a decadência e a prescrição no direito do consumidor

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A DECADÊNCIA E A PRESCRIÇÃO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Régis Cardoso Ares * 01 - Introdução Há muito que a doutrina civilista estuda as diferenças entre os institutos da Decadência e da Prescrição, delineando suas respectivas distinções, tanto as essenciais quanto as decorrentes de suas respectivas aplicações. Com efeito, o antigo Código Civil de 1916, nas palavras de Vidal Serrano Nunes Junior e de Yolanda Alves Pinto Serrano, "[...] englobava sob a designação de prescrição ambos os institutos" (NUNES JUNIOR e SERRANO, 2008, p. 120). A Professora Maria Helena Diniz, reforça o exposto, ao lecionar, com referência à norma de 1916, que "O Código Civil brasileiro não trata, explicitamente, da decadência, confundindo prescrição com decadência devido à analogia existente entre ambas, por terem traço comum da carga deletéria do tempo aliada à inatividade do titular do direito, englobando, por isso, num só capítulo, prazos prescricionais e decadenciais" (DINIZ, 1994, p. 212). No entanto, o Código Civil vigente (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) passou a tratar da decadência, em específico, em seus artigos 207 até 211, bem como faz referência ao instituto em seus artigos 178 e 179, acompanhando a coerente norma consumerista da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), que aborda, de forma distinta, a Decadência e a Prescrição, respectivamente em seus artigos 26 e 27. Sobre o tema, interessante o comentário feito por Mariana Dias, em seu trabalho "Inovações no Tratamento à Prescrição e à Decadência no Código de Defesa do Consumidor", onde ressalta que "Diante destas imperfeições em nossa doutrina nacional, os estudos estrangeiros, principalmente do Direito Alemão, mostraram-se

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Page 1: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

A DECADÊNCIA E A PRESCRIÇÃO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Régis Cardoso Ares *

01 - Introdução

Há muito que a doutrina civilista estuda as diferenças entre os institutos da

Decadência e da Prescrição, delineando suas respectivas distinções, tanto as

essenciais quanto as decorrentes de suas respectivas aplicações.

Com efeito, o antigo Código Civil de 1916, nas palavras de Vidal Serrano Nunes

Junior e de Yolanda Alves Pinto Serrano, "[...] englobava sob a designação de

prescrição ambos os institutos" (NUNES JUNIOR e SERRANO, 2008, p. 120).

A Professora Maria Helena Diniz, reforça o exposto, ao lecionar, com referência

à norma de 1916, que "O Código Civil brasileiro não trata, explicitamente, da

decadência, confundindo prescrição com decadência devido à analogia existente entre

ambas, por terem traço comum da carga deletéria do tempo aliada à inatividade do

titular do direito, englobando, por isso, num só capítulo, prazos prescricionais e

decadenciais" (DINIZ, 1994, p. 212).

No entanto, o Código Civil vigente (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002)

passou a tratar da decadência, em específico, em seus artigos 207 até 211, bem como

faz referência ao instituto em seus artigos 178 e 179, acompanhando a coerente norma

consumerista da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do

Consumidor), que aborda, de forma distinta, a Decadência e a Prescrição,

respectivamente em seus artigos 26 e 27.

Sobre o tema, interessante o comentário feito por Mariana Dias, em seu trabalho

"Inovações no Tratamento à Prescrição e à Decadência no Código de Defesa do

Consumidor", onde ressalta que "Diante destas imperfeições em nossa doutrina

nacional, os estudos estrangeiros, principalmente do Direito Alemão, mostraram-se

Page 2: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

mais precisos a respeito do assunto. E, a partir disso, é publicado na RT, nº 300, em

1965, um artigo de Agnelo Amorim Filho sobre o tema ('Critério Científico sobre

Prescrição e Decadência – PP. 07-37). Neste trabalho, ele toma por base a

classificação dos direitos em sujeitos a uma obrigação e potestativos (classificação

desenvolvida por Chiovenda). Os primeiros são sujeitos à ação condenatória (a parte

contrária deverá se sujeitar a cumprir uma obrigação); os segundos são sujeitos a ação

constitutiva (haverá modificação, formação ou extinção de estado jurídico,

independente da vontade da parte contrária). A partir disso, conclui que: as ações

condenatórias possuem prazo prescricional; as ações constitutivas possuem prazos

decadenciais; as ações meramente declaratórias são perpétuas, ou sujeitas a prazos

decadenciais, quando este é previsto em lei" (DIAS, p. 01)

Analisaremos, assim, as propriedades quanto a Decadência e a Prescrição, sob

a ótica do Direito do Consumidor, sem desconsiderar, porém, as influências do Código

Civil Brasileiro, discorrendo sobre seus conceitos, aplicações, prazos, semelhanças e

diferenças, com o intuito de melhor esclarecer ambos os fatos jurídicos.

02 - A Decadência

Etimologicamente, o vocábulo "decadência" sugere a queda, o declínio de algo; e

sua aplicação, no universo jurídico, relaciona-se com o direito a ser exercido.

Nas palavras de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Decadência é a "[...]

Extinção de um direito por haver decorrido o prazo legal prefixado para o exercício dele"

(FERREIRA, 2004).

Rodrigo Nunes, em seu Dicionário Jurídico RG - Fênix, por sua vez, conceitua

decadência como a "[...] Perda, perecimento ou extinção de direito potestativo, em

consequência de finalização do termo legal ou convencional e peremptório a que se

achava subordinado: decadência do direito de ação; decadência do direito de queixa;

do direito de regresso do portador cambial etc.. O mesmo que caducidade [...]"

(NUNES, 1995, p.127).

Page 3: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Maria Helena Diniz, por sua vez, expõe que "A decadência é a extinção do direito

pela inação de seu titular que deixa escoar o prazo legal ou voluntariamente fixado para

o seu exercício"1 (DINIZ, 1994, p. 212).

Isto posto, é correto afirmar que a decadência tem como objeto o direito a ser

exercido, o qual, seja por determinação estabelecida em lei ou pela vontade unilateral

ou das partes envolvidas, subordina-se a ser exercido em determinado lapso de tempo,

sob pena de caducar e não mais poder ser levado a efeito. Ou seja, na hipótese do

titular do direito deixar de exercer determinado direito até o momento estabelecido para

o término de seus efeitos, ocorre a decadência e, por conseqüência, perderá o direito,

de forma que o seu titular não mais poderá exercê-lo (CÂMARA LEAL, 1948, p. 105 e

106, apud DINIZ, 1994, p. 213).

E a decadência do direito tem razão de existir, em favor da segurança jurídica

que deve prevalecer entre as partes envolvidas, pois o direito decorrente da relação

não pode subsistir "ad eternum", sendo que o prazo decadencial estabelecido no

ordenamento ou convencionado entre as partes implicadas resulta em evidente

fortalecimento do negócio jurídico2.

Maria Helena Diniz ressalta que a decadência poderá ser argüida tanto pela via

da ação quanto pela força da exceção. Pela via da ação, caso o titular do direito tenta

exercitá-lo sem observar a existência da respectiva decadência, por outro lado, o

interessado, pela via da ação, pleiteará a declaração da decadência do direito em

questão. E, pela via da exceção, se o titular do direito vem a exercitá-lo por meio da

ação judicial, a parte adversa, obviamente interessada no reconhecimento da

decadência do direito que originou a lide, se defenderá, pela via da exceção, pleiteando

a decadência do direito (DINIZ, 1994, p. 213).

Cabe ressaltar que o instituto da decadência é hipótese de julgamento da lide

com a resolução do mérito3, de acordo com o determinado pelo artigo 269, inciso IV, do

Código de Processo Civil:

Page 4: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

"Art. 269 – Haverá a resolução do mérito:

[...]

IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição;

[...]"

A decadência "ex vi legis"4, por tratar-se de matéria de ordem pública e, portanto,

irrenunciável5, deverá ser conhecida de ofício pelo magistrado, quando estabelecida em

lei, conforme, aliás, determina o artigo 210 do Código Civil Brasileiro. Ou seja, o juiz tem

o dever de reconhecer o prazo decadencial existente, por sua própria conta, sem

qualquer impulso pelas partes do processo; sendo caso de indeferimento da petição

inicial na forma do artigo 295, inciso IV, do Código de Processo Civil:

"Art. 295 - A petição inicial será indeferida:

[...]

IV – quando o juiz verificar, desde logo, a decadência ou a prescrição (art.

219, § 5º);

[...]"

Porém, no caso do prazo decadencial ser decorrente de convenção entre as

partes, o interessado, por força do disposto no artigo 211 do Código Civil Brasileiro,

poderá alegá-la em qualquer grau de jurisdição, antes da lide ser definitivamente

julgada6. No entanto, a parte final da referida norma alerta que o magistrado não

poderá suprir tal alegação; o que equivale dizer que o juiz não poderá reconhecer a

decadência convencional de ofício, sem ser impulsionado, sem existir o requerimento,

da parte interessada.

A argüição da decadência, por sua vez, só poderá ser efetuada por quem detiver

o legítimo interesse jurídico em seu reconhecimento, ou seja, poderá argüi-la àquele

que sofreria as conseqüências do direito decaído, caso a decadência não o tivesse

extinguido (DINIZ 1994, 213).

Portanto, na lição de Maria Helena Diniz, "podem argüir a decadência contra o

titular do direito decaído: 1) o sujeito passivo do direito, se este for oriundo de relação

Page 5: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

jurídica obrigacional; 2) o sujeito passivo da ação, quando esta tiver por fundamento o

direito decaído; 3) os sucessores, a título universal ou particular, do sujeito passivo do

direito ou da ação; 4) qualquer terceiro a quem a eficácia do direito decaído acarretaria

prejuízo, representando a decadência o afastamento desse prejuízo" (DINIZ, 1994, p.

213).

Por fim, cabe ressaltar que "salvo disposição legal em contrário", o artigo 207 do

Código Civil em vigor estabelece que não se aplicam à decadência as normas que

impedem, suspendem ou interrompem a prescrição (artigos 197 até 204 do Código Civil

Brasileiro). Ou seja, com relação a decadência, a mesma não se suspende e nem se

interrompe e só é impedida pelo efetivo exercício do direito, dentro do lapso de tempo

pré-fixado (CÂMARA LEAL, 1948, p. 105 e 106, apud DINIZ, 1994, p. 214). Não

obstante, mais a frente, no item 02.04, que trata da "obstaculização da decadência",

debatermos com maior objetividade este assunto, no que concerne ao Direito do

Consumidor, sob a luz do artigo 26, parágrafo 02º, do Código de Defesa do

Consumidor.

02.01 - A Decadência no Direito do Consumidor

Superado o tema "decadência" sob a visão do Direito Civil, trataremos, então, de

direcionar o assunto para o Direito Consumerista, mais precisamente para o artigo 26

da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), o qual

estabelece:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação

caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não

duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos

duráveis.

Page 6: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

§ 1° Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do

produto ou do término da execução dos serviços.

§ 2° Obstam a decadência:

I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o

fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente,

que deve ser transmitida de forma inequívoca;

II – VETADO7;

III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.

§ 3° Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento

em que ficar evidenciado o defeito.

Como observamos, o artigo 26 e seus parágrafos 01º até 03º, do Código de

Defesa do Consumidor regulamenta a extinção do direito de reclamar em face de vícios

aparentes ou de fácil constatação, bem como os vícios ocultos, os quais fazem com que

os bens adquiridos ou os serviços prestados sejam inadequados ou impróprios para o

consumo (DENARI, 1996, p. 149).

Conforme se depreende pelos parágrafos 01º até 03º da supra mencionada

norma, os prazos estabelecidos dão evidentemente decadenciais, vez que tratam da

extinção do direito.

Em primeira análise ao referido artigo, nos dirigimos ao seu caput, onde nos

deparamos com a expressão "vícios aparentes ou de fácil constatação", a qual sofreu

crítica – acertada, no nosso entendimento – do professor Rizzatto Nunes, o qual

esclarece que o termo "aparente" não é dos melhores se analisado pela semântica, vez

que tal palavra tem o sentido de "aparência", daquilo que não é real; sendo que o vício,

pelo contrário, é algo bem real. Segundo Rizzato Nunes, o legislador tinha a intenção

de aproveitar do vocábulo o sentido de aparecimento, do que aparece, mas ele não se

presta a isso. Por conseguinte, o emérito Desembargador do Egrégio Tribunal de

Justiça Paulista, optou por abandonar o seu uso e permanecer tão somente com a

Page 7: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

outra expressão, "de fácil constatação", a qual, realmente, diz respeito ao sentido

desejado pela norma (NUNES, 2009, p. 376 e 377).

Ressalta o professor Rizzatto Nunes que "O que pretende a lei é que a garantia

legal com seus curtos prazos seja exercida pela fácil constatação da existência do vício,

isto é, pelo singelo uso e consumo do produto e do serviço" e exemplifica o caso em

que "[...] o consumidor adquire um televisor que não sintoniza os canais", caso em que,

a bem da verdade, "o vício é evidente e decorre no mero uso" (NUNES, 2009, p. 377).

Portanto, o vício abarcado pelo "caput" do artigo 26 do Código de Processo Civil

refere-se àquele que é facilmente constatado em relação ao bem e ao serviço quando

de sua utilização normal ou regular consumo.

Tratando-se de bens e serviços prestados de natureza "não durável", o Código

de Processo do Consumidor estabelece o prazo decadencial de 30 (trinta) dias para o

interessado reclamar quanto aos vícios de fácil constatação (ou "aparentes", de acordo

com a norma), conforme determina o inciso I do seu artigo 26.

Com relação ao bem ou serviço "não durável", podemos conceituá-los como "[...]

àqueles que se exaurem após o consumo [...]" (GARCIA, 2008, p. 164).

Os bens ou serviços não duráveis "[...] são àqueles que perecem ante um ato

isolado do consumidor. A sua utilização implica necessariamente a sua deterioração,

como ocorre com os medicamentos, produtos alimentícios etc." (NUNES JUNIOR e

SERRANO, 2008, p. 122).

No entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

"Entende-se por produtos não-duráveis aqueles que se exaurem no primeiro

uso ou logo após sua aquisição, enquanto que os duráveis, definidos por

exclusão, seriam aqueles de vida útil não-efêmera". (STJ, REsp. 114473/RJ,

Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 05/05/1997).

Portanto, em contraposição, os produtos duráveis, "[...] àqueles que não se

exaurem após o consumo, mas que também não se perpetuam, tendo sua vida útil"

Page 8: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

(GARCIA, 2008, p. 164), são regrados pelo inciso II, do mencionado artigo 26, que

concede um prazo decadencial três vezes maior, de 90 (noventa) dias, para que o

interessado reclame de um vício mais facilmente constatável.

Ocorre que a distinção entre bens duráveis e não duráveis, em alguns casos

especiais, se torna uma empreitada mais complexa que apenas se mostra viável após a

melhor análise do caso concreto, conforme podemos depreender pelo julgado que se

segue:

"Decadência – Inocorrência – Ação indenizatória – Sementes de graminídeas

– Entrega de produto diverso do comprado – Bem que não pode ser

equiparado ao não-durável, pois não se consome ou se destrói pelo simples

lançamento ao solo – Espécie sui generis de peculiaridades correlatas com

produtos duráveis, uma vez que o fim a que se destina somente vem a ser

conhecido após relativamente longo processo reprodutivo – Circunstâncias

que transcendem à conceituação binária do art. 26 da Lei 0.078/90" (RT

767/260).

O parágrafo 01º, do artigo 26 em estudo, discorre sobre o momento em que tem

início o prazo decadencial para os vícios facilmente constatáveis, firmando o seu

começo no instante da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos

serviços. Diferente dos vícios ocultos, como veremos em breve.

Com referência aos vícios ocultos, o parágrafo 03º do citado artigo 26,

estabelece que o prazo decadencial tem o seu início a partir do momento em que o

defeito for constatado.

O Professor Rizzatto Nunes, por sua vez, tece crítica ao mencionado parágrafo,

vez que entende existir um de erro de redação ao mencionar a palavra "defeito" em vez

de "vício", sob o argumento de que, sob o sistema do Código de Defesa do

Consumidor, "defeito" é diferente de "vício" (NUNES, 2009, 405).

"São considerados vícios as características de qualidade ou quantidade que

tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se

Page 9: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados

vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do

recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária" (NUNES, 2009,

180).

Por sua vez, o defeito "é o vício acrescido de um problema extra, alguma coisa

extrínseca ao produto ou serviço, que causa um dano maior que simplesmente o mau

funcionamento, o não-funcionamento, a quantidade errada, a perda do valor pago – já

que o produto ou serviço não cumpriram o fim ao qual se destinavam [...]" (NUNES,

2009, 181).

Realmente, a existência de um defeito presume que exista um vício, porém, pode

acontecer que um vício ocorra sem que haja defeito algum. Ambos estão relacionados,

mas, "em termos de dano causado ao consumidor" o defeito "é mais devastador"

(NUNES 2009, 181).

No que concerne aos vícios ocultos, estes "[...] são os que não são constatáveis

de plano; manifestam-se após algum tempo da aquisição do bem" (NUNES JUNIOR e

SERRANO, 2008, p. 123).

No cotidiano, muitas vezes adquirimos bens onde não nos é permitido constatar

com facilidade a existência de vícios, pois estes estão ocultos aos nossos olhos, a

nossa percepção natural.

O vício oculto, portanto, é aquele não detectável normalmente por uma pessoa

comum:

"Consumidor – Prestação de serviços – Manutenção de equipamentos

duráveis – Reparos em peças internas de tecnologia que não é de

conhecimento comum – Constatação de permanência do defeito após o

prazo de garantia de três meses – Circunstância que não acarreta em

decadência do direito de reclamar pela má prestação do serviço, pois trata-se

de vício oculto – Inteligência do art. 26, § 3º, da Lei 8.078/90 (1º TACCivSP)"

(RT 800/281).

Page 10: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

E, caracterizado o vício oculto, questiona-se qual seria o prazo máximo para que

se abra o prazo decadencial de 90 (noventa) dias, na forma do parágrafo 03º do supra

mencionado artigo 26, vez que a legislação vigente é absolutamente omissa nesse

sentido.

Nas palavras de Héctor Valverde Santana, "a noção em tela deve ser analisada

com vista à realidade do mercado que fornece produtos com durabilidade limitada. Não

é toda imperfeição do bem de consumo que configura o vício oculto. A questão deve

ser enfrentada mediante a consideração da vida útil de cada bem de consumo colocado

no mercado [...]" (SANTANA, p. 119, apud NUNES JUNIOR e SERRANO, 2008, p.

123).

Trata-se, acima de tudo, de uma questão de bom senso e coerência, haja vista

que se um produto possui determinada vida útil, o início do prazo decadencial em face

de um vício oculto não poderá estender-se pela eternidade, devendo respeitar o prazo

razoável de durabilidade do bem.

Traria evidente desequilíbrio na relação de consumo e conseqüente insegurança

jurídica à aplicação do parágrafo 03º do referido artigo 26, no sentido de se perpetuar o

começo do prazo decadencial em vício oculto que ocorresse após o tempo habitual de

duração de determinado bem, considerando que, com o uso freqüente, certos produtos

sofrerão o normal e conseqüente desgaste, o que, ao final da vida útil do bem,

escondem a anterioridade ou não do vício, sendo, nas palavras de Cláudia Lima

Marques, "causas alheias à relação de consumo como se confundem com a agora

revelada inadequação do produto para o seu uso normal" (MARQUES, 2002, p. 1022 a

1023, apud GARCIA, 2008, 165).

Este, aliás, vem sendo o entendimento de nossa jurisprudência:

"RESPONSABILIDADE CIVIL – DANOS MATERIAIS – VEÍCULO

AUTOMOTOR – PEÇA – RUPTURA POR FADIGA – CONDUÇÃO

ADEQUADA – VÍCIO OCULTO CONFIGURADO. Configura a ruptura da biela

por fadiga de material, inexistente prova de má condução do veículo por seu

Page 11: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

proprietário, presente a responsabilidade do fabricante pelas indenizações

devidas. Vício oculto configurado. Vida útil do bem de consumo que não pode

ficar restrita ao prazo de garantia do fabricante " (TJRS, Apel. Cível nº

70014964498. Des. Rel. Jorge Alberto Schreiner Pestana, DJ. 09/04/2007).

02.02 - A garantia contratual

O "caput" do artigo 50 do Código de Defesa do Consumidor regulamenta a

garantia contratual:

"Art. 50 – A garantia contratual é complementar à legal e será conferida

mediante termo escrito".

Temos por garantia legal àquela prevista nos incisos I e II do artigo 26 do Código

de Defesa do Consumidor; e por garantia contratual a estabelecida em contrato, na

forma disposta no artigo 50 e seu parágrafo único do mesmo diploma legal.

A garantia contratual faculta as partes pactuar a ampliação do prazo decadencial

para reclamar em relação aos vícios existentes, de forma a tornar o produto mais

atraente ao consumidor, que, evidentemente, vê com bons olhos a vantagem de ter o

produto adquirido resguardado por maior tempo do que o previsto em lei.

Não há, porém o que se falar em redução do prazo decadencial estabelecido no

Código de Defesa do Consumidor, sendo que a garantia contratual apenas poderá

aumentar o tempo previsto na norma consumerista, sem jamais afrontá-la com a

pretensão de reduzir o prazo decadencial.

O Professor Rizzatto Nunes, por sinal, entende que se "o fornecedor estipula

prazo igual ou inferior ao legal, nada esta oferecendo, podendo até incidir em punição

por prática de publicidade ou informação enganosa" (NUNES, 2009, p. 393).

Porém, o artigo 50, do Código de Defesa do Consumidor, em seu "caput",

menciona a palavra "complementar" a respeito da garantia contratual em relação à

Page 12: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

legal, o que resultou em debate doutrinário a respeito; se o prazo legal e o contratual se

acumulam ou não.

Mirella D'Angelo Caldeira, ao abordar o assunto, entende pela somatória dos

prazos legal e contratual em razão do vocábulo "complementar" ter sentido de

complemento ao prazo estabelecido em lei, dando como exemplo o caso do fornecedor

que garante que seu televisor funcionará corretamente até a próxima copa do mundo:

"[...] Caso surja um vício no último dia do prazo, o consumidor ainda terá 90 dias para

reclamar deste vício [...]". (CALDEIRA, 2005, p. 41).

Para Leonardo de Medeiros Garcia, "a garantia contratual será complementar à

garantia legal, possuindo existência distinta. Nesse sentido, os prazos estipulados no

art. 26 (chamados prazo de garantia legal) só começarão a correr depois do prazo de

garantia que o fornecedor oferecer de livre e espontânea vontade ao consumidor

(garantia contratual)" (GARCIA, 2008, p. 261).

E há julgados nesse mesmo sentido:

"Na compra e venda de veículo automotor, a abertura da contagem de prazo

decadencial para que o consumidor reclame de eventuais defeitos de

fabricação só pode ser feita a partir do vencimento do período de garantia

contratual de um ano dado pelo fabricante, nos termos do art. 50 da lei nº

8078/90". (1º TACSP, Apel. Cível 774309-9, j. 11/08/1998, Rel. Juiz Antonio

Rigolin).

"Consumidor – Compra e venda – Veículo automotor – Defeitos de fabricação

– Prazo decadencial para reclamação que flui a partir do vencimento do

período de garantia contratual de um ano dado pelo fabricante – Inteligência

do art. 50 da Lei 8.078/90" (RT 761/259).

A outra linha de entendimento é a de que o prazo legal e o contratual não se

somam, sendo contados igualmente ao mesmo tempo; ou seja, ao final do prazo

previsto em lei, seguirá em frente a apenas a prazo da garantia contratual, de forma

"complementar", até o prazo final estabelecido.

Page 13: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Entendemos, porém, que o termo "complementar" disposto no artigo 50, "caput",

do Código de Defesa do Consumidor não deixa margem a outra interpretação que não

seja a soma dos referidos prazos legal e contratual, pois, se de modo diverso fosse a

intenção do legislador, este não faria uso do vocábulo "complementar", o qual, na

norma em debate, tem sentido de "adicionar".

Quanto à "garantia estendida", da mesma maneira que a garantia contratual, é

também objeto de convenção entre as partes, sendo facultativa a sua aquisição pelo

consumidor, sobretudo porque é cobrada junto com o produto adquirido, com a

finalidade de estender a garantia do mesmo por mais tempo que o prazo estabelecido

na garantia contratual.

E o prazo da garantia estendida começa a correr após terminado o prazo da

garantia contratual somado ao prazo da garantia legal.

02.03 - A obstaculização da Decadência

O Código Civil Brasileiro de 2002 determina que "salvo disposição em contrário,

não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a

prescrição".

Rizzatto Nunes lembra que "Há na tradição jurídica nacional a posição firmada

de que os prazos decadenciais estabelecidos não se interrompem nem se suspendem,

enquanto os prazos prescricionais podem tanto interromper-se quanto suspender-se"

(NUNES, 2009, p. 390).

Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor apresentou uma novidade no

parágrafo 02º do seu artigo 26, ao utilizar a frase "Obstam a decadência", e deu partida

a intensos debates sobre os efeitos dessa ordem legal, se teria efeito interruptivo ou

suspensivo no prazo decadencial.

Page 14: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

A causa suspensiva, quando ocorre, paralisa o prazo que assim permanece até

que a referida causa deixe de existir, quando então, retoma o seu curso, aproveitando

todo o tempo já decorrido anteriormente.

Diferente é a causa interruptiva, a qual interrompe o prazo, inutilizando todo o

tempo até então decorrido, sendo que, quando a causa interruptiva termina a sua

existência, o prazo é reiniciado novamente do princípio, sem nada aproveitar do tempo

anterior.

Zelmo Denari, um dos autores do anteprojeto do Código de Defesa do

Consumidor, entende que o parágrafo 02º do artigo 26 da Lei nº 8.078/1990, dá efeito

suspensivo as causas ali elencadas. E sustenta seu posicionamento com o argumento

de que "[...] se a reclamação ou o inquérito civil paralisam o curso decadencial durante

um lapso de tempo (até a resposta negativa ou o encerramento do inquérito), parece

intuitivo que o propósito do legislador não foi interromper, mas suspender o curso

decadencial. Do contrário, não teria estabelecido um hiato, com previsão de um termo

final (dies a quo), mas, simplesmente, um ato interruptivo" (DENARI, 1996, p. 151).

A mesma posição é adotada por Nelson Nery Junior8 e Fábio Ulhoa Coelho9.

Sustentando que as causas dispostas no parágrafo 02º do artigo 26 do Código

de Defesa do Consumidor são interruptivas, encontram-se Cláudia Lima Marques10,

Luiz Edson Fachin11, Luiz Daniel Pereira Cintra12 e Odete Novais Carneiro Queiroz13

(GARCIA, 2008, P. 167).

A tese da interrupção, aliás, é defendida pelo robusto argumento de Hector

Valverde Santana14, de que o parágrafo único do artigo 27 do Código de Defesa do

Consumidor foi vetado pelo Presidente da República por reconhecer nele grave defeito

de formulação; haja vista que o dispositivo censurado determinava que seria

interrompida a prescrição nas hipóteses do parágrafo 01º do artigo 26 do mesmo

diploma lega, ocorrendo um erro de remissão, já que pretendia se referir às causas

obstativas do parágrafo 02º do artigo 26 da Lei nº 8.078/1990 (GARCIA, 2008, p. 167).

Page 15: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Em meio aos dois posicionamentos, Rizzatto Nunes, que chegou a postar-se

favorável a tese da suspensão do prazo decadencial, apontou para a solução proposta

pela Professora Mirella D'Angelo Caldeira, para quem não há o que se falar de efeito

suspensivo ou devolutivo (NUNES, 2009, p. 395).

Para a Mirella D'Angelo Caldeira "[...] a expressão obstar não foi adotada em

nenhum desses dois sentidos, [...]" (interruptivo e suspensivo) "[...] mas sim, no sentido

de exercício do direito, por dois motivos. Primeiro porque em se tratando de prazo

decadencial, o mesmo é insuscetível à interrupção, suspensão ou extinção, devendo

ocorrer de forma contínua e ininterrupta. Segundo porque o prazo decadencial refere-se

ao exercício de um direito potestativo, isto é, no prazo previsto em lei, o consumidor tem

que constituir o seu direito de reclamar por um vício existente no produto ou serviço,

sob pena de perdê-lo" (CALDEIRA, 2005, P. 47).

A reclamação do consumidor tem a finalidade de ou obter a solução do problema

decorrente do vício existente no produto ou serviço (aqui a resposta do fornecedor é

positiva) ou garantir, na hipótese de resposta negativa do fornecedor, bem como da

ausência de resposta, os seu direito de pleitear os direitos previstos em Lei, nas

hipóteses do parágrafo 01º do artigo 18, nos quatro incisos do artigo 19 e nos três

incisos do artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor (NUNES, 2009, p. 395).

Então, com a ocorrência das causas dispostas nos incisos I e III, parágrafo 02º

do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor, não haveria suspensão ou

interrupção do prazo decadencial do direito de reclamar, visto que este sendo exercido

pelo consumidor, com a resposta negativa do fornecedor ou a ausência de resposta, a

reclamação atinge o seu objetivo, fazendo nascer outro direito de natureza

condenatória, mas agora sob a égide do prazo prescricional do artigo 27 da Lei nº

8.078/1990, o qual regulamenta o tempo para o ajuizamento da ação que objetiva à

reparação por danos causados por fato do produto ou serviço, da forma da seção II do

Código de Defesa do Consumidor15.

Page 16: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

E aplica-se o prazo de qüinqüenal do artigo 27 da Lei nº 8.078/1990, haja vista

que se o vício não é solucionado pelo fornecedor, tal problema naturalmente acarretará

prejuízo ao consumidor, o qual terá o direito de ser indenizado.

02.04 - A reclamação pelo consumidor

O inciso I, parágrafo 02º, do artigo 26, em estudo, dispõe que obsta à decadência

"a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de

produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida

de forma inequívoca"

A norma determina que o consumidor comprove que formulou a reclamação

perante o fornecedor, não colocando nenhum impedimento para que seja efetuada de

forma verbal, seja pessoalmente ou por telefone.

Hector Valverde Santana16 observa que "[...] não há uma forma preestabelecida

para realizar a reclamação. Efetivamente, pode o consumidor, ou quem o represente

legalmente, apresentar sua reclamação perante o fornecedor por todos os meios

possíveis, seja verbal, pessoalmente ou por telefone, nos Serviços de Atendimento ao

Cliente (SAC), por escrito, mediante instrumento enviado pelo cartório de títulos e

documentos, carta registrada ou simples, encaminhada pelo serviço postal ou entregue

diretamente pelo consumidor, e-mail, fax, dentre outros. A exigência da lei é apenas

quanto à comprovação de que o fornecedor tomou ciência inequívoca quanto ao

propósito do consumidor de reclamar pelos vícios do produto ou serviço. A reclamação

verbal é válida, podendo ser provada mediante a oitiva de testemunhas. Ressalte-se

que a reclamação por escrito deve ter a preferência do consumidor, pois é meio mais

seguro em caso de necessidade de comprovação em eventual processo judicial"

(SANTANA, 2002, p. 128, apud GARCIA, 2008, p. 168).

Com relação à validade da reclamação verbal para obstar a decadência, na

forma do inciso I, parágrafo 02º, do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor, o

Egrégio Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou em sentido favorável:

Page 17: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

"A reclamação verbal seria suficiente a obstar os efeitos da causa extintiva

(decadência) se efetivamente comprovada" (STJ. REsp 156760/SP, voto do

Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ. 22/03/2004).

No caso da reclamação verbal, quando efetuada pessoalmente pelo consumidor,

como já exposto, é possível ao mesmo comprovar que a efetuou pessoalmente perante

o fornecedor através, por exemplo, de testemunha que presenciou o ato da reclamação.

O consumidor também poderá realizar a sua reclamação verbal por telefone;

meio adotado pela maioria das grandes empresas, que organizam um Serviço de

Atendimento ao Consumidor (S.A.C.) com a finalidade de manter aberto um canal direto

de comunicação com seus clientes.

Aliás, Rizzatto Nunes lembra que "não se deve olvidar da realidade do mercado

e da dinâmica do atendimento existente. São centenas de empresas que têm colocado

à disposição do cliente os Serviços de Atendimento ao Consumidor, conhecidos como

SACs, exatamente para receber, via telefone, as reclamações relativas a vícios dos

produtos e dos serviços".

E complementa "Supor que o consumidor, em vez de servir-se desse

atendimento oferecido, vá burocratizar a relação, preparando um documento escrito e

remetendo-o pelo Cartório, é ir contra o andamento natural das relações de consumo.

Além de que, como o SAC é oferecido pelo fornecedor, como serviço posto à

disposição do consumidor, ele integra a oferta e, como ela, vincula o ofertante (arts. 30

e s.)" (NUNES, 2009, 398).

Não obstante, a questão é como comprovar a reclamação verbal efetuada por

telefone, haja vista a evidente dificuldade, neste caso, da produção de prova

testemunhal em seu favor.

O Decreto 6.523, de 31 de julho de 2008, vigente desde de 01º de dezembro de

2008, veio regulamentar os Serviços de Atendimento ao Consumidor (S.A.Cs.)

colocados à disposição dos consumidores pelas empresas. O artigo 15 do referido

Page 18: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Decreto passou, então, a regrar o que, na prática, já vinha sendo feito parcialmente

pela maioria das empresas:

Art. 15 - Será permitido o acompanhamento pelo consumidor de todas as

suas demandas por meio de registro numérico, que lhe será informado no

início do atendimento.

§ 1º - Para fins do disposto no caput, será utilizada sequência numérica única

para identificar todos os atendimentos.

§ 2º - O registro numérico, com data, hora e objeto da demanda, será

informado ao consumidor e, se por este solicitado, enviado por

correspondência ou por meio eletrônico, a critério do consumidor.

§ 3º - É obrigatória a manutenção da gravação das chamadas efetuadas para

o SAC, pelo prazo mínimo de noventa dias, durante o qual o consumidor

poderá requerer acesso ao seu conteúdo.

§ 4º - O registro eletrônico do atendimento será mantido à disposição do

consumidor e do órgão ou entidade fiscalizadora por um período mínimo de

dois anos após a solução da demanda.

Os S.A.Cs., ao receberem um requerimento por parte do consumidor, devem

fornecer ao mesmo um número de protocolo, com que formalizam o pedido ou

reclamação; o que, desde a vigência do Decreto nº 6.523/2008, passou a ser

obrigatório, bem como ter acesso à gravação da chamada efetuada para o Serviço de

Atendimento ao Consumidor e ao registro eletrônico do atendimento.

Em teoria, ao menos, trata-se se um considerável e bem-vindo avanço na

proteção ao consumidor, que tem a defesa de seu direito mais facilitada, em vista da

possibilidade de gerar a prova necessária em seu favor quanto ao ato da reclamação

apresentada, tendo como base o disposto no artigo 06º, inciso VIII, da Lei nº

8.078/1990.

Page 19: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

O professor Rizzatto Nunes, aliás, vai mais distante, e esclarece que "o uso pela

norma no inciso I do termo 'comprovadamente' não implica que o ônus da prova seja do

consumidor. Aplica-se ao caso plenamente a regra do inciso VIII do art. 6º, com o que,

no caso concreto, poder-se-á determinar a inversão do ônus da prova para deixar

comprovada a reclamação feita pelo consumidor" (NUNES, 2009, p. 398 e 399).

02.05 - A reclamação perante órgãos de defesa do consumidor

As causas que obstam a decadência estão elencadas, de forma taxativa, nos

incisos I e III, § 02º do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor.

Ocorre que o inciso II foi vetado pelo Presidente da República, sob o argumento

de que "O dispositivo ameaça a estabilidade das relações jurídicas, pois atribui a

entidade privada função reservada, por sua própria natureza, aos agentes públicos (e.g.

Cod. Civil, art. 172 e Cod. Proc. Civil, art. 219, § 1º)"17.

Dizia o inciso vetado:

§ 2º - Obstam a decadência:

[...]

II – a reclamação formalizada perante os órgãos ou entidades com

atribuições de defesa do consumidor, pelo prazo de noventa dias;

[...]

Ou seja, a reclamação efetuada pelo consumidor perante os órgãos ou entidades

que promovem a defesa do consumidor encontra-se fora do rol taxativo do parágrafo

02º do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor, que possibilita obstar à

decadência.

Sobre o assunto, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu:

Page 20: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

"Não obsta a decadência a simples denúncia oferecida ao Procon, sem que

se formule qualquer pretensão, e para a qual não há cogitar de resposta"

(STJ, REsp 65498/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 16/12/1996).

Não obstante, compreendemos que tal posicionamento deverá sofrer alterações

no futuro, haja vista a crescente e benéfica atuação dos órgãos e entidades que

promovem a defesa do consumidor, que, cada vez mais, vêm conquistando o seu

espaço.

Todavia, o Professor Rizzato Nunes defende a possibilidade da reclamação

efetuada perante órgãos e entidades de defesa do consumidor obstar à decadência.

Para ele, "as razões do veto são equivocadas".

Rizzatto Nunes baseia-se no direito de associação, garantia fundamental da

Carta Magna de 1988 (conforme o inciso XVII do artigo 05º) e no fato que as

Organizações Não-Governamentais (as denominadas O.N.Gs.) têm exercido

progressiva influência na defesa dos direitos das pessoas, tendo atuação importante

perante o Direito do Consumidor. Ressalta que o próprio Código de Defesa do

Consumidor "[...] expressamente dá legitimidade para que a associação privada possa

propor ações judiciais para a defesa dos interesses e direitos difusos, coletivos e

individuais homogêneos dos consumidores (art. 82, IV, c/c o art. 81 e parágrafo

único18). Dá mesma forma a Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347, de 24-7-1985)

garante que as ações que ela regula possam ser propostas por associação privada (art.

5º)19". (NUNES, 2009, p. 399 e 400).

Assim, o ilustre professor questiona: "[...] se uma entidade privada de defesa do

consumidor tem garantida legalmente a prerrogativa de ingressar com ações judiciais

para a defesa dos direitos individuais homogêneos, coletivos e difusos que envolvem

centenas, milhares e toda a comunidade de consumidores, por que não teria

legitimidade para deles receber reclamação a ser encaminhada para os fornecedores?"

(NUNES, 2009, p. 400).

Page 21: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Em sua crítica, Rizzatto Nunes lembra que o questionado veto gerou um

problema ainda maior, pois, além de atingir as entidades privadas, também abarcou as

públicas, acarretando uma grave lacuna. Para ele, "[...] se não se aceitar a reclamação

feita perante o Procon obsta a decadência, estar-se-á praticando verdadeira

'publicidade enganosa pública' contra os consumidores, que poderão perder seu direito

de reclamar por acreditar que fizeram o certo: foram ao Procon fazer reclamação. Não

tem cabimento que o Estado coloque à disposição do consumidor um órgão para

defendê-lo e depois se possa dizer a esse consumidor que, exatamente por ter ido

àquele órgão, seu direito caducou!" (NUNES, 2009, p. 401).

Realmente, os órgãos públicos de defesa do consumidor têm poderes mais

amplos, conforme depreende pelos artigos 5520, "caput", 55, § 01º21, e 5622 e incisos,

do Código de Defesa do Consumidor e, sendo assim, realmente, também nos parece

um contra-senso que não seja possível obstar à decadência a reclamação que lhe é

apresentada pelo consumidor, tratando-se, como lembra Rizzatto Nunes, "de mero

direito individual" (NUNES, 2009, p. 402).

Diante do exposto, o eminente Professor conclui que "A reclamação do

consumidor perante o órgão público – qualquer que seja ele: PROCON, serviço de

Vigilância Sanitária, Banco Central, Contru, IPEM, SUSEP, Departamento de Proteção

e Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça etc. – obsta (só pode) o decurso do

prazo decadencial, porque: a) essa é a teleologia do sistema e é o sentido que se deve

dar ao termo "perante" da redação do inciso I do § 2º, conforme explicaremos; b) quem

pode o mais, pode o menos. Se o órgão público de defesa do consumidor pode fechar

um estabelecimento, inutilizar produtos, cassar licenças etc., pode receber reclamação

dos consumidores, com efeito favorável à garantia do seu direito individual

(obstaculização da decadência)" (NUNES, 2009, p. 402).

E completa, quanto à redação do inciso I, § 02º, do artigo 26 em estudo, que "é

de ter, então, como válida a reclamação formulada pelo consumidor junto a órgão

público, por força da teleologia do § 2º e com base no vocábulo 'perante' utilizado. Com

efeito, quando a norma disse 'perante', não quis dizer apenas diretamente ao

fornecedor, mas também, indiretamente, por intermédio do órgão público de defesa do

Page 22: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

consumidor. E, conseqüentemente, a data da obstaculização é a do dia da

apresentação da reclamação no órgão público" (NUNES, 2009, p. 402 e 403).

Deveras, o inconformismo e a crítica do Professor Rizzatto Nunes tem razão de

existir, haja vista que, sem sombra de dúvida, o questionado veto presidencial peca

pela falta de razoabilidade.

Restringir a atuação das entidades e órgãos privados na atuação plena da

defesa do consumidor é, antes de tudo, um verdadeiro desserviço à sociedade; além de

que, não há o que se falar em "ameaça das relações jurídicas" em face de atribuição

própria dos agentes públicos à entidade privada, conforme expõe as razões do veto,

por absoluta ausência de disposição legal impeditiva para a situação em específico.

Entretanto, o veto do citado inciso II, tem os seus efeitos, deixando, por

enquanto, as reclamações dirigidas às entidades e órgãos privados de defesa do

consumidor fora do rol taxativo do parágrafo 02º do artigo 26 da Lei nº 8.078/1990.

Neste sentido, temos a decisão do Colendo Tribunal de Justiça do Distrito

Federal e Territórios:

"CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS. MUDANÇA. TRANSPORTADORA. CDC.

DECADÊNCIA. DANO MORAL. NÃO-CONFIGURAÇÃO. I – A reclamação

que obsta a decadência é aquela formulada perante o fornecedor e não aos

órgãos de proteção e defesa do consumidor, segundo dispõe o art. 26 do

CDC. II – Inexiste nos autos o acordo firmado entre as partes, no qual a

transportadora-ré assumiu a obrigação de enviar um representante para

conferir a mudança da autora, portanto não demonstrado o descumprimento

da avença. III - Não configura dano moral a devolução de cheques por

insuficiência de fundos, se a negativação do nome da autora não ocorreu por

ordem da empresa-ré. IV – Apelação conhecida e improvida. Unânime"

(TJDF, Apelação Cível nº 2004011071468-0, 4ª Turma, Rel. Des. Vera

Andrighi, publicado no D.J.U. de 05/09/2006).

Page 23: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Quanto à reclamação dirigida às entidades e órgãos públicos de defesa do

consumidor, tem razão o Professor Rizzatto Nunes, não apenas em face de seus

lúcidos argumentos, mas, também porque a própria razão do debatido veto expressa,

com todas as letras, sua reprovação tão somente em face dos órgãos e entidades

privadas, os quais não poderiam ter atribuições próprias dos agentes públicos. Essa foi,

strictu sensu, a mensagem do veto presidencial.

Compreendemos, diante de todo o exposto, pela possibilidade da obstaculização

do prazo decadencial diante da reclamação efetuada ao órgão ou entidade pública de

defesa do consumidor.

E a jurisprudência vem acolhendo esse entendimento:

"CIVIL. CONSUMIDOR. MATERIAL DE CONTRUÇÃO DEFEITUOSO.

RECLAMAÇÃO NO PROCON. ACORDO. DECADÊNCIA INOCORRIDA.

CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. DANO MATERIAL E MORAL

COMPROVADO. INDENIZAÇÃO DEFERIDA. RECURSO IMPROVIDO À

UNANIMIDADE. I – A reclamação formulada junto ao Procon, onde houve a

ciência do fornecedor, é causa que obsta a decadência prevista no artigo 26

do CDC.II – Para a retomada da fluência do prazo decadencial é necessária a

negativa expressa e inequívoca do fornecedor quanto ao pleito do

consumidor. III – Resposta oferecida ao Procon, por ocasião de notificação de

descumprimento de acordo, onde o consumidor não tomou ciência e não está

expresso de forma inequívoca a negativa do fornecedor, não gera a retomada

do prazo decadencial.IV – Comprovada a entrega de material de construção

defeituoso pela apelante, o ressarcimento do prejuízo ao consumidor é

medida que se impõe.V – É devido o pagamento de estada em hotel quando

de nova reforma do imóvel, por culpa exclusiva do apelante.VI – A demora

em resolver o problema gerado pelo fornecedor, gerando constrangimento ao

consumidor caracteriza-se dano moral. VII – Recurso Improvido. Unânime"

(TJDF – 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais,

Apelação Cível no Juizado Especial, Processo nº 2003.01.1.114542-5, Rel.

Juiz Alfeu Machado, publicado no D.J.U, em 17/06/2004).

Page 24: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESSARCIMENTO - AGRAVO RETIDO -

RESPONSABILIDADE DA TELEMAT CONFIGURADA - REJEIÇÃO DE

PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E DE

FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO COM A EMPRESA EMBRATEL -

PREJUDICIAL DE MÉRITO - RECLAMAÇÃO FORMULADA PELO

CONSUMIDOR NO PROCON - FATO OBSTATIVO DA DECADÊNCIA - ART.

26, § 2º, DO CDC -MÉRITO - SERVIÇOS DE TELEFONIA NÃO

PRESTADOS, PORÉM PAGOS PELO USUÁRIO - CONFISSÃO

EXTRAJUDICIAL, VIA PREPOSTO DA RÉ, NÃO IMPUGNADA PELOS

MEIOS LEGAIS - VALIDADE PLENA - ART. 353 DO CPC -INDENIZAÇÃO

PERTINENTE - CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS LEGAIS DE 6% AO

ANO - INCIDÊNCIAA PARTIR DO PREJUÍZO MATERIAL SUPORTADO

PELO CREDOR -DECISÃO MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO. A

reclamação formulada pelo usuário no PROCON obsta o prazo decadencial

do direito de reclamar por vícios ocultos ou de difícil constatação, em se

tratando de fornecimento de serviço contratado sob o manto do Código de

Defesa do Consumidor. A confissão expressa e não impugnada pelos meios

legais e moralmente legítimos,nos moldes dos artigos 348 e 353 do CPC , faz

prova contra o confitente e via de regra importa na veracidade dos fatos

alegados na petição inicial" (TJMT, Apelação Civil nº 27858/2003 – classe II-

20 – Comarca da Capital, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j.

01/12/2003).

02.06 - A instauração do inquérito civil

O inciso III, § 02º, do artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor determina

que a instauração de inquérito civil, até o seu encerramento, obsta à decadência.

Ou seja, a reclamação efetuada perante o Ministério Público possibilita a

instauração de inquérito civil, conforme o artigo 08º, parágrafo 01º da Lei nº

Page 25: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

7.347/198523. E, desde a instauração do inquérito civil até o seu encerramento, terá

obstada a decadência.

Entre as formas de reclamação colocadas à disposição do consumidor,

certamente, esta é a menos comum de ocorrer.

No entanto, Rizzato Nunes nos chama a atenção quanto ao texto da referida

norma, uma vez que a mesma menciona, como momento da obstaculização a

"instauração do inquérito civil" e não a reclamação efetuada perante o Ministério

Público.

Ocorre que entre o ato da reclamação pelo consumidor e a instauração do

inquérito civil, pode levar dias, por motivos alheios à vontade do Parquet, em face das

providenciais iniciais para a que o inquérito seja convenientemente instaurado,

podendo, desta forma, ultrapassar o prazo decadencial previsto no Código de Defesa

do Consumidor.

Também, poderá o Ministério Público compreender que não há razão para

promover o inquérito civil e, assim sendo, este não é instaurado, também ultrapassando

o prazo decadencial previsto na norma consumerista.

Temos, então, duas situações em que, por força do disposto no inciso III, § 02º,

do artigo 26 da Lei nº 8.078/1990, o consumidor sofrerá a decadência de seu direito,

muito embora tenha apresentada a reclamação de forma tempestiva perante o

Ministério Público.

Para o Professor Rizzatto Nunes, portanto, "a lei disse menos do que deveria", e

argumenta que a norma do referido inciso III deve ser interpretada de forma extensiva,

de maneira que o início da obstaculização à decadência ocorra com a apresentação da

reclamação perante o Ministério Público.

Trata-se, evidentemente, do entendimento mais sensato, levando em conta o

espírito da mensagem contida na norma em estudo; a qual, aliás, deve ser interpretada

da maneira mais favorável ao consumidor.

Page 26: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

03 - A Prescrição

O termo "prescrição" procede do vocábulo latino "praescriptio", formado de "prae"

e "scribere", com a significação de "escrever antes" ou "no começo". Tem por objeto as

ações, visto ser uma exceção oposta ao exercício da ação com a finalidade de extingui-

la, tendo por fundamento um interesse jurídico social (DINIZ, 1994, p. 201 e 202).

Maria Helena Diniz, em relação á prescrição, ressalta que "Esse instituto foi

criado como medida de ordem pública para proporcionar segurança às relações

jurídicas, que seriam comprometidas diante da instabilidade oriunda do fato de se

possibilitar o exercício da ação por tempo indeterminado. Constitui-se como uma pena

para o negligente, que deixa de exercer seu direito de ação, dentro de certo prazo, ante

uma pretensão resistida" (DINIZ, 1994, p. 202).

Pontes de Miranda, conforme menção feita por Maria Helena Diniz, ensina que a

prescrição é "uma exceção que alguém tem contra o que não exerceu, durante um

lapso de tempo fixado em norma, sua pretensão" (DINIZ, 1994, p. 202).

Porém, o próprio artigo 189 do Código Civil de 2002 encarrega-se de esclarecer

sobre a prescrição:

Art. 189 – Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se

extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Ou seja, a prescrição é o término do prazo para que o titular de um direito que

tenha sido violado efetue alguma pretensão.

No vigente Código Civil Brasileiro, a prescrição é disciplinada pelos artigos 189 até 206,

onde constam a sua aplicação (artigos 189 até 196), causas de impedimento24 ou

suspensão25 (artigos 197 até 201), causas de interrupção26 (que só poderá ocorrer uma

única vez27) da prescrição (artigos 202 até 204) e seus respectivos prazos (artigo 205 e

206).

Page 27: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

E para que se configure a prescrição, necessário que se apresentem quatro

requisitos: 1º) que exista uma ação exercitável - seu objeto -, em face da violação do

direito que a ação objetiva remover; 2º) que ocorra a inércia do titular da ação pelo seu

não-exercício - sua causa eficiente -, mantendo-se passivo diante do direito violado e

permitindo que assim permaneça; 3º) que a inércia continue durante um determinado

lapso temporal - seu fator operante - haja vista que a norma jurídica objetiva punir a

inércia prolongada; 4º) que não exista nenhum fato ou ato que a lei confere eficácia

impeditiva, suspensiva ou interruptiva de curso prescricional - seu fator neutralizante

(DINIZ, 1994, 203).

Fato recente a respeito da prescrição deu-se com o advento da Lei nº 11.280, de

16 de fevereiro de 2006, a qual também revogou o artigo 194 dfo Código Civil de 2002,

que tratava da prescrição e estabelecia que "O juiz não pode suprir, de ofício, a

alegação de prescrição, salvo se favorecer a absolutamente incapaz".

O mesmo diploma legal também alterou a redação do § 05º, artigo 219 do

Código de Processo Civil, determinando que "O juiz pronunciará, de ofício, a

prescrição", trazendo para o magistrado a obrigatoriedade de reconhecê-la e declará-la

de ofício, independente do impulso das partes.

Como a decadência, a prescrição também é causa de resolução de mérito, na

forma do inciso IV do artigo 269 do Código Civil Brasileiro.

03.01 - A Prescrição no Direito do Consumidor

O artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor trata do instituto da prescrição:

Art. 27 – Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos

causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste

Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano

e de sua autoria.

Page 28: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Parágrafo único – (VETADO)28.

Portanto "O artigo trata da prescrição do direito de pleitear judicialmente a

reparação pelos danos causados por um acidente de consumo (responsabilidade pelo

fato do produto e do serviço – arts. 12 a 17)" (GARCIA, 2008, p. 171).

Leonardo de Medeiros Garcia, ressalta o ensinamento de Zelmo Danari29 que "a

responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço decorre da exteriorização de um

vício de qualidade, vale dizer, de um defeito capaz de frustrar a legítima expectativa do

consumidor quanto à sua fruição. (...) um produto ou serviço é defeituoso, da mesma

sorte, quando sua utilização ou fruição é capaz de adicionar riscos à segurança do

consumidor ou de terceiros. Nesta hipótese, podemos aludir a um vício ou defeito de

insegurança do produto ou serviço. (...) A insegurança é um vício de qualidade que se

agrega ao produto ou serviço como um novo elemento de desvalia. De resto, em ambas

as hipóteses, sua utilização ou fruição suscita um evento danoso (eventus damni) que

se convencionou designar 'acidente de consumo'" (GARCIA, 2008, p. 171 e 172).

Levanta-se, no entanto, a questão quanto à aplicação da regra estabelecida no

artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor, se estaria tão somente restrita a

acidentes de consumo (a existência de vício de qualidade por insegurança) ou se seria

possível aplicá-la de forma geral a todas as ações indenizatórias resultantes de uma

relação de consumo.

Na opinião de Leonardo de Medeiros Garcia "Ao que parece, o CDC não desejou

disciplinar toda espécie de responsabilidade. Somente o fez em relação àquelas que

entendeu ser específicas para relações de consumo. Nesse sentido é que deu

tratamento diferenciado para a responsabilidade pelo fato e por vício do produto e

serviço, deixando outras modalidades de responsabilidade serem tratadas em normas

específicas ou no Código Civil" (GARCIA, 2008, p. 172).

Por essa ótica, não haveria o que se falar, então, em generalizar a aplicação do

referido artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor a todas as ações indenizatórias

com origem em relação de consumo, mas tão somente àquela taxativamente prevista

Page 29: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

na norma, limitando o seu emprego às situações relativas à reparação pelos danos

causados por fato do produto ou do serviço previstos nos artigos 12, 13 e 14 do Código

de Defesa do Consumidor, que regulam especificamente a responsabilidade civil pela

reparação dos danos causados pelo fornecedor aos consumidores em razão de

defeitos relativos ao produto ou à prestação do serviço.

E na mesma direção temos o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de

Justiça:

"O art. 27 do mesmo diploma legal cuida somente das hipóteses em que

estão presentes vícios de qualidade do produto por insegurança, ou seja,

casos em que o produto traz um vício intrínseco que potencializa um acidente

de consumo, sujeitando-se o consumidor a um perigo eminente" (STJ, REsp

114473 / RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 05/05/1997).

Nesse mesmo sentido:

"Em ação de indenização, sendo a causa de pedir o inadimplemento

contratual, não incide o prazo prescricional estabelecido no art. 27 do CDC,

aplicável somente à hipótese de danos decorrentes de acidente de consumo"

(STJ, REsp 476.458-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04/08/2005).

"A ação de indenização decorrente do inadimplemento do contrato de

transporte, por atraso de vôo, não se aplica o art. 26 do Código de Defesa do

Consumidor, dispondo essa norma a propósito da decadência em trinta (30)

dias no caso de vício aparente, de fácil constatação. De qualquer forma, nos

termos da jurisprudência deste Tribunal, o prazo prescricional do art. 177 do

Código Civil (CC/1916) subsiste mesmo com o advento do Código de Defesa

do Consumidor, considerando que suas disposições não se confundem"

(STJ, Resp 304705-RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ

13/08/2001).

"O Código de Defesa do Consumidor, como lei nova, estabeleceu disciplina

especial apenas quanto à ação de reparação de danos por fato de serviço,

Page 30: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

não revogando o art. 178, § 6º, II, do Código Civil (206, § 1º, II do Novo

Código Civil), dispositivo mais amplo, pois engloba toda e qualquer ação

entre segurado e segurador. A jurisprudência desta Corte, consolidada por

sua Súmula 101, posterior, inclusive, ao Código de Defesa do Consumidor, é

no sentido de que a ação do segurado contra a seguradora, decorrente do

contrato de seguro, prescreve em um ano" (STJ, REsp 255147-RJ, DJ

02/04/2001, Rel. Min. Waldemar Zveiter).

Não obstante as divergências doutrinárias, o Egrégio Superior Tribunal de

Justiça vem interpretando o artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor de modo

mais amplo, entendendo que o prazo de cinco anos, disposto na norma, deverá ser

aplicada toda ver que existir ação de natureza condenatória em uma relação de

consumo.

No entanto, Leonardo de Medeiros Garcia ressalta que o S.T.J. não vem

aplicando, de forma pacífica, o prazo do artigo 27 no caso de ações entre segurados e

seguradora, no que emprega o prazo prescricional de um ano, na forma do artigo 206,

parágrafo 01º, inciso II, do Código Civil Brasileiro (GARCIA, 2008, 174).

Todavia, mesmo não sendo caso de acidente de consumo, o Superior Tribunal

de Justiça tem entendido pela aplicação do artigo 27, estabelecendo a prescrição

qüinqüenal:

"Direito do consumidor. Oferecimento de curso de mestrado. Posterior

impossibilidade de reconhecimento, pela CAPES/MEC, do título conferido

pelo curso. Alegação de decadência do direito do consumidor a pleitear

indenização. Afastamento. Hipótese de inadimplemento absoluto da

obrigação da instituição de ensino, a atrair a aplicação do art. 27 do CDC.

Alegação de inexistência de competência da CAPES para reconhecimento do

mestrado, e de exceção por contrato não cumprido. Ausência de

prequestionamento. Na esteira de precedentes desta Terceira Turma, as

hipóteses de inadimplemento absoluto da obrigação do fornecedor de

produtos ou serviços atraem a aplicação do art. 27 do CDC que fixa prazo

Page 31: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

prescricional de cinco anos para o exercício da pretensão indenizatória do

consumidor" (STJ, REsp 773994-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ

18/06/2007).

"Consumidor. Recurso especial. Danos decorrentes de falha na prestação do

serviço. Publicação incorreta de nome e número de assinante em listas

telefônicas. Ação de indenização. Prazo. Prescrição. Incidência do art. 27 do

CDC e não do art. 26 do mesmo código. – O prazo prescricional para o

consumidor pleitear o recebimento d indenização por danos decorrentes de

falha de prestação de serviço é de 5 (cinco) anos, conforme prevê o art. 27 do

CDC, não sendo aplicável, por conseqüência, os prazos de decadência,

previstos no art. 26 do CDC. – A ação de indenização movida pelo

consumidor contra a prestadora de serviço, por danos decorrentes de

publicação incorreta de seu nome e/ou número de telefone em lista

telefônica, prescreve em cinco anos, conforme o art. 27 do CDC" (STJ, REsp

722510-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 01/02/2006).

Acompanhando a posição mais ampla do Superior Tribunal de Justiça, o

Professor Rizzatto Nunes ensina que o prazo prescricional do artigo 27 do Código de

Defesa do Consumidor refere-se ao direito de "pleitear indenização por defeito"

conforme a Seção II do Capítulo IV desse mesmo diploma legal; no que "o defeito gera

um dano material (dano emergente e/ou lucros cessantes) e/ou moral, criando o direito

do consumidor de receber indenização por tais danos". (NUNES, 2009, p. 405).

Rizzatto Nunes expõe que "[...] a referida Seção II regula toda espécie de defeito

que ocorre pelo fato do produto ou do serviço, de maneira que, sempre que o

consumidor sofrer dano por defeito que diretamente, como lá está expressamente

tratado, quer indiretamente, como conseqüência do não-cumprimento da obrigação de

resolver o vício, conforme estabelecido no inciso II do § 1º do art. 18, no inciso III do art.

19 e no inciso II do art. 20, aplica-se o período prescritivo fixado no artigo em comento".

E conclui: "Na verdade, toda e qualquer situação relativa a relação jurídica de consumo

que gerar dano por defeito está enquadrada na norma do art. 27" (NUNES, 2009, p.

405).

Page 32: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Nessa esteira, no confronto de prazos prescricionais entre o Código de Defesa

do Consumidor e o Código Civil, em face de pretensão a ressarcimento pelo dano civil

causado em uma situação relativa à relação jurídica de consumo, não haveria o que se

falar no prazo trienal do artigo 206, parágrafo 03º, inciso V, do Código Civil de 2002,

prevalecendo o prazo qüinqüenal do Código de Defesa do Consumidor (NUNES, 2009,

p. 407).

Não obstante, temos situações extraordinariamente interessantes como a

decisão do Supremo Tribunal Federal (infra transcrito na íntegra) que, em o caso de

indenização de danos causados em contrato de transporte internacional, decidiu pela

aplicação do prazo prescricional de dois anos previsto no artigo 29 da Convenção de

Varsóvia30:

RE 297.901 – S.T.F.

Segunda Turma

Recurso Extraordinário 297.901-5 Rio Grande do Norte

Relatora : Min. Ellen Gracie

Recorrente : Viação Aérea São Paulo S/A - Vasp

Advogados : João Câncio Leite de Melo e Outros

Recorrida : Janekelly Ribeiro Rêgo

Advogados : Camila Léllis Galvão de Souza e Outro

PRAZO PRESCRICIONAL. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA E CÓDIGO DE

DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. O art. 5º, § 2º, da Constituição Federal se

refere a tratados internacionais relativos a direitos e garantias fundamentais,

matéria não objeto da Convenção de Varsóvia, que trata da limitação da

responsabilidade civil do transportador aéreo internacional (RE 214.349, rel.

Min. Moreira Alves, DJ 11.6.99). 2. Embora válida a norma do Código de

Defesa do Consumidor quanto aos consumidores em geral, no caso

específico de contrato de transporte internacional aéreo, com base no art. 178

da Constituição Federal de 1988, prevalece a Convenção de Varsóvia, que

determina prazo prescricional de dois anos. 3. Recurso provido.

Page 33: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo

Tribunal Federal, em Segunda Turma, sob a Presidência do Senhor Ministro

Celso de Mello, na conformidade da ata de julgamento e das notas

taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe

provimento, nos termos do voto da relatora.

Brasília, 7 de março de 2006.

Ellen Gracie - Relatora

Supremo Tribunal Federal

Diário da Justiça de 31/03/2006

R E L A T Ó R I O

A Senhora Ministra Ellen Gracie: 1. Trata-se de recurso extraordinário, com

fulcro no art. 102, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão da Turma

Recursal dos Juizados Especiais Cível e Criminal de Natal, Estado do Rio

Grande do Norte. 2. A decisão recorrida entendeu que, no conflito entre as

normas do Código de Defesa do Consumidor e da Convenção de Varsóvia

sobre a prescrição, em ação de indenização do passageiro contra empresa

aérea, prevalecem as disposições mais favoráveis do Código, que

estabelecem o prazo prescricional de cinco e não de dois anos. 3. A

recorrente sustenta que a decisão recorrida ofende os arts. 5º, § 2º, e 178 da

Constituição Federal. Argumenta que prevalecem, no âmbito interno, as

normas estabelecidas em tratados internacionais, pois estes têm hierarquia

superior às leis. Por outro lado, afirma ainda, a Convenção de Varsóvia é lei

especial, e o Código de Defesa do Consumidor é lei geral, e aquela se

sobrepõe a este, como determina a Lei de Introdução ao Código Civil. 4. As

contra-razões pugnam pela manutenção da decisão recorrida (fls. 110/117).

O parecer da Procuradoria-Geral da República opina pelo não-provimento do

recurso (fls. 127/131).

É o relatório.

V O T O

Page 34: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

A Senhora Ministra Ellen Gracie - (Relatora): 1. No julgamento de caso

semelhante, a Primeira Turma desta Corte entendeu que a alegação de

ofensa ao art. 5º, § 2º, da Constituição Federal não ocorre, pois esse

dispositivo se refere a tratados internacionais relativos a direitos e garantias

fundamentais, matéria não objeto da Convenção de Varsóvia, que trata da

limitação da responsabilidade civil do transportador aéreo internacional (RE

214.349, rel. Min. Moreira Alves, DJ 11.6.99). Não é cabível, pois, o recurso

extraordinário nesse ponto. 2. Já no que se refere à sustentada supremacia

da Convenção de Varsóvia, com relação ao Código de Defesa do

Consumidor, observo que, no julgamento de conflito entre norma da

Convenção de Genebra e o Decreto-Lei 427/69, o Plenário do Supremo

Tribunal Federal entendeu que leis internas posteriores revogam os tratados

internacionais (RE 80.004, redator para o acórdão o Min. Cunha Peixoto, DJ

29.12.77). Não obstante, na hipótese ora em julgamento, cabe observar que o

art. 178 da Constituição Federal de 1988 expressamente estabeleceu que,

quanto à ordenação do transporte internacional, a lei observará os acordos

firmados pela União. Assim, embora válida a norma do Código de Defesa do

Consumidor quanto aos consumidores em geral, no caso de contrato de

transporte internacional aéreo, em obediência à norma constitucional antes

referida, prevalece o que dispõe a Convenção de Varsóvia, que determina

prazo prescricional de dois anos, não o de cinco anos, do Código de Defesa

do Consumidor. 3. Dou provimento ao recurso.

Supremo Tribunal Federal

Decisão: A Turma, por votação unânime, conheceu e deu provimento ao

recurso extraordinário, nos termos do voto da Relatora. Ausente,

justificadamente, neste julgamento, o Senhor Ministro Gilmar Mendes.

2ª Turma, 07.03.2006.

Presidência do Senhor Ministro Celso de Mello. Presentes à sessão a

Senhora Ministra Ellen Gracie e o Senhor Ministro Joaquim Barbosa.

Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Subprocurador-

Page 35: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Geral da República, Dr. Wagner Gonçalves. Carlos Alberto Cantanhede

Coordenador

Supremo Tribunal Federal.

03.02 - O início da contagem do prazo prescricional

Conforme estabelece o artigo 27 em estudo, o início da contagem do prazo

prescricional se dará a partir "a partir do conhecimento do dano e de sua autoria".

Portanto, é necessário que ocorram estes dois requisitos (conhecer o dano e

conhecer quem o causou), para que comece a fluir o prazo prescricional do artigo 27 do

Código de Defesa do Consumidor.

Rizzatto Nunes observa que "A norma se utiliza adequadamente da conjuntiva 'e'

para determinar o início do prazo, porque pode acontecer de o consumidor sofrer dano

e não conseguir de imediato identificar o responsável por ele ou, pelo menos, todos os

responsáveis, uma vez que, como se viu, a Lei nº 8.078 estabelece ampla solidariedade

entre os fornecedores" (NUNES, 2009, p. 408).

Neste sentido, a Lei nº 8.078/1990 concedeu à prescrição um tratamento

diferente do que é dado pelo Código Civil, o qual estabelece, como regra geral, que a

prescrição tem seu início a partir do momento em que ocorre a violação do direito, sem

nada mencionar quanto ao conhecimento da respectiva autoria (artigo 189 do Código

Civil Brasileiro).

Quanto ao assunto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que o prazo

prescricional é o do conhecimento do dano e da lesão, não importando se a lesão

persiste a ocorrer no tempo:

"A prescrição da ação de reparação por fato do produto é contada do

conhecimento do dano e da autoria, nada importa a renovação da lesão no

tempo, pois, ainda que a lesão seja continua, a fluência da prescrição já se

Page 36: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

iniciou com o conhecimento do dano e da autoria" (STJ, REsp 304.724-RJ,

Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 24/05/2005).

03.03 - Causas impeditivas, suspensivas ou interruptivas

O artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor, teve vetado o seu parágrafo

único, que determinava: "Interrompe-se o prazo de prescrição do direito de indenização

pelo fato do produto ou serviço nas hipóteses previstas no § 1º do artigo anterior, sem

prejuízo de outras disposições legais".

O referido parágrafo único sofreu veto porque, no entendimento do Sr.

Presidente da República, "Essa disposição padece de grave defeito de formulação, que

impossibilita o seu entendimento, uma vez que o § 1º do art. 26 refere-se ao termo

inicial dos prazos de decadência, nada dispondo sobre interrupção da prescrição"31.

Quanto ao veto, o Professor Rizzatto Nunes entende que "As razões estão

corretas; porém o que a assessoria da Presidência, que as elaborou, não percebeu foi

que havia apenas uma falha de redação e remissão no parágrafo único vetado. Quando

a norma fez referência ao § 1º, queria, na verdade, estar fazendo ao § 2º, que trata dos

casos de obstaculização da decadência do direito de reclamar por vícios" (NUNES,

2009, p. 409).

No entanto, o espírito na regra vetada era coerente, no sentido de interromper o

prazo prescricional disposto no "caput" do artigo 27 no caso de se verificar alguma das

hipóteses dispostas no parágrafo 02º do artigo 26, concedendo maior dilação de prazo

para o consumidor buscar a reparação pelos danos que lhe foram causados.

Não há grande prejuízo, a bem da verdade, considerando que o prazo

qüinqüenal para a prescrição do artigo 27 é razoavelmente extenso, possibilitando ao

consumidor o exercício do seu respectivo direito com bastante espaço de tempo.

Page 37: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Mas, no que concerne ao assunto, a regra do artigo 07º do Código de Defesa do

Consumidor "[...] a incidência da lei consumerista não exclui as demais normas que não

sejam com ela incompatíveis, assim como aquelas que as complementam" (NUNES,

2009, p. 409):

Art. 07º - Os direitos previstos neste Código não excluem outros decorrentes

de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da

legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades

administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios

gerais do direito, analogia, costumes e equidade.

Com base nisso, constata-se razoável a posição do Professor Rizzatto Nunes

quando ensina que "as causas de interrupção do Código Civil aplicam-se ao subsistema

consumerista". Conclui que, "[...] no tema da prescrição, anote-se que não só as

disposições gerais da Seção I do Capítulo I do Título IV do Código Civil aplicam-se à

hipótese de consumo (arts. 189 a 196)32, como também a seção que cuida das causas

que impedem ou suspendem a prescrição quando compatíveis (arts. 197 a 201)33 e as

da Seção III que trata das causas que interrompem a prescrição (arts. 202 a 20434)"

(NUNES, 2009, p. 409 e 410).

04 - As diferenças entre a Decadência e a Prescrição

Após abordarmos os ambos os institutos, da Prescrição e da Decadência,

podemos delinear algumas diferenças.

Quanto à primeira distinção, podemos constatar que, na Prescrição, o direito

material se extingue na medida que o seu titular nãoexerce tempestivamente o direito

de ação, enquanto que, na Decadência, o direito material se perde se não for pleiteado.

Em síntese, a Prescrição objetiva extinguir a ação e a decadência tem por fim a

extinção do direito.

Page 38: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

A segunda diferença observada diz respeito a interrupção e suspensão, haja

vista que a Prescrição admite ser interrompida ou suspensa, sendo que, no Direito do

Consumidor, por força do disposto no artigo 07º da Lei nº 8.078/1990, aplica-se, quando

compatíveis, as causas de interrupção e de suspensão previstas no Código Civil de

2002, em relação ao prazo prescricional previsto no artigo 27 do Código de Defesa do

Consumidor. Quanto a Decadência, não há o que se falar em interrupção ou

suspensão, conforme expressa determinação do Código Civil vigente, em seu artigo

207, sendo que, como já vimos anteriormente, ao estudar este instituto, a

obstaculização do prazo decadencial previsto no parágrafo 02º do artigo 26 do Código

de Defesa do Consumidor não possui efeito suspensivo ou interruptivo.

Em terceiro, a Decadência atinge a todos, pois contra ela não prevalece as

isenções dispostas em lei em benéfico de certas pessoas, sendo que a Prescrição já

não corre contra todos, existindo pessoas que, por força dos artigos 197 até 201 do

Código Civil Brasileiro, estão isentas de seus efeitos.

A quarta distinção, refere-se a renúncia, pois a Decadência decorrente de prazo

extintivo determinado pela lei não poderá ser renunciada, enquanto que a Prescrição,

após sua consumação, poderá ser renunciada pelo prescribente. No entanto, cabe

novamente lembrar que, por força da nova redação do parágrafo 05º, artigo 219, do

Código de Processo Civil, alterado pela Lei nº 11.280/2006, a prescrição deverá ser

conhecida e declarada de ofício pelo juiz, igualando-se ao instituto da Decadência, que,

por força do artigo 210 do atual Código Civil, também deverá ser conhecida pelo

magistrado, quando estiver estabelecida em lei.

05 - Conclusão

Por derradeiro, concluímos o estudo da Prescrição e da Decadência perante o

Direito do Consumidor sem, no entanto, deixar de considerar a luz emanada do Direito

Civil.

Page 39: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

Se a primeira vista ambos os institutos se assemelham e até podem ser

confundidos, como, aliás, ocorreu no Código Civil de 1916, a melhor análise na

natureza destes institutos e de suas sutis diferenças possibilita a clara identidade de

ambos.

A segurança jurídica decorrente da Decadência e da Prescrição é indubitável e

os aperfeiçoamentos gerados em ambos os institutos através do Código de Defesa do

Consumidor e do Código Civil de 2002 foram benéficos, no geral, apesar das críticas

que foram levantadas neste trabalho.

Page 40: A Decadência e a Prescrição no Direito do Consumidor

06 - Bibliografia

CALDEIRA, Mirella D'Angelo. "Aspectos da Prescrição e Decadência no Código de

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Defesa do Consumidor", artigo publicado no site da Universidade Estadual

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NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. "Curso de Direito do Consumidor", 04ª edição, São

Paulo, Editora Saraiva, 2009.

NUNES, Rodrigues. "Dicionário Jurídico RG - Fênix", 03ª edição, São Paulo, RG

Editores Associados Ltda., 1995.

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SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade da. "Interrelação entre Prescrição e

Decadência no Código de Defesa do Consumidor e o Atual Código

Civil". Boletim Jurídico, Uberaba-MG, a. 3, nº 113. Disponível em:

<http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=499> Acesso em: 16

de setembro de 2008.

* Advogado, sócio do escritório Ares e Takehisa Advogados, em Santos-SP; Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Santos - UniSantos; Pós-Graduado “lato sensu”, com Especializações em Direito Processual Civil, em Direito Processual do Trabalho e em Direito e Processo do Consumidor, pela Universidade Católica de Santos - UniSantos; Professor em cursos preparatórios; Autor de artigos jurídicos; Colaborador em jornais e revistas jurídicas. 1 "Decadência" é um vocábulo de formação vernácula, originário do verbo latino "cedere" (cair); do prefixo latino de (de cima de) e do sufixo entia (ação ou estado); literalmente designa a ação de cair ou o estado daquilo que caiu (CÂMARA LEAL, 1948, apud DINIZ, 1994, P. 212). 2 Ressalta o Professor Luiz Antonio Rizzatto Nunnes que "É da tradição do direito que dormentibus non succurit jus, por isso que estão distribuídos em toda parte do sistema pátrio prazos para a efetivação e exercício de direitos" (NUNES, 2009, p. 390). 3 O termo "resolução do mérito" substituiu o anterior "julgamento do mérito", com a alteração imposta pela Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005. 4 Termo latino: "por força da lei, em virtude de lei". 5 Conforme determina o artigo 209 do vigente Código Civil Brasileiro. 6 Decisão transitada em julgado. 7 II - a reclamação formalizada perante os órgãos ou entidades com atribuições de defesa do consumidor, pelo prazo de noventa dias. 8 Código de Processo Civil - Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor. 04ª edição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1999, página 1819. 9 O Empresário e os Direitos do Consumidor. São Paulo, Editora Saraiva, 1994, página 113. 10 Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2003, página 371. 11 Da prescrição e da decadência no Código do Consumidor, revista da Procuradoria Geral do Estado – RPGE, Fortaleza, 10 (12): 29-40, 1993. 12 Anotações sobre os vícios, a prescrição e a decadência no Código de Defesa do Consumidor, revista de Direito do Consumidor, nº 8, páginas 118 a 145, outubro/dezembro. 1993. 13 Da responsabilidade por vicio do produto e do serviço. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, página 112. 14 Prescrição e Decadência nas relações de Consumo. São Paulo. Revista do Direito do Consumidor, nº 10, páginas 77 a 96, abril/junho de 1994.

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15 Nesse mesmo sentido, é o entendimento do Professor William Santos Ferreira, em seu artigo publicado na Revista Direito do Consumidor: "não há mais que falar em transcurso de prazo (suspensão ou interrupção), não é necessário tratar-se do prazo, o direito foi exercido". E cita Câmara Leal "A decadência tem um curso fatal, não se suspendendo, nem se interrompendo, pelas causas suspensivas ou interruptivas da prescrição, só podendo ser obstada a sua consumação pelo efetivo exercício do direito ou da ação, quando esta constitui o meio pelo qual deve ser exercitado o direito" (SILVA, p.07). 16 Prescrição e Decadência nas Relações de Consumo. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2002, p.128. 17 Mensagem nº 644, de 11 de setembro de 1990, dirigida ao Presidente do Senado Federal, expondo o veto parcial ao Projeto de Lei nº 97/89 (nº 3.683/89, na Câmara dos Deputados), que dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências (atual Código de Defesa do Consumidor). 18 Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: [...] IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear. [...] § 1° O requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações previstas nos arts. 91 e seguintes, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum. 19 Art. 5o Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: I - o Ministério Público; II - a Defensoria Pública; III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista; V - a associação que, concomitantemente: a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil; b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. 20 Art. 55. A União, os Estados e o Distrito Federal, em caráter concorrente e nas suas respectivas áreas de atuação administrativa, baixarão normas relativas à produção, industrialização, distribuição e consumo de produtos e serviços. 21 § 1° A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios fiscalizarão e controlarão a produção, industrialização, distribuição, a publicidade de produtos e serviços e o mercado de consumo, no interesse da preservação da vida, da saúde, da segurança, da informação e do bem-estar do consumidor, baixando as normas que se fizerem necessárias. 22 Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas: I - multa; II - apreensão do produto; III - inutilização do produto; IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente; V - proibição de fabricação do produto; VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço; VII - suspensão temporária de atividade; VIII - revogação de concessão ou permissão de uso; IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade; X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade; XI - intervenção administrativa; XII - imposição de contrapropaganda. Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo. 23 § 1º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.

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24 Que impedem que o curso da prescrição tenha início. 25 Que paralisam temporariamente o curso da prescrição, no que, terminada a causa suspensiva, a prescrição volta a correr, considerando todo o tempo anteriormente decorrido. 26 Que inutilizam todo o tempo da prescrição iniciada, razão pela qual, quando cessa a causa interruptiva, o prazo prescricional volta a correr novamente, sem aproveitar o período anterior. 27 Artigo 202, "caput", do Código Civil Brasileiro: "A interrupção da prescrição, que só poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: [...]". 28 Interrompe-se o prazo de prescrição do direito de indenização pelo fato do produto ou serviço das hipóteses previstas no § 1º do artigo anterior, sem prejuízo de outras disposições legais. 29 “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto", 06ª edição, Rio de Janeiro, Editora Forense Universitária, 1999, páginas 152 e 153. 30 Artigo 29 - 1) A ação de responsabilidade deverá intentar-se, sob pena de caducidade, dentro do prazo de dois anos, a contar da data de chegada, ou do dia em que a aeronave devia ter chegado a seu destino, ou do da interrupção do transporte. 2) O prazo será computado de acordo com a lei nacional do tribunal que conhecer da questão. 31 Mensagem nº 664, de 11 de setembro de 1990, dirigida pela Presidência da República ao Sr. Presidente do Senado Federal. 32 Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.

Art. 190. A exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão.

Art. 191. A renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar; tácita é a renúncia quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

Art. 192. Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes.

Art. 193. A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita.

Art. 194 (Revogado pela Lei nº 11.280, de 2006).

Art. 195. Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.

Art. 196. A prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu sucessor. 33 Art. 197. Não corre a prescrição:

I - entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

II - entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

III - entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.

Art. 198. Também não corre a prescrição:

I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;

II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;

III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.

Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:

I - pendendo condição suspensiva;

II - não estando vencido o prazo;

III - pendendo ação de evicção.

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Art. 200. Quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

Art. 201. Suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível. 34 Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:

I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;

II - por protesto, nas condições do inciso antecedente;

III - por protesto cambial;

IV - pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;

V - por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

VI - por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.

Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.

Art. 203. A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado.

Art. 204. A interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o co-devedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados.

§ 1o A interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros.

§ 2o A interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros herdeiros ou devedores, senão quando se trate de obrigações e direitos indivisíveis.

§ 3o A interrupção produzida contra o principal devedor prejudica o fiador.