a fotografia suas permanencias e deslocamentos contemporaneos albuns fotograficos digitais

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Título: A fotografia suas permanências e deslocamentos contemporâneos: álbuns fotográficos digitais AZEVEDO,Moreira Jussara (Mestre) 1 ULBRA/RS Resumo: Este artigo é parte integrante de minha pesquisa de Mestrado no campo da Cultura Visual em que analisei as representações da urbe em álbuns fotográficos virtuais da contemporânea cidade de Porto Alegre 2 . Nesta comunicação busco refletir sobre a os deslocamentos e permanências da fotografia decorrentes das tecnologias digitais. A análise orienta-se teoricamente em estudos de Nicholas Mirzoeff, Philippe Dubois, Roland Barthes, Gilian Rose, Sandra Pesavento e Lucia Santaella entre outros. Enfocando os álbuns fotográficos virtuais, disponíveis na rede mundial de computadores, discuto as transformações na maneira como circulam e se exibem às imagens, cada vez mais visuais e fluídas, configurando novas formas de comunicação e aprendizado. Considerando o olhar como construção cultural e os álbuns fotográficos ( analógicos e digitais) como lugares de memória. Palavras-chave: Fotografia digital , álbum fotográfico ; Cidade e Cultura Visual. 1Mestre em Estudos Culturais na Educação, foco de pesquisa em Cultura Visual/Fotografia pela - ULBRA(2010);Especialização em Supervisão e Orientação Educacional (2006)com pesquisa sobre a Fotografia na Educação. Bacharel em Artes Visuais- Fotografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2000) e Bacharel em Desenho UFRGS (1995). Artista Plástica com várias exposições em Poéticas Visuais. Graduada em Arquitetura e Urbanismo pelo Centro Universitário Uniritter(1988). Professora de Fotografia do Instituto de Artes da UFRGS(2001/2002). Professora da Universidade Luterana do Brasil, no Curso de Comunicação Social ;Artes Visuais e Professora titular no curso de Graduação Superior em Tecnologia de Fotografia, de 2004 a 2010.Desenvolve projetos de extensão universitária na área de Fotografia, Artes e Educação com Projetos socio-educacionais ;coordenadora do Núcleo de Fotografia Experimental/ULBRA(2007-2009);atuou na docência de Disciplinas como Fotografia de Arquitetura ; Fotografia Arte e História; Arquivo e Preservação e outras ligadas a área.Participa de grupos de Estudos na Area de Arte/Educação/Fotografia . Pesquisadora do grupo de estudos sobre Fotografia, Historia e Cultura visual da PUC/Pós-graduação História. Tem experiência na área de Arquitetura, Educação e Artes, com ênfase em Fotografia, atuando principalmente nos seguintes temas: foto/ arte;pesquisa de processos fotograficos altenativos, Artes e historia visual e Educação email:[email protected] ; blog:www.jussaramoreiraarte.blogspot.com . 2 Título: Cidade(s) na Janela Pós-Moderna: Um Olhar Sobre Os Álbuns Fotográficos Virtuais de Porto Alegre. Dissertação apresentada para a obtenção do titulo de Mestre em Estudos Culturais em Educação na Universidade Luterana do Brasil em 2010 ;Orientadora Dr.ªIara Tatiana Bonin.

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  • Ttulo: A fotografia suas permanncias e deslocamentos contemporneos: lbuns fotogrficos digitais

    AZEVEDO,Moreira Jussara (Mestre)1

    ULBRA/RS

    Resumo: Este artigo parte integrante de minha pesquisa de Mestrado no campo da Cultura Visual em que analisei as representaes da urbe em lbuns fotogrficos virtuais da contempornea cidade de Porto Alegre2. Nesta comunicao busco refletir sobre a os deslocamentos e permanncias da fotografia decorrentes das tecnologias digitais. A anlise orienta-se teoricamente em estudos de Nicholas Mirzoeff, Philippe Dubois, Roland Barthes, Gilian Rose, Sandra Pesavento e Lucia Santaella entre outros. Enfocando os lbuns fotogrficos virtuais, disponveis na rede mundial de computadores, discuto as transformaes na maneira como circulam e se exibem s imagens, cada vez mais visuais e fludas, configurando novas formas de comunicao e aprendizado. Considerando o olhar como construo cultural e os lbuns fotogrficos ( analgicos e digitais) como lugares de memria.

    Palavras-chave: Fotografia digital , lbum fotogrfico ; Cidade e Cultura Visual.

