"a gente tinha vergonha de dizer que morava em lajedinho. hoje temos muito orgulho!"

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ano 8 • nº 1852 embro/2014 BARROCAS “A gente tinha vergonha de dizer que morava em Lajedinho. Hoje temos muito orgulho” “Mainha” é a palavra mais ouvida entre sorrisos largos e lembranças marcantes contadas por participantes do Grupo de Mulheres Delícia da Terra, da comunidade de Lajedinho, município baiano de Barrocas. “Mainha” é Dona Zefinha, mãe de 12 filhos e uma das primeiras moradoras de Lajedinho, mãe e avó de algumas mulheres do grupo. “No início de tudo só existiam três casas, a minha e mais duas”, conta Dona Zefinha. “Quando alguém perguntava às meninas de onde elas eram, elas com vergonha diziam que era de Santa Rosa e não de Lajedinho. Elas davam o endereço errado”, diz a matriarca até ser interrompida por Nilda. “A gente não tinha despertado que podia ser uma comunidade igual a Santa Rosa, com Sindicato, Associação. Mas no final de 2004 veio o Projeto. Depois disso eu precisava reunir o povo e não tinha onde. Então batia de porta em porta para falar do projeto. Com o tempo fui marcando reuniões que no início eram na garagem da casa de Zefinha”, conta Nilda dos Anjos na época multiplicadora de Assistência Técnica Rural (ATER) do Projeto Prosperar. Nilda acompanhou de perto as dificuldades que a comunidade enfrentou e relembra com orgulho o esforço das pessoas na organização da Associação e do grupo de produção. O despertar As filhas de Dona Zefinha sempre gostaram de cozinhar, fazer artesanato e uma delas chamada Adelaide já fazia e vendia cocada. “Nos espelhamos na experiência de Adelaide que já tinha feito cursos”, conta Nilda. Com a constituição da Associação Comunitária e da vontade de fazer Lajedinho prosperar, algumas mulheres decidiram montar o grupo de produção Delícia da Terra, que inicialmente produzia cocada em pequena escala e com o tempo passaram a produzir polpas de frutas. “Contamos com o apoio do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR) de Teofilândia e Serrinha, que nos ajudou a organizar o grupo e nos inspirou”, completa Nilda. D. Zefinha doou o terreno para a construção da Associação toda feita com doações de material de construção, com o lucro arrecadado com venda de guloseimas e pela apresentação do “Samba Brasileiro”, formado por pessoas da comunidade. “O registro foi possível graças à arrecadação mensal de R$ 1,00 por família, de janeiro 2006 até julho 2007”, lembra Ednalva, outra filha de Dona Zefinha. ∙A união, a articulação política e social dos moradores de Lajedinho é o segredo que faz a comunidade ser reconhecida como exemplo de desenvolvimento e perseverança.

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O Candeeiro nos conta a história de um grupo de produção formado exclusivamente por mulheres moradoras da comunidade de Lajedinho, município de Barrocas, que com muita determinação e garra transformou suas vidas e a realidade do local.

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Page 1: "A gente tinha vergonha de dizer que morava em Lajedinho. Hoje temos muito orgulho!"

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 8 • nº 1852

embro/2014

BARROCAS

“A gente tinha vergonha de dizer que morava em Lajedinho. Hoje temos muito orgulho”

“Mainha” é a palavra mais ouvida entre sorrisos largos e lembranças m a r c a n t e s c o n t a d a s p o r participantes do Grupo de Mulheres Delícia da Terra, da comunidade de Lajedinho, município baiano de Barrocas. “Mainha” é Dona Zefinha, mãe de 12 filhos e uma das primeiras moradoras de Lajedinho, mãe e avó de algumas mulheres do grupo. “No início de tudo só existiam três casas, a minha e mais duas”, conta Dona Z e f i n h a . “ Q u a n d o a l g u é m perguntava às meninas de onde elas eram, elas com vergonha diziam que era de Santa Rosa e não de Lajedinho. Elas davam o endereço errado”, diz a matriarca até ser interrompida por Nilda.

