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A CONTRIBUIÇÃO DA ERGONOMIA
PARA A SUSTENTABILIDADE DA
PESCA ARTESANAL UTILIZANDO
JANGADAS
Joyce Elanne Mateus Celestino* GREPE - Grupo de Estudos e
Pesquisas em Ergonomia (PEP/UFRN)
Isis Tatiane de Barros Macêdo Veloso* GREPE - Grupo de
Estudos e Pesquisas em Ergonomia (PEP/UFRN)
Larissa Praça de Oliveira* Bolsista CAPES/GREPE - Grupo de
Estudos e Pesquisas em Ergonomia (PEP/UFRN)
Anelena Jaeschke* GREPE - Grupo de Estudos e Pesquisas em
Ergonomia (PEP/UFRN)
Cíntia Araújo de Andrade Rosso - Grupo de Estudos e Pesquisas
em Ergonomia (PEP/UFRN)
Neste trabalho se buscou fazer um levantamento de demandas
ergonômicas dos pescadores artesanais que realizam a pesca através
de jangadas, em duas praias urbanas da cidade de Natal, no Rio
Grande do Norte. A pesquisa foi baseada na Análise Ergonômica do
Trabalho (AET). Para a coleta de dados foram utilizados métodos
observacionais e interacionais como escuta respeitosa, ação
conversacional, registros fotográficos e vídeos. Verificou-se que as
principais demandas estão relacionadas com a segurança, a
organização do trabalho, manipulação do alimento e do pescado,
postura, meio ambiente e a embarcação. A partir destes resultados,
foram elaboradas propostas de ações de pesquisa e desenvolvimento
para minimizar estes problemas, visando contribuir na melhoria da
qualidade de vida destes pescadores e na busca da sustentabilidade da
atividade de pesca artesanal.
Palavras-chaves: Sustentabilidade, Análise Ergonômica do Trabalho,
Pesca Artesanal, Jangadas
XXIX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO A Engenharia de Produção e o Desenvolvimento Sustentável: Integrando Tecnologia e Gestão.
Salvador, BA, Brasil, 06 a 09 de outubro de 2009
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1. Introdução
A sustentabilidade vem sendo requisitada para o alcance de melhorias ambientais e
socioeconômicas na pesca artesanal. No Rio Grande do Norte, este tipo de pesca contribui
para o desenvolvimento econômico do Estado, representando 18,15% do volume anual de
pescado (2.739,9T), conforme os últimos dados estátísticos da Secretaria de Aquicultura e
Pesca - SEAP (2005). A adoção de práticas de sustentabilidade poderá colaborar para a
continuidade da atividade pesqueira, sendo esta a principal justificativa para a realização
dessa pesquisa.
A produção pesqueira tem sofrido decréscimo com o passar dos anos, a sobrepesca tem
levado à redução dos estoques, contribuindo para a redução da produção a partir de 1986,
conforme ressalta Abdallah (1999). Silva (2004) relata que a pesca artesanal é aquela que se
viabiliza única e exclusivamente pelo trabalho manual do pescador, logo não utiliza
aparelhagens que consigam atingir os mesmos níveis de produtividade pesqueira industrial,
não causando impactos ambientais sobre os recursos pesqueiros com a mesma intensidade.
No entanto, esta atividade é caracterizada por imprevisibilidade, altos riscos e condições
inadequadas de trabalho. As extensas jornadas de trabalho, condições de higiene precárias,
ausência de equipamentos de salvatagem, somadas as questões de espaço físico reduzido,
habitabilidade, condições ambientais e meteorológicas adversas, contribuem para o quadro de
insegurança em alto mar, necessitando de urgentes medidas de reformulação adequada e
continuada. Além destes, existem problemas ambientais como resíduos dispostos na praia,
queda de produtividade pesqueira, baixa consciência ambiental, os quais também precisam de
tais medidas, pois afetam no desenvolvimento dessa atividade.
