a geologia no litoral parte i: do tejo à lagoa de albufeira

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Geologia no Verão 2 1 A Geologia no Litoral – _______________________________________________________________ AGÊNCIA CIÊNCIA VIVA DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA Centro de Geologia FACULDADE DE CIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA Anabela Cruces, Isabel Lopes, Maria Conceição Freitas & César Andrade A Geologia no Litoral Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira 2002 1. Guia de Excursão 002 – Guia de Excursão Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira Geologia no Verão

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Geologia no Verão 2 1 A Geologia no Litoral –_______________________________________________________________

A Geologia no Litoral Parte I:

Do Tejo à Lagoa de Albufeira

2002

1. Guia de Excursão

002 – Guia de Excursão Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira Geologia no Verão

AGÊNCIA CIÊNCIA VIVA

DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA

Centro de Geologia

FACULDADE DE CIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE DE LISBOA

Anabela Cruces, Isabel Lopes, Maria Conceição Freitas & César Andrade

Geologia no Verão 2002 – Guia de Excursão 2 ra

_

I.

Anabela Cruces1, Isabel Lopes1, Maria Conceição Freitas2, César Andrade2 1 Monitor, Mestre em Geologia Económica e Aplicada

([email protected]; [email protected]) 2 Prof. Auxiliar e Investigador, Departamento e Centro de Geologia da

Universidade de Lisboa ([email protected]; [email protected])

A Geologia no Litoral Parte I:

Do Tejo à Lagoa de Albufeira

2002

Guia de Excursão

Geologia no Verão

A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufei______________________________________________________________

Geologia no Verão 2002 – Guia de Excursão 3 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

ÍNDICE

I. INTRODUÇÃO………………………………………………………..……………………………...… 2

II. ITINERÁRIO…………………….………………………………………..…………………………..…. 4

III. PARAGENS…………………………………………………………………………..…………..………. 5

1. LISBOA……………………………………………………………………………….…………………. 5

2. BAÍA DO SEIXAL………………………………………………………..………………………. 6

3. SAPAL DE CORROIOS (Moinho de maré de Corroios)…………………….…………………………………………. 10

4. RESTINGA DO ALFEITE……………………………………………………..…..……… 14

5. ARRIBA FÓSSIL DA COSTA DA CAPARICA (Miradouro dos Capuchos)…………………………………………………………………..…. 16

6. FONTE DA TELHA……………………………………………………………………………… 20

7. LAGOA DE ALBUFEIRA……………………………………….…………………………. 21

IV. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……….…………..……………………………………… 26

NOTAS………………………………………………………………………………………………………….….. 28

ANEXOS Anexo I - Tabela Crono-estratigráfica…………………………….………………... 31

Anexo II - Dimensões dos detritos sedimentares………………………... 32

Geologia no Verão 2002 – Guia de Excursão 4 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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I. INTRODUÇÃO

A Península de Setúbal é enquadrada por dois grandes estuários: o do Tejo, a Norte, e o do Sado, a Sul (Fig. 1A).

O litoral desta Península evidencia acentuada assimetria morfológica, em virtude dos diferentes regimes de agitação marítima a que está exposto e da natureza e estrutura do substrato rochoso que o suporta.

Na fachada ocidental, o Cabo Raso, a Norte, e o Espichel, a Sul, limitam um arco litoral de grande raio de curvatura formando a enseada Caparica - Espichel, ampla, de contorno plano suave, definida essencialmente em rochas detríticas brandas. O litoral meridional contrasta pelo vigor do relevo da Serra da Arrábida, constituída essencialmente por rochas calcárias fortemente dobradas e pela escassez de praias, que se restringem a pequenas enseadas encastradas na costa alcantilada (ex: Portinho da Arrábida, Figueirinha).

Cerca de dois terços deste troço costeiro (25km) são constituídos por litoral de acumulação (anamórfico) formando uma costa baixa, arenosa e contínua até à Praia das Bicas, enquanto o terço Sul do arco (11km) é rochoso contendo algumas pequenas praias encastradas, constituíndo essencialmente um litoral de erosão (catamórfico).

Do ponto vista geológico e geomorfológico esta Península é formada por duas unidades fundamentais que condicionam a morfologia do litoral: o Sinclinal de Albufeira e a Cadeia da Arrábida (Fig. 1).