    1Mestre em Estudos Culturais na Educao, foco de pesquisa em Cultura Visual/Fotografia pela -ULBRA(2010);Especializao em Superviso e Orientao Educacional (2006)com pesquisa sobre a Fotografia na Educao. Bacharel em Artes Visuais- Fotografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2000) e Bacharel em Desenho UFRGS (1995). Artista Plstica com vrias exposies em Poticas Visuais. Graduada em Arquitetura e Urbanismo pelo Centro Universitrio Uniritter(1988). Professora de Fotografia do Instituto de Artes da UFRGS(2001/2002). Professora da Universidade Luterana do Brasil, no Curso de Comunicao Social ;Artes Visuais e Professora titular no curso de Graduao Superior em Tecnologia de Fotografia, de 2004 a 2010.Desenvolve projetos de extenso universitria na rea de Fotografia, Artes e Educao com Projetos socio-educacionais ;coordenadora do Ncleo de Fotografia Experimental/ULBRA(2007-2009);atuou na docncia de Disciplinas como Fotografia de Arquitetura ; Fotografia Arte e Histria; Arquivo e Preservao e outras ligadas a rea.Participa de grupos de Estudos na Area de Arte/Educao/Fotografia . Pesquisadora do grupo de estudos sobre Fotografia, Historia e Cultura visual da PUC/Ps-graduao Histria. Tem experincia na rea de Arquitetura, Educao e Artes, com nfase em Fotografia, atuando principalmente nos seguintes temas: foto/ arte;pesquisa de processos fotograficos altenativos, Artes e historia visual e Educao email:[email protected]; blog:www.jussaramoreiraarte.blogspot.com . 2 Ttulo: Cidade(s) na Janela Ps-Moderna: Um Olhar Sobre Os lbuns Fotogrficos Virtuais de Porto Alegre. Dissertao apresentada para a obteno do titulo de Mestre em Estudos Culturais em Educao na Universidade Luterana do Brasil em 2010 ;Orientadora Dr.Iara Tatiana Bonin.

  • ...em latimfotografia se diria:imago lucis opera expressa;ous eja:imagem, revelada, tirada, subida, espremida (...) por ao da luz (Barthes, 1984, p.121)

    Desde a sua criao, em 1839, at os anos 1980, toda fotografia era produzida

    por algum processo fsico-qumico, no qual o suporte ou material fotossensvel poderia

    variar, mas a imagem continuava a ser impressa pela queima de um cristal sob a luz. A

    partir de 1990, houve a introduo do processo digital que dispensou a parte qumica e

    passou a converter a luz em sinais eletrnicos, trocando a matriz fotossensvel por uma

    placa de silcio - o CCD3 -, modificando significativamente as maneiras de produzirmos

    e de nos relacionarmos com a imagem.

    Atualmente, enquanto escrevemos em nossos computadores, podemos navegar na

    rede em busca de imagens e textos, receber fotos via e-mail e ver na tela do computador,

    em uma segunda janela, uma seqncia de fotografias mudando constantemente. Essas

    mesmas fotos so substitudas a cada segundo e poderiam, ainda, ser transformadas ou

    mescladas a outras naquele instante. Essa mobilidade visual, longe de ser uma

    peculiaridade particular do equipamento utilizado, tornou-se uma qualidade na maioria

    dos computadores e de outros equipamentos contemporneos dotados das novas

    tecnologias digitais.

    H 30 anos, mesmo para aqueles que trabalhavam com a imagem esta rapidez e

    interatividade imagtica nem era imaginada. Embora a imagem digital j fosse

    conhecida desde a dcada de setenta, quando foi desenvolvida pela NASA4 para o

    programa aeroespacial , foi s na dcada de 80 que as primeiras cmeras com o

    processo digital foram lanadas pela Sony para o mercado consumidor. Inicialmente,

    estas primeiras cmeras, as Mavica (Magnetic Vdeo Camera), conseguiam registrar

    somente imagens estticas; todavia, j no fim da dcada de 90 vrias empresas

    jornalsticas brasileiras usavam as cmeras digitais profissionais para acelerar os

    procedimentos da imprensa. No mesmo perodo, entravam no mercado os primeiros

    3 A sigla CCD quer dizer charge coupled device - dispositivo de carga acoplada, formado por conjunto de elementos chamados SPDs, em que cada um acumula carga eltrica de acordo com a quantidade de luz que o atinge. FREEDMAN, Michael,2003, p.12. 4 Esta sigla em ingls NASA significa National Aeronautics and Space Administration; Administrao Nacional do Espao e da Aeronutica, uma agncia do Governo dos Estados Unidos da Amrica, criada em 29 de julho de 1958, responsvel pela pesquisa e desenvolvimento de tecnologias e programas de explorao espacial. Disponvel: www.nasa.gov. Acesso em 20/05/2009.

  • computadores de uso pessoal, inicialmente destinados aos ambientes de trabalho.

    Gradativamente, eles passaram a ocupar um lugar de destaque nas residncias.

    Com a melhoria tecnolgica e barateamento do sistema, os computadores se

    popularizam e passam a ser mais um eletrodomstico, atuando no lazer e na

    comunicao das famlias. Eles tambm se tornam um meio privilegiado para a

    visualizao da fotografia, que circula livremente pelas casas como papel de parede na

    tela de cristal lquido, em e-mails, em sites e lbuns virtuais. Nos ltimos anos, tal como

    os computadores, os equipamentos fotogrficos digitais se tornaram mais acessveis e

    populares, devido ao forte investimento das tradicionais fbricas de cmeras

    fotogrficas (Nikon, Sony, Cnon, etc.). No mercado de cmeras amadoras, vemos uma

    variedade de modelos e preos, sem falar nos vrios equipamentos, como os telefones

    celulares, que possuem cmeras acopladas com melhor capacidade e qualidade de

    imagem em menos espao.