Nesse contexto, a Ergonomia surge como agente transformador, a fim de promover
adequações na atividade jangadeira, contribuindo para a qualidade de vida dos pescadores e
para a qualidade e produtividade do pescado. Assim, o presente artigo tem como objetivo
realizar o levantamento das demandas ergonômicas da atividade jangadeira através da
pesquisa realizada em uma situação de referência que vai nortear ações de pesquisa e
desenvolvimento, no projeto Atividade jangadeira: tradição, ergonomia e sustentabilidade. A
metodologia utilizada foi fundamentada na Análise Ergonômica do Trabalho (AET)
(WISNER, 1987; VIDAL, 2008; GUÈRIN, 2001). Para a coleta dos dados foram utilizados
métodos observacionais e interacionais como ação conversacional, verbalizações, escuta
ampliada, registros fotográficos e vídeos.
A partir desta pesquisa constata-se que as principais demandas da atividade jangadeira estão
relacionadas com a segurança, saúde, organização do trabalho, manipulação do alimento e do
pescado e meio ambiente e, que a melhoria da qualidade de vida desta população e a
sustentabilidade desta atividade requer a implementação de intervenções de gestão,
capacitação e modificações no projeto da embarcação.
2. Referencial teórico
2.1 Sustentabilidade na pesca artesanal
Segundo o Relatório Brundtland de 1987, o conceito de sustentabilidade corresponde ao
“desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Este conceito é passível de aplicação
em todas as atividades humanas. (MAWHINNEY, 2005)
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A sustentabilidade no setor pesqueiro requer inicialmente que seu conteúdo seja difundido,
havendo uma conscientização tanto das indústrias quanto das comunidades pesqueiras que
sobrevivem desta atividade. Políticas de incentivo vêm sendo desenvolvidas no país com o
objetivo de repassar aos pescadores o conhecimento de exploração sustentável das reservas
pesqueiras do litoral brasileiro, pois o esgotamento dessas compromete a atividade pesqueira.
Chamy e Maldonado (2003) enfatizam que os instrumentos econômicos voltados à
diminuição das desigualdades sociais sejam compatibilizados com o conhecimento das
comunidades locais, fator imprescindível para obter sucesso nas políticas públicas
relacionadas à sustentabilidade. Em pesquisa realizada com pescadores, Fonseca (2005)
aponta para as mudanças no modo de produção e para as novas relações sociais que geram
contraste entre as gerações passadas e as atuais provocando “importantes alterações
ambientais, as quais causam nas comunidades tradicionais o que podemos chamar de
impactos sociais e culturais.”
Além dessas mudanças percebe-se que na pesca artesanal ocorrem impactos provocados pela
ação predatória. Dessa forma a pesca com jangadas pode perder força para atividades que não
vislumbram a sustentabilidade e a qualidade de vida de seu povo, mas apenas o lucro, sem
atentar para a erradicação de tradições e costumes antes arraigados.
2.2 Pesca artesanal utilizando jangadas
A jangada é uma embarcação primitiva utilizada na pesca artesanal e intrínseca ao Nordeste
brasileiro. Na Enciclopédia Agrícola Brasileira (2004) há registros dessa embarcação no
Brasil desde o período da colonização, onde os índios as utilizavam para transporte e pesca.
As primeiras jangadas eram feitas de rolos de madeira. A partir de 1940 começaram a surgir
jangadas de tábuas construídas em compensado naval, se mostrando mais resistentes.
Para Cascudo (2002), a tripulação das jangadas é formada por Mestre, Proeiro, Bico de Proa e
Contra Bico. O Mestre é considerado o piloto da jangada que geralmente detém uma maior
sobrecarga mental, pois é responsável pela navegação e escolha dos pesqueiros (pontos de
pesca). Os demais componentes auxiliam na atividade de pesca.
Figura 2 – Jangada. Fonte: Jangada, uma pesquisa
etnográfica (CASCUDO, 2002)
Figura 1 – Jangadeiros da praia A.
Fonte: Pesquisa de campo na praia A, Natal-RN.
2009.
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Os estudos de Pimenta e Vidal (2000) demonstram que os pescadores estão expostos as mais
adversas condições de trabalho, que exigem uma sobrecarga física e mental, tornando esta
atividade imprevisível e de alto risco.
