a expansão do universo

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A Expansão do Universo Ioav Waga Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto de Física 1 Introdução O século XX foi extremamente rico em descobertas tanto na física, de uma forma geral, como na cosmologia. Foi neste século que descobriu-se a existência de galáxias e que elas constituem os tijolos das grande estruturas no Universo. Também neste século descobriu-se que o Universo está em expansão e essa grande descoberta é o tema principal destas notas. O ano de 1998 pode tornar-se um marco na história da cosmologia. A descoberta nesse ano de que o Universo está em expansão acelerada, se confirmada, é de importância comparável à descoberta na década de 60, da existência de uma radiação cósmica de fundo (veja a seção 6). Certamente ela traz um impacto profundo na nossa compreensão do cosmos, abre novas perspectivas para a teoria de campos, para a física de partículas elementares e como toda grande descoberta lança novos desafios. A aceleração da expansão do Universo, suas evidências observacionais e possíveis causas são assuntos que também trataremos aqui. No século XX tivemos grandes astrônomos mas sem dúvida Edwin Powell Hubble destacou-se entre eles. Hubble é considerado o maior astrônomo desde Copérnico: realizou descobertas tão importantes que imortalizariam qualquer cientista que tivesse descoberto ao menos uma delas. Ele deu uma contribuição fundamental à descoberta de galáxias, criou um sistema simples de classificação de galáxias aceito até hoje e finalmente mostrou que o Universo está em expansão.

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Expansão do universo

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A Expanso do Universo

Ioav Waga

Universidade Federal do Rio de JaneiroInstituto de Fsica

1 Introduo

O sculo XX foi extremamente rico em descobertas tanto na fsica, de uma forma geral, como na cosmologia. Foi neste sculo que descobriu-se a existncia de galxias e que elas constituem os tijolos das grande estruturas no Universo. Tambm neste sculo descobriu-se que o Universo est em expanso e essa grande descoberta o tema principal destas notas.O ano de 1998 pode tornar-se um marco na histria da cosmologia. A descoberta nesse ano de que o Universo est em expanso acelerada, se confirmada, de importncia comparvel descoberta na dcada de 60, da existncia de uma radiao csmica de fundo (veja a seo 6). Certamente ela traz um impacto profundo na nossa compreenso do cosmos, abre novas perspectivas para a teoria de campos, para a fsica de partculas elementares e como toda grande descoberta lana novos desafios. A acelerao da expanso do Universo, suas evidncias observacionais e possveis causas so assuntos que tambm trataremos aqui.

No sculo XX tivemos grandes astrnomos mas sem dvida Edwin Powell Hubble destacou-se entre eles. Hubble considerado o maior astrnomo desde Coprnico: realizou descobertas to importantes que imortalizariam qualquer cientista que tivesse descoberto ao menos uma delas. Ele deu uma contribuio fundamental descoberta de galxias, criou um sistema simples de classificao de galxias aceito at hoje e finalmente mostrou que o Universo est em expanso. Hubble nasceu em novembro de 1889 em uma famlia de classe mdia no estado de Missouri nos Estados Unidos. Aos 10 anos de idade, estimulado pelo seu av materno, surgiu seu interesse pela astronomia. Entretanto a trajetria seguida, at se tornar um astrnomo consagrado est longe de ser linear. Em 1906, aos 17 anos entrou para a Universidade de Chicago onde realizou seus estudos universitrios. Entre 1910 e 1913 estudou cincias jurdicas na Universidade de Oxford na Inglaterra, e aos 25 anos de idade retorna Universidade de Chicago onde defendeu tese de doutorado em astronomia. Aps a defesa de tese ele alistou-se como major na fora expedicionria americana e seguiu para a Frana onde comandou um batalho na primeira guerra mundial. Em 1919 voltou aos Estados Unidos e foi ento contratado para trabalhar no Observatrio do Monte Wilson. Foi nesse observatrio que realizou suas grandes descobertas.

2 Como Hubble descobriu galxiasUma das grandes questes da astronomia no incio do sculo XX era saber a natureza das nebulosas espirais. Alguns astrnomos argumentavam serem elas um sistema de estrelas que nos circundam, enquanto outros defendiam a tese de que as nebulosas espirais eram sistemas semelhantes nossa prpria galxia e situadas bem mais distantes que as estrelas usuais. A existncia de nebulosas j era conhecida h centenas de anos.Em abril de 1920 ocorreu um debate entre dois grandes astrnomos da poca, Herbert Curtis e Harlow Shapley, que entrou para a histria da cosmologia. Uma das questes do debate era a natureza das nebulosas espirais. Curtis dizia:

``A evidncia hoje aponta fortemente para a concluso de que as espirais so galxias individuais, ou universos ilhas, comparveis em dimenso e nmero de componentes individuais nossa prpria galxia.''

Enquanto que Shapley defendia um outro ponto de vista:

``Me parece que a evidncia oposta a que as espirais so galxias de estrlas comparveis nossa prpria galxia. At o presente no h razo para modificarmos a hiptese tentativa de que as espirais so simplesmente objetos nebulosos.''

A disputa no foi resolvida ento. O que faltava? Dados precisos sobre a nossa distncia at as nebulosas. Em 1923 Hubble inicia, em Monte Wilson, uma srie de observaes de Andrmeda, a mais famosa das nebulosas espirais. No incio de outubro ele observa em Andrmeda duas novas e uma estrla varivel bem tnue. Esta ltima foi uma grande descoberta. Aps uma sequncia de observaes Hubble pode concluir que a estrla varivel era uma estrla do tipo Cefeida1. Mas porque isso era to importante? Em 1912, Henrietta Leavitt, uma astrnoma do Harvard College Observatory, mostrou a existncia de uma correlao entre a luminosidade absoluta 2de estrelas variveis cefeidas e o perodo de oscilao da intensidade da luz vinda dessas estrelas. A correlao no sentido de que quanto maior o perodo entre dois mximos (variando de alguns dias at algumas semanas), maior a luminosidade absoluta. Observando-se o perodo de variao de uma estrela cefeida, os resultados de Leavitt permitem inferir sua luminosidade absoluta. Assim, como a intensidade da luz cai com o inverso do quadrado da distncia, podemos determinar a distncia de uma estrela cefeida medindo sua luminosidade aparente3 e estimando sua luminosidade absoluta atravs da observao do perodo.Usando a tcnica desenvolvida por Leavitt, Hubble pode determinar a distncia Andrmeda. Em fevereiro de 1924 Hubble escreveu uma carta a Shapley em que dizia:`` Voc se interessar em ouvir que encontrei uma varivel Cefeida na nebulosa de Andrmeda (M31). ... Em anexo segue uma cpia da curva de luz que, mesmo grosseira, mostra de forma inquestionvel as caractersticas de uma Cefeida. ... Usando o valor de Seares ... a distncia obtida possui um valor acima de 300 000 parsecs.''4J se conhecia, naquela poca, que o raio da nossa galxia era bem menor que o valor acima (o raio da galxia da ordem de 15 000 parsecs). Portanto a concluso era inescapvel. A nebulosa Andrmeda uma galxia espiral semelhante a nossa Via Lctea e que, sabemos hoje, encontra-se a uma distncia aproximada de 2,9 milhes de anos luz.5

