a experiÊncia agroecolÓgica e educativa da eem … · em geografia (licenciatura e bacharelado),...

58
Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) Convênio: UNESP/INCRA/Pronera Parceria: Escola Nacional Florestan Fernandes A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM “PAULO FREIRE”: CONTRIBUIÇÕES PARA A FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO CAMPONÊS EM ABELARDO LUZ - SC GILBERTO VILANT DE BIASI Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Clifford Andrew Welch Co-Orientador: Tiago Egídio Avanço Cubas Monitor: Annelise Mariano Presidente Prudente 2011

Upload: trannhi

Post on 09-Nov-2018

215 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado)

Convênio: UNESP/INCRA/Pronera Parceria: Escola Nacional Florestan Fernandes

A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA

DA EEM “PAULO FREIRE”: CONTRIBUIÇÕES PARA A

FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO CAMPONÊS EM

ABELARDO LUZ - SC

GILBERTO VILANT DE BIASI

Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Prof. Dr. Clifford Andrew Welch

Co-Orientador: Tiago Egídio Avanço Cubas

Monitor: Annelise Mariano

Presidente Prudente

2011

Page 2: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA

DA EEM “PAULO FREIRE”: CONTRIBUIÇÕES PARA A

FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO CAMPONÊS EM

ABELARDO LUZ - SC

GILBERTO VILANT DE BIASI

Trabalho de monografia apresentada ao Conselho do curso de Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia, campus de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Prof. Dr. Clifford Andrew Welch

Presidente Prudente

2011

Page 3: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

Gilberto Vilant de Biasi

A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA

DA EEM “PAULO FREIRE”: CONTRIBUIÇÕES PARA A

FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO CAMPONÊS EM

ABELARDO LUZ - SC

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Bacharel em Geografia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, submetida à aprovação da banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Presidente Prudente, novembro de 2011

Page 4: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos,

O meu Professor orientador Cliff e os meus monitores Liciane, Annelise e Tiago que muito

contribuíram pra a construção da minha monografia.

Agradeço também aos meus colegas de turma, pois estes me ensinaram profundamente em

todos os aspectos.

A minha família de modo geral, sobretudo a minha irmã Simoni e amiga Simone que doaram

parte do tempo lendo minha escrita, corrigindo e sugerido.

Page 5: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

Por um lado, é necessário modificar as condições sociais para criar um novo sistema de ensino;

por outro, falta um sistema de ensino novo para poder modificar as condições sociais.

Consequentemente, é necessário partir da situação atual. Karl Marx

Page 6: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

RESUMO O objeto desta monografia é uma avaliação do curso de agroecologia desenvolvida na Escola

Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina, e sua contribuição

para fortalecer o território camponês da região. Utiliza pesquisa bibliográfica, encontros com

especialistas, trabalhos de campo na própria escola, entrevistas com administradores da escola

bem como seus professores, alunos e seus pais. Minhas impressões a cerca do meu objeto de

pesquisa demonstraram que há por detrás da proposta de curso e da própria escola, iniciativas

importantes que tentam resolver os problemas que a realidade apresenta, sugerindo

metodologias, currículo, conteúdos, calendário que possam servir de base de analise e

investigativa dessa realidade bastante complexa e contraditória. Dentre, poderíamos elencar a

própria produção agroecológica, (como contra senso) e construção de uma educação que é

forjada diariamente na luta dos trabalhadores no acampamento e no assentamento, promova o

ser humano emancipado pelo trabalho cooperado socialmente necessário e útil.

Palavras-Chave: Educação do Campo; formação técnica; agroecológica

ABSTRACT

The objectives of this monograph are to describe the development and assess the contributions

of the Paulo Freire High School agroecology course toward strengthening peasant territory in

Abelardo Luz, Santa Catarina state. It uses literature, conference presentations, field research,

and interviews with school administrators, teachers, students, and parents to achieve these

objectives. Research conclusions about the object indicate that behind the pilot course and the

school itself, important initiatives are in place to solve the real-life problems of peasants,

suggesting that the course’s methodologies, curriculum, content, and schedule offer important

insights for investigators to analyze the very complex and contradictory reality of peasants.

Among insights gained, we emphasize how the course teaching practical agro-ecological

production methods and the construction of pedagogical techniques that are compatible with

the daily reality of workers in encampments and settlements, demonstrating that human

beings emancipated by education foster cooperative work that is both socially necessary and

useful.

Keywords: Education for the Countryside; agroecology; technical education

Page 7: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

Lista de Siglas APP Associação de Pais e Professores ATES Assistência Técnica dos Assentamentos CEGeT Centro de Estudos em Geografia do Trabalho CNBB Conselho Nacional dos Bispos do Brasil COOPEROESTE Cooperativa ligada aos assentamentos de Santa Catarina COOPERUNIÃO Cooperativa de Produção Comercialização da Fronteira COOPTRASC Cooperativa de Prestação de Serviço de Santa Catarina CPFP Centro de Produção e Formação Popular EEM Paulo Freire Escola Estadual de Ensino Médio Paulo Freire EJA Educação de Jovens e Adultos

EMATER Empresa de Assistência Tecnica e extensão Rural do Estado de Minas Gerais

ENERA Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária

EPAGRIs Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina

FCT/UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus de Presidente Prudente

FUNDEP Fundação e Educação e Pesquisa GPT Grupo Permanente de Trabalho IFET Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária ITERRA Instituto de Educação e Reforma Agrária “Josué de Castro” MEC Ministério de Educação MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra NERA Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária

ONU Organização das Nações Unidas PAA Programa de Aquisição de Alimento PPP Projeto Político Pedagógico PRONAF Programa Nacional da Agricultura Familiar PRONERA Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária UnB Universidade de Brasília

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

UNICEF Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para as Crianças

Lista de Figuras

Figura 1 Vacas crioulas para produção de leite a base de pasto 44

Figura 2 Produção de hortaliças para auto-consumo e venda no PAA (Programa de Aquisição de Alimentos)

45

Figura 3 Alunos e professora medindo declividade para curvamento de nível com equipamentos tradicionais: mangueira de nível e “pé-de-galinha”

45

Figura 4 Alunos fazendo a coleta de solo para posteriormente fazer análise 46

Figura 5 Educandos, pais e educadores visitando área na escola: experimento do curso técnico agroecológico de cobertura verde para recuperação de solos degradados

46

Page 8: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

Figura 6 Alunos produzindo sabão para auto-consumo 47

Figura 7 Alunos produzindo substrato para produção de mudas 47

Figura 8 9º Jornada de Agroecologia Em Francisco Beltrão/PR 49

Figura 9 Alunos do curso técnico em campo 50

Page 9: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 9

CAPÍTULO 1 - A EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE CONSTRUÇÃO SOCIAL NO MST.............................................................................................................. 11

1.1- O MST COMO SUJEITO PEDAGÓGICO............................................................... 11

1.2 - RELEMBRANDO A LUTA PELA EDUCAÇÃO NO MST .................................... 17

CAPÍTULO 2 - ESCOLA, AGROECOLOGIA E TERRITÓRIO CAMPONÊS ........... 23

2.1 ESCOLA DO CAMPO................................................................................................. 23

2.2 AGROECOLOGIA CAMPONESA ............................................................................ 26

2.3 - TERRITÓRIO CAMPONÊS EM ABELARDO LUZ .............................................. 30

CAPÍTULO 3 - EDUCAÇÃO DO CAMPO E AGROECOLOGIA: O CASO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PAULO FREIRE .................................... 34

3.1 - ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PAULO FREIRE ............................ 34

3.2 - PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO PAULO FREIRE ............................................................................................................... 38

3.3 - CURSO DE ENSINO MÉDIO INTEGRADO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL EIXO DE TECNOLÓGICO DE RECURSOS NATURAIS CURSO ‘TÉCNICO EM AGROECOLOGIA’ .......................................................................................................... 39

3.4 - CONSTRUÇÕES DE PRÁTICAS SOCIAIS E AGRÍCOLAS EMBASADAS PELOS PRESSUPOSTOS DA AGROECOLOGIA NA EEM PAULO FREIRE E ÁREA DE ABRANGÊNCIA ......................................................................................................... 43

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 53

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 56

Page 10: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

9

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por objetivo principal fazer uma discussão em torno de um tempo

bastante polêmico no campo brasileiro e, sobretudo, na vida dos camponeses de Abelardo

Luz, Santa Catarina, no que diz respeito à formação técnica de modo geral e especificamento

no Curso de Ensino Médio Integrado a Educação Profissional no Eixo Tecnológico de

Recursos Naturais, o chamado curso “Técnico em Agroecologia.”

O objeto específico de analise, ainda com muitas limitações teóricas, é o Centro de

Produção e Formação Popular (CPFP) que funciona na EEM Paulo Freire do município.

Procuramos entender a relação estas têm com os assentamentos da abrangência da escola,

alguns conceitos da agroecologia e da Educação do Campo, relacionando-as com as teorias

estudadas e as práticas realizadas na escola. Tentaremos demonstrar o quanto é importante

para os trabalhadores do campo o espaço da escola como espaço de luta, também, por um

território camponês coeso, mesmo que contraditório.

No primeiro capítulo argumentamos sobre a construção dos espaços escolares,

sobretudo os formais, mas também os informais, e da luta pela terra como espaço pedagógico

de construção coletiva da escola. Tentaremos dialogar com alguns intelectuais que ao longo

dos anos vem se debruçado em esforços para melhor compreender essa forma pedagógica.

Procuraremos levar em conta os acontecimentos temporais, porém consideraremos de que as

ações do dia-a-dia no assentamento fossem valorizadas como partes importantes dessa

construção.

O segundo capitulo abordará alguns conceitos da agroecologia e sua aplicabilidade na

formação dos jovens do campo, tendo por base dois aspectos básicos: a permanência dos

jovens no campo porque são essenciais para promover a produção alimentar de fato e a

reprodução do campesinato, com suas formas distintas de organização da produção, cultural,

etc. A resistência camponesa através da luta, e a sua recriação também pela agroecologia

camponesa é um aspecto fundamental do qual faremos parte e tentaremos expor no capítulo

que segue.

No terceiro capítulo examinaremos o curso e a própria escola no sentido de entender o

processo de construção de um curso técnico agroecologico de ensino médio dentro do MST.

Aborda também como o curso tem ganhado corpo como alternativa para o desenvolvimento

do campo, a manutenção camponesa e construção do território camponês. Tentaremos

Page 11: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

10

demonstrar o processo de readequação da escola ao longo dos últimos 20 anos com a

nucleação e analisar o significado disso para as comunidades.

Tendo por base a abordagem já feita da Educação do Campo e da Agroecologia, o

argumento aqui é que a EEM Paulo Freire tem avançado muito no processo de capacitação

dos alunos para o exercício da agroecologia bem como a contribuição deste curso a sociedade

no que tange o próprio conceito de agroecologia. A implantação do curso como matriz

tecnológica de fato bem como seu papel na fortalecimento do território camponês servem de

exemplo no que diz respeito à propria gestão e dos espaços orgânicos como a elaboração do

Projeto Político Pedagógico (PPP), de seminários, da formação da Associação de Pais e

Professores (APP), etc.

Por último, apresentaremos uma série de eventos que acontece no espaço da escola e

na luta dos trabalhadores; nos cre que a EMM Paulo Freire esta intrinsecamente ligada a luta

camponesa no território e preocupada com uma boa formação técnica, mesmo que

contraditória, e a construção de sujeitos históricos.

Page 12: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

11

CAPÍTULO 1

A EDUCAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE CONSTRUÇÃO SOCIAL NO MST

No primeiro capítulo tentaremos insistentemente argumentar sobre a construção dos

espaços escolares, sobretudo os formais, mas também os informais, e a luta pela terra como

espaços pedagógicos de construção coletiva da escola/educação do campo vinculada a luta

dos trabalhadores do campo. Tentaremos fazer menções a alguns intelectuais que ao longo

dos anos vem se debruçado em esforços para melhor compreender essa forma pedagógica

bem como seus acontecimentos temporais, porém, gostaríamos que as ações do dia a dia no

assentamento fossem valorizada como parte importante dessa construção.

1.1- O MST como sujeito pedagógico

Muito do que se propõem a Escola de Ensino Médio Paulo Freire (EEM Paulo Freire)

e o Setor de Educação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ou mesmo

o Curso de Cnsino Médio Integrado a Educação Profissional no Eixo Tecnológico de

Recursos Naturais (o curso ‘Técnico em Agroecologia’), bem como o curso de ensino médio

regular da escola em questão, fazem parte de uma discussão que vem sendo engajada no

município de Abelardo Luz ao longo dos últimos 25 anos desde que o conceito da Educação

do Campo começou ser elaborado.

Além, da luta pela terra, a partir de 1985, ano da primeira ocupação de terra em

Abelardo Luz, Santa Catarina, bem como outras grandes ocupações, o MST estabeleceu em

seu ideário de reivindicações a luta pela educação popular no campo.

A luta por terra logo de início ganhou outras metas, pois os camponeses se deram

conta na luta cotidiana, no acampamento, e depois no assentamento, na caminhada, enfim, no

movimento social, que a terra seria importante, também como suporte para as demais

conquistas, tais quais: a alimentação, a moradia, a cooperação e a educação. A terra seria,

juntamente com os elementos acima citados, fundamental para a reprodução cultural

camponesa e formação de um território sólido.

Page 13: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

12

Uma das preocupações que logo foi percebido que, para garantir a continuidade da

vida no campo, deveria se preocupar com a atração dos jovens do campo que viam - e ainda

veem - no urbano uma oportunidade de crescimento e bem estar. Esse era também, um dos

motivos da luta para tornar a escola um espaço de reprodução da identidade cultural

camponesa. Assim, a ocupação da escola, tornando - se um território camponês se torna

essencial do ponto de vista da viabilização do projeto sem terra.

Alguns intelectuais entre eles Fernandes (1999) reforça a idéia de que o campo

brasileiro ao se modernizar, principalmente nas últimas décadas, e ao escrever sobre esse

campo promove amplo debate que se fundamenta pelo profundo êxodo rural que chegou a 30

milhões entre 1960 e 1980, sendo que na última década o número é de 16 milhões de pessoas.

Esse processo de desenvolvimento provocou uma nova composição espacial, o campo se

esvazia para dar lugar à mega - projetos como barragens, à destruição florestal, à mecanização

e outras mudanças provocadas pela Revolução Verde da época. Por outro lado, as cidades

crescerem e junto com elas as mazelas sociais, a acumulação, sobretudo das terras no campo,

e na cidade o desemprego, já que a indústria não conseguiu absorver toda a mão-de-obra

vinda do campo e por conseqüência instalaram-se a miséria e a violência.

Esses processos migratórios provocaram uma des-territorialização dos camponeses,

tendo em vista um novo rearranjo espacial que o capital provocou no campo, rearticulando o

próprio campo do ponto de vista do trabalho, das tecnologias promovendo um falso

desenvolvimento com a agroindústria presente para além das metrópoles.

A des-territorialização do campesinato provocou muitos conflitos fundiários que mais

tarde se transformam em movimentos sociais, tutelados por algumas igrejas principalmente a

Católica que seguia a Teoria da Libertação e por alguns partidos políticos, como o PT, que

põem na ordem do dia, a Reforma Agrária, reprimida no início da década de 1960 com a

supressão das Ligas Camponesas do nordeste e outros movimentos sociais do campo, como

Mastro e o Master, Paraná e Rio Grande do Sul.

Fernandes (1999) afirma que o processo de ocupação dos camponeses é

reterritorialização ou a territorialização em alguns casos, já que muitos latifúndios que haviam

se constituído a partir da expulsão dos camponeses foram retomados, ou até mesmo, em

alguns casos em que grandes latifúndios, históricos, foram ocupados pelos camponeses Sem

Terra.

Page 14: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

13

O processo até então vivenciado não havia feito a ruptura entre o urbano e o rural, pois

o campo – predominante no Brasil até os anos 1960 - agora foi subordinado à cidade. Para

começar restaurar o equilíbrio, fazia-se necessário estabelecer um novo modelo de agricultura,

uma nova educação que levasse ao campo desenvolvimento embasado em pressupostos

ambientais e preservação de modos de vidas milenares - por excelência, a camponesa - e para

isso a educação diferenciada se fazia necessária, já que a luta pela terra teria despertado na

sociedade outros elementos sócio-culturais, portanto, outras perspectivas e outros valores.

Então, foi no contexto da luta pela terra e na terra que nasceram as escolas nos

assentamentos e acampamentos. Segundo Roseli Salete Caldart (2002), a luta pela educação

acontece em três momentos básicos. O primeiro é quando as famílias mobilizam-se pelo

direito à escola, sua principal preocupação é o futuro dos filhos; o segundo é quando o MST,

organização de massa, articula os professores e as famílias a fim de garantir uma proposta

pedagógica específica, e a coordenação dessas escolas. No terceiro momento se consolida a

idéia de que assentamentos e acampamentos têm que ter escola, com pedagogia do MST.

Foi no segundo momento que nasceu o Setor de Educação do MST. Esse setor tem a

incumbência de articular as lutas pela educação internamente com a sociedade. Cria-se uma

identidade de classe e a escola passa a ter um papel estratégico na luta pela Reforma Agrária e

na formação dos Sujeitos Sem Terra.

Ao fazer isso o MST, através das suas escolas e de suas mobilizações por políticas

públicas, provocou debates na sociedade.

Muitos foram os intelectuais, que se debruçaram sobre a proposta e que começaram a

pesquisar e contribuir de forma significativa ao modelo de sociedade e de educação escolar

que o movimento objetivava. Muitos deles tornaram-se intelectuais orgânicos 1

1 Para Gramsci todos os homens são intelectuais, mas nem todos possuem na sociedade esta função de intelectuais alem do mais intelectuais orgânicos pertencentes a um determinado grupo social com níveis diferenciados de inserção.

a partir do

apoio que as universidades públicas como, por exemplo, a Universidade de Brasília (UnB)

que mantém junto ao Instituto Josué de Castro em Veranópolis um curso de licenciatura com

o MST. Também, se cita aqui a Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”,

campus de Presidente Prudente (FCT/UNESP) que mantém junto ao seu campus e em

parceria com a Escola Nacional Florestan Fernandes um curso de Geografia e dois grupos de

pesquisas ligadas ao departamento de geografia que o Núcleo de Estudos, Pesquisas e

Projetos de Reforma Agrária (NERA) e o Centro de Estudos em Geografia do Trabalho

Page 15: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

14

(CEGeT), estes dois grupos detém em seus bancos de dados muitos estudos e dados respeito

da luta pela terra no Brasil e na via Campesina de modo geral.

Para Caldart (2000), o movimento social é o sujeito pedagógico, pois estabelece a luta

pela terra de maneira coletiva como processo de formação dos Sem Terras como sujeito

histórico, com atuação intencional no processo de formação das pessoas. A autora diz,

também que a luta pela terra é uma luta de classe e estabelece a educação como espaço

privilegiado para a contestação do modelo capitalista bem como seus valores paradoxalmente

a construção de novos valores embasados humanistas, ou no resgate da humanidade.

Ver o MST como sujeito pedagógico significa trazer duas dimensões para a reflexão pedagógica: uma destas dimensões se refere aos novos personagens que faz entrar em cena na reflexão pedagógica e a outra dimensão diz respeito a formação dos sem-terras com materialização de um modo de produção da formação humana (CALDART, 2000, p.199).

Essa autora reforça a luta pela terra, como uma condição essencial para a implantação

de uma educação, ferramental de construção de sujeito histórico. Caldart (2000) destaca em

primeiro lugar o movimento social como sujeito sociocultural, enfatiza o momento da luta

pela terra como espaço de construção da consciência e, portanto, da própria escola. Fernandes,

por sua vez, trabalha com a espacialização da luta através da formação dos territórios,

sugerindo os conceitos de des-territorialização e a análise muito mais disciplinada do ponto de

vista acadêmico, do acúmulo de espaço e de forças, combinando e o trazendo mais

insistentemente características culturais, econômicas, de produção e trabalho, da forma como

o camponês se relaciona com o mercado, etc., da reafirmação do campo como território de

identidade camponesa com toda sua multidimencionalidade e conflitualidade como

característica do prorio conceito de território.

Caldart (2000) nas suas ponderações, diz que a escola retrata em primeiro plano o

Movimento Humano em prol de algo específico, a terra, mas que ganha dimensões para além,

pois o processo recria e cria valores e expectativas, pois coletivamente o sujeito consegue

fazer uma análise mais apurados dos seus direitos, historicamente negados.

É talvez neste momento bastante diferenciado da/na luta que se criou a Escola do

Campo, que vá se contrapor ao modelo que foi criado socialmente burguês, para servir ao

interesse da classe industrial no início do século XX e depois pelos modelos de modernização

ocidental, tais como a Revolução Verde, com o tipo de escola fazenda profissionalizante norte

Page 16: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

15

americana, que ajudaria na implementação da mecanização rural e outras novas formas de

agricultura intensiva, que contribuíram para transformar parte do campo em um lugar

tecnológico e excludente, devastadora do ponto de vista ambiental e cultural.

Fernandes (1999), reafirma e vê na educação um espaço fundamental para a

implementação de um modelo de agricultura sustentável e de outra sociedade a partir da

escola:

Um projeto de educação que contribua para com a realidade camponesa é fundamental da modernização da agricultura brasileira [...] reconhecida por sua produtividade e por sua resistência histórica na sociedade moderna [...] um modelo de agricultura sustentável, e em harmonia com o meio ambiente. Existe a urgência de investimento na interpretação e produção de conhecimento da agricultura camponesa. Um passo é reconhecermos a necessidade da escola do campo. Valorizar essa condição é o ponto de partida. (1999, p.38)

Portanto, a escola deve ser um centro irradiador da agroecologia como matriz

tecnológica moderna e adaptada, com base nos conhecimentos adquiridos pelos camponeses

ao longo do tempo. A escola deve estimular a diversidade de cultivares, bem como a busca e

resgate as sementes crioulas, bem como os métodos usados na seleção das sementes que iriam

ser cultivadas, estimulando as trocas de sementes, como prática secular entre os camponeses,

evitando assim, o refinamento genético e fortalecendo uma prática cultural de cooperação,

solidariedade entre os trabalhadores do campo e da cidade.

Em 2010, no segundo ano do curso técnico e como parte das atividades do curso

técnico agroecológico da EEM Paulo Freire, promoveu-se um seminário de agroecologia

como Tema: Agroecologia como Ferramenta de Luta. Na ocasião a assentada e Coordenadora

do MST Irma Brunetto rememorizou em um seminário a luta dos sem-terra em Santa Catarina

de 1985 em diante (apud BIASI, 2010). Depois de décadas de ditadura militar e êxodo

rural foi difícil à adaptação das famílias no novo espaço ocupado, pois muitas se viam presos

nas antigas comunidades e nas velhas formas de produção, que o próprio processo de

expropriação lhes tinham imposto a partir da Revolução Verde.

No seminário, Brunetto fez apontamentos que ajudaram entender como naquele

momento era importante para os Sem-terra repensarem as formas estruturais de produção e

comercialização. A educação foi vista então como um importante instrumento de

transformação de hábitos, crucial para fomentar uma transição paradigmática:

Page 17: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

16

[...] Quando começamos a lutar inclusive com a 1º ocupação de Abelardo Luz em maio de 1985 o desafio mais difícil era a terra e a terra era o mais importante. Os primeiros anos de assentamento foram os mais difíceis. Quando o assentamento foi feito, os assentados voltarão a fazer o que já faziam nas antigas comunidades, essas práticas que já tinham sido provados que não serviam... as discussões feitas nas lutas dando entender que precisávamos pensar em outro Ser Humano e uma sociedade diferente, provocaram também a idéia de pensar o assentamento para alem da terra do lote em que se implementaria adiante modos de vida mais humano e justo... Precisávamos pensar o assentamento para além da terra e a escola deveria ser pensada diferente [...] (BRUNETTO, apud BIASI, G., 2010)

Para os assentados naquela época ter escola nos assentamentos e até mesmo nos

acampamentos significava manter os jovens no campo e reproduzir pelos bancos escolares as

formas de organização que eles tinham construído no acampamento a partir do movimento

social. Pois, eles perceberiam que não poderiam retroceder na luta, pois para eles era mais

fácil conquistar a terra que permanecer na terra. Portanto, a escola se tornaria instrumento de

transformação, ajudando a tornar este novo território camponês muito mais coeso como

política de estado e que respeite a nossa realidade.

Ainda como nos diz Brunetto:

Os primeiros professores foram militantes como formas de garantir ideologia do movimento. A escolha necessariamente passava pelo povo, eles diziam quem deveria ser o professor! ...a comunidade deve querer uma educação diferente, ela deve ser construída coletivamente, ou seja, todos juntos. O grande mistério da educação do campo é educar a partir da realidade a partir dos valores de justiça, solidariedade e coletivo, etc. Só o coletivo educa... até quando o ser humano for vivo ele pode mudar, mas só o coletivo educa (apud BIASI, G., 2010).

Esta luta dos trabalhadores sem-terras, sobretudo os ligados ao MST, assumiram a

responsabilidade de propor uma nova forma de organização da sociedade. Contestação da

estrutura educacional que se debilitou ao longo das décadas da revolução verde, sobretudo no

campo com o êxodo rural e sua reorganização espacial, recriou novas formas de organização

do trabalho com formas diferenciadas cooperação e com apropria agroecologia e formação

agroecológicas com cursos formais e informais. Nos espaços de formação cultural reavivou o

próprio conceito de camponeses intimamente ligados a terra propondo distribuição de terra e

provocando a priori outra conformação espacial no que diz respeito à estrutura fundiária.

Portanto, faz necessário reforçar que a escola do campo é forjada na luta e com luta

dos trabalhadores organizados nos acampamentos e nos assentamentos, sob a ótica, a priori

Page 18: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

17

resolver um problema prático de suprir com as demandas desse local e concomitante a isso

reproduzir uma ideologia que reproduzisse formas de organização que respeitasse o momento

histórico que a luta pela terra no MST estava e ainda esta vivendo.

1.2 - Relembrando a Luta pela Educação no MST

Para que possamos entender a constituição da proposta da Educação do Campo é

importante lembrar três momentos históricos, dentre tantos que aconteceram, nas mais

variadas formas. Esses momentos foram importantes para a acumulação enquanto proposta,

pois foi onde a sociedade se fez representar em alguns encontros para assimilar o que de novo

estava acontecendo no campo na área da educação.

O primeiro momento deles foi o Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da

Reforma Agrária (1° ENERA). O encontro aconteceu no mês de julho de 1997 na

Universidade de Brasília. Tal encontro foi promovido pelo MST, principal articulador, em

parceria com algumas universidades, entre elas a UnB, a Organização para Educação, a

Ciência e a Cultura da ONU (UNESCO), o Conselho Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

e Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para as Crianças (UNICEF). O

encontro abordou de maneira objetiva a educação tendo por base os sujeitos e suas

experiências.

No 1º ENERA foram denunciadas as condições precárias do povo do campo,

sobretudo às relacionadas ao ensino, como por exemplo: falta de escolas, alto índice de

analfabetismo, principalmente entre os camponeses, falta de docentes capacitados, evasão

decorrente das condições de acesso, ausência de uma proposta de valorização do homem do

campo e adequada à cultura e ao tempo, entre outros. Além da denuncia dos problemas acima

citados, também foram levantadas propostas como o PRONERA (Programa Nacional de

Educação na Reforma Agrária). O PRONERA foi definido como uma política pública do

governo federal, que tem como objetivo geral promover ações educativas nos assentamentos

da reforma agrária, com metodologias de ensino específicas à realidade sociocultural do

campo. Podemos, dizer que a partir do 1º ENERA a educação do campo passou a fazer parte

da agenda institucional do governo.

O segundo momento foi um desdobramento do 1° ENERA, denominada a Conferência

“Por Uma Educação do Campo”, que aconteceu em Luziânia, Goiás, em julho e 1997. O

Page 19: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

18

evento afirmou-se a necessidade de políticas púbicas educacionais para o campo que levasse

em conta as necessidades e a realidade do povo do campo, quais sejam: os quilombolas, os

indígenas, os ribeirinhos, os assentados, meeiros, reassentados, bóias-frias, pescadores,

agregados, roceiros, e outros.

Tal proposta, se baseava na idéia de utilizar a escola para ajudar sustentar a realidade

camponesa. A prioridade era resolver os problemas de analfabetismo nas várias faixas etárias

e promover o desenvolvimento humano e das comunidades. A luta era que a educação

específica, para sujeitos do campo se tornassem uma política pública, financiada pelo Estado.

Em relação às políticas do Estado, a Educação do Campo foi reconhecida na Lei

Diretriz de Base (LDB) de 1996, quando essa aceitou a diversidade sociocultural e o direito à

igualdade e à diferença, possibilitando a definição de diretrizes operacionais para a educação

rural sem, no entanto, necessidade de romper com o objetivo de construir um o projeto global

de educação para o país.

Pela a LDB, a idéia da mera adaptação foi substituída pelo conceito de adequação, o

que significou levar em conta, nas finalidades, nos conteúdos e na metodologia, os processos

próprios de aprendizado do estudante, que criou espaço para especificar novas iniciativas para

o campo. Permitiu, ainda, a organização escolar própria, a adequação do calendário escolar às

fases do ciclo agrícola e às condições climáticas.

O terceiro momento que marca a Educação do Campo foi em 2001, quando finalmente

as diretrizes operacionais para a educação básica das escolas do campo foram aprovadas pelo

Conselho Nacional de Educação. Essas diretrizes contemplam um conjunto de preocupações

conceituais e estruturais presentes historicamente nas reivindicações dos movimentos sociais.

Dentre elas o reconhecimento e valorização da diversidade dos povos do campo, a formação

diferenciada de professores, a possibilidade de diferentes formas de organização da escola, a

adequação dos conteúdos às peculiaridades locais, o uso de práticas pedagógicas

contextualizadas, a gestão democrática, a consideração dos tempos pedagógicos

diferenciados, a promoção, através da escola, do desenvolvimento sustentável e do acesso aos

bens econômicos, sociais e culturais.

Ainda, o movimento pressionava para criar outras políticas por parte do Estado, como

o Grupo Permanente de Trabalho (GPT), com a principal atribuição de articular as ações dos

ministérios para executar as diretrizes operacionais para a Educação do Campo.

Page 20: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

19

Uma das importantes ações do GPT fora a promoção, junto a Via Campesina, do 1º

Seminário Nacional sobre Educação Básica de Nível Médio nas Áreas de Reforma Agrária

que aconteceu em Luziânia, Goiás entre 18 a 22 de setembro de 2006. O seminário estava

organizado em torno do tema: “Caminhos da Educação Básica de Nível Médio para a

Juventude de Reforma Agrária” como objetivo de fazer do campo um lugar de formação

integral e de produção de fato.

Foi um encontro massivo, com representações de 197 escolas públicas de

assentamentos sendo que 38 de nível médio. Além da participação do GPT e Via na sua

organização, também colaboraram representantes de universidades e algumas secretarias de

educação estaduais e municipais.

O seminário se iniciou à luz de um diagnóstico alarmante. Segundo, os dados da

Pesquisa por Amostra de Domicílios (PNAD, 2004) havia em torno de 6 milhões de jovens no

campo entre 15 a 17 anos. Desta faixa etária eram 47 mil jovens fora da escola e dos que

frequentavam, pouco mais de 28 mil estavam no ensino médio. Entre os assentados os

números eram também bastante alarmantes. De um total de mais de 1, 4 milhões de jovens

assentados na faixa etária 15 a 25 anos, apenas 92 mil concluíram o ensino médio.

Para compreender essa realidade, contextualizamos que das duas mil escolas que o

MST conseguiu implantar nos assentamentos, menos que 50 oferecerem ensino médio, sendo

que a metade das escolas são extensões de escolas urbanas, do jeito que a EEM Paulo Freire

funcionava até tornar autônoma no ano de 2006.

No 5º Congresso Nacional do Movimento Sem Terra em 2007 propôs (o que, frase

sem sentido) reafirmando alguns desafios que nasce junto à base. Entre estes objetivos

poderíamos elencar:

- de transformar os assentamentos em territórios livres do analfabetismo, com

educação para todos,

- viabilizar economicamente com produção de alimentos sadios e diversificados,

garantindo assim a seguranças alimentar e o respeito a meio ambiente.

- desenvolver técnicas agroecológicas de produção agrícola, respeitando assim à

biodiversidade e água.

- identificar a luta por acesso à educação em todos os níveis, profissionalizante e

integral, que ela seja um direito, portanto política pública e que ela seja específica, do

e para campo, território camponês. Enfim, a idéia central era de desenvolver e praticar

Page 21: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

20

de forma permanente os valores humanistas como solidariedade, companheirismo,

indignação e a cooperação, etc.

O documento final do congresso do MST/2007 ofereceu orientações para o

movimento seguir até o próximo congresso em 2012. Entre elas são o desafio de avançar na

solução dos problemas estruturais históricos do capitalismo, especialmente a tendência da

lógica de “propriedade privada” ser levada ao extremo de tornar tudo privada quer dizer

propriedade de alguém até mesma vida. Para isso é urgente, os congressistas concluíram, que

cria condições objetivas e subjetivas (que nem consciência social), afim de que esta ordem

seja mudada. Uma das formas tradicionais, reafirmadas pelo congresso, é tornar as escolas,

sobretudo, as do campo em espaços de elaboração e aplicação de uma nova educação (MST,

2007).

Ao analisarmos a historia da Educação do Campo, sobretudo seu aspecto de ser uma

política pública, responderia pela universalização do espaço escola, pois resolve quase por

completo as questões de analfabetismo, ausência de escola, etc. Veremos o quanto ela evolui

do ponto de vista pedagógico. Se estabelecermos o alcaboço acadêmico teórico construído, se

levarmos em conta que muitos jovens do campo já podiam estudar em universidades públicas,

fazendo cursos adaptados ao tempo do campo, etc. Dos pouco mais de 100 anos de escola

moderna, temos o reconhecimento social de que existe uma escola diferente. Reconhecida

recentemente em 2010, pelo presidente Lula em mais um decreto nº 7352, consolidando de

vez por toda a pedagogia do campo.

Ao analisarmos o decreto em questão, mencionado acima poderíamos sem sombra de

dúvida que há um reconhecimento por parte do Estado brasileiro por uma cultura especifica e

com território bem definido, pois tal documento elenca todas as situações em que se pode

discriminar como educação do campo, desde o sem-terra no assentamento até o ribeirinho na

Amazônia.

Em se falando de um caso especifico, no caso de Abelardo Luz há no campo, segundo

a secretaria de educação municipal, são considerados escola do campo, duas escolas de

básicas com mais de 1200 alunos, duas escolas que a comunidade não permitiu que fossem

nucleadas, que funcionam nos moldes das séries multisseriadas e duas escolas de ensino

médio com mais de 230 alunos, sendo que estas o MST indica os coordenadores e

professores.

Page 22: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

21

Este espaço construído ao longo dos últimos 26 anos, em Abelardo Luz tem se

apresentado como espaço de construção cultural do povo camponês. Há uma clara

diferenciação das demais escolas do município, pela forma que são organizadas as turmas, o

planejamento dos professores, o próprio calendário escolar, que obedece a um calendário de

festas comemorativas, como festa das 1ª e grande ocupação de 25 de maio de 1985, os

campeonatos, etc.

Estas escolas estão espacialmente distribuídas, em áreas continuas no município de

Abelardo Luz, com mais ou menos 1.3 mil assentados, numa população de 17 mil habitantes

responde por 45 % da renda do município, segundo a Secretaria de Tributação da Prefeitura

Municipal.

Conforme dados do Censo Agropecuário de 2006 (BRASIL, 2009), os grandes

proprietários e empresas são beneficiados com 86% do crédito rural, mas são responsáveis por

apenas 60% dos valores comercializados. Ainda segundo o Censo, a terra ficou mais

concentrada, com o índice de GINI passando de 0, 852 para 0, 872.

O município de Abelardo Luz possui uma população de estimada em 18 mil habitantes

(IBGE, 2010) distribuídos em seus 955,37 km2. Situa-se na região do Território da Cidadania

Meio Oeste Contestado, tendo a particularidade de ser um pólo de destaque na produção de

grãos e traz também na sua composição social um considerável número de famílias

camponesas assentadas, em torno de 1,3 mil famílias, ligadas ao MST, distribuídos em 22

assentamentos de Reforma Agrária. Em adição, tem 60% (das 1300 famílias) dos

assentamentos ou tantas famílias com vínculos com outros processos e movimentos como, por

exemplo, da reforma agrária do mercado. Mas, ao lado da presença do MST, esta proporção

da população rural é menos expressiva.

É parte desse tecido social camponês um número bastante significativo de agricultores

familiares e duas reservas indígenas com aproximadamente 500 famílias indígenas das nações

Guarani, Kaiguangy e Shoklen. Segundo, dados do IBGE/2010, quase 44% da população de

Abelardo Luz moram no campo, sendo que boa parte da população vivem da/na agricultura,

sobretudo a camponesa, já que este município é essencialmente agrícola.

A diversidade cultural deste município e a discrepância social, entre os que não têm,

provocou e provocam muitos conflitos, fruto dessa contradição estrutural. Os embates

políticos muitas vezes levado ao extremo tem marcado a luta de classe nesse município. Essa

herança de desigualdade e da lutas pelo resgate social se dão em dois momentos; a estrutura

Page 23: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

22

desigual a partir da colonização e da guerra do contestado, onde os militares e “pessoas de

influência” foram agraciados com grandes extensões de terra. O segundo momento mais

importante para os trabalhadores que a luta pela terra a partir de 1985 com as grandes

ocupações de terra que se seguiram por mais de 20 anos. Outro momento importante da luta

por terra é a luta dos indígenas, para retomar as terras que foram engolidas pela colonização

vinda principalmente do Rio Grande do Sul, a partir da década de 40 do século passado.

É sobre a EEM Paulo Freire uma das duas escolas de ensino médio com seis turmas,

134 alunos que esta localizada no assentamento José Maria, no município de Abelardo Luz,

ela é fundamentalmente uma conquista dos camponeses e sobre esta que buscamos fazer

considerações, que nasceram a partir da luta pela terra, e tem em seus objetivos a meta de

potencializar a luta dos camponeses, reforçar valores, sonhos, discussões e as necessidades

desse movimento camponês.

Para isso, faremos o possível para entender o contexto histórico, de mais de duas

décadas, que esses espaços escolares foram criados e seu acumulo em busca de ser uma

ferramenta a serviço dos trabalhadores, suas necessidades e sua cultura.

Page 24: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

23

CAPÍTULO 2

ESCOLA, AGROECOLOGIA E TERRITÓRIO CAMPONÊS

Este capítulo tem como objetivo apresentar as alguns conceitos sobre agroecologia e

sua aplicabilidade na formação dos jovens do campo, tendo por base dois aspectos básicos: a

permanência dos jovens no campo, por que há produção de fato e reprodução do camponês

nas formas de organização da produção, cultural, etc. A resistência camponesa através da luta,

e a sua recriação também pela agroecologia camponesa é um aspecto fundamental do qual

faremos parte e tentaremos expor no capítulo que segue.

2.1 - Escola do campo

Como anunciado no capítulo anterior a Educação do Campo nasce a partir do MST

nos acampamentos e depois se estende aos assentamentos, como políticas públicas

reivindicatórias.

Dalmagro (2010) cita, Caldart (2007) em, elaborar um esquema distinguindo o

desenvolvimento da Educação do Campo em cinco fases, identificando cada um com um tipo

de escola: primeira, a Escola diferente; segunda, a Escola de Assentamento; terceira, a Escola

do MST; quarta, a Pedagogia do MST e quinta Escolas Públicas do Campo.

[...] Escola Diferente, Escola de Assentamento; Escola do MST; Pedagogia do Movimento e Escolas Públicas do Campo. A autora não traz datas entre uma e outra concepção, mas é possível extraí-las dos textos que indica como demarcatórios de um novo momento. A concepção Escola Diferente é demarcada no texto de Caldart e Schwaab (1990); Escola de Assentamento caracteriza-se a partir do Caderno de Formação n. 18 (MST, 1991), Escolas do MST, no Caderno de Princípios da Educação no MST (1996); a Pedagogia do Movimento no Caderno de Educação n. 9 (1999) e no Boletim n. 8 (2001a); e por fim, Escolas Públicas do Campo tem referência documental em MST (2006). A autora assinala a concomitância entre a concepção Escola Públicas do Campo e Pedagogia do Movimento (p.164).

Muitas interpretações em relação a educação do campo, foram sendo construídas ao

longo dos anos. A implementação de políticas públicas na área de educação levando em conta

os períodos da década de 80 do século 20 e meados do século 21. As divergências ficam por

Page 25: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

24

conta de alguns fatos temporais, reelaboração e interpretação de materiais e opções

metodológicas e até mesmo ideológicas.

Para Dalmagro (2010):

No Movimento Sem Terra se desenvolve uma rica experiência educacional, qual seja, a vinculação da escola aos interesses dos trabalhadores, possivelmente umas das mais avançadas do país. Supomos que o avanço da experiência escolar do MST se deva ao fato de que tal experiência ocorre no interior de um movimento social contestador, isto é, a escola encontra-se inserida em um projeto de transformação social radical e a ele está articulada. A escola no MST aponta para a superação da escola liberal, pois está enraizada na educação originada das lutas sociais que almejam a superação das relações burguesas e para tanto forçam o desenvolvimento de novos conteúdos e formas de escola. A inversão no projeto de escola é possível, pois se situa numa inversão do projeto de sociedade que propõe o MST. Nesse sentido, pensamos que a escola no MST avança em relação à escola burguesa quando atua com a complexidade da vida humana, suas contradições e suas múltiplas dimensões (p.26).

Mas, todos concordam que a Escola do Campo re-significou o próprio campo e o

próprio conceito de camponês, ambos que a Revolução Verde tinha tentado eliminar. Um dos

objetivos dos que defende o campo sem pessoas era retirar do campo os elementos atrativos,

um deles é a educação.

Em meados dos anos 80 com a abertura no pós-ditadura e com efervescência de massa

nas cidades, com as grandes greves sindicais e no campo com algumas ocupações que passam

a ser coordenadas por um único movimento, nasce imbricada com a luta por terra a Educação

do Campo.

Esta escola do campo nasce apoiada nas idéias de Paulo Freire, que havia tido uma

experiência muito rica no nordeste Brasileiro em meados da década de 1960, com

reconhecimento internacional e a partir de alguns pensadores ativistas da Revolução Russa

como Moisey M. Pistrak, Anton S. Vygotsky e depois foram influenciados por alguns

intelectuais mais orgânicos e pelo Setor de Educação do próprio MST e de muitos encontros,

seminários que se seguiram pelo Brasil todo, e que já foram mencionados, alguns dele no

capítulo anterior.

Como política pública a educação do campo ganha status nacional com grandes

encontros, a partir da segunda metade da década de 1990 com a criação de convênios com o

Governo Federal, através do MEC, como o Programa Nacional de Educação na Reforma

Page 26: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

25

Agrária (PRONERA), que estabelecido em 1998 e formalmente integrado na estrutura do

Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 2001 (BRASIL, 2011).

Foi a partir dessa perspectiva de demanda e opção de que o campo precisa de uma

escola específica e para além das series básicas que aparecem os cursos superiores, para

formação de professores, médicos, geógrafos, tecnólogos, técnicos agrícolas, a Educação de

Jovens e Adultos (EJAs), e além de cursos não formais, e outros.

Para Dalmagro 2010:

O estudo como uma dimensão fundamental para o avanço da luta por reforma agrária. Todo Sem Terra deve estar estudando, das crianças aos idosos, da base aos dirigentes, seja na EJA, na escola formal, nas cirandas infantis, em cursos informais, na universidade, enfim, todos devem buscar se qualificar. A educação é maior e acontece para além da escola. O sentido da educação deve ser a construção de uma nova sociedade. Mas a escola é um espaço importante que deve ser ocupado, somando esforços na perspectiva maior do Movimento (p.196).

A Escola do Campo deveria ser pensada para além das series iniciais, pois uma grande

quantidade de jovens morava nele, além do mais precisa dar resposta positiva para a

sociedade, do ponto de vista da produção e da organização. Mas, muito mais além, o MST

tinha que criar mecanismos de apropriação dos conceitos e de estratégias de manutenção da

própria luta. Para isso Dalmagro (2010) diz:

A luta pelo ensino médio e a educação profissional são reforçados devido ao elevado número de jovens presentes nos acampamentos e assentamentos e o insignificante número de unidades escolares com ensino médio nessas áreas. Calcula-se que em 2006 não somavam 50 unidades ofertando o nível médio num contexto de duas mil que ofereciam o ensino fundamental, ao passo que, de 203 mil jovens entre 15 e 17 anos vivendo em assentamentos, cerca de 47 mil estavam fora da escola e apenas 28 mil cursavam o ensino médio (MST, 2006). Os jovens representam para o MST um público estratégico, tanto para a constituição de militantes como para o desenvolvimento dos assentamentos, o que tem levado o Movimento a desenvolver políticas específicas para a juventude (p.196).

Os educadores formados e formadores desta modalidade deveriam responder por uma

educação emancipadora na sala de aula e procurar fomentar a emancipação na comunidade e

para da própria comunidade. Foi no contexto de luta por uma escola, que respondesse os

problemas enfrentados no campo, que a agroecologia cresceu como meta do movimento. Os

formados deveriam optar pela agroecologia como forma de produção, para que de fato

Page 27: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

26

pudesse haver a ruptura estrutural parcial com o modelo empacotado do agronegócio, este

nem do ponto de vista econômico e muito ambiental respondem pelas necessidades dos

camponeses e da sociedade de modo geral.

2.2 - Agroecologia Camponesa

Professor José Maria Tardin da Escola Latino Americana resume de maneira clara a

idéia de agroecologia e de escola que o MST deseja:

A agroecologia é uma forma de trabalhar a agricultura que se baseia em dois campos do conhecimento: o primeiro é o conhecimento tradicional. Aquilo que os agricultores, as comunidades e os povos indígenas desenvolveram ao longo de séculos. Esta é uma das bases que orienta a agroecologia. Outro campo é a ciências biológica, os conhecimentos desenvolvidos nos últimos anos na Biologia, Botânica e Química, que ajudam a compreender um pouco melhor os processos ecológicos da vida, da natureza. Através desta compreensão, nós organizamos tecnologias e procedimentos técnicos para manejar a terra, a água, as sementes e os animais de forma mais próxima a natural. A agroecologia junta este conhecimento de base tradicional, científica e desenvolve um novo padrão de agricultura. (TARDIN, apud BIASI, S., 2009)

Essa Escola-Educação do Campo, criada com características revolucionaria, começou

ganhar corpo, enquanto proposta pedagógico-metodológica que negasse o convencional, que

resgatasse a cultura camponesa, que fizesse uma opção pelo campo, que negasse com

veemência o papel de ser coadjuvante, produtora apenas de matéria prima para a indústria e

da ordem burguesa. Embasada por essa essência o conceito de agroecologia foi incorporada

pela proposta de educação do MST.

Para o professor Sobral do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia

Catarinense (IFET):

A escola elaborada neste contexto é uma “Escola Propedêutica,” que tem como princípio fundante o trabalho. Prioritariamente, a noção do trabalho nesta escola a dá “características emancipatórias que estimula a promoção de debate mais profundo sobre um modelo diferenciado para a parcela da população brasileira que se encontra no campo, em especial os jovens (2008) (texto não publicado)

A escola do campo é um lugar, segundo Guterres (2006), para o campesinato

aprofundar seu conhecimento nativo. Identificando pelo estudo da distribuição técnica do

Page 28: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

27

trabalho, e a ordem social mundial, novas tecnologias, formas de organização do trabalho e

preferências de consumos, são pressupostos condicionantes para a formação do profissional

militante camponês. A gestão escolar (em todos seus aspectos orgânicos, como por exemplo:

o conselho escolar, com participação dos alunos também), deverá preparar os educandos para

o exercício consciente e capaz, tendo como base a democracia e os valores da

responsabilidade e respeito ao coletivo.

Uma escola assim concebida deveria ter a capacidade de formar um ser que está

intrinsecamente ligada à realidade ampla e de classes sociais, que promova o sujeito, mas

acima de tudo o sujeito coletivo despertando assim valores humanistas. O campesinato, a

agricultura camponesa está centrada enquanto conceito na identidade do agricultor, enquanto

categoria que se organiza em um movimento ou não, com base de produção familiar, orgânica

ou não, e até mesmo cooperada, que se relaciona por vez e em alguns lugares, com os

consumidores praticando um mercado solidário, com tecnologias constituídas historicamente

ou adquirida, dependendo muito do local em questão e com costumes e cultura própria.

Ter de maneira clara as formas como os camponeses se reproduz na sociedade atual e

ao longo da história são condicionantes elementares para entender a própria resistência na luta

de classe e as contradições que este processo propicia nos conflitos de interesses ao longo dos

tempos. Fernandes (2000) escreveu:

A formação do campesinato não acontece somente pela reprodução ampliada das contradições do capitalismo. A outra condição de criação e recriação do trabalho camponês é uma estratégia de criação política do campesinato: a luta pela terra. É por meio da ocupação da terra que historicamente o campesinato tem enfrentado a condição da lógica do capital. Essas duas condições, a reprodução ampliada das contradições do capitalismo e da política camponesa de construção de sua existência, geram a conflitualidade que projeta diferentes modelos do desenvolvimento. A conflitualidade resulta do enfrentamento das classes. De um lado, o capital expropria e exclui; de outro, o campesinato ocupa a terra e se ressocializa. A conflitualidade gerada pelo capital, em seu processo de territorialização destrói e recria o campesinato, excluindo-o, subordinando-o, concentrando terra, aumentando as desigualdades. A conflitualidade gerada pelo campesinato em seu processo de territorialização destrói e recria o capital, ressocializando-se em sua formação autônoma, diminuindo as desigualdades, desconcentrando terra. Essa conflitualidade promove modelos distintos de desenvolvimento (p. 279).

Esta abertura tem permitido que a luta do povo entre na escola e vice-versa, pois acaba

por tornar cotidiano o excepcional, pois seria extremamente contraditório se a escola,

Page 29: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

28

principalmente as Escolas Técnicas privilegiassem os conteúdos desvinculados da luta de

classe. Com base nesse acumulo pedagógico, enquanto proposta, de mais de 20 anos que o

curso técnico se propõe em ser um marco na Educação do Campo dos trabalhadores

assentados em Abelardo Luz, capacitando jovens camponeses para responder por quatro

aspectos da produção social organizada. Os aspectos são:

a- Para de fato ser organizada precisa ser cooperada;

b- Para ser cooperada precisa ser participativa, portanto, capacitadora para o exercício

da produção cidadão;

c- Deve ser agroecológica como paradigma, precisa necessariamente criar outra

perspectiva de renda para os trabalhadores do campo e

d- Por último, ser construtora de um novo cidadão, assentados em valores

humanistas, portanto, revolucionaria.

Como já mencionado no capítulo anterior, no seminário na EEM Paulo Freire, no dia

26 de abril de 2010, “A agroecologia como ferramenta política e produtiva dos

Assentamentos” a discussão afirmava que a escola seria, ou teria um papel fundamental na

implantação de uma nova matriz tecnológica nos assentamentos e de modo geral na

sociedade.

TARDIN (2006) aponta três elementos bastaste interessante para ser debatidos. O

primeiro e mais importante que era as práticas tradicionais de produção que vem sendo

aperfeiçoadas durante os milhares de anos na agricultura bem como as práticas até hoje

vivenciadas.

O segundo elemento importante são as formas de organização do trabalho e os

avanços tecnológicos que proporcionaram, junto com o acumulo de conhecimento e o repasse

para as próximas gerações, bom que se diga que o capital, sobretudo a agronegócio, utilizasse

de maneira muito eficaz desses avanços.

O terceiro é a ausência de tecnologias adequadas que torna a produção agroecológica

muito penosa, fator que a sociedade não mais se submete, com agravante, as terras estão

bastante degradadas pelo uso de máquinas inadequadas e de insumos e venenos.

Outros obstáculos vêm na forma de regras normativas extremamente burocratizadas e

inacessíveis aos trabalhadores que buscam na produção subprodutos que agregariam valor. E

mesmo, na produção inatura, opções vantajosas do ponto de vista financeiro e de divulgação

Page 30: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

29

diferencial da produção. Por exemplo, os produtos agroecológicos têm que ser apresentado

legalmente ao mercado embalado, com descrição de composição, data de validade e outros

detalhes que, dificultam assim a vida dos produtores.

Na maioria das vezes o Estado não oferece assistência técnica e nem profissionais

habilitados a disposição dos camponeses, grupos tradicionais de modo geral, que muitas vezes

ao tentarem introduzir no mercado tradicional enfrentam verdadeiros cartéis, uma legislação

extremamente dura, monopólio a atacadistas, uma disputa desleal, pois as formas de produção

dos camponeses têm base familiar e artesanal. Basta nós darmos uma olhada nos rótulos dos

produtos expostos nas gôndolas dos mercados para observarmos tal concentração de posse.

Uma das saídas seria criar redes de produção e comercialização agroecológicas,

segundo a discussão que temos observado nos vários seminários e discussões que temos

participado, ou até materiais orientativos elaborados. Essas redes seriam organizadas, a partir

de territórios potencialmente instalados para a produção de um determinado produto, a partir

de um mercado, a ser atingido, se organizaria a produção do ponto de vista local, na

propriedade, do ponto de vista comercial, com certificação, marcas, industrialização e vendas,

que também estaria em rede, o que poderíamos chamar de “redes solidárias de produção,

gerenciamento e comercialização”, que seria uma espécie de organização a partir dos MST e

da Via Campesina.

Para que os aspectos acima sejam concretizados é preciso que o conceito de

agroecologia seja compreendido sobre dois aspectos que para nos parecem ser importantes. O

primeiro fica por conta de culturalmente os camponeses praticarem uma agricultura milenar,

que para eles é agroecologia - esta forma de produção esta amparada no próprio conceito de

camponês, da forma que produzem as sementes, as tecnologias, etc. A segunda, porém não

antagônica em relação à primeira, mas com diferenciação conceitual, é que se tornou uma

ciência. Com status de ciência, ganhou elementos comparativos, reinterpretação de acordo

com a variação na forma de implementação da produção exemplo: agricultura biodinâmica,

agra-floresta, etc.

Para Guterres (2006), há diferenças entre agricultura ecológica, agricultura tradicional

e a agricultura com base no enfoque agroecológico. Para ele agroecologia é:

A dinâmica das explorações agrárias não se explica só por condicionamentos agronômicos da parcela e sim por condicionamentos ambientais, sociais e econômicos. E mais, as variáveis sociais ocupam um papel muito relevante, dando que as relações estabelecidas entre os seres humanos e as instituições

Page 31: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

30

que regulam constituem a peça-chave dos sistemas agrários, que dependem do homem para sua manutenção (p. 93).

Em seu livro Agroecologia militante, Guterres (2006) reforça que as relações culturais

estabelecidas nas comunidades são importantes para a produção agroecológica e que sem ela

não haverá de fato a agroecologia.

Segundo Miguel Altieri (apud EPAGRI, 2002) cartinha: Comercialização e consumo de

produtos agroecológicos grande Florianópolis:

A agroecologia é uma ciência, um conjunto de conceitos, princípios e métodos que permitem estudar, manejar e avaliar um ecossistema agrícola, oferecendo diretrizes para uma agricultura mais sustentável, ambientalmente sadia, socialmente justa economicamente viável (p. 7).

Para GUTERRES (2006), as atividades já desenvolvidas tradicionalmente nas

comunidades tradicionais, assentamentos são muito importantes, porém para eles é preciso

gerar ações que resolvam os problemas que a produção convencional gerou. É necessário que

os solos sejam recuperados, pois eles estão completamente contaminados pelo uso excessivo

de agrotóxicos, adubos químicos e sementes hibridas e geneticamente modificadas. Para isso

acontecer, seria necessário sistematizarmos conhecimentos tradicionais camponês e

refletirmos sobre eles a fim de soluções no campo das técnicas resolvêssemos os problemas

de produção suficiente e proteção da natureza, das sementes, da água, dos animais e do

próprio homem como um intrínseco.

2.3 - Território Camponês em Abelardo Luz

Para que possamos considerar e fazermos uma analise razoável da realidade, é preciso

que se considere alguns fatores estruturais de município de Abelardo Luz, como palco e

disputa entre dois projetos.

O primeiro diz respeito como a agricultura esta organizada. Esta não responde as

necessidades dos camponeses, pois esses estão desvinculados estruturalmente dos processos

produtivos, do ponto de vista tecnológico e de mercado. A renda dos agricultores, como por

exemplo, soja ou fumo, não dão conta de responder pelas necessidades básicas, como lazer,

alimentação, escola, sobretudo para os jovens que ainda buscam nas universidades

particulares saída para estudar e muito menos do ponto de vista ambiental, por que a

degradação do solo fica evidente quando praticadas essas culturas convencionais.

Page 32: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

31

Tivemos contacto parcial com um diagnóstico que a escola EEM Paulo Freire fez em

2010, quando da reestruturação do PPP onde um dado que nos chamou a atenção da amostra

de agricultores pesquisas, todos eles assentados, 100%, produzem de maneira convencional,

fumo, soja, milho, etc., ainda, também produz produtos agroecológicos. No entanto, não

houve avanços em questões centrais para o desenvolvimento dos assentamentos a criação de

agroindústrias cooperativadas, a universalização do atendimento público de assistência

técnica e uma política de crédito rural adequada aos assentados. O Programa Nacional da

Agricultura Familiar (PRONAF) tem se mostrado insuficiente para resolver os problemas dos

assentados, mesmo aumentando o volume do crédito. O maior problema do não acesso aos

créditos é a inadimplência. Essa situação dificulta o aumento da renda das famílias (MST,

2009d).

A EEM Paulo Freire foi o veículo que trouxe para os camponeses de Abelardo Luz

uma noção mais profunda do significado da agroecologia para a consolidação de seu

território. Como anfitrião do “Seminário de Agroecologia como Ferramenta de Luta” em

2009, na ocasião a escola levantou para a comunidade o conhecimento já elaborado na Feira

Agroecológica de Florianópolis de 30/10 a 03/11/09 e na jornada de Agroecologia que

aconteceu em Francisco Beltrão no oeste do Paraná entre 19 a 22 de maio de 2010. No

seminário da escola, os alunos do Curso Técnico ficaram evidenciados, o interesse em fazer

da agroecologia uma bandeira de luta cientifica e pratica, principalmente entre os camponeses

assentados do MST.

Segundo BIASI (2010), em seu relatório, o seminário estabeleceu um diagnóstico da

situação e gerou cinco diretrizes para orientar algumas ações da comunidade para consolidar o

papel da agroecologia no fortalecimento do território camponês. As cinco orientações incluem

propostas sobre: 1) a tecnologia, 2) a organicidade, 3) a economia, 4) a cultura e 5) o místico.

Foram assim elaborados:

1°- Tecnologia- jeito de fazer;

Tecnologia não é só maquinas, mas o jeito de fazer é preciso que os camponeses

quebrem com o ciclo vicioso que a revolução verde introduziu, com todo seu pacote

tecnológico, de máquinas grandes, de plantações homogenias, do uso indiscriminado de

venenos. Para se ter uma idéia, segundo dados das nações unidas e assuntos de meio

ambientes, o Brasil é o maior consumidor de venenos do mundo na produção agrícola.

Page 33: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

32

Os centros de pesquisa, do Estado como: EPAGRIs, EMATERs, IFETs, escolas

agrícolas, etc., precisam ser utilizados como ferramental de pesquisas a serviço de um novo

paradigma de produção com uma matriz tecnológica que respeite o limite do planeta e do

homem.

Os trabalhadores do campo devem preocupar-se com espaços de trocas de

experiências, historicamente experimentadas entre os camponeses, como feiras que mostre

para a sociedade possibilidades de alimentos saudáveis, de formas de organização das

propriedades, formas de cooperação agrícola, enfim.

2º- organicidade da propriedade;

É preciso que os trabalhadores se organizem em grupos de base, que experimente

formas alternativas de cooperação agrícola bem como formas não tradicionais de

propriedades, há exemplo de faxinais, espaços e terras coletivas, de áreas de reservas

ambientais com uso racional e controlado, que potencialmente serviriam e poupanças vivas,

de sistemas de vendas diferenciadas e de mercados “solidários”, reforçando ainda a aliança

com o urbano.

3°- economia- viabilidade econômica;

A parte econômica é o principal nó da agroecologia. Poderíamos levantar dois

aspectos: O primeiro é estruturas organizativas do ponto de vista da comercialização e

legislação-certificação, (diferenciação de produtos), que permita ao camponês competir com o

mercado, que vêem na maximinizaçao das forças produtivas os lucros.

4º- cultural

É necessário que o homem se aproxime novamente da natureza, que possa se ver nela,

e com ela, ele evolua. Para que isso aconteça deveremos valorizar os conhecimentos

tradicionais e as práticas cotidianas entre os camponeses potencializando-as, disseminando-as,

nos espaços locais nas nossas comunidades e fora dela, sobretudo na escola.

5º- místico

Os agricultores camponeses precisam resgatar sua cultura cosmológica, os mitos, o

folclore, as danças, as formas de trabalho de mutua ajuda como “puxirão”, sua capacidade

Page 34: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

33

artesão de experimentar, de inventar, suas festas tradicionais, os alimentos em toda sua

variedade. A capacidade resignação contra o modelo, contra as injustiças herança dos Setes

Povos das Missões, da Revolta do Contestado, dos Quilombos, enfim de 500 anos de luta

camponesa no Brasil por terra.

Diante deste quadro mencionado acima, é mais urgente que os camponeses através das

mais variadas formas busquem saídas a fim seja alterada esta situação. As escolas, em

especial o curso técnico tem servido como espaço para potencializar o enfrentamento entre os

dois modelos, o agronegócio e agricultura camponesa agroecológica.

A priori é preciso que se considere o modelo hegemônico que a produção e a

organização do trabalho a partir do capitalismo agrário. Também, é importante ressaltar as

contradições que a transição exige, porém ter consciência dos problemas que o modelo

apresenta é a primeira condicionante para a mudança, não possível propor nada diferente sem

saber do que não se quer, um exemplo é a própria luta pela terra, os camponeses só irão

programar ações em busca da terra, quando se identificarem como classe desprovida da terra.

As atividades de seminários até então realizadas nos assentamentos ou mesmo fora

deles são espaços de reflexão privilegiada e a escola participando há de se esperar que isso vá

influenciar na formação dos alunos e, portanto nas famílias, e por conseqüência nas

comunidades.

Portanto, é fato reconhecer que a implantação de uma escola do campo agroecológica

que atenda a contento os camponeses em todas suas dimensões e necessidades é tão diversa

quanto seus próprios conceitos, tal situação longe de ser ideal, seria, ou passaria por uma

construção para além dos espaços físicos da escola.

Page 35: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

34

CAPÍTULO 3

EDUCAÇÃO DO CAMPO E AGROECOLOGIA: O CASO DA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PAULO FREIRE

No 3º capitulo tentaremos fazer a abordagem já feita da Educação do Campo e da

Agroecologia, meu principal objetivo aqui é mostrar o quanto a EEM Paulo Freire tem

avançado no processo de capacitação dos alunos para o exercício da agroecologia como

alunos/camponês-técnicos, bem como a contribuição deste curso a sociedade no que tange o

próprio conceito de agroecologia, sua implantação de fato como matriz tecnológica e na

questão da formação do território camponês de Abelardo Luz.

Tal demostração terá como base nossas impressões diante da realidade, coleta de

informações e muitas matérias observadas duarante o preocesso de elaboração da monografia.

3.1 - Escola Estadual de Ensino Médio Paulo Freire

A luta pela terra retomada a partir de 1985, através dos Movimentos Sociais (MS), em

Abelardo Luz é também uma luta por educação, por moradia, por produção, por preservação,

enfim. Acreditava-se e acredita-se que o Ser Humano integral, não dá para separar lazer de

trabalho, saúde e alimentação, escola e produção, etc. com está perspectiva é desafiada por

uma realidade precária o MST encampa a luta por uma escola que abordasse e aborda de

maneira direta essa necessidade que é um direito fundamental da pessoa.

Junto com os assentamentos até mesmo nos acampamento dos Sem-terra nascem às

escolas, cobertas de esteira e lonas, feitas pela comunidade até mesmo antes dos barracos,

gestionadas pela coordenação do acampamento onde os professores eram uma indicação dos

pais e estes tinham a obrigação de aproximar o máximo possível à realidade dos conteúdos.

Nasce então a Pedagogia do MST, tutelado por muitos intelectuais, dentre Paulo Freire que

mais tarde vai batizar uma dessas escolas de ensino médio.

No inicio eram muitas escolas, nos assentamentos, a cada 40 famílias mais ou menos

tinha uma, as chamadas Escolas Multiseriadas, que a priori davam conta da realidade, já que

se pleiteavam a primeiro momento apenas as series iniciais. Com o passar dos anos, se

observava que serieis iniciais não comportavam a realidade que se modificaram, muitos

Page 36: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

35

jovem ficavam impossibilitados de estudar já que não tinha no assentamento e a cidade era

muito distante e “distante” o então “ginásio” (5° a 8° série) ou até mesmo o ensino médio, em

alguns casos.

Neste momento nasce a primeira escola básica, no inicio da década de 90 no

assentamento 25 de Maio e tem a obrigação de responder elas/essas necessidades dos

assentamentos em torno, concomitantes a isso nascem os primeiros cursos de ensino médio

técnico, ligados e coordenados pelo Setor de Educação do MST, que tentam resolver o

problema da não-formação desses professores que atuam nos assentamentos e acampamentos,

o Magistério em Braga – RS na Fundação e Educação e Pesquisa (FUNDEP) e que até hoje

funciona agora em Veranópolis no Instituto de Educação e Reforma Agrária “Josué de

Castro” (ITERRA).

Em meados da década de 90, as escolas sofreram uma readequação espacial e por

conseqüência impactaram socialmente nas comunidades, por que mudou a perspectivas de

atuação e organização das comunidades, já não tinha aquele espaço orgânico onde pudessem

se reunir, sendo que também seus filhos não mais estudavam perto de suas casas, isso

modificou radicalmente os assentamentos.

As escolas foram nucleadas e contraditoriamente o que era um problema, e talvez

ainda, ou seja, as nucleações passaram a ser um novo olhar a essa realidade, de enxergar os

problemas de maneira mais ampla e encaminhar sob a ótica de um coletivo maior. Para tanto

em 2002 criou a primeira escola de ensino médio, inicialmente como extensão de um a escola

da cidade, que é a EEM Semente da conquista na comunidade 25 de Maio, que meio que

irônicamente funcionou de maneira improvisada na antiga escola, agora nucleada. No ano

seguinte, nos mesmos moldes cria-se a EEM Paulo Freire.

Nos seus primeiros anos, a escola funcionou em caráter provisório, sob a forma de

extensão de uma escola da cidade em espaços precários da antiga sede fazenda, salas no

antigo casarão e até mesmo num antigo açougue da fazenda e depois numa sala cedida pela

escola de EEB José Maria sob a direção do município.

Funcionando a mais de cinco anos, o EEM Paulo Freire cumpre segundo, a diretora

Edilaine Vieira, como seus objetivos, que é de ser um espaço de socialização do

conhecimento através do estudo, promover a cooperação, experimentando formas de gestão

democrática a partir da escola e dos cursos, fomentar outra matriz tecnológica a partir de um

curso de agroecologia e promover amplo debate para construção e revisão do PPP, investindo

Page 37: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

36

constantemente na formação dos professores através de estudos-planejamento repensado

sistematicamente métodos de tratar conhecimento, avaliação e prática. Enquanto instituição

social, na visão de seus fundadores, a EEM Paulo Freire tem o papel de tornar o quadro geral

para a sociedade, sugerindo que esta repense suas práticas sociais, como o ato de se alimentar

e a forma de produzir, portanto, a escola ressignificar sua própria existência enquanto

instituição, por que prepara para o trabalho de fato, capacita pelo conhecimento, gerando

consciência (PPP, 2007)

A escola esta localizada numa região extremamente importante para a produção de

grãos, fumo e leite. Além de algumas grandes propriedades nessa área da escola se encontra

mais de 50% dos assentados do município, sendo que no município de Abelardo Luz esse

total chega a 1,3 mil famílias, a grande maioria vinculado com as lutas do MST. Neste

contexto, foi visto como fundamental o desenvolvimento dentro da EEM Paulo Freire de um

curso de ensino médio de formação de técnico de agroecologia.

O curso de ensino médio técnico agroecológico, uma das mais importantes e

desafiadoras tarefas, fruto de uma luta social e intenso debate em torno da viabilidade social e

econômica da Reforma Agrária. Ele é resultado, desse momento político histórico de amplo

debate dentro do MST, para resolver os problemas de formação dos camponeses no que diz

respeito à formação propriamente dita e capacitação para o trabalho. Para a diretora os

desafios são muitos, mesmo assim, estamos no segundo ano desse curso, com duas turmas,

uma no primeiro e a outro no segundo ano, portanto, na metade da primeira turma curso de

técnico em agroecologia, e os resultados já começam a aparecer.

Segundo, uma pesquisa diagnóstico que a EMM Paulo Freire fez para rediscutir as

políticas de atuação e revisão do Projeto Político Pedagógico, todas as famílias produzem

agroecologicamente principalmente para o auto-consumo, porém todas as famílias também

produzem de maneira convencional para o mercado. Esta afirmação fica por conta de quem

produz sabe como produz e sabe o quanto vai de veneno na produção convencional e

certamente não vai levar a mesa de sua família um alimento contaminado.

Foi considerado um papel fundamental da escola identificar através de um bom

diagnóstico as práticas agrícolas da comunidade, sistematizá-las a luz do conhecimento

cientifico, nas aulas teóricas e nos experimentos, torná-las práticas novamente depois de

analisadas.

Page 38: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

37

O curso agroecológico da EEM Paulo Freire tem se mostrado bastante comprometido

com a realidade dos camponeses da região de abrangência. Têm promovido nos espaços

escolares uma pedagogia, que permite a interação entre o empírico, próprio do camponês,

com o cientifico. Têm criado metodologias que permite a experimentação dos conteúdos com

a realidade, permitindo que a práxis aconteça. Adota a gestão democrática, como construção

do trabalhador ligado ao MST, criando espaços orgânicos, para pais, alunos e professores.

Exemplos como reuniões ordinárias de planejamentos, avaliações todo fim de cada bimestre,

reuniões periódicas com a APP, etc. Conseguiu construir espaços físicos como condicionante

para uma boa capacitação e mais, tem se desafiado a fazer dos espaços da escola um grande

laboratório e construção e uma forma de produção, organização e consumo que perpasse por

valores humanistas um dos exemplos foi uma grande mobilização que os alunos fizeram na

escola para restabelecer uma merenda diferenciada, já que no estado de Santa Catariana a

merenda foi privatiza e padronizada.

Têm estimulado a participação da comunidade de modo geral, sobretudo os

educandos, a participar das lutas dos camponeses nas mais variadas formas de organização, a

se contrapor ao modelo capitalista. Para isto tem orientado os professores a aceitar que

quando um aluno, ou um grupo de aluno, vá a uma mobilização ou a um curso fora do espaço

escolar este tenha o direito à recuperação dos conteúdos que foram ministrados na sua

ausência e que este mesmo não tenha falta no diário de classe. Segundo a diretora, só neste

ano os alunos participaram de mais de oito atividades extra-sala de aula, desde seminário a

mobilizações por crédito, educação, festas, jogos, etc.

O instrumento de formação ora proposto é compatível com tais idéias, posto que a

formação técnica do camponês permita que o mesmo não se distancie de suas origens e

contribua para uma agricultura melhor desenvolvida, o que possibilitará sua permanência no

campo, uma preservação do meio ambiente, bem como se evitará o êxodo destas famílias para

o inchamento das periferias urbanas, bem como suas mazelas que este processo provocou no

Brasil a partir da “revolução verde” nos últimos 50 anos.

Desse modo, além da melhoria na produção agrícola devido à aplicação de técnicas

inovadoras, abre-se um campo de trabalho permitindo que a juventude não se desligue de suas

origens, permitindo sua permanência na zona rural, garantindo-se, desse modo, a continuação

do povoamento destas áreas com condições plenas de desenvolvimento. Este é o meio pelo

qual se poderão formar jovens técnicos capazes de contribuir a priori com as comunidades

Page 39: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

38

locais e, depois, com o mercado, levando em conta a agroecologia e demais conceitos

necessários a esta formação.

As práticas pautadas na agroecologia se efetivam contrárias ao modelo de produção

agrícola vigente, hoje, no país e no mundo. No embate entre dois modelos de produção, faz-se

oportuno, ressaltar que dados mostram o modelo tradicional de produção, com base na

produção de commoditties, contraditoriamente apresentados altos níveis de produtividade e de

fome, altas tecnologias e desemprego, grandes extensões de terra cultivadas e

conseqüentemente degradadas e sem-terras, legitimando assim, a concentração de renda e

exclusão social.

3.2 - Projeto Político Pedagógico da Escola Estadual de ensino Paulo Freire

O Projeto Político Pedagógico (PPP) da EEM Paulo Freire foi construído a partir de

uma ação coletiva, segundo a diretora da escola Edilaine Vieira, da comunidade escolar

(profissionais da educação, a APP - Associação de Pais e Professores e alunos, no ano de

2007. Para que isso acontecesse muitas reuniões foram feitas nas comunidades. Questionários

foram aplicados juntos as e resultados de toda essa coleta de dados, sejam eles de dado conta

da perspectiva do papel da escola na perspectivas das famílias bem como os traziam presente

a realidade através das informações que apresentavam uma realidade, o diagnóstico. Todo

esse material, vindo da pesquisa, foi amplamente debatidas por um conselho de pais,

professores e alunos a fim de que o PPP fosse fiel aos anseios dessa realidade, portanto, da

sua população. Foi aprovado sem emendas por uma assembléia de Associação de Pais e

Professores e com a presença massiva dos alunos.

O projeto político pedagógico estabeleceu algumas metas para a escola. Dentre as

metas, a escola deveria formar sujeitos históricos, pertencente à categoria de trabalhadores –

sem-terra, camponeses, com o compromisso mediante o exercício da cidadania para promover

a igualdade social, respeitando a dignidade de homens, mulheres, crianças e a natureza. Uma

das formas de promover esse Ser Humano seria através de cursos regulares, que

estabelecerem através do trabalho, da pesquisa, do estudo, da avaliação e da auto-avaliação,

da gestão escolar participativa, da forma como se escolheria os professores, etc.

Para tanto o PPP da escola se norteia pela proposta de Educação do Campo e na

pedagogia do MST, adota os pressupostos metodológicos e filosóficos dessa Escola enquanto

paradigma. Adota a partir do curso técnico agroecológico, uma gestão participativa – com

Page 40: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

39

conselho escolar além da APP, escolhe os professores levando em conta a avaliação das

comunidades, alunos e MST.

Segundo a diretora, alguns espaços foram importantes para a construção da escola e do

projeto pedagógico. O primeiro foi o fato de que no MST e comunidade a educação é

prioridade, o segundo é que deveríamos levar em conta toda a construção social dos “24 anos

de pedagogia do MST só em Abelardo”.

O terceiro é que a escola enquanto espaço de formação e capacitação é um direito,

portanto, deve ser política pública, o estado deve ser responsável pela criação e manutenção

das escolas, e estas devem respeitar e potencializar as várias realidades respeitando as formas

de organização, as culturas, enfim a pluralidade social.

Por último, é importante ressaltar que com base nessa política de escola para o campo,

como política pública e estendida para o ensino médio como ensino básico, também como

solução para os problemas da falta de profissionais na área da produção agrícola, acontece a

1ª Oficina sobre Ensino Médio Integrado a Educação Profissional do Campo no mês de

dezembro de 2007 em Luziânia, Goiás. Nesta oficina, com a presença da sociedade

organizada (movimentos sociais e universidades) e representantes governamentais,

estabeleceu-se como meta a criação de mais escolas e de cursos integrados técnicos por todo o

Brasil, principalmente em área de assentamentos, com intuito de preparar para o trabalho

socialmente produtivo e emancipador.

Segundo, sua Proposta Pedagógica do Ensino Médio por meio do curso

profissionalizante em agroecologia a EEM Paulo Freire poderá contribuir na formação dos

jovens do campo para o enfrentamento de modelo predominante da agricultura convencional,

demandas da especifica da realidade camponesa dos assentamentos de Abelardo Luz.

3.3 - Curso de Ensino Médio Integrado a Educação Profissional Eixo de Tecnológico de Recursos Naturais Curso ‘Técnico em Agroecologia’

Esse curso bem como a escola de modo geral, e as demais escolas do município de

Abelardo Luz, foram espaços de construídos pela comunidade, ao longo das últimas duas

décadas, para servir de espaços refletivos das ansiedades que a realidade local apresentava,

para isso muito se experimentou ao longo desses anos em nível de metodologias, formas de

direção, tanto a nível de escola propriamente, como também a nível de comunidade, no que

Page 41: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

40

diz respeito as formas de participação efetiva da comunidade, formas de organização dos

alunos, etc.

Em atividade de discussão promovida pela escola Paulo Freire, em seminário já

mencionada acima, num dos espaços de reflexão da escola e do próprio MST, alguns

diretrizes foram elencadas, segundo relatório de Biasi (2009).

- Nos assentamentos de modo geral é preciso que se crie equipes técnicas vinculadas às

cooperativas de prestação de assistência técnico como a Cooperativa de Prestação de

Serviço de Santa Catarina (COOPTRASC) ligada ao setor de produção do MST a as

prefeituras e de maneira geral com as instituições de pesquisas do Estado (nas varias

esferas) que priorizar o acompanhamento de experiência agroecológico entre os

assentados e também nas Escolas, sobretudo as técnicas, encarando assim, os limites e as

contradições que se apresentam no processo pra efetivamente aconteça à transição.

- A escola deve adotar a metodologia da práxis como método de investigativo que

discutira a teoria e pratica estabelecendo ainda mais uma ciência a serviço da vida.

- A escola deve formar bem os educandos de modo geral, mas principalmente os do

curso técnico, por entender que estes vão dar a cara da produção entre os camponeses,

para isso deve investir na formação constante dos professores, nos métodos de gestão e

pedagógicos, em um currículo que contemple a realidade e cria as perspectivas de

mudanças, gerando assim outro paradigma e um novo Ser Humano;

- A escola deve se preocupar em sistematizar as práticas experimentadas no campo da

produção enquanto tecnologia, bem como as de cunho mais pedagógico, para que estas

experiências sirvam como pressupostos teóricos para novas experiências no campo da

educação do campo e formação técnica;

- A escola EEM Paulo Freire deve investir em equipamentos que sirvam como

ferramental que a priori será usado nas experiências de campo, nas pesquisas e no dia-a-

dia de modo geral da escola.

Nesse sentido, o objeto de analise deste projeto se mostra relevante em saber, em que

medida o curso profissionalizante em agroecologia tem proporcionado aos jovens do campo,

uma formação que auxiliem na construção de novas práticas agrícolas, coerente com a

reprodução senão a expansão do território camponês.

Page 42: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

41

Os assentamentos, sobretudo os ligados à luta pela terra do MST, tem vividos

momentos bastante interessantes do ponto de vista da produção, comercialização e acho que

outro elemento fundamental são as escolas técnicas que nos últimos anos tem privilegiado a

discussão da matriz produtiva e paradigmática, com dois cursos técnicos em Santa Catarina,

(Abelardo Luz e Fraiburgo) e dezenas pelo Brasil na área de agroecologia.

Na área de produção podemos observar uma crescente preocupação dos camponeses

assentados com a produção com base agroecológica ou mista. Um exemplo bastante

significativo é a produção de leite a base pasto, promovida pela COOPEROESTE

(cooperativa ligada aos assentamentos de Santa Catarina), a Marca TERRA VIVA e a

BIONATUR (cooperativa de produção comercialização de sementes crioulas, ligadas aos

assentados do Rio Grande do Sul), que cria junto à sociedade uma tradição de produtos

ecologicamente correto e socialmente justo, pois promove distribuição de renda, por que

agrega valor a produção primária, preserva a natureza, pois, usa sementes crioulas e adubos

orgânicos, valoriza o trabalho e promove cooperação agrícola, experimentando um novo

modelo de produção, circulação e comercialização o que poderíamos chamar de redes

solidárias de produção comercialização. BIASI, 2009- relatório- 2° Feira Sustentável

Agricultura Familiar, Economia Solidaria Pesca, Reforma Agrária, Energias Renováveis.

Centro Sul- Florianópolis- SC 30/10/09 a 03/11/09.

Essa realidade por si só representa um avanço do ponto de vista da luta de classe, pois

se propõe a uma nova matriz tecnológica, a um conceito de diferenciado de produção, a

formas de organização do trabalho que valoriza o sujeito, por que não dizer, a uma nova

forma de ver a terra, não apenas como “parideira de mercadorias”, mas fonte reprodutora de

vida e cultura.

O Curso de ensino Médio Integrado a Educação Profissional no Eixo de Tecnológico

de Recursos Naturais Curso ‘Técnico em Agroecologia’ foi justificado na importância da

agroecologia como forma de resistência histórica camponesa fazendo contra censo ao modelo

de produção capitalista e no campo o agronegócio.

Já se justificaria por si só, se a escola discutiria outra matriz produtiva para o campo,

já que neste momento histórico assistimos a quase que de braços cruzados, na sua totalidade, a

uma investida do capital contra os recursos naturais e ao homem, para maximizar a produção

e o acumulo das riquezas. Porém, a escola quer discutir produção de fato, mas produção do

Page 43: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

42

trabalho socialmente produtivo, com respeito à natureza, ao homem e demais animais. A

forma de produção agroecológica é de fato para o camponês a consolidação do território.

Como afirmamos anteriormente, ao fazer um resgate histórico a educação foi é uma

dimensão humana muito importante e, por isso ela foi priorizada pelos trabalhadores

camponeses na luta pela terra, não seria diferente neste momento histórico em mais do que

nunca ela determina o nível de conhecimento e por que não dizer o nível de consciência, ou

pelo menos a qualidade organizativa consciente.

Fernandes (1994) ao falar de territorialização estipula momentos, um deles fica por

conta do conflito de interesse entre duas classes e o outro fala da qualidade do território, ou as

várias territorialidades, que são as dimensões. Para os camponeses as dimensões foram

traduzidas em necessidades, a fim de que se traduzisse em qualidade cotidiana à nova ordem,

estabelecida no espaço que é o assentamento. Portanto, haveremos de concordar que um

assentamento sem escola não responde positivamente a uma dimensão humana que é a escola,

do jeito que poderíamos, que não haverá uma Escola do Campo sem agroecologia, pois seria

contraditório ser “neutro”, não discutir Agroecologia e mais contraditório ainda seria ser

contra.

E, sendo assim a escola é um importante fomentador de novas territorialidades, pois

pode estabelecer relações diferenciadas entre as pessoas, na forma de produzir, nas formas de

gestionar o lote e de se organizar na comunidade.

Muito do que podemos observar nos assentamentos, a territorialização camponesa sem

agroecologia fica comprometida, do jeito que não haverá educação do campo sem

agroecologia, pois, não poderíamos conceber uma escola que forma cidadão do campo se ela

não adotasse em suas práticas pedagógicas e metodológicas, conceitos de gestão, de

conteúdos, de calendários que gerassem outros valores que não estes no atual modelo.

Foi com base nestas preocupações, que foi criado o curso de agroecologia como

espaço de discussão e instrumentalização que optasse por mudanças de paradigmas e de

valores, portanto espaço de formação e transformação. Para que isso aconteça é importante

que observado no dia a dia o compromisso com a proposta, o estudo, o fortalecimento do

coletivo, o desapego de vícios egocêntricos, negar incessantemente pelo eu (BRUNETTO,

2010).

Page 44: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

43

Cuidar, buscar e zelar dos espaços físicos e das pessoas, garantir a disciplina ordinária,

mas principalmente a disciplina consciente, respeitando e potencializando espaços orgânicos

bem como todas as diretrizes que venha desse momento organizativo (BRUNETTO, 2010).

Essas são algumas das principais diferenças que pudemos observar na escola e no

próprio curso, que são fundamentais, para entender de que Escola que estamos falando não

encontradas apenas às ementas, nem os conteúdos das disciplinas.

Outra diferença fica por conta da forma com que a escola se organiza enquanto espaço

orgânico na comunidade onde ela se encontra, na escolha dos professores e coordenadores, na

relação com o movimento social e na luta de classe (VIEIRA, 2010).

A escola, enquanto instituição, tem que primar pelo respeito aos anseios locais e sua

historia, criando espaços orgânicos e participativos sem cair no democratismo irresponsável

de não assumir o papel formador que lhe incumbida (VIEIRA, 2010). Para isto é importante

que os professores usem do PPP e de sua construção, dos conteúdos, das metodologias, da

junção diária de jovens em ferramental para fazer desse espaço um instrumento de

transformação social.

Os conteúdos de vez por todas precisam ser encarados como avanços científicos

sociais a serviço da humanidade. Para tanto a escola do campo tem o desafio de fazer da à

agroecologia um tema gerador constante que vindo da sociedade servirá de objeto de analise

dando um caráter de interdisciplinaridade às áreas do conhecimento divida hoje em nossas

escolas.

3.4 - Construções de Práticas Sociais e Agrícolas Embasadas pelos Pressupostos da Agroecologia na EEM Paulo Freire e Área de Abrangência

Antes de elencar as experiências agroecológicas experimentadas até então pelo curso

técnico agroecológico e as experiências que certamente o curso tem gerado nos assentamentos

da região do Jose Maria, área de abrangência da escola em questão, faz-se necessário

mencionar o espaço físico e pedagógico que vêm a mais de uma década servindo a aplicação

da agroecologia como pratica cotidiana, que é o Centro de Produção e Formação Popular

(CPFP).

Segundo Aidir Pinotti, militante do MST e professor do curso técnico da escola Paulo

Freire, o CPFP nasceu com a ocupação da Fazenda Congonhas realizada em 1996. Quando

foi conquistada a posse, a coordenação do acampamento juntou com a direção regional do

Page 45: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

44

MST em destinar uma área dentro do assentamento cuja finalidade seria de produção e

formação de militantes. Com a divisão das áreas para as famílias, foi destinada para essa

finalidade a área mais próxima a sede da fazenda, pois esta já contava com algumas casas,

instalações de animais e outras estruturas. Mais tarde iria se tornar o pólo do Assentamento

José Maria, sendo sítio da construção de escolas, ginásio, posto de saúde e posto de

resfriamento de leite.

Na divisão da fazenda, uma área de 17 ha foi destinada para experimentar práticas

agroecológicas e garantir a produção para auto-sustento dos militantes que viriam para

contribuir voluntariamente na cultivação enquanto formaram-se ali.

Para Pinotti, o espaço do centro ganhou uma motivação maior quando a EEM Paulo

Freire, a comunidade e a direção do MST começaram a discutir um curso técnico

agroecológico. Foi a partir do centro de formação com seus objetivos a formação de quadros

militantes, uma matriz agroecológica, a cooperação agrícola e sua institucionalização pela

escola para ganhar legitimidade do ponto de vista documental.

Se a principio a área física do Centro era também servir para a construção de

estruturas, como escolas, uma dessas era o próprio Centro e todos os seus recursos físico e

humano a fim de aproveitar suas atividades pedagógicas e experimentações práticas na área

de agroecologia. O Centro eventualmente servia ainda de moradia para alguns educadores e

educandos que se revezam diariamente na manutenção das linhas de produção e das moradias.

Para Pinotti, que mora no Centro desde sua implantação, a escola e o curso estão

qualificando o processo de implementação de práticas agroecológicas na área do Centro, pois,

lembra ele, que o solo da área era extremamente degradado pelo pisoteio de gado na época

que era fazenda. Hoje é possível produzir com certa qualidade e quantidade com práticas

integral ou parcialmente agroecológicas.

Podemos elencar como grandes experiências de produção agroecológicas testadas em

nível de Curso no espaço experimental do centro. Destacamos entre elas a produção de suínos

no sistema siscal2, a produção leiteira a base de pasto no modelo rotação de pastagem ou

piquetiamento3

2 Modelo de criame de porcos em piqueteamento, não confinado e a base agroecológica.

, a criação de galinhas crioulas e mistas, a produção de hortaliças que servem

para a comercialização junto as escolas municipais na merenda adquiridas pelo PAA e na

própria merenda da escola Paulo Freire.

3 Sistema de pastorei em pasto preveamente dividido em área menores, tem por objetivo o manejo racional dos solos, controle de pragas e concervação do solo pelo pisotei menos intenço e espaço do ponto de vista temporal.

Page 46: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

45

Figura 1 - Vacas crioulas para produção de leite a base de pasto

Fonte: EEM Paulo Freire

Figura 2 - Produção de hortaliças para auto-consumo e venda no PAA (Programa de Aquisição de Alimentos)

Fonte: EEM Paulo Freire.

Page 47: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

46

Ainda é possível destacar a aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos nos espaços

da sala de aula e nas demonstrações a campo, principalmente nas áreas de solos, curvas de

níveis, preparando sabão e transformando casca de arroz em substrato, entre outras atividades

didáticas.

Figura 3 - Alunos e professora medindo declividade para curvamento de nível com equipamentos tradicionais: mangueira de nível e “pé-de-

galinha”

Fonte: EEM Paulo Freire.

Figura 4 - Alunos fazendo a coleta de solo para posteriormente fazer análise

Fof f o

Fonte: EEM Paulo Freire

Page 48: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

47

Para a escola é muito importante que os pais contribuam na escola em todos os

aspectos, entre poderíamos elencar a visita deles nas s de experimentação de coberturas verde.

Tais experimentos foram realizados pelos alunos do curso técnico, pois como parte da grade

curricular específica do curso e por ser uma necessidade dos assenetamento, a recuperação

dos solos.

Figura 5 - Educandos, pais e educadores visitando área na escola: experimento do curso técnico agroecológico de cobertura verde para recuperação de solos degradados

Fonte: EEM Paulo Freire.

Como forma de recuparar técnicas de se usar das coisas que tinha a mão, como por

exemplo: os chãs, os compostos, a produção de sabão, etc. a EEM Paulo Freire, ministra em

parceria com o Centro deformação e a ATES cursos-oficinas, e aulas teóricas, que tem como

objetivo o resgate dessa caraceristica de campos artesão.

Page 49: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

48

Figura 6 - Alunos produzindo sabão para auto-consumo

f f ont

Fonte: EEM Paulo Freire.

Figura 7 - Alunos produzindo substrato para produção de mudas para ser usado na própria escola.

Fonte: EMM Paulo Freire.

Page 50: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

49

É de conhecimento de todos que a junção entre o conhecimento popular, o estudo dos

conhecimentos científicos e a experimentação prática são pressupostos fundamentais para

uma boa formação técnica, sobretudo na área de agroecologia.

Além do mais, a organização do espaço físico e o fato de que lá os alunos estão

passando minimante para experiências concretas de produção a partir das atividades escolares

do curso técnico, a organização e ampliação das estruturas físicas e a junção entre os dois

espaços de formação (militantes do centro e técnicos do curso), fazem evidente que temos no

mínimo uma experiência inovadora para a escola, para o assentamento, para a educação e para

a comunidade.

Para os assentados, da região da escola Paulo Freire que receberam seus lotes em

condições de degradação ambiental, por conta da irresponsável prática convencional de

criação intensiva de gado, têm no Curso Técnico e no CPFP exemplos de manejo e

recuperação do solo, que mostram como é possível reverter o quadro de degradação com uso

sustentável do solo e práticas agroecológicas.

Podemos destacar um elemento bastante importante na construção da Escola

comprometida com uma agricultura sustentável. Grande parte das disciplinas técnicas do

curso técnico ficou a cargo do grupo de técnicos da Assistência Técnica dos Assentamentos

(ATES), coordenada pelo MST. Essa prática pedagógica tem aproximado os assentados e

MST da Escola de maneira objetiva.

Muitos encontros foram promovidos a nível da região sul em que os alunos

participaram. Com a presença de alguns educadores e educandos, a escola Paulo Freire

participou da Feira Sustentável de 30/10 a 02/11/2009 em Florianópolis - Agricultura

Familiar, Economia Solidaria Pesca, Reforma Agrária, Energias Renováveis. De 19 a 22 de

maio, eles também contribuíram com suas amplas experiências na 9° Jornada de

Agroecologia no município de Francisco Beltrão- PR, onde colaboraram para enriquecer a

lema, Terra Livre de Transgênico e Sem Agrotóxicos.

Page 51: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

50

Figura 8 – 9º Jornada de Agroecologia Em Francisco Beltrão/PR.

Fonte: EEM Paulo Freire

Além desses eventos, o curso faz trabalhos de campos para conhecer experiências

alternativas que estão dando certo nas áreas de produção, organização de cooperativas e

agroecologia. Citamos uma visita do curso na BIONATUR em Candiota- RS. A BIONATUR

é uma empresa do MST especializada na produção e disseminação de sementes crioulas e

técnicas agroecológicas. Outras visitas que merecem ser registradas são de natureza regular.

Todas as turmas obedecem a um cronograma pensado pela comunidade escolar e de currículo

a visitas sistematicamente às cooperativas do MST COOPEROESTE e COOPERUNIÃO. Em

São Miguel d’Oeste, COOPEROESTE é líder na produção de leite do Sul do Brasil, com

inserção plena no município de Abelardo Luz, sobretudo nos assentamentos do movimento;

em Dionísio Cerqueira, COOPERUNIÃO é nestas visitas e, até por proximidade física que o

grupo de estudantes da EEM Paulo Freire também faz uma visita à Argentina, uma vez que

considera importante o fator, conhecer outra realidade, outro país, isso é considerado histórico

do ponto de vista do conhecimento científico.

Na Figura 9, vemos os alunos do curso técnico num dia de campo na casa de uma

família de assentados do assentamento José Maria. Essa família assentada é uma das maiores

Page 52: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

51

produtores de pêssegos do Município de Abelardo Luz e neste dia monitora as atividades, de

poda e enxertia.

Os dias de campo no próprio assentamento são sob orientação dos pais tem três

objetivos básicos: um deles é apresentar aos alunos a realidade dos próprios; o segundo de

valorizar o conhecimento de quem faz de fato a produção acontecer e seus conhecimentos

acumulados e o terceiro é que os pais possam conhecer defato o curso e sua preocupação com

a formação vinculada à realidade e boa.

Figura 9 – Alunos do curso técnico em campo no lote de um assentado do Assentamento Jose Maria

Fonte: EEM Paulo Freire.

Para o professor e coordenador do curso técnico Florentino Camargo, o curso da

escola tem avançado apesar do curso estar encontrando dificuldades metodológicas para

aplicar os conteúdos, a falta de tempo e disponibilidade dos professores planejarem juntos,

dificuldade de encontrar e reter professores principalmente nas áreas técnicas, o limite que o

próprio currículo escolar impõe, e outros problemas mais.

Ficam evidenciado algumas mudanças ao longo dos anos que a EEM Paulo Freire foi

criada, mas as transformações mais destacadas se consolidaram principalmente depois da

implantação do curso técnico. A escola passou a ser um espaço mais utilizado para encontros

entre pais, professores, técnicos da ATES (estes contribuem com grande parte das aulas

Page 53: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

52

práticas e técnicas). O curso, juntamente com a escola, tem promovido alguns seminários

para discutir a agroecologia, promovendo dias de campo junto às famílias assentadas.

Tendo por base os livros de atas da EEM Paulo Freire (com observação em lócus)

conhecendo a estrutura da escola do ponto de vista organizativo e de gestão, podemos afirmar

que a escola se propõe a implementar de fato espaços orgânicos das tomadas das decisões.

Para Camargo e Pinotti (2010):

A coordenação da escola tem se preocupado e trabalhado para que possa ser democratizado cada vez mais o processo, é sempre tomada as decisões coletivas [...] os alunos são instigados a participar cada vez mais, eles tem os núcleos de base, o conselho de classe participativo e em outras instancias da Escola, reunião de professores, APP, isto vale para todas as turmas, o curso técnico não tem tratamento diferenciado na escola, ele é um curso diferenciado por sua intencionalidade. (p.27)

Pelo que podemos observar a Escola e a comunidade absorveu bem o curso (segundo

avaliações dos alunos e entrevistas com os pais de alunos e seminário de agroecologia que

aconteceu na EEM Paulo Freire). Tanto a escola como a comunidade conseguirem fazer uma

avaliação bastante critica apontando os avanços, mas principalmente os limites. As avaliações

que podemos ver fica evidenciados verdadeiros gargalos. No que tange a formação dos

professores, na maturidade dos alunos, na avaliação, na concretização metodológica entre os

conteúdos programáticos, a realidade e a prática. Porém, é possível enxergar o papel

estratégico que a agroecologia e o próprio curso tem frente ao desafio, que é se manter no

campo bem, fortalecer o território camponês e manter o jovem camponês.

Para Santin (2010), coordenação do MST/SC, “precisamos propagandeia” do quanto

faz mal os alimentos convencionais, sobretudo os transgênicos, promover uma pedagogia do

exemplo, fazer visitas periódicas junto às famílias e “promover a desobediência civil”.

De todos os aspectos é preciso reconhecer que a EEM Paulo Freire, o MST, na forma

social e orgânica tem feito muito esforça para fazer do espaço escolar e orgânico, bem como,

os de prestação serviço um ferramental e prol de uma forma de organização da escola de fato

da produção nos assentamentos.

Page 54: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

53

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da pesquisa da monografia ficou evidenciado o quanto a comunidade espera e

aposta no curso técnico da EEM Paulo Freire. Para os pais, a formação técnica dos filhos já

contribuiu no melhoramento da produção de seus lotes através da organização das formas de

produção agroecológicas, com técnicas que foram resgatadas, outras que foram introduzidas,

além do mais dos cuidados que devemos ter com os recursos naturais e as sementes. As

técnicas ajudaram recuperar o solo, revitalizar os pastos e aumentar a produtividade das vacas

e galinhas, entre outros benefícios concretos.

A pesquisa também mostrou algumas deficiências na área de produção mais

planificada e na relação estabelecida entre comercialização, legislação, infraestrutura e

políticas públicas de modo geral. Grande parte dos problemas em nível de produção

agroecológica nos assentamentos, segundo pesquisa, ficam por conta de que o poder público

não prioriza a agricultura, sobretudo a camponesa e menos ainda a agroecológica.

Segundo, um levantamento da escola para reestrutura o PPP, após a implantação do

curso técnico integrado agroecológico, da EEM Paulo Freire, por amostragem, cem por cento

das famílias utilizam técnicas agroecológicas, produtos para auto-consumo e eventualmente

para venda (EEM Paulo Freire- diagnóstico para o PPP, 2010). A comercialização neste caso

fica por conta do produtor que vai para o urbano e vende de porta em porta, ou em outro caso,

o consumidor vai até o campo “garimpar alimentos saudáveis” e geralmente mais baratos -

mostrando certo grau de consciência por parte do comprador.

É unânime entre os pais e professores e comunidade de modo geral em afirmar que o

curso tem contribuído para a fixação do jovem no campo. Todo mundo, também está de

acordo que tendo mais espaço para a juventude participar, anima o campo.

A Educação do Campo nos tempos atuais, a qual deve voltar atender os interesses

sociais culturais e econômicos da população do campo, deve se tratar especificamente a

diversidade histórica e cultural para população ter condições de viver com dignidade.

Page 55: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

54

População essa que através da organização social vêm resistindo à expulsão e a expropriação

capitalista.

Para tanto, reforçamos a idéia que as escolas de fato estejam no campo, com novas

construções, mas também, que as que já existam sejam equipadas, como instrumentos

políticos de Projetos Políticos Pedagógicos voltados às causas sociais, aos desafios, aos

sonhos, a história e a cultura do povo trabalhador do campo.

A Educação do Campo que tenha enfoque dialógico e libertador. Onde educador e

educando ensinam e aprendem numa troca de conhecimentos constantes, na busca da

transformação da realidade do próprio campo e das famílias camponesas de forma

participativa que torna educandos e educadores protagonistas de novas técnicas, novas idéias,

novos projetos e talvez, novos mundos possíveis.

A agricultura familiar camponesa é reconhecida atualmente por produzir alimentos,

pela organização do trabalho e produção, pela cooperação e pela resistência histórica na

sociedade moderna. A escola do campo em todos os níveis deve ter compromissos éticos e

morais com o povo, com os problemas locais, mas também de humanidade, já que sugere uma

relação de produção que integre de maneira mais harmônica possível entre homem e natureza.

No ambiente social promover a educação transformadora é construir novas relações

sociais e desenvolver as ações participativas. Assim, a escola tornar-se-á espaço de

participação popular, de valorização humana, da busca e construção do saber científico,

enquanto apropriação de fato do conhecimento por todos que se propõe e pela vivência

cotidiana, varrendo de vez subterfúgios de crenças como meias verdades ou explicações

compensatórias.

Nossas escolas devem respeitar as mais variadas organizações sociais, respeitando o

conhecimento popular aprendendo e ensinando, desenvolvendo, acolhendo e partilhando

experiências, construindo no fazer do dia a dia, no trabalho a agroecologia como ciência junto

aos agroecossistemas familiares camponeses.

E, dessa forma fazer agroecologia é uma construção social. Necessitamos juntar vários

parceiros afins, lutar por direitos e políticas públicas para o desenvolvimento da produção

agroecológica. A produção agroecológica é uma opção de vida, que tem como principal

função salvar a vida da humanidade e do planeta e deve ser bandeira defendida pelo campo e

pela cidade, a mudança se fará com participação de todos. A agroecologia pode sim,

Page 56: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

55

contribuir para pensar a agricultura do futuro, cuidando da vida do solo, da

agrobiodiversidade, das plantas, das sementes, dos animais e do ser humano.

Portanto, podemos afirmar que a escola, também é um espaço privilegiado para

discutir a realidade da sociedade. Mas, é importante não esperarmos que ela vá ser a

ferramenta principal da transformação social, a superação das contradições e luta cotiana, nas

ruas, nas famílias, na produção, na fábrica, nas relações de gênero, na superação de

preconceitos, etc. são e serão a mola propulsora de um mundo melhor e justo para todos.

Page 57: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

56

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARROYO, Miguel González e FERNANDES, Bernardo Mançano. A Educação Básica e o Movimento Social do Campo. Coleção Por uma Educação Básica do Campo, nº2, 1999. BIASI, Gilberto Vilant de. 2° Feira Sustentável Agricultura Familiar, Economia Solidaria Pesca, Reforma Agrária, Energias Renováveis. Centro Sul- Florianópolis- SC 30/10/09 a 03/11/09. 2009.

------ 9º Jornada de agroecologia. Terra Livre de Transgênico e Sem Agrotóxicos.

Francisco Beltrão – 19 a 22/05/10.

------ Seminário de agroecologia. Agroecologia como Ferramenta de Luta. EEM Paulo Freire. VIERA, SANTIN, BRUNETTO - 24/06/2010 BIASI, Simone Vilant de. O professor e qualidade de ensino: uma análise a partir dos resultados do SAEB na escola pública do Paraná. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR. 2009. BRASIL, Ministério da Educação. Referências Para Uma Política de Educação Nacional de Educação do Campo, cadernos de subsídios, Grupo de Trabalho Permanente de Educação do Campo. Instituído pela Portaria n° 1.374 de 03 de junho de 2003. BRASIL. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, Censo 1997. BRASIL. INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Histórico do PRONERA. Disponível em http://www.incra.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=92&Itemid=125 . Accessado 15 mai, 2011. CALDART, Roseli Salete. Por uma Educação do Campo: Traços de uma Identidade em Construção. Exposição realizada no Seminário Nacional de Educação do Campo, Brasília, 26 a 29 de novembro de 2002. DALMAGRO, Sandra Luciana. A Escola no Contexto das Lutas do MST, Florianópolis - SC. 2010. EMM Paulo Freire, Projeto Político Pedagógico, 2007. FERNANDES, Bernardo Mançano. MST Formação e Territorialização. São Paulo, Editora Hucitec, 2° edição, 1999. GUTERRES, Ivani. Agroecologia Militante: contribuições de Enio Guterres, São Paulo, Expressão Popular, 2006.

Page 58: A EXPERIÊNCIA AGROECOLÓGICA E EDUCATIVA DA EEM … · em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio ... Estadual de Ensino Médio Paulo Freire em Abelardo Luz, Santa Catarina,

57

KOLLING, Edgar Jorge e CIRIOLI, Paulo Ricardo, osfs CALDART, Roseli Salete. Educação do campo: identidade e políticas públicas. Brasília- DF, 2002 KOLLING, Edgar Jorge, CIRIOLI, Paulo Ricardo, osfs CALDART, Roseli Salete. Educação do campo: identidade e políticas públicas, Brasília- DF, 2002 principalmente na região da Escola de Ensino Médio Paulo Freire, no ano de 2008, quando da elaboração do PME – Plano Decenal Municipal de Educação, que foi uma conquista a partir da Constituição Federal (CF) de 1988 que em seu artigo 28 diz que é de responsabilidade da União Legislar sobre. 2002. MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Caminhos da Educação Básica de Nível Médio para a Juventude das Áreas de Reforma Agrária. Documento Final do Seminário Nacional sobre Educação Básica de Nível Médio nas áreas de Reforma Agrária, Luziânia, 18 a 22 de setembro de 2006. PINOTTI, Aidir. Curso Técnico em Agroecologia como Ferramenta de Implementação da Agroecologia no Assentamento José Maria- Abelardo Luz, 2010. ROCHA, Eliene Novaes, PASSOS, Joana Célia dos, CARVALHO, Raquel Alves de. Educação do Campo: Um olhar panorâmico. 2005.