    A presena e importncia que a fotografia adquiriu nas comunicaes modernas,

    juntamente com a televiso e o cinema (desenvolvidos a partir dela), bem como o

    avano das tecnologias de informao e transmisso de dados tm contribudo para esta

    popularizao e transformado as relaes entre os indivduos e as imagens em uma

    vertiginosa velocidade.

    A passagem da fotografia para o campo da tecnologia digital causou,

    inicialmente, um enorme impacto no conceito at ento constitudo. Geraram-se com

    isso vrias discusses no campo fotogrfico, por tericos e profissionais que

    questionavam sua identidade fotogrfica, levando alguns a trat-la como uma mera

    simulao da fotografia verdadeira (analgica)5. O rpido processo de

    informatizao e o uso da representao digital transformaram sensivelmente a

    fotografia, o que levou alguns tericos do campo da imagem a denominar este novo

    perodo como ps-fotogrfico6.

    Santaella (1998) utiliza o termo ps-fotografia7 para se referir a criaes

    5 Sobre este aspecto, ver Teles (2005). 6 Ver mais sobre o assunto em Lister, Martin (org.)1997. La imagen fotogrfica em la cultura digital.

    Barcelona: Paids. 7 Santaella utiliza o termo ps-fotografico para denominar as imagens produzidas com a utilizao de processos matemticos. Ela descreve as modificaes do olhar no processo de produo de imagens em trs momentos: o primeiro o pr-fotogrfico, o qual se refere a imagens feitas mo, dependendo da habilidade

  • computacionais que, necessariamente, no se vinculam a um objeto, ou a um referente,

    ou seja, ela fala de imagens que vo alm do registro indicial. No entanto, tal termo tem

    sido utilizado tambm para designar a fluidez das imagens na contemporaneidade,

    ocasionada por transformaes, tanto nos processos de produo das fotografias -

    utilizando-se as cmeras digitais, por exemplo -, quanto nas suas formas de circulao,

    reproduo e de tudo aquilo que com ela se pode produzir e criar em termos imagticos.

    O perodo atual de intensa produo, manipulao e transformao da imagem

    fotogrfica amplia o prprio conceito de fotografia, que passa a abarcar as imagens

    produzidas pelas cmeras analgica e digital, e tambm as imagens que foram

    produzidas de modo analgico e posteriormente digitalizadas.

    Em tempos marcados pela rapidez, velocidade e fluidez, tambm nossas

    maneiras de olhar, apreciar e produzir sentidos se tornam fragmentadas e se

    transformam. A psfotografia se vincula ento aos tempos ps-modernos, indicando

    que no h uma tecnologia nica, frmulas, expresses e linguagens fixas, mas, sim, um

    amplo leque de possibilidades para a produo, circulao e consumo de repertrios

    imagticos e fotogrficos.

    As alteraes que vemos na fotografia so parte de um processo mais amplo, que

    envolve muitos outros setores de nossa vida. Machado (1997) comenta que a fotografia

    corrobora um movimento maior, que se d em todas as esferas da cultura, e que poderamos caracterizar resumidamente como um processo implacvel de "pixelizao" (converso em informao eletrnica) e de informatizao de todos os sistemas de expresso, de todos os meios de comunicao do homem contemporneo. A tela "mosaicada" do monitor representa hoje o local de convergncia de todos os novos saberes e das sensibilidades emergentes que perfazem o panorama da visualidade (e tambm da musicalidade, da "verbalidade") deste final de sculo (p.244).

    Vivemos em uma era, na qual a imagem fator predominante e sua centralidade

    nos meios de comunicao marcante. A coexistncia de diferentes formas de produzir

    a imagem fotogrfica e de convert-la em informao eletrnica, bem como a

    popularizao das cmeras digitais transforma as relaes e os olhares. Nossa insero

    nesses espaos de produo, circulao e consumo de imagens tambm nos constitui e

    manual de um indivduo (p. 303); o segundo, o fotogrfico, que se refere quelas imagens que mantm uma conexo dinmica e fsica com algo que existe no mundo. A produo dessas imagens depende de mquinas que so capazes de registrar objetos (...) as fotografias, filmes, vdeos e tambm a holografia (idem); o terceiro, o ps-fotogrfico, que diz respeito s imagens sintticas ou infogrficas que so inteiramente computacionais. (idem).

  • conforma nossos gostos, preferncias, escolhas, enfim, nossas identidades. Nessa

    direo, Silva (2005) argumenta que a fotografia no somente um meio de registro de

    imagens, mas tornou-se um hbito que hoje est inserido no cotidiano de milhes de

    pessoas. Para ele, tal fato

    refora a ideia de que no o mercado febril das cmeras digitais que est impulsionando novos hbitos: em vez de ser causa, a expanso no nmero de usurios conseqncia das velhas demandas de uma cultura que encontrou na gravao de imagens (fixas ou em movimento), uma das principais formas de lazer e de construo de identidades(p. 4).