A região axial do sinclinal de Albufeira situa-se a Norte da Lagoa de Albufeira sendo o seu flanco norte constituído por uma série detrítica e ocasionalmente carbonatada (sucessão de areolas, siltes e argilas com níveis de calcários margosos) depositada desde o Miocénico até à actualidade, inclinando para Sul e cortada pelo Estuário do Tejo (Fig. 1B). Estas rochas podem ser observadas nos dois terços setentrionais do arco Caparica-Espichel. No flanco Sul afloram camadas mais antigas, do Cretácico à actualidade, formando uma série essencialmente carbonatada e detrítica, inclinando para Norte. Na Cadeia da Arrábida têm maior expressão rochas mais antigas (jurássicas) predominando as litologias carbonatadas e margosas (Fig. 1B). Estas rochas podem ser observadas no terço meridional do arco Caparica Espichel e no litoral Sul da Península de Setúbal.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 5 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Rio TejoLagoa de Albufeira

Cabo Espichel

Cenomaniano e Complexo Vulcânico de Lisboa

Miocénico

Plioquaternário

Dunas

Paleogénico e Miocénico

Cretácico

Jurássico

N S

B 0 10 20 km

Serra da ArrábidaEstuário

do Sado

Lagoa de Albufeira

Estuário

do Tejo

LISBOA

SETÚBAL

Cabo Espichel

N

S

A N

Figura 1 – A – Enquadramento da Península de Setúbal; B - Corte Geológico da Península de Setúbal (adaptado de Andrade, 1989).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 6 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

II. ITINERÁRIO

7

6

54

32

N

0 5 10 15km

1

Figura 2 – Localização das paragens.

1 – Lisboa

2 – Baía do Seixal

3 – Sapal de Corroios (Moinho de maré de Corroios)

4 – Restinga do Alfeite

5 – Arriba Fóssil da Costa da Caparica (Miradouro dos Capuchos)

6 – Fonte da Telha

7 – Lagoa de Albufeira

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 7 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

III. PARAGENS 1. LISBOA

A cidade de Lisboa foi edificada sobre rochas de diferentes litologias e idades,

das quais se salientam (ver Tabela Crono-estratigráfica em anexo): • calcários e margas com níveis fossilíferos, do Cenomaniano (início

Cretácico superior); • escoadas basálticas e piroclastos, reunidos no "Complexo Vulcânico de

Lisboa", do Cretácico final (≈72 M.a.);

• depósitos essencialmente detríticos (conglomerados, areias e argilas) de origem continental reunidos no "Complexo de Benfica", do Eocénico – Oligocénico;

• areias, areolas, argilas e calcários, em proporções variáveis, ricas em fósseis animais e vegetais, do Miocénico;

• depósitos aluvionares acumulados nas linhas de água (ribeiras secundárias e Rio Tejo) do Quaternário. Parte da zona ribeirinha de Lisboa foi conquistada ao rio e assenta sobre materiais de aterro, ou seja, depósitos artificiais colocados para mudar a fisiografia natural do terreno. Este tipo de depósitos existem noutras zonas da cidade atingindo, por vezes, grande expressão e resultam por exemplo do entulhamento de antigas explorações ou de catástrofes naturais como o sismo de 1755.

A erosão diferencial destes tipos de litologias definiu, no que é hoje a cidade de Lisboa, um conjunto de relevos com forte controlo litológico e estrutural, tradicionalmente referidos como as sete colinas (São Vicente, Santo André, Castelo, Santana, São Roque, Chagas e Santa Catarina). Devido à expansão urbana no início do século XIX havia autores que elevavam para quinze as colinas de Lisboa (Oliveira, 1990).

A cidade desenvolve-se desde a cota 3-4 m na zona ribeirinha, até aos cumes Poiais (108 m), Castelo de São Jorge (110,7 m), Penha de França (127,9 m), Montes Claros (170,3 m) e Monsanto (227,8 m) (Lopes, 2001).

Na região oriental e setentrional da cidade, onde predominam as litologias miocénicas, as formas de relevo são fortemente condicionadas pelos contrastes litológicos e pela estrutura geológica, marcada essencialmente pela presença de dobramentos suaves. A rede de drenagem instalou-se nas formações menos _________________________________________________________________ 1 M.a. – Milhões de anos

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 8 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

resistentes, evoluindo para vales assimétricos enquanto as mais resistentes originaram planaltos (como os do Aeroporto, Carnide-Lumiar e Campo Grande-Saldanha) e alinhamentos de cornijas (Almeida, 1991). Na zona central da cidade salienta-se o relevo da Colina do Castelo de S. Jorge, composto por rochas com maior componente carbonatada, mais resistentes, rodeado pelo vale da ribeira que segue ao longo da Av. Almirante Reis/Rua da Palma e pelo esteiro da Baixa que se instalaram em formações mais brandas, com uma maior componente detrítica.