3 A Lei de Hubble

um fato comum a todas as grandes descobertas cientficas de que estas s ocorrem aps serem precedidas por pequenos e importantes passos. A descoberta da lei que governa a expanso do Universo feita por Hubble no fugiu a essa regra. Contar um pouco dessa histria o objetivo desta seo. V. M. SlipherEm 1901, Vesto M. Slipher, um jovem astrnomo, ento com 25 anos, foi contratado para trabalhar no Observatrio Lowell no Arizona (EUA). Durante mais de 10 anos Slipher analisou o espectro da luz vinda de estrlas e nebulosas.6Em 1912 ele percebeu que as linhas espectrais de Andrmeda estavam no lugar errado: elas estavam deslocados para o azul, isto , para a regio do espectro de menores comprimentos de onda. Medindo o deslocamento espectral ele conseguiu determinar a velocidade de Andrmeda em relao Terra. Isso foi possvel devido ao fenmeno denominado efeito Doppler, nome dado em homenagem Christian Doppler, cientista austraco que em 1842 o descobriu. No caso de uma onda que propaga-se em um meio material (uma onda sonora por exemplo), esse efeito manifesta-se em uma mudana na frequncia observda sempre que o detector ou a fonte movem-se em relao ao meio. Observamos que o som vindo da sirene de uma ambulncia torna-se mais agudo (maior frequncia) quando esta aproxima-se de ns e mais grave quando ela se afasta. O efeito ocorre no apenas com ondas sonoras mas com ondas eletromagnticas (como a luz vinda de uma galxia) tambm. A distncia entre duas cristas de uma onda (comprimento de onda) medida por um observador, menor (deslocamento para o azul - som agudo) quando a fonte emissora aproxima-se do observador do que quando a fonte est parada. Quando a fonte afasta-se do observador o comprimento de onda medido por ele maior (deslocamento para o vermelho - som grave). Para a radiao eletromagntica temos:

z =lobservado - lemitidolemitido= vec,(1)onde c a velocidade da luz, lobservado o comprimento de onda observado, lemitido o comprimento de onda no referencial da fonte, ve a velocidade da fonte (em relao ao observador) e z o deslocamento para o vermelho. Velocidades positivas indicam afastamento da fonte em relao ao observador e correspondem a z positivo. A frmula vale para velocidades bem menores que a da luz.A velocidade de Andrmeda estimada por Slipher foi da ordem de 300 km/s. Em 1915 ele j tinha 40 medidas de espectro de nebulosas com 15 velocidades radiais estimadas, nmero que sobe para 25 em 1917. Contrariamente ao observado para Andrmeda, a grande maioria apresentava velocidades positivas. Por exemplo, das 41 nebulosas com redshift medido em 1923, apenas 5 (incluindo Andrmeda) aproximavam-se da Terra. A velocidade das nebulosas era considerada muito alta, em mdia mais de 20 vezes as velocidades tpicas encontradas para estrlas. Os valores obtidos estavam compreendidos entre 200 e 1100 km/s. Enquanto a cosmologia observacional comeava a desenvolver-se nos Estados Unidos, na Europa progressos tericos fundamentais estavam sendo feitos. Em 1917 Albert Einstein j havia desenvolvido sua teoria para o campo gravitacional, a relatividade geral, e construdo o primeiro modelo cosmolgico relativstico. O modelo de Einstein, alm de ser espacialmente homogneo, tinha a propriedade de ser esttico. Naquela poca os cientistas acreditavam ser esta uma caracterstica do Universo. Como a gravitao atrativa, para obter um Universo esttico, Einstein foi obrigado a modificar as suas equaes originais do campo gravitacional introduzindo um termo repulsivo, a chamada constante cosmolgica (L). Einstein acreditava que seu modelo possua as seguintes virtudes: 1) ele podia relacionar a massa do Universo com a constante cosmolgica, o que estava em acordo com um princpio que lhe era muito caro, o princpio de Mach7; 2) ele acreditava ser este o nico modelo com essas caractersticas; 3) ele mostrou ser possvel construir um modelo cosmolgico consistente com a relatividade geral.Em 1917, o astrnomo holandes Willem de Sitter tambm publica trs trabalhos em que aplica a relatividade geral cosmologia. Mostra que possvel obter-se novas solues da relatividade geral., com constante cosmolgica, estticas8, porm vazias (sem matria), o que de certa forma entra em conflito com as virtudes atribudas por Einstein ao seu modelo. De Sitter sugere ainda que a velocidade de afastamento de objetos aleatoriamente espalhados em seu Universo aumentaria com a distncia.9Esta propriedade era ento conhecida como ``efeito de Sitter''. Portanto, j em 1917 possvel notar-se a semente do que viria a ser mostrado observacionalmente por Hubble mais de uma dcada depois.Em 1922, Aleksandr Aleksandrovich Friedmann, cientista russo nascido em 1887 na cidade de So Petersburgo, obteve, pela primeira vez, solues expansionistas das equaes de Einstein. Nessa poca, tanto Einstein quanto de Sitter insistiam que as propriedades do espao-tempo so estticas. Einsten chegou mesmo a publicar uma nota em que declarava estar o trabalho de Friedmann matematicamente incorreto. Contudo, um ano depois ele admitiu seu erro e reconheceu a importncia do trabalho de Friedmann. O Universo descrito pelo modelo de Friedmann espacialmente homogneo, isotrpico em relao a qualquer ponto, e possui uma origem no passado em que a densidade de matria diverge. Este modelo considerado atualmente o modelo padro da cosmologia. Friedmann mostrou que sob certas condies obtm-se uma soluo que descreve a expanso e contrao em ciclos do universo e cujo perodo ele estimou em dez bilhes de anos. notvel que ele tenha chegado a esse valor bastante prximo ao que hoje acreditamos ser a idade do Universo (quatorze bilhes de anos). Friedmann publicou ainda outro trabalho em 1924, mas no ano seguinte, contraiu tifo e faleceu precocemente aos 37 anos.Motivado pelas medidas de Slipher e o ``efeito de Sitter'', o alemo C. Wirtz foi o primeiro astrnomo a buscar uma relao entre a distncia e a velocidade de galxias. Wirtz usou o dimetro aparente das galxias como o indicador de distncia. Quanto mais afastada uma galxia menor seu dimetro aparente. Em 1922 sugeriu que a velocidade cresce com a distncia, porm a relao encontrada por ele no era linear e sim logartmica. Estudos semelhantes foram realizados por Lundmark e Stronberg, sem contudo concluir sobre a existncia ou no de alguma relao entre velocidade e distncia. Em 1928, H. Robertson usando as velocidades obtidas por Slipher e dados de distncia de galxias j publicados por Hubble, encontra uma relao aproximadamente linear entre velocidade e distncia. Ele publica seu trabalho em uma revista no muito lida por astrnomos. No se sabe se Hubble tinha ou no conhecimento da publicao de Robertson. M. Humason e E. HubbleO fato que a relao j era pblica desde o primeiro trabalho de de Sitter em 1917. Em 1929, e nos anos subsequentes, Hubble sistematicamente estende suas medidas de distncia, e usando desvios para o vermelho medidos por Milton Humason, coloca sobre uma base firme a validade da lei que indica que a razo entre a velocidade de afastamento de um objeto e sua distncia uma constante.A seguir, iniciaremos uma discusso um pouco mais tcnica, pois julgamos importante fazer uma distino entre o que chamaremos de ``Lei de Hubble do Astrnomo'' e a lei que foi obtida posteriormente e que denominaremos ``Lei de Hubble''. 10O que de fato Hubble observou foi a existncia de uma relao linear entre o desvio para o vermelho e a distncia, isto ,cz = H0 d ; H0 = constante.(2)Essa , na verdade, uma relao de validade limitada. S vlida para pequenas distncias ou pequenos desvios para o vermelho. No clebre trabalho de Hubble de 1929 a distncia das galxias mais afastadas de aproximadamente dois milhes de parsecs. Para essas distncias, ou mesmo para distncias maiores, a lei acima perfeitamente vlida. Usando ento a equao (1) que relaciona velocidade e desvio para o vermelho (vlida para baixas velocidades), ve = cz, chegamos a lei de Hubble do astrnomo:ve = H0 d. (LHA)(3)Note que aqui H0 uma constante e que ve a velocidade da fonte no instante da emisso, isto no passado, relativa ao observador.A Lei de Hubble, por outro lado, escrita como:v(t) = H(t) d(t).(4)Existem algumas diferenas entre a relao acima e a lei de Hubble do astrnomo. Em primeiro lugar, todas as quantidades na expresso acima so tomadas no mesmo instante t. Veja que na lei de Hubble do astrnomo H0 uma constante (denominada constante de Hubble) enquanto que em (4) a quantidade H(t) uma funo do tempo. Na verdade essa quantidade, denominada parmetro de Hubble, em geral diminui com o tempo. A constante de Hubble (H0) o valor do parmetro de Hubble hoje, isto , no instante t = thoje. Uma outra diferena o significado da velocidade que aparece na Lei de Hubble. usual denomin-la velocidade de recesso por razes que ficaro claras adiante.Mas qual o significado fsico da distncia d que aparece na equao 4? Em cosmologia temos vrias definies de distncia, sendo que algumas podem ser observacionalmente determinadas enquanto outras no. Por exemplo: h pouco descrevemos como Hubble determinou a distncia de Andrmeda usando cefeidas e a relao perodo-luminosidade descoberta por Leavitt. A distncia obtida dessa forma ou de forma equivalente denominada distncia luminosidade. A distncia que aparece na Lei de Hubble denominada distncia prpria. Ela no uma quantidade observvel, embora seja a definio de distncia mais prxima do que nosso senso comum entende como distncia. Podemos defini-la operacionalmente da seguinte forma: suponha que pudssemos organizar um consrcio csmico com o objetivo de determinar a distncia de uma galxia at ns. Para concretizar esse objetivo, esse consrcio poderia, por exemplo, colocar um nmero muito grande de observadores, cada observador muito prximo um do outro, enfileirados radialmente desde nossa posio at a galxia. Esses observadores estariam com seus relgios sincronizados e combinariam que em um mesmo instante t cada qual enviaria um sinal de luz para o seguinte. Este ento determinaria o instante de chegada do sinal e aps multiplicar a velocidade da luz pelo intervalo de tempo gasto para o sinal chegar at ele, teria a distncia que o separa de seu vizinho ( estamos aqui desprezando efeitos decorrentes de existir uma velocidade relativa entre dois observadores vizinhos). Esses observadores se reuniriam finalmente em uma grande conveno e aps somarem todos os resultados parciais obtidos teriam a distncia galxia no instante t. claro que um consrcio desse tipo no pode ser realizado, mas se fosse possvel, a distncia obtida seria o que denominamos de distncia prpria. O aumento da distncia prpria das galxias, em relao a ns, reflexo da expanso do Universo. E a taxa de variao da distncia prpria de uma galxia em relao ao tempo o que denominamos de sua velocidade de recesso.