    Dentro dessa perspectiva, o conceito de fotografia tambm passa por novos

    questionamentos e, com a fotografia digital, seu carter documental se reconfigura e

    surgem diversificadas formas de exibio e circulao. O referencial fotognico da

    imagem no mais uma regra constituinte do objeto. Para Machado (2005, p.311),

    Uma vez que hoje se pode tanto converter imagens fotogrficas em eletrnicas, quanto eletrnicas em fotogrficas, sem que nessa passagem permanea nenhuma marca do seu estado anterior, vive-se uma situao de indiferenciao entre os meios, situao essa que contagiante e ameaa at mesmo o mais singelo dos flagrantes.

    As mudanas ocorridas com o advento de novas tecnologias da imagem, a era

    digital, os hologramas, os programas de manipulao e de construo de imagens e as

    chamadas realidades virtuais suscitam discusses variadas sobre a imagem, em especial

    no que se refere fidedignidade fotogrfica. A imagem pode ser construda e

    modificada j na sua captao ou, ainda, a imagem capturada pode se tornar mltipla,

    destacando-se suas partes, aproximando ou distanciando, inserindo ou retirando

    elementos, de modo que a realidade ali retratada assuma cada vez mais o carter de

    construo.

    Desde seu surgimento, a fotografia passou por vrios processos de

    transformao. Sua conquista esteve ligada busca de procedimentos que lhe garantisse

    mais qualidade de imagem, facilidade de reproduo, leveza e rapidez. Apesar de a

    fotografia digital suscitar outra srie de questes, ela mais uma forma de captao de

    imagem, as cmeras digitais continuam funcionando com base na cmera escura.

    Trocamos o suporte fotossensvel pela placa CCD e continuamos tratando de imagens

    captadas segundo o princpio da cmera obscura, com seu registro da perspectiva

    Renascentista e com maior ou menor manipulao, dependendo do interesse do

  • Operador8 (TELES, 2005, p.3).

    Quanto mudana na sua forma de exibio, temos outras modificaes

    significativas, pois, em geral, as fotografias eram reservadas aos ambientes privados,

    arquivadas em porta-retratos ou em lbuns fotogrficos de famlia - expostos apenas a

    pequeno grupo de pessoas ntimas de uma determinada residncia. As viagens, as

    frias, a formatura, o casamento, tudo era registrado, impresso e organizado em um

    lbum para ser visualizado.

    Para se tornarem pblicas, as fotografias passavam por uma seleo especial,

    feita por experts que avaliavam a sua importncia social ou histrica e eram expostas

    em sales de arte, em revistas ou publicaes especficas. Hoje, alm dessas formas,

    vemos as fotografias sendo expostas e circulando com uma maior fluidez e mobilidade,

    quando passam a integrar as redes virtuais de computadores. Entretanto, esta

    virtualidade no significa imaterialidade e, apesar da leveza aparente do suporte, se

    fizermos uma comparao s antigas placas de cobre, vidro e papel utilizados na

    fotografia analgica, ainda necessitamos de um suporte para sua visualizao - agora os

    acessrios so o cabo USB, uma tela de cristal lquido e o cordo umbilical que nos

    conecta a rede.

    Pierre Lvy (1999) argumenta que no h uma desmaterializao da imagem,

    mas, sim, sua virtualizao. O universo do privado se ampliou e hoje no

    necessitamos mais nos deslocar para a casa de algum para ver determinada foto,

    podemos visualiz-la na tela do computador, por e-mail, atravs de lbuns virtuais

    privados os fotologs ou, ainda, em lbuns particulares disponibilizados ao pblico

    em sites especficos de imagem. Apesar de todas essas mudanas, continuamos a falar

    de imagens e de fotografia. Obviamente, as transformaes no tipo de suporte ou nas

    formas de produo de circulao e de consumo de fotografias tambm alteram nossas

    relaes com tais imagens, bem como as maneiras como elas nos convocam, nos

    comunicam e, efetivamente, constituem nossas identidades.

    8 Barthes em a Cmera Clara coloca que: uma foto pode ser objeto de trs prticas (ou de trs emoes, ou de trs intenes): fazer, suportar, olhar. O Operador aquele que manipula a cmera - o fotgrafo, O Spectador somos todos ns, que compulsamos (manuseamos), nos jornais, nos livros, nos lbuns, nos arquivos, colees de fotos. E aquele ou aquela que fotografado, o alvo, o referente, espcie de pequeno simulacro, [...] eu chamaria de Spectrum da fotografia, porque essa palavra mantm, atravs da raiz uma relao com o espetculo [...] (BARTHES, 1984, p.20).

  • Lugares de Memria: lbuns fotogrficos, analgicos e digitais.

    A relao da fotografia com a memria tem instigado estudos de vrios

    pesquisadores e artistas contemporneos e, entre eles, destacamos os tericos Etienne

    Samain, Philippe Dubois, Roland Barthes e o historiador Boris Kossoy. Seus trabalhos

    abrangem questes histricas e tambm conceituais e filosficas da fotografia, servindo

    de referncia para estudiosos dos mais diversos campos como o da Histria, das Artes,

    da Filosofia e, mais recentemente, da Antropologia (Visual), Arquitetura e Educao,

    que buscam pensar a fotografia como um lugar possvel de pesquisa e interlocuo de

    saberes.