O descumprimento das normas de segurança impostas pela Marinha, no tocante aos limites de
navegação, número de tripulantes e equipamentos de salvatagem, aumentam a
imprevisibilidade e a insegurança em alto mar. Benevides (2007) em sua pesquisa, destaca
que os jangadeiros desrespeitam estas normas. Este fato, segundo Pimenta e Vidal (2000);
Teles e Vidal (2000); Marques (2000) favorece a ocorrência de acidentes no trabalho,
intensificados pelas extensas jornadas de trabalho, questões de habitabilidade e condições
ambientais. Porém, não é apenas o descumprimento das normas de segurança que refletem na
ocorrência de acidentes e comprometimento à saúde dos pescadores artesanais durante sua
atividade de trabalho. Um estudo realizado por Neto, Cordeiro e Haddad Jr (2005), com os
pescadores artesanais da Região do Médio Rio Araguaia, identificou que as principais causas
de acidentes no trabalho são as lesões causadas pelos animais do ambiente aquático (86% dos
casos). As demais causas imediatas foram: cortes com facas ou tesouras (5%), lesões
provocadas por anzóis (3%), acidentes com redes ou tarrafas (2%), traumas por barco a remo
(2%), e lesões por motor de barco (2%).
Segundo Pinto et al (2007), o esforço necessário para empurrar e lançar o barco ao mar pode
causar danos à coluna, bem como, vários movimentos corriqueiros da atividade podem causar
lesões musculares e até acidentes com fraturas, impossibilitando ou dificultando o trabalho do
pescador. Dall’Oca (2004) em sua pesquisa com pescadores do Mato Grosso do Sul constatou
que as queixas mais frequentes eram dores de origem neuromusculares e articulares,
traduzidas por dores nos pulsos, braços, ombros, costas, peito, coluna ou dores pelo corpo em
geral. Rosa e Mattos (2007) também encontraram estas mesmas queixas em sua pesquisa com
pescadores e catadores de caranguejo na Baía da Guanabara. Evidenciando a prática de um
trabalho desgastante, com problemas posturais advindos do excesso de esforço físico.
Uma outra forma de agravos à saúde consiste na pesca da lagosta “no peito” ou “mergulho
livre”. Esta atividade compreende em mergulhar sem auxílio de qualquer equipamento
respiratório, sendo de grande risco em locais onde a profundidade é superior a oito braças, já
que as descidas simultâneas favorecem o desgaste físico do pescador, estando este suscetível a
desmaios e afogamentos (FERREIRA, DONATELLI, REIS Jr, 2002). A alta prevalência à
exposição de raios ultravioletas, associadas à ausência de proteção como chapéu/boné ou
protetor solar/labial, também compromete a saúde dos pescadores, pois favorece o surgimento
de queilite actínica e carcinoma epidermóide, como demonstrou o estudo da prevalência de
alterações labiais em pescadores da ilha de Santa Catarina (SILVA, et al, 2006).
Pesquisas demonstram o surgimento de doenças psíquicas nos pescadores, bem como o
aumento do consumo de álcool e entorpecentes a bordo. De acordo com Teles e Vidal (2000),
isso pode estar relacionado com o surgimento da monotonia durante a demora ao atingir os
objetivos da pesca. O consumo de álcool, também foi discutido no trabalho de Neto, Cordeiro
e Haddad Jr (2005), no qual foi constatada que elevada quantidade de pescadores tinham o
hábito de beber e fumar. O álcool levado a bordo serve tanto para “esquentar o corpo” como
para limpar os ferimentos sofridos durante a atividade pesqueira. Com relação a alterações
psíquicas, o estudo de Barbosa (2004) identificou a presença de depressão grave e outros
distúrbios psíquicos associados ao estresse, como insônia e elevação da pressão arterial.
