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A FORMAÇÃO DOS INTÉRPRETES EDUCACIONAIS DE LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS E SUA POLIVALÊNCIA Lucielma Karla de Vasconcelos Rêgo Faculdade do Norte do Paraná FACNORTE [email protected]. Eliete Correia dos Santos Universidade Estadual da Paraíba UEPB [email protected] Este artigo aborda a importância da formação dos intérpretes educacionais de Libras e sua polivalência, cujo objetivo da pesquisa foi analisar a percepção desses profissionais que atuam na cidade de Caruaru-PE, sobre os aspectos da polivalência na sua atividade profissional, e identificar as dificuldades encontradas na sua atuação, quais os mecanismos desenvolvidos por eles para superar as dificuldades e analisar a importância da sua formação para se trabalhar de forma polivalente. Foi realizado um estudo descritivo, exploratório, empregando a abordagem qualitativa e para obter as informações, optamos pelo questionário semiestruturado enviado para 40 intérpretes educacionais, porém, obtivemos apenas a resposta de 21. Os dados evidenciaram que este profissional não está preparado para trabalhar de forma polivalente, pois precisa de formação mais adequada e especifica. Enfim, apesar de haver alguma formação entre os participantes da pesquisa, é claro que suas formações ainda não estão voltadas, de fato, para a sua atuação como intérpretes dentro do âmbito educacional. Conclui-se que o papel do intérprete no contexto educacional inclusivo é importantíssimo para os surdos, porque é através deste profissional que podemos destacar a relevância e contribuição que ele traz no processo de ensino/aprendizagem destes alunos, fazendo com que esse processo ocorra de forma mais eficaz e segura, é importante que estes profissionais se unam para requerer e enviar propostas de formação e capacitação mais específicas dentro da área de atuação de acordo com cada disciplina ou área, e enviar para o poder executivo Municipal e Estadual. Palavras-chave: Intérprete, Formação continuada, Aluno surdo, Inclusão escolar. 1 INTRODUÇÃO A questão da surdez sempre foi cercada de muitos preconceitos e dificuldades, pois se acreditava que os surdos não podiam ser educados, e eram tratados como incapazes e limitados em seus direitos, eram impedidos de exercer plenamente sua cidadania em decorrência da barreira de comunicação existente entre eles e as pessoas ouvintes. (LACERDA, 2005). Esse contexto adverso começou a se modificar com o surgimento da língua de sinais. Essa forma de comunicação, inicialmente desenvolvida voluntariamente por amigos e familiares, foi se consolidando até surgir o intérprete de LIBRAS (língua brasileira de sinais), que pode ser considerado um passo fundamental para que os surdos conquistem seu direito à cidadania e sua inclusão na sociedade.

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A FORMAÇÃO DOS INTÉRPRETES EDUCACIONAIS DE LÍNGUA

BRASILEIRA DE SINAIS E SUA POLIVALÊNCIA

Lucielma Karla de Vasconcelos Rêgo Faculdade do Norte do Paraná – FACNORTE [email protected].

Eliete Correia dos Santos Universidade Estadual da Paraíba – UEPB – [email protected]

Este artigo aborda a importância da formação dos intérpretes educacionais de Libras e sua

polivalência, cujo objetivo da pesquisa foi analisar a percepção desses profissionais que atuam na

cidade de Caruaru-PE, sobre os aspectos da polivalência na sua atividade profissional, e identificar as

dificuldades encontradas na sua atuação, quais os mecanismos desenvolvidos por eles para superar as

dificuldades e analisar a importância da sua formação para se trabalhar de forma polivalente. Foi

realizado um estudo descritivo, exploratório, empregando a abordagem qualitativa e para obter as

informações, optamos pelo questionário semiestruturado enviado para 40 intérpretes educacionais,

porém, obtivemos apenas a resposta de 21. Os dados evidenciaram que este profissional não está

preparado para trabalhar de forma polivalente, pois precisa de formação mais adequada e especifica.

