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A FINALIDADE DOS EMBARGOS
Gelson Amaro de Souza. Doutor em Direito Processual Civil pela
PUC/SP, Professor concursado para os cursos de graduação e
mestrado em direito da Universidade Estadual do Norte do Paraná –
UENP (Campus de Jacarezinho), ex-diretor e professor da Faculdade
de Direito da Associação Educacional Toledo - AET de Presidente
Prudente-SP, e da Faculdade de Direito da Uniesp de Presidente
Prudente-Sp, Procurador do Estado (aposentado) e advogado em
Presidente Prudente - SP.
Resumo: Pretende-se com esta narrativa trazer algumas considerações
sobre a finalidade dos embargos à execução, sua natureza e efeitos,
com o fim de demonstrar que os embargos à execução não visam
anular ou rescindir o título executivo e nem atacar a causa subjacente
da obrigação. A anulação do título ou a declaração de inexistência da
dívida somente pode ser obtida através de ação própria e não em
embargos à execução, que nada mais são do que meio de defesa e não
de ataque.
Palavras chaves. Embargos. Sentença. Anulação. Título de crédito
Sumário
Introdução
1. Conceito de embargos à execução
2. Natureza dos embargos à execução
3. Conteúdo dos embargos à execução
4. O objeto dos embargos à execução
5. A finalidade dos embargos à execução
6. Sentença dos embargos à execução
7. Efeitos da sentença que julga os embargos
8. Diferenças entre embargos e ação rescisória
8.1. Aspecto temporal
8.2. Objeto
8.3. Efeitos
8.4. Pedidos
8.5. Competência
8.6. Julgamento
9. Impossibilidade de efeitos rescisórios nos embargos
Conclusões
Referências
Introdução
Tornou-se corrente nos meios jurídicos a pregação de que os embargos à execução têm
como finalidade a anulação do título executivo ou a declaração de inexistência da dívida. No
entanto, ao que se pensa a finalidade dos embargos à execução é outra, nada tendo a ver com
a anulação do título e nem com o combate a causa subjacente da dívida.
Pretende-se apresentar nas considerações que vão a seguir é que os embargos do
executado ou embargos à execução, como o próprio nome indica, têm por finalidade atacarem
a execução, impedindo que esta se desenvolva tal como foi proposta. Ao se falar “embargos
do executado” estar-se-á se referindo à defesa de quem está sendo executado; ao se falar em
“embargos à execução” também estar-se-á falando de defesa contra a execução. Isto quer
dizer que o executado-embargante discorda da execução, mas não quer dizer que ele discorda
do título executivo e nem mesmo da obrigação estampada no título. Pode o embargange
discordar a forma de execução, mas concordar com a dívida e com o título executivo sem
atacá-los.
O executado-devedor pode até concordar com a existência da dívida e, mesmo com
montante exigido, estar impossibilitado de pagar diretamente ao credor por estar impedido de
fazê-lo por determinação judicial (art. 671, I, do CPC).
Não se pode concordar com o pensamento de que os embargos visam atacar o título ou
a dívida nele representada. Os embargos à execução são apenas meio defensivo e que não
podem conduzir pedido contra o credor exequente. Qualquer ataque ao título ou a negativa de
existência da dívida somente pode ser solucionada em ação própria, que no primeiro caso
pode ser a ação anulatória ou a declaratória de nulidade e, no segundo, a ação declaratória de
inexistência de dívida que são os meios próprios para tais finalidades, o que não se alcança
por medida defensiva como os embargos à execução ou embargos do devedor.
Ainda mais surpreendente é a afirmação de que os embargos à execução podem ter
efeito rescisório para rescindir título judicial. O efeito rescisório somente pode ser obtido
através de ação própria, com características e requisitos específicos (art. 485 e segs., do CPC)
e a anulação do título de crédito ou a declaração de inexistência da dívida através de ação
anulatória ou declaratória respectivamente.
1. Conceito de embargos à execução
Embargar e embaraçar são palavras designativas de formas de dificultarem o
seguimento de alguma atividade ou algum ato relacionado a algum tipo de procedimento.
O termo “embargos” de uma maneira geral, sempre teve a conotação de meio
defensivo ou impeditivo. Embargar quer dizer impedir. Embargar a execução, nada mais é do
que pretender impedir a continuidade da execução. Podem ser utilizados por grande variação
na terminologia, tais como, Obstruir, barrar, obstaculizar a execução, entre outros termos que
podem ser utilizados.
Na formatação do artigo 736 do CPC, os embargos são tratados como meio de
oposição à execução e no artigo 827 do Código Civil, aparece como contestação. Também o
artigo 542, § 3º do CPC, ao cuidar da retenção dos recursos extraordinários e especiais
extraídos de decisão interlocutória, fala nas modalidades de processo de conhecimento e
processo cautelar, para depois acrescentar os embargos à execução, deixando a entender que
estes não são processo, o que restaria a hipótese de ser apenas defesa. Mais incisivo é o art.
745, V, do CPC, ao afirmar que o embargante pode aduzir qualquer matéria que lhe era lícito
alegar como defesa em processo de conhecimento, dando a conotação aos embargos de defesa
e não de processo.
Levando em conta nas normas acima mencionadas, podem-se conceituar os embargos
como meio de defesa contra a execução, e tão-somente contra a execução, pois não se prestam
para atacar nem o título executivo e nem o negócio subjacente que dá origem à execução.
A própria lei fala que nos embargos o executado poderá alegar toda a matéria
defensiva que lhe seria lícito aduzir no processo de conhecimento (art. 745, V, do CPC), mas,
só matéria de defesa e não de ataque como normalmente se faz quando se trata de ação. Com
isso, parece estar bem caracterizada a natureza defensiva dos embargos à execução.
2. Natureza dos embargos à execução
No passado a doutrina mais antiga afirmava tratar-se de ação incidental proposta pelo
executado contra o exequente. No entanto, a tendência moderna é considerar os embargos
como meio de defesa, como o fez o Código de Processo Civil nos artigos 736, 738 e 745, V,
dando a eles a conotação de meio defensivo. A reforma processual realizada pela Lei
11.232/2005, transformando o que era antes embargos à execução de sentença para
impugnação ao cumprimento de sentença, alinhou-se à doutrina que antes pregava serem os
embargos meio de defesa. Pela reforma imposta pela Lei 11.232/2005, o que antes era
embargos à execução de sentença, passou a ser impugnação ao cumprimento de sentença,
assumindo a condição de defesa dos embargos à execução.
Não se pode negar que esta nunca foi pacífica. Esse tema, natureza jurídica dos
embargos do executado, sempre desafiou e continua a desafiar os mais argutos observadores.
Nunca faltaram aqueles que afirmaram que se trata de ação de conhecimento interposta pelo
devedor contra o credor1, de um lado e, de outro, aqueles que sustentam que se trata de defesa
do executado contra a execução2. Uma terceira vertente, ainda existe propugnando por uma
solução intermediária entendendo que os embargos são ação apenas no sentido formal e
defesa em seu aspecto substancial3.
É necessário que se diga que o assunto pode parecer à primeira vista de menor
importância prática. Mas, é bom lembrar que é neste particular que essa importância se realça.
Mais do que um simples amor ao academissismo, a análise e o estudo dessa natureza têm
grande influência na prática. Isto acontece porque conforme o entendimento que se der à
natureza dos embargos, também haverá de se atribuir efeitos diferentes. Prevalecendo a
posição de que se trata de ação, em que o devedor faz pedido contra o autor, a improcedência
dos embargos vai implicar na rejeição do pedido e com isso instaura-se a coisa julgada. De
outra forma, caso prevaleça a vertente que sustenta se tratar os embargos como meio de
defesa e não de ação em seu contexto substancial, o devedor apenas se defende, apresenta
argumentos, arguição e fundamentos, nada pedindo contra o credor, o que impede que a
apreciação destes, não alcança a coisa julgada material.
Deste modo, apenas se defendendo e não fazendo pedido contra o credor, o devedor
não terá pedido algum para ser julgado e, logo, está afastado do contexto da coisa julgada
material. Não enseja, nesta hipótese, a coisa julgada material, pois a matéria utilizada na
defesa será apenas como argumento para promover o convencimento do juiz como raciocínio
meio para se chegar à conclusão (dispositivo) e, assim sendo, será sempre fundamento (art.
469 do CPC) e, como se sabe, os fundamentos não fazem coisa julgada4, não impedindo que
tais questões sejam aviventadas e apreciadas posteriormente em outro processo.
O julgamento dando por improcedente um pedido implica no julgamento e na rejeição
do pedido feito pelo autor e, este mesmo pedido, aliado aos demais elementos da ação indica
que o autor não mais poderá voltar a incluí-lo como objeto de futura ação. Todavia, quando o
1 OLIVEIRA NETO, Olavo. A defesa do executado e dos terceiros na execução forçada, p. 89. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2.000.