Também merece destaque a pesquisa desenvolvida por Andrade (2000), que compilou os
principais atendimentos ambulatoriais a pronto-socorros em pescadores que realizam a pesca
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em superfície. Ela constatou que as lesões corporais diversas provocadas por instrumentos de
trabalho, desidratação, câncer de pele, dermatocitose, alcoolismo e gastroenterites, são os
principais motivos que levam os pescadores à procura de atendimento médico. Pesquisa
realizada por Murrieta (2001) sobre a dieta dos pescadores de uma comunidade ribeirinha da
região de Santarém constatou que a alimentação destes é inadequada para o tipo de atividade,
evidenciando o baixo consumo de frutas e verduras.
Outra problemática consiste nas práticas inadequadas de manipulação do pescado. Segundo o
SINDIPI (2008) o gelo é o principal meio de conservação dessa cadeia produtiva e o seu
acesso é determinante para a atividade pesqueira, pois o pescado é um produto extremamente
perecível, uma deficiência estrutural nesse setor vincula-se ao não acesso a esse meio de
conservação. Bonnell (apud VIERA 2004) ressalta a dificuldade de higienização da
embarcação pesqueira, fonte constante de contaminação do pescado recém capturado, a
lavagem sistemática é uma prática recomendável com o objetivo de evitar sua contaminação
por bactérias, a qual deve ser realizada com desinfetantes a cada término de viagem,
objetivando minimizar o risco de contaminação cruzada.
Stori (2000); Repinaldo, Tonini (2007), destacam que a produção de resíduos pode ocasionar
outros agravos à pesca com o destino agressivo ao meio ambiente, além do problema nos
desgastes do estoque dos recursos pesqueiros, devido a problemas como, sobrepesca, baixa
conscientização ambiental voltada à importância dos ciclos biológicos dos organismos nos
ecossistemas marinhos ou estuarinos nas próprias comunidades dependentes da atividade
pesqueira. Somando-se a isso, a introdução do período de defeso para reprodução da maioria
das espécies, não só reduz a quantidade destas como dificulta a situação do pescador, mesmo
aquele com carteira assinada. (FAVERET FILHO, SIQUEIRA 1997)
Outro fator que afeta a pesca artesanal, conforme discutido por Soares (2003), está
relacionado as transformações técnicas relativas a captura e industrialização do pescado que
ocorreram a partir de um processo de concentração de capital e acarretaram um da destruição
causada pelos equipamentos de produção utilizados na pesca. Segundo Abdallah, Bacha
(1999) a oscilação na produtividade da pesca artesanal fundamenta-se, na sobreexploração do
recurso pesqueiro marítimo e ao estudar essa exploração Paez (1993 apud ABDALLAH,
BACHA 1999) evidencia a situação de sobrepesca para a maioria das espécies de peixes de
valor comercial capturados comercialmente no litoral brasileiro.
Além dos problemas mencionados, com a expansão da atividade urbana e turística
desordenada, muitos jangadeiros de praias urbanas sofrem em virtude da ausência de local
adequado para o estacionamento das jangadas. (MONTEIRO 2007)
3. Metodologia
Para o processo de instrução da demana na situação de referência, utilizou-se de uma
metodologia baseada na Análise Ergonômica do Trabalho (WISNER, 1987; VIDAL, 2008;
GUÉRIN, 2001). Para tanto foram utilizadas técnicas interacionais e observacionais como
escuta respeitosa, roteiros de ação conversacional, verbalizações, registros fotográficos e
vídeos. A figura 3 apresenta um esquema detalhado das etapas que foram desenvolvidas para
a instrução da demanda da atividade jangadeira em duas praias urbanas de Natal.
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Figura 3 – Instrução da demanda - Adaptado de Vidal, Carvalho e Saldanha (2001).
3.1 Pesquisa teórica, pesquisa documental e hipóteses da demanda
Para a realização da instrução da demanda junto aos jangadeiros, inicialmente realizou-se
pesquisas bibliográficas sobre a atividade desenvolvida pelos pescadores artesanais a partir de
livros, artigos científicos e documentos de instituições. Após uma análise criteriosa das
informações levantadas foi possível formular as primeiras hipóteses da demanda provocada
presentes nesta atividade (tabela 2 - pesquisa documental) e iniciar as reuniões de
planejamento de ações a serem realizadas nas etapas seguintes.
