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1 FACULDADE 7 DE SETEMBRO - FA7 CURSO GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO EM JORNALISMO A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA E AS ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO NATALIE CARATTI DA CUNHA Fortaleza, Ceará, Brasil 2010

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FACULDADE 7 DE SETEMBRO - FA7

CURSO GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM

JORNALISMO

A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA E AS

ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO

NATALIE CARATTI DA CUNHA

Fortaleza, Ceará, Brasil

2010

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NATALIE CARATTI DA CUNHA

A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA E AS

ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO

Monografia apresentada à Faculdade 7 de

Setembro como requisito parcial para

obtenção de título de Bacharel em

Comunicação Social com habilitação em

Jornalismo.

Orientadora: Professora Ms. Kátia Patrocínio

Fortaleza, Ceará, Brasil

2010

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A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA E AS

ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO

Monografia apresentada à Faculdade 7 de Setembro como requisito parcial

para obtenção de título de Bacharel e Comunicação Social com habilitação

em Jornalismo.

________________________________________

Natalie Caratti da Cunha

Monografia aprovada em: ______ /_______/______

________________________________________

Professora Ms. Kátia Patrocínio (orientadora)

BANCA EXAMINADORA:

________________________________________

Professora Ms. Alessandra Marques Marques Cavalcante da Fontoura

(membro)

________________________________________

Professor Ms. Danilo Almeida Patrício (membro)

COORDENADORA DO CURSO:

________________________________________

Professora Ms. Juliana Lotif Araújo

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus avós Francisco

Chaves da Cunha e Olívia Leite Chaves da Cunha;

aos meus pais Carla Caratti Cunha e Henrique Leite

Chaves da Cunha. É insubstituível a alegria de saber

da confiança que vocês depositaram em mim.

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AGRADECIMENTOS

Diante da honrosa tarefa de transformar memórias em texto e

arquivo histórico, agradeço a todos que fizeram parte deste trabalho direta

ou indiretamente. Primeiro, aos meus familiares já citados anteriormente:

vovô Chaves, pelo apoio moral e financeiro, vovó Olívia, e aos meus pais

Carla e Henrique.

Agradeço ao curso de jornalismo, já abraçando todos os

professores que me alertaram para o mundo, me fizeram entender as

dores e paixões desse ofício tão envolvente. Individualmente, agradeço

ao professor Luiz Gonzaga Capaverde pelas conversas esclarecedoras

sobre jornalismo, poesia de vida e assuntos relacionados. Ao professor

Miguel Macedo, pelas aulas enérgicas, conversas indispensáveis e

relatos sobre a greve. Ao professor Ismar Capistrano, pelo vasto

conhecimento e pelo incansável estímulo da prática nas ruas. À Ana Mary

C. Cavalcante, pelos conselhos sobre texto e jornalismo. À coordenadora

Juliana Lotif. A Danilo Patrício pela oportunidade de debater e conhecer

melhor o jornalismo esportivo. Ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais

no Estado do Ceará (Sindjorce) pela atenção.

Em especial, reverencio a professora Alessandra Marques por

indicar o tema deste trabalho. Agradeço à Kátia Patrocínio que

prontamente aceitou o meu convite para orientação. Aos jornalistas

Ângela Marinho, Carlos Alberto Alencar, Ronaldo Salgado, Paulo

Ernesto Serpa e Nilton Almeida, pela disponibilidade e memórias da

greve.

Aos meus primos queridos Igor e Luisa Maria por estarem sempre

tão perto e acreditarem em mim. Ao meu amigo Gustavo Vieira a quem

inspiro grande carinho e confiança. À Joana D‟arc Dutra, pelo senso

crítico latente, conselhos e sermões necessários. À minha amiga Paula

Trajano, por me ouvir sempre. À Patrícia Melo pela delicadeza,

companhia e paciência. À Aurelina Paz, „Leinha‟, pela cumplicidade,

carinho e dedicação.

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RESUMO

CARATTI, Natalie. A greve de 1988 dos jornalistas e as estratégias de

mobilização 2010. 50 f. Monografia (graduação em Jornalismo). Curso

de Comunicação social com habilitação em Jornalismo, Faculdade 7 de

Setembro, Fortaleza, 2010.

Este trabalho resgata e analisa a greve de 1988 dos jornalistas em

Fortaleza e como os profissionais conseguiram sustentá-la durante o

período de 1º a 15 de dezembro daquele ano. Aqui mostraremos quais

foram as principais estratégias de comunicação, ferramentas utilizadas e

os principais fatores que contribuíram para a duração da greve. O produto

fundamenta-se em história oral, com base em relatos de seis jornalistas

entrevistados; análises de jornais locais circulados à época da greve e

duas edições do jornal Em pauta, produzido pelo Sindicato dos Jornalistas

Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce). Com este trabalho buscou-

se contrubuir para a história dos jornalistas e do Sindjorce.

Palavras-chave: sindicalismo, greve, jornalismo.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..........................................................................................8

01– SINDICATOS E SINDICALISMO......................................................11

1.1 - HISTÓRICO DOS SINDICATOS NO MUNDO..................................11

1.2 – PARTIDOS E CENTRAIS SINDICAIS.............................................12

1.3 - SINDICALISMO NO BRASIL...........................................................14

1.3.1 – CRIAÇÃO DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS

(CLT).......................................................................................................15

1.4 - BREVE HISTÓRICO DA FUNDAÇÃO DO SINDICATO DOS

JORNALISTAS PROFISSIONAIS DO CEARÁ (Sindjorce).......................17

02 - A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA............18

2.1 – Episódios marcantes da greve.........................................................24

2.2 – Falta de documentação..................................................................26

03 – ANÁLISE DA GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM

FORTALEZA.............................................................................................28

3.1 – FATORES QUE LEVARAM À GREVE.............................................28

3.2 – FERRAMENTAS DE MOBILIZAÇÃO...............................................29

3.3 – ANÁLISES DAS ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO E

COMUNICAÇÃO.......................................................................................33

CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................36

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................38

ANEXOS...................................................................................................40

APÊNDICE...............................................................................................43

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INTRODUÇÃO

No dia 31 de março de 2009, estudantes e profissionais de

jornalismo estiveram na Praça da Imprensa, localizada em frente ao

prédio do sistema Verdes Mares de Comunicação, num ato de defesa à

obrigatoriedade do diploma no exercício da profissão e por melhorias

salariais. A manifestação que possibilitaria uma possível greve não vingou

para tal. A partir de uma reflexão sobre a movimentação e uma conversa

com a professora Alessandra Marques, comecei a me interessar pelo

tema aqui proposto. Ela foi quem me informou da greve de 1988 em que

muitos jornalistas das duas maiores redações de Fortaleza paralisaram as

atividades durante 15 dias.

A categoria de jornalistas do estado do Ceará, em particular, de

Fortaleza, viveu em 1988 o que pode ser considerado, simbolicamente, o

maior e mais significativo movimento sindical da categoria no estado.

Foram 15 dias de paralisações de atividades em vários setores da

imprensa local. Em especial, no Jornal O Povo, jornal diário mais antigo

do Ceará e jornal Diário do Nordeste. Durante o movimento grevista, o

caderno de cultura do jornal O Povo, então chamado Segundo Caderno,

não teve uma de suas edições publicadas.

Esta pesquisa se desdobra, principalmente, na identificação das

estratégias de mobilização utilizadas para deflagrar a greve e manter a

paralisação de jornalistas em Fortaleza, durante os 15 dias, entre 1º a 15

de dezembro de 1988. Este trabalho baseia-se em história oral, em que

foi possível o registro através da contribuição dos jornalistas Ângela

Marinho, Carlos Alberto Alencar, Ronaldo Salgado, Paulo Ernesto Serpa,

Nilton Almeida e Miguel Macedo, através de entrevistas presenciais

durante o primeiro semestre de 2009 e o primeiro de 2010. Por meio de

pesquisas em bibliotecas públicas e privadas, e até mesmo com os

profissionais que participaram da greve, não foi possível encontrar livros

ou arquivos sobre a greve.

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Contudo, conseguimos, com o Sindicato dos Jornalistas

Profissionais do Ceará (Sindjorce), duas edições do jornal Em pauta que

traziam a retrospectiva da greve. Mas não se descarta a dificuldade em

fundamentar este trabalho com base em atas de reuniões e assembleias

da greve de 1988, pelo fato do Sindjorce não disponibilizá-las mais. Ao

entrarmos em contato com a direção atual do Sindjorce, obtivemos a

informação de que não havia nenhum tipo desse registro do período de

1984 a 1988.

Não há dados como acordo salarial e nomes de todos os jornalistas

que foram demitidos após a greve. De certo, há algumas críticas a serem

feitas sobre a falta de documentação histórica do Sindicato dos

Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce). No editorial do

exemplar Em pauta (2003) reforça essa questão1:

É verdade que a nossa relação com o passado é problemática. E mais ainda com o seu resgate. Daí porque nosso esforço em bater nesta tecla, a tecla do que fomos, do que somos e do que seremos, nem pior nem melhor.

Além das entrevistas, foram analisados jornais locais que

circularam na época da greve. Na biblioteca pública governador Menezes

Pimentel foram consultados jornais e registramos difícil conseguir os

arquivos deles. Não há digitalização disponível deles, então procurou-se

entrar em contato com o banco de dados dos jornais que ainda circulam

em Fortaleza.

Os arquivos digitalizados do jornal O Povo, foram três, cada um

com o custo de R$ 16 reais. Já no Diário do Nordeste eles não dispõem

arquivos digitalizados e cada exemplar do periódico custa R$ 50 reais. No

que se refere ao jornal O Estado, não foram encontrados exemplares da

época da greve na biblioteca governador Menezes Pimentel nem o

próprio jornal tem em arquivo. Quanto ao periódico Tribuna do Ceará, foi

encontrada apenas uma coluna que falava sobre a greve. Em tom de

1 Trecho da edição do jornal Em pauta, produto feito em comemoração aos 50 anos do

Sindjorce.

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“defesa”, o jornal tinha argumentos de que os jornalistas da Tribuna eram

compromissados com o ofício e estavam trabalhando. Alguns exemplares

estavam com as páginas amareladas e rasgadas, dificultando a leitura.

No primeiro momento deste trabalho, fazemos uma explanação

sobre o surgimento dos sindicatos e sindicalismo no mundo; movimento

sindical brasileiro e movimentos grevistas no Brasil. Também um resgate

histórico da fundação do Sindjorce e a trajetória de luta da categoria.