Na região Sudoeste da cidade, onde afloram materiais do Cenomaniano e do Complexo Vulcânico de Lisboa, sobressaem os relevos da serra de Monsanto e da colina da Ajuda (que integram respectivamente os anticlinais/horsts de Monsanto e Ajuda). Nesta região, onde não há grandes contrastes de resistência à erosão, o relevo é fundamentamente controlado por uma estrutura geológica complexa, afectada por falhas e dobras e definido por uma rede de drenagem frequentemente condicionada pela fracturação (Almeida, 1991).

Como exemplo refere-se a ribeira de Alcântara que se esbate a montante num vale de fundo aplanado assente sobre substrato miocénico, enquanto a juzante, na zona terminal, se encaixa vigorosamente nos calcários do Cenomaniano devido à intensa fracturação das rochas neste local (Almeida, 1991).

Salienta-se ainda a forte assimetria, geológica e geomorfológica, das margens do Tejo (Fig. 3) que, segundo Cabral (1995), se deve essencialmente a factores tectónicos, nomeadamente a deslocamentos verticais ocorridos desde o Miocénico até a actualidade, produzidos pela "Falha do vale inferior do Tejo", com orientação geral N30ºE. Este acidente condiciona o traçado do rio Tejo no troço compreendido entre Vila Nova da Barquinha e o Barreiro. Apesar de não existirem evidências da continuidade desta estrutura no interior da Penísula de Setúbal, o alinhamento do canhão submarino de Lisboa ao largo da Lagoa de Albufeira com orientação NNE-SSW, no seu troço intermédio, no enfiamento do vale inferior do Tejo, sugere, segundo Freire de Andrade (1933, in: Cabral, 1995) a continuação daquela falha pela plataforma continental adjacente.

A presença de outro importante acidente tectónico, oblíquo ao anterior, é sugerido por evidências geofísicas, e denominado como "Falha do gargalo do Tejo", apresentando direcção ENE-WSW a E-W e coincidindo com o troço vestibular do rio, na sua região mais estreita.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 9 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira ______________________________________________________________

_ NS

0 200 m

LEGENDA:

Holocénico

Miocénico Pliocénico

Eocénico - Oligocénico

Miocénico Cretácico

Figura 3 – Corte Geológico na região da Ponte 25 de Abril (adaptado da Carta Geológica do concelho de Lisboa, folha 3, esc: 1/10 000. SGP, 1986).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 10 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

2. BAÍA DO SEIXAL

A baía do Seixal localiza-se na margem esquerda do estuário do Tejo e ocupa uma área com cerca de 482 ha. Esta enseada está abrigada por uma extensa língua de areia (restinga do Alfeite – ver paragem 4) que lhe confere condições de hidrodinamismo baixo e permite a deposição de sedimentos finos (lodosos) organizados em extensas manchas de sapal e rasos de maré (exemplo: sapal de Corroios – ver paragem 3). A maré propaga-se por canais pouco profundos, muito assoreados, meandrizados, dos quais se destaca o Rio Judeu (Fig. 4) (Freire, 1999).

1- Restinga do Alfeite 2- Baía do Seixal

2

1

N

Figura 4 – Elementos morfo-sedimentares da região da baía do Seixal (adaptado de Freire,

1999).

Nesta baía existem ainda algumas praias de areia de pequena extensão com

origens distintas, resultantes de (Freire, 1999): • acumulação de sedimentos provenientes da erosão pluvial em areeiros

abandonados, escavados em afloramentos pliocénicos - Arrentela e Talaminho;

• depósitos de aterro – Amora; • despejos de dragagens – margem sul da Ponta dos Corvos. Por constituir uma zona particular dos pontos de vista morfológico e

hidrodinâmico, proporcionou desde tempos remotos o seu aproveitamento socio-

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 11 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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económico: instalação de núcleos piscatórios e de importantes centros urbanos e industriais, exploração agrícola e moinhos de maré (Nabais e Ramos, 1987 in: Freire, 1999). Estes últimos, desde o início do século XV, utilizavam a energia das marés na moagem de cereal para a produção de biscoito nos "Fornos do Valdezebro, onde se fabricão os biscoutos para as Armadas, Náos da India, Conquistas, e Fortalezas do Reino" 2.

No interior desta baía encontram-se seis moinhos de maré: Corroios, Raposa, Galvão, Capitão, Passagem e Torre, sendo possível observar os últimos quatro deste local.

Outro dos exemplos do aproveitamento das condições naturais oferecidas pela baía do Seixal, foi a implantação da indústria corticeira, de que a MUNDET, estratégicamente localizada na margem oriental desta baía.

____________________________________________________ 2 "Regimento dos Fornos de Valdezebro", in "Systema ou Colecção dos Regimentos Reaes",

Tomo Terceiro, 1785, p. 339 in Nabais, 1986.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 12 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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3. SAPAL DE CORROIOS (Moinho de Maré de Corroios)

O Moinho de Corroios situa-se dentro da baía do Seixal, no sapal de Corroios que tem cerca de 143ha (Freire, 1999) (Fig.5).

sapal de Corroios

Figura 5 – Sapal de Corroios e localização do moinho de maré de Corroios (•).