2 PABST, Haroldo. Natureza Jurídica dos Embargos do devedor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986.
3 Neste sentido nossa tese de doutoramento, in “Efeitos da sentença que julga embargos à execução”. São Paulo:
MP-Editora, 2007.
4 “Na verdade a coisa julgada abrange a questão última do raciocínio do juiz, a conclusão de seu silogismo, que
constitui a premissa essencial objetiva, a base lógica necessária do dispositivo”. CHIOVENDA, Giuseppe.
Instituição de direito processual civil. p. 475.
juiz, pura e simplesmente, deixa de acolher a alegação defensiva do réu não está julgando
pedido algum, senão apenas conhecendo da fundamentação que não pode ser alcançada pela
coisa julgada (art. 469, do CPC)
Certo é que, o que faz coisa julgada é o julgamento do pedido e não a apreciação de
fundamento defensivo. O juiz somente julga o pedido e não o fundamento. O fundamento é
apenas conhecido, mas não julgado. Assim, o pedido quando acolhido ou rejeitado será
atingido pela coisa julgada material, não mais podendo o autor voltar a fazer a mesma
postulação. Caso reconheçam os embargos do executado como verdadeira ação, há de se
reconhecer que o embargante faz pedido contra o credor. Todavia, se restar reconhecido que
os embargos são apenas tidos como meio defensivo5 e, essa defesa será feita através de
fundamentos e não de pedido e, se aceita ou rejeitada, não implica em coisa julgada. Estas e
outras questões neste sentido é que serão vistas mais abaixo.
3. Conteúdo dos embargos à execução
A própria lei limita o conteúdo dos embargos aos aspectos meramente defensivos, não
permitindo pedido contra o exeqüente, contendo apenas fundamentos de defesa6. A defesa do
embargante será feita através de fundamentos de fato e de direito que devem ser capaz para
afastar ou inibir a execução da forma em que foi proposta, não podendo pedir a nulidade do
título e nem a inexistência do crédito alegado7. Nos embargos, não pode o devedor apresentar
matéria de ataque contra o credor, porque nada pode exigir do exeqüente no contexto dos
embargos8, isto porque o exequente não pode ter sua situação arruinada pela execução que
propôs. O título executivo e causa subjacente continua após o julgamento dos embargos na
mesma situação em que se achava antes da execução, sem sofreu qualquer alteração.
5 O legislador pátrio parece considerar os embargos como meio de defesa e não como ação. Além de falar em
oposição à execução (art. 736, do CPC), no art. 542, § 3º, fala em processo de conhecimento, cautelar e
embargos à execução, distinguindo assim os embargos do devedor do processo de conhecimento, sendo que se
os embargos já fossem processo de conhecimento não precisaria da última referência. Ainda no art. 745, V, fala
em qualquer matéria de defesa. Também o Código Civil, em seu artigo 827, fala que o fiador ao ser demandado
tem direito a exigir, até a contestação da lide que sejam primeiro penhorados bens do devedor, o que deixa claro
tratar de execução por se falar em penhora e em defesa ao falar em contestação.
6 “O entendimento desenvolvido, aqui mantido, é o de que, ao julgar os embargos, os eventuais defeitos no título
executivo serão apreciados apenas como motivos ou fundamentos”. SOUZA, Gelson Amaro de. Efeitos da
sentença que julga os embargos à execução, p. 13. No mesmo sentido LUCON, Paulo H. dos Santos, ao dizer:
“Diversos são os possíveis fundamentos dos embargos do executado”. Embargos à execução, p. 135.
7 “nesse caso, não se alega com a oposição, a inexistência do crédito, senão a impossibilidade de satisfazê-lo,
mesmo por via de execução”. LIEBMAN, Enrico Tulio. Embargos do executado, p. 251. Campinas: M.E.
Editora, 2000.
8 Essa matéria foi tratada mais amplamente em nosso: Efeitos da sentença que julga os embargos à execução,
São Paulo: MP-Editora, 2007.
Por outro lado quando se fala em embargos vem logo à mente que estes sobrevieram a
uma execução antes proposta pelo pretenso credor. Neste caso o executado somente vai se
defender da execução direcionada contra si. Defende-se da execução, pois, somente lhe
interessa impedir que a execução prossiga como foi proposta, não sendo palco para pedido de
inexistência do crédito, sendo que eventual discussão neste sentido será apenas fundamento9.
Não pode fazer pedido algum contra o credor, porque este é o titular da ação de execução e é
este quem faz pedido contra o devedor. Como no processo de conhecimento, o réu de regra
não pode fazer pedido contra o autor10, no processo de execução o executado não pode fazer
pedido contra o exeqüente.
Como já aduzido, o exeqüente ao propor a execução não pode ter a sua situação
arruinada. Os embargos somente podem pedir que se pare com a execução, mas a situação do
exeqüente continuará a mesma de antes da execução. Para se alterar a situação do credor, será
necessária ação própria com conteúdo mais amplo para anular o título ou declarar a
inexistência do crédito11. Como a lei atribui força executiva ao título formalmente perfeito,
nos embargos não se pode pedir a anulação do título e nem a declaração da inexistência do
crédito, no campo limitado para os embargos à execução. Havendo título perfeito, em razão
sua abstração, a execução deve seguir ainda que não exista o crédito12.
O artigo 745, V, do CPC diz que o devedor poderá “deduzir” como defesa qualquer
matéria que lhe seria lícito alegar como fundamento em contestação em processo de
conhecimento. Só isso, já é o suficiente para indicar a opção do legislador pelo conteúdo
defensivo dos embargos. Já o art. 736, do CPC, somente autoriza o executado a opor-se à
execução. Inexiste, todavia, norma que autorize o executado a se voltar contra o exequente,
9 “Mas este é um resultado que contrasta com o conceito do título executório como emerge do sistema da lei: de
vez que sua eficácia não depende da existência do crédito, claro é que a declaração da inexistência deste não
basta a satisfazer o interesse do devedor, e não lhe possibilita conseguir o objetivo, que se propõe, de tornar
inviável a execução”. LIEBMAN, Enrico Tulio, Embargos do executado, p. 205 Campinas: M.E. Editora e
Distribuidora, 2000.
10 Só caso em excepcionais é que se permite ao réu fazer pedido contraposto junto à contestação; Nem mesmo no
caso de reconvenção isto não possível, exigindo-se uma ação reconvencional onde o réu pode pedir contra o
autor. Na execução, não se admite pedido contraposto e nem reconvenção.
11 “Vê-se, dessa maneira, desenhar entre as formas flutuantes a verdadeira figura de uma ação de conteúdo
diverso e muito mais amplo, ou seja, o de retirar ao título executório sua eficácia formal”. LIEBMAN Enrico
Tulio. Embargos do executado, p. 201.
12 “A lei, criando o instituto do título executório e subordinando-lhe a admissibilidade do processo de execução,
tornou estranha ao sistema deste qualquer questão sobre a existência do crédito”. LIEBMAN, Enrico Tulio.
Embargos do executado, p. 200. Em ponto já havia afirmado: “Assim como a relação jurídica substancial
corrente entre as partes, seu nascimento, sua declaração ou mesmo sua extinção não influem em nada sobre a
eficácia do título, assim também este não incide sobre a primeira”, p. 179.
fazendo contra este qualquer pedido. Tudo o que se pode fazer é se defender e, nunca atacar.
Por isso, os embargos têm conteúdo apenas defensivo13.
4. O objeto dos embargos à execução
Neste compasso é fácil perceber-se que o objeto dos embargos é sempre a execução14.
Os embargos à execução somente poderão ser interpostos se houver processo de execução15.
Antes da execução não haverá embargos por falta de objeto. Extinta a execução desaparece o
objeto dos embargos e este devem também ser extintos.
Parece claro que a norma do art. 736, do CPC, quer dizer que o objeto dos embargos à
execução será sempre a própria execução. Pela textura da norma, sem a execução não poderá
haver embargos. Tanto é assim, que mesmo nos casos de existência de execução e propositura
dos embargos, sendo aquela extinta, estes também o serão por falta de objeto16.
É de se ver que essa norma limita a atividade do executado ao dispor que o devedor
poderá se opor à execução (defender-se da execução) através de embargos, indicando ser esta
a única via aberta ao executado, como regra geral, para apresentar a sua defesa contra a
execução injusta.
Somente existirá razão para a propositura dos embargos se houver execução
aparelhada contra o embargante. Ainda que exista título executivo, mas, se por acaso não
existir execução em andamento, não poderá haver embargos do devedor, porque não se
embarga o título executivo, mas tão-somente a execução. Mesmo que exista título exeqüível,
mas se a execução for proposta indevidamente, poderá o executado apresentar embargos,
ainda que seja somente para alegar a irregularidade da execução, sem nenhum ataque ao
13 “autor é o devedor opoente, que é o primeiro (e o único interessado) a propor um pedido destinado a fazer
declarar nulo ou inadmissível um ato executivo”. LIEBMAN, Enrico Tulio, obra citada, p. 197.