Neste capítulo trabalhamos com os seguintes autores: Marx (2008),

Núcleo Piratininga de Comunicação (s/d), Dutra (2003) e Sá (1981).

Em seguida, trouxemos a história da greve de 1988 dos jornalistas

e as estratégias de mobilização que levaram à paralisação das atividades

nas principais redações, do jornal O Povo e Diário do Nordeste, com base

em relatos de jornalistas participantes do movimento paredista da época.

No terceiro momento, foi feita a análise da greve nas definições

dos seguintes tópicos: fatores que levaram à greve e ferramentas de

mobilização.

Nosso objetivo é revelar os diversos olhares sobre o movimento a

partir das entrevistas exploratórias com diretores do Sindjorce e jornalistas

que aderiram à greve de 1988.

Partindo da compreensão de que a comunicação é uma ferramenta

indispensável para a luta sindical, nossa investigação se concentra

especialmente nos aspectos e\ou ações comunicativas que foram

utilizadas no período.

Na greve de 1988, o Sindjorce tinha mais de 30 anos de fundação.

Naquela época e segundo nossa pesquisa prévia, até hoje mesmo se

tratando de um sindicato que reúne profissionais da área de

comunicação, este setor não teve sua ação potencializada ao longo da

história de luta da entidade. Nesse sentido nosso estudo também

identifica as razões para esta contradição. Por fim o desafio dessa

pesquisa, que parte das características do Brasil e chega às

especificidades do movimento grevista de jornalistas em 1988 no Ceará, é

compreender como as estratégias de mobilização e comunicação foram

eficazes para manter a paralisação durante os quinze dias de greve.

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01– SINDICATOS E SINDICALISMO

1.1 - HISTÓRICO DOS SINDICATOS NO MUNDO

O surgimento dos primeiros movimentos sindicais e a

institucionalização de sindicatos remonta, em especial, às lutas dos

trabalhadores operários. Primeiramente, os da Europa Ocidental, que

sofreram com a industrialização de máquinas a vapor e péssimas

condições de trabalho nas fábricas em que trabalhavam2. Assim, o reflexo

das lutas foi vivido no resto do mundo. Eram reivindicações por menor

jornada de trabalho, melhoria de salário e diminuição de acidentes no

sistema trabalhista.

Inicialmente o sentimento de coletividade, de conjunto, não existia

e cada trabalhador defendia-se de maneira individual. Com o aumento no

número de operários, coube ao grupo sentir-se uma só classe: dos

proletários, operários. Ainda buscando explicar e denominar a condição

dos trabalhadores, Karl Marx (2008), entende como uma luta de classes.

Em questão, há a luta entre a classe burguesa (patrões) e a classe

operária (trabalhadores).

Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, membro das corporações e aprendiz, em suma, opressores e oprimidos, estiveram em contraposição uns aos outros e envolvidos em uma luta ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que terminou sempre com a transformação revolucionária da sociedade inteira ou com o declínio conjunto das classes em conflito (MARX, 2008: p.8).

Foram muitas greves, agitações e repressões no momento de luta

dos operários. De acordo com o livro Sindicatos e centrais sindicais no

Brasil: "Na Inglaterra, o país que começou a industrialização,

aconteceram os primeiros protestos e manifestações. Eram as chamadas

"marchas da fome". (NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d,

2 A inicialização do problema deu-se na Europa, Inglaterra, por ser o país mais

industrializado

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p.7). Depois surgiram os primeiros comícios, sufocados pelos exércitos da

burguesia ou dos reis.

Com a inibição e proibição dos movimentos em todos os países, foi

apenas em 1824 que o parlamento da Inglaterra concedeu o direito da

associação. O primeiro sindicato inglês, a União dos Fiadores de Algodão,

nasceu em 1825, representado por 100 mil membros e criado assim um

jornal. "A greve e o jornal operário eram os dois símbolos de luta da

classe trabalhadora. A greve para dobrar os patrões e o jornal para

difundir a ideia de união e da necessidade da luta", (NÚCLEO

PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d, p. 8).

A atuação do movimento paredista à época, século XIX, começou

a atingir o âmbito político e a exigência era pelo direito ao voto universal

secreto, escola gratuita para todos e ainda o Cartismo: direitos do povo

descritos. A Inglaterra vivia com vigor a luta sindical e em 1847 houve

aprovação de uma lei que estabelecia um limite de 10 horas de trabalho

diário. O país inglês foi o primeiro a conquistar mais autonomia e

liberdade para instrumentalizar os sindicatos. Ainda com base no texto

produzido pelo Núcleo Piratininga de Comunicação (s/d, p 9): "Até 1850,

os sindicatos e toda organização operária para a luta eram proibidos. Em

todos os países, menos na Inglaterra"

Mas da união entre os operários, articulada

primeiramente pelos franceses e ingleses, surgiu em 1864, através de

uma reunião geral, a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT). A

bandeira de luta da Associação era de redução da jornada de trabalho.

1.2 – PARTIDOS E CENTRAIS SINDICAIS

Logo após a criação da AIT, dois anos mais tarde, em 1866,

aparecia o primeiro partido socialista na Alemanha, o Partido Operário

Social-Democrata. A partir da inserção do Partido e da classe operária

nas decisões políticas, foi possível também formar uma nova

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configuração de resistência: a central sindical. Lembrando que, até os

anos 1850, qualquer instituição e organização de luta eram proibidas em

todos os países, com exceção da Inglaterra. Marx, conhecido à época por

ser autor do livreto Manifesto do Partido Comunista, lançou na I

Internacional3 a seguinte frase: “A emancipação da classe trabalhadora

será obra da própria classe trabalhadora”.

Em 1871, a França, com exclusividade a capital francesa Paris,

vivia um intenso movimento revolucionário. A população conseguiu tomar

o poder do imperador e a cidade tinha o município como governante.

A classe trabalhadora dominou uma das maiores capitais do mundo por três meses. Mesmo depois da derrota da classe trabalhadora de Paris, no resto da Europa ela continuou a se organizar em sindicatos, centrais sindicais e partidos operários. (NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d, p.11)

De acordo com a publicação do Núcleo Piratininga de

Comunicação, o ano de 1889 foi marcado por debates, entre eles,

questionamentos sobre qual o destino do socialismo e qual democracia

seria ideal para os proletários. Como fatores de tensão, houve as duas

grandes guerras que abalaram todo o mundo: a I e II Guerra Mundial.

Em junho de 1945, dois meses após o fim da guerra, encontraram-se, em Paris, representantes de sindicatos ingleses, soviéticos, franceses e norte-americanos. Juntos, decidiram criar uma grande organização unitária: a Federação Sindical Mundial (FSM). [...] Logo, a FSM ficou paralisada. O clima de coexistência pacífica entre mundo capitalista e bloco comunista não teria futuro. (NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d, p.15)

A jornada por lutas em favor da melhoria de salários e condições

de trabalho permeia no Brasil antes mesmo da primeira guerra mundial.

3 Foi o primeiro encontro internacional entre a classe trabalhadora que resultou na

criação da Associação Internacional do Trabalho. Como funções, tinham a luta por uma sociedade socialista e a difusão de ideias socialistas.

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1.3 – SINDICALISMO NO BRASIL

No Brasil, a força sindical pela luta por melhores salários e

condições de trabalho também vieram atreladas à industrialização do

trabalho. Joana D‟arc Dutra (2003). na dissertação de mestrado4, Luta

sindical e comunicação um estudo de caso sobre a comunicação

desenvolvida pelo Sindicato dos trabalhadores no serviço público federal

do Estado da Bahia, pontua:

A organização dos trabalhadores em grupos com reivindicações coletivas, no Brasil, tem origem nos últimos anos do século XIX. Essa organização está vinculada ao processo de transformação de nossa economia, cujo centro agrário era o café. A substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado, a transferência de lucro do café para a indústria e o poder político concentrado nas mãos dos cafeicultores marcaram esse momento. Esses trabalhadores, em primeiro lugar, reuniram-se em “sociedades de socorro” e ajuda mútua para depois se fortalecerem com o surgimento da chamada União Operária, e com o advento da indústria, eles passaram a se organizar por ramo de atividade dando origem aos sindicatos. (DUTRA, 2003, p 14)

Mas a trajetória de luta perpassa por muitas repressões do governo

e tentativas de impedir o movimento sindical dos trabalhadores.

De acordo com o livro do Núcleo Piratininga de Comunicação,

Sindicatos e centrais sindicais no Brasil (s\d), houve muitas tentativas de

institucionalização para uma unidade em defesa dos direitos dos

trabalhadores; desde a Confederação Operária Brasileira (COB) em 1906,

até a Central Única dos Trabalhadores (CUT) em 1983.

O atrelamento entre Estado e movimento sindical no Brasil ganha maior força a partir da revolução de 1930. Com a criação do Ministério do Trabalho e a publicação do Decreto 19.1770, a Lei dos Sindicatos, como ficou conhecido, a aproximação ganhou tamanha dimensão que marcou a trajetória do movimento no Brasil. (DUTRA, 2003, p 14)

4 Disponível para leitura em: http://www.poscom.ufba.br/arquivos/Poscom-Producao_Cientifica-Joana_D-Arc_Dutra.pdf

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Ainda com base na publicação Sindicatos e centrais sindicais no

Brasil, tem-se registro da COB como fruto do 1º Congresso Operário no

Brasil e que em seguida a Confederação teve o próprio jornal chamado A

Voz do Trabalhador, e também que “a COB teve um papel

importantíssimo na formação política e ideológica da nascente classe

operária”. (NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d, p 20) Porém, o órgão

começou a perder força mediante a pressões vindas do governo e dos

patrões.

Após o desaparecimento e desarticulação da COB, vieram outras

tentativas de fomentar uma confederação sindical. Uma em 1929, que

daria na Confederação Geral dos Trabalhadores Brasileiros (CGTB) e a

outra em 1935, Confederação Sindical Unitária Brasileira (CSUB),

contudo as duas não entraram como mérito para a história sindical no

Brasil, ambas não vingaram. Mas no final da II Guerra Mundial, o Brasil

despontou; no que se refere à volta de um engajamento político-social.