Enfim, apesar de haver alguma formação entre os participantes da pesquisa, é claro que suas

formações ainda não estão voltadas, de fato, para a sua atuação como intérpretes dentro do âmbito

educacional. Conclui-se que o papel do intérprete no contexto educacional inclusivo é importantíssimo

para os surdos, porque é através deste profissional que podemos destacar a relevância e contribuição

que ele traz no processo de ensino/aprendizagem destes alunos, fazendo com que esse processo ocorra

de forma mais eficaz e segura, é importante que estes profissionais se unam para requerer e enviar

propostas de formação e capacitação mais específicas dentro da área de atuação de acordo com cada

disciplina ou área, e enviar para o poder executivo Municipal e Estadual.

Palavras-chave: Intérprete, Formação continuada, Aluno surdo, Inclusão escolar.

1 INTRODUÇÃO

A questão da surdez sempre foi cercada de muitos preconceitos e dificuldades, pois se

acreditava que os surdos não podiam ser educados, e eram tratados como incapazes e

limitados em seus direitos, eram impedidos de exercer plenamente sua cidadania em

decorrência da barreira de comunicação existente entre eles e as pessoas ouvintes.

(LACERDA, 2005). Esse contexto adverso começou a se modificar com o surgimento da

língua de sinais. Essa forma de comunicação, inicialmente desenvolvida voluntariamente por

amigos e familiares, foi se consolidando até surgir o intérprete de LIBRAS (língua brasileira

de sinais), que pode ser considerado um passo fundamental para que os surdos conquistem

seu direito à cidadania e sua inclusão na sociedade.

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Na atualidade, é indispensável e determinante a atuação do profissional intérprete de

LIBRAS para a edificação da vida educacional do surdo. Nesse diapasão se dá o

reconhecimento de Libras, através da homologação da Lei Federal nº 10.436 de 24 de abril de

2002, que traz o reconhecimento da Libras e do profissional intérprete, bem como inclui os

surdos nas instituições de ensino. (QUADROS, 2004).

A lei 12.319 (2010) estabelece que a formação profissional do tradutor e intérprete de

Libras-Língua Portuguesa em nível médio, deve ser realizada por meio de:

I - cursos de educação profissional reconhecidos pelo Sistema que os credenciou; II -

cursos de extensão universitária; III - cursos de formação continuada promovidos por

instituições de ensino superior e instituições credenciadas por Secretarias de

Educação.(BRASIL, 2010).

Atualmente, o cenário que se encontra dentro do âmbito educacional vinculando o

profissional intérprete de língua de sinais, tem surgido como atributo no contexto da

interpretação à polivalência, já que através dela ocorrem diversos tipos de interpretações

realizadas dentro e fora da escola, desde as disciplinas até os passeios culturais, palestras,

gincanas, e também entre surdos/professores, pais/surdos/professores e alunos/surdos,

facilitando a comunicação entre eles. Porém, não há a menor preocupação das pessoas de

maneira geral (escola e sociedade), com a formação desse profissional e se ele estaria ou não

preparado para os diversos tipos de interpretações que surgem para serem realizadas.

A partir do conhecimento empírico de uma das pesquisadoras durante cinco anos

interpretando em uma sala de aula de uma escola do Estado de Pernambuco, surgiu-se o

interesse em realizar uma pesquisa em que o objetivo geral desta pesquisa é analisar a

percepção de intérpretes educacional de língua brasileira de sinais, que atuam na cidade de

Caruaru-PE, sobre os aspectos da polivalência na sua atividade profissional.

O município de Caruaru, em face de sua localização geográfica e importância cultural,

econômica e política, assume a função de difundir para as cidades do entorno, e até mesmo

para todo o interior do estado de Pernambuco, muitos dos avanços científicos e as

consequentes inclusões sociais que podem propiciar. Registra-se que a despeito dessa

característica, existem na cidade 40 intérpretes educacionais de língua de sinais, revelando

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uma carência de cursos de Libras e de formação de intérpretes.