14 “pois que o verdadeiro objeto do processo é a ação executória”. LIEBMAN, Enrico Tulio, Embargos do
executado, p. 280.
15 “Mas a típica estrutura da oposição de mérito em nosso direito tem por conseqüência necessária que só se
possa formular, em sua figura peculiar e com a plenitude de efeitos que lhe são característicos, quando a
execução está em curso e haja ato do processo a que se possa contrapor”. LIEBMAN, Enrico Tulio, Embargos
do executado, p. 256.
16 “Extinta a execução por falta de título hábil, devem igualmente ser extintos os respectivos embargos, pela
perda do objeto”. TRF, 3ª R. Ac. 749773, j. 24-06-2003. Bol. AASP. Ementário, 5-11-04-2004, nº 2.361, p. 845.
“Embargos à execução de sentença. Execução extinta. Perda superveniente de objeto dos embargos. Havendo
decisão transitada em julgado que extingue a execução, ocorre a perda superveniente do objeto dos presentes
embargos”. TRF. 3ª Região. 7ª turma. Ac. 96.03.829608-2. j. 05.04.2004. v.u. DJU de 26.05.04 e Revista
Nacional de Direito e Jurisprudência, v. 57, p. 174. Ribeirão Preto: Nacional de Direito, setembro, 2004.
título17. Pode acontecer de o devedor pode reconhecer a legitimidade do título e validade da
dívida e até mesmo quer saldá-la, mas não o faz por impossibilidade de efetuar o pagamento
diretamente ao credor, por impedimento judicial (art. 671, I, do CPC)
Afastando-se do que se tem apregoado e, muito pelo contrário do que se pode
imaginar à primeira vista, o objeto dos embargos é a execução e não título executivo18.
Havendo execução sem título, o executado já pode embargar a execução. Ao contrário,
havendo título exeqüível, mas não havendo execução, torna-se inviável pensar-se em
embargos. Embarga-se à execução e não ao título19. Não se concebe a utilização dos
embargos antes da propositura da execução ou mesmo depois que esta foi extinta. Opor
embargos sem execução em andamento é o mesmo que propor ação formal sem objeto. Como
o legislador optou em dar aos embargos a conotação formal de ação incidental à execução,
esta somente terá objeto quando também existir ação de execução20.
Não há como negar que o objeto ou a finalidade dos embargos é somente atacar a
execução. Casos existem em que o devedor concorda com a dívida, nada tem a opor contra o
título, mas apenas se opõe à execução, porque não concorda com a forma com que a mesma
está sendo realizada. Quando o devedor embarga a execução somente para alegar prescrição,
ele está se opondo à execução, mas não nega a existência da dívida e nem alega irregularidade
do título. Tanto que se acolhida a alegação de prescrição a execução será extinta, mas o título
e a dívida permanece como antes, podendo o crédito ser exigido por ação de conhecimento de
cobrança ou, mesmo a depender do caso, por ação monitória.
Ocorrem casos em que o devedor concorda com a dívida, com o título e até já reservou
o dinheiro para pagamento, mas se sente impedido de pagar ao seu credor, como acontece no
caso de penhora do crédito na forma do art. 671, I, do CPC. Tudo isto demonstra que os
embargos são contra a execução e não contra o título ou contra o negócio subjacente. Neste
17 “O legislador pátrio deixou claro no art. 738 do Código de Processo, que os embargos de que trata são
dirigidos sempre à execução”. CARMONA, Carlos Alberto. Em torno do Processo de Execução, in Processo
civil – evolução – 20 anos de vigência, p. 20. Coord. CRUZ E TUCCI, José Rogério. São Paulo; Saraiva, 1995.
Ainda cita à p. 22 : “embargos do devedor, como instrumento de defesa, visam anular ou reduzir a execução”.
TJRJ. 2ª Câm, do antigo TARJ, j. 12-2-1980, ap. 52.961, rel. Des. Emerson Santos Parente, Adcoas, 1981, n.
74.697.
18 LIMA GUERRA, Marcelo observa: “[ ...] a sentença de procedência dos embargos, quando desconstitutiva, o
será não da “eficácia abstrata do título”, mas, sim, da própria relação processual executiva, ou mesmo de alguns
de seus atos”. Execução forçada, p. 59. ARAKEN DE ASSIS expressa: “Ora, os embargos se acham
desprovidos de eficácia condenatória e não se prestam, como já assinalado, para resolver questões estranhas à
eficácia do título”. Manual do processo execução, p. 1282, 8ª edição, 2002.
19 ARAKEN DE ASSIS, assim se expressa: “Os embargos não confrontam o direito do credor ao título, e, sim, o
de exigi-lo, ou seja, o de proceder executivamente”. Manual do processo de execução, p. 1294, 8ª ed. 2002.
20 Ao se referir aos embargos à execução observou LIEBMAN, Enrico Túlio: “o verdadeiro objeto do processo é
a ação executiva”. Embargos do devedor, p. 280.
caso, só resta ao executado, embargar a execução, por não poder efetuar o pagamento ao
credor exeqüente, sob pena de tal pagamento ser ineficaz e a dívida continuar.
5. A finalidade dos embargos à execução
Seguindo o que foi anotado acima de que a causa dos embargos é a execução. Agora,
ver-se-á que a sua finalidade deles é atacar a própria execução e não o título ou causa
subjacente. Neste sentido ensina THEODORO JUNIOR que os embargos se destinam a atacar
a execução21. Com o mesmo pensamento aponta CARMONA22, para quem o legislador pátrio
deixou claro que os embargos são dirigidos contra a execução23.
A finalidade dos embargos é atacar a execução e somente contra esta é que eles se
voltam24. Não se conformando com a execução instrumentalizada, o executado poderá a ela se
opor por via dos embargos, quando então, poderá pedir a sua extinção ou a modificação para
adequação à forma, ao quantum ou ao objeto da execução.
Não servem os embargos para negarem a causa subjacente e nem mesmo invalidarem
o título; para estas questões será necessária ação autônoma25. Na defesa por meio dos
embargos não se permite reconvenção do devedor ao credor, visto que essa providência
somente foi concedida com caráter defensivo.
21 “Assim os embargos do devedor, que se destinam a atacar a execução forçada, só são admissíveis após a
penhora”. THEODORO JUNIOR, Humberto. Processo de execução. p 30, 6ª edição. Leud, 1981. Em outra obra
reitera: “Por isso, os embargos não são meios de solucionar divergência entre devedor executado e o credor, mas
apenas remédio para resistir a uma execução indevida”. Curso de direito processual civil, v. II, 264, 35ª edição.
Rio de Janeiro: Forense, 2003.
22 CARMONA, Carlos Alberto. Em torno do processo de execução. in. Processo civil – evolução 20 anos de
vigência. Coord. José Rogério Cruz e Tucci, p. 20.
23 “Execução de sentença. Embargos à execução. Limites. Com exceção da hipótese de nulidade por falta ou
nulidade da citação, o artigo 741 do Código de Processo Civil não prevê a possibilidade de ataque ao título
executivo judicial tendo em vista nulidades no processo de conhecimento. De modo que os embargos do
executado não podem substituir nem a ação rescisória (PCC, art. 485), nem a ação ordinária anulatória de
sentença meramente homologatória (CPC, art. 486). STJ. REsp. 503.490-RS. Rel. Min. José Delgado. J.
24.06.2003. DJU, 15-09-2003. RTSJ 174/95, fevereiro, 2004.
24 “[...] a sentença de mérito nos embargos do executado apenas reconhece e declara uma situação de carência de
ação no processo de execução”. Ainda: “Desse modo, o provimento jurisdicional que se deseja em sede de
embargos é de natureza declaratória do exato limite da execução”. LUCON, Paulo Henrique dos Santos.
Execução, condições da ação e embargos do executado, in Processo civil – evolução – 20 anos de vigência, p.
223. Coord. CRUZ E TUCCI, José Rogério. São Paulo; Saraiva, 1995.
25 “enquanto o título se mantém válido, não lhe é dado, efetivamente, insurgir-se contra a execução. É contra o
título que lhe cumpre apontar suas armas, e somente quando o houver eliminado poderá fazer revogar os atos
executivos e ver-se recolocado na posição primitiva” p. 188. LIEBMAN, Enrico Tulio. Embargos do
executado.p. 188. Campinas: M.E. Editora, 2000.
Assim a finalidade dos embargos à execução não poderá ser outra, senão a de impedir
ou paralisar a execução, sem que possa o executado-embargante dirigir pedido contra o
credor26.
Não se pode ter dúvida de que nos embargos o que se busca é a obstrução da execução
e, conseguindo este intento, está atendida a defesa alegada pelo embargante e se não obtida a
paralisação da execução, em razão da rejeição da defesa pelos fundamentos apresentados, o
processo executório seguirá sem apreciação da causa subjacente, que é questão absolutamente
estranha aos embargos do executado.
O artigo 736, do CPC, coerente com toda a sistemática adotada, admite embargos
apenas para se opor à execução e não como veículo condutor de pretensão outra do executado
em face do exeqüente. O devedor pode se defender, mas, jamais atacar, o que impede que se
faça qualquer pedido de caráter reconvencional ao exeqüente27.
Os embargos não podem conduzir pretensão do devedor, senão apenas matéria de
defesa. O que se pode alegar nos embargos são fundamentos de defesa e não se trata de
pedido (pretensão) do executado (devedor) contra o credor-exeqüente. Nos embargos, o
devedor nada pode pedir contra o credor-exequente28. Daí a razão de que a sentença dos
embargos não pode anular o título e nem julgar a causa subjacente, tudo permanecendo como
antes, em relação ao título e a causa subjacente29. Sendo acolhidos os embargos, isto não
altera o título e nem a causa subjacente, senão apenas declara o não cabimento daquela
execução. De outra forma, sendo os embargos julgados improcedentes tudo permanecerá
como antes, visto que a sentença de improcedência em nada altera a situação, até mesmo
26 Assim já foi decidido: “Por outro lado, sendo os embargos não um meio de pedir, mas de impedir,
inadmissível em processo dessa natureza e rito especialíssimo a condenação da embargada em perdas e danos
reclamados” TJSC. Ap. 13.226, j. 4.5.1978. Revista Forense, v. 267, p. 254. julho-setembro, 1979.
ROSENBLAT, Héctor Cláudio adverte: “a instância executória não depende da relação originária e, por isso,
não perime, nem o triunfo de uma defesa na execução altera a coisa julgada, sendo as exceções oponíveis seu
fundamento (fundamento de defesa) e sua prova independente da instância original”. Procedimento de ejecución
de sentenças, p. 25.
27 “Execução por título extrajudicial. Embargos procedentes. Execução declarada nula por falta de título.
Ressarcimento de danos pleiteados pelo devedor nos próprios autos da execução frustrada. Impossibilidade.
Necessidade de ajuizamento de ação própria”. JTACSP-Lex. v. 192, p. 66.
28 Assim já se decidiu: “Por outro lado, sendo os embargos não um meio de pedir, mas de impedir, é
inadmissível em processo dessa natureza e rito especialíssimo a condenação da embargada em perdas e danos
reclamados”. TJSC, ap. 13.226, j. 04.05.1978.
29 “Em primeiro lugar, é juridicamente herética a suposição de que a não interposição de embargos, por parte de
qualquer executado, possa resultar no surgimento, em favor do exeqüente, de efeitos similares aos da “coisa
julgada material”. CARNEIRO, Athos Gusmão. Hipoteca em garantia de dívida de outrem. Limite da
responsabilidade. RDDP, v. 101, p. 135, de agosto de 2011.
porque nada declara a respeito do título ou da causa subjacente30, senão apenas que a
execução pode prosseguir.
Esse entendimento é reforçado por DINAMARCO31, ao afirmar que na execução bem
sucedida, o processo tem desfecho único e sempre favorável ao demandante, não se
concebendo que a execução venha produzir eventual pretensão do executado. O autor da
execução não pode sofrer prejuízo com a execução por ele proposta, o máximo que pode
acontecer é a execução ser extinta sem atender a sua pretensão em face do acolhimento da
defesa do devedor. Esta é a razão do porque os embargos que são defesa não podem conduzir
pretensão contra o credor32.
Não visam os embargos a atribuírem direito algum ao embargante, senão apenas a
atacar a execução33. Por isso, os embargos não portam pedido algum contra o exeqüente. Nos
embargos somente se faz alegações defensivas e não pedido. Não conduzem pretensão do
embargante contra o embargado. O que se alega nos embargos são apenas motivos ou
fundamentos, mas jamais pedido, infenso à coisa julgada (art. 469, I e II, do CPC). Pedir é
uma coisa e argüir ou aduzir (art. 745 do CPC) é outra bem diferente34.
6. Sentença dos embargos à execução
Muito embora, conduzindo matéria defensiva, os embargos têm a formalidade de ação,
exigindo, com isso, que a sua extinção se dê por meio de sentença35. Como se trata de
sentença que aprecia somente os fundamentos da defesa do executado, esta sentença nada
30 “Julgada improcedente a ação, no entanto, a sentença não terá efeito declaratório”. BOTELHO DE
MESQUITA, José Ignacio. A coisa julgada no Código do Consumidor. In Processo civil – evolução – 20 anos
de vigência, p. 223. Coord. CRUZ E TUCCI, José Rogério. São Paulo; Saraiva, 1995.
31 DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 5ª edição, p. 151.
32 “Segundo dispõe o art. 459 do CPC, o juiz proferirá sentença acolhendo ou rejeitando o pedido do autor. Isto
significa que a sentença não pode produzir nunca efeito algum a favor do réu, a não ser no caso excepcional das
chamadas ações dúplices”. BOTELHO DE MESQUITA, José Ignacio. A coisa julgada no Código do
Consumidor. In Processo civil – evolução – 20 anos de vigência, p. 144. Coord. CRUZ E TUCCI, José Rogério.
São Paulo; Saraiva, 1995.
33 “Embargos à execução. Demanda que busca a extinção da própria ação executiva”. TAPR. AgIn. 0258946-6,
8ª Câm. J. 01.06.2004. Rel. Juiz. Hélio Lopes. RT. v. 833, p. 359. São Paulo: março, 2005.
34 “Argüição que é causa de pedir e não o próprio pedido”. STJ. Resp 175.222. j. 19.3.2002. DJU 24.6.2002. RT.
v. 806, p. 133. Dezembro de 2002.
35 Mesmo após a reforma da Lei 11.232/2005, ainda permanece a sentença como ato capaz de extinguir o
processo, isto porque, este somente será extinto por sentença. É ilusória e sem sentido a pregação de que a
sentença após a reforma deixou de extinguir. Isto porque, se a sentença não extingue o processo, qual será então
o ato que o extingue? Este assunto foi amplamente tratado em nosso artigo em co-autoria com Gelson Amaro de
Souza Filho: Sentença – Em busca de uma nova definição. Revista Jurídica, v. 376. Porto Alegre-RS: Notadez,
fevereiro de 2009.
decide sobre a validade do título executivo36 e nem sobre a existência da dívida ou da causa
subjacente37.
Esta sentença se aperfeiçoa formalmente, mas por apreciar apenas fundamentos da
defesa do devedor (e não pedido contra o credor), não é atingida pela coisa julgada material,
em face da norma do artigo 469, do CPC38. Quando são julgados os embargos improcedentes,
isso não significa que o executado é devedor, porque essa decisão em nada altera o título de
crédito e nem a causa subjacente39. Se antes a dívida não existia, continua não existindo. Essa
decisão de improcedência dos embargos não cria para o exeqüente direito que ele não tinha.
Se não tinha o direito de crédito, continua sem tê-lo. Se o título de crédito era nulo, continua
nulo, sem criar direito algum para o exeqüente40. De outra forma, ainda que os embargos
sejam julgados improcedentes, poderá o executado por ação autônoma apresentar pedido
contra o exeqüente, tanto para anular o título, bem como para declarar a inexistência da
dívida41.
7. Efeitos da sentença que julga os embargos
Enganam-se aqueles que pensam que a sentença que aprecia os embargos à execução
faz coisa material em face deles. A coisa julgada material somente recai sobre pedido e, ainda,
quando este for julgado pelo mérito. Como nos embargos o embargante não pede e não
apresenta pretensão contra o exeqüente, não há julgamento de pedido algum. Como não há
julgamento de pedido (por inexistente), não há mérito a ser julgado.
Como se demonstrou acima, nos embargos o embargante somente faz alegações e não
pedido. As alegações do embargante correspondem aos motivos e fundamentos para rechaçar
36 “O título executivo, dentro dos justos limites que deve ser entendida a sua eficácia abstrata, não fica atingido”,
LUCON, Paulo Henrique dos. p. 199. Embargos à execução. São Paulo: Saraiva, 1996.
37 “Isso porque os embargos pretendem atingir o processo de execução e não a relação jurídica de direito
material”, idem, ibidem p. 292. “A sentença que julga procedentes os embargos atinge de maneira direta o
processo de execução”, idem, p. 199.
38 Essa matéria foi tratada com mais profundidade em nosso: Efeitos da sentença que julga os embargos à
execução. São Paulo: MP-Editora, 2007.
39 “A sentença que julga procedentes os embargos atinge de maneira direta o processo de execução”. LUCON,
Paulo Henrique dos. Embargos à execução, p. 199. São Paulo: Saraiva, 1996.
40 CRUZ e TUCCI, José Rogério. “Lembre-se que a improcedência não confere qualquer direito ao réu, apenas
declara a inexistência do direito deduzido pelo embargante” Processo Civil – Realidade e Justiça, pp. 45. São
Paulo: Saraiva, 1.994. “Como o ato decisório de improcedência dos embargos não produz qualquer efeito
confirmatório do título executivo ou do crédito”, idem, p. 46. “[...] na hipótese supra-aludida, não teria o condão
de conferir ao embargado a titularidade de um direito substancial que, na verdade, ele não possui”, idem, idem p.
47.
41 “O título executivo não faz nascer um direito nem lhe declara a sua existência”. LUCON, Paulo Henrique dos
Santos. Embargos à execução, p. 199. São Paulo: Saraiva, 1996.
a execução e estes não fazem coisa julgada material à luz do art. 469, I e II, do CPC. Isto
porque os motivos e os fundamentos são conhecidos e apreciados, mas não julgados42.
Na relação execução/embargos quem faz pedido é o exeqüente ao propor a ação de
execução. Nesta há pedido e, se não houver, a petição inicial será inepta (art. 295, I e seu
parágrafo único do CPC). Havendo pedido do exeqüente na execução o executado será citado
para satisfazer a pretensão daquele ou, caso não concorde com a execução, poderá apresentar
defesa contra esta, o que será através de embargos do devedor ou embargos à execução.
A defesa que o executado poderá apresentar é somente relacionada aos motivos e aos
fundamentos defensivos na forma de alegação, argüição ou dedução, sem que possa fazer
pedido ou apresentar pretensão contra o credor (art. 736 e 745, V, do CPC. O que o juiz julga
é a pretensão da parte, como nos embargos não há pretensão, não há pedido a ser julgado.
Como não há pedido com efeito pretensivo a ser julgado, resta ao juiz somente analisar,
conhecer das alegações e apreciar os motivos e fundamentos que não fazem coisa julgada (art.
469, I e II do CPC). Em verdade o embargante não faz pedido contra o exeqüente. Quando
muito, pode-se dizer que o embargante faz apenas pedido defensivo e não pretensivo.
Neste diapasão, os efeitos da sentença que julga os embargos do executado, serão
somente sobre os motivos e os fundamentos aduzidos pelo embargante, que não passam
materialmente em julgado (art. 469, I e II, do CPC), podendo ser reapresentados em outra
ação. Esta sentença faz coisa julgada formal, mas não alcança a coisa julgada material43.
A sentença que julga os embargos, qualquer que seja o resultado, sejam estes,
procedentes ou improcedentes44, em nada altera o título ou a causa subjacente, porque sobre
estes não há julgamento, senão apenas análise dos motivos ou fundamentos defensivos
apresentados nos embargos. Por tal razão, a sentença que julga os embargos não atingirá o
título executivo e nem a causa subjacente, o que sobre eles o juiz pronunciar será apenas
questão incidente que não produz coisa julgada material45. Estes mesmos fundamentos ou
motivos poderão voltar a ser apreciados em outra ação (art. 469, I e II, do CPC). Assim, a
42 Conhecer não é o mesmo que julgar. É o caminho para se chegar ao julgamento. “Conhecer é preparar-se
pagar julgar”. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo, p. 363. Em outro local assim
se expressou: “[...] meras pretensões apreciadas pelo juiz como fundamento para decidir sobre o objeto do
processo. Essa apreciação incidentum tantum está na motivação da sentença, não no decisório”. Instituições de
direito processual civil, v. III, p. 319.
43 Esta matéria foi tratada mais amplamente em nosso: Efeitos da sentença que julga embargos à execução. São
Paulo: MP-Editora, 2007.
44 Ensina BOTELHO DE MESQUITA, José Ignácio. “Ao contrário se improcedente a ação, a sentença não
produzirá nenhum efeito jurídico, a não ser o de extinguir o processo”. A coisa julgada, p. 26.
45 “A coisa julgada – fenômeno verificado apenas naqueles embargos – atinge somente aquela demanda”. TJSP
(antigo 2º TACivel, 1ª Câmara). Ap. 742.100-00/5, rel. Amorim Cantuária, j. 17.9.2002.
sentença que julga os embargos não influenciará em nada o título de crédito e nem a causa
subjacente que continuaram como eram antes dos embargos46.
FINALIDADE DOS EMBARGOS
“A sentença transitada em julgado, passados os dois anos da ação rescisória, não é mais nula e
não pode ser desconstituída. O que se impugna ou se embarga, em sede executiva, não é esta
sentença transitada em julgado, mas a própria execução”. DE LUCCA, Rodrigo Ramina.
Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil brasileiro. REPRO, v. 202, p. 134.
São Paulo: RT, dezembro, 2011.
“Pouco importa se a sentença será retirada do ordenamento jurídico: importa que ela não
produza efeitos contra o réu, proibindo-se o Estado de utilizá-la para constranger o seu
patrimônio. A retirada de um ato ineficaz do ordenamento jurídico é irrelevante; e muitas das
vezes, ele sequer poderá ser retirado, pois tratar-se-á de ato válido, porém ineficaz”. P. 134.
“Ao réu revel não citado ou invalidamente citado basta que peça a declaração de ineficácia da
sentença a qualquer tempo para que se lhe garanta a segurança jurídica necessária. Tal qual
toda sentença declaratória, não há prazo para o reconhecimento da ineficácia de um ato
jurídico, seja ele qual for”. Idem, p. 134.
“O réu revel citado ou invalidamente citado, com isso, pode perfeitamente ajuizar ação
declaratória de ineficácia da sentença mesmo depois de transcorrido o prazo de dois anos da
cão rescisória”, idem p. 135.
“Processo em que não houve citação ou em que a citação foi defeituosa e, salvo a inexistência
de prejuízo, processo nulo”, idem, p. 135.
“Também é incorreto falar em ação de nulidade contra atos jurídicos processuais”. DE
LUCCA, Rodrigo Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil
brasileiro. REPRO, v. 202, p. 136. São Paulo: RT, dezembro, 2011.
“Quanto aos arts. 475-L, I, e 741, I, do CPC são não mais do que hipóteses que autorizam a
resistência do executado a uma execução fundada em título ineficaz. Não parece que tenham
força para atacar a própria sentença, mas mesmo se a tivessem, não poderiam se estender às
sentenças constitutivas e declaratórias. Por isso, mais uma vez, o problema tem de ser
resolvido sob o prisma da ineficácia da sentença e não de sua “invalidade”, p. 136.
_____________________
46 “Que, depois, a obrigação não exista, é questão distinta, que o juiz examinará e que poderá, determinando uma
sentença dele, suprimir a eficácia do título executório; diretamente sobre a responsabilidade, porém, nenhuma
influência exerce”. LIEBMAN, Enrico Tulio, Embargos do executado, p. 188. Campinas: M.E. Editora, 2000.
“[...] os embargos não podem ir além das hipóteses previstas no art. 741 do CPC, quaisquer
vícios na transação devem ser discutidos na ação ordinária de rescisão da sentença
homologatória (art. 486, do CPC), e não em sede de embargos à execução. Recurso Especial
conhecido e provido”. STJ-REsp 187.537/RS, 3ª T. j. 23-11-2000, rel. Min. Ari Pargendler,
DJ. 05.02.2001, p. 99. Citado por ARRUDA ALVIM. Forma de impugnação de transação
sobre a qual pesa autoridade de coisa julgada. Repro, v. 201, p. 371, novembro, 2011.
“Quaisquer vícios na transação devem ser discutidos em ação constitutivo-negativa, ou seja,
na ação anulatória, e não em sede de embargos à execução”, idem, p. 371.
“Fora desse caso, o art. 741 do CPC não prevê a possibilidade de ataque ao título executivo,
de modo que os embargos do executado nem podem substituir a ação rescisória (art. 485 do
CPC), nem a ação ordinária de rescisão de sentença meramente homologatória (art. 486 do
CPC”, idem, 371.
“(...) não sendo a rescisão da sentença pleiteável pelos embargos do devedor (...)” Pontes de
Miranda. (Com. Ao CPC. Rio de Janeiro: Forense, 1976, t. XI, p. 94, idem p. 372. “Também é
incorreto falar em ação de nulidade contra atos jurídicos processuais”. DE LUCCA, Rodrigo
Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil brasileiro. REPRO, v.
202, p. 136. São Paulo: RT, dezembro, 2011.
“Acordo devidamente homologado somente pode ser desconstituído pela via da ação
anulatória, prevista no art. 486 do CPC”. STJ. ROMS 3.277/RS. Rel. Min. Costa Leite. 3ª T. j.
27.05.1996, DJU, 05.08.1996, idem, p. 372.
8. Diferenças entre embargos e ação rescisória
Entre os embargos à execução e a ação rescisória existem tantas diferenças, que é
impossível confundi-los. Trata-se de dois institutos jurídicos completamente diferentes, sendo
o primeiro com natureza de defesa47 e a segunda com natureza de ação.
A ação rescisória, como o próprio nome indica, caracteriza-se como ação e não como
defesa em face da execução do julgado. Os embargos, apesar de terem a feição de ação, nada
47 Sobre a natureza dos embargos tratamos com maior amplitude em nosso artigo: Embargos à execução –
natureza jurídica. Revista Dialética de Direito Processual. v. 36, pp. 55-69. São Paulo: Dialética. Março, 2006.
mais são do que defesa contra a execução. O legislador deu aos embargos a forma de ação,
mas restringiu o seu conteúdo somente àquilo que se pode alegar em contestação no processo
de conhecimento, o que deixar claro, tratar-se de ação apenas no sentido formal e mera defesa
no sentido material.
8.1. Aspecto temporal
Não bastasse a diferença matriz no sentido de que a ação rescisória é ação e os
embargos são defesa, ainda, diferem no aspecto temporal. A ação rescisória pode ser proposta
até o prazo de dois (2) anos, a contar do trânsito em julgado e, este prazo, tem natureza
decadencial. Passado esse prazo nada mais se pode fazer48, salvo o caso do revel não citado
ou se invalidamente citado que poderá requerer a ineficácia da sentença a qualquer tempo49.
Porquanto o os embargos à execução, tem o prazo estipulado em quinze dias a contar da
citação para embargar, sendo de natureza simplesmente preclusiva.
Apesar da previsão do prazo de quinze dias que o executado tem para embargar a
execução, este somente começa a correr a partir da citação do executado e esta citação pode se
dar após os dois anos do trânsito em julgado da sentença. Desta forma, a possibilidade de
propositura de embargos perdura até a ocorrência de citação para a execução, não se limitando
ao prazo de dois (2) anos como acontece com a ação rescisória50. A qualquer tempo em que o
executado for citado para a execução terá ele quinze (15) dias para embargar a execução.
Em outros termos, o prazo para embargar somente começa a correr após a iniciativa do
credor em promover a citação do executado, estando a depender da iniciativa do credor;
porquanto o prazo para a ação rescisória começa a correr a partir do trânsito em julgado da
sentença ou acórdão, independentemente da iniciativa de qualquer das partes, encerrando-se o
prazo, ocorre decadência e a rescisão não mais poderá ser requerida.
48 “A sentença transitada em julgado, passados os dois anos da ação rescisória, não é mais nula e não pode ser
desconstituída. O que se impugna ou se embarga, em sede executiva, não é esta sentença transitada em julgado,
mas a própria execução”. DE LUCCA, Rodrigo Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo
civil brasileiro. REPRO, v. 202, p. 134. São Paulo: RT, dezembro, 2011.
49 “O réu revel citado ou invalidamente citado, com isso, pode perfeitamente ajuizar ação declaratória de
ineficácia da sentença mesmo depois de transcorrido o prazo de dois anos da cão rescisória”, DE LUCCA,
Rodrigo Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil brasileiro. REPRO, v. 202, p. 135.
São Paulo: RT, dezembro, 2011.
50 Parece equivocada a posição de ROSSI, Julio Cesar, ao expor: “apresentação de embargos para desconstituir
o título, podendo ser manejado no mesmo prazo em que a ação rescisória poderia ter sido proposta[...]”
Embargos à execução e impugnação ao cumprimento de sentença: Aplicabilidade retroativa às decisões
transitadas em julgado pendentes de imunização. RDDP, v. 103, p. 52. São Paulo: Dialética, outubro, 2011.
8.2. Objeto
Em relação ao objeto destes institutos, a diferença é gritante. O objeto dos embargos é
execução e não a sentença; o objeto da ação rescisória é a própria sentença, mesmo não
havendo execução. Os embargos visam extinguir ou modificar a execução, sem alterar a
sentença; a ação rescisória visa rescindir a sentença. Para os embargos é necessária a
existência de execução, enquanto que para a ação rescisória não se exige execução, podendo
ser proposta antes. durante ou até mesmo após a execução.
Os embargos carregam motivos e fundamentos (não pedido), originados de execução
ou ato executivo após a formação do título de crédito51, porquanto a ação rescisória contém
pedido fundado em fato anterior ou concomitante à sentença (art. 485, do CPC). Até mesmo
quando a lei fala em documento novo (art. 485, VII, do CPC), ela está se referindo a fato
velho e documento que já existia e que a parte não pode fazer uso52.
8.3. Efeitos
Com relação aos efeitos de um e de outra, estes, também são, em muito, diferentes.
Os embargos cuja defesa se volta contra a execução, quando acolhida esta
impugnação, apenas a execução é que será atingida com a extinção ou alteração, mantendo-se,
tanto o título executivo, bem como o negócio subjacente, tal como eram antes53; Como os
embargos apresentam apenas motivos e fundamentos, a sentença que os extingue faz coisa
julgada apenas formal e não material (art. 469, do CPC).
A ação rescisória cujo pedido é a rescisão do julgado, sendo atendido o pedido do
autor, a sentença será atingida e rescindida, desparecendo-se. Neste caso, o que desaparece é a
51 Como os embargos visam atacar a execução, eles não podem conduzir questão já resolvia judicialmente ou
extrajudicial. Assim se expressa: CARMONA, Carlos Alberto, “na execução, é verdade, não se podem mais
abordar as questões de mérito previamente resolvidas”. Em torno do processo de execução. in. Processo civil –
evolução 20 anos de vigência, p. 17. Coord. José Rogério Cruz e Tucci. São Paulo: Saraiva, 1995. No mesmo
sentido: LIEBMAN, Enrico Tulio. “Ainda em relação a essas sentenças, portanto, só se podem alegar como
motivos de oposição os fatos supervenientes”. Embargos do Executado, p. 237. Campinas: M.E. Editora e
Distribuidora, 2000.
52 “2. Não pode ser considerado documento novo aquele produzido após o trânsito em julgado do acórdão
rescindendo. 3. Desqualifica-se como documento novo o que não foi produzido na ação principal por desídia da
parte. 4. Agravo regimental desprovido. STJ – 3ª T. Agr no AI nº 569.566 –RS. Rel. Min. Antônio de Pádua
Ribeiro; j. 24/8/2004; vu. Bol. AASP, nº 2459, p. 1158- Ementário de 20 a 26-02-2006.
53 “Que, depois, a obrigação não exista, é questão distinta, que o juiz examinará e que poderá, determinando
uma sentença dele, suprimir a eficácia do título executório; diretamente sobre a responsabilidade, porém,
nenhuma influência exerce”. LIEBMAN, Enrico Tulio, Embargos do executado, p. 188. Campinas: M.E.
Editora, 2000.
sentença, que é o próprio título. Também, como na ação rescisória o autor faz pedido contra a
sentença, seja este procedente ou improcedente, o julgamento faz coisa julgada material.
8.4. Pedidos
Até mesmo com relação aos pedidos, existem diferenças marcantes entre os dois
institutos. Nos embargos, não há pedido contra o exeqüente e nem pedido contra o título ou a
causa subjacente. Será apenas defesa contra a execução, que nem mesmo poderá ser
considerado pedido, senão apenas motivo ou fundamento. Mas, se por um esforço heróico o
for considerado pedido, este será apenas contra a execução, nada alterando o título e nem a
causa subjacente.
Diferentemente dos embargos, onde não há pedido, senão apenas motivos ou
fundamentos defensivos (art. 745, do CPC), na ação rescisória, de regra, o autor faz dois
pedidos: um pedido rescindendo e outro rescisório (art. 488, I, do CPC).
No pedido rescindendo o autor pede que seja rescindido o julgado anterior, cujo
pedido se acolhido, desfazerá a sentença ou o julgado fazendo com que este desapareça. No
pedido rescisório pede-se que seja dado outro pronunciamento para substitui o julgado
anterior desfeito.
8.5. Competência
Com relação à competência para o julgamento dos embargos e para o julgamento da
ação rescisória, a diferença é extremada.
Os embargos à execução devem ser processados e julgados no juízo onde se processa a
execução, que de regra é o juízo de primeiro grau (art. 575, II, do CPC). Enquanto que a ação
rescisória se processará sempre por órgão de jurisdição superior, jamais em juízo de primeiro
grau (art. 491, do CPC).