    Em nossa contemporaneidade, cujo tempo fluido, acelerado e os olhares

    passageiros, somos bombardeados, atravs dos vrios meios de comunicao, por

    uma srie de imagens predominantemente fotogrficas. Estejam elas em publicaes

    como revistas, jornais, lbuns fotogrficos, diversos sites da Internet, obras de arte ou,

    ainda, em filmes e vdeos formados por fotografias em movimento as fotografias

    nos ensinam maneiras de nos entendermos e nos constituirmos, produzindo memrias

    imagticas que nos servem de referncia para a construo de nossas identidades.

    Kossoy (2005) afirma que a imagem fotogrfica estabelece uma relao com as

    lembranas dos indivduos, sejam elas individuais ou coletivas, contribuindo para a

    formao e reafirmao de referenciais visuais construdos ao longo da histria dos

    sujeitos. Para ele, a fotografia nos envolve em sua narrativa atemporal:

    Quando apreciamos determinadas fotografias nos vemos, quase sem perceber, mergulhando no seu contedo e imaginando a trama dos fatos e as circunstncias que envolveram o assunto ou a prpria representao (o documento fotogrfico) no contexto em que foi produzido: trata-se de um exerccio mental de reconstituio quase intuitivo. Fotografia memria e com ela se confunde. O estatuto de recorte espacial-interrupo temporal da fotografia se v rompido na mente do receptor em funo da visibilidade e verismo dos contedos fotogrficos. A reconstituio histrica de um tema dado, assim como a observao do indivduo rememorando, atravs dos lbuns, suas prprias histrias de vida, constitui-se num fascinante exerccio intelectual pelo qual podemos detectar em que medida a realidade se aproxima da fico (p.40).

    Nessa direo, as imagens fotogrficas possibilitam a identificao dos

    indivduos com determinado fato, situao ou local, pois estabelecem elos entre

    acontecimentos vividos e recordados.

  • Assim como Kossoy nos fala da existncia de uma relao estreita entre as

    fotografias vistas ou produzidas e nossa memria, tambm para Dubois (1984) a

    memria feita de fotografias e seu estatuto indicial faz dela o equivalente visual

    exato da lembrana, uma foto sempre uma imagem mental (p.314). Ele explica que a

    fotografia uma forma de acessar nossas referncias virtuais de memria, pela relao

    que ela tem com os procedimentos chamados de artes da memria um conjunto de

    tcnicas artificiais de mnemotcnica concebido na Grcia Antiga, que utiliza um jogo de

    duas noes: os lugares e as imagens.

    Dubois (idem) afirma que a lembrana uma atividade mental, que encontra na

    fotografia uma das formas modernas que mais se aproxima dessas tcnicas. Para ele, a

    fotografia uma mquina da memria, na qual a cmera, suas objetivas e a pelcula

    seriam o lugar; as impresses, inscries e revelaes seriam as imagens. No entanto,

    mesmo sendo uma atividade mental, como afirma Dubois, nossa memria uma

    construo cultural que se produz e se modifica constantemente nas vrias situaes e

    momentos em que atuamos. Como ressalta Picolo (2009), seguindo as teorizaes de

    Halbwachs,

    pertencer a um determinado grupo condio primordial para o registro da memria, que tratada pelo autor como um fenmeno de natureza social. A coletividade vai influir na formao da memria individual, que sofre mudanas conforme o lugar que o indivduo ocupa, por ser um ponto de vista sobre a memria coletiva. Assim, cada sociedade recorta o espao a seu modo, de forma a constituir um quadro fixo onde encerra e localiza suas lembranas (p.2).

    Diversos autores, tais como Maurice Halbwachs (1990) e Ecla Bosi (1994)

    afirmam que a memria coletiva, e que, mesmo as lembranas aparentemente mais

    particulares remetem a um grupo, pois estamos sempre interagindo na sociedade, nos

    mais diversos lugares e posies e nestes contextos que construmos nossas

    lembranas. Todavia, segundo Halbwachs (1990), dizer que a memria coletiva no

    significa negar a participao de cada pessoa na produo do que lembrado:

    Diramos voluntariamente que cada memria individual um ponto de vista sobre a memria coletiva, que este ponto de vista muda conforme o lugar que ali eu ocupo, e que este lugar mesmo muda segundo as relaes que mantenho com outros meios (textos e imagens, por exemplo). Todavia, quando tentamos explicar esta diversidade, voltamos sempre a uma combinao de influncias que so, todas, de natureza social (p.51).

    Ele segue argumentando que a lembrana individual construda por

    representaes comuns de um determinado referencial coletivo. Para o autor, uma

  • lembrana se estabelece numa teia de lembranas coletivas que se reconectam,

    produzindo memrias e fazendo com que o indivduo possa recri-las e recont-las para

    si e para o grupo.

    Sob esta perspectiva terica, j Bosi (1994), falando tambm da memria, faz

    uma distino entre a matria e o modo de lembrar. Enquanto a matria - o que

    lembrado -, marcado pelo interesse que a sociedade tem pelo fato, o modo - como

    lembramos - estaria relacionado ao indivduo, a sua personalidade e ao seu

    temperamento.