A demanda provocada é aquela que é levada a uma “empresa” por meio de uma análise prévia
do trabalho realizada através de um referencial teórico (estado da arte) ou situação de
referência (estado da prática) onde são levantadas algumas hipóteses sobre o trabalho que se
quer estudar. As hipóteses são afirmações intuitivas que deverão ser demonstradas a luz dos
dados disponíveis e/ ou coletados em campo. (VIDAL, 2003)
3.2 Análise global da situação de referência
A análise global corresponde a uma análise macro da atividade de trabalho, essencial para
clarificar as demandas ergonômicas (Vidal, 2008). Para as análises globais foram realizadas
14 visitas sistemáticas em duas praias urbanas de Natal. A situação de referência consiste na
análise de situações de trabalho que apresentem características próximas as do local definido,
para nelas observar as variabilidades reais e as estratégias empregadas para enfrentá-las
(DANIELLOU, 2002). Com a análise de situações de referência é possível identificar
características do local a ser estudado, adequando as ações para a melhoria nas condições de
trabalho e saúde dos jangadeiros para a melhoria do produto.
3.3 Pesquisas complementares
Paralelo as análises globais foram realizadas visitas em instituições que possuem relações
com a atividade pesqueira objetivando esclarecer algumas demandas encontradas nas análises
globais bem como levantar as possíveis demandas destes setores relacionadas com a atividade
jangadeira. Estes locais foram: Capitania dos Portos do Rio Grande do Norte; Colônia Z-04 de
Pesca e Aquicultura de Natal, Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca de Natal (SEAP),
Instituto de Defesa do Meio Ambiente (IDEMA), Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Hospital dos Pescadores, Centro de Referência em
Saúde do Trabalhador (CEREST), Federação dos Pescadores do Rio Grande do Norte. Além
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disso, alguns destes disponibilizaram materiais para a pesquisa através de cartilhas, apostilas,
banco de dados e participações em cursos relacionados à pesca.
3.4 Construção social
A Construção Social consiste numa estrutura de ação participativa, técnica e gerencial.
Segundo Saldanha (2004), ela é formada por pessoas que participam do levantamento das
informações as quais permitem o conhecimento sobre a atividade. Na situação de referência,
estes grupos estão representados na tabela 1 abaixo.
Grupos Características
Grupo de Ação
Ergonômica (GAE)
Formado por uma equipe multidisciplinar de mestrandos envolvida no projeto,
bolsistas e voluntários de graduação e pelos representantes de cada praia onde foi
realizada a situação de referência (Grupo de Interesse)
Grupo de Suporte (GS) Formado pela Colônia Z-04 de Pesca e Aquicultura de Natal e pela coordenadora
da pesquisa
Grupo de
Acompanhamento(GA)
Formado pelo mestre, representante dos jangadeiros das praias A e B na colônia de
Pescadores.
Grupos de Foco
(GF´S),
Formado por carpinteiros, manipuladores de alimentos, marchantes, mestres,
ajudantes e instituições relacionadas com a atividade pesqueira.
Grupo de Especialistas
(GE)
Formado pelos co-orientadores da pesquisa.
Tabela 1 - Dispositivo de construção social nas situações de referência.
3.5 Formulação das demandas: clarificação e confronto entre as demandas dos
jangadeiros, das instituições e das demandas latentes
Nesta etapa, iniciou-se a formulação das demandas a partir da confrontação entre as demandas
dos jangadeiros, encontradas nas situações de referência; demandas institucionais,
identificadas durante as visitas às instituições envolvidas com a atividade jangadeira; e
demandas latentes encontradas pelos pesquisadores na análise global.
3.6 Formulação de demandas
Após a confrontação das demandas dos jangadeiros, institucionais e latentes foi possível
identificar as demandas que nortearão a AET e que tem como objetivo o desenvolvimento de
ações voltadas para a sustentabilidade da atividade jangadeira, baseadas nas necessidades
reais dos jangadeiros. Estas compreendem: ações de gestão, capacitações e modificação no
projeto da jangada.