Deste local é possível observar as principais características morfológicas de

um sapal salgado em estado de maturação avançado. O sapal desenvolve-se sobre sedimentos essencialmente vasosos e é cortado por numerosos canais de maré, meandrizados e anastomosados, apresentando, por vezes, um padrão dendrítico nos canais de ordem inferior. Contrariaramente às redes fluviais da margem terrestre adjacente, os canais de maré dos sapais não são formas erosivas, mas formas remanescentes da agradação lateral e vertical dos bancos de vaza que os confinam.

A textura e constituição mineralógica destes sedimentos, essencialmente siltosa, argilosa e orgânica, confere-lhes propriedades de floculação, adsorção e troca iónica importantes com a água de circulação. Estas propriedades permitem a retenção selectiva de algumas substâncias poluentes (nomeadamente metais pesados) extraíndo-os da água de circulação e aprisionando-os no sapal em crescimento. Por isso, os sapais funcionam como "rins", depurando o sistema hidrológico.

Os sapais são ecossistemas que incluem vegetação halófita, apresentando zonação característica determinada pelo tempo de imersão. A vegetação é um factor condicionante da evolução do sapal, sendo os seus sistemas radiculares e estruturas aéreas armadilhas eficientes para a captura de sedimentos trazidos em suspensão pelas correntes de maré. Constituem as zonas de maior produtividade da biosfera, tendo papel importante como berçário de variadissímas espécies piscícolas e local de nidificação de aves.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 13 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Cerca de 46% das margens de sapal da baía do Seixal encontram-se fortemente intervencionadas por actividade humana, da qual se salienta: actividades agrícolas (ocupação e recuperação de terrenos, construção de diques, regularização e desvio de canais), aterro e instalação de moinhos de maré. Estes últimos constituem um exemplo interessante da modificação da dinâmica das margens. Nos moinhos de maré, a presença de um dique que controla a entrada/saída de água para a zona da caldeira, modifica as velocidades de corrente e a taxa de sedimentação na zona a montante do dique. Lima (1995) refere, para a caldeira do moinho de Corroios, um assoreamento de 1.5m nos últimos 20 anos, o que equivale a uma taxa de sedimentação de 7.5cm/ano (a taxa de sedimentação média nos sapais do estuário é variável entre 5mm e 1cm/ano).

A título de curiosidade seguem-se algumas informações sobre a história (Fig. 6) e funcionamento (Fig. 7) do moinho de maré de Corroios.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira ______________________________________________________________

14

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Figura 6 – Aspectos históricos do moinho de maré de Corroios (Retirado do folheto: Moinho de maré de Corroios, Ecomuseu Municipal do Seixal. Câmara Municipal do Seixal).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 15 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Figura 7 - Funcionamento do moinho de maré de Corroios (Retirado do folheto: Moinho de maré de Corroios, Ecomuseu Municipal do Seixal. Câmara Municipal do Seixal).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 16 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira _______________________________________________________________

4. RESTINGA DO ALFEITE

A restinga do Alfeite situa-se na margem esquerda do estuário interno do Tejo, entre o rio de Coina e Cacilhas, constituindo um corpo arenoso com a sua extremidade W enraizada em arribas miocénicas. Estende-se por cerca de 2,5km de comprimento com altitude máxima de 4m acima do nível médio do mar, apresentando na vertente norte uma praia activa reflectiva, limitada inferiormente por um raso de maré areno-vasoso que se estende por cerca de 300m (Freire, 1999).

A formação, evolução e morfologia da restinga, associam-se ao regime de agitação local. Este regime caracteriza-se por ondas com altura significativa média de 0.2-0.4m originadas no interior do estuário, fundamentalmente por ventos do quadrante N, a que corresponde fetch de cerca de 13km. Esta actividade promove um transporte longitudinal residual de sedimentos para NE, de 10 000m3/ano (Freire & Andrade, 1998). A restinga é formada por uma série de cristas arenosas soldadas, encurvadas, que materializam diferentes episódios de crescimento, encontrando-se separadas por zonas deprimidas, preenchidas por sedimentos vasosos (Fig. 8).