    Assim, de acordo com o seu lugar social, com os grupos dos quais participa e

    com suas caractersticas particulares, cada pessoa atribui aspectos distintos a memrias

    coletivas. Podemos pensar que nossa memria resulta do somatrio das mltiplas

    experincias e variadas informaes produzidas nos locais que freqentamos, assim

    como das representaes de lugares, pessoas ou acontecimentos propiciados pelas

    fotografias - imagens estas que se tornam lembranas insubstituveis que constroem

    uma vida para si e para os outros (KOURY, 2008, p.168).

    Desta forma, entendendo a fotografia como construtora de memrias e tambm

    como uma produo cultural, podemos pensar que, atravs dela, produzimos

    determinadas narrativas nas quais estamos envolvidos. Para lermos uma fotografia, seja

    ela de um grupo particular de pessoas, de lugares em que vivemos ou visitamos,

    utilizamos nossas lembranas das experincias, dos conhecimentos e das histrias

    pessoais. Dessa maneira, quando olhamos uma foto de um determinado local, como

    uma paisagem natural, uma cidade ou um bairro, podemos atribuir mltiplos sentidos a

    estas imagens, de acordo com as lembranas que temos destes locais, o que pode tornar

    tais memrias agradveis ou no. Se for uma recordao agradvel, a fotografia vista

    recebe a mesma conotao, suscitando lembranas tambm agradveis, desejos de

    retornar aos locais ou rever as pessoas. A fotografia pode nos fazer pensar em uma

    casa, cidade ou um jardim de nossa infncia, mesmo que no tenhamos estado neste

    local em particular; entretanto, de acordo com as experincias que tivemos, construmos

    imagens com as quais nos identificamos.

    Quando vemos determinadas fotografias, no s utilizamos nossas lembranas

    pessoais na construo de referenciais imagticos, como tambm as de outros: daqueles

  • que estiveram nos locais e os fotografaram. Nossas recordaes individuais so, ento,

    construdas na tessitura das memrias dos diversos grupos sociais nos quais nos

    inserimos. Ao alimentarmos nossas memrias pessoais com lembranas coletivas e

    histricas, acrescentamos elementos mais amplos do que aqueles de que dispomos

    individualmente. Picolo (2009) nos diz que:

    Conhecemos a memria pessoal pelo interior, mas a memria coletiva s nos conhecida exteriormente. Assim sendo, a memria se modifica e se rearticula conforme posio que ocupo e as relaes que estabeleo nos diferentes grupos de que participo. Est submetida a questes inconscientes, como o interesse, a afetividade, o desejo, a inibio, a censura, que exercem sobre a memria individual manipulaes conscientes ou no. Tambm, a memria coletiva foi posta em jogo na luta das foras sociais pelo poder (p.2).

    Retomo esse conjunto de ideias para dizer que, quando vemos fotografias de

    lugares que nunca fomos, sejam eles distantes ou prximos, utilizamos a lembrana do

    olhar do outro e ela se torna um convite para conhecermos e vivenciarmos novas

    situaes. Essas imagens se tornam tambm parte de nossas memrias visuais, pois uma

    forma de nos apropriarmos e compreendermos um pouco mais sobre um local vermos

    suas vrias fotografias. Ainda que essas imagens sejam parte de uma viso particular e

    de um recorte interpretativo, elas nos servem de referncia para aprendermos e para

    experimentarmos aquilo que nos estranho, tornando-o, de algum modo, reconhecvel

    para que assim nos sintamos acolhidos e parte daquela histria.

    Desde o surgimento das primeiras fotografias, essa tcnica tem sido utilizada

    pelos indivduos como uma maneira de conhecer o mundo, uma forma de aprendizagem

    sobre determinada cultura, sua arquitetura, sua arte e dos valores dos distintos grupos

    sociais. Com o aumento de sua popularidade, foram vrias as produes fotogrficas

    que procuravam registrar, reapresentar, detalhar e, at mesmo, catalogar os locais e

    cidades distantes. Utilizada principalmente por sua caracterstica indicial, para

    documentao, preservao e exemplificao das coisas, passou a servir tambm para a

    contestao e registro das mudanas ocorridas nas sociedades, tanto de seus olhares

    como de seus espaos, tornando-se, com isso, um dos cones da modernidade e da nova

    visualidade. Possamai (2007) argumenta que, dentre as tcnicas visuais modernas, a

    fotografia parece ser a que mais promove a prtica da coleo, o que se justificaria por

    algumas caractersticas principais como: a facilidade de produo e reproduo de

    cpias com relativo baixo custo, sua acessibilidade visual, uma vez que no requer

  • sofisticados equipamentos para ser visvel sempre se pode fazer uma cpia material e,

    alm disso, o prprio exerccio fotogrfico, ao fazer surgir uma quantidade inesgotvel

    de imagens acaba por criar colees (p.2) 9.

