a definição de camponês - teodor shanin

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    REVISTA NERA ANO 8, N. 7 JULHO/DEZEMBRO DE 2005 ISSN 1806-6755

    Revista NERA Presidente Prudente Ano 8, n. 7 pp. 1-21 Jul./Dez. 2005

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    A definio de campons: conceituaes e desconceituaes ovelho e o novo em uma discusso marxista

    Teodor ShaninProfessor doutor da Moscow School of Social and Economic Sciences

    Endereo profissional: Vernadsky Prospekt 82/2, 117571, Moscow, Russia

    Telephone: +7-095-564-85-82/Fax: +7-095-434-75-47Website: http://www.msses.ru

    Para um amigo, dolorosamente perdido.A Declinatio Rustica alem do sculo XIII tinha seis declinaes para a

    palavra campons vilo, rstico, demnio, ladro, bandido e saqueador; eno plural miserveis, mendigos, mentirosos, vagabundos, escrias e

    infiis.J. Le Goff

    O campesinato no uma classe, mas uma noo.G. Plekhanov

    ...como se fosse uma questo de reconciliao dialtica de conceitos e node compreenso das relaes reais.

    K. Marx

    H razes para definir campons e h razes para deixar indefinida a palavra, umafigura de linguagem fora do domnio onde residem as criteriosas categorias doconhecimento. Tal deciso jamais inconseqente, pois este conceito, se aceito como tal,vincula-se ao prprio mago do pensamento terico sobre a sociedade globalcontempornea e reflete-se em concluses de imediato interesse poltico e analtico. O queimporta so as maneiras com tais palavras so utilizadas.

    Sem dvida, pode-se exagerar as preocupaes com terminologias, desviando-separa um discurso fastidioso, em que longas palavras so usadas para tecer mais palavras,

    ainda mais longas, sem jamais retornar ao mundo dos vivos. Para evit-lo, o pensamentodos cientistas sociais deve sempre mergulhar diretamente nas realidades e nos problemassociais e polticos. Entretanto, de vez em quando, recomenda-se fazer um teste do conceitoou voltar s suas razes epistemolgicas. Para que, agora, o momento propcio para isso,pois por razes s quais retornaremos brevemente, a moda intelectual de estudoscamponeses parece aproximar-se de um novo estgio e de um momento decisivo.

    O campons como mistificao

    Para testar um conceito, convm comear considerando seu contedo, maneiraconsagrada pela hiptese de nulidade da estatstica convencional, isto , iniciar a partirdas razes pelas quais o conceito deveria ser totalmente descartado. Nessa perspectiva, a

    afirmao de validade do conceito, seus vnculos com a realidade, sua consistncia interna,seu marco terico e seus possveis esclarecimentos podem ser rigorosamente examinados.Comecemos por esses comeos, enunciando-os.

    Campons uma mistificao. Para comear, um campons, no existe emnenhum sentido imediato e estritamente especfico. Em qualquer continente, estado ouregio, os assim designados diferem em contedo de maneira to rica quanto o prpriomundo. Dentro da mesma aldeia, o rico e o pobre, o proprietrio de terras e o arrendatrio, ochefe do grupo domstico e um brao contratado rompero, muito freqentemente,qualquer continuidade de gradaes regulares. Tambm a histria acrescenta sua dimenso

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    da diversidade, pois inclusive o mesmo poderia no ser o mesmo em diferentes anos,dcadas e sculos. Uma conceituao mais estrita do contexto social salientar tudo isso eainda mais, pois, tomando alguns exemplos, significados semelhantes podem ser atribudos,a um campons em diferentes perodos e sociedades, seja na Borgonha feudal, no cerradodevastado e queimado da Tanznia, no Punjab mercantilizado de hoje ou na Geziraprodutora de algodo para a indstria. Finalmente, os termos gerais, a-histricos e fora docontexto, costumam odiosamente se transformar em reificaes da realidade ou, o que ainda pior, em manipulaes conscientes p polticos espertos ou acadmicos caadores deprestgio. Eis por que, e como, os camponeses se tornam uma mistificao.

    Tudo isso fatalmente verdadeiro para cada um dos quatro momentos analticosconsiderados. A heterogeneidade dos camponeses indubitvel. Os camponeses nopodem ser, de fato, compreendidos ou mesmo adequadamente descritos sem sua estruturasocietria mais geral; e o mesmo vlido para o contexto histrico (na realidade, apenasanaliticamente possvel dividir o diacrnico e o sincrnico nos fenmenos sociais).Enfim, o termo campons pode ser usado, e tem sido usado, como mistificao.Entretanto, dizer tudo isso apenas limpar o terreno para a discusso das questes centraisque esto em jogo aqui. O que est em pauta a maneira como esse conceito opera noprocesso de conhecimento das sociedades. A definio de campons s pode serentendida dentro desse contexto. Nesses termos, uma hiptese de nulidade serviria paramostrar que a utilizao do conceito de campons torna a realidade social opaca aosnossos olhos ou, pelo menos, em nada contribui para o seu esclarecimento. Se issoacontecer, a concluso mais consistente seria livrar-se deste inadequado termo, para evitaras aflies a que ele nos pode levar. A alternativa, isto , reter a utilizao conceitual decampons, ter que ser esclarecida e definida.

    O atual surto de marxismo acadmico tem exercido papel importante, e cada vezmais significativo, nessas consideraes. Sua globalizao crescente trouxe novamente oscamponeses para o foco das atenes. Novos insights e nova fora no debate tm nosoferecido oportunidade de reconsiderar tanto o pensamento dos estudiosos como associedades. Algumas das argumentaes tem reafirmado e, em certa medida, recolocado ojuzo contra a legitimidade do conceito de campons. Outras tm declarado o oposto. Dentrodo quadro de referncias conceitual marxista est sendo explorada uma problemtica cujarelevncia ser facilmente reconhecida, mesmo fora desse campo. Muitas das posies

    tomadas, concluses oferecidas e dvidas levantadas demarcam as fronteiras e linhas debatalha entre marxistas e no-marxistas.O artigo partir do sentido em que o conceito vem sendo utilizado, considerando a

    maneira como se torna problemtico dentro da recente discusso marxista, para, no fim, pra questo da desconceituao. Persegue, grosso modo, o juzo contra a relevncia doconceito de campons, acima mencionado.

    O campons como generalizao

    Mesmo para indagar sobre o campons com fundamento, necessrio dizer primeirodo que se trata. Mais ainda se quisermos utilizar analiticamente esse conceito. O que sequer dizer com campons? Comecemos pelos estudiosos das sociedades camponesas,

    que tentam generalizar o contedo de suas anlises. A afirmao de Redfield de que asociedade e a cultura camponesa tm algo de genrico em si... (sendo)... uma organizaoda humanidade com semelhanas em todo o mundo e a descrio, de Fei, do camponscomo um modo de vida1 representam bem um sentimento amplamente difundido entre amaioria daqueles que estudam o campons de modo sistemtico e comparativo. Taisintuies no devem ser menosprezadas, pois refletem muitas vezes um conhecimentotcito, enraizado na experincia. Entretanto, podem igualmente representar uma visoprofissional distorcida de camponeslogos. Portanto, para ser mais preciso, a afirmao (ea orientao para qualquer teste potencial) da especificidade do campons pode ser

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    repetitivos, assim como a posio subserviente geral das unidades sociais camponesas,dentro da rede mais ampla de dominao poltica, econmica e cultural.

    Em quinto lugar, pode-se isolar analiticamente uma dinmica social especfica dasociedade camponesa ( claro que, na realidade, a estatstica e a dinmica so indivisveis).Particularmente a reproduo social, isto , a produo das necessidades materiais, areproduo dos atores humanos e do sistema de relaes sociais mostram padresespecficos e genrico dos camponeses. Relevante, aqui, o j referido aprendizadoocupacional dentro da famlia. O ritmo de vida da aldeia e do grupo domstico camponsreflete, nitidamente, os principais ciclos naturais, ou seja, o ano agrcola.

    Finalmente, as causas e os padres fundamentais de mudana estrutural tm sidovistos, mais uma vez, como genricos e especficos dos camponeses. Sem dvida, asteorias de mudana estrutural tm sido corretamente expressas no quadro de referncias,mais amplo que o campesinato, das sociedades nacionais ou dos sistemas internacionais.Ao mesmo tempo, a especificidade camponesa tem sido afirmada a partir da maneira comoas comunidades camponesas reagem a esses processos gerais e como estes nela serefletem. Por exemplo, a comercializao tem resultado, em geral, inicialmente em umestgio de agriculturao do campons, fazendo com que suas tarefas no-agrcolasanteriores sejam assumidas pela produo industrial em massa (enquanto os aldees so,freqentemente, jogados nas redes de explorao de empresas agrcolas capitalistas, devrios tipos). Do outro lado, a coletivizao levou a uma variedade de padresespecificamente camponeses e de ao e reao, por exemplo, os padres diferenciais deproduo no terreno domstico em oposio rea coletiva e seu impacto sobre as atuaisesferas sociais da agricultura.11 Pode-se tambm mencionar, aqui, a recorrente surpresadiante da tenacidade das formas sociais camponesas (o problema do no-desaparecimento) e, mesmo, a recamponesao de algumas reas.

    No h lugar, aqui, para discutir o alcance de dados comparativos, apresentadoscom freqncia suficiente para sustentar essas generalizaes. Passemos diretamente aoque implicam tais generalizaes. Comeando pelas negativas, o uso da generalizaocomo conceito implica obviamente a homogeneidade dos camponeses. Tampouco supeuma separao ntida das categorias reais, do gnero 1:0. Qualquer generalizao, baseadana comparao, assumir a heterogeneidade dos dados, assim como as margens oulimites da ambivalncia conceitual. A primeira acusao contra o campons como uma

    entidade conceitual, na relao acima, ou est longe do fundamental ou pe em dvida aessncia analtica das cincias sociais, e no simplesmente um de seus termos. O statusdecampons, como generalizao, foi bem expresso, em uma recente conferncia de EricWolf, como o de uma sndrome recorrente12, que claramente admite, e de fato necessita, adiversidade (muitas vezes expressas em taxonomias adicionais). A generalizao emprica,enquanto tal, constitui uma parte indispensvel das cincias sociais. Seu perigo reside nopossvel excesso de generalizao, pela extrapolao de semelhanas ou seqnciasconhecidas, simplesmente porque so conhecidas. Disse isso, a prpria existncia deregistros sobre as repetitivas e contundentes semelhanas um ponto que vale a penaconsiderar, e a importncia das generalizaes baseadas na comparao entre oscamponeses. Tm ajudado a enfocar estudos, provocar insights e empregar mtodos depesquisa j testados, assim como desenhar um campo de anlise. Mas no a substituem.

    O florescimento de estudos camponeses, nos anos 60, estava vinculado a novas

    tentativas de definir o campons pela explorao da lgica estrutural subjacente suacamponesidade. Nessa discusso, a ala da antropologia ocidental, que interpretou asinstituies de Redfield e Fei em termos de economia poltica, encontrou e fundiu-se comsetores da histria rural da Europa Ocidental e como os que seguiram a tradio de estudoscamponeses da Europa Oriental, tanto marxistas quanto no-marxistas. O resultado dessesencontros leva a muito mais do que simples generalizaes a partir do emprico, mas demodo geral no oferece uma anlise estrutural plenamente desenvolvida.13

    Um exemplo pode ajudar e, no caso, mais simples usarmos a ns mesmos comobode expiatrio.14 H aproximadamente uma dcada, foi proposto um delineamento dequatro caractersticas do campons, incorporando: a) a propriedade rural familiar como a

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    unidade bsica da organizao econmica e social; b) a agricultura como a principal fontede sobrevivncia; c) a vida em aldeia e a cultura especfica das pequenas comunidadesrurais; d) a situao oprimida, isto , a dominao e explorao dos camponeses porpoderosas foras externas. No discurso, as quatro caractersticas qualificavam a vidacamponesa plenamente desenvolvida, enquanto trs delas a, c e d aplicavam-se avrios grupos analiticamente marginais, por exemplo, os artesos rurais. Isso foi feito paradar coerncia a uma coletnea, estruturando dados comparativos e contribuindo paradesenhar um campo de interesse. At a, tudo bem. Mas o resultado foi exguo em termosde uma anlise sistemtica da lgica estrutural, na raiz da generalizao apresentada. Oque a torna, em muitos pontos, insatisfatria.

    Para comear, os quatro componentes desse delineamento so insuficientes, noporque falte um outro que deva ser acrescentado, mas principalmente por que os vnculosentre esse quatro ficaram sem maiores especificaes. Sem dvida a utilidade da tipologiaest em grande parte sujeita pressuposio implcita de tendncias/padres dedeterminao mtua de seus elementos. Isso explicaria por que podemos facilmente deduzirvrias caractersticas de cada um dos componentes, observado apenas um emprofundidade. Para dar um exemplo, o modo como a agricultura camponesa opera pode nosdizer muito como sobre o carter da comunidade rural, o estabelecimento rural familiarcampons e os padres tpicos de explorao dos produtores de tal sociedade. Entretanto,mesmo uma elaborao desses vnculos ainda no ser suficiente. Hobsbawm salientouque a pressuposio de hierarquias de elementos bsicos de estrutura social umacaracterstica que definem a teorizao social marxista.15 Tais princpios de interpretaoso tambm, de fato, uma parte necessria da maioria dos sistemas tericos. No casoobservado, jamais uma hierarquia de importncia (ou ainda, a suposio de que ela noexista) foi claramente explicitada, o que possibilita interpretaes ambivalentes e/oueclticas.

    Alm disso, ao definir campons como um processo e tipologizar padres demudana, a forma como os diferentes elementos dessa complexa equao se vinculam histria social mais geral ficou relativamente inexplorada (realmente um passo atrs comrelao a uma discusso anterior).16 Por exemplo, no foi sequer considerado o impacto docomrcio internacional e da economia poltica global sobre os rumos bsicos dodesenvolvimento da agricultura camponesa. Observando pelo lado contrrio, o impacto

    das histrias especficas dos camponeses sobre as sociedades, das quais fazem parte, foitotalmente negligenciado.Finalmente, a forma como foi apresentada a problemtica da incorporao societria

    dos camponeses sofre de todas as limitaes essenciais concernentes histria, a que jnos referimos, e s quais pode ser acrescentado um toque de provincianismo, no sentidode uma tendncia a abordar qualquer problemtica, por assim dizer, apenas do camponspara fora. Tudo isso igualmente insatisfatrio, embora possa ter sido explicvel, comouma virada em sentido contrrio, em um argumento contra a marginalizao conceitual doscamponeses.

    Embora no seja aqui o lugar para outra anlise exaustiva, que hierarquize oselementos, deve-se trazer luz o que anteriormente se deixou implcito. A especificidade docampons reflete a interdependncia entre os elementos bsicos mencionados e no podeser pura e simplesmente reduzida a qualquer um deles. Ao mesmo tempo, o cerne de suas

    caractersticas determinantes parece repousar na natureza e na dinmica doestabelecimento rural familiar, enquanto unidade bsica de produo e meio de vida social.Conseqentemente, a prpria existncia do campons, como uma entidade socialespecfica, depende da presena de estabelecimentos rural familiares como a unidadebsica da economia e da sociedade. O campons deve ser compreendido, portanto, atravsda investigao das caractersticas do estabelecimento rural familiar campons, tantointernas quanto externas, isto , suas especificidades reaes e interaes com o contextosocial mais amplo. Um ponto a ser lembrado, especialmente no contexto das diversasexperincias ocidentais, que a essncia de tal unidade reside no no parentesco, mas naproduo. A repetio mundialmente abrangente de traos econmicos, polticos e culturais,

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    assim como dos tpicos padres de sua dinmica, teria a ver com o modus operandidosestabelecimentos rurais familiares camponeses e com as formas especficas em que sevinculam e se transformam. Quando (e se) fosse utilizada uma navalha Ocam, seria melhoraceitar o manejo do estabelecimento familiar como a definio mais estrita de campons,salvo se houver razes definitivas para se proceder de outra maneira.

    Essa foi essencialmente, a abordagem para a caracterizao do campesinato queconstitui a linha mestra da pesquisa e do debate poltico, na Europa Central e Oriental,durante o sculo passado. Embora os pressupostos, as questes e as conclusesdiferissem, a maneira como o conceito foi identificado e adotado perpassou os camposideolgicos e as escolas de pensamento. Particularmente, enquanto se acirrava umadiscusso em torno da questo de estabilidade do campons, parecia no haver dvidassobre onde repousa a raiz do campesinato. Tampouco havia qualquer critrio pelo qualpudssemos julgar quando e se, no bojo das transformaes econmicas e sociais, essaentidade chegaria ao fim. Foi a unidade de produo familiar camponesa e sua metamorfoseestrutural, ou seu desaparecimento, que delinearam essas questes. Passadas trsgeraes essa tradio ainda se reflete, inteiramente, na gerao atual dos principaisestudiosos marxistas do campons, na Europa Oriental.17

    Interpretaes de Marx, contraditrias e muitas vezes consideravelmentedistanciadas, tornam-se rapidamente uma importante indstria acadmica no perodo ps-1968. dentro desse tipo de discusso que, recentemente, se tem ouvido um apelo desconceituao do campons, invocando-se para tanto a prpria autoridade de Marx. No portanto inoportuna uma rpida observao de seus reais pontos de vista. O insighte ainspirao de Marx, no que se refere aos camponeses so, em grande parte, os de umeuropeu da Europa Central (com conhecimento das lnguas e a tradio da EuropaOriental), situado no meio ingls de um capitalismo descamponesado. No estudo em quese debrua mais diretamente sobre os camponeses de sua poca, Marx caracterizou edelineou a mais numerosa classe da sociedade francesa atravs do conceito de posseparcelria (parzellen). O que parzelle seno o estabelecimento descrito na continuaode seu texto?

    Com efeito, Marx aponta-o tranqilamente como a oficina individual (que) contm aeconomia total, constituindo um centro independente de produo de um perodo anterior,subseqentemente comercializado e parcialmente transformado pelo incio do

    desenvolvimento capitalista da Frana. Ou, para descodificar a linguagem metafrica, umabatata dentro do saco de batatas (como Marx caracterizava os camponeses franceses) ,sem dvida, a mesma unidade, isto , um estabelecimento rural familiar campons. Atendncia prevista do desenvolvimento posterior tambm foi esclarecida. Trata-se dadissoluo da propriedade privada baseada no trabalho de seu proprietrio, isto , doavano do desenvolvimento capitalista devido reestruturao da sociedade em duasclasses fundamentais, dissolvendo, nesse processo, as unidades de produo familiarescamponesas e, portanto, o campesinato. Ou seja, a produo de capital e de trabalhadoresassalariados , portanto, o principal produto do processo pela qual o capital se valoriza.18Conseqentemente, alinha mestra da teoria social marxista abordou o campesinatocontemporneo atravs da problemtica de sua transformao capitalista expressa em doisprincipais debates conceituais, referentes diferenciao e aos modos de produo. Enessa linha foi tratada a questo da posio dos camponeses dentro da histria e da

    sociedade.

    N. do trad.: Navalha de Occam forma como se tornou conhecida a assertiva de que princpios enoes no devem ser multiplicados sem necessidade, atribuda ao filsofo escolstico inglsWilliam of Ockham, ou Occam (1284-1349).

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    A diferenciao camponesa: a multilinearidade da transformao capitalista daagricultura

    A transformao capitalista propiciou a principal tendncia que a mudana estruturalassumiu nas sociedades camponesas contemporneas. Capitalismo significadescamponesao sculo XIX, esse ponto de vista foi, em geral, adotado pelo pblicoilustrado, com muito poucas excees: os romnticos reacionrios, os populistas rgidos ealguns dos revisionistas da Social-Democracia alem. Todos eles, porm, foramdesafiados pela frente nica dos economistas acadmicos e da maior parte dos marxistasortodoxos. Para estes, o que estava em discusso no era a descamponesao capitalistada agricultura, mas apenas a forma e a velocidade que tomaria.

    A principal obra que dominou o pensamento marxista daquela poca foi A QuestoAgrria de K. Kautsky. Ela foi (e ainda ) rica em contedo e em insight quanto problemtica camponesa. Aceitou a possibilidade de algumas diferenas no modo como ocapital penetra na agricultura, em contraposio aos outros ramos da economia. Apontoupara a acumulao de capital e para a mudana na agricultura alem. E salientou que areferida falta de concentrao da propriedade fundiria no significava necessariamente ofracasso do capitalismo em ali se estabelecer. O principal motor da transformao capitalistada sociedade rural foi a indstria, que sobrepujou, subordinou e finalmente destruiu a

    agricultura camponesa. A posio de Kautsky seguiu de perto e elaborou a apresentao deMarx do exemplo ingls/irlands em O Capital, adequadamente generalizado edesdobrado.19

    Talvez o sucesso poltico de Lnin tenha sido responsvel pela decisiva influncia desua contribuio a esse debate, no que cerne as posteriores geraes de marxistas. Emsuas primeiras obras, Lnin era ainda, em muitos aspectos, um kautskiano, mas comnfase claramente diferente. Para ele, eram a dinmica intercamponesa deaprofundamento das relaes mercantis, a diviso do trabalho e a diferenciao de classeque constituam o ponto central da transformao capitalista.20 A nfase passa da produopara as relaes mercantis. A polmica pretendia atingir uma ala dentro do populismo russo,a qual acreditava que a homogeneidade e a estabilidade da sociedade camponesaabortariam o desenvolvimento capitalista na Rssia. A lgica das relaes de mercado e dacapacidade de explorao dos camponeses mais ricos indicava uma polarizao necessria

    dos camponeses em ricos e pobres e, eventualmente, em capitalistas rurais e proletriosrurais. O problema da diferenciao, seu carter, sua velocidade e seus resultados polticosdominaram, subseqentemente, a anlise das sociedades camponesas na III Internacional enos movimentos comunistas do Leste. Longos trechos do livro de Lnin de 1899aparecem, ainda hoje, praticamente de forma literal, em muitos estudos de diversassociedades.

    Entre a apreciao de uma concluso analtica como magistral e a auto-exaltaoreligiosa perante ela, existe uma linha divisria muito tnue. A melhor maneira de explicar adiferena simplesmente perguntar: aprendeu-se algo de substantivamente novo, duranteos oitenta anos que se passaram desde que foi publicado o livro de Lnin? Teria o prprioLnin aprendido algo de novo, nos 25 anos de sua experincia revolucionria que seseguiram publicao de seu tratado?

    Comecemos pela segunda questo: a prpria abordagem de Lnin sobre o

    campesinato passou por uma mudana consistente, embora lenta. J por volta de 1907, eledeclarava ter claro exagero em suas primeiras concluses sobre a natureza capitalista daagricultura russa, no perodo de hegemonia de Plekhanov na Social-Democracia russa.Lnin foi alm (embora mais implicitamente) na aceitao da permanncia de traoscamponeses. Esta mudana subjaz e explica as modificaes dos programas do partido em1917, 1921 e foi mais firmemente expressa nos ltimos momentos de vida de Lnin.21 Comefeito, o simples fato de o programa agrrio de seu partido ter sido cancelado j significavaque a anlise de 1896-1898, diretamente relacionada a ele, no podia se sustentada. Olivro, porm, jamais foi reescrito. Foi canonizado junto com o autor.

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    Na ultima dcada, foram feitas tentativas de considerar, outra vez, a discusso dadiferenciao, tanto no Ocidente como na URSS. Inmeras correes da anlise foramsugeridas particularmente pelos historiadores soviticos contemporneos, observandonovamente os dados russos. As tentativas dos franceses de utilizar a metodologia de Lnin,no que concerne diferenciao do campesinato em outros lugares (por exemplo, na ndia),apresentaram tambm novos insightse novas oportunidades. Todavia, na maioria dessesestudos, as equivocadas hipteses bsicas de Lnin, no que se refere diferenciaocamponesa, so tratadas por muitos marxistas quase como se fossem leis da natureza, comum ntido sinal de aprovao dos economistas neoclssicos. Os comentrios e/ou emendascrticas tese original, agora transplantada, centraram-se apenas na rapidez da polarizaoe nas possveis contratendncias. Ora, deve-se tambm examinar os modelos e arqutiposfundamentais que esto na raiz das anlises de diferenciao. Em que medida satisfatrioo prembulo terico de Lnin, em seu livro de 1899, para o cenrio contemporneo?

    O quadro que emerge de complexas partculas e fragmentos da comparaointernacional parece mais complexo e multidirecional do que o modelo de diferenciaoinicial poderia admitir. No caso da transformao capitalista da agricultura parece ocorrerno uma, mas trs tendncias principais, simultaneamente em diferentes regies e partesdo mundo e, s vezes, dentro da mesma sociedade. Chamaremos essas tendncias deprocessos de diferenciao, pauperizao e marginalizao.

    Sem dvida, a diferenciao exerceu um papel importante na transformaocapitalista da agricultura camponesa e representou, muitas vezes, sua mudana estruturalmais significativa. As argumentaes tericas e fatuais, em seu favor, vo vlidas. Mas suainterpretao como um padro de desenvolvimento exclusivo e incontestavelmentenecessrio no o .

    Comeando pelo modelo terico, a explorao, mais a causao circular e aacumulao de vantagens e desvantagens de Myrdal22 deveriam levar a uma crescenteacumulao de capital no topo, isto , nas mos dos ricos e/ou capitalistas rurais eurbanos. Pressupe-se, no conjunto, uma economia de mercado livre. Presume-se que talprocesso deveria tambm produzir emprego para os recm-pauperizados, tornando-osproletrios e expandindo o capitalismo em seu sentido clssico. Tratemos um doscomponentes: a mais-valia no acumulada, nem na aldeia, nem nas cidades do interiormas em uma metrpole a 5.000 milhas de distncia. O que se segue uma polarizao

    distorcida, na qual a tendncia declinante no corresponde uma ascendente, ou seja,defrontamo-nos no com uma diferenciao e proletarizao da maioria, mas com umprocesso de pauperizao expresso no fenmeno da populao excedente, dosubemprego rural, da cultura da pobreza, das favelas, etc. O que se produz no umexrcito industrial de reserva, pois ningum deve apelas para essas reservas nas dcadasque viro. Tampouco so desviantes, marginais, ou qualquer outra palavra que suponhaexcepcionalidade, porque o grupo social a que se refere central e constante em talsociedade.

    Tal modificao do modelo de diferenciao realista? Obviamente, isso aconteceem todas as sociedades coloniais e tipifica o que , hoje, conhecido como neocolonialismoe periferizao. O cenrio resultante realista? Claro, basta olhar para Java23 etc. etc. Elerequer um esforo analtico e conceitual especfico? Sem dvida, porque, para comear, oscamponeses nessas circunstncias nem desaparecero completamente, nem

    permanecero estruturalmente como antes, nem se tornaro proletrios rurais nos termosda teoria clssica do capitalismo. Difere at mesmo a etnografia do cenrio, isto , aquiloque faz a anlise social verdadeiramente relevante.

    Prosseguindo, o capitalismo juvenil e otimista do sculo XIX influenciou muito aviso marxista clssica. Era visto como agressivo, construtivo, dominador e supereficaz emsua capacidade de se expandir Com o dedo de Midas que transforma em ouro tudo o quetoca, o capitalismo tambm transforma em capitalismo tudo o que toca. A terra o limite.

    luz do que realmente encontramos hoje, tudo isso parece um grande exagero. indubitvel a capacidade dos centros capitalistas de explorar todos e tudo sua volta; massua capacidade ou sua necessidade (em termos de maximizao dos lucros) de transformar

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    o Estado transformou a economia camponesa atravs da imposio da centralizaomonopolista da troca rural, o que, ao mesmo tempo em que limitou a burguesia rural,estabeleceu uma gigantesca manufatura dispersa, explorada em sua natureza: porexemplo, a posio dos pequenos proprietrios produtores de caf de Ghana. Taltransformao estatal definiu novamente o lugar e o papel do campons dentro da estruturasocial. Dito isto, no h necessidade de acrscimos ou comentrios suprfluos.

    Modos e camponeses, camponeses como modo de produo

    A outra maneira como a problemtica camponesa foi abordada, com a retomada dadiscusso marxista, deu-se atravs da elaborao das propriedades dos modos deproduo. Os problemas conceituais da especificidade, isto , da existncia decamponeses podem ser e tm sido assim apresentados. Sua particular importncia resideno fato de centrar a ateno da anlise naquilo que parece ser o cerne da dificuldade detoda a problemtica conceitual, isto , na questo da insero dos camponeses nasociedade e na histria mais amplas.

    Parte do debate atual em torno dos modos de produo no tem sido mais que umaverborragia em moda, um jeito de conseguir um lugar no palanque ou um distintivo marxista,dentro de comunidades onde tais coisas so importantes. Isso lembra em parte os pioresexemplos do Funcionalismo: manipulao lgica de abstraes elaboradas, numaverbosidade frtil em neologismos, essencialmente estril para o avano na compreensoda realidade social. Entretanto, ao lado de tudo isso, encontramos algumas das mais sriasoportunidades e consideraes tericas. A identificao de unidades de anlisefundamentais, seu carter, sua flexibilidade e sua utilizao variada exercem um papelcrucial na maneira como so moldados nossos mapas intelectuais, que, por sua vez,moldam a realidade social. Tais unidades de anlises fundamentais, dentro do pensamentoterico marxista, so os modos de produo.

    A autoridade de Marx, ainda em grande medida, designa o que se entende por modode produo. A utilizao que ele faz de conceitos muitas vezes parcial, mutvel ouimplcita, sendo extrada de trabalhos que encontram alhures sua coerncia interna. Isso vlido tambm para o conceito de modo de produo. Mas a maioria dos que estudaram

    Marx concorda quanto s caractersticas e aos elementos centrais do conceito em questo,embora possam varias consideravelmente em sua respectiva nfase.O modo de produo representa a forma geral (no sentido de abstrata) e especfica

    (no sentido de uma estrutura histrica particular) m que so providas as necessidadesmateriais da sociedade, em dado estgio do seu desenvolvimento. Isso o torna crucial paraanlise da natureza geral da existncia da sociedade e da caracterizao de suaespecificidade. Explica tambm por que a exposio do conceito comea usualmente pelaindependncia entre as relaes de produo e as foras produtivas, isto , apareceigualmente como a relao de indivduos entre si e seu comportamento cotidiano especficoem relao natureza inorgnica, seu modo de trabalho especfico.27 Um sistema deeconomia poltica centrada na criao, apropriao e controle de excedentes, atravs dadominao do homem pelo homem, isto , uma relao essencial de apropriao (que ) arelao de dominao28 fornece o elemento central e distintivo de um modo de produo.

    parte do conceito um padro tpico de dinmica, especfico a todo modo de produo. Naterminologia estruturalista, um modo de produo tem, ento, tanto uma dimensosincrnica quanto diacrnica, isto , representa no apenas um sistema especificamenteestrutural, mas tambm uma poca histrica. Incorpora processos de reproduo, no quediz respeito aos bens materiais, fora de trabalho e ao sistema de relaes sociais.Especifica tambm padres prprios de mudana estrutural.

    O conceito de modo de produo, tal como foi definido, fornece o ncleo coeso e/oudeterminante de inmeras outras caractersticas. O carter e a extenso de taisdeterminaes nunca so simples, sendo geralmente mtuas. Os sistemas legais depropriedade refletem bem essa questo ( qual Marx dedicou muita ateno). Ele define

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    uma economia poltica, mas representa tambm um padro de consci6encia tpica. Refleteas relaes reais de produo e controle, mas ao mesmo tempo mostra uma capacidade euma autonomia parciais para realimentar (com sua prpria capacidade de determinao) aeconomia stricto sensu. O mesmo pode ser dito das inmeras estruturas bsicas de controlesocial, interao e conscincia, entre as quais o estado Moderno provavelmente aprincipal.

    O rejuvenescimento da anlise marxista, nos anos 70, levou a um aumentoconsidervel na ateno e sofisticao do uso do conceito de modo de produo. Estamudana na perspectiva terica foi intensamente influenciada, durante algum tempo, pelotrabalho de Althusser e seus discpulos, no qual o marxismo se confrontou e interagiu com oestruturalismo francs contemporneo. O foco analtico moveu-se em direo ao que estavaoculto sob o observvel, ao estrutural, ao no-objetivo, com a lgica dos modos de produoobscurecendo outras unidades de anlise. A atrao intelectual por tal preferncia relaciona-se busca, pelos intelectuais, do que mais seguro e determinista, expresso como maisprofundo, mais objetivo, mais sujeito a leis e terico. Isso se refletiu terminologicamente namaneira como cincia, cientfico e rigoroso chegaram a ser usados como distintivosfundamentais do conhecimento marxista (tornando O Capital, de Marx, mais cientfico queseu Dezoito Brumrio).

    Essa linguagem terica levou a redefinio do termo formao social e rpidaascenso fama do termo articulao, recm-chegado ao discurso marxista. Por formaosocial passou-se a designar uma sociedade especfica geralmente um Estado-nao definida, ento, como uma articulao especfica de modos de produo, um dos quaisexerce um papel dominante. A essncia da anlise social passou a ser, em grande medida,o exame das formas em que os modos operam e se articulam dentro dassociedades/formaes sociais.29

    Uma vez aceito o modo de produo como a unidade central da anlise social, oescopo da problemtica referente conceituao de campons pode ser reformulado naseqncia de questes a seguir: O esquema oferece, tambm, uma abordagem sistemticaao problema da estrutura histrica e societria dos camponeses, isto , invalida ashipteses de nulidade dois e trs, acima mencionadas.

    a) O campesinato, enquanto tal, deve ser constitudo como um modo de produo e,se for, como se articula com a sociedade em geral? (e seno for...)

    b) O campesinato deve ser visto como um componente de um modo de produoespecfico (e exclusivo)? (e se no for...).c) O campesinato deve ser compreendido como uma entidade social suficientemente

    autnoma para se relacionar com diferentes modos de produo e para se transferir de umpara outro? (e se no for...)

    d) O campesinato uma palavra vazia desnudada e anulada pela utilizaosatisfatria do conceito de modo de produo?

    Para comear, campons um modo de produo? Evidentemente, a respostarelaciona-se maneira como so definidos modo de produo e campons. Nos termosacima sugeridos, os camponeses no so um modo de produo porque lhes falta aestrutura poltica-econmica relativamente auto-suficiente, isto , os sistemas maissignificativos de explorao e apropriao do excedente tem sido, de modo geral, externos aeles. Desnecessrio dizer que os camponeses no so todos iguais e que toda

    comunidade camponesa dispe de estruturas complexas de explorao interna devizinhana, freqentemente encadeadas em redes de apadrinhamento. Entretanto, para amaioria dos camponeses, a desigualdade (e a explorao) intercamponesa secundriadiante da extracamponesa, tanto em termos da quota extrada quanto da maneira comoagem sobre eles a dinmica estrutural e a estrutura de classes. De fato, a guinada emdireo predominncia decisiva de estruturas de desigualdade e exploraointercamponesa e interaldeias significa o fim do campesinato enquanto tal, isto , enquantoum grupamento social especfico.

    H duas abordagens alternativas que Eva caracterizao do campesinato como ummodo de produo. A primeira consiste em estipular dois subtipos de modos de produo,

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    um na linha acima sugerida, e outro definido diferentemente. Tal sugesto encontradiaem inmeros estudos recentes que apontam para um modo de produo secundrio,diferente de um principal na medida em que aparece apenas em articulao com outrosmodos de produo, mas nunca por si prprio.30 Uma sociedade (uma formao scio-econmica?) fornece, portanto, a estrutura dentro da qual uma economia polticaexploradora age como um elo determinante entre o modo de produo dominante(explorador) e o secundrio (explorado). O modo de produo secundrio representaria umaestrutura encadeada de foras e relaes de produo, uma economia polticanecessariamente incompleta, em cujos limites se situam o conflito e as determinaessocietrias dominantes. As regras do jogo do modo de produo dominante dominariam aformao como um todo.

    As origens (e a legitimao) do conceito de modo de produo secundrio e suapresente utilizao esto na discusso sobre os pequenos proprietrios produtoresimediatos a que Marx se referiu como um modo de produo... (que) tambm existe sob aescravido e outras situaes de dependncia... mas... floresce onde o trabalhador o livreproprietrio das condies de seu trabalho e ele mesmo as pe em movimento.31 Asinterpretaes desse texto variam muito, do tratamento do conceito como um dispositivoessencialmente pedaggico (isto , um ponto de partida abstrato, fixado para esclarecer adinmica do capitalismo) suposio de um modo de produo plenamente desenvolvido(principal) de produtores independentes de mercadorias, por exemplo, em uma poca dahistria dos Estados Unidos em que ele constituiu uma barreira temporria aodesenvolvimento do capitalismo nesse pas.32 A idia de um modo de produo secundriocampons recai, de certo modo, entre essas polaridades. A economia camponesa abordada como uma subcategoria de um gnero mais amplo de modos de produo depequenos produtores de mercadorias, cuja posio na sociedade foi bem captada pelotermo sociedade tributria.

    A segunda alternativa consiste em redefinir o termo modo de produo de maneiraainda mais radical. Uma vez mais, o prprio texto de Marx tem sido usado como suporte. Omodo de produo considerado, aqui, em seu sentido mais direto e descritivo, isto , comouma forma de produzir, um processo de trabalho, um estgio tecnolgico geral dedesenvolvimento social, um conceito de alcance muito reduzido, ao longo das linhasexpressas, por exemplo, na designao de Marx da Agriculturacomo um modo de produo

    sui generis.Ambas as alternativas delimitam o campons como um modo de produo (ou entoo fazem para os pequenos produtores de mercadorias principalmente camponeses). Quaisos ganhos e limitaes heursticas de tal estratgia analtica? A delimitao e aapresentao da especificidade camponesa, dentro do conceito de modo de produocampons, fornecem uma abordagem possvel teorizao e anlise de inmerosproblemas em questo como, por exemplo, a estrutura societria dos camponeses. Aomesmo tempo, porm, o gume do conceito de modo de produo tem estado sujeito, emgrande parte, sua designao especfica como um sistema/dinmica, dentro do qual aproduo e a apropriao exploradora so centrais e encadeadas (o mesmo talvez se possadizer da prpria contribuio do marxismo s cincias sociais). Um modo de produo,como uma unidade de anlise que no traz essas caractersticas essenciais, parece foraros termos ao ponto de categorizar na ausncia de seus insigthsanalticos mais importantes.

    Colocado na balana, o conceito de modo de produo campons tem provavelmentedemasiadas limitaes heursticas para ser sustentado.

    Camponeses e modos: totalidades e unidades

    Passando segunda questo da seqncia referente aos modos e camponeses, ocampesinato um componente de um modo de produo exclusivo? O candidato maisprovvel, aqui, seria o feudalismo, que se apropria do produto e do trabalho camponeses,dentro de uma economia e uma sociedade essencialmente agrcolas e descentralizadas, em

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    cujo topo esto os proprietrios de terras/governantes locais/cavaleiros. Mas, j de incio, hsrias dvidas. Inmeros modos de produo (pocas progressivas na formaoeconmica da sociedade33, na prpria definio de Marx) contm alguma coisa, que ele eos que estudaram os camponeses delimitaram como mago da especificidade camponesa.Lembremos tambm que em O Dezoito Brumrio... Marx usou e explorou o conceito decampons na (primitiva?) Frana capitalista. Os grupos domsticos camponeses comounidades bsicas de produo e vida social, os camponeses como um grupo comsemelhanas estruturais considerveis e, mesmo, como uma auto-identidade polticaestabelecida, podem ser facilmente situados dentro de sistemas scio-econmicosdiferentemente estruturados, desde o Asitico (se existir tal coisa), passando peloslimites extensivos dos domnios escravistas na antiguidade, pelo florescente capitalismo(primitivo?) da Alemanha, at a NEP sovitica e a Polnia de hoje. A nica maneira deinsistir em encaixar os camponeses exclusivamente no modo de produo feudal atravsde uma tautologia, isto , definido arbitrariamente: a) todos os modos de produo quecontm camponeses como feudais; b) todas as unidades de produo familiares exterioresao feudalismo como no-camponesas (ou, ainda, como reminiscncias arqueolgicas a-conceituais, que compartilham o espao societrio com aqueles que legitimamente oocuparam, isto , os trabalhadores assalariados sob o capitalismo). Tais procedimentoslimitam, mais do que expandem, nossa compreenso da realidade social em suascomplexidades e contradies.

    Em termos mais gerais, a diversidade de abordagens relativas insero doestabelecimento rural familiar, enquanto unidade bsica de economia/sociedade camponesaem um modo de produo pode ser apresentada por um continuumentre dois plos, ambosrepresentados em trabalhos publicados durante a ltima dcada. Por um lado, exclusivamente a caracterstica da unidade de produo dominante que define a estruturamais ampla (modo de produo? formao? sociedade?); por outro lado, as caractersticasessenciais do estabelecimento rural/familiar e, conseqentemente, da economia camponesatm sido tratadas como determinadas exclusivamente pelo sistema scio-econmico maisamplo, isto , pelo modo de produo (dominante?).

    Um exemplo da primeira abordagem: o o grupo domstico est para a economiatribal, assim como o domnio feudal para a economia medieval, ou a corporao para ocapitalismo moderno; cada um a instituio produtiva dominante no seu tempo. 34 Embora

    a designao de Sahlin de um grupo domstico como tipicamente tribal (excluindo doesquema o estabelecimento rural familiar campons) possa induzir em erro, especialmenteno mundo contemporneo, sua lgica admiravelmente clara. Ela tem sido tambmexplcita e corretamente relacionada taxonomia comparativa dos sistemas econmicos, deChayanov, e posta em contradio manifesta com o estruturalismo de Terray. A conclusoplenamente elaborada de tal abordagem j foi expressa na categoria de Thorner deeconomia camponesa, definida como uma economia global de pases de dimensoconsidervel e como uma forma de organizao de sociedade humana amplamentedifundida, delimitada pelas porcentagens de unidades sociais especificamentecamponesas, dentro da populao, da economia, etc. Conseqentemente, um conjunto decaractersticas, das quais o grupo domstico enquanto unidade tpica de produo a maisfundamental, define um sistema econmico e uma poca de extenso e heterogeneidadeconsiderveis, pois as economias camponesas existiram muito antes do feudalismo, ao

    longo do feudalismo e muito depois dele. Ser tambm a diminuio na proporo deestabelecimentos familiares camponeses o que tornar inaplicvel o termo campons, apartir de certo momento, para designar tal economia em seu conjunto.35

    Por outro lado, diferentes modos de produo, sistemas ou sociedades implicariamuma essncia social totalmente diferente para o estabelecimento rural familiar campons (epara o campesinato, de forma geral), mesmo que possam ser apontadas semelhanasformais. A observao de Marx de que mesmo as categorias econmicas, apropriadas amodos de produo anteriores, adquirem um carter histrico novo e especfico sob oimpacto da produo capitalista36 conseqentemente interpretada como significado queno h um campesinato em geral, apenas formas especficas de produo agrcolas,

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    trabalhadas e controladas, em maior ou menor grau, por unidades domsticas... especficasao modo de produo no qual existem. As tipologias baseadas nas condies tcnicas,agronmicas e culturais so, na melhor das hipteses, equivocadas. Ou, na forma maisconcisa do mesmo texto, o campesinato como uma categoria econmica terica no existeno marxismo... e deve ser tratado como um destacamento especfico da pequenaburguesia.37 O mesmo valeria necessariamente para a histria camponesa especfica epara qualquer de suas supostas caractersticas bsicas. No limite, isso pode seracompanhado do certificado de ortodoxia-e-verdade, atravs da simples diviso do campoconceitual entre o estruturalismo marxista e uma abordagem no marxista dirigida unidade.

    Provavelmente a melhor maneira de tentar resolver esses problemas comear porprestar mais ateno s questes epistemolgicas mais amplas que aqui se apresentam,isto , as relaes entre a totalidade e suas subunidades. Uma estrutura geral determina edefine exclusivamente suas unidades componentes, ou a soma total de subunidades quedefine o todo? H outras possibilidades? Aqui, tambm relevante a terceira pergunta daseqncia de questes acima estabelecidas: os camponeses podem ser vistos comoentidades transferveis intermodos ou tal noo absurda?

    A resposta parece, de fato, residir, pelo menos inicialmente, no plano epistemolgico.A anlise marxista , sem dvida, corretamente estruturalista na medida de sua recusa emaceitar a reduo de qualquer totalidade soma de suas subunidades (como tambm, alis,o conhecimento no-marxista sofisticado).38 A concluso que daqui no se pode tirar areduo pelo lado contrrio, isto , uma tentativa de deduo das subunidades a partir dascaractersticas do todo, atravs do desenvolvimento simples, lgico, da verdade geral.Deve-se apreender, de uma s vez, a interao do todo e suas partes, em todas as suascaractersticas especficas, diferentes e relacionadas, a dinmica muitas vezes contraditriae as ordens da lgica, tanto da totalidade quanto de suas unidades. Sendo assim complexa,no h como vir-las do lado contrrio. Aqui as palavras relao dialtica, freqentementeempregadas em excesso, no estaro fora do lugar. Para exemplificar, as classes sociaisrefletem as contradies e as leis do movimento dos modos de produo, mas nenhumadeduo das primeiras a partir dos segundos (ou vice-versa) pode substituir a anliseespecfica. Voltando aos camponeses, o que deve ser rejeitado um falso problema quesupe uma falsa dualidade de possibilidades. Sem dvida, no podemos compreender

    como operam as unidades de produo camponesas sem seu contexto societrio.Tampouco podemos, simplesmente por isso, deduzir-las ou reduzi-las ou dissolv-lasconceitualmente. O deducionismo no uma resposta satisfatria ao empirismo.

    Em outras palavras, aceitar a existncia e a possvel transferncia dos camponesesintermodos chegar mais perto da riqueza e das contradies da realidade. Dizer isso no afirmar que os camponeses sob o capitalismo so iguais aos camponeses sob ofeudalismo, porque isso no est em questo (pressupe-se, obviamente, o contrrio). Oque realmente se quer dizer que os camponeses representam uma especificidade decaractersticas sociais econmicas, que se refletiro em qualquer sistema societrio em queoperem. Que dizer tambm que a histria camponesa se relaciona com as histriassocietrias mais amplas, no como seu simples reflexo, mas com medidas importantes deautonomia. Em poucas palavras, significa que uma formao social dominada pelo capital,que abarque camponeses, difere daquelas em que no existem camponeses. Mais uma vez,

    a questo delimita a fronteira marxista/no marxista, pois, como precisou o comentrioautocrtico de um expoente da escola do funcionalismo estrutural, sua crise conceitualsegui-se a nova forte nfase na autonomia de qualquer subestrutura, subgrupo ousubsistema..., assim problematizada39 uma observao que poderia, igualmente,enquadrar alguns estruturalismos marxistas. Finalmente, e o que mais importante, essasconcluses no so simplesmente um exerccio de lgica, mas so centrais para estratgiasde pesquisa e ao poltica, pois implicam que os camponeses e sua dinmica devem serconsiderados tantoenquanto tais, comodentro dos contextos societrios mais amplos, paramaior compreenso do que so eles e do que a sociedade em que vivem.

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    Para tranqilizar aqueles que gostam da autoridade de referncias textuais, tudoisso, bvio, tambm est metodologicamente implcito no prprio trabalho de Marx. Porexemplo, sua considerao sobre o capital mercantil e os comerciantes relaciona-os adiferentes modos de produo e d-lhes uma histria prpria, parcialmente autnoma. Ocapital mercantil no totalmente independente do capitalismo, nem simplesmente o reflete,nem , ainda, apenas um estgio dentro dele. Tampouco so os comerciantes a-histricos,em termos da sociedade onde operam. Ora, se afirmamos que na produo e no nacirculao que a verdadeira economia poltica comea, o capital mercantil isolado paraanlise em sua relativa independncia, mas como uma parte claramente necessria doprocesso de compreenso do todo.40

    Ento, que so os camponeses, conceitualmente falando? Voltando, uma vez mais,aos princpios epistemolgicos, os conceitos, as generalizaes e os modelos no so arealidade, que , de fato, infinitamente mais rica. Isso torna sem sentido uma perguntagenrica, tal como: Os camponeses soum modo de produo, ouuma economia, ouumaclasse?, pois esses conceitos no so mutuamente excludentes, nem intercambiveis; asluzes que trazem podem ser tomadas. Os conceitos so instrumentos de anlise; suautilidade e utilizao esto sujeitas s perguntas feitas, s maneiras como estas serelacionam aos esquemas de questionamento terico mais gerais e a seu esclarecimento darealidade. Nenhuma dessas conceituaes pode ser total, exceto aquelas que sotautolgicas e/ou triviais. Alm disso, tal afirmao no constitui defesa de um ecletismo deprincpios, pois a hierarquia de importncia central e pressuposta, e diferentes conceitosmostram diferentes medidas de esclarecimento (ou nenhuma que seja), especialmentequando a pergunta est determinada. So portanto a maneira de utilizar o conceito e seusresultados heursticos o que central em nosso caso, isto , discusso sobre um debateatual dentro de um quadro de referncia de anlise claramente marxista.

    Os camponeses entraram na discusso marxista como a pr-histria analtica docapitalismo, como sua forragem passiva dentro da acumulao primitiva, mas, emparticular, como classes histricas para si com, por assim dizer, baixo carter de classe,explicvel, por sua vez, dentro dos termos da especificidade camponesa.41 A utilizao e asnfases diferem no tempo e no contexto. Os camponeses pertencem aos tempos antigos emedievais no Grundrisse, ao passado mais imediato da Inglaterra em O Capital, de Marx,mas so centrais anlise da histria poltica atual da Frana e ao futuro poltico da

    revoluo proletria em pases de maioria camponesa. Classe para si representa aquino apenas uma definio mais expressiva do que classe em si, mas tambm um nveldiferente de abstrao, no apenas como uma construo analtica, no apenas portadorade caractersticas de uma matriz geral, mas um grupo social que existe na conscinciadireta e na ao poltica de seus membros.42 Somente a conceituao de uma classe comoator e sujeito da histria social permite levantar questes como cristalizao edescristalizao de classe, coalizes de classes temporrias, retiradas, vitrias e derrotas. Aluta de classes significa, neste nvel, no apenas uma contradio objetiva de interesses,mas uma confrontao real de organizaes especficas, palavras de ordem e homens. Umgerao depois, os camponeses, historicamente reais, gradualmente tomaram o lugar deseus congneres conceituais, analticos e abstratos em si, medida que os escritos e osfeios de Lnin se tornavam maduros, politicamente mais profundos, mais fortes naconfrontao decisiva e mais perto da vitria. Algum dia, uma histria similar sobre Mo e

    Tito tambm ser escrita. Quando a anlise poltica imediatamente relevante reconheceu olugar dos camponeses, estes se transformaram, de derivaes e dedues, em exrcitos eatores; e, simultaneamente, admitiu-se, cada vez mais, a autonomia analtica relativa daclasse com relao ao(s) modo(s) e/ou sociedade a que se vincula. Os camponesestornaram-se, de fato, uma classe, mesmo dentro de um pas capitalista citando o Lninps-1906.43

    Entretanto, isto no um happy end, apesar de resolvidas todas as dvidas ereconhecidos os camponeses como o que realmente so, isto , uma classe. Os

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    camponeses so uma classe, uma economia, uma part-society* e, alm disso, outrascoisas que ainda no conceituamos. S a definio de uma problemtica torna possvel aseleo de um quadro de referncias conceitual vlido. Ademais, nenhuma realidade socialpode ser monopolizada e nitidamente dividida por um tipo de unidade de anlisedevidamente selecionado, do qual derivem todas as concluses. A realidade no s pura;tampouco pode s-lo a anlise relevante da realidade. De fato, livrar-se das impurezassignifica desfazer-se justamente dos pontos onde a perplexidade engendra a descobertanas ci6encias sociais.

    Tudo isso nos leva ao ltimo ponto de ambas as seqncias sugeridas sobre aproblemtica da conceituao de campons: a questo da possvel inutilidade e/ouqualidades insatisfatrias do termo. Isso necessrio porque, para compreender o queso os camponeses, devemos compreender o que e como pensarmos sobre eles.

    Camponeses como uma moda

    Uma histria dos camponeses como uma entidade conceitual ou como uma modasria, uma tarefa importante em si mesma. Limit-la-emos, aqui, a poucos aspectosrelevantes para o problema em pauta. O significado poltico do conceito garantiu umaperiodicidade de seu prprio uso, sempre refletindo a histria social em sentido amplo, mastambm uma dinmica especfica do pensamento acadmico. Ocorria uma insurreio noque pode ser grosseiramente chamado de primeiros estgios da industrializao e datransformao capitalista da Europa Central e Oriental, isto , nas sociedades situadas naperiferia prximas s origens do capitalismo. Estava relacionada rpida industrializao, ascenso dos movimentos nacionalista, populista e socialista, e assim por diante. Comeouna segunda metade do sculo XIX e produziu, at o comeo do sculo XX, a maioria dosinstrumentos conceituais e ideolgicos relevantes de que hoje dispomos. Grande parte dissochegou ao pensamento propriamente ocidental, atravs da mediao de europeus daEuropa Central e Oriental que escreviam em ingls (por exemplo, Marx Znaniecki, Weber eSorokin) ou ainda atravs de tradues (por exemplo, Weber, Lnin e Chayanov).

    A insurreio chegou a um fim abrupto e dramtico, durante a dcada de 1920/30,derrubada pelas represses bem como pelo avano das entrelaadas ideolgicas e polticas

    do nacionalismo militante e pela rpida industrializao, que situou os camponeses no lugaronde estavam a bruxaria e o rstico, isto , fora do alcance das preocupaes intelectuais epolticas progressivas. A Europa Oriental e Ocidental emparelhou-se, assim, a umatendncia anterior europia ocidental/norte-americana dominante. A modernizao e aindustrializao foram consideradas necessrias e uma coisa boa. Uma taxonomia bsicade moderno/tradicional (com uma implcita suposio ns/eles) tornou os camponesesterminologicamente invisveis, dentro do pacote geral de tradicionais e outros exticos.Durante a dcada de 1930/40 e, posteriormente, na euforia das teorias da modernizaops-colonial da dcada de 1950/60, os camponeses continuaram a no existir,conceitualmente falando.

    Uma sucesso de crises das chamadas sociedades em desenvolvimento e daagricultura mundial, o colapso das prescries modernizantes simples-e-rpidas, a decisoda China de andar com os prprios ps, a descoberta pelo Banco Mundial da tenacidade

    camponesa, etc., mas especialmente a maneira com os camponeses vietnamitas derrotaram

    * N. do Trad.: No traduzimos o termo, por se tratar de uma noo utilizada na sua forma original. Talnoo teve Kroeber como precursor. Para ele camponeses constituem part-societiese part-cultures.Eles so definitivamente rurais entretanto vivem em relao a cidades mercantis; formam umsegmento de classe de uma populao maior, que geralmente contm tambm centros urbanos...falta-lhes o isolamento, a autonomia poltica e a auto-suficincia das populaes tribais; mas suasunidades locais retm muito de sua velha identidade, integrao e apego ao solo e aos cultos.Extrado e traduzido de KROEBER, A. L., Antropology, New York, Harcourt, Brace and Co., 1948, p.284.

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    o pas mais industrializado do mundo, tudo isso trouxe os camponeses abruptamente para ofoco das atenes. Seguiu-se ma exploso virtual de estudos, publicaes e debates. Aestrutura das casas editoriais e da academia, enquanto empresa, rapidamente transformoutudo isso em moda crescentemente controlada pelas leis do mercado da moda. Issosignificou um rpido aumento da utilizao da palavra como um truque editorial (ao lado demulheres nuas e camisas com retratos do Che). Significou brigar por dizer alguma coisa denovo ou de bm para fazer carreira, em um campo que se abarrotava depressa, muito antesde qualquer avano real do conhecimento que o justificasse. Fcil predizer o estgioseguinte, dentro da racionalidade de tais dinamismos acadmicos: desencantamento, sinaisde fastio com o termo utilizado em excesso e trivializado, descobertas de sua no-existncia real, apelos a desconceituao, investida em novos truques e, freqentemente,uma tentativa de tirar academicamente proveito da desmistificao de velhas predilees(pode-se sempre excetuar uns poucos livros). Estamos agora nos aproximando rapidamentedesse estgio, dentro do ciclo da moda camponesa. Ela mostrou-se articulada a, esobredeterminada conjuntamente por, uma onda de marxismo deducionista dasuniversidades ocidentais, por sua vez crescentemente atacado por aqueles para quem arealidade social indedutvel, especialmente quando se trata de marxismo.

    Escusado dizer que ver os seguidores de modas instalarem-se em outro lugardeleitaria queles que se empenham seriamente no estudo. Entretanto, na medida em quese empenham seriamente no estudo. Entretanto, na medida em que algumas questesforam elaboradas e que portanto alguns estudiosos entraram em campo, o resultado daexploso da moda no poderia ser de todo negativo. Este pode ser, tambm, o momentoexato de revogar um conceito totalmente batido e desgastado. Afinal, palavras comocampons no so as Sagradas escrituras e quanto menos complexa a terminologia,melhor. Por exemplo, que tal substitu-lo por o destacamento agrcola da pequenaburguesia para torn-lo lmpido, puro e claro?

    Revogao de conceitos: algumas regras prticas

    Para responder a essa pergunta, passemos a algumas regras prticas para adesconceituao, antes de voltarmos, pela ltima vez, questo da definio de campons.

    Comeando novamente pelas negaes, o que se segue pode ser dito de maneira geral.(a) Nenhum conceito deve ser revogado simplesmente por representar apenasalguns aspectos da realidade. Todo conceito simplesmente seletivo e, portanto, temlimitaes e obscuridades necessrias. Exigir demasiado de nossos conceitos significadualizar a anlise: de um lado, os fatos totalmente empricos e, de outro, as construestotalmente tericas e, portanto, absolutas. Ambos tm pouca utilidade.

    (b) Nenhum conceito deve ser revogado por razes puramente dedutivas e/oulgicas, sem uma investigao exaustiva dos insights sobre a realidade, que podem serperdidos por tal desconceituao e/ou a adequao de formas alternativas de lidar comesses insights.

    (c) Nenhum conceito deve ser revogado para se adequar a uma simples diviso deconceitos em nossos se situam em um mundo assptico, livre de qualquer misturaaliengena. As preocupaes e descobertas marxistas devem ser reconhecveis, tanto nos

    fatos quanto na problemtica, pelos analistas no-marxistas genunos, e vice-versa, excetoas diferenas profundas. Dentro do prprio marxismo, o purismo dedutivo destri os vnculoscom a realidade, que mais rica que qualquer conceituao. Devemos evitar em particularas oscilaes da moda, que levam ao esforo de ser um marxista de acordo com a ltimadelas. Como no sexo, quanto menor o esforo, melhor o desempenho.

    Justifica-se a desconceituao para conceitos que no trazem qualqueresclarecimento, devido ou representao equivocada da realidade social e/ou irrelevncia para problemas de importncia e/ou estrutura lgico defeituosa e incoerncia. Tudo isso pode se dar de sada ou resultar de uma mudana na realidade ou,

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    ainda, da adoo de novos conhecimentos tericos ou de mtodos aceitos para suaverificao. Nesse sentido, como fica o campons?

    Retomando, primeiramente, a posio acima enunciada, o termo campesinato noimplica a total semelhana dos camponeses em todo o mundo, e/ou sua existncia fora docontexto de uma sociedade mais ampla no-apenas-camponesa e/ou extra-historicidade.Essas idias so como espantalhos, coisas que as crianas se encantam m derrubar. Oscamponeses diferem necessariamente de uma sociedade para outra e, tambm, dentro deuma mesma sociedade; trata-se do problema de suas caractersticas gerais e especficas.Os camponeses necessariamente refletem, relacionam-se e interagem com no-camponeses; trata-se da questo da autonomia parcial de seu ser social. O campesinato um processo e necessariamente parte de uma histria social mais ampla; trata-se daquesto da extenso da especificidade dos padres de seu desenvolvimento, das pocassignificativas e das rupturas estratgicas que dizem respeito aos camponeses. O conceitode campons seletivo; a questo o que podemos aprender valendo-nos apenas dele. Oscamponeses so uma mistificao; o problema quando o so, como e quando no o so.

    A simples questo os camponeses existem? Seria obviamente tola se colocada ereificada em seu contedo; no discutimos aqui a realidade imediata, mas umageneralizao, ligada a um modelo conceitual uma simplificao e uma formalizaosignificamente seletivas, com o propsito de uma melhor compreenso. Deveramos,portanto, colocar a questo de outra maneira, perguntando que esclarecimentos pode-se terpela utilizao do conceito e quais so os obscurecimentos em tal teorizao.

    Um exemplo pode ilustrar o problema. A derrota da interveno armada dos EUA noVietn est ainda viva na memria e , sem dvida, um evento social da maior importnciapoltica na histria contempornea. tambm um tipo de dado com relao ao qual tanto acompreenso da realidade quanto a tentativa de molda-la tm sito e sero tentadas nomundo inteiro. Podemos explicar satisfatoriamente a derrota do maior, mais rico etecnologicamente mais adiantado complexo militar industrial, sem levar em conta a estruturasocial especificamente camponesa de 90% dos vietnamitas? Uma complexidade de fatoresopera, sempre, em tais conflitos; mas isso no est em questo. Podemos compreender oque aconteceu considerando apenas o sistema econmico internacional, o modo deproduo capitalista, a neurose de Johnson e/ou as contradies e protestos internos dosEUA. Ou foi a selva, a lavagem cerebral, as tticas militantes e/ou as qualidades do fuzil AK

    47? Ou foi simplesmente a superioridade da Weltanschauungsocialista e a devoo pessoaldos quadros do partido? Todos esses fatores exerceram um papel, mas provavelmentebasta comparar o Vietn com as reas que tentaram desafiar a potncia militar imperialistapara admitir a importncia analtica crucial de se considerar a especificidade camponesaneste caso.44 Foram citados ou colocados em notas de rodap, na seo 2, outros exemplosde ganhos heursticos. pelo trabalho cotidiano de pesquisa e de programas e aespolticas reais que as utilizaes de um conceito devem ser julgadas. E por esses critriosque a generalizao da especificidade camponesa no deixa de trazer novas luzes, no irrelevante para as questes importantes do mundo em que vivemos, nem incoerente na suaestrutura lgica. O conceito de campons , sem dvida, insuficiente em si mesmo, assimcomo qualquer outro conceito, exceto no que diz respeito a suas diferenas de extenso. Oporqu da ltima das acusaes bsicas contra o campesinato como um conceito vlido ade seu carter mistificador ser respondido nas linhas a seguir.

    Um campons no uma palavra vazia a refletir os preconceitos do populus, asfrivolidades lingsticas dos intelectuais ou, ainda, conspiraes de adeptos de umaideologia, embora s vezes isso possa ser verdadeiro. Se revogado, este conceito (ainda?)no pode ser facilmente substitudo por algo de natureza semelhante. Ele tem, assim comoos conceitos de capitalismo, proletariado e, claro, modo de produo, potenciais dereificao, isto , pode ser enganoso, assim com pode ser usado para enganar,especialmente quando utilizado de maneira ingnua. Tem-se dito corretamente que o preoda utilizao de modelos a eterna vigilncia.45 verdade tambm que sem taisconstrues tericas no seria absolutamente possvel qualquer progresso nas cinciassociais.

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    O campons uma mistificao principalmente para aqueles que so propensos ase tornar mistificados. Tipicamente, foi nas mos do brilhante terico e indiferente polticoPlekhanov que os camponeses russos desapareceram conceitualmente, para reapareceremapenas com o conhecimento e a ao poltica de Lnin na Guerra Civil e posteriormente(Mais tarde, Li-Li San e Mo pareciam representar, outra vez esta dualidade.) Foram osgrandes deducionistas, com pouco contato com a realidade, que caram mais facilmente naarmadilha da reificao (no outro extremo, o mesmo acontece queles para quem apenas oemprico importa). A conceituao da especificidade camponesa reside na admisso dacomplexidade e dos graus de ambivalncia e expressa uma tentativa de acatar a questoem um nvel terico. No essencialmente uma resposta, mas uma pressuposio queajuda a engendrar novas respostas especficas.

    As questes fundamentais da realidade social ou podem ser compreendidas em umnvel razovel de sofisticao epistemolgica, ou no podem de modo algum. Ao mesmotempo, inclusive o rigor mais estrito de deduo, por si s, no pode resolver os problemasbsicos, mais do que o uso correto do silogismo pode nos provar a existncia do mundo nossa volta. Em ltima instncia, os conceitos devem servir no a uma questo dereconciliao dialtica de conceitos, mas compreenso das relaes reais.46 Devemosacrescentar, aqui, o compromisso, dentro da tradio socialista, de definir as dimenses daopresso do homem pelo homem e os caminhos da luta para combate-las. Excetuando suamistificao e sua utilizao ideolgica, o conceito de campesinato cumpriu, muitas vezes,todos esses servios. Esta capacidade ainda no se esgotou.

    (Traduo de Cynhia A. Sarti e Wanda Caldeira Brant)

    Notas:

    1 REDFIELD, Robert, Peasant Society and Culture, Chicago University of Chicago Press, 1956, p. 25;FEI HSIU-TUNG, Peasants and Gentry, in American Journal of Sociology, 52: 1-17, 1946.2 Ver, por exemplo, GALESKI, Borguslaw, Basic Concepts of Rural Sociology, Manchester,Manchester University Press, 1972.3 Por exemplo, WOLF, Eric, Peasants, New York 1966; e MALITA, N., Agriculture in 2000, inSociologia Ruralis, 50, 1971.4 Por exemplo, NADERI, N. Afshar, The Settlement of Nomads: its social and economic implications,Tehran, 1971.5 CHAYANOV, A. V., The Theory of Peasant Economy, Illinois, Homewood, 1966; BANARJEE, J.,Sumarry of Selected Parts of Kautsky: The Agrarian Question, in Economy and Society, 5 91), 1976,p. 26-28, 35. Anteriormente, Marx falou sobre a capacidade do campons de Irich himself (vir a serirlands): MARX, K., Capital, Harmondsworth, 1976, vol. 1, p. 1068.6 WOLF, E., op. cit., captulo 2.7 Para discusso, ver SHANIN, T., The Nature and Logic of Peasant Economy, in Journal of PeasantStudies, 1 (1-2), 1973.8 WOLF, Eric, Peasant Wars in the 20th Century, London, Harper & Row, 1969; STAVENHAGEN,Rodolfo, Agrarian Problems and Peasant Movements in Latin America, New York 1970, etc.9 Por exemplo, BALLEY, F. G., The Peasant View of the Bad Life, in Advancement of Science,December 1966. Alm disso, DOBROWOLSKI, K., Peasant Traditional Culture. (Para traduoinglesa, ver SHANIN, T., Peasants and Peasants Societies, Harmondsworth 1971.)10 GALESKI, op. cit., captulo 2.11 Por exemplo, CUONG, Pham, e Van BA, Nguyen, Revolution in the Village: Nam Hong, 1945-1975,Hanoi 1976.12 WOLF, Eric, Is the Peasant a Class Category Separate from Bourgeois and Proletarian? (notaspara uma palestra, 2.3.77), Binghampton 1977.13 Para uma reflexo crtica relevante, ver CLAUS, G., Toward a Structural Definition of PeasantSociety, in Peasant Studies Newsletter, 2 (2), 1973.14 SHANIN, T., Peasants..., op. cit., Introduction.15 HOBSBAWN, E. J., Karl Marxs Contribution to Historiography, in BLACKBURN, R., Ideology andSocial Sciences, London, 1972.

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    16 SHANIN, T., Peasants..., op. cit., p. 238-263, escrito em 1966.17 Por exemplo, os trabalhos de B. Galeski, V. P. Danilov, A. M. Anfimov.18 As citaes foram tiradas de MARX, K., Eighteenth Brumaire of Louis Bonaparte. Selected Writings,vol. I, Moscou 1973, p. 478-9; Pr-Capitalist Economic Formations, London 1964, p. 79, 118; Capital;op. cit., vol. I, p. 962.19 Ou seja, o ltimo captulo de MARX, K., Capital, op. cit., vol. I, parte 8.20

    LNIN, V. I., The Problem of Markets, in Collectrd Writings, vol. I, Moscou; e Development ofCapitalism in Russia, Moscou 1974; e tambm, posteriormente, Polnoc Sobranie Sockynenii, Moscou,vol. 17, p. 120-127, 1968.21 Particularmente, On Cooperation, Better Fewer but Better e a carta ao Congresso, de 22/24 dedezembro de 1923, in Lnin, V. I., Selected Works, Moscou 1971, p. 681-713.22 MYRDAL, G., Economic Theory and Underdeveloped Regions, London 1957.23 Por exemplo, GEERTZ, H., Agricultural Involution, Berkeley 1963.24 LOPES, J. R. B., Capitalist Development and Agrarian Structure in Brazil, So Paulo, CEBRAP,1976 (manuscrito).25 Ver MAC NAMARA, Address to the Board of Governors, Washington Bird, 1974.26 DANILOV, V. P.; DANILOV, L. V.; RESTYANIKV, V. G., Osnovnye Etapy Razvitiya KrestyanaskogoKhozyaistva, Moscou, 1977. Para uma abordagem, de modo geral, semelhante na escrita ocidental,ver AMIN, S., Capitalism and Ground Reant, Dakar, 1974.27 MARX, K., Pr-Capitalist..., op. cit., p. 94.28

    Ibid., p. 102.29 Por exemplo, ALTHUSSER, L., e BALIBAR, E., Reading Capital, London 1970. Sua apresentaoinicial na edio inglesa. Para uma discusso recente, ver FOSTER-CARTER, A., The Modes ofProduction Debate, in New Left Review, 1978, p. 107.30 CARDOSO, C. F. S., On the Colonial Modes of Production of the Americas, in Critique ofAnthropology, 4 & 5: 1-36, Autumn 1975 (primeira publicao, em espanhol, em 1975).31 MARX, K., Capital, op. cit., 926; Pre-Capitalist..., op. cit., p. 94.32 Ver o debate de OCONNOR, J., e SHERRY, R., Monthly Review, 28, 1976.33 MARX, K., Selected, op. cit., p. 504.34 SAHLIN, M., Stone Age Economics, London 1974, p. 76.35 THORNER, D., Peasant Economy as a Category in Economic History, in SHANIN, T.,Peasants, op. cit., p. 202-208, 216-217.36 MARX, K., Capital, op. cit., p. 950.37 HIST, P., Can There Be a Peasant Mode of Production? (manuscrito), p. 7. Sua verso finalaparece como ENNEW, J.; HIRST, P.; e TRIBE, K., Peasants as na Economic Category, in Journalof Peasant Studies, 4 (4), 1977. A citao foi tirada das p. 295-296.38 Por exemplo, Von BERTLANFFY, L., Problems of Life, New York 1952; KOESTLER, A. eSMITHIES, J. R., Beyond Reductionism, London 1969. Ver tambm SHANIN, T. (ed), The Rules ofthe Game, London 1972.39 EISENSTADT, S., Sociological Theory and an Analysis of the Dynamics of Civilizations and ofRevolutions in Daedalus, 106 (4), 1977, p. 66.40 Por exemplo, MARX, K., Capital, op. cit., vol. 3, captulos XIX e XX. Ver tambm a importantecarta de Engels para C. Schimidt, in MARX, K. e ENGELS, F., Collected Writtings, vol. 3, Moscou1973, p. 483-485.41 Ver o texto citado na nota 14. Para um esclarecimento de um ponto de vista algo diferente, verWOLF, E. R., Is the Peasat..., op. cit., p. 2-4. Marx... todavia, trabalhava com um modelohomogneo da sociedade hipottica... A razo por que isto me parece importante est no fato de ocampesinato encontrar-se sempre estabelecido em um local demarcado. Por definio, eles habitamperiferias e semiperiferias, e periferias dentro de periferias. E talvez, por isso, difcil ou impossvelfalar do campesinato como uma classe.42 Um sculo depois de Marx, as anlises marxistas tm acrescentado muito pouco lista bsica designificados, apresentados pela dicotomia classe em si... (em relao ) classe para si... Ambos oslados desta frmula levam consigo o aspecto definidor necessrio de um interesse de um interessecoletivo, objetivo e fundamental, em um sistema e relaes de produo e explorao. O segundoacrescenta um componente relacionado de conscincia tpica de grupo, auto-identificao eorganizao de classe. A suposio da cristalizao de caractersticas da classe para si, via luta declasses, deu incio a uma historiografia de etapas necessrias e propiciou uma maior racionalizaoda histria poltica. Para uma discusso que, embora velha, ainda a melhor disponvel, verOSSOWSKI, S., Class Structure in the Social Sciences, London, 1963.

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    43 A experincia revolucionria de 1905/6 encontra sua expresso na nova conscincia daquelesescritores. Por exemplo, LNIN, V. I., Agrarian Programme of Social Democracy... (1908);Polnoeop. cit., vol. 17, p. 170-172.44 HOBSBAWN, E., Vietnam and the Dynamics of Guerilla War, in New Left review(17), 1965.45 BRAITHWAITE, R. B., Scientific Explanation, Cambridge 1953, p. 93.46 MARX, K., Grundrisse, Harmondsworth 1973, p. 90.