Assim, foi criado o Movimento Unitário dos Trabalhadores (MUT), “os

trabalhadores reivindicavam e queriam incluir na Constituição o que foi

sufocado nos duros anos da ditadura do Estado Novo, de 1937 a 1945”.

(NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO, s/d, p 22)

1.3.1 – CRIAÇÃO DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS TRABALHISTAS

(CLT)

Foi no mandato de Getúlio Vargas, em 1943, que foi criada a

chamada Consolidação das Leis do trabalho (CLT), assim concebida

como uma forma de dar “legitimar” alguns direitos sindicais ao mesmo

tempo sem deixar de repreendê-los, era uma:

[..] legislação sindical que visava controlar e domesticar a organização dos trabalhadores. Impunha uma estrutura burocratizada e dependente do Ministério do Trabalho com o objetivo de enquadrar e controlar os trabalhadores. Nessa legislação além de uma série de restrições à atividade sindical, fez uma série de proibições explícitas. (idem ; p 21)

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E Adísia Sá (1981) contribui:

A estrutura sindical brasileira, a partir das Leis Trabalhistas de Vargas, obedece a um esquema rígido, definido, onde tudo é determinado por lei própria e fiscalizado por um Ministério, desde a elaboração dos estatutos à gestão financeira e à escolha dos dirigentes; das definições à estrutura vertical das entidades. (SÁ, 1981, p 40).

Para tanto, é preciso lembrar que as formas de repressão e

ameaças dos governantes referentes ao combate das ações dos

sindicatos, não foram recebidas:

[...] sem resistência. [...] A violência e a perseguição contra alguns líderes dos trabalhadores e também de outros setores da sociedade que, em muitos casos ainda timidamente, se manifestavam como mulheres e estudantes, deixou uma mancha na história brasileira. (DUTRA, 2003, p 15).

De acordo com o Núcleo Piratininga de Comunicação, o golpe

militar em 31 de março de 1964 “veio exatamente para acabar com as

greves e as mobilizações operárias e a agitação estudantil”. Mesmo

perseguidos pela ditadura, os trabalhadores ainda faziam pequenas

manifestações.

Quem reforça o argumento é Adísia Sá (1999):

O sindicalismo brasileiro passou do espontaneísmo da Primeira República para o autoritarismo estatal de Vargas; atravessou os desordenados e inquietos anos de Juscelino e Jânio para a violência do Golpe de 64; deveria não ter outra história senão a feita de repressão, intervenção, cassação de mandatos, prisão. Paralela, contudo, a esta história de violência, violentações e violação de direitos, o sindicalismo brasileiro tem uma história de lutas e conquistas. (SÁ, 1999, p 37)

A autora lista algumas conquistas dos trabalhadores: redução da

carga horária de trabalho (1906), proteção contra acidentes de trabalho

(1906), pagamento em dia (1906), trabalho da mulher e do menor (1906),

pensão (1906), sindicatos rurais (1906), estatutos livres de tutela (1913),

delegados sindicais (1913), salário mínimo (1913), condições de trabalho

(1913), sindicato não deve dar guarida a lutas político-partidárias e

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religiosas (1906), Sindicato-Federação-Confederação (1906-1913),

formação do trabalhador (1906-1913) e liberdade de reunião (1906).

Já no final da década de 1970, o Brasil iria apresentar um novo

referencial de atores sindicais, no sentido de “combater” o chamado

sindicalismo pelego5.

Uma das greves mais expressivas ocorridas no Brasil é a dos

metalúrgicos do ABC Paulista, em São Bernardo do Campo, no ano de

1978; atrelada a ela veio a criação da Central Única dos Trabalhadores.

Muitos metalúrgicos paralisaram as atividades em prol de melhorias

salariais e de trabalho.

1.4 - BREVE HISTÓRICO DA FUNDAÇÃO DO SINDICATO DOS

JORNALISTAS PROFISSIONAIS DO CEARÁ (Sindjorce)

A construção de um espaço onde jornalistas e profissionais da

comunicação pudessem discutir e defender o ofício aconteceu,

primeiramente, através da fundação da Associação Cearense de

Imprensa (ACI), em 1925. Mas no ano de 1944, em 14 de dezembro,

“houve uma reunião no gabinete do Delegado Regional do Trabalho para

a instalação daquilo que todos pensavam ser o Sindicato. (SÁ, 1981; p

30). Porém a primeira tentativa ainda no mesmo ano (1944) não obteve

êxito, por motivo de conflitos entre patrões e empregados.

Apareceu, assim, outro empecilho para a criação do Sindicato. De

acordo com SÁ (1981), o Delegado do Trabalho exigia registro

profissional dos membros associados e à época muitos “não tinham a

condição de jornalista profissional, e mais, alguns deles eram, também,

proprietários de jornais”. (idem, 31).

Mais tarde, em 1951, fundou-se a Associação Profissional dos

Jornalistas do Ceará. Só em 26 de maio de 1953, mediante assembleia

geral, a Associação passou a ser o Sindicato.

5 Era o chamado sindicalismo que não tinha comprometimento com a categoria e sim

com os patrões.

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02 - A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA

O movimento paredista de 1988 eclodiu mediante a greve de 1985,

com duração de apenas três dias, que deixou brechas e insatisfações

para a categoria. Ronaldo Salgado6, jornalista e participante ativo do

movimento sindical, é quem sustenta a afirmação e diz que “a greve

deixou resquícios”. Salgado também relata que a greve de 1985 foi

considerada, à época, intempestiva, em que durante uma assembleia

uma pessoa deu grito de greve, às vésperas do natal. Contudo, a greve

foi pressionada entre dirigentes e jornalistas para a rápida solução.

Houve uma mobilização por parte dos jornalistas e dirigentes

visando a uma rápida solução. A solução rápida foi encontrada

mas deixou resquícios, de insatisfação: salarial, ao nível de insatisfação dos jornalistas [..]e nesse período da greve de 1985 nós estávamos prestes a terminar o mandato da presidente à época, da jornalista Ivonete Maia. (SALGADO, 2010, informação verbal).

E o jornalista Nilton Almeida7 completa: “Eu acredito que, em 1988,

quando a greve foi decretada, os jornalistas vinham de uma interpretação

da greve de 1985”.

Para tanto, é preciso retornar ao momento político e histórico

daquela época (1988). Na década de 1980 o Brasil estava calejado de

uma ditadura militar, da repressão do governo. O sentimento de luta e

reivindicação estava instalado em muitos brasileiros. No movimento

grevista de 1988, os sindicatos de outras categorias como os gráficos e

professores também juntaram as forças para ajudar os jornalistas. O país

vivia e planejava um cenário nítido de redemocratização política.

6 À época da greve, o jornalista era membro do Conselho Fiscal do Sindicato dos

Jornalistas Profissionais do Ceará (Sindjorce) e trabalhava como chefe de reportagem do jornal Diário do Nordeste. Atualmente compõe o corpo docente do curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo na Universidade Federal do Ceará (UFC). Entrevista feita pela autora deste trabalho no dia 11 de março de 2010. 7 Presidente do Sindjorce à época, atualmente trabalha na assessoria de imprensa do

Banco do Nordeste (BNB). Entrevista feita pela autora deste trabalho no dia 16 de março de 2010.

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Frente à diretoria do sindicato estava o jornalista Nilton Almeida,

que antes da formação acadêmica, participava do movimento estudantil e

das assembleias no Sindicato. Almeida acredita que a mobilização para a

greve teve relativa significação porque era feita pessoalmente, nas

redações e locais de trabalho dos jornalistas.

Você tem que estar lá no local do trabalho e realmente tentar criar manter o diálogo, reforçar os laços e assim criar um corpo orgânico com força. [..] não foi uma greve de cima para baixo, a greve não acontece porque um dirigente quer, porque alguns querem, ela ocorre em função de mobilização planejada, esquematizada, de um sistema de comunicação mais no olho a olho com as pessoas. O que acaba fortalecendo uma consciência do coletivo. (ALMEIDA, 2010, informação oral).

Na mesma linha de raciocínio, a jornalista Cláudia Santiago e o

sindicalista Vito Giannotti citam:

Do boletim ao cartaz, à pichação, ao repente, ao livro, à Internet, ao cordel – os sindicalistas têm dezenas de ferramentas à mão para comunicar sua política. Mas a mais importante de todas as ferramentas é ainda a mais simples, mais barata, mais antiga e sempre à disposição de todos: a língua. Ou seja, a comunicação direta: a palavra. (SANTIAGO; GIANNOTTI; 1997: 27)

A jornalista Ângela Marinho8 enumera alguns fatores que foram

determinantes para que a categoria chegasse à paralisação. Entre eles,

ela cita o fato dos jornalistas serem da mesma faculdade.

Nós éramos muito apaixonados pelo que a gente estava fazendo. Ninguém tinha medo não. Hoje em dia as coisas são bem diferentes. Nós somos uma geração, pós-golpe, pós 68, algumas pessoas tinham vivido a repressão, os mais velhos. Mas nós éramos mais engajados do que os jornalistas são hoje. Tem outra vertente dessa história: Nós todos éramos oriundos da mesma faculdade, todos nos conhecíamos, era menos gente, hoje em dia são sete faculdades, muita gente não se conhece. (MARINHO, 2010, informação oral).

Consciência é a palavra de ordem do jornalista Carlos Alberto

Alencar. “Havia uma mobilização forte, muito boa e a greve foi um

movimento lançado com muita consciência. Antes da greve já havia um

8 À época era editora de Polícia do Diário do Nordeste e diretora do Sindjorce.

Atualmente diretora de Comunicação da Agência da Boa Notícia e ouvidora da Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor). Entrevista feita pela autora deste trabalho, no dia 4 de março de 2010.

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processo de ebulição. Havia uma consciência maior, uma união maior”. A

afirmação de Nilton Almeida confere com a do jornalista Carlos Alencar:

A rigor quem não participou da greve foram as pessoas que tinham cargo de confiança, mas a esmagadora maioria não estava trabalhando. Os que furaram diziam; motivo 1: não quero correr o risco de perder meu emprego, 2: a greve não é justa, não deve acontecer, enfim, então entra os motivos de caráter ideológicos. Naquele momento havia uma consciência do que é ser jornalista, das dificuldades pelas quais passavam e da possibilidade de usar essa capacidade de mobilização que nós tínhamos para mostrar uma série de reivindicações daquela pauta, daquele período. (ALMEIDA, 2010, informação oral)

O movimento paredista de 1988 foi um momento preciso para a

categoria e de muita resistência. Alguns sofriam pressões dos patrões e

insultos dos jornalistas que se esquivaram da greve, os chamados “fura-

greve”. Ângela Marinho recorda:

Eu vinha de um piquete muito cansada e fui no supermercado Romcy fazer um pagamento. [..] quando eu entrei lá a Patrícia Nobre, que hoje em dia é repórter da Globo em Salvador, estava fazendo uma matéria no meio do Romcy. E eu tive uma briga com ela no meio do Romcy, chamei-a de fura greve e o câmera dela pedindo para eu ter calma. Ela num sotaque bem carioca disse; "Se eu não trabalhar quem é que vai pagar as minhas contas no fim do mês?". E eu falei: não é você com esse salário que você ganha. Porque você vai ter aumento de salário por causa da greve que eu estou fazendo. (MARINHO, 2010, informação oral)

Foram passeatas e piquetes em frente aos jornais e empresas de

comunicação, para esclarecer à população. Os jornais saiam sem alguns

cadernos, feitos com colagens de revistas e eram mais notícias nacionais

e internacionais. Para não haver constrangimento, por exemplo: o

jornalista que era do jornal O Povo ficava em frente ao Diário do Nordeste

e vice-versa. Assim, eles fiscalizavam quem entrava e saía da empresa, o

que levavam para a redação e alertavam para a importância da greve.

Uma estratégia usada era de tentar sensibilizar o colega para não ir

trabalhar, às vezes indo à residência dele ou fazer com que ele ficasse no

Sindjorce.

Então uma das formas era essa, sequestrar, no bom sentido, para levar lá pro Sindicato. Uma vez nós demos um porre no Luís Antônio, da Tribuna do Ceará, e ele passou a noite no sofá do Sindicato. Dormiu lá e vomitou, enfim, mas não foi trabalhar. (MARINHO, 2010, informação oral).

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Para explicar a estratégia de mobilização, Ângela Marinho pontua

três tipos de condição em que os jornalistas estavam à época:

A pessoa que aderiu à greve e ia fazer o piquete, que se expunha, tinha o que aderiu e ficava em casa e tinha a pessoa que ia trabalhar. As pessoas que a gente sabia que estavam em casa a gente ia conversar e pedia para não ir trabalhar, Às vezes a gente conseguia às vezes não. (MARINHO, 2010, informação oral).

Os grevistas estavam atentos às manobras utilizadas pelos donos

das empresas de comunicação, uma delas foi barrada pelos jornalistas. O

jornal O Povo estava com dificuldade para imprimir os jornais, boa parte

dos gráficos tinham aderido à greve, então o jornal tinha que ser rodado

na gráfica do jornal Tribuna do Ceará. Ao tratar das forças sindicais, o

professor Leôncio Martins Rodrigues afirma:

O melhor e mais comum, mas não o único, instrumento de efetivação da força do sindicalismo está na capacidade de as lideranças sindicais causarem algum tipo de prejuízo aos empregadores (e também ao governo). Nas democracias, o instrumento por excelência para alcançar esse objetivo é a paralisação de atividades econômicas ou de outro tipo de atividade (quando se trata da administração pública), ou seja, cortar o fornecimento da força de trabalho para as empresas ou para o governo. (RODRIGUES, 1999: 119).

Ângela relata uma das estratégias usadas pelos grevistas para

impedir que o jornal saísse pela Tribuna do Ceará foi furar os pneus do

carro:

Ficávamos prestando atenção nos carros que saiam para levar o jornal... Aí a gente, por iniciativa de um colega nosso, Vicente Mota, mandou fazer umas aranhas que são de prego, amassadas e soldadas. Como se fosse uma aranha de ferro, aí era só soltar duas aranhas, uma de um lado outra do outro. Aí o pneu no carro furava (risos), porque bastava furar dois, ele não podia mais rodar. (MARINHO, 2010, informação oral).

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Os quinze dias de greve foram marcados por luta constante,

mobilização e algumas histórias curiosas. Uma delas, conta o jornalista

Carlos Alberto Alencar9, foi para ele a mais intrigante.

No auge da greve, quando estava bem forte mesmo; quase que parando os jornais, o dono do Jornal O Povo, Demócrito Dummam, ele numa manobra com a jornalista Adísia Sá, conseguiu ir a uma assembleia do Sindicato, no sindicato, em pleno fervor da greve e fez um discurso muito emocionado, chorou, pedindo a volta dos jornalistas. E isso me deixou muito revoltado, a presença dele no sindicato, eu e outros companheiros ficamos. E depois quando terminou a greve ele demitiu todo mundo. (ALENCAR, 2010, informação oral).

Para Carlos Alencar, a atitude foi de traição. E analisa: “Como se

fosse assim uma iniciativa para se chegar a um bom senso, a um

consenso, desfecho positivo da greve; e na realidade foi uma traição”.

Carlos ainda lembra da forma como foi demitido, após a greve; através de

uma carta a direção do jornal informou que estava dispensada a presença

dele na redação.

E uma deflagração de greve nos tempos atuais, seria viável? (No

ano de 2009 a atual presidente do Sindjorce, Débora Lima, tentou

deflagrar uma greve mas por falta de quórum não foi possível). Para o

questionamento, Carlos Alencar e Nilton Almeida têm opiniões firmes:

Hoje eu acho que há um esvaziamento muito grande do movimento sindical. O PT nasceu no movimento sindical, fortaleceu e cresceu no movimento sindical e foi ele quem articulou o movimento sindical até como uma forma de não só do trabalhador perante o patrão como também ao próprio governo, ao regime, à ditadura. Não era só puramente trabalhista, era político também diante do regime que imperava na época. Quando o PT chegou ao poder, esse movimento de certa forma se tornou pelego, porque hoje a CUT é a pelega do governo. Enfraqueceu muito, não tem mais capacidade de mobilização, espírito de luta (ALENCAR, 2010, informação oral).

Paulo Ernesto Serpa10 ajuda:

9 À época era editor de Cidades do Diário do Nordeste, trabalhava na Tv Verdes Mares e

no IBAMA, antigo IBDF em Fortaleza. Atualmente é editor geral do Jornal O Estado. Entrevista feita pela autora deste trabalho, no dia 10 de março de 2010.

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Fazendo um paralelo, a tentativa de greve que o sindicato quis fazer em 2009, uma diferença enorme de tempo, de tudo, vinte e um anos, todo o Brasil mudou muito. Estava muito evidente a luta de classes, entre patrão e empregado, ente o dono do capital e o dono do trabalho. A força do trabalho e a força do capital. (SERPA, 2010, informação oral).

Já Nilton Almeida denomina a postura dos trabalhadores como

“acomodada”. Para ele, a greve de 1988 foi um movimento de luta

constante e trabalho intenso e hoje “as pessoas não reagem, se

acomodam, não vão ao sindicato. Estão nas mãos da empresas, que

demitem a qualquer hora, e pronto, acabou”. Para Nilton, hoje os

trabalhadores perderam muito do espírito de luta, mesmo que não tenha

boas as condições de trabalho, a “garantia” do emprego os conforta.

Paulo Ernesto atenta para o momento histórico e contextualiza:

É importante entender que essa mobilização foi possível por causa do clima no País. Aí nós tínhamos a nosso favor esse sentimento de revolta no país inteiro. Nesse período, três anos depois que os militares saíram do poder, Sarney foi eleito indiretamente pelo Congresso Nacional, era um presidente civil. Então havia todo um sentimento de medo, embora a Constituição tenha estabelecido muitos pontos positivos depois que o Brasil saiu de todo esse golpe militar que realmente amordaçou a nação inteira. (SERPA, 2010, informação oral).

Em relatos sobre a greve, jornalistas não reclamaram ou

lamentaram a pouca estrutura do Sindjorce, ao contrário, souberam

utilizar cada potencialidade do movimento; em que o poder da palavra foi

usado de forma significativa. Sobre a questão, Cláudia Santiago e Vito

Giannoti lançam uma crítica aos movimentos sindicais.

É uma atitude comum na esquerda, e especialmente no movimento sindical, queixar-se da própria impotência. Quase uma contemplação da própria fraqueza. Um deleitar-se da própria pequenez, numa atitude fatalista que leva ao imobilismo. A frase que resume esse estado de espírito é a clássica: “A burguesia está com tudo”. (SANTIAGO; GIANNOTTI, 1997:29)

10

À época da greve, era vice-presidente do Sindijorce e atualmente é assessor de

imprensa e porta-voz do Detran-CE. Entrevista feita pela autora deste trabalho, no dia 10 de marco de 2010.

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2.1 – Episódios marcantes da greve

Mas o que parte dos jornalistas faziam para driblar as mobilizações

e abordagem dos grevistas? Como eles reagiam? Os grevistas afirmam

que muitas eram as artimanhas utilizadas pelos “fura-greve”. Alguns se

escondiam no bagageiro dos carros para não serem vistos entrando na

empresa, outros mandavam matérias de casa por outras pessoas.

Ronaldo Salgado lembra de um episódio marcante durante a greve. Foi

quando chegou em suas mãos um envelope em atenção ao jornalista

Sérgio Pires, um dos diretores do jornal O Povo; e Ronaldo teve acesso

ao documento. Na ocasião, estava fazendo piquete em frente ao jornal:

Quando eu peguei esse pacote tinha um cocô (sic), então era alguma pessoa tentando denegrir o movimento, e eu pedi para entrar para falar com ele (Sérgio Pires). Fui até lá, mostrei: "olha, isso não é a gente que está fazendo, tem gente querendo jogar a empresa contra a gente, está aqui”. (SALGADO, 2010, informação oral)

Ao entrar no movimento paredista, Ângela Marinho, junto com os

repórteres do núcleo de Polícia (editoria em que trabalhava), levaram as

matérias mais trabalhadas, as chamadas matérias frias, para casa:

E umas das providências que nós tomamos foi levar as matérias prontas para casa, evitando que os fura-greve fechassem o jornal com as matérias que a gente tinha produzido anteriormente. (MARINHO, 2010, informação oral)

Ainda em relação aos desentendimentos que ocorreram na época,

Ângela Marinho conta a história do jornalista Ribamar Barbosa (In

memoriam), “um fura-greve”, que apontou uma arma para os colegas,

numa reação a um insulto vindo de um dos participantes. A categoria

tinha acordado com o governo para não haver policiamento ostensivo nos

piquetes e mobilizações. Então quando chamaram a Polícia para acalmar

a agitação, os policiais não foram até o local, na Praça da Imprensa11.