    Hoje, segundo a autora, com o avano

    tecnolgico da fotografia, a prtica do

    "colecionismo" tambm cresceu; todavia,

    diferentemente do que se pensava antes, o

    conhecimento total do mundo no pode ser

    atingido atravs dela, j que uma viso, uma

    interpretao e um recorte. Assim, a produo

    vertiginosa de imagens que fazemos, torna-se um

    ato de colecionar fragmentos da vida, a fotografia

    permite a coleo do objeto fotografado e, neste

    sentido, colecionar fotografias significa poder

    colecionar o mundo, as coisas e as pessoas (idem).

    Penso que, contrrio ao ato conhecido de

    colecionar que visa adquirir para si o objeto,

    tirando-o de circulao para sua proteo e

    valorizando-o por sua histria e, raridade, atribuindo-lhe assim, valor de mercado

    hoje temos o que Beatriz Sarlo (2006) denomina de colecionador s avessas.

    Atualmente, temos uma grande facilidade de produo e difuso das fotografias,

    intensificada pela tecnologia digital e, desse modo, o compartilhamento e a aquisio de

    imagens fotogrficas fez com que elas se tornassem tambm descartveis para alguns.

    Esses colecionadores s avessas no valorizam os objetos fotogrficos em si mesmos,

    mas o ato de aquisio. Para eles, assim que um objeto incorporado coleo, ele

    perde o seu valor. Conforme Sarlo

    adquiridas, as mercadorias perdem sua alma; na coleo, ao contrrio, a alma das coisas enriquece medida que a coleo vai se tornando mais e mais rica [...] a antiguidade implica mais valor. Para o colecionador as avessas, o desejo no tem um objeto como qual possa conformar-se, pois sempre haver outro objeto chamando sua ateno (2006, p.27).

    9 A autora desenvolve tal argumentao no artigo: Narrativas fotogrficas sobre a cidade: POSSAMAI, Zita Rosane, 2007. Disponvel: www.scielo.com.br, acesso: 16/08/08.

    Foto 1: foto retirada de Possamai, 2007

    Foto 2: foto retirada de Possamai, 2007

  • Independente do fato de armazenarmos nossas imagens com o objetivo de

    preservar ou compartilhar, a questo da fotografia como memria e a prtica da coleo

    nos remete inevitavelmente ao lbum fotogrfico, cujo ato de selecionar e reunir

    determinadas imagens nos liga narrativa10. Jacques Aumont (1995) nos coloca que a

    narrativa tradicionalmente definida pela "narratologia" como sendo um conjunto

    ordenado de significantes, cujos significados constituem uma histria. Para ele, existe

    uma representao de espao e de tempo na imagem, pelo fato dela apresentar tambm

    um fato que situado em dado contexto geogrfico e cronolgico; todavia,

    especialmente, porque a imagem representativa costuma ser uma imagem narrativa

    (p.244). O autor retoma o estudo de Gaudreault11, no qual ele destaca os trs tipos de

    narrativa (em Plato): a narrativa que exclui a mimese, a narrativa que comporta a

    mimese e a narrativa mista12. Gaudreault (idem) estende esta ultima definio para o

    cinema, que poderamos tambm aplicar na fotografia. Para ele a narrao

    propriamente dita, qualquer que seja o suporte - escritural, teatral ou cinematogrfico,

    restringe-se ao telling - ao dizer -, e prope que se diferencie rigorosamente da narrao

    aquilo que ele chama de mostrao - showing (p.245).

    Aumont (idem) segue explicando que a imagem possui dois nveis de

    narratividade: o inscrito na imagem nica, processo codificado em uma cena e o que se

    situa na ordenao seqencial das fotografias no lbum fotogrfico. No caso dos lbuns

    fotogrficos tradicionais, as imagens so colocadas de forma a construir uma narrativa

    que possibilite a reconstituio da viso fragmentada de uma nica foto. Possamai

    (2007), ao falar dos lbuns fotogrficos de vistas urbanas13, coloca que esta

    intencionalidade ainda mais flagrante pela impossibilidade de ser alcanada em uma

    nica representao fotogrfica, a dimenso colossal do espao urbano (p.3).

    Assim como uma fotografia uma construo intencional de significados, ao

    organizar um lbum o autor - ou autores -, seleciona determinadas imagens, segundo

    alguns critrios, intenes e olhares situados numa dada poca, em que esta sendo

    10 Ver mais sobre narrativa, tempo e espao em ALMON (1995) p.244-254. 11 GAUDREAULT, Andr.Du littratire au filmique,Mridiens-Klinck-sieck,1988. 12 A primeira a narrativa exclusivamente verbal, a segunda constitui-se por uma analogia das aes e das palavras (teatro) e a narrativa mista comporta a parte verbal e a parte mimtica referindo-se a mais a literatura. (ALMON, 1995, p.244) 13 Ver mais sobre o assunto na tese da autora: A cidade fotografada: memria esquecimento nos lbuns fotogrficos de Porto Alegre - dcadas de 1920 a 1930, na qual pesquisa trs lbuns histricos da capital do RS.

  • produzido.

    A questo autoral no lbum fotogrfico tambm possui sua peculiaridade quando

    comparada ao ato fotogrfico. A produo de uma fotografia uma atividade solitria e,

    embora possa haver uma equipe na execuo, em geral, a autoria e a concepo so

    atribudas a um nico autor, diferentemente da construo de um lbum que tambm

    pode ser feita por um grupo ou vrios grupos de indivduos. No caso de lbuns

    fotogrficos de cidades, esta narrativa interessada procura mostrar e ensinar ao leitor

    como v-la de determinada maneira, atravs das escolhas e do ordenamento das

    imagens fotogrficas.

    importante considerar, em relao aos lbuns fotogrficos, que as formas de

    transmisso, manuteno e circulao de informaes se transformaram radicalmente

    nas ltimas dcadas e com elas as maneiras de narrarmos. A grande velocidade e o ritmo

    fragmentado que se estabelece nas grandes cidades constroem outras formas de

    trocarmos informaes, como o surgimento da imprensa e do rdio; posteriormente, o

    da televiso; mais recentemente, o da Internet, configurando-se como formas capazes de

    levar informaes ao crescente contingente populacional das cidades contemporneas,

    tarefa antes feita por narradores que atingiam apenas um pequeno grupo. Nesse

    contexto, inserem-se as imagens visuais, em especial as fotografias, (que) tambm se

    revelam como forma de dar a ver o mundo e as coisas, na perspectiva da plausividade

    exigida pela informao (POSSAMAI, 2007, p.3).

    Teles (2005) destaca que hoje, com ao advento da Internet e crescente exibio e

    circulao de fotografias na rede, h uma reconfigurao da

    noo dos lbuns de fotografias do passado, do que prprio de ser registrado ou no. A conexo de computadores em rede instaura novas formas de comunicao e relao social, com abundncia de imagens e informaes que podem ser selecionadas, mas no controladas (p.8).

    A Internet, como ferramenta de comunicao e de interconexes, instaura novas

    percepes para o lbum fotogrfico. Diferentemente dos lbuns tradicionais

    analgicos, os lbuns virtuais estabelecem uma nova relao temporal e de visibilidade

    com os indivduos. Constitudos basicamente por fotografias, configuram um espao

    selecionado para receb-las e tornam a imagem fotografada visvel e fluida para uma

    grande gama de indivduos, constituindo-se um dos fenmenos cibercultura que

  • eclodiram no ciberespao nos ltimos anos (TELES, 2005, p.4).

    Ao falarmos de lbuns fotogrficos virtuais, estamos tratando, portanto, de uma

    nova forma de comunicao e de uma conseqente troca de suporte. Isso significa que

    ocorrem necessariamente mudanas na maneira como nos relacionamos com tais

    lbuns.

    Dentre essas mudanas, temos a grande visibilidade e difuso de suas imagens,

    distinta dos lbuns analgicos tradicionais, cuja abrangncia restringia-se a um pequeno

    grupo de pessoas que poderiam ver as imagens apenas em um ambiente privado (entre

    quatro paredes). Hoje, com a rede de computadores, temos a possibilidade de tornar

    pblico esse lbum - ou lbuns - e suas imagens, abrangendo um maior nmero de

    pessoas interessadas na temtica, independente de nossas relaes pessoais.

    Outra mudana j indicada se refere noo de coleo: na fotografia digital, as

    imagens no sustentam a noo de raridade e, embora algumas sejam destacadas e at

    mesmo tratadas com maior discusso, elas so volteis, descartveis e multiplicam-se

    indefinidamente. Mesmo em se tratando de lbuns fotogrficos temticos, cujas

    fotografias so o destaque - diferentemente dos fotologs que se caracterizam por dirios

    virtuais -, hoje as fotografias esto l, mas amanh podem ser outras.

    Alteram-se, tambm, as formas de narrativa, uma vez que nos lbuns virtuais

    no h necessariamente uma seqencialidade linear, mas sim mltiplas possibilidades de

    acesso a uma ou a outra fotografia. Os lbuns fotogrficos, em geral, sejam analgicos

    ou digitais, estabelecem-se na circularidade temporal, isto , apesar de uma suposta

    ordenao, podemos corromp-la, estabelecendo nosso prprio tempo visual,

    percorrendo as pginas e retornando, estabelecendo novas conexes. No entanto, os

    lbuns virtuais acentuam e potencializam essas caractersticas, com uma maleabilidade

    muito maior, que prpria do meio em que a intertextualidade se estabelece com uma

    maior fluidez e rapidez.

    Tal como no lbum analgico, cuja autoria pode se estabelecer como uma

    produo individual e tambm de grupos, no lbum fotogrfico virtual ao acessarmos

    uma determinada coligao, reunida sobre uma temtica, temos tambm a possibilidade

    de visualizarmos o lbum de um nico indivduo participante. Ainda que as novas

    tecnologias tenham gerado novos suportes de expresso e ocasionado todas estas

  • mudanas, o lbum fotogrfico parece manter certas caractersticas distintivas, tais

    como uma seleo de imagens, uma coleo conformada sobre uma ou vrias intenes.

    E na fluidez desses tempos e espaos virtuais, eles seguem estabelecendo narrativas e

    memrias.

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