4. Resultados e discussões
4.1 Análise global da atividade jangadeira nas praias A e B
A atividade jangadeira, desenvolvida nas duas praias urbanas de Natal que foram analisadas,
as quais chamaremos de praias “A” e “B”, possui características semelhantes. Em ambas, esta
atividade é desenvolvida por pescadores do sexo masculino, com idade média de quarenta
anos, primeiro grau incompleto e com constituição familiar de cinco a oito filhos. Na praia
“A” há, aproximadamente, vinte e dois jangadeiros enquanto que na praia “B”, quarenta.
Uma pequena parcela dos jangadeiros, em torno de 20%, é cadastrada na Colônia Z4 de
Aqüicultura e Pesca. Estes recebem um salário mínimo durante a época do defeso, (dezembro
a maio) mas nem todos conseguem a licença para a pesca da lagosta, a qual assegura a
licença, conforme fala de jangadeiro: “tão querendo dar 3 parcelas para quem pesca lagosta,
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essa embarcação tudinho aqui era para tirar a licença de pescar lagosta, só em Ponta Negra
tem umas 30 jangada e só conseguiu tirar 4 Aqui tem umas 12 ou 11 jangada, mas nenhuma
conseguiu.” Jangadeiro.
Com o cadastro, os jangadeiros também têm o direito de participar das palestras e cursos
promovidos pela Colônia e outros órgãos governamentais, com o intuito de fornecê-los
capacitação em busca de uma melhor qualidade de vida. Para os pescadores, este cadastro é de
extrema importância, pois o dinheiro recebido é utilizado não só para a aquisição de
alimentos, mas também para comprar equipamentos e utensílios necessários para a pesca, bem
como para realizar a manutenção da jangada. O depoimento a seguir demonstra essa
realidade: “Agente precisa do seguro, esse seguro aí ajuda muito pescador, muitos precisam
de coletes, e esse dinheiro é para isso né, já compra material, já comprava a linha”
Jangadeiro. Segundo informações obtidas na Colônia Z4, para a realização do cadastro, os
jangadeiros precisam apresentar documentação pessoal, comprovar que sobrevivem apenas da
pesca através de duas testemunhas que também sejam cadastradas na Colônia e pagar uma
taxa mensal equivalente a R$ 7,00.
Para realizar a pesca, os jangadeiros devem possuir domínio do território marinho e dos
elementos naturais que o compõem, tais como o relevo submarino, os ventos, as marés, as
formas de terra que representam os referenciais de localização, as profundidades da coluna
d’água e a cor da água (SANTOS e CÂMARA, 2002). Na praia “A” observou-se que para a
escolha do local da pescaria, os mestres utilizam como pontos de referência o farol, os prédios
e os morros, e a distância percorrida é medida em braças. As braças equivalem a 1,82 metros,
sendo a distância percorrida pelos jangadeiros da praia “A” aproximadamente 27 a 30 braças.
Já os jangadeiros da praia “B” tomam como referência a ponte Newton Navarro, os morros e
as antenas das casas e, da mesma forma que os jangadeiros da praia “A”, percorrem
aproximadamente 30 braças para chegar ao pesqueiro escolhido. Foi observado também que a
saída para o mar obedece às condições das marés, os meses do ano, as condições climáticas e
as fases lunares. Este fato condiz com os achados de Monteiro (2007).
Para a realização da atividade jangadeira, os pescadores necessitam dos seguintes
equipamentos e utensílios: para a navegação: cordas (coita), âncora (garateia), cuia ou
cachimbo (adaptada de uma garrafa de detergente ou um pote de plástico), bolina (pedaço de
madeira em formato retangular utilizado para proporcionar equilíbrio à embarcação), remos,
tranca (pedaço de madeira colocado na base da vela para dar sustentação ao abrir a mesma),
estai (uma vela menor que direciona o vento para a vela maior), vela, lampião, leme e
chaveta; para alimentação: mini-fogão ou “fogão a carvão” (improvisado a partir de panelas
ou latas de tintas ou manteigas industriais; carvão; areia da praia e bucha de coco), isqueiro ou
fósforo, querosene, canecas e garrafas térmicas; para a pesca: anzóis, iscas, faca, porrete
(araçanga ou bixeiro), monobloco (garajáu), linhas de náilon, caixa de isopor e gelo em
escamas (conservação do pescado), e equipamentos de proteção individual (EPI) como colete
salva-vidas, denominado na atividade como equipamentos de salvatagem. Alguns destes
equipamentos e utensílios podem ser observados na figura 2.