O juízo de primeiro grau tem competência para julgar os embargos e negar eficácia
executiva para a sentença, mas, não tem competência para rescindir sentença. Negar a eficácia
executiva é uma coisa, rescindir a sentença é outra bem diferente54. Ao negar a eficácia
54 Tanto para os embargos, bem como para a querela nullitatis Insanabilis a competência do juízo da execução.
neste sentido já pronunciou o STJ. “4. Por outro lado, é assente a orientação do Superior Tribunal de Justiça no
sentido de que a competência para apreciar e julgar a denominada querela nullitatis Insanabilis pertence ao juízo
de primeira instância, pois o que se postula não é a desconstituição da coisa julgada, mas apenas o
reconhecimento de inexistência da relação processual. Neste sentido, são os seguintes julgados: AgRg no REsp
1.199.335/RJ, Primeira Turma, rel. Benedito Gonçalves, DJe 22/03/2011. REsp 1.015.133/MT, Segunda Turma,
executiva o juiz não altera o título, mantém-se a sentença como estava antes55. Ao rescindir o
julgado este será desfeito e, se for o caso, outro julgamento será proferido. Mas somente o
Tribunal tem competência para rescindir julgado (art. 491, do CPC).
8.6. Julgamento
No que se diz respeito ao julgamento dos embargos à execução e da ação rescisória a
diferença é marcante. Os embargos são julgados pelo juiz singular de primeiro grau (art. 575,
II c/c 736, parágrafo único, do CPC), sendo a ação rescisória julgada sempre pelo colegiado
de segunda instância ou grau superior (art. 488, II, do CPC).
Mesmo sendo de competência do Tribunal a ação rescisória deve ser julgada pelo
colegiado, não se cogitando de julgamento singular pelo relator, visto que a lei mencionada,
de forma expressa aponta a necessidade de julgamento pelo colegiado (art. 488, II, do CPC),
sem o qual, não se alcança unanimidade.
Também em relação à matéria a ser julgada a diferença é realçada. Na ação rescisória
há um pedido contra a própria sentença, em que se pede a sua rescisão e a realização de um
novo julgamento pelo tribunal.
Nos embargos, nada se pede contra o título executivo e, por isso, nada se pede contra a
sentença, apenas fundamenta-se que a sentença é inexeqüível e que a execução deve ser
paralisada. Os embargos são alimentados por fundamentos e não por pedido, porque se trata
de meio de defesa e não de ataque como acontece com a ação.
Caso se pretenda atacar a sentença, com pedido de reconhecimento ou de declaração
de sua ineficácia executiva ou de nulidade, há necessidade de propositura de ação declaratória
em separado. Somente em ação própria e autônoma é que se pode postular com força de
sentença declaratória a ineficácia ou a nulidade da sentença, como já se decidiu.56
9. Impossibilidade de efeitos rescisórios nos embargos
Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/Acórdão Ministro Castro Meira, DJe 23/04/2010; REsp 710.599/SP,
Primeira Turma. Rel. Ministra Denise Arruda, DJ. 14/02/2008”. STJ-EDecl na Ação Rescisória nº 569-PE
(1997/0019773-5). RDDP, v. 103, p. 177, outubro, 2011.
55 “reconhecendo-se posteriormente a superveniente extinção do crédito e retirando-se, dessarte, qualquer força
ao título executivo, possa e deva sustar-se a execução que, baseado nele, se pretende fazer prosseguir”.
LIEBMAN, Enrico Túlio. Embargos do Executado, p. 260. Campinas: M.E. Editora, 2000.
56 “2. Caso em que, tendo sido extinta a execução, em razão da declaração de nulidade, em outros autos, do título
executivo”. TRF-1ª R. Ap. 0007048-42-2006.4.01.3813/MG-6ª T. rel. Des. Fed. Daniel Paes Ribeiro, Dje.
19.09.2011. RSDCPC, v. 74, p, 211. São Paulo: IOB, novembro/dezembro, 2011.
Questão que chama à atenção dos estudiosos e que provoca divergência é a de se saber
se os embargos à execução podem ter efeito rescisório. Essa matéria sempre foi e continua
sendo objeto de divergência. Como em toda hipótese de divergência há pensamentos variados
e, por certo, aqui também não faltam aqueles que acham que os embargos podem ter efeito
rescisório57.
Poder-se-ia pensar que após a reforma de 2005 pela Lei 11.232, tal discussão teria
perdido o sentido porque a sentença civil, de regra, não é mais executada via processo de
execução, senão apenas mediante fase executiva, onde não mais existem embargos. Mas,
existem exceções que ainda exigem processo autônomo de execução58.
No entanto, tal discussão ainda tem sentido, porque muitas sentenças ainda exigem
processo de execução e, com isso, defesa através de embargos, como são os casos do art. 475-
N, incisos II, IV, IV, do CPC e, ainda, execução individual de sentença coletiva quando
proposta por prejudicado individualmente. Nestes casos, exigem-se processo autônomo de
execução59 e a defesa do executado será feita via embargos do executado.
No entanto, norteando-se, pelo que foi exposto acima, percebe-se a impossibilidade de
haver embargos com efeito rescisório60 e nem mesmo efeito anulatório da sentença61. Por
57 “Os embargos têm, nesse caso, natureza rescisória do julgado”. NAKAMURA, André Luiz dos Santos. O
princípio da justa indenização e a Coisa Julgada. Bol. CEPGE, v. 35, n. 1, p. 39, jan/fev, 2011; Também: “Ora,
a ação rescisória é disciplinada por lei ordinária (CPC, artigo 485) da mesma forma que os embargos com efeitos
rescisórios, disciplinados no art. 741, parágrafo único, e a impugnação prevista no art. 475-L, parágrafo 1º, todos
do Código de Processo Civil”. ROSSI, Júlio Cesar. Embargos à execução e impugnação ao cumprimento de
sentença: Aplicabilidade retroativa às sentenças transitadas em julgado pendentes de imunização. Revista
Dialética de Direito Processual, v. 103, p. 52. São Paulo: Dialética, outubro, 2011.
58 “Apesar do esforço do legislador reformista para afastar a exigência de processo autônomo de execução para
o caso de sentença condenatória civil comum, não foi possível excluir o processo autônomo de execução para os
demais casos de sentença condenatória como acontece com aquelas previstas no art. 475-N, II, IV e VI e para os
casos de sentença coletiva. SOUZA, Gelson Amaro de. Coisa julgada e execução individual na ação coletiva. In
Panorama atual das tutelas individual e coletiva, p. 427. Coord. BRUSCHI, Gilberto Gomes, MOREIRA,
Alberto Camiña e ALVAREZ, Anselmo Prieto. Estudos em homenagem a Sergio Shimura. São Paulo: Saraiva,
2011.
59 Neste sentido, SHIMURA, Sergio afirma: “Subsistem, todavia, casos em que, mesmo se se cuidar de título
judicial (sentença), continuará havendo processo autônomo de execução”. Tutela coletiva e sua efetividade, p.
166. São Paulo: Método, 2006. FREITAS, Gabriela Oliveira, contrariamente, afirma que a sentença arbitral está
sujeita ao procedimento do cumprimento de sentença, mas, ainda assim faz a observação: “Entretanto, inviável
aplicar integralmente as disposições previstas nos arts, 475-I ao 475-R à execução de sentença arbitral, sendo
necessário observar algumas peculiaridades no tocante à arbitragem”. Execução de sentença arbitral. Revista
Síntese de DC e PC, v. 68, p. 62. São Paulo: IOB, nov/dezembro, 2010.
60 “(...) não sendo a rescisão da sentença pleiteável pelos embargos do devedor (...)” Pontes de Miranda.
Comentários ao CPC. Rio de Janeiro: Forense, 1976, t. XI, p. 94.
61 “Também é incorreto falar em ação de nulidade contra atos jurídicos processuais”. DE LUCCA, Rodrigo
Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil brasileiro. REPRO, v. 202, p. 136. São
Paulo: RT, dezembro, 2011.
várias razões os embargos não podem ter natureza rescisória, porque não são opostos contra a
sentença em si, mas contra a execução ou a sua eficácia executiva62.
Os embargos não se voltam contra o título, senão apenas contra a execução ou sobre a
sua eficácia executiva63. Jamais os embargos poderão se voltar contra a sentença64, como
também contra esta não se volta a impugnação ao cumprimento de sentença, instituto que veio
substituir os embargos para a execução de sentença civil em geral. Como os embargos não
podem se voltar contra a sentença (título executivo), logo, não podem produzir efeitos
rescisórios. Diferem os embargos da ação rescisória, porque esta se volta contra a sentença
para rescindi-la.
Além do mais, a competência para apreciar os embargos à execução é do juízo da
execução, que de regra é o de primeiro grau (art. 575, II, DO CPC), porquanto a competência
para a ação rescisória é sempre do Tribunal. O juízo de primeiro grau de jurisdição somente
poderá reconhecer a ineficácia executiva da sentença, mas, jamais rescindi-la ou anulá-la65.
O Juiz depois de proferir a sentença, não mais poderá alterá-la66, salvo as hipóteses
restritas autorizadas por lei, ou seja, somente para esclarecimentos (embargos de declaração)
ou para corrigir inexatidões materiais ou retificar erro de cálculo (art. 463, do CPC) e nos
casos de indeferimento da petição inicial (arts. 195 e 296, do CPC) e de julgamento imediato
na forma do art. 285-A, do CPC. Assim, quando a sentença é colocada em execução, os
embargos somente o serão contra a execução e não contra a sentença, porque, a sentença
mesma, o juízo já não pode modificá-la.
62 “Os embargos não atingem a sentença, mas sua eficácia”. TJSP. Ap. Cível nº 23.881-4, j. 02-09-1997, JTJ-
Lex, v. 200, p. 47.
63 “Pouco importa se a sentença será retirada do ordenamento jurídico: importa que ela não produza efeitos
contra o réu, proibindo-se o Estado de utilizá-la para constranger o seu patrimônio. A retirada de um ato ineficaz
do ordenamento jurídico é irrelevante; e muitas das vezes, ele sequer poderá ser retirado, pois tratar-se-á de ato
válido, porém ineficaz”. DE LUCCA, Rodrigo Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo
civil brasileiro. REPRO, v. 202, p. 134. São Paulo: RT, dezembro, 2011.
64 “A oposição não se dirige, nem se pode dirigir, contra a sentença como tal, mas somente contra sua força de
título executório”. LIEBMAN, Enrico Túlio. Embargos do executado, p. 232.
65 “O juiz executor não tem competência para anular a sentença exeqüenda, porque a ação rescisória é de
competência privativa dos tribunais (arts. 493 e 494). Se não tem competência para anular a sentença mediante
ação rescisória, com maior razão não tem competência para anulá-la julgando embargos do executado. Deverá,
entretanto, recusar efeitos à sentença, isto é, declará-la inoperante naquele processo de execução”. CASTRO,
Amilcar de. Comentários ao CPC, v. III, p. 394.
66 Essa matéria especificamente foi tratada em nosso artigo: Efeitos da Sentença que acolhe embargos à
execução da sentença por falta ou nulidade de citação na forma do art. 741, I, do CPC. Revista Brasileira
Direito Processual, vol. 6. Gênesis. Curitiba: setembro/dezembro de 1.997, Curitiba-PR e RIPE vol. 20, Bauru,
Dezembro/março de 1998; Revista Nacional de direito e jurisprudência, vol. 9 Nacional de Direito. Ribeirão
Preto: setembro 2000: RT 785 março 2001.
De outra forma a sentença rescindível tem eficácia executiva (art. 489, do CPC) sendo
que a propositura da ação rescisória não retira essa eficácia, enquanto que os embargos à
execução visam demonstrar que a sentença não tem eficácia executiva ou que a execução não
pode ser realizada na forma proposta, mas não visam atacar a própria sentença67, como foi
demonstrado alhures68.
Ação rescisória tem o prazo decadencial de dois anos a contar do trânsito em julgado
da sentença (art. 495, do CPC), porquanto os embargos têm o prazo de quinze dias a contar da
citação para a execução. Não se pode tomar o prazo de dois anos para a propositura da ação
rescisória, para a proposição dos embargos, cujo prazo é de quinze e contados a partir da
citação para execução69, sendo que o ato citatório pode ser antes ou depois de dois anos.
Além do mais, existem vícios que podem ser alegados mesmo após o prazo dos
embargos e da ação rescisória como é o caso da ação autônoma declaratória que pode ser
proposta a qualquer tempo, para declarar a inexistência de dívida ou a inexistência de relação
jurídica processual por falta de citação70.
Conclusões
Feitas estas observações é possível extrair-se algumas conclusões.
1. Os embargos e a ação rescisória são diferentes e não podem ser confundidos.
67 “Quanto aos arts. 475-L, I, e 741, I, do CPC são não mais do que hipóteses que autorizam a resistência do
executado a uma execução fundada em título ineficaz. Não parece que tenham força para atacar a própria
sentença, mas mesmo se a tivessem, não poderiam se estender às sentenças constitutivas e declaratórias. Por isso,
mais uma vez, o problema tem de ser resolvido sob o prisma da ineficácia da sentença e não de sua “invalidade”,
DE LUCCA, Rodrigo Ramina. Querela Nullitatis e réu revel não citado no processo civil brasileiro. REPRO, v.
202, p. 136. São Paulo: RT, dezembro, 2011.
68 Confira nosso: “Efeitos da Sentença que acolhe embargos à execução da sentença por falta ou nulidade de
citação na forma do art. 741, I, do CPC. Revista Brasileira Direito Processual, vol. 6. Gênesis. Curitiba:
setembro/dezembro de 1.997, Curitiba-PR e RIPE vol. 20, Bauru, Dezembro/março de 1998; Revista Nacional
de direito e jurisprudência, vol. 9. Ribeirão Preto: Nacional de Direito, setembro 2000: RT 785 março 2001.
69 Equivocada nos parece a posição de ROSSI, Julio Cesar: “Nessa ordem de idéias, tanto a ação rescisória
quanto os embargos, respeitado o biênio decadencial, cujo termo a quo é a data do trânsito em julgado da decisão
atacada, podem, presentes os requisitos necessários, rescindir a coisa julgada”. Aplicabilidade retroativa às
decisões transitadas em julgado pendentes de imunização. RDDP, v. 103, p. 53. São Paulo: Dialética, outubro de
2011.
70 Diz CARNEIRO, Athos Gusmão: “O signatário deste parecer assim decidiu, em sede jurisprudencial, como
relator do AgRg no Ag 8.089 (STJ, j. em 23.4.1991); igualmente em voto no REsp 11.620, 4ª T. Rel. Min.
Fontes de Alencar; O Professor Araken de Assis, em sede doutrinária, menciona que o uso da “ação autônoma”
não se vincula à observância do prazo para embargos, sendo livre ao executado ajuizar tal demanda mesmo após
ao término da execução”. Hipoteca em garantia de dívida de outrem. Limite da responsabilidade. RDDP, v.
101, p. 135, de agosto de 2011.
2. O prazo para a propositura da ação rescisória é de natureza decadencial e o prazo
para oposição de embargos é preclusivo.
3. A ação rescisória e os embargos têm finalidades diferentes e, por isso, a decisão que
os julgar, também produzirá efeitos diferentes.
4. A ação rescisória, como o próprio indica, visa rescindir o julgado e retirar deste a
força executiva que ostenta até julgamento de procedência da ação rescisória (art. 489, do
CPC). Os embargos não visam modificar o título executivo e nem a causa subjacente, visa
modificar apenas a execução ou até mesmo algum ato executivo, não modificando o título
executivo e a causa subjacente.
5. A ação rescisória visa desconstituir o título sentencial e, por isso, quando acolhida
tem efeito constitutivo negativo ou desconstitutivo como afirmam alguns autores. Os
embargos não portam pedido, produzindo somente fundamentos e, mesmo quando acolhidos,
não produzem alteração no título posto em execução.
6. A ação rescisória conduz pedido contra o próprio título (sentença ou acórdão) e o
julgamento deste pedido faz coisa julgada material. Os embargos não apresentam pedido
contra o credor, nem contra o título ou a causa subjacente, conduzem apenas fundamentos que
servem para a defesa do executado e, que por serem apenas fundamentos (não pedido), o
julgamento destes não faz coisa julgada, à luz do artigo 469, do CPC.
7. Como os embargos apenas conduzem fundamentos, estes quando julgados,
acolhidos ou rejeitados, não produzem coisa julgada material conforma normatiza o art. 469,
do CPC. Disto resulta, que mesmo que acolhidos os embargos para por fim à execução, o
título continua como antes e pode ser utilizado para outras ações, como acontece com a ação
de cobrança ou ação monitória quando a execução é extinta por prescrição executiva.
8. A ação rescisória visa rescindir o julgado em razão de algum daqueles vícios
elencados no art. 485, do CPC e, quando acolhido o pedido rescindendo, desfaz-se o julgado
anterior e passa-se ao juízo rescisório para se proferir novo julgamento. Em sede de embargos
isto não acontece, pois, mesmo sendo acolhidos os embargos para negar a eficácia executiva
do título, não haverá outro julgamento.
9. Nos embargos haverá apenas um julgamento e não dois como se dá na ação
rescisória. Por isso, é impossível haver embargos com efeitos rescisórios. Porque o
julgamento com efeito rescisório, de regra exige-se novo julgamento, o que não acontece no
julgamento dos embargos à execução.
10. A competência para rescindir um julgado de primeiro grau será sempre de
Tribunal, porquanto para o julgamento dos embargos à execução a competência será do juízo
de primeiro grau onde corre à execução.
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