Embora a lei de Hubble do astrnomo tenha validade limitada, a Lei de Hubble, como definida, sempre vlida. Ela consequncia da homogeneidade e isotropia do Universo. A homogeneidade significa a equivalncia de todos os pontos do espao e a isotropia a igualdade, em um determinado ponto, de todas as direes. Mas se todos os pontos so equivalentes, isso implica a igualdade de todas as direes em qualquer ponto. Assim no podemos apontar para uma direo e dizer que para l encontra-se o centro do Universo. Tampouco estamos no centro do Universo. A verdade que no h centro do Universo, ou melhor todos os pontos so centrais. Isso realmente parece estranho! Talvez a idia de que o Universo possui um centro tenha sua origem na imagem que fazemos do ``big-bang''. comum pensarmos na grande exploso como uma granada que explode no ar e cujos fragmentos voam em todas as direes a partir de um ponto. Como veremos, essa imagem, na verdade, possui alguns aspectos corretos e outros no.

Voltando a questo anterior. Mas como que todos os pontos podem ser centrais? A melhor forma de ilustrar isso por meio da imagem de um balo inflando. Considere ento um balo elstico e suponha que as galxias sejam pequenas moedas uniformemente distribudas e coladas na superfcie do balo. Neste exemplo preciso desprezar a espessura das moedas e supor que o Universo esteja restrito superfcie bidimensional do balo, isto , imagine que somos seres bidimensionais vivendo na superfcie do balo. Ao inflarmos o balo as moedas (galxias) se afastam umas das outras, mas como elas esto uniformemente distribudas na superfcie do balo podemos nos situar sobre qualquer uma delas que veremos sempre o mesmo quadro. Isto , todas as moedas so equivalentes (homogeneidade) e como o balo esfrico todas as direes so equivalentes (isotropia) em qualquer ponto. Observe que qualquer moeda pode ser tomada como centro, pois a distribuio das outras moedas em torno dela esfricamente simtrica. Mas se olharmos na direo do raio do balo? Lembre-se que nesse universo somos seres bidimensionais e portanto isso no possvel.

Um outro aspecto ilustrativo no exemplo acima que embora as moedas afastem-se umas das outras devido expanso do balo, elas so feitas de metal e no aumentam de tamanho. O mesmo ocorre com as galxias ou, em uma escala menor, com o prprio sistema solar. A Terra ou os planetas no se afastam do Sol devido expanso do Universo, muito menos se distanciam os tomos ou as clulas do nosso corpo. Em todos esses casos h outras foras envolvidas, que tornam o efeito da expanso do universo, nessas escalas, totalmente desprezvel. Nesse aspecto a imagem da expanso do Universo como de fragmentos de uma granada afastando-se uns dos outros correta. Os fragmentos mantm a forma. Foi por essa razo que escolhemos moedas coladas ao balo para representar as galxias, e no pintas desenhadas sobre o balo, que aumentariam medida que esse inflasse.11

H, contudo, no exemplo do balo, assim como no da granada, uma diferena importante com relao ao Universo. No caso do balo a expanso acontece em um espao vazio e esttico, isto , ao inflar o balo ocupa uma regio cada vez maior do espao tridimensional. No caso do Universo isso no ocorre, o Universo a totalidade e portanto no est expandindo-se dentro de um espao vazio e esttico que o contm. realmente difcil imaginarmos isso. Nesse sentido, nos parece inadequada a pergunta: ``para onde est o Universo expandindo-se?''. Embora bastante comum, ela inadequada pois pressupe que existe algo externo ao Universo.

Finalmente interessante discutir um pouco mais sobre o conceito de velocidade de recesso. Em geral, quando falamos de velocidade de uma partcula em um determinado referencial, estamos nos reportando ao fato de que essa partcula ocupa diferentes posies ou coordenadas espaciais a medida que o tempo passa. Segundo a relatividade especial, a velocidade mxima de uma partcula a velocidade da luz no vcuo, que igual a c = 300 000 km/seg. Contudo, h pouco afirmamos que a Lei de Hubble sempre vlida e o leitor poderia ento perguntar-se se essa lei no violaria a relatividade especial. Note que para distncias maiores que o chamado ``raio de Hubble'', dH = c/H , a velocidade de recesso de uma galxia (equao 4), maior que a velocidade da luz. A resposta questo acima sutil e exige uma discusso melhor do que a velocidade de recesso. Como dissemos anteriormente o aumento da distncia prpria entre as galxias decorrncia da expanso do Universo, ou seja, com a expanso do Universo aumentam as distncias entre as galxias distantes. Esse aumento contudo deve ser pensado, no como devido ao movimento das galxias atravs do espao, mas decorrente, digamos assim, do aumento do prprio espao. Nesse sentido podemos pensar que as coordenadas espaciais das galxias esto fixas e que o que est aumentando o espao entre elas. A Lei de Hubble no viola, portanto, a relatividade especial, pois a velocidade de recesso no uma velocidade usual, como a descrita no incio deste pargrafo, em que um objeto desloca-se no espao. Ela decorre do aumento do espao devido expanso e em princpio pode ser infinta. A velocidade de recesso deixaria de existir se o Universo parasse de expandir.Cabe dizer ainda que as galxias possuem tambm uma velocidade aleatria no espao, usualmente chamada de velocidade peculiar. Essa sim no pode ser superior a velocidade da luz. Ela surge porque o Universo real no exatamente homogneo, isto , ele no homogneo em todas as escalas de distncia.12A propriedade de homogeneidade de fato s se revela quando consideramos as propriedades mdias da distribuio de matria em grandes escalas. a existncia de inomogeneidades locais na distribuio de matria que induzem o surgimento das velocidades peculiares de galxias. Valores tpicos para essas velocidades so da ordem de 300 km/s. Veja que a velocidade peculiar de Andrmeda explica o fato de Hubble ter observado que essa galxia aproxima-se de ns (desvio para o azul). De fato para galxias prximas isso possvel, pois a velocidade de recesso pequena e pode em princpio ser suplantada pela velocidade peculiar.

4 Supernovas e a expanso acelerada do UniversoUma questo relevante, e que tem recebido grande ateno dos cosmlogos atualmente, saber se a velocidade de recesso das galxias est aumentando ou diminuindo com o tempo. Isto , est o Universo em expanso acelerada ou desacelerada? Observaes recentes de supernovas distantes sugerem que a expanso est acelerando. Isso no significa contudo que a expanso do Universo foi sempre acelerada. Na verdade o que as observaes indicam que o Universo entrou em uma fase de acelerao mais recentemente e que no passado remoto a expanso era desacelerada. Discutir porque e como os cosmlogos esto chegando a essa concluso o objetivo dessa seo. Uma supernova a exploso de uma estrela em fase final de evoluo. Existem alguns tipos distintos de supernovas, classificadas de acordo com as caractersticas do espectro da luz que emitem. Por exemplo, as supernovas do tipo I so aquelas que no apresentam linhas de hidrognio em seu espectro. Elas so ditas do tipo Ia quando h fortes linhas de silcio. Assim como as cefeidas, as supernovas do tipo Ia (sne Ia) so ferramentas muito teis em cosmologia: constituem o que costuma-se chamar de ``vela padro''. Um nome que julgamos ser tambm bastante apropriado ``rgua csmica'', pois as sne Ia nos auxiliam a determinar distncias.Em termos de evoluo estelar, as sne Ia comeam onde as cefeidas terminam, isto , em um tipo de estrla chamada ``an branca''. Uma an branca uma estrela muito densa. como se toda a massa do Sol estivesse confinada em uma regio do tamanho da Terra.13A estabilidade de uma an branca resultado de um balano entre a fora gravitacional atrativa e uma fora repulsiva de origem quntica, que decorre do princpio de excluso de Pauli entre eltrons. Por conta disso uma an branca no pode ter qualquer massa. Existe um limite de massa, denominado ``limite de Chandrasekhar''14( que igual a aproximadamente 1,4 massas solares), acima do qual a repulso quntica no consegue mais contrabalanar a atrao gravitacional. Em geral uma an branca vai lentamente esfriando-se e apagando. No entanto, se ela fizer parte de um sistema binrio, pode comear a acumular massa proveniente de sua companheira, tornando-se mais e mais densa. Esse acmulo de massa no se mantm indefinidamente: quando a estrla atinge o limite de Chandrasekhar ela comea a colapsar violentamente. Com o colapso o centro da estrela atinge temperaturas extremamente elevadas o que provoca o gatilho da cadeia de reaes termonucleares. Uma exploso termonuvlear tem ento incio e o material da estrla violentamente lanado no espao, chegando a atingir velocidades da ordem de 10 000 km/seg. Temos ento uma sne Ia, que em seu referencial pode levar algumas semanas para atingir o mximo e alguns meses para terminarAt aqui descrevemos em linhas bem gerais, o que uma sne Ia. A seguir veremos porque elas so to teis para a cosmologia e como elas podem nos dizer alguma coisa sobre a expanso do Universo.

A principal caracterstica das sne Ia e que as torna de grande importncia em cosmologia a sua homogeneidade. Como sempre surgem devido a acreo de massa de ans brancas em sistemas binrios, essa homogeneidade esperada. Na verdade, existe uma certa inomogeneidade. Observou-se que as sne Ia que demoram mais a apagar so mais brilhantes. Para que se possa utiliz-las como rguas csmicas, algumas tcnicas foram desenvolvidas que usam essa informao para corrigir o brilho da sne Ia no mximo (pico) de sua luminosidade. Grosso modo, a variao de brilho entre a mais e a menos brilhosa das sne Ia um fator 2, sendo que aproximadamente 80% das sne Ia so normais. Outra caracterstica importante das sne Ia sua alta luminosidade. No pico, ela atinge cerca de dez bilhes de vezes a luminosidade do Sol. Uma galxia como a nossa possui 100 bilhes de estrlas e portanto, o brilho de uma sne Ia comparvel ao de uma galxia. Essa propriedade, de ser muito luminosa, permite que possamos observar as sne Ia a grandes distncias. Por exemplo, a luz vinda da supernova ck97 levou 8 bilhes de anos para chegar at ns. Uma sne Ia 1 milho de vezes mais luminosa que uma cefeida, e pode ser vista mil vezes mais longe.Supernova sn97j atinge o pico e vai apagando-se. Cada foto foi obtida com um intervalo de aproximadamente uma semana.As sne Ia apresentam tambm algumas dificuldades. Por exemplo, as supernovas do tipo Ia so muito raras. Elas ocorrem a uma taxa de aproximadamente uma a cada 400 anos por galxia. Assim, para observ-las com uma certa frequncia, foi desenvolvida uma estratgia onde h o monitoramento de aproximadamente 100 campos de galxias, cada qual com mil galxias. Alm disso, supernovas no so propriamente objetos e sim eventos que ocorrem muito rapidamente. como um fogo de artifcio (como um sinal de localizao ) que sobe ao cu, brilha e aos poucos apaga. Uma sne Ia com desvio para o vermelho z ~ 0.5, vista aqui na Terra, atinge o mximo em poucos dias e aps algumas semanas j no mais possvel detect-la nem com o mais potente telescpio.Mas como que as sne Ia podem nos indicar que o Universo est em expanso acelerada? A razo simples. As distncias em um Universo em expanso acelerada so maiores do que em um Universo que desacelera ou expande-se com velocidade constante. Assim, se o Universo estiverem expanso acelerada, supernovas distantes parecero menos luminosas do que pareceriam se a expanso do Universo estivesse desacelerando-se.Vejamos agora de forma qualitativa porque em um Universo que expande-se de forma acelerada as distncias so maiores do que seriam se ele estivesse desacelerando. O que discutimos anteriormente sobre a lei de Hubble nos ajudar a entender isso. Consideremos ento uma galxia prxima cujo desvio para o vermelho, z, tenha sido medido. Para efeito de raciocnio desprezemos por hora a existncia de uma possvel velocidade peculiar. Para galxias prximas podemos, como Hubble, pensar no desvio para o vermelho como um puro efeito Doppler. Assim, usando que ve = z c, obtemos a velocidade de afastamento da galxia no instante da emisso da luz. Como essa radiao leva um certo tempo para chegar at ns, ela detectada posteriormente, isto , no presente. Considere agora a Lei de Hubble: v(t) = H(t)d(t) e tome t como o tempo presente, isto , t = thoje. Sabendo-se ento que no passado a velocidade da galxia era ve, podemos concluir que se o Universo est em expanso acelerada a velocidade dessa galxia hoje ser maior do que seria se o Universo estivesse desacelerando ou em expanso com velocidade constante. Portanto, considerando um valor fixo para a constante de Hubble (H0), conclumos da Lei de Hubble, que velocidades maiores implicam em distncias maiores.

Resumindo: o que medimos de uma supernova o seu desvio para o vermelho e a sua luminosidade aparente. A luminosidade intrnseca estimada observando-se supernovas prximas cujas distncias sejam conhecidas, por exemplo, atravs da observao de cefeidas nas galxias onde essas supernovas apareceram. Observe que aqui a hiptese de que as sne Ia formam um conjunto homogneo crucial; caso contrrio no poderamos inferir a luminosidade intrnseca das supernovas distantes usando supernovas prximas. Atualmente existem dois grupos rivais, envolvidos na observao e anlise de sne Ia, com mais de uma centena de supernovas observadas. Os dois grupos aps uma anlise muito cuidadosa chegaram a uma mesma concluso. Estatisticamente as supernovas distantes so menos brilhosas do que se esperaria em um Universo expandindo-se, por exemplo, com velocidade constante. O resultado obtido slido mas no est imune a possveis erros sistemticos. Por exemplo, uma das maiores preocupaes a evoluo. possvel que as sne Ia distantes sejam intrinsecamente menos luminosas do que as supernovas prximas. Inicialmente, algumas anlises apontaram para uma diferena, estatisticamente significativa, no tempo gasto para atingir o mximo, entre supernovas prximas e distantes. Anlises recentes contudo no confirmaram esses resultados. Outra possvel fonte de erros sistemticos, seria a existncia de poeira na galxia hospedeira da sne Ia ou no meio intergalctico. Contudo, anlises cuidadosas parecem descartar essa possibilidade, pelo menos na quantidade necessria para tornar vivel um Universo com expanso desacelerada. Como veremos nas prximas sees , existem outros resultados observacionais, totalmente independentes e imunes aos possveis erros sistemticos das observaes de supernovas que apontam no mesmo sentido dessas. Isso tem feito com que os cosmlogos tenham uma grande confiana de que esto no caminho certo.

5 O maior erro cientfico de EinsteinMas o que pode estar causando a acelerao da expanso do Universo? Como se sabe, a gravidade decorrente da matria ordinria (prtons, eltrons, ftons etc) atrativa e, portanto, essa matria desacelera a expanso. Isto , da mesma forma que a gravidade da Terra desacelera um objeto lanado radialmente na sua superfcie e que se afasta, a gravitao gerada por toda a matria ordinria do Universo deve diminuir a velocidade de recesso e no aument-la. Assim, preciso uma outra fora ou alguma matria com propriedades bem distintas da matria usual para explicar esse fenmeno. Na verdade muito pouco sabemos sobre a natureza dessa matria extica capaz de gerar a acelerao csmica. A seguir, falaremos sobre uma possvel causa da acelerao da expanso (a constante cosmolgica), mas deixamos claro, de incio, que trata-se de uma possibilidade e que h ainda diversos aspectos no compreendidos sobre essa questo. Acreditamos que novos avanos na elucidao desse problema dependero de uma compreenso mais profunda de fsica fundamental, bem como de novas e mais precisas observaes. Pensamos tambm ser esse um dos grandes desafios da fsica e da cosmologia do prximo sculo.A constante cosmolgica (L) introduzida por Einstein em seu primeiro modelo cosmolgico um possvel candidato capaz de gerar a repulso csmica que mencionamos. Como vimos, ela foi introduzida nas equaes de campo da relatividade geral para compatibiliz-las com a idia de um Universo esttico. Aps a descoberta da expanso do Universo, Einstein considerou a introduo de L nas suas equaes como o maior erro cientfico da sua vida. Contudo, ironicamente, talvez isso no tenha sido um erro.Embora rejeitada por Einstein, a constante cosmolgica foi mantida nas equaes da relatividade geral por Eddington. Grande cientista ingls, Arthur Stanley Eddington foi o principal organizador das expedies ilha de Prncipe (Guin)e Sobral (Brasil) para observar um eclipse solar em 1919, quando verificaram, experimentalmente, a superioridade da relatividade geral sobre a teoria da gravitao de Newton. Eddington gostava tanto de L que chegou a dizer que preferia voltar teoria newtoniana, caso tivesse que abrir mo dela. Mas por que tanto apego a essa constante? Para entender isso, devemos lembrar que nas dcadas de 30 e 40, o valor aceito para outra constante, a constante de Hubble (H0), era oito vezes maior do que o valor atualmente aceito (H0 ~ 65 km/seg Mpc-1).15,16,17Usando-se o valor considerado correto naquela poca, a idade terica obtida para o Universo era menor do que a idade estimada para a Terra! Havia, portanto, naquela poca, um grande conflito entre teoria e observao, mas que poderia ser resolvido introduzindo-se uma constante cosmolgica no nula. Essa era a motivao de Eddington: a idade em um Universo com L diferente de zero maior do que em um Universo com L igual a zero.Mas como L pode gerar uma expanso acelerada? Segundo a teoria newtoniana da gravitao a massa a fonte de gravidade, e como esta positiva, a forca gravitacional sempre atrativa. Para um fluido, por exemplo, o limite newtoniano deixa de valer quando a presso relativamente alta. Isso ocorre para fluidos cuja presso da ordem da densidade de massa vezes a velocidade da luz ao quadrado. Nesses casos preciso usar a teoria da relatividade. Como se sabe, com a relatividade especial estabelecida uma equivalncia entre massa e energia (E = mc2). Para a relatividade geral toda energia fonte de gravitao. De uma forma mais precisa, a ``massa efetiva'' que gera gravitao proporcional a densidade de energia mais trs vezes a presso. Assim, existindo uma matria extica com uma presso suficientemente negativa, a ``massa efetiva'', que gera gravitao ser negativa e teremos repulso gravitacional. A constante cosmolgica possui essa propriedade. Ela pode ser pensada como um fluido com uma equao de estado do tipo pL = -rL , onde pL a presso e rL a densidade de energia, de tal forma que rL + 3 pL negativo se rL positivo. Trata-se realmente de um fluido estranho; est uniformemente espalhado em todo o espao e sua densidade no varia mesmo com a expanso do Universo, da o nome constante cosmolgica. possvel mostrar ainda que o efeito de L anlogo ao de uma fora repulsiva que cresce linearmente com a distncia. Dimensionalmente a unidade de L inverso de comprimento ao quadrado. O fato que observacionalmente L muito pequena nos indica que os efeitos dessa constante s manifestam-se em escalas cosmolgicas de distncia.Vrias vezes na histria da cosmologia moderna L foi introduzida quando havia uma discrepncia entre teoria e observaes . Posteriormente, com a obteno de melhores dados observacionais ou quando novas interpretaes surgiam essa constante era descartada por uma questo de simplicidade. No impossvel que isso ocorra novamente. Contudo agora h algo novo, que precisa ser explicado, e que torna a questo da constante cosmolgica um dos problemas mais importantes (e complicados) da fsica de partculas e campos. Trata-se da questo da energia do vcuo.Quando se fala em vcuo, a maioria de ns, associa essa idia ao espao vazio, isto , a de um espao desprovido de qualquer matria. Contudo, para o fsico de partculas, por exemplo, a palavra ``vcuo'' possui um significado mais amplo. Para ele vcuo significa o estado de mnima energia de um sistema. Mas como pode o espao vazio ter energia? Segundo a mecnica quntica, todas as quantidades fsicas tendem a flutuar, particularmente isso ocorre tambm com o estado de vcuo. A teoria indica que, no estado de vcuo, partculas e antipartculas virtuais aparecem e desaparecem no espao, contribuindo assim para a sua energia. E do que depende essa energia? Em um de seus trabalhos seminais sobre o vcuo, Ya. B. Zel'dovich, um dos cientistas russos mais brilhantes do sculo XX, conta uma anedota curiosa sobre um vendedor de sucos misturados a uma gua mineral gasosa. O vendedor foi orientado a sempre perguntar aos seus clientes: ``Com que suco voc deseja a gua mineral?'' Quando uma vez um fregus solicitou gua mineral sem suco, ele perguntou:``Sem que suco? Sem suco de cereja ou sem suco de uva?'' Esta pergunta, certamente absurda nesse contexto, no o no caso do vcuo. Isto porque o vcuo obedece as leis da mecnica quntica. De fato, embora possam no estar presentes, a energia do vcuo depende das partculas reais existentes .Em geral, fora da relatividade geral a energia do vcuo no importante. Se temos uma partcula de massa m com energia E = K + V, onde K a energia cintica e V a potencial, e adicionamos uma constante a V, no alteramos com isso o movimento da partcula. A fora sobre a partcula depende do gradiente de V, isto , o que importa so variaes de V e no seu valor absoluto. Assim, comum escolher essa constante de tal forma que o mnimo de V seja igual a zero. Por exemplo, classicamente para um oscilador harmnico unidimensional define-se a energia potencial como V(x) = 1/2 k x2. Aqui a constante aditiva foi escolhida de tal forma que o potencial seja zero quando a elongao x for nula. O mnimo da energia ocorre quando a partcula est parada na origem. Quanticamente, no entanto, a situao no to simples. Nesse caso, devido ao princpio de incerteza, existe uma ``energia de ponto zero''. Isto , segundo a mecnica quntica, h uma limitao na determinao simultnea da posio e do momentum de uma partcula. Assim, por exemplo, a determinao precisa da posio da partcula implica em uma indeterminao absoluta de seu momentum e vice versa. O resultado que a energia mnima de um oscilador harmnico quntico no zero (a partcula no pode estar parada na origem) e sim igual a E0 = 1/2 [h/(2p)] w, onde w = k/m e h a constante de Planck.

Uma das teorias mais bem sucedidas j elaboradas pelo crebro humano o chamado ``modelo padro da fsica de partculas''. O modelo padro , na verdade, um conjunto de teorias que descrevem (at o limite de energia acessvel nos modernos aceleradores de partculas) as partculas elementares conhecidas assim como suas interaes . O sucesso dessa teoria decorre da sua comprovada capacidade em descrever corretamente os resultados experimentais, bem como de ter feito previses que foram confirmadas posteriormente. Sendo uma teoria quntica de campos, o modelo padro descreve as partculas elementares (eltron, quarks, fton etc) e suas interaes por meio de campos quantizados. possvel mostrar que todo campo sem interao , associado a uma partcula elementar, pode ser considerado como uma coleo de osciladores harmnicos qunticos. Assim, cada partcula elementar ter uma contribuio para a energia do vcuo, que ser a soma da energia de ponto zero desses osciladores. Em princpio, essa energia (densidade de energia) infinita, pois h infinitas frequncias (modos) que entrariam nessa soma. Na prtica, o que feito estabelecer-se uma frequncia de corte. Dessa forma, o que se obtem um limite inferior para a densidade de energia do vcuo. O problema que qualquer valor razovel para a frequncia de corte resulta em um valor para a densidade de energia do vcuo muito acima do que permitido pelas observaes cosmolgicas. Presso de CasimirExistem efeitos passveis de observao associados energia do vcuo? Sim, e um exemplo espetacular disso o chamado ``Efeito Casimir''.18O fsico holandes H. B. G. Casimir mostrou que a existncia de flutuaes qunticas do vcuo entre duas placas condutoras, paralelas e separadas por uma distncia d, gera uma fora atrativa por unidade de rea (presso de ponto zero) entre elas igual a [(p2 h/(2p) c)/(240 d4)] = 1,3 10-18 dyne cm2/d4. Esse efeito foi comprovado por Sparnaay em 1957 e mais recentemente por Lamoreaux (1997) que obteve uma excelente concordncia experimental com a teoria.Como dissemos acima, em geral podemos redefinir a energia do vcuo atravs de uma constante aditiva. Contudo, isso no possvel quando lidamos com a gravitao. Segundo a relatividade geral a gravitao sensvel a toda forma de energia, inclusive a do vcuo. apenas no contexto da gravitao descrita pela relatividade geral que podemos atribuir um valor ou significado absoluto energia do vcuo. Pode-se mostrar que a condio de que o estado de vcuo seja independente do observador inercial implica em que sua contribuio gravidade tenha a mesma forma que a de uma constante cosmolgica. Assim, a constante cosmolgica efetiva, isto o L que pode ser observado pelos testes cosmolgicos, a soma de dois termos. O primeiro termo a chamada constante cosmolgica nua, ou seja, um termo nas equaes como o introduzido por Einstein. A segunda contribuio a advinda da densidade de energia do vcuo. O problema que essa contribuio muito, mas muito maior que o limite observacional. H uma discrepncia entre as estimativas tericas e as observaes de um fator da ordem de 10120, ou na melhor das hipteses de 1050 ! Sem dvida, essa a maior divergncia conhecida entre teoria e observao. Isso pode significar, por exemplo, que: 1) Existe uma espcie de cancelamento (ou quase cancelamento) milagroso entre a constante cosmolgica nua e a densidade de energia do vcuo. Esse extremo ajuste fino inaceitvel e precisaria ser explicado. 2)Existe alguma simetria ou mecanismo, que ainda no conhecemos, e que leva a um cancelamento da densidade de energia do vcuo. Nesse caso, como as observaes indicam uma expanso acelerada, alguma outra fonte desempenharia o papel de L. 3) possvel ainda que a relatividade geral seja uma teoria incompleta e no descreva adequadamente o efeito gravitacional do vcuo. Como dissemos no incio dessa seo h vrios aspectos do problema ainda pouco compreendidos. De fato, estamos tocando em uma das fronteiras do conhecimento humano, onde concentra-se um grande esforo de pesquisa nos dias atuais. So desafios como esse que podem levar a grandes descobertas e que tornam a atividade cientfica ainda mais estimulante.

6 Outros resultadosComo discutido na seo IV, a evidncia mais forte para uma expanso acelerada vem do fato de que supernovas distantes parecem ser mais tnues do que o esperado em um universo cuja expanso desacelera. Contudo, a histria da cosmologia moderna nos ensina que uma certa dose de cautela sempre saudvel. Assim, antes de tirarmos concluses definitivas sobre a acelerao da expanso, recomendvel nos perguntarmos se no existem outros resultados observacionais independentes que apontam na mesma direo. Como veremos eles existem, parecem robustos, do forte suporte s observaes de supernovas, mas so preliminares no permitindo ainda uma concluso definitiva.Tradicionalmente, e em especial para aqueles que advogam um valor alto para a constante de Hubble, o problema da idade do Universo foi sempre a maior motivao para uma constante cosmolgica no nula. fcil de entender porque um universo com expanso acelerada possui uma idade maior do que outro cuja expanso desacelera. Para isso, consideremos uma galxia distante, cuja distncia hoje seja D. claro que se o Universo est em expanso acelerada, no passado, a velocidade de recesso dessa galxia era menor do que hoje. Portanto, ela leva mais tempo para atingir a separao atual do que levaria se no passado ela tivesse uma velocidade maior ou igual a atual.Os aglomerados globulares so grupos discretos de estrelas, cada qual com cerca de um milho de estrelas e que mantm-se ligados devido a sua mtua ao gravitacional. Existem no halo da nossa galxia cerca de duzentos aglomerados globulares de forma aproximadamente esfrica. Essas estrelas formaram-se em uma mesma poca no passado, e acredita-se que elas sejam as mais antigas na galxia. Uma indicao disso que a abundncia de elementos mais pesados do que o hlio nessas estrelas muito baixa. A observao de estrelas nesses aglomerados, que esto saindo da sequncia principal, permite fazer uma estimativa da idade dos aglomerados globulares. Assim, adicionando-se meio bilho de anos idade dos aglomerados, que seria o tempo gasto para o incio do processo de sua formao, teremos uma estimativa da idade do Universo. As evidncias indicavam at pouco tempo atrs um limite inferior para a idade do Universo de aproximadamente 12,5 bilhes de anos. A maior incerteza, na determinao da idade, advm de possveis erros nas estimativas de distncia dos aglomerados. Em 1997, dados obtidos com o satlite Hipparcos, levaram a uma reviso da distncia dos aglomerados globulares. As novas distncias revelaram-se maiores, o que significa que as estrelas dos aglomerados so intrinsecamente mais brilhantes e portanto mais jovens. Novos clculos indicam 10,5 bilhes de anos como o novo limite inferior para a idade do Universo.

Em cosmologia comum expressarmos a densidade de energia do Universo em unidades de uma densidade crtica, rc = [(3H02)/(8pG)]~ 1,88 10-29 h2 g/cm3, onde G a constante universal da gravitao e h aqui a constante de Hubble em unidades de 100 km/seg Mpc-1. Como discutimos anteriormente, a idade do Universo depende se este expande de forma acelerada (TU maior que H0-1 ) ou no. De uma forma geral, a idade depende dos valores de L (vamos usar aqui a quantidade WL = L /(3H02)), da densidade de energia da matria rm (vamos usar aqui a quantidade Wm = rm / rc) e de sua equao de estado (vamos considerar matria no relativstica tal que a presso possa ser desprezada). Por exemplo, mostra-se que a idade para um universo com L = 0 e Wm = 1 igual a TU = 2/3 H0-1 = 6,5 h-1 bilhes de anos. Portanto esse universo compatvel com a idade mnima descrita acima, se H0 for menor que 62 km/seg Mpc-1. Valores menores de Wm e/ou maiores de WL levam a idades tericas maiores, e podem ser mais confortavelmente compatibilizados com as observaes. Assim, podemos dizer que aps a reviso de distncias feita pelo satlite Hipparcos, o problema da idade deixou de ser uma motivao para L.Existem diversas tcnicas e mtodos para a determinao da quantidade de matria no Universo: mtodos dinmicos, frao de brions em aglomerados de galxias, lentes gravitacionais, emisso de raios X em aglomerados galcticos, abundncia desses aglomerados e sua evoluo, so alguns exemplos. Todos os mtodos, de forma praticamente unnime, indicam baixos valores para o parmetro de densidade (Wm); mais precisamente, os resultados atualmente esto convergindo para Wm = 0,3 0,1. Esses mtodos, contudo, so sensveis apenas matria que se aglomera em escalas de 30 a 50 milhes de parsecs. Isso , eles no possuem a capacidade de detectar uma componente suave, uniformemente distribuda e que no se aglomera nessas escalas, como o caso da constante cosmolgica. Entretanto, como veremos, a compatibilizao de um valor baixo para Wm com observaes recentes de anisotropias da radiao csmica de fundo s possvel se uma componente semelhante a uma constante cosmolgica existir. Em 1964, os rdio-astrnomos americanos Arno Allan Penzias e Robert Woodrow Wilson dos laboratrios Bell, descobriram acidentalmente um excesso de radiao de microondas. Publicaram no Astrophysical Journal em 1965 seus resultados e, no mesmo volume os seus compatriotas R. H. Dicke, P. J. E. Peebles , P. G. Roll e D. T. Wilkison, que estavam montando uma antena para detectar essa radiao , apresentaram a interpretao correta do observado, isto , a de que Penzias e Wilson haviam detectado uma radiao remanescente do incio do Universo.A existncia da RCF j havia sido prevista nos anos 40 pelo fsico russo George Gamov e seus dois estudantes Ralph Asher Alpher e Robert Herman. A caracterstica principal da radiao csmica de fundo que ela uma radiao de corpo negro19cuja temperatura, observada pelo experimento FIRAS a bordo do satlite COBE, 2,725 graus Kelvin. Embora altamente isotrpica a radiao csmica de fundo possui pequenas anisotropias intrnsecas e uma anisotropia dipolar. Essa anisotropia dipolar, da ordem de DT / T ~ 10-3, decorre do movimento da Terra (v ~ 370 km/seg) em relao ao referencial no qual a radia seria isotrpica. Como veremos, das anisotropias intrnsecas da radiao csmica de fundo, que so da ordem de DT / T ~ 10-5, muita informao pode ser extraida.