A diferenciação da restinga do Alfeite resulta de um episódio de mobilização e deposição de sedimentos arenosos provenientes de fontes proximais (rochas detríticas miocénicas e pliocénicas), transportados pelas ondas de geração local. A instalação deste corpo arenoso parece ter ocorrido há pelo menos 500 anos (Freitas & Andrade, 1998), através de um crescimento progressivo para leste por acreção sucessiva de "ganchos" arenosos terminais (Fig. 9). A instalação desta barreira arenosa proporcionou condições de abrigo e gerou um ambiente de baixa energia na Baía do Seixal permitindo a deposição de um sistema de rasos de maré canais e bancos de sapal (Sapal de Corroios – paragem 3), de substrato essencialmente vasoso.

A variação morfológica da restinga do Alfeite, nos últimos 150 anos, mostra tendência marcadamente erosiva, embora aquela evolução não tenha sido uniforme no tempo e no espaço. Entre 1849 e 1993 registou-se uma variação da área da restinga da ordem de 23.7ha (erosão 15ha e acreção 8,7ha). Da totalidade da área erodida, 80% perdeu-se num intervalo de apenas 40 anos (1939-1979), com uma taxa de erosão média de 0,3ha/ano (Freire, 1999). A construção de infra-estruturas portuárias, a expansão urbana e a protecção de arribas, na década de 30, foram os responsáveis pela redução de intensidade das fontes sedimentares. Esta redução, associada ao corte do transporte longitudinal de sedimentos, provocado pela implantação de estruturas perpendiculares à

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 17 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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costa, conduziu ao incremento do processo erosivo, tendo como consequência o "emagrecimento" da praia do Alfeite.

Actualmente este sistema parece estar a reequilibrar-se lentamente, através da aquisição de uma configuração plana arqueada, que minimiza a erosão induzida pelas ondas de geração local.

Figura 8 – Esboço geomorfológico da restinga do Alfeite (retirado de Freire & Andrade,

1998).

Baía doSeixal

N

Restinga do Alfeite

actualidade

500 anos

Figura 9 – Instalação da restinga do Alfeite e baía do Seixal (adaptado de Freire, 1999).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 18 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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5. ARRIBA FÓSSIL DA COSTA DA CAPARICA (Miradouro dos Capuchos) Deste local vislumbra-se, para N, a região exterior do estuário do Tejo onde

podem ser observadas duas das quatro unidades fisiográficas definidas por Freire (1999):

• O Canal de Embocadura também denominado de "Gargalo do Tejo" ou "Corredor" – entre Cacilhas e a transversal Cova do Vapor – Paço de Arcos;

• A Embocadura – limitada a Este pelo Canal de Embocadura e a Oeste pelo limite da pluma túrbida na zona costeira adjacente. No "Gargalo do Tejo" salienta-se a dissimetria batimétrica, com

profundidades maiores junto à margem esquerda entre Cacilhas e Trafaria, enquanto que na Embocadura a zona mais profunda se desenvolve mais perto da margem N.

Na Embocadura existem formas aluvionares submersas como o "Cachopo do Norte" (ou Bico do Pato), o "Cachopo do Sul" (ou Alpeidão), que constituem barras lineares marginais do canal de vazante. Sobre este último banco encontra-se um complexo de barras de rebentação e de espalho que formam o "Banco do Bugio". O conjunto destas formas que se distribuem ao largo da embocadura num raio de aproximadamente 10km, coroam o remanescente do antigo delta do Tejo, formado por sedimentos de proveniência fluvial (Fig. 10).

O Estuário do Tejo, nem sempre apresentou a morfologia que hoje conhecemos. A génese e evolução deste sistema fluvial remontam à época pliocénica (≈ 5 M.a.).

Após a retirada do mar miocénico da bacia do Tejo – Sado, ter-se-á formado uma vasta planície emersa entre Lisboa e a Serra da Arrábida, onde se instalou um sistema fluvial precursor do Tejo actual (Azevedo, 1982), que se encaixou livremente nos sedimentos brandos subjacentes, constituídos por argilas, siltes e margas.

O Pré-Tejo terá sido um sistema fluvial de múltiplos canais anastomosados, os quais migravam ou divagavam de um extremo ao outro na vasta planície aluvial, abandonando canais e abrindo outros, retomando mais tarde os primeiros, e assim sucessivamente, constituindo uma saída ramificada em nada semelhante à actual, limitada a Sul, pela Serra da Arrábida e, a Norte, pelas terras altas de Lisboa (Azevedo, 1987).

Há cerca de 1,5-1,7 M.a. (Plistocénico) deu-se uma forte subsidência desta bacia fluvial a Nordeste, originando a deformação daquela superfície em sentido contrário ao do escoamento regional, provocando a inversão, reorganização e

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 19 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Figura 10 – Caracterização geomorfológica do troço Trafaria – Lagoa de Albufeira (retirado

de Freire, 1986).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 20 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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hierarquização da rede de drenagem. Este movimento de subsidência parece ter sido um dos principais responsáveis pelo desvio e canalização do Tejo para o leito actual (Azevedo, 1982). A evolução que se seguiu durante o Plistocénico foi essencialmente controlada por oscilações climáticas e variação do nível médio do mar.