A atividade jangadeira é realizada quase todos os dias da semana. Na praia “A”, a pesca não é
realizada na segunda-feira, pois não há como comprar a isca (sardinha do sul) no domingo. Na
praia “B”, não há atividade pesqueira aos domingos e segundas, sendo considerados dias de
descanso e manutenção da jangada (limpeza, consertos, etc). A forma da pescaria realizada
depende da característica do grupo de pescadores, podendo ser de linha, de rede, de mergulho
com compressor ou peito livre (FERREIRA, DONATELLI e REIS Jr, 2002). Nas praias “A”
e “B”, a forma de pescaria utilizada é a de linha, que embora seja a mais rudimentar e com
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baixa produtividade, é mais barata que a pescaria de rede e com menos risco de agravo à
saúde do que aquela por mergulho com compressor ou peito livre. No entanto, foi constatado
que dois jangadeiros da praia “A” praticam mergulho ao peito livre.
A estratégia de trabalho dos jangadeiros está diretamente relacionada ao tipo de pescaria
escolhida de acordo com as épocas do ano. Existem dois tipos de pescaria: a pescaria de “ida
e volta” ou de inverno e a pescaria de verão ou de “gelo”.
A pescaria de inverno é realizada nos meses de junho a setembro, onde os pescadores partem
para o mar por volta das 04:00 horas e retornam por volta das 17:00 horas, dependendo da
velocidade do vento. Nesta pescaria os jangadeiros utilizam todos os equipamentos e
utensílios referidos acima, exceto o gelo em escamas e a caixa de isopor, para o
condicionamento do pescado, o lampião e o mini-fogão. O peixe, logo após a sua coleta,
permanece no piso da embarcação até que o pescador identifique o seu pescado com nós
diferenciados feitos com auxílio da linha de náilon, no caso da praia “A”, ou façam cortes
diferenciados na cauda dos peixes, no caso da praia “B”. Após esse procedimento, o pescado
é armazenado nos monoblocos utilizando-se apenas água do mar para a “conservação”.
Na pescaria de verão, realizada nos meses outubro a maio, os pescadores da praia “A” podem
passar dias no mar e na praia “B”, apenas um dia, levando consigo os equipamentos e
utensílios para pesca, navegação, alimentação e salvatagem. Para a alimentação, alguns
jangadeiros levam para a pescaria alimentos perecíveis, como o arroz e o feijão prontos para o
consumo, onde estes se estragam com facilidade já que são armazenados em temperatura
ambiente e são preparadas na noite anterior às pescarias. “Nossa comida é preparada de
noite. Aí agente deixa no fogão com a panela bem tampadinha. Aí, de manhã agente leva na
jangada. Aí, come dela a pescaria toda. No final da tarde, no raspo da panela, as vez não dá
pra comer....a comida desanda. E se comer fica ruim” Jangadeiro. Neste tipo de pescaria fica
evidente a sobrecarga física e mental e as extensas jornadas de trabalho destes pescadores,
como discutido pelos autores Pimenta e Vidal (2000); Teles e Vidal (2000)
Constatou-se que na praia “A” há a necessidade de aluguel de um automóvel para o transporte
dos equipamentos e utensílios acrescidos aos sacos de gelo em escamas (saco grande de 10
kg). Na praia “B”, os equipamentos de pesca são acondicionados em pequenos armazéns
construídos na praia e o gelo e as iscas são adquiridos no Mercado do Peixe, localizado na
beira da praia, próximo às embarcações. Apenas neste tipo de pescaria foi observada a
utilização de gelo para a conservação do pescado e do alimento. No outro tipo de pescaria
pode ocorrer o que o pescador ressalta:“ Às vezes o peixe já chega ruim e agente ñ consegue
vender. