a educaÇÃo continuada e (a) capacitaÇÃo gerencial: … · 2019-02-22 · key words: continuing...

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A EDUCAÇÃO CONTINUADA E (A) CAPACITAÇÃO GERENCIAL: DISCUSSÃO DE UMA EXPERIÊNCIA Maria Ester Menegasso * José Francisco Salm ** RESUMO Este artigo discute uma experiência de capacitação gerencial projetada como educação continuada, realizada em uma empresa bancária que, no período de 1995 a 1999, passou por um processo de mudança organizacional. A experiência merece destaque por estar inserida no contexto de mudanças da empresa, por utilizar aulas presenciais com preparação prévia à distância e, também, por ser uma experiência utilizada como laboratório para pesquisa, já incluído no projeto inicial. PALAVRAS-CHAVE: Educação continuada, capacitação gerencial, mudança e ser humano. ABSTRACT This article discusses an experience of management development designed as continuing education. The experience was carried out by a bank that went through a process of organizational change in the period between 1995 and 1999. This experience deserves to be highlighted because it is inserted in the context of the organizational change and, because it was based on supervised classes with previous long distance preparation. It is also relevant because it was also used as research laboratory, according to a previous design. KEY WORDS: Continuing education, management development, change, human being. 1. INTRODUÇÃO Estudos sobre inovação e mudança nas organizações indicam ser necessário analisar o meio ambiente em que elas estão inseridas, bem como o espaço interno em que se articulam e adquirem forma. O meio ambiente se constitui em arena na qual as organizações exercem sua influência e são submetidas, conforme os dizeres de Simon (1971), ao exercício da racionalidade limitada. Já no espaço interno, toma forma a dominação, identificada por Weber (1944) como elemento necessário à administração dos negócios. Também fazem parte desse espaço a tecnologia e a estrutura, dois elementos essenciais para o funcionamento das organizações. Mais importante, contudo, é o ser humano, já que permeia o meio ambiente e o espaço interno das organizações. Ele se constitui, portanto, no elo central de qualquer processo de mudança que for gerado a partir das pressões externas sobre a organização. Assim, é necessário entender como as pessoas mudam ou são mudadas; ainda mais importante é compreender como elas percebem a necessidade da mudança ou como elas aprendem sobre a necessidade de * Doutora. Professora do Curso de Graduação em Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação do EPS da Universidade Federal de Santa Catarina. ** PhD em Administração. Professor do Departamento de Ciências da Administração e do Programa de Pós- Graduação do EPS da Universidade Federal de Santa Catarina. 0111 C.1.1

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A EDUCAÇÃO CONTINUADA E (A) CAPACITAÇÃO GERENCIAL:DISCUSSÃO DE UMA EXPERIÊNCIA

Maria Ester Menegasso *José Francisco Salm **

RESUMOEste artigo discute uma experiência de capacitação gerencial projetada como educação continuada, realizada em umaempresa bancária que, no período de 1995 a 1999, passou por um processo de mudança organizacional. A experiênciamerece destaque por estar inserida no contexto de mudanças da empresa, por utilizar aulas presenciais com preparaçãoprévia à distância e, também, por ser uma experiência utilizada como laboratório para pesquisa, já incluído no projetoinicial.

PALAVRAS-CHAVE: Educação continuada, capacitação gerencial, mudança e ser humano.

ABSTRACTThis article discusses an experience of management development designed as continuing education. The experience wascarried out by a bank that went through a process of organizational change in the period between 1995 and 1999. Thisexperience deserves to be highlighted because it is inserted in the context of the organizational change and, because it wasbased on supervised classes with previous long distance preparation. It is also relevant because it was also used as researchlaboratory, according to a previous design.

KEY WORDS: Continuing education, management development, change, human being.

1. INTRODUÇÃO

Estudos sobre inovação e mudança nasorganizações indicam ser necessário analisaro meio ambiente em que elas estão inseridas,bem como o espaço interno em que searticulam e adquirem forma. O meio ambientese constitui em arena na qual as organizaçõesexercem sua influência e são submetidas,conforme os dizeres de Simon (1971), aoexercício da racionalidade limitada. Já noespaço interno, toma forma a dominação,identificada por Weber (1944) como elementonecessário à administração dos negócios.Também fazem parte desse espaço a

tecnologia e a estrutura, dois elementosessenciais para o funcionamento dasorganizações.

Mais importante, contudo, é o ser humano,já que permeia o meio ambiente e o espaçointerno das organizações. Ele se constitui,portanto, no elo central de qualquer processode mudança que for gerado a partir daspressões externas sobre a organização. Assim,é necessário entender como as pessoasmudam ou são mudadas; ainda maisimportante é compreender como elaspercebem a necessidade da mudança oucomo elas aprendem sobre a necessidade de

* Doutora. Professora do Curso de Graduação em Serviço Social e do Programa de Pós-Graduação do EPS daUniversidade Federal de Santa Catarina.

** PhD em Administração. Professor do Departamento de Ciências da Administração e do Programa de Pós-Graduação do EPS da Universidade Federal de Santa Catarina.

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mudar. Sob este prisma, é essencial que sediscuta como educar as pessoas para amudança ou como elas se educam para amudança. Esta discussão, porém, não écompleta se não for levada em conta amudança permanente e contínua a que se estásujeito atualmente, em face das profundastransformações pelas quais se está passando.Logo, para que a educação levada a efeitodentro do espaço organizacional se conformeà mudança permanente, é necessário que essaeducação seja continuada.

A discussão da experiência de educaçãocontinuada relatada ao longo deste texto serefere ao •desenvolvimento de um projeto decapacitação gerencial realizado junto aosfuncionários sem curso superior de umainstituição bancária, no período de 1995 a1999. Se partimos do pressuposto de queatualmente a capacitação gerencialcorresponde, também, à necessidade deeducação continuada, estaremos diante de umfato complexo que requer maioraprofundamento e qualificações frente aomarco de uma realidade que sensivelmentese modifica a cada momento. Esta realidade,em que o modelo de organização do trabalhocomeça a tomar uma forma diferente daquelado passado (inclusive do passado recente),exige novas formas de abordagem dasquestões que dizem respeito à educação.Nessa perspectiva, a educação continuada seidentifica com a trajetória de vida pessoal eprofissional, que remete à necessidade deconstrução de patamares cada vez maisavançados de ser e de saber-fazer.

Neste artigo, discute-se a educaçãocontinuada por meio do relato de algumasexperiências desenvolvidas em umaorganização bancária que, em convênio comuma instituição de ensino superior,desenvolveu um projeto de capacitaçãogerencial. Também se discute a educaçãocontinuada sob a perspectiva das políticas derecursos humanos em organizações

empresariais.

O texto apresenta, em primeiro lugar, atematização e a importância da capacitaçãogerencial como educação continuada nocontexto das organizações empresariais. Aseguir, vêm os antecedentes da experiência,quando se mostra em que contexto aorganização opta pelo desenvolvimento doprojeto de capacitação gerencial. Depois, natrajetória e delineamento do projeto,descrevem-se a metodologia aplicada e o seureferencial programático. Seguem-se osresultados de uma pesquisa de avaliação doprojeto de capacitação. Finaliza-se com umabreve análise dos resultados da pesquisa.

2. EDUCAÇÃO CONTINUADA E ASORGANIZAÇÕES

Este novo milênio está marcado pela explosãotecnológica que alcançou todos os setores davida humana. É inegável que cada vez mais astecnologias permeiam as ações e atividadescotidianas. Elas alteram a cultura social, omodo de viver, de se relacionar, de aprendere ensinar. Por outro lado, o modo de produçãode hoje requer informações rápidas, exigindodas pessoas formação sempre atualizada, semo que não será possível entender eacompanhar as mudanças a quediuturnamente se está sujeito. Além do mais,"as invenções usualmente precisam de umaforça de trabalho bem educada para absorvera tecnologia e adquirir as habilidadesnecessárias para empregá-las" (Thurow, 1999,p.111).

Neste caso, as tradicionais salas de aulaprecisam ser transformadas em "laboratóriosde experimentação", completando aaprendizagem propiciada pelas organizações,nos programas de treinamento realizados nolocal de trabalho (Sauaia, 1997).

Daí a relevância de considerar-se a idéia que

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muitos pesquisadores vêm chamando deorganização em aprendizagem, entendidacomo a capacidade das organizações "emcriar, adquirir e transferir conhecimentos e emmodificar seus comportamentos para refletirestes novos conhecimentos e insights" (Garvin,1994, p.80).

Contudo, o estudo e a análise de muitosprogramas de formação de recursos humanosnas empresa, levam a crer que pouco se fezpara o desenvolvimento de novasmetodologias para capacitar o trabalhador aenfrentar as novas situações. Mesmo com asnovas tecnologias, os métodos são similaresàqueles que já estão sendo praticados háalguns anos (Bassi, 1997). De fato, muito setem feito para que o empregado saiba fazer atarefa, porém pouco se tem feito para que elesaiba refletir criticamente sobre ela.

Por seu turno, o surgimento de novastecnologias baseadas no computador e naautomação cada vez maior da produção, porsi só, não mudaram a realidade do arranjoorganizacional nestes últimos quarenta anos.As empresas continuam a utilizar-se dosmesmos métodos de qualificação dotrabalhador e pouco têm mudado com relaçãoa seus programas de formação. De fato, amaioria desses programas ainda procuratransformar os trabalhadores em merosreceptores de informações ou dóceis entescomportamentais (Ramos, 1983). Resta notarque o treinamento tecnológico oferecido pormuitas empresas enfatiza o uso doequipamento, ou seja, o trabalhador aprendea apertar os botões e não a tomar decisões eresolver problemas. O processo deaprendizado fica no campo dos objetos e dasações, porém não são criadas condições paraque se desenvolva uma habilidade intelectuale se entenda o que se faz e porque se faz.Não é de admirar, pois, que muitos métodosde ensino utilizados pelas empresasmantenham o trabalhador em uma situaçãopassiva e receptora de informações que não

estimulam o diálogo e a participação, tãonecessários para a transformação do espaçode produção. Portanto, inúmeros programasde treinamento podem não ser maisadequados ao momento em que vive aempresa.

Por outro lado, muitos dirigentes de empresassentem-se desconfortáveis com estaambigüidade, passando a procurar soluçõespara os problemas de capacitação de pessoalvia educação continuada. Surge, assim, anecessidade do desenvolvimento demetodologias e ferramentas de aprendizagempara atender às novas demandas que asempresas estão enfrentando, tanto aquelasrelacionadas com as políticas e osprocedimentos da empresa quanto aquelasque dizem respeito à qualificação dotrabalhador. Assim, é preciso repensar osprogramas de treinamento para transformar olocal de trabalho em um ambiente deaprendizagem, redefinindo os papéis dostrabalhadores de forma que eles se tornemparceiros na criação deste ambiente e demodo a incluir nesse espaço o ser humano nasua totalidade. A educação continuada podeser um dos meios para se processar estatransformação dentro da organização.

3. OS ANTECEDENTES DA EXPERIÊNCIA

A organização cuja experiência de educaçãocontinuada aqui se relata desenvolveu umprograma de mudanças intitulado "Programapara a Excelência Empresarial". Esse programatinha o seu foco nas pessoas, já que são elasque buscam o sucesso dos negócios. Naformulação do programa, figurava comopropósito o fortalecimento da empresa e a suaadaptação ao quadro de mudança daqueleperíodo. Estabeleceram-se, à época, asseguintes diretrizes estratégicas básicas: acapitalização da empresa, a ampliação dosnegócios, a redução dos custos e amodernização empresarial. A partir destas

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diretrizes, foi desenvolvido o Projeto deCapacitação Gerencial, como um instrumento,sob a forma de educação continuada, voltadopara a mudança .

O "Programa para a Excelência Empresarial"era composto por vários projetos e ações, cujopropósito central era transformar a empresa,orientando-a para resultados, transformando-a numa instituição ágil e competitiva. O estilogerencial que sustentava a proposta tinhacomo principal característica a obsessão porresultados e uma profunda convicção arespeito da capacidade e da vontade que aspessoas e as equipes formadas por elas têmde empreender e buscar o sucesso. Com basenessa concepção, o programa de mudançaapresentava-se como um instrumento detransformação da empresa, capaz de orientá-la no turbulento cenário de mudanças em quese situava o setor. Sua implementação contoucom a assessoria de instituições de renomenacional, tanto de consultoria quanto deensino.

Para os propósitos deste texto, não cabeaprofundar a descrição do Programa para aExcelência Empresarial; cabe, porém, alertarpara o fato de que a instituição encontrava-seem um processo amplo e profundo dereestruturação, por intermédio do qual sebuscava um novo estilo de gestão, direcionadopara o trabalho empreendedor, criativo eparticipativo, capaz de enfrentar os desafiosque eram impostos pela incerteza einstabilidade de toda ordem que se vivianaquele momento. Por essa razão, e emdecorrência das diretrizes do Programa,desenvolveu-se um projeto amplo direcionadoà capacitação gerencial entendida comoeducação continuada. Desta forma,estruturaram-se os cursos de Gestão eEstratégia Empresarial e de CapacitaçãoGerencial, dos quais participaram 695funcionários da gerência média e superior daempresa. Essas experiências de educaçãocontinuada buscavam conscientizar os

gerentes sobre o momento atual, bem comosobre a necessidade de se prepararem para oenfrentamento do futuro. No plano individual,esses cursos procuravam conscientizar os seusparticipantes para a necessidade de irem embusca de sua empregabilidade.

4. A TRAJETÓRIA E O DELINEAMENTO DOPROJETO

O Curso de Capacitação Gerencial foidestinado aos gerentes de unidadesoperacionais e teve uma carga horária totalde 450 horas/aula, dele participando 620gerentes. O Curso de Gestão e EstratégiaEmpresarial foi destinado a 75 chefes dedivisão e assessores, com carga total de 360horas. Para os propósitos deste texto, a ênfaseestará concentrada no primeiro projeto.

A realização dos projetos contou com aparticipação das Diretorias de RecursosHumanos e de Planejamento da empresa e,também, com a colaboração de umauniversidade local. O Curso de CapacitaçãoGerencial foi estruturado com base nocurrículo mínimo de um curso de graduaçãoem administração, com adaptação aodesenvolvimento gerencial, atendendo àsnecessidades de conteúdo e escolaridade dosparticipantes. A ênfase sempre era dirigida aoprocesso de mudança pelo qual passava aempresa.

Sendo um curso de capacitação gerencial,constitui-se em instrumento de aprendizagemindividual e organizacional, além de ser umaoportunidade de retorno aos estudos paracada gerente que dele participou. É necessáriorelembrar que participavam do curso apenasgerentes sem curso superior, sendo que oobjetivo principal era levar ao gerente umconjunto de técnicas gerenciais e deconhecimentos humanos, tanto aquelesrelativos à fundamentação conceitua! quantoos que dizem respeito à instrumentação

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operacional. Outra finalidade, era alcançar, odespertar do entusiasmo, a integração, e aconscientização dos participantes com relaçãoàs novas realidades do ambiente dos negóciosbancários no Brasil e às posturas e práticas domodelo de transformação empresarial emimplementação na organização.

Ingressaram no Curso de CapacitaçãoGerencial 620 (seiscentos e vinte) gerentes semcurso superior, organizados em 19 (dezenove)turmas, distribuídas entre as 10 (dez) regiõesem que o Banco dividiu o Estado. Essaestratégia foi adotada pelo fato de que aempresa atua de forma descentralizada.

Em todas as turmas, a primeira semana foidedicada às atividades de dinâmica de grupo.Buscava-se sensibilizar os participantes doCurso para entenderem o Programa e, aomesmo tempo, integrá-los ao grupo. Estaintegração se fez necessária uma vez quealguns gerentes, embora tivessem mais de 10anos de empresa, não se conheciam mais deperto.

A carga horária das 15 disciplinas quecompuseram o curso foi dimensionada paraaulas presenciais. Estas foram ministradas emforma de módulos concentrados de 30 horas/aula, num período de três dias letivos, àsquintas, às sextas e aos sábados, pela manhãe à tarde, uma semana por mês, ao longo de18 meses. As demais semanas do mês foramutilizadas pelos participantes na realização dastarefas e dos estudos complementares àdisciplina. No período dos 18 meses estãoincluídos três meses de férias escolares.

A seleção dos professores que ministraramdisciplinas no Curso foi muito criteriosa. Assim,65% dos professores do Curso eram doutorese 35% deles eram mestres. A seleção dosprofessores se fez levando em conta oconhecimento que possuem da teoria e daprática da gestão e da administraçãoempresarial. Partia-se do princípio de que o

professor deveria saber levar para a práticaaquilo que ensinava na aula. A época, sópoucas, entre as melhores universidades,possuíam um corpo de professores com talqualificação. Aliás, nenhum dos alunos doCurso tivera aulas com professores com talformação acadêmica e experiênciaprofissional.

A estrutura curricular do curso era compostapelas seguintes disciplinas: Cultura geral eempresarial; Teoria geral das organizações; Adinâmica das organizações e da gestão; Gestãode pessoas e administração de conflitos;Qualidade do atendimento a clientes;Administração contábil-financeira;Administração da produção e estoques;Comércio exterior; Elementos estatísticos;Marketing de serviços; Introdução àengenharia econômica; Mercado financeiro ede capitais; Política econômica; Planejamentoe tomada de decisão e Mudança e transiçãoorganizacional.

Os programas das disciplinas privilegiaram oaspecto teórico e conceituai e técnico-operativo dos temas, que eram apresentadospresencialmente. No desenvolvimento daprogramação foi utilizada uma combinação detécnicas de ensino. As atividades prévias aoencontro foram realizadas em regime tutoriala distância, exigindo do aluno leitura de textos,levantamento de problemas mediante estudode caso, solução de problemas ou outrasatividades que a criatividade do docentepermitiu estimular.

Foram tomadas medidas no sentido de que omaterial de leitura fosse entregue previamenteao participante, de modo que ele pudesserealizar as tarefas propostas e apresentá-las nomomento presencial. Esse material foiacompanhado por texto redigido peloprofessor, explicitando o objetivo da tarefa,isto é, o resultado que dela se esperava, atarefa em si e como seu produto seriatrabalhado no momento presencial. É

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importante mencionar que estesprocedimentos levaram o participante doCurso a construir a desenvolver referenciais econceitos, além de exercitar a reflexão,atributos essenciais para o programa demudança da empresa e para a compreensãoda estratégia do negócio. É preciso chamar aatenção para o fato de se estar promovendo

desenvolvimento intelectual do cursista,além de prepará-lo para a mudança queocorria na empresa.

Ao final de cada disciplina, foram realizadasavaliações com base nos assuntos ministrados

nos textos que eventualmente haviam sidoindicados para leitura complementar àmatéria. Normalmente foram realizadasavaliações com a utilização de trabalhosescritos, envolvendo a teoria ministrada emsala de aula em confronto com a prática diáriado gerente, principalmente nos aspectosassociados com os projetos de mudança.Assim, os participantes foram avaliados pelosprofessores, obedecendo os seguintes critérios:realização das tarefas propostas, engajamento

qualidade da participação nos debates eexercícios em sala de aula.

A 19 disciplina foi Mudança e transiçãoorganizacional. Nela discutiu-se, em primeirolugar, a temática da mudança e datransformação em organizações. Em seguida,foi realizado um trabalho escrito sobre acontribuição de cada uma das disciplinas paraa solução de questões relevantes quepudessem afetar o programa de mudança daempresa. Este trabalho foi realizado em grupo,a partir de um roteiro previamente definido.A elaboração do trabalho escrito ocorreu aolongo de dois dias, sob a orientação de doisprofessores. A partir da correlação que osalunos fizeram entre a base teórica, a realidadeinstitucional e as experiências dosparticipantes, foi possível extrair inferências econtribuições para a solução de problemasrelativos à atividade gerencial, bem comoindicar novas estratégias de ação para o

programa de mudanças que estava ocorrendona empresa.

O trabalho final foi apresentado oralmentepelos grupos, precedido pela entrega dodocumento escrito, em duas vias, sendo umapara o professor e a outra para a empresa.Cada grupo teve uma hora para a apresentaçãodo trabalho aos colegas, professores e diretoresou superintendes das regionais. Após aapresentação, ocorria a discussão sobre asconclusões apresentadas por cada grupo.

Evidentemente, este não é o espaço adequadopara se aprofundar a análise das informaçõescoletadas no decorrer da elaboração destestrabalhos, nem mesmo cansar o leitor comtecnicidades que extrapolariam o propósitodeste texto. Pretende-se, apenas, mostrar maisuma característica que distingue este programade desenvolvimento de competências,legitimando-o como uma ação de educaçãocontinuada. Este procedimento fez osparticipantes refletirem em conjunto sobre aempresa, sobre seu programa de mudança,pensarem os seus problemas e investiremprofundamente em seus estudos. Nada além,portanto, do que deve ser a educaçãocontinuada, principalmente para adultos quedeixaram de freqüentar a sala de aula, emboradeva-se considerar que pudessem aprendercom o processo de viver.

À medida que cada uma das 19 turmasconcluía o Curso, realizava-se uma cerimôniade formatura. A área de comunicação emarketing da empresa organizou esses eventoscomo solenidades oficiais, convidando emcada região as autoridades locais. Ascerimônias das dezenove turmas, realizadasem cada região, contaram também com aparticipação do Presidente e da Diretoria daempresa, dos familiares dos cursistas, dosprofessores e do representante dauniversidade.

As solenidades foram realizadas em clubes ou

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auditórios, na região em que havia se realizadoo Curso. Esses eventos constituíram-se emencontros de famílias e amigos dos formandos.Os formandos escolheram paraninfos, fizeramdiscursos, prestaram homenagens especiais aprofessores, familiares e amigos. A ocasião setransformou num verdadeiro evento deconfraternização, com expressões de muitaalegria e emoção. No planejamento dosCursos, foi previsto esse evento, já que a suarealização poderia servir de estímulo para oprosseguimento dos estudos.

5. A PESQUISA DE AVALIAÇÃO DOPROJETO

No decorrer do desenvolvimento deste projetode educação continuada, houve por parte dacoordenação um esforço sistemático deacompanhamento dos resultados deaprendizagem e da satisfação demonstradapelos cursistas. Para tanto, foi elaborado umprojeto de pesquisa cientificamenteestruturado. É importante mencionar que, aofinal de cada uma das disciplinas, era aplicadoum questionário de avaliação. Esseinstrumento de avaliação serviu como umcanal de comunicação escrita entre acoordenação geral do projeto, os professores,os cursistas e a direção da empresa. O espaçodestinado às sugestões ou comentários semprefoi utilizado pelos participantes do Curso paramanifestarem suas opiniões sobre o Curso.Com base nessas manifestações a coordenaçãodo Curso promovia os ajustes que se fizessemnecessários.

Nessa pesquisa de avaliação, constatou-se queo projeto, no seu desenvolvimento, além decontribuir para a elevação do nível culturaldos participantes, proporcionou bases para aimplantação dos demais projetos de mudançada empresa.

Alguns dos depoimentos transcritos pelosgerentes nos questionários comprovam esta

afirmação. Assim, um gerente afirmou que oCurso "Estava abrindo a cabeça de todos paraas mudanças que estão sendo necessárias paraa sobrevivência da nossa empresa/emprego."Outro concluiu que, "para a implantação deum programa de modernização empresariale complexo, há necessidade de uma mudançade nossos administradores, com relação àvisão, qualificação, modernização ecompetitividade, pois o projeto em si está todointerligado, não dá para implantar um projetoou processo se não se muda a maneira daspessoas pensarem e agirem."

Ainda outros depoimentos dos cursistasatestaram a satisfação com os resultadosalcançados:"Nunca se fez tanto em termos de educação

e treinamento, foi uma das melhores coisasque 'fiz por mim' e pela empresa, muito maispor mim. Foi excelente.""Nunca vi na empresa durante toda a minha

vida os gerentes e escriturários tão motivadose envolvidos nesta nova caminhada, sendoque minha vontade é que não temos o direitode deixar isto parar.""Foi como renascer... Como estou há tempo

fora de uma escola, me senti novamente "vivo"e apto a receber esta nova bagagem."

As manifestações dos participantes sobre acontribuição do Curso de CapacitaçãoGerencial, como programa de educaçãocontinuada, pode ser resumida da seguintemaneira:

Contribuiu para o enriquecimentocultural do corpo de profissionais da empresa,diante da conjuntura e de um mundo emprofundas mudanças;

Contribuiu para a formação deconhecimentos voltados ao processo detransformação pelo qual a empresa vinhapassando, principalmente nos aspectosrelativos às ações por resultados e pararesultados;

Proporcionou conhecimentos teórico-filosóficos, que auxiliam a concretização de

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um novo estilo gerencial, fundamentado noprincípio de que o ser humano é o centro datransformação institucional.

A pesquisa também indica que o projetocontribuiu para desenvolver o pensar crítico ecriativo; aprender a aprender com aexperiência; transferir as experiências econhecimentos adquiridos para a equipe edespertar para a necessidade de gerenciar opróprio desenvolvimento profissional e aempregabilidade.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em uma época na qual a capacitação gerencialnecessita ser entendida como educaçãocontinuada, conforme se pode atestar pelaprioridade que este assunto tem na agendados seminários, debates e encontros sobrerecursos humanos, faz-se necessário, também,repensar o conceito que se tem do ser humanono espaço das organizações. De nada adiantafalar-se de educação continuada se não houveruma nova percepção do que é ser gente e doque é educação continuada para sereshumanos.

Vale lembrar que, durante o último século,também se proporcionou educação para aspessoas. Resta saber quais eram ospressupostos dessa educação, se estavamdirecionados ao condicionamento humano eà alienação ou se estimulavam a prática dareflexão sobre a liberdade e criatividadehumana. Este é, sem dúvida, um momentopara se pensar sobre o que queremos emtermos de educação continuada nas empresas,principalmente no que se refere à capacitaçãogerencial, se as pessoas devem continuar a sertreinadas e educadas como no passado ou sedevemos proporcionar-lhes os meiosnecessários para que elas tenham a consciênciadas grandes transformações pelas quais omundo está passando.

Por outro lado, as empresas têm no seu corpogerencial grande parte da memóriainstitucional. A simples substituição degerentes por empregados mais novos tem-semostrado frustrante em muitas empresas. Aquientra a experiência relatada ao longo destetexto. Todos os gerentes que viveram aexperiência da educação continuada via Cursode Capacitação Gerencial tinham mais de 40anos de idade. Todos estavam empregados naempresa há mais de dez anos e todos haviamterminado não mais do que o primeiro grau,exceto alguns que tinham terminado osegundo grau. Hoje, de acordo com o últimolevantamento a que se teve acesso,aproximadamente 40% dos participantes doCurso freqüentam algum curso superior, alémdaqueles que buscam terminar o segundograu.

O sucesso do Curso de Capacitação Gerencialcomo um programa de educação continuadaficou evidente nos levantamentos da pesquisa.Ele contribuiu para que o Programa deExcelência Empresarial pudesse lograr sucesso,para que os gerentes estivessem maispreparados para o desempenho de suasfunções e, também, para que eles seconscientizassem sobre a necessidade dedesenvolverem a própria empregabilidade.

Houve, porém, um resultado que o Cursoproporcionou e que é maior que todos os jámencionados, já que ele se constitui na pedraangular de qualquer programa de educaçãocontinuada. Este resultado está na consciênciaque os participantes do Curso de CapacitaçãoGerencial desenvolveram de que cada umdeles, muito embora já tivessem mais do que40 anos de vida, poderia voltar a aprenderem programas de educação continuada.Conclui-se que esta consciência foi essencialpara o sucesso do projeto de CapacitaçãoGerencial como um programa de educaçãocontinuada.

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