Após o último Máximo Glaciar ocorrido há cerca de 18.000 anos a subida do nível do mar e sua desacelaração e estabilização entre 5.000 – 3.000 BP3 conduziram ao estabelecimento de um novo equílibrio deste sistema litoral. No caso do estuário do Tejo, a deslocação dos pólos de sedimentação para o seu interior induziu o assoreamento e a colmatação rápida dos afluentes menos encaixados. Esta evolução sedimentar é responsável pela formação de vastas lezírias, extensas planícies aluviais e inundações frequentes (Freire, 1993).

Deste ponto de observação tem-se uma panorâmica da arriba da Costa da Caparica que se estende para Sul até à praia da Foz e para Norte até à Trafaria. Trata-se de uma arriba fóssil, separada da acção do mar por planície litoral (Fig. 10), até às imediações da Fonte da Telha, mais concretamente na Mina do Ouro (Fig. 10) tornando-se viva para Sul desta localidade, sendo esporadicamente trabalhada pelo mar, em alturas de temporal e marés vivas. Culminando a arriba fóssil, observa-se uma extensa plataforma litoral, onde os elementos morfológicos dominantes são as dunas (Fig. 11), actualmente fixadas pela vegetação e muito perturbadas pela intervenção antrópica.

Na Península de Setúbal o regime de marés é semi-diurno com amplitude variável entre 2.9m (águas vivas) e 1.2m (águas mortas), podendo atingir o máximo de 3.6m, constituindo um litoral mesotidal elevado.

A costa Ocidental está exposta à ondulação gerada no Atlântico Norte, sendo os rumos ao largo compreendidos entre o Noroeste e o Sudoeste, verificando-se

Dunas interioresPraia

Cordão dunar

Arribafóssil Plataforma litoral Planície litoral

Figura 11 – Caracterização geomorfológica – unidades de paisagem (adaptado de Freire,

1986).

__________________________________________________________________________ 3 BP – Before Present – antes do presente; por convenção o presente corresponde a 1950.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 21 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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que a gama de direcções mais frequente tem rumo W10ºN (ocasionalmente associado a temporais violentos).

A ondulação do quadrante Sudoeste sofre refracção sensivelmente uniforme em todo o arco, atingindo a sua totalidade com idêntica densidade de energia. No entanto, à medida que o rumo ao largo roda para o quadrante Noroeste, verifica-se um aumento do efeito de abrigo gerado pelo Cabo Raso no troço superior do arco, que associado à batimetria dos fundos correspondente aos bancos submarinos do estuário exterior do Tejo, induzem intensa difracção e refracção das ondas, definindo uma região de baixa energia, sensivelmente para Norte da Fonte da Telha (Fig. 12). A conjugação destes factores gera um aumento da densidade e do fluxo de energia de Norte para Sul, reflectindo-se num aumento da granularidade dos sedimentos (areias mais grosseiras nas praias a sul - Praia da Foz) e induz para o troço a Norte da Fonte da Telha uma deriva longilitoral residual para Norte, enquanto que para Sul se processa com sentido inverso (Fig. 12).

Figura 12 – Representação simplificada do padrão de circulação longilitoral de areias na

Península de Setúbal em situações de mar de (retirado de Freitas et al., 1993): 1 – Oeste; 2 –

Sudoeste; 3 – Circulação residual.

Desde os finais da década de 40, registaram-se importantes recuos da linha

de costa entre a Cova do Vapor (500m entre 1947-1951) e a Costa da Caparica. A necessidade vital de protecção das povoações costeiras conduziu à construção de um esporão na Cova do Vapor (Fig. 10) para evitar a progressão de uma restinga para o interior do porto e de um paredão longitudinal de 2.5km armado de 7 esporões transversais (Fig. 10), com vista ao controlo da erosão das praias, protecção do casario e manutenção de alguma areia nas praias da frente urbana da Costa da Caparica.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 22 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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6. FONTE DA TELHA

Nesta paragem o topo da arriba apenas atinge uma altitude de cerca de 50m, ao contrário do que se verificava na região da Costa da Caparica onde o topo se situava a cerca de 100m. A arriba encontra-se bem vegetada, o que a defende da erosão pluvial, sem dúvida a mais importante nesta região, uma vez que não existem vestígios de erosão marinha directa actual. No entanto, começa a observar-se neste troço o ínicio de interacções entre a arriba e a praia.

Outro elemento contrastante a Norte e a Sul deste local é a morfologia da planície litoral que, aumentando de largura para Norte, permitiu o desenvolvimento de extensos campos dunares (Fig. 10). As primeiras intervenções do homem no topo da arriba datam do século XVIII e tiveram como objectivo suster o avanço das areias para o interior. D. João V mandou semear, um extenso pinhal (pinheiro manso), desde a praia do Rei até à Lagoa de Albufeira (Pinhal do Rei ou Mata dos Medos - Freire, 1986). Na planície litoral a construção de extenso parque habitacional conjuntamente com a implantação de áreas hortículas tem promovido a destruição da vegetação, incrementando a erosão.

A cerca de 3km para sul desta localidade, junto à Mina do Ouro, ao processo erosivo provocado pela acção das chuvas e pelo escoamento que induz forte abarrancamento, gerando cones de dejecção no sopé da arriba, junta-se a acção erosiva das ondas, que remove os sedimentos ali acumulados, redistribuindo-os pelas praias. Deste modo, para Sul da Fonte da Telha a arriba passa a constituir a fonte de sedimento indirecta e depois directa, que alimenta as praias.

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7. LAGOA DE ALBUFEIRA

A laguna de Albufeira situa-se na orla ocidental da Península de Setúbal, no arco litoral Caparica -Espichel, cerca de 20km a sul de Lisboa.

Ocupa uma superfície de 1,3km2 e apresenta uma geometria alongada, com o eixo maior oblíquo relativamente à linha de costa, orientado Sudoeste-Nordeste.

É formada por dois corpos lagunares principais ligados por um canal estreito, sinuoso e pouco profundo: a Lagoa Pequena, mais interior e menos profunda e a Lagoa Grande, com profundidades máximas de cerca de 15m, constituída por dois segmentos elípticos, definidos por cúspides arenosas marginais (Fig. 13).

N

1 km 0

Figura 13 – Laguna de Albufeira (extracto da Carta Militar nº. 453, escala original:

1/25.000).

A laguna está separada do oceano por uma barreira, contínua ao longo de

1200m, ancorada por ambas as extremidades a um litoral de arribas talhadas em terrenos plio-quaternários. A barreira é formada por areias grosseiras, remobilizadas e transportadas em permanência pelas ondas do mar. No extremo norte deste cordão estabeleceu-se uma duna frontal embrionária, colonizada por vegetação pioneira.

A laguna ocupa a região vestibular da Ribeira da Apostiça, seu afluente principal. As restantes linhas de água são de menores dimensões e afluem exclusivamente à margem esquerda. A bacia hidrográfica drenante estende-se por 106km2, em formações de natureza litológica diversa que, cronologicamente, se situam entre o Jurássico e o Quaternário.

Com o intuito de melhorar a qualidade do corpo aquoso e controlar a eutrofização, é aberta periodicamente por meios mecânicos uma barra de maré

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que fecha naturalmente algum tempo depois. Esta intervenção antrópica (que começou pelo menos no século XV), consiste em remover areia do lado interno da barreira e abrir depois uma estreita ligação ao mar; o forte fluxo de descarga, que se gera em baixa-mar devido ao desnível existente entre as cotas dos planos de água lagunar e oceânico, rasga um canal amplo e profundo através do cordão arenoso.

Devido ao tipo de agitação marítima local, existe um fluxo de areias ao longo da praia, dirigido preferencialmente para sul, que é responsável pela reconstrução da barreira quando nela se abre a barra de maré. Esta reconstrução faz-se por acreção na margem norte e erosão na margem sul do canal de maré, o qual meandriza, perde eficiência hidráulica e finalmente é colmatado. A barra tem, pois, um carácter divagante, e funciona durante um período variável, de semanas a meses.

Enquanto a barra se mantém aberta, a maré oceânica propaga-se no interior da laguna, transportando areias a favor da enchente, que se depositam nas vizinhanças da boca da barra sob a forma de leques sedimentares. Os sucessivos episódios de abertura/fecho da barra e a meandrização dos canais promovem a multiplicação, justaposição ou erosão destes leques, produzindo a longo prazo uma morfologia complexa da margem interna da barreira, variável no tempo.

A água lagunar tem características sazonais que reflectem a dualidade barra aberta/barra fechada. A abertura da barra promove a renovação completa da água no interior da laguna que adquire temporariamente características fisico-químicas idênticas às da água oceânica. A coluna de água torna-se homogénea, oxigenada e límpida, com salinidade da ordem de 3,5% (Freitas, 1995). Em situação de barra fechada, os aportes de água doce aumentam a profundidade do corpo aquoso e, devido a diferenças de densidade, gera-se uma coluna de água estratificada, com acumulação de água salgada nas zonas mais profundas e salobra ou doce à superfície (Fig. 14A). O oxigénio dissolvido nas camadas mais profundas é rapidamente consumido, gerando-se anoxia junto ao fundo. Os sedimentos de fundo apresentam uma distribuição marcadamente concêntrica, em que as areias ocupam a faixa periférica e as vasas a área central, mais profunda. Esta organização reflecte o baixo hidrodinamismo do corpo lagunar e a diversidade das fontes sedimentares, marinha e continental. Os sedimentos provenientes do continente perdem os componentes mais grosseiros (areia e cascalho, transportados junto ao fundo) na periferia do espelho de água, originando pequenas praias lagunares ou deltas fluviais; os componentes mais finos (siltes e argilas, transportados em suspensão) alcançam as regiões mais internas da bacia lagunar (Fig. 14B). Os sedimentos de origem marinha

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concentram-se preferencialmente no terço poente do corpo lagunar, em estreita associação física e funcional com a barreira e barra de maré.

Os sedimentos de fundo são de natureza essencialmente minerogénica, incorporando quantidades variáveis de matéria orgânica e bioclastos.

A laguna de Albufeira, tal como a conhecemos hoje, representa uma das etapas evolutivas do troço costeiro em que se integra, nos últimos milhares de anos, em resposta às variações ambientais que se fizeram e continuam a fazer sentir.

A. B.

Lagoa Grande

LagoaPequena

3.5%

2.0%

1.0%

(Salinidade)

areias vasosasareias vasas arenosas

vasas

Figura 14 – Laguna de Albufeira: A. Características físico-químicas da coluna de água; B.

Distribuição espacial dos sedimentos de fundo.

Há cerca de 10.000 anos o nível médio do mar localizava-se cerca de 20m

abaixo do actual. Nessa altura a laguna ainda não se teria formado e em seu lugar existia um vale profundo, escavado no substrato que desembocava a mais de 1km de distância do litoral actual (Fig. 15A).

No período de 10.000 a 6.000 BP o nível do mar elevou-se rapidamente até perto da cota actual, invadindo a superfície previamente modelada pela rede hidrográfica, formando um litoral de rias (Fig. 15B).

Cerca de 5.000 BP ocorreu uma desacelaração brusca da taxa de elevação do nível do mar que possibilitou a diferenciação e acumulação de uma restinga arenosa e definiu o ambiente lagunar (Fig. 15C).

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 26 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Desde 5.000 BP até ao presente, a descarga sólida fluvial preencheu os vales que hoje se encontram afogados em sedimento e com fundo plano. O corpo lagunar reduziu a sua extensão e profundidade (Fig. 15D).

A evolução futura da Lagoa de Albufeira será certamente dominada pelos processos de assoreamento que se traduzem pela agradação vertical do fundo do corpo lagunar e pela redução da sua superfície molhada. Os condicionantes desta evolução são de natureza global (elevação do nível médio do mar associada ao efeito de estufa) e de âmbito local, com relevância especial para os de origem antrópica. Dos últimos, destacam-se a intervenção agrícola, a desflorestação, a ocupação urbana da margem terrestre e a (re)abertura frequente da barreira. Colectivamente, estas actividades potenciam a erosão dos solos e a captura de areias do litoral exterior, aumentando a taxa de sedimentação local.

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 27 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira ______________________________________________________________

6 000 BP

_

A.

B.

5 000 BP

C.

D.Figura 15 – Evolução da laguna de Albufeira nos últimos 10.000 anos.

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IV. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, F.M. (1986) – Carta Geológica do Concelho de Lisboa, escala

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Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 29 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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Friedman, G.M. & Sanders, J.E. (1978) – Principles of Sedimentology. John Wiley & Sons, New York, 792 pp.

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Nabais, A.J.C.M. (1986) – História do concelho do Seixal. Património industrial. Moinhos de Maré. Câmara Municipal do Seixal. Seixal, 155 p.

Oliveira, M.A. (1990) – Guia Turístico de Portugal de A a Z. Círculo dos Leitores. Lisboa, 344 p.

IMAGEM DA CAPA: LANDSAT 5 TM 1994. EURIMAGE. Agradecimentos

Os autores agradecem à Câmara Municipal do Seixal, nomeadamente à Drª. Ana Isabel Apolinário e à Drª. Madalena Campos (Ecomuseu – Serviço Educativo) pela simpatia, disponibilidade, empenhamento demonstrados e fornecimento de material de apoio.

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NOTAS

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NOTAS

Geologia no Verão 2001 – Guia de Excursão 32 A Geologia no Litoral – Parte I: Do Tejo à Lagoa de Albufeira

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NOTAS

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ANEXO I - Tabela Crono-estratigráfica

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ANEXO II - Dimensões dos detritos sedimentares (adaptado de Friedman & Sanders, 1978).