Mas qual exatamente a origem dessa radiao ? claro que se o Universo expande-se, no passado as galxias estavam mais prximas umas das outras do que elas esto hoje. O raio do Universo diminui quando voltamos no tempo, a sua densidade aumenta e ele torna-se mais quente. Poderamos voltar no tempo at uma poca em que as partculas que constituem o Universo estivessem to prximas umas das outras que a prpria noo de galxia perderia sentido. Voltemos ento at a poca em que a matria no Universo estava na forma de um plasma de hidrognio, isto , havia eltrons, prtons, alguns nucleos leves mas no tomos de hidrognio. Havia tambm ftons que interagiam fortemente com os eltrons atravs do espalhamento Compton. O livre caminho mdio dos ftons era muito pequeno, de tal forma que se pudssemos olhar o Universo naquela poca, seria como se estivessemos olhando-o atravs de uma densa neblina. Os eltrons quando tentavam combinar-se com os prtons para formar tomos de hidrognio, eram sempre impedidos por ftons de alta energia (E > 13,6 eV). Quando a temperatura do Universo, que cai devido a expanso, chega a aproximadamente3 000 graus Kelvin, isto , quando a idade do Universo era de aproximadamente 300 000 anos, os ftons no possuem mais energia suficiente para manter o hidrognio ionizado. Formam-se ento tomos neutros e os ftons seguem, a partir da, livres, sem interagir com a matria. Essa poca chamada de recombinao e a regio da qual os ftons seguem livres chamada de superfcie de ltimo espalhamento. So esses ftons, que seguem praticamente livres aps a recombinao, que constituem a radiao csmica de fundo detectada pela primeira vez por Penzias e Wilson.O importante que os ftons, eltrons e prtons, antes da recombinao, estavam fortemente acoplados formando portanto, efetivamente, um nico fluido. Assim, os ftons aps desacoplarem carregam com eles a informao de como era o Universo quela poca. A existncia de inomogeneidades no fluido csmico naquela poca, ir imprimir pequenas anisotropias na radiao csmica de fundo, isto , ela no ser perfeitamente uniforme mas existiro pequenas variaes em sua temperatura. De l para c a radiao csmica de fundo apenas esfria devido a expanso do Universo, mas, se nenhum outro efeito as apagou, as anisotropias permanecem.20A coleta, processamento e anlise dessas anisotropias um trabalho de grande dificuldade e que envolve hoje centenas de pessoas em todo o mundo. Esse trabalho trar, em um futuro prximo, informaes preciosas sobre diversos parmetros cosmolgicos. Nesse momento, o parmetro sobre o qual recai grande ateno a curvatura do Universo. A razo desse interesse que hoje existem resultados que, embora preliminares, j permitem inferir algo sobre a topologia do Universo. De acordo com o modelo padro da cosmologia o Universo pode ser espacialmente plano, esfrico (fechado) ou pseudo-esfrico (aberto). Usando a notao introduzida anteriormente, teremos para um universo espacialmente plano Wm + WL = 1. Para um universo fechado Wm + WL > 1 e para um aberto Wm + WL < 1.Como a radiao csmica de fundo pode nos dar essa informao ? Em geral uma flutuao no espao, como por exemplo a da temperatura da radiao csmica de fundo, pode ser descrita atravs de uma superposio de modos normais. No espao plano, podemos decompor a flutuaao em ondas planas, tendo cada qual um comprimento de onda l. Como as flutuaes de temperatura so muito pequenas (DT / T ~ 10-5), mostra-se que os modos evoluem de forma independente uns dos outros e podem ser estudados separadamente. Os modos com grandes l evoluem pouco. Isso se d porue a microfsica s pode atuar em escalas menores que o horizonte.21Assim, quando se observa anisotropias em grandes escalas angulares, de fato est se observando as anisotropias primordiais, isto aquelas originadas bem no incio do Universo e sobre as quais a ao de processos fsicos ainda no se fez presente. J as escalas menores que o horizonte na poca da recombinao sofrem a ao de duas foras. Por um lado, a gravidade que tende a aumentar a flutuao , e, por outro, a presso da radiao que se ope a isso. O resultado que a flutuao oscila. Cada modo (comprimento de onda) entra no horizonte em instantes distintos, e portanto inicia a oscilao em instantes diferentes. Alm disso, a fase e o perodo de oscilao tambm so distintos. No instante da recombinao, o modo que atingir o mximo de sua amplitude contribuir para uma mxima anisotropia. Um outro modo que ainda no chegou ao mximo ou cujo mximo tenha ocorrido um pouco antes dar uma contribuio menor. Assim, o espectro da perturbao como funo da escala angular (q@ comprimento de onda / distncia superfcie de ltimo espalhamento) apresentar um conjunto de mximos e mnimos. Mostra-se que o valor do comprimento de onda do modo cuja contribuio mxima independente de modelo cosmolgico. Essencialmente ele s depende da velocidade do som no fluido csmico na poca da recombinao. Contudo, a distncia superfcie de ltimo espalhamento depende da curvatura espacial. Por exemplo, a curvatura espacial nos modelos abertos tende a convergir as trajetrias dos ftons que deixam a superfcie de ltimo espalhamento em seu caminho at ns. Assim veremos o mximo das anisotropias em uma escala angular menor do que em um universo sem curvatura espacial. Portanto, a localizao do primeiro pico do espectro, por exemplo, pode nos dar informaes preciosas sobre a curvatura espacial do Universo. Medidas recentes de anisotropias da radiao csmica de fundo indicam que o Universo aproximadamente plano (sem curvatura espacial), isto , Wm + WL@ 1. Como dissemos, quase todos os mtodos de determinao de Wm indicam, Wm~ 0,3. Assim, quando combinamos esse resultado com aquele obtido pela anlise das anisotropias da radiao csmica de fundo (Wm + WL@ 1) obtemos que WL~ 0,7. Isso, se confirmado por novas anlises, simplesmente espetacular! Ele est em excelente acordo com os resultados de supernovas, totalmente independente deles, com possveis erros sistemticos completamente distintos e mais uma indicao da existncia de uma constante cosmolgica.

7 ConclusoNesse final de sculo, comea a formar-se, entre os cosmlogos, um consenso de que vivemos em um Universo com curvatura espacial aproximadamente nula, com baixa densidade de matria (Wm~ 0,3) e que possui uma componente com presso negativa, uniformemente distribuda, que contribui com WL~ 0,7 para a densidade total de energia. Pouco sabemos sobre a natureza dessa componente, e acreditamos que futuros avanos dependem de novas observaes, bem como de uma compreenso mais profunda de fsica fundamental. As consequncias de uma expanso acelerada para o futuro do Universo so intrigantes. Por exemplo, se de fato uma constante cosmolgica domina a expanso, o nmero de objetos dentro do nosso horizonte diminuir com o tempo. Devido a expanso acelerada o raio do horizonte cresce mais lentamente do que a distncia prpria de galxias distantes. Ftons emitidos em uma galxia distante e que viajam em nossa direo , percorrem em um certo intervalo de tempo, uma distncia menor do que de quanto aumenta a nossa distncia at eles nesse intervalo de tempo. Assim, eles efetivamente afastam-se de ns e nunca chegaro at ns se a expanso continuar a acelerar. Portanto, galxias que hoje encontram-se dentro do nosso horizonte e de onde recebemos ftons que so detectados com nossos telescpios, no sero mais acessveis no futuro e deixaro de ser vistas. Alm disso, caso se confirmem os resultados atuais, de que uma constante cosmolgica realmente domina a expanso, o Universo ir expandir-se para sempre e no ocorrer um recolapso no futuro. Contudo, deve-se deixar claro que existem outras possibilidades tericas compatveis com os dados atuais. H modelos que sugerem que esta fase de acelerao passageira, e que no futuro entraremos novamente em uma fase em que a expanso desacelera. Dessa forma a prpria possibilidade de um recolapso no futuro no est ainda definitivamente descartada.O sculo XX viu nascer e desenvolver-se a cosmologia moderna. Podemos afirmar que hoje a cosmologia uma cincia madura, que comea a entrar em uma era de preciso. Importantes mapeamentos do cu como o ``2DF'' e o ``Sloan Sky Digital Survey'' (que far o levantamento de um milho de desvios para o vermelho de galxias) j esto em funcionamento. Novos dados de sne Ia devem tornar-se pblicos em breve, o que nos permitir obter resultados mais significativos do ponto de vista estatstico. J se fala de um telescpio totalmente dedicado descoberta de novas sne Ia. As tcnicas desenvolvidas nos ltimos anos, em que a distribuio de massa de aglomerados galcticos obtida via o efeito fraco de lentes gravitacionais, esto sendo aplicadas com sucesso e essa rea est em franco desenvolvimento. Em alguns anos os satlites MAP e PLANCK nos enviaro dados de anisotropias da radiao csmica de fundo que permitiro a determinao de parmetros cosmolgicos com uma preciso sem precedentes. Isso sem falar em outras observaes, como de ondas gravitacionais, micro lenteamento (``microlensing''), possvel deteco direta de matria escura no halo da galxia etc. Enfim, o prximo sculo promete uma intensa atividade na rea. A aventura est apenas comeando!