“A gente não tinha despertado que podia ser uma comunidade igual a Santa Rosa, com Sindicato, Associação. Mas no final de 2004 veio o Projeto. Depois disso eu precisava reunir o povo e não tinha onde. Então batia de porta em porta para falar do projeto. Com o tempo fui marcando reuniões que no início eram na garagem da casa de Zefinha”, conta Nilda dos Anjos na época multiplicadora de Assistência Técnica Rural (ATER) do Projeto Prosperar. Nilda acompanhou de perto as dificuldades que a comunidade enfrentou e relembra com orgulho o esforço das pessoas na organização da Associação e do grupo de produção.

O despertar

As filhas de Dona Zefinha sempre gostaram de cozinhar, fazer artesanato e uma delas chamada Adelaide já fazia e vendia cocada. “Nos espelhamos na experiência de Adelaide que já tinha feito cursos”, conta Nilda. Com a constituição da Associação Comunitária e da vontade de fazer Lajedinho prosperar, algumas mulheres decidiram montar o grupo de produção Delícia da Terra, que inicialmente produzia cocada em pequena escala e com o tempo passaram a produzir polpas de frutas. “Contamos com o apoio do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais (MMTR) de Teofilândia e Serrinha, que nos ajudou a organizar o grupo e nos inspirou”, completa Nilda.

D. Zefinha doou o terreno para a construção da Associação toda feita com doações de material de construção, com o lucro arrecadado com venda de guloseimas e pela apresentação do “Samba Brasileiro”, formado por pessoas da comunidade. “O registro foi possível graças à arrecadação mensal de R$ 1,00 por família, de janeiro 2006 até julho 2007”, lembra Ednalva, outra filha de Dona Zefinha.

∙ A união, a articulação política e social dos moradores de Lajedinho é o segredo que faz a comunidade ser reconhecida como exemplo de desenvolvimento e perseverança.

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Bahia

Naquela época os jovens do local não possuíam documentos e partiam em busca de trabalho e não queriam voltar mais, conta Idejane enquanto amamenta. “As filhas de “Mainha” foram casando, tendo filhos, as casas aumentando e quem foi embora foi voltando querendo comprar mais terra, depois que viu Lajedinho crescer de 2005 para cá”, conta Maria da Paz, neta de D.Zefinha. “Todo mundo aqui tinha seu pedaço de terra antes, mas era raro quem t inha uma horta , po is não t inha conhecimento de plantação. Muita gente passava até fome”, conta Ednalva.

O florescer

“Os moradores de Lajedinho passaram a entender mais sobre agricultura familiar, convivência com o Semiárido e sobre os princípios agroecológicos depois de diversas

formações, oficinas, intercâmbios e visitas a outras propriedades de agricultores familiares na região e também fora do estado”, conta Nilda, eleita a primeira presidenta da Associação Comunitária local.

D i an te do p rocesso de o rgan ização e desenvolvimento da comunidade, a partir de 2009 alguns moradores receberam a cisterna de produção e passaram a fazer em seus quintais hortas e canteiros produtivos. “Hoje todo mundo na comunidade tem a sua horta, inclusive o grupo de produção, e as hortaliças são consumidas na alimentação e também são vendidas na feira agroecológica de Barrocas”, complementa Nilda lembrando ainda do fundo rotativo da comunidade que hoje tem regimento próprio criado pelo grupo. “Até os maridos mais resistentes e pessoas de outras comunidades, inclusive de Santa Rosa tem sido beneficiados com nosso fundo rotativo”, complementa.

Hoje o grupo comer c i a l i z a a s polpas de frutas para a s e s c o l a s d o município através do Programa Nacional d e A l i m e n t a ç ã o Escolar (PNAE). O grupo Delícia da Terra não para. Está agora em processo de implantação do Banco de Sementes do local. “Mainha já p a r t i c i p o u d e

reunião sobre o assunto e já se propôs a ceder o espaço. Com a ajuda dos técnicos vamos conseguir ter nosso Banco logo, logo”, diz dona Zefinha.

Dona Zefinha, a “Mainha” cedeu a garagem da sua casa para as primeiras reuniões do grupo, doou o terreno para a construção da sede da Associação

e já se propôs a ceder um espaço para o Banco de Sementes.

Todos agora têm a sua horta, inclusive as mulheres do grupo. As hortaliças são consumidas na alimentação e também são

vendidas na feira agroecológica de Barrocas

Os equipamentos foram conquistados um a um ao longo dos anos através de projetos, parcerias e concorrências públicas.

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