E fundamentada no objetivo geral e específicos desta pesquisa vamos identificar as

dificuldades enfrentadas pelos intérpretes educacionais de Libras no exercício de sua

atividade prática profissional, analisando a importância da formação dos intérpretes para atuar

de forma polivalente, verificar os mecanismos desenvolvidos para superar as dificuldades

encontradas.

A partir desta pesquisa pretende-se chamar a atenção para a importância da formação

desse profissional intérprete para sua atuação, seja no contexto educacional ou social, e deste

modo, a conscientização possa despertar para uma maior cobrança em relação à formação

desse profissional, para que todos possam entender a relevância desta formação e através das

análises e discussões dessa pesquisa contribuir para meio cientifico.

2 METODOLOGIA

Esta pesquisa é descritiva, exploratória e de abordagem qualitativa e para o

levantamento da coleta dos dados foi aplicado um questionário contendo 10 questões abertas,

junto aos sujeitos participantes. Foram convidados à participar dessa pesquisa, 40

tradutores/intérpretes educacionais da língua brasileira de sinais (Libras) independente de

gênero, idade e instituição educacional, fossem eles do Município (ensino fundamental),

Estado (ensino médio) ou Particular (ensino fundamental, médio e superior) e foram

abordadas apenas escolas do perímetro urbano no Município de Caruaru – PE, porém apenas

21 tradutores/intérpretes participaram desta pesquisa, respondendo ao questionário e

assinando o termo de consentimento livre e esclarecido.

O local da pesquisa foi desenvolvido com intérpretes educacionais do município de

Caruaru em instituições de ensino do Município (ensino fundamental), Estado (ensino médio -

sendo 02 escolas de jornada integral, 04 de jornada semi-integral e 08 de jornada regular) e

Particulares (ensinos fundamental, médio e superior), localizado a 138 km da capital Recife, e

em face de sua localização geográfica e importância cultural, econômica e política, assume a

função de difundir para as cidades do entorno, e até mesmo para todo o interior do estado de

Pernambuco, muitos dos avanços científicos e as consequentes inclusões sociais que possam

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propiciar.

A amostra deu-se por saturação, isto é, a amostragem e a integração de mais materiais

fez com que encerrássemos quando não houve mais o surgimento de nada novo. (FLICK,

2004). Após o esclarecimento do que vem a ser polivalência, foram utilizadas as seguintes

questões como norteadoras da entrevista: As dificuldades encontradas na prática em

decorrência da polivalência, como procura superar as dificuldades, como avalia a formação

para enfrentar os problemas decorrentes da polivalência e o que precisa ser modificado

atualmente na formação do intérprete de língua brasileira de sinais em relação à polivalência?

Nesta pesquisa serão usadas as seguintes categorias de analises: I - O perfil de

formação acadêmica e profissional dos intérpretes, onde serão discutidos os obstáculos e

dificuldades encontradas por estes profissionais na sua atuação como intérprete de língua de

sinais, a sua formação, tempo de atuação e se o intérprete tem outras formações associados a

esta área, II - A percepção da profissão de intérprete, que vai abordar qual o papel deste

profissional dentro das instituições educacionais, a escolha dos participantes em relação a esta

profissão, a visão dos intérpretes em relação a polivalência na sua atuação e a opinião quanto

a definição da atuação deste profissional e III - A atuação como intérprete através de uma

autoavaliação destes profissionais e dilemas encontrados na sua atuação.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

No Município de Caruaru-PE, infelizmente ainda não são suficientes o números de

tradutores / intérpretes para o número de alunos surdos existente, pois ainda existe escola que

tem o aluno surdo e não tem o intérprete na sala de aula, mais dentre os 40 intérpretes

educacionais de língua de sinais que compuseram a população do estudo, 19 não participaram

do estudo, tendo a participação de 21 intérpretes educacionais, o que correspondeu há um

pouco mais de 50% da população de estudo, percentual considerado representativo, sendo 11

intérpretes de escolas do Estado, 05 de escolas particulares e 04 de escolas do Munícipio.

Na pesquisa, os questionários foram entregues pessoalmente a 07 intérpretes e

encaminhado para 33 intérpretes por e-mail, totalizando 40 questionários. Destes 40

questionários foram respondidos 15 por e-mail, 07 no ato da entrega, enquanto 18

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questionários que foram enviados por e-mail não obtivemos resposta.

Dos 21 intérpretes educacionais que participaram da pesquisa 13 são mulheres e 08

homens, com faixa etária entre 19 e 45 anos. Estes profissionais trabalham em diferentes

níveis de ensino: fundamental (5º ano ao 7º ano), médio (1º ano ao 3º ano) e superior (1º e 3º

período). Destes intérpretes, dois trabalham em duas escolas uma do Estado e a outra do

Munícipio de Caruaru.

3.1 Perfil de formação acadêmica e profissional dos intérpretes

No gráfico 01, será aborda a questão de número 01 do questionário em que se fala sobre a

formação dos intérpretes educacionais em todos os níveis, de acordo com as respostas

repassadas pelos participantes da pesquisa nos questionários.

Gráfico 01- Qual A Formação Dos Intérpretes

Fonte: Elaborado pelo próprio autor (2015).

De acordo com o gráfico acima, percebesse que dos 21 tradutores/intérpretes apenas

quatro (19%), concluíram a graduação; cinco (24%), estão cursando Licenciatura em

Letras/Libras; um (5%), concluiu o curso de Bacharelado em Letras/Libras; um (5%), está

cursando o curso de Letras/Libras; um (5%), concluiu o curso de Bacharelado em Serviço

19% 24%

5% 5% 5% 10%

19% 10% 5% 5% 5%

14% 71%

5% 5% 10%

14% 10%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80%

LICENCIATURA EM LETRAS/LIBRAS - CONCLUIDO

BACHARELADO EM LETRAS/LIBRAS - CONCLUIDO

SERVIÇO SOCIAL – CURSANDO

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA - CONCLUIDO

LICENCIATURA EM HISTÓRIA - CONCLUIDO

MAGISTÉRIO - CONCLUIDO

HABILITADO EM TODOS NÍVEIS DO CURSO DE …

PÓS-GRADUAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA - …

PRO LIBRAS EM TRADUÇÃO E INTERPRETAÇÃO DA …

Percentual - Formação

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Social; dois (10%), possuem a graduação em Licenciatura em Letras; quatro (19%),

concluíram o curso de Letras; dois (10%), estão cursando Licenciatura em Pedagogia; um

(5%), é formado em Licenciatura em História; um (5%), tem sua formação em Magistério;

três (14%), têm apenas o ensino médio; cinco (71%); são habilitados em todos os níveis do

curso de Libras (básico, intermediário, avançado e interprete); um (5%), tem pós-graduação

em Libras e Educação Especial; um (5%), possui pós-graduação em Língua Portuguesa; dois

(10%), têm proficiência no ensino da Libras e Prolibras em tradução e interpretação da Libras;

três (14%), têm Prolibras em tradução e interpretação da Libras; e um (5%), tem pós-

graduação apenas em Libras.

Diante desses dados, percebemos que apesar de haver alguma formação entre os

participantes da pesquisa, suas formações ainda não estão voltadas de fato para a sua atuação

como intérpretes dentro do âmbito educacional, e isso pode ocorrer por diversos motivos,

porém, é de relevância lembrar que os resultados acima são frutos de buscas particulares, e o

governo na estância federal, procura até oferecer algum suporte, como é o caso do MEC que

lançou o curso de Licenciatura e Bacharelado em Letras/Libras, mas o governo do Estado e

do Munícipio, não investem nesta área, e isso gera alguns desconfortos dentro das instituições

de ensino.

A falta de formação que pode levar este profissional a realizar um trabalho

improvisado, atrapalhando assim a seriedade de sua atuação, e com este pensamento o

Ministério da Educação (MEC) procurou colocar como objetivo na formação deste

profissional uma formação específica em algumas Licenciaturas, ou através da seleção de

alguns docentes da rede regular de ensino, com o intuito de prepará-los para atuarem como

intérpretes. (SILVA; JUNIOR; LIMA, 2008). Cada analise que é realizada sobre a

importância destes profissionais, seja na área educacional ou não, mais se percebe a

complexidade e dimensões nas suas interpretações.(PERLIN, 2006).

Para uma formação adequada o intérprete precisa ter domínio das línguas envolvidas

na interpretação e tradução, é necessário que estes profissionais tenham domínio de

estratégias, técnicas e processos de interpretação e tradução, capacitações, cursos e formação

específica dentro da sua área de atuação, para que este profissional possa trabalhar de forma

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mais humanizada e ética.(QUADROS, 2004).

3.2 Percepção da profissão de intérprete

Na quarta pergunta do questionário, aborda-se a visão que os participantes têm em

relação a polivalência do intérprete dentro e fora do ambiente educacional. Em meio aos

intérpretes que responderam à pergunta, os dados coletados apontam sobre essa questão,

conforme o exemplo que segue:

Exemplo 08 – Questão 04 (Resposta intérprete 05): - Qual a sua visão em relação à

polivalência do intérprete de libras na instituição educacional? - A polivalência é uma “pedra no sapato”, pois acabamos desempenhando um trabalho

de má qualidade em algumas áreas do conhecimento. De forma particular, sei que

durante minhas interpretações, possuo uma queda na qualidade da minha interpretação

em áreas como Matemática ou Fisiologia. Dessa forma, um profissional para cada

área do conhecimento é o mais aconselhável.

Para a sociedade de maneira geral, estes intérpretes estão prontos para atuar em

qualquer área, e essa visão não estaria equivocada se este profissional tivesse uma formação

mais direcionada de acordo com sua formação, percebemos isso nas respostas dos intérpretes

que participaram desta pesquisa conforme os relatos dos dados obtidos.

Encontramos no exemplo 08, o relato do intérprete 05 alegando que a polivalência é

“uma pedra no sapato”, porque faz a atuação do intérprete ser de má qualidade, em que o

certo seria um intérprete para cada área do conhecimento, ele exemplifica sua própria atuação,

afirmando que na interpretação dele há uma queda na qualidade principalmente em

matemática e filosofia, os intérpretes 06, 08, 09, 10, 18 e 21 concordam que este profissional

precisa ter uma formação e capacitações mais específicas, e os intérpretes 06 e 09 reforçam

apoiando a linha de pensamento do intérprete 15 sobre se ter nas escolas um intérprete para

cada área, já os intérpretes 08, 09 e 10, que possuem um olhar mais voltado para o prejuízo

que os alunos surdos têm diante desta polivalência do intérprete, porque estes profissionais

não possuem um conhecimento amplo e consequentemente não dominam todas as disciplinas,

e isso só vem a prejudicar o aprendizado dos alunos surdos.

Na atualidade, a polivalência deste profissional dentro âmbito educacional tem

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despertado insegurança e angústia dos profissionais intérpretes de língua de sinais, pois

ocorrem diversos tipos de interpretações realizadas dentro e fora da escola, desde as

disciplinares até os passeios culturais, palestras, gincanas, mas não há a menor preocupação

das instituições educacionais ou da sociedade em relação a formação desse profissional, pois

para ambos só o fato do aluno surdo ter com quem se comunicar dentro da escola é o

suficiente. Mas se este profissional está capacitado ou não para os diversos tipos de

interpretações que surgem para serem realizadas, se sua atuação está atingindo o que é

esperado para que haja uma formação para o aluno surdo, infelizmente, não há essa

preocupação.

Na literatura, encontram-se várias vertentes que discutem o papel e a atuação dos

intérpretes no espaço educacional, que de acordo com Gurgel, pouco se conhece sobre a

educação bilíngue destes alunos surdos dentro da sala de aula, e apesar de ter sido

reconhecida por lei a profissão do tradutor/intérprete de língua de sinais, é oficialmente muito

recente, e só depois deste reconhecimento as discussões em retorno deste profissional

começaram a ser fortalecidas. Ainda não há um número suficiente de intérpretes com

formação básica para suprir a demanda necessária, e por este motivo muitas vezes o governo

acaba não exigindo formação ou qualificação específica além do domínio de Libras,

contratando pessoas com o mínimo de experiência e conhecimento da área para atuar em um

papel tão importante. Isso só vem a prejudicar o desenvolvimento do aluno surdo. Pois este

profissional por não ter uma preparação adequada, por vezes acaba dando as respostas ao

aluno das atividades solicitadas pelo professor, achando que vai ajudar o surdo, só depois

percebendo o tamanho da responsabilidade que termina assumindo. (SIMÕES, 2015).

É importante ressaltar que o intérprete precisa ser respeitado como profissional, pois a

sociedade e os profissionais da área da educação precisam entender e reconhecer o real papel

do intérprete dentro do âmbito educacional, para que desta forma este profissional possa atuar

sem que haja interferências equivocadas.

3.3 Atuação como intérprete

Na terceira categoria de análise discutiremos sobre a atuação do tradutor/intérprete de

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língua de sinais, e nesta categoria analisaremos as perguntas 09 do questionário respondido

pelos participantes da pesquisa.

Os tradutores/intérpretes que responderam à pergunta 09 do questionário que fala das

dificuldades, dilemas e obstáculos encontrados por eles na sua atuação, relataram importantes

pontos.

Exemplo 17 – Pergunta 09 (Resposta intérprete 01): - Quais são os maiores obstáculos,

dificuldades, dilemas, com que se depara no trabalho que desempenha?

- O aluno surdo que não tem conhecimento de sua L1(Libras). O professor que é leigo

na Libras e acha que o surdo é aluno do intérprete. A sobrecarga de ser polivalente em

sala, quando não temos formação para isso.

A resposta da questão 09 no exemplo 17, o intérprete 01 é bastante relevante, pois

muitas vezes estes profissionais se deparam com surdos que não sabem a língua de sinais e

interagem apenas através de gestos criados por eles dentro de casa para que possam ter o

mínimo de comunicação com seus familiares.

Outro problema enfrentado por estes profissionais, é um problema que os professores

também passam com seus alunos ouvintes, de acordo com o intérprete 02, ele fala que tenta

sempre motivar o surdo a estudar, seja por preguiça ou falta de interesse nos estudos, muitas

vezes eles procuram se esconder atrás da sua deficiência por acharem que a cobrança pode ser

amenizada, o intérprete procura sempre estar lembrando aos alunos surdos que adotam este

prática, que eles não podem lutar pelos seus direitos à igualdade se ficarem sempre usando a

surdez para não estudar, pois eles acabam sendo vistos pelos ouvintes como “coitados”. Em

alguns casos, depois deste esclarecimento o intérprete obtém bons retornos, e diante de tantas

situações que os tradutores/interpretes passam, eles também precisam saber lhe dar com a

falta de reconhecimento e salários baixos.

O interprete 17 fala de escolas que mostram resistência em receber estes alunos, por

não se sentirem aptas para o atendimento destes alunos, que por Lei isso não pode ocorrer,

mas lamentavelmente as Leis podem assegurar os direitos, mas se não houver uma

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fiscalização para saber se as Leis estão de fato sendo cumpridas, muitas pessoas vão ficar sem

seus direitos garantidos. Os intérpretes também sofrem com uma jornada de trabalho contínua

sem nenhum revezamento, tendo que cumprir o seu papel interpretando diversos temas, ou

seja, este profissional não é valorizado e tem que atuar de forma sobre-humana.

4 CONCLUSÃO

Esta pesquisa teve como objetivo analisar a percepção de intérpretes educacionais de

Libras, que atuam em instituições de ensino Particular, Estadual ou Municipal no perímetro

urbano nos níveis fundamental, médio e superior na cidade de Caruaru-PE, sobre os aspectos

da polivalência na sua atividade profissional.

A partir dos resultados e da análise, foi possível perceber a importância deste

profissional ter uma formação adequada e direcionada, pois sem uma formação correta e

continuada, o tradutor/intérprete pode influenciar diversos fatores negativos dentro e/ou fora

da instituição educacional da qual ele atua, principalmente no desenvolvimento educacional e

social na vida do aluno surdo.

Ao analisar as respostas dos questionários, buscou-se verificar como estes

profissionais se autoavaliaram, qual seria sua formação, os obstáculos e dificuldades

encontrados por eles na sua atuação, como eles definiriam o trabalho do intérprete

educacional, porque optou pela profissão, há quanto tempo trabalha na área e o que eles

acham da polivalência existente dentro da sua atuação na escola. Diante de todas as respostas

podemos verificar quantos impasses são gerados por estes profissionais sem uma formação

adequada, e que acaba afetando toda a categoria e prejudicando também os profissionais mais

preparados.

Considerando todos os argumentos citados, é importante ressaltar que esta pesquisa foi

realizada com o intuito de conscientizar os tradutores/intérpretes da necessidade de se ter uma

formação continuada e específica, e para que isso ocorra é necessário que haja uma maior

união da categoria para que eles possam requerer e enviar propostas de formação e

capacitação mais específicas dentro da área da interpretação, de acordo com cada disciplina

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ou área (humanas e exatas), e encaminha-las para o poder executivo do âmbito Municipal e

Estadual, para que esse quadro atual se reverta, qualificando de forma mais adequada os

intérpretes para atuarem junto ao surdo nas instituições educacionais.

A pesquisa em epígrafe encontrou outras linhas de investigação que poderiam ser

abordas como: a relação do professor e o intérprete na sala de aula, a atuação do docente junto

ao aluno surdo, a insegurança do docentes em relação a atuação do intérprete, entre outros,

mas para não sair do foco da pesquisa não foram abordas, mais que podem servir para outras

futuras pesquisas, pois seria necessário que novas pesquisas surgissem para orientar ainda

mais estes profissionais, pois é fortalecendo as discussões sobre este assunto que surgem

novas ideias para solucionar as dificuldades encontradas pelos intérpretes na sua atuação,

temas que possam ajudar na atuação dos intérpretes educacionais na área de exatas e

humanas.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n° 12.319 de 1° de setembro de 2010. Regulamenta a profissão de Tradutor e

Intérprete de Língua Brasileira de Sinais. Diário Oficial da República Federativa do Brasil.

Brasília, 02 set. 2010.

LACERDA, C. B. F.; POLETTI, J. E. O intérprete de Língua de Sinais em sala de aula:

experiência de atuação no ensino fundamental. Itajaí-SP: UNIMEP, v. 5, n. 3, p. 353-367,

set/dez 2005.

PERLIN, T. Gladis. O intérprete de língua de sinais. In Educação & Sociedade.

Campinas, v. 27, n. 94, p. 277-292, jan./abr. 2006.

QUADROS, Ronice Muller. O Tradutor e Intérprete de Língua Brasileira de Sinais e

Língua Portuguesa. 2. ed. Brasília: MEC, 2004.

SILVA, Anderson Tavares Correia da; LIMA, José Francisco de; JÚNIOR, Márcio Ribeiro

Macedo. O intérprete de Língua Brasileira de Sinais no Ensino Fundamental e seu Papel

na Escola Comum. Trabalho de conclusão (Graduação em pedagogia) - UFPE, 2008.

SIMÕES, Janice Macedo da Matta. Tradutor Automatizado Português x Libras: um

hiperlink de possibilidades no processo educativo do aluno surdo. Disponível em:

<http://teacherjanicefeirabahiabrazil.blogspot.com.br/p/tradutor-automatizado-portugues-

x.html>. Acesso em: 28 abr. 2015.

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