11 Havia reuniões e piqueniques na Praça da Imprensa, em frente ao jornal Diário do Nordeste. No segundo domingo que sucedeu o início da greve, aconteceu esse incidente.

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A paralisação de jornalistas aconteceu, especialmente, nas

redações do jornal O Povo e Diário do Nordeste. Até porque a

concentração de jornalistas nesses veículos era de pessoas que atuavam

frente ao movimento estudantil e movimentos sociais; ou tinham

minimamente uma formação política.

Ao final da greve, o saldo foi de certa forma positivo. De acordo

com Nilton Almeida, houve ganhos tanto no âmbito econômico quanto

político. Através dos relatos colhidos, foi observado que não houve

nenhuma agressão física por parte dos policiais, “mas havia uma guerra

psicológica, por exemplo, impedir que a gente colocasse faixas em frente

às empresas, a cada dia de greve a tensão aumentava mais”, comenta

Ronaldo Salgado. Ao final da greve, apesar do desgaste psicológico,

físico e mental, a categoria esteve mais integrada e fortalecida. Quem

conta é Carlos Alencar.

Mas assim, apesar da tensão, foi um momento de muita alegria, de confraternização da categoria. Muita gente se conheceu melhor, houve um fortalecimento de amizades, das pessoas, dos companheiros e até hoje essas amizades ainda permanecem. (ALENCAR, 2010, informação oral).

Fazendo uma rápida retrospectiva, Paulo Ernestro Serpa traz uma

explicação do por que a greve foi especialmente dos jornais impressos.

A greve era mais do jornal impresso porque nessa época de redemocratização, o jornal tinha muita força, ainda hoje tem, mas não tanto quanto tem a televisão. A questão de serem formadores de opinião, então os jornais impressos passaram a pautar a televisão, emissoras de rádio. Tinha isso também. Havia um sentimento de unidade da categoria, isso porque o Brasil todo estava assim. (SERPA, 2010, informação oral).

E os argumentos de Ronaldo Salgado confrontam:

Naquela época a campanha salarial, não havia essa divisão como há hoje, o pessoal de rádio tem uma campanha, de impresso outra, não. Era tudo junto; então ela foi deflagrada tentando pegar o conjunto da categoria. A adesão maior foi no meio impresso. (SALGADO, 2010, informação oral)

Após a greve, muitas foram as demissões de profissionais. Paulo

Serpa detalha um dos momentos em que foi anunciada algumas das

demissões.

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Ana Márcia Diógenes e Miguel Macedo, um casal de jornalistas, foi demitido do mesmo veículo para servir como exemplo. Nós sentimos na pele essa demissão, a gente fez até um apelo para eles não demitirem, mas eles não aceitaram. Os próprios colegas buscavam relocar os jornalistas. (SERPA, 2010, informação oral)

Numa espécie de „operação contrata e demite‟, os patrões faziam

assim: quem fosse demitido do jornal X não seria contratado pelo jornal Y.

E vice versa. Como exempla o jornalista Ronaldo Salgado:

Isso é oficioso, tem que comprovar, mas as empresas tinham o compromisso de não contratar aqueles que tivessem sido demitidos. Por exemplo, aquele jornalista do O Povo que tinha sido demitido, não seria contratado pelo Diário do Nordeste e vice-versa. (SALGADO, 2010, informação oral).

Para tanto, com as demissões quase massivas, muitos dos

jornalistas foram para as assessorias de imprensa de governo, longe das

redações. Ronaldo Salgado conta que após a greve o clima era de certa

forma hostil entre jornalistas grevistas e os „fura-greve‟. Logo após o

retorno das atividades, às vésperas do Natal, não havia espírito de união

no âmbito das redações entre grevistas e fura-greve. O jornalista acabou

saindo do Diário do Nordeste por falta de estímulo para continuar

trabalhando na presente situação.

O retorno da greve foi muito traumático porque as pessoas que furavam a greve se encontravam com os que tinham feito greve e a relação ficou pesada. E por exemplo no mês de dezembro, nas vésperas do natal, aquele espírito de confraternização não tinha mais. E depois disso não houve mais nenhuma greve. (SALGADO, 2010, informação oral).

2.2 – Falta de documentação

Vinte e dois anos separam a greve de 1988 à contemporaneidade.

Ao buscar informações documentadas para este trabalho tive algumas

surpresas. O Sindjorce não tem mais registro das atas de reuniões, de

arquivos da assessoria jurídica, então, para falar sobre a campanha

salarial e de valores reais da época, baseio-me nos relatos orais

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apresentados pelos grevistas. Assim, Nilton Almeida apenas pincela

algumas das reivindicações que havia na época:

Tinham varias questões como auxílio prévio, diárias de viagem, auxílio-creche até 5 anos. As demissões foram de mais ou menos 70 profissionais, e uma empresa não contratava um que tivesse sido demitido de outra empresa. Foi uma retaliação brutal, coisas que eu desconfio de hoje que sindicalistas ficam sentindo saudade de patrões que já morreram. (ALMEIDA, 2010, informação oral).

Nilton Almeida relembra os momentos tensos em que

particularmente viveu na greve. Para o jornalista, afora os episódios de

tentativa de agressão física, em que foram relatados pela jornalista

Ângela Marinho onde um colega apontou uma arma em direção às

pessoas que estavam no piquenique; a hora da negociação entre

patronato e empregado é a mais difícil.

Mas o elemento mais tenso é na mesa de negociação, onde os debates e argumentos são colocados e o negociador patronal que era o Eduardo Campos, um intelectual aqui da cidade, ele era um negociador bastante irônico, negociador muito consciente do papel dele. O negociador para nós, uma figura bastante. (sic).ele não era mais dono de jornal, isso estava no passado dele. Então era um negociador que não tinha autoridade para resolver determinadas questões, e na verdade a empresa delega alguém para fazer isso, mas um homem muito sagaz, experiente, ele complicava. As reuniões realmente eram muito tensas e extensas, havia muitas cobranças, contra argumentos. Aquele momento ali ele é único, ele é da mesa de negociação, por mais que você transmita as informações, os elementos de caráter psicológicos que estão envolvidos naquela mesa são complexos, desgastantes, é um lado contra o outro e lados bem definidos. (ALMEIDA, 2010, informação oral).

Então, a greve, com duração de quinze dias, de 1º a 15 de

dezembro, trouxe para a história de lutas da categoria um símbolo de

resistência e força sindical. Passados esses vinte e dois anos, não houve

mais nenhuma greve dos jornalistas em que a conjuntura e mobilização

se assemelhassem ao movimento paredista de 1988 na cidade de

Fortaleza.

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03 – ANÁLISE DA GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM

FORTALEZA

Em 1988 a cidade de Fortaleza tinha quatro jornais: O Povo, Diário

do Nordeste, O Estado e Tribuna do Ceará. Contudo, a participação mais

significativa de profissionais que estiveram à frente do movimento

paredista, aqui mencionado, mostrou-se nas redações dos jornais O Povo

e Diário do Nordeste. Jornalistas jovens e mais experientes de Fortaleza

tomaram como objetivo urgente a defesa da categoria e luta por melhores

condições de emprego.

3.1 – FATORES QUE LEVARAM À GREVE

Ao falar sobre o início da greve, dois dos cinco jornalistas

entrevistados fizeram retrospectivas semelhantes. Foi preciso mencionar

a curta greve, com duração de 3 dias, que houve em 1985. Para

contextualizar, os jornalistas Nilton Almeida e Ronaldo Salgado,

mostraram as falhas e brechas que a greve de 1985 deixou.

Como numa continuação do que havia restado de 1985, os

jornalistas puderam trabalhar intensamente com mobilização e

conscientização dos problemas enfrentados pela categoria. Com mais

unidade e compromisso, puderam levar a greve de forma mais intensa.

O cenário político e econômico contribuía para o incentivo à greve.

À época o Brasil passava por um momento de intensas greves, saído do

golpe militar. As greves foram lançadas através do espírito de libertação,

de redemocratização política. Muitos ainda estavam com as feridas do

pós - golpe militar, da repressão, a maioria havia participado do

movimento estudantil.

A economia estava super inflacionada. Iram Jácome Rodrigues12

traz em seu artigo, A nova ordem Sindical, um paralelo da atuação

sindical nos anos 1970, 1980 e 1990.

12

Professor do Departamento de Economia da Universidade de São Paulo e autor do livro Sindicalismo e Política: a trajetória da CUT, São Paulo, Scritta/Fapesp, 1997.

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Nos anos setenta e oitenta, em larga medida, as pautas sindicais tinham como primazia a luta pela reposição salarial, em função da inflação alta durante quase todo esse período. Já nos anos 90 ocorreu uma mudança radical no que diz respeito às demandas do sindicalismo. Em função de todas essas transformações, a agenda sindical se voltou para o interior da empresa, discutindo temas mais diretamente relacionados à problemática do trabalho, seja a veiculada à organização e gestão do trabalho, sejam as questões ligadas à remuneração variável. (RODRIGUES,1998, pags. 181 e 182)

Outro fator decisivo para a ascensão da greve foi os profissionais

terem saído de uma única universidade, Universidade Federal do Ceará

(UFC). À época só existia o Curso de Comunicação Social lá, e ainda

houve participação de estudantes na mobilização. Em relação aos

estudantes, Nilton Almeida comenta:

Tinham alguns, que também já trabalhavam nas redações, foi uma força muito importante. Eles tinham uma capacidade de se reunir, de ir na casa dos colegas, convencer, argumentar. Havia toda essa dinâmica. A greve foi um movimento belíssimo. (ALMEIDA, 2010, informação oral).

3.2 – FERRAMENTAS DE MOBILIZAÇÃO

Ao que tudo indica, pelos relatos, houve um bom apoio financeiro.

Os jornalistas conseguiam arrecadar dinheiro para as principais despesas

como material de papelaria, comida (pois durante o período da greve,

todos os dias aconteciam assembleias e reuniões para avaliar o

movimento).

A amizade dos jornalistas, com alguns empresários de outros ramos, fez com que tivéssemos um "fundo de greve", usávamos o dinheiro para comprar comida, e quem podia usava o seu carro para levar informação, as pessoas, tinha também a questão do voluntarismo. (SERPA, 2010, informação oral)

O Sindjorce tem em arquivo um jornal chamado Em Pauta de onde

foram retiradas as fotografias abaixo. Nelas, foram registrados os

momentos em que os jornalistas estiveram reunidos em passeatas,

assembleias e reuniões nos 15 dias de greve:

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Os autores Cláudia Santiago e Vito Giannotti (1997) trazem uma

afirmação a cerca das ferramentas utilizadas pelos sindicatos no Brasil. A

princípio, colocam em xeque que a comunicação sindical, muitas vezes,

não precisa ter custo elevado para comunicar bem. Os autores reforçam a

ideia quando afirmam:

Melhorar a comunicação dos trabalhadores. E isso, muitas vezes, sem necessitar de grandes investimentos além da disposição de mudar. Melhorar e aumentar o volume da comunicação sindical. Aumentar a consciência entre os trabalhadores, pois o outro lado- o dos patrões- se comunica muito bem. Para isso é necessário que do lado dos trabalhadores haja disposição de mudar, de melhorar, de ter uma comunicação à altura do desafio que se apresenta. (SANTIAGO; GIANNOTTI; 1997: p. 16)

Não se pode negar que houve, por parte dos profissionais

envolvidos na causa, um trabalho muito próximo à categoria, intenso na

comunicação verbal e de nítida cumplicidade. Muitos dos que sabiam da

real necessidade da greve não desistiram porque recebiam alertas e

ameaças de perder o emprego.

Os instrumentos de comunicação usados foram basicamente:

mega-fones, panfletos, cartazes, faixas e carros de som. Mas

principalmente a conversa presencial foi o principal artifício utilizado como

forma de mobilização. A pesquisa feita para este trabalho sobre a

abordagem dos jornais locais mostrou que os veículos pouco

mencionaram a greve, mas o jornal O Povo veio com uma defesa, “um

direito de resposta” sobre a greve. Uma das edições, a do dia 7 de

dezembro, trouxe o editorial falando do movimento paredista. Escreveu

aos leitores sobre o livre direito dos profissionais de participarem da greve

e ainda, afirmou que havia um diálogo franco entre a redação e direção

do jornal. Trecho13:

A distância zero entre a direção da empresa e a redação tem propiciado um grau tal de identidade, de liberdade e de respeitosa cordialidade e diálogo franco que, no que se refere à notícia e opinião inexistem hierarquiais.

13 Ver anexo na página 41

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Ao fazer uma breve comparação de como a imprensa trata dos

assuntos diretamente relacionados aos profissionais da comunicação e ao

contexto político e histórico que permeia, pode-se dizer que não foi

lançada ao debate de forma ampla a derrubada da obrigatoriedade do

diploma.

A notícia da greve de 1988 veio de forma tímida nos jornais locais;

o movimento não conseguiu paralisar totalmente as redações, mas deixou

alguns „incômodos‟. Os jornais saíram sem caderno, com colagens de

notícias nacionais e internacionais, bem menores do que o habitual.

Contudo, na edição do dia 2 de dezembro, em uma das manchetes, o

jornal O Povo informou aos leitores o motivo do desfalque no periódico.

Trecho14: “Em conseqüência do movimento paredista, O POVO, circula

hoje sem o Segundo Caderno e com pequenas modificações na estrutura

do Primeiro Caderno”.

A forma como os grevistas se comunicaram com a categoria pode

ser interpretada como emergencial e incisiva. Deve-se lembrar também

das manifestações feitas em praça pública com mais intensidade nos

centro de Fortaleza, sinais e locais de maior movimentação dos cidadãos

fortalezenses.

A direção do Sindjorce à época era composta por profissionais de

atuação firme e militância política significativa na história de lutas em

Fortaleza. O jornalista Miguel Macedo15 ainda comenta sobre a atuação

ideal de uma diretoria de sindicato no momento de uma mesa de

negociação: “A direção tem que ser estrategista, ter sangue frio, sangue

de barata. Deve estar bem preparada e saber quando ataca ou recua”.

(MACEDO, 2009).

Atores do movimento estudantil e de outros movimentos sociais, os

representantes partiram para o confronto, mas de forma pacífica no que

se refere às agressões físicas.

14

Ver anexo na página 42 15 À época era editor do Segundo Caderno do Jornal O Povo. Atualmente é professor do

curso de Comunicação Social da Faculdade Sete de Setembro (FA7) e trabalha na Fundação Konrad Adenauer no Brasil/Fortaleza. Entrevista realizada pela autora deste trabalho, no primeiro semestre do ano de 2009.

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O sindicalismo dos anos 1980 no Brasil teve essa característica de

conflito, de embate com o patronato. É como explica o autor Iram Jácome

Rodrigues (1998, p 184):

Essa situação começou a se modificar nos anos 90. Oriundos de uma tradição extremamente conflitiva, tanto empregados quanto empregadores começaram a modificar sua forma de atuação. Esse processo é mais visível no setor privado. Múltiplos aspectos foram responsáveis por esta dinâmica. É necessário, no entanto, levar em conta um dado extremamente significativo em todo esse novo sistema de relações de trabalho que começa a se desenhar nesta região, uma das mais industrializadas do País: o processo de reestruturação do trabalho e da produção que vinha ocorrendo nos países centrais desde a segunda metade dos anos setenta e, de forma mais ampla, durante a década de 80.

Contudo, apesar das artimanhas usadas pelos grevistas, na

tentativa de driblar o patronato, com artifícios para comprometer a saída

dos jornais, não houve, propriamente, violência física ou verbal por parte

do patronato nem da categoria. Reforça Paulo Serpa (2010, informação

oral):

Ninguém chegava nos jornais e xingava, nem teve polícia, nem apedrejamento, nada disso. Não houve ódio, de querer ferir os patrões. Houve piquete, convencer os colegas não ir trabalhar, mas tinha gente que ia mesmo assim.

Para tanto, o que houve foi grande pressão psicológica e

“demissão estratégica de profissionais”, como pontua Paulo Serpa. O

jornalista Miguel Macedo, à época editor do Segundo Caderno do jornal O

Povo, estava de férias e quando teve que voltar para trabalhar, já estava

acontecendo a greve. Avisou ao jornal que não retornaria porque estava

de greve, ele e a mulher, Ana Márcia Diógenes; à época editora do

caderno Cidades do jornal O Povo.

3.3 – ANÁLISES DAS ESTRATÉGIAS DE MOBILIZAÇÃO E

COMUNICAÇÃO

A comunicação como ferramenta de mobilização tem se fortalecido

no Brasil especialmente a partir dos anos 1990. Segundo os estudos do

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ex-metalúrgico Giannotti (1998) durante muitos anos os veículos de

comunicação eram produzidos de forma improvisada, amadora e

descontínua. Somente depois da Constituição de 1988 e da

regulamentação de sindicatos no Brasil é que a comunicação começa a

ser feita de forma profissionalizada.

As informações colhidas por meio de entrevistas com os jornalistas

grevistas mostram que a maioria dos profissionais estavam sensibilizados

com a causa e, ainda, não se precisou de muito “convite” para às

mobilizações, pelas palavras de Ângela Marinho (2010).

Para o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE),

Luis Momesso (1994), a dinâmica da comunicação sindical está ligada à

prática sindical. Contudo a prática para funcionar precisa de estratégias

da ação sindical, concepções políticas. Então a greve, teve como

principais atuantes, pessoas que tinham uma mínima ligação com

movimento social e entendimento do processo político à época da greve.

Vale lembrar que uma das principais estratégias dos profissionais

foi a conversa presencial com a categoria. Também havia o contato diário

dos jornalistas na sede do Sindjorce, para avaliar a greve e propor

melhorias ao movimento; idas à casa dos jornalistas, que ainda não

tinham aderido à greve, no sentido de convencer a não ir trabalhar e

participar das manifestações. Mas o fato da maioria dos jornalistas serem

oriundos da Universidade Federal do Ceará (UFC), única universidade

que ofertava o curso de jornalismo à época, foi bem significativo. Pode-se

entender que havia naquele momento uma unicidade maior entre os

participantes e também o fato de muitos terem ligação desde movimento

estudantil contribuiu para a força do movimento.

Sobre a comunicação do sindicato com a categoria, a professora

Maria Luiza Cardinale Baptista (2004), tem a análise:

[...] ajudaria se cada entidade tivesse disponível informações o mais abrangentes possível desse receptor. Depois, orientada por essas informações, poderia definir o composto de veículos, o „mix‟ de mídias a serem utilizadas. Dependendo dessas informações é que se pode pensar quais são os meios mais indicados para se chegar até estes receptores, para encontrá-los, para se conseguir estabelecer uma comunicação com eles. (BAPTISTA, 2004, p 354)

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Piquetes, passeatas e piqueniques em frente aos jornais e praças

públicas foram também estratégias de mobilização usadas para chamar a

atenção da população e dos diretores de empresas. Para não causar

nenhum tipo de constrangimento, os profissionais se dirigiam às redações

em que não trabalhavam. Quanto aos piquetes, em que os jornalistas

levavam suas famílias, Ronaldo Salgado aponta: “Era uma estratégia

usada pelo Sindicato para justamente contornar aquela história de quem

faz greve é baderneiro. Não era”. (SALGADO, 2010). As atividades de

mobilização acima citadas necessitam de certa disposição,

especialmente, física.

Trata-se, assim, de uma série de mobilizações pensadas não só no

âmbito das redações de jornais como também em espaços que

possibilitaram um fluxo considerável de pessoas. As manifestações,

intensas; foram reformuladas em reuniões e encontros entre os grevistas.

Ainda com base nos estudos de Maria Baptista (2004) ela comenta a

relação entre o sindicato com a sociedade:

O encontro comunicacional da entidade com a sociedade pode ser buscado de várias formas. Neste caso, trata-se de utilizar dispositivos que propiciem a divulgação de atividades e concepções da categoria para o conjunto da sociedade. (BAPTISTA, 2004, p 354)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da pesquisa e análise qualitativa da greve dos jornalistas

de 1988 em Fortaleza, consideramos este trabalho um documento

histórico para a categoria de jornalistas do estado do Ceará,

especificamente, de Fortaleza e para o Sindjorce.

Apesar de ter sido um movimento importante em defesa da

categoria, lamentamos a perda dos arquivos, como atas de reuniões e

demissões dos jornalistas. Por isso, não pudemos mencionar algumas

questões como acordo salarial, número de sindicalizados à época e, com

precisão, falar da quantidade de jornalistas demitidos após a greve. Mas

um trecho do jornal Em pauta, da edição em comemoração aos 55 anos

de existência do Sindjorce, traz a informação:

A paralisação levou à demissão em torno de 70 profissionais que aderiram ao movimento. O jornalista Agostinho Gósson era um dos líderes grevistas, foi eleito presidente do sindicato para a gestão seguinte e conseguiu reempregar em assessorias de imprensa grande parte dos profissionais afastados. (2008)

O movimento desestruturou as principais redações dos jornais

locais e não houve como as empresas deixarem de noticiar, mesmo que

sucintamente, a notícia da greve. Com base no jornal Em pauta, na

edição de 50 anos do Sindjorce, Nilton Almeida afirma que o principal

objetivo da greve foi paralisar totalmente as redações dos jornais, não

deixar que os jornais circulassem na cidade. Mas “de qualquer forma os

jornais tiveram bastante dificuldade para rodar, apelando para esquemas

alternativos de trabalho”. (ALMEIDA, 2003) Podemos então, relembrar

algumas das “saídas” utilizadas pelos veículos.

Em meio à greve, o jornal O Povo não tinha gráficos suficientes,

então a direção acordou que os periódicos seriam impressos pela Tribuna

do Ceará. Tanto o Diário do Nordeste como o jornal O Povo saíram com

páginas reduzidas, em algumas edições prevaleciam as notícias

internacionais e nacionais. Pela ausência de profissionais na redação, os

que não estavam na greve utilizaram colagens de matérias de revistas e

telex.

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Trazendo para a atualidade, hoje, os veículos locais pouco

escrevem ou reagem sobre problemas da categoria. A exemplo, tivemos a

derrubada da obrigatoriedade do diploma, em que pouco se noticiou

sobre o assunto.

Faz-se necessário dizer que a greve tornou-se possível

principalmente pelo nível de comprometimento político, ideológico e

sindical dos atuantes. Também pela unicidade do grupo de profissionais e

estudantes de jornalismo, concentrados e saídos da Universidade Federal

do Ceará. A ausência de telefones celulares, internet e computador foram

fatores contribuintes para a maior proximidade entre os grevistas. Durante

a greve se encontravam em diversos espaços, criando assim um espírito

de grupo, de coletivo. Já nos dias atuais, fica mais difícil estabelecer esse

compromisso de reuniões freqüentes. Hoje, Fortaleza mostra-se bem

diferente de vinte e dois anos atrás. Percebe-se o trânsito da cidade de

maneira diferente, as distâncias dos locais, os acessos.

Ao final dos anos 1980, a ausência da tecnologia avançada, da

internet, pode ter sido um fator contribuinte para a formação de um grupo

mais unido e cúmplice. A informação circulava através de conversas

presenciais, o diálogo era estabelecido em locais de trabalho e locais

informais como bares e restaurantes. É possível se firmar uma ideia de

que a greve foi possível por dois fatores em especial: momento político e

proximidade entre os participantes.

O estudo abre possibilidades para mais pesquisas em torno do

assunto, da história até aqui contada.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

SÁ, Adísia. Biografia de um sindicato. Fortaleza: Edições UFC, 1981.

SÁ, Adísia. O jornalista brasileiro: Federação Nacional dos

Jornalistas Profissionais, de 1946 a 1999. 2ed. Fortaleza: Edições

Fundação Demócrito Rocha, 1999.

PERUZZO, Cicília M.K. (Org.). Vozes cidadãs: aspectos teóricos e

análises de experiências de comunicação popular e sindical na América

latina. São Paulo: Angellara, 2004. In: BAPTISTA, Maria. Comunicação

dos sindicatos: Pai metáfora da lei.

SANTIAGO, Cláudia. GIANNOTTI, Vito. Comunicação sindical: falando

para milhões. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997.

MARX, Karl. ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido Comunista. 1d.

São Paulo: Expressão Popular, 2008.

NETO, Antônio. CARVALHO, Ricardo. (Org). Sindicalismo e

Negociação Coletiva nos anos 90. Belo Horizonte, 1998. In:

RODRIGUES, Iram. A nova agenda sindical. 1998

RODRIGUES, Leôncio. Destino do sindicalismo. São Paulo: Editora da

Universidade de São Paulo: Fapesp, 1999.

Site:

NÚCLEO PIRATININGA DE COMUNICAÇÃO. Sindicatos e centrais

sindicais no Brasil. Potro Alegre: Sintrajufe. S/d. Disponível em:

<http://sintrajufe.tempsite.ws/noticias/anexos/cartilha.pdf>. Acessado em

7 de junho de 2010.

Mestrado/doutorado:

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MOMESSO, Luis. Comunicação Sindical: limites, contradições e

perspectivas. 160 f. Tese de doutorado em Ciências da Comunicação,

Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA-

USP, São Paulo, 1994.

DUTRA, Joana. Luta sindical e comunicação: um estudo de caso

sobre a comunicação desenvolvida pelo Sindicato dos

Trabalhadores no Serviço Público Federal do Estado da Bahia. 151 f.

Dissertação de mestrado em Comunicação e Cultura Contemporâneas da

Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, 2003.

Entrevistas:

MARINHO, Ângela. Depoimento oral. Colhido em 4 de março de 2010.

SALGADO, Ronaldo. Depoimento oral. Colhido em 11 de março de

2010.

ALENCAR, Carlos. Depoimento oral. Colhido em 10 de março de 2010.

SERPA, Paulo. Depoimento oral. Colhido em 10 de março de 2010.

ALMEIDA, Nilton. Depoimento oral. Colhido em 16 de março de 2010.

MACEDO, Miguel. Depoimento oral. Colhido em junho de 2009

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ANEXO 01: EDIÇÃO DO DIA 7 DE DEZEMBRO DE 1988

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ANEXO 02: EDIÇÃO DO DIA 2 DE DEZEMBRO DE 1988

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ANEXO 03: EDIÇÃO DO DIA 16 DE DEZEMBRO DE 1988

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APÊNDICE:

Entrevista realizada no dia 16 de março de 2010 com o jornalista Nilton Almeida, atual assessor de imprensa do Banco do Nordeste (BNB), à época, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Ceará (Sindjorce).

TRANSCRIÇÃO LITERAL:

Autora da monografia: Como foi o início dessa greve como estava a

situação do Sindicato à época?

Nilton Almeida: Essa greve ela foi decretada quando estava à frente do

sindicato uma diretoria que tinha assumido em 1986 que era um grupo

correlativo, de pensamentos muito parecidos, uma diretoria que vinha no

movimento estudantil, da reabertura do centro acadêmico da

comunicação da UFC. Então essas pessoas tinham assim uma integração

muito forte, eram pessoas que estavam no mercado de trabalho,

vivenciando as dificuldades, os baixos salários, jornadas duplas de

trabalho, todas essas questão que foram decisivas para a deflagração do

movimento paredista. Então nesse período é bom e destacar que a gente

havia saído do curso de comunicação, no fim da ditadura. Particularmente

eu não concordo com essa coisa de fim da ditadura, não começa nem

termina de um dia para o outro. Mas há um certo consenso de que

terminou em 1985 então havia um ar maior de democracia, desejo de

mobilização muito forte, tudo isso já influenciado pelas greves dos

metalúrgicos em 1978, São Paulo, a ditadura começou realmente a cair

com aquelas mobilizações onde o Lula estava presente. Então há um

contexto de retorno à democracia, de retomada mais forte do movimento

sindical, pelo menos aqui pelos nossos lados, e essa integração de uma

diretoria que entrou com muita vontade de trabalhar com muita unidade

dentro da categoria, a diretoria trabalhou muito nesse período,três anos,

entrou em junho de 1986. Eu particularmente andava muito nas redações,

eu era do Diário do Nordeste, tinha saído para assumir a presidência do

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sindicato. Eu era da editoria de Cidades. Então eu era um diretor do

sindicato que estava no local de trabalho.

A: Sabia realmente o que estava acontecendo nas redações..

N.A: Eu tinha uma boa visão dos problemas da categoria, e também tem

a vantagem de eu ter participado do sindicato desde o movimento

estudantil. Talvez seja o exemplar mais raro de estudante que teve uma

freqüência sistemática. O que me permitiu de caráter mais orgânicos da

categoria, problemas que se repetiam do ponto de vista nacional.

A: Do ponto de vista de mobilização, como vocês faziam? Como era a

mobilização?

A: Essa coisa de estar sempre na redação, levantando os problemas

pedindo sugestões, ouvindo os trabalhadores, os colegas da profissão,

mostrar para eles o sindicato dentro das redações, saindo das quatro

paredes do sindicato. E isso fazia parte da mobilização, da

responsabilidade do dirigente sindical. Você tem que estar lá no local do

trabalho e realmente tentar criar manter o diálogo, reforçar os laços e

assim você criar um corpo orgânico com força. Além das visitas às

redações, havia os boletins, certa periodicidade dos boletins, colocando

os problemas em cada edição. E o certo é que a categoria ganhando mal

sempre trabalhando muito o sindicato com respeitabilidade, a diretoria

com a confiança da categoria e o próprio elã da categoria em fazer esse

teste com esse movimento, tentar mostrar que era necessário mudar

aquela realidade...não foi uma greve de cima para baixo, a greve não

acontece porque um dirigente quer, porque alguns querem, ela ocorre em

função de mobilização planejada, esquematizada, de um sistema de

comunicação mais no olho a olho de uma pessoa. O que acaba

fortalecendo uma consciência do coletivo. Se você vai conhecendo as

pessoas, sabendo dos problemas, porque a categoria (jornalista) é

relativamente pequena, com três redações, Diário do Nordeste, O Povo,

Tribuna do Ceará, Canal 10, ou seja um núcleo bem concentrado, você

conhece todo mundo pelo nome, quem é casado, sabe quantos filhos

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tem, onde é que moram...eu creio que esses elementos ajudaram muito a

dar força ao sindicato naquele momento. E evidentemente tem a questão

conjuntural, havia o contexto que o sindicato na época estava retomando,

estava confuso, havia muita greve no país...

A: Era um sentimento em todo o país?

N.A: É...um milagre que aconteceu aqui, de ter feito uma greve de 15 dias

com uma participação forte de 95%. A rigor quem não participou da greve

eram as pessoas que tinham cargo de confiança, mas esmagadora

maioria não estava trabalhando. Os que furaram diziam; motivo 1: não

quero correr o risco de perder meu emprego, 2: a greve não é justa, não

deve acontecer, enfim, então entra os motivos de caráter ideológicos.

Então naquele momento havia uma consciência do que é ser jornalista,

das dificuldades pelas quais passavam e da possibilidade de usar essa

capacidade de mobilização que nós tínhamos para mostrar uma série de

reivindicações daquela pauta, daquele período. Então um trabalho

permanente, sem tréguas, sem descanso, tanto é que a greve não existiu

por si só nem pela vontade de um ou de outro, muito menos minha.

Porque a principal característica de um presidente sindical é saber ouvir.

Esse trabalho que começou antes, muito cedo, é como se ele tivesse

desaguado naquele 1988, na campanha salarial de 1988.

A: Sobre a greve de 1985 que houve também aqui, que foram três dias,

em relação a de 1988, foi uma continuação?

N.A: Talvez uma continuação sim, mas vamos falar em termos de

experiência. Os jornalistas cearenses tiveram essa experiência como

tiveram muitos anos atrás, mas a experiência mais recente que estava na

cabeça das pessoas era a de 1985. Uma greve rápida, de três dias, mas

que deixou lições. Então quem estava a frente do sindicato, coordenando

as mobilizações tinha que levar isso em conta. Tanto que a de 1988 foi

uma greve de confronto muito grande com o patronato, dirigentes de

jornal puxaram arma, teve maior tempo de duração, além do fato de que o

trabalho organizado com os gráficos esse ano funcionou mais

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eficientemente. Um trabalho de convencimento particular, pessoal,

individual. Chamar a atenção das pessoas para o movimento, era uma

oportunidade que tínhamos de mostrar a classe trabalhadora, porque s

trabalhadores que estão no limbo de uma organização que beneficia a

estrutura empresarial , porque os trabalhadores são celetistas, ou seja,

podem ser demitidos a qualquer hora. Então a correlação de forças ela

pende para a empresa, você ter a capacidade de ir para esse

enfrentamento, realmente é uma determinação, uma decisão política,

ideológica. Eu acredito que em 1988, quando a greve foi decretada os

jornalistas vinham de uma interpretação da greve de 1985. Houve um

cuidado de não decretar a greve por um pequeno grupo..

A: A greve de 1988 pode-se dizer que foi planejada?

N.A: Ela não foi de todo planejada. Não estávamos há dois anos ou mais

planejando isso. Dedicou-se ao trabalho, de organização e mobilização.

Então isso faz parte do processo de planejamento. Uma prova categórica

é que as últimas assembleias até a decretação da greve, elas eram

realizadas fora do sindicato, nas ruas, a assembleia que decretou a

greve...a rua Joaquim Sá, estava tomada pelos jornalistas ali. Alguns até

poderia estar em dúvida mas estavam lá. Não há como fazer greve sem

adesão, porque acaba sendo um suicídio. Havia uma rede de jovens

jornalistas...

A: A participação dos estudantes foi significativa?

N.A: Tinham alguns, que também já trabalhavam nas redações, foi uma

força muito importante. Eles tinham uma capacidade de se reunir, de ir na

casa dos colegas, convencer, argumentar. Havia toda essa dinâmica. A

greve foi um movimento belíssimo. Hoje, depois de passar mais de 21

anos, foi um movimento extraordinário, de coragem, desprendimento,

enfrentamento, todo mundo jogando, a prova foi que muita gente foi

demitida. Particularmente o jornal O Povo, reagiu violentamente com a

demissão. A violência contra o trabalhador não pode ser pior do que tirá-

lo do seu sustento, sua capacidade de sobreviver. Essa violência é pior

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do que a dos dirigentes da Tribuna que saíram com revolver na mão para

enfrentar os piquetes. A minha autoridade, do ponto de vista da

consciência do papel de dirigente sindical, de trabalhador, é que aquilo ali

foi um movimento decidido pela classe, então, assumamos a

responsabilidade.

A: Qual foi o saldo da greve?

N.A: Houve conquistas, houve conquistas. Atas do sindicato, jornal em

comemoração. As repercussões foram muitas, houve ganho econômico,

ganho político. Aparato financeiro era nosso. Eu particularmente não pedi

dinheiro a ninguém, nós tínhamos o nosso dinheiro do sindicato. A minha

preocupação era de manter a vontade de lutar. Uma greve longa há

pressões, nos últimos dias foi entrando no desgaste. E veio o medo, o

medo né, que hoje o maior problema do trabalhador é de perder o

emprego. As pessoas não reagem, se acomodam, não vão ao sindicato,

que é vulnerável, que esta nas mãos da empresa, que demitem a

qualquer hora, e pronto acabou. Então houve conquistas, principalmente

de caráter político e econômico, a de Carter político talvez seja a mais

essencial porque a greve deu lições que parece que não foram atendidas

mais a frente. Fazer uma greve em jornal numa época tecnologizada num

ramo da economia, muito automatizado é muito complexo. Então a

complexidade daquele período era uma, hoje é mais grave. Porque os

jornais saíram, com matérias de agencia, hoje é mais grave, porque a

internet, hoje um editor faz tudo se quiser. Já acabaram revisor,

paginador, e a tendência é cada vez menos pessoas fazerem mais

tarefas. Naquele momento a greve já deixou esse sinal, é muito difícil

você enfrentar o patronato, talvez a maior vitória seria que o jornal não

saísse de jeito nenhum, o assinante não recebe nem o leitor vai encontrar

na banca. A televisão nem se fala, porque coloca filme, não tem como. A

TV participou de certa forma. Agora outra sinalização é que a estrutura

sindical é madrasta com o trabalhador, que você tem trabalhadores

jornalistas, gráficos, publicidade, representados por diferentes entidades é

um elemento complicador a mais para o êxito de uma greve. No jornal o

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jornalista é substituído pelo jornalista de agência, se o jornalista está mais

longe dos gráficos, se a publicidade não entra; essa estrutura não é

possível mais achar que temos condição de fazer um movimento

paredista apenas com os jornalistas. É necessário mudar a estrutura

sindical. As amarras legais hoje são mais complexas ainda, você tem que

avisar à empresa que vai entrar em greve, criando assim uma camisa de

força para o trabalhador. A nossa greve não foi considerada ilegal, essa

legislação não existia ainda eu acho, veio depois. Ou trabalhador rompe

com esses mecanismos de controle ou ele não vai fazer nada. Os

trabalhadores da área de comunicação já têm uma bagagem, experiência,

de que não é possível agir sozinho. E essa legislação que reparte os

trabalhadores que não permite um sindicato único, já está claro que não é

possível, quem pensar assim vai errar. Porque as várias greves que os

jornalistas fizeram, não só aqui no Ceará, mas em outros estados, houve

em 1988 até 1990 as greves pipocaram no país.

A: A campanha salarial existia, piso nacional.

N.A: A gente não tinha como propor, mas tinham varias questões como

auxílio prévio, diárias de viagem, auxílio-creche até 5 anos. As demissões

foram de mais ou menos 70, e uma empresa não contratava um que

tivesse sido demitido de outra empresa. Foi uma retaliação brutal, coisas

que eu desconfio de hoje que sindicalistas ficam sentindo saudade de

patrões que já morreram.

A: Como foi o momento em que Demócrito Dummam apareceu no

Sindijorce em meio à greve?

N.A: Ele Foi recebido por uma questão de educação, mas foi uma coisa

constrangedora, inadequada. Era um empresário que ia para uma

assembléia de trabalhador. Já pensou um trabalhador dentro de uma

reunião da FIEC. Mas nós como trabalhadores somos educados... mas

tiveram outras agressões, o dirigente da Tribuna do Ceará Chico Alves

puxou um revólver em plena greve, a pessoa perde a noção e acaba

cometendo esse tipo. Mas o elemento mais tenso é na mesa de

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negociação, onde os debates e argumentos são colocados e o negociador

patronal que era o Eduardo Campos, um intelectual aqui da cidade, ele

era um negociador bastante irônico, negociador muito consciente do

papel dele. O negociador para nós, uma figura bastante..ele não era mais

dono de jornal, isso estava no passado dele. Então era um negociador

que não tinha autoridade para resolver determinadas questões, e na

verdade a empresa delega alguém para fazer isso, mas um homem muito

sagaz, experiente, ele complicava. As reuniões realmente eram muito

tensas e extensas, havia muitas cobranças, contra argumentos. Aquele

momento ali ele é único, ele é da mesa de negociação, por mais que você

transmita as informações....os elementos de caráter psicológicos que

estão envolvidos naquela mesa são complexos, desgastante, é um lado

contra o outro e lados bem definidos. Claro que não dá para ser ingênuo

que uma mesa que tenha empregado e patrão vai ser uma reunião

harmônica, mas por conta desses elementos, a figura do próprio

negociador, as artimanhas, mentiras casca de banana, tudo isso leva a

um universo absolutamente...você tem que chegar para a assembléia e

dizer: os patrões aceitam isso e isso.

A: As palavras vão se perdendo, não tem mais o mesmo sentido?

N.A: Se tornam muito duras..agora tinham momentos absolutamente de

êxtase.

A: Tinha alguém fazendo registro dessas negociações?

N.A: Ficavam com a secretária geral, ela fazia as atas. Talvez ela não

lembre..Mas havia momentos de êxtase, grupos de jornalistas irem para a

Praça do Ferreira com megafone falar da greve, distribuir panfleto. „olha

os jornalistas estão em greve‟, „mas o jornal está saindo‟, mas está saindo

capenga, não está saindo coluna tal...aquela coisa de mostrar que o

jornalista profissional, lutava tanto quanto o metalúrgico. Nós tivemos

muito apoio, de políticos que estavam no campo da esquerda, foi um

momento de confronto. Você ser jornalista e fazer uma greve no Ceará,

Page 50: A GREVE DE 1988 DOS JORNALISTAS EM FORTALEZA E AS ... · prontamente aceitou o meu convite para orientação. Aos jornalistas Ângela Marinho, Carlos Alberto Alencar, Ronaldo Salgado,

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você é demitido, as opções de trabalho são poucas, pouquíssimas. Quais

são? Jornal? Diário do Nordeste, Jornal O Povo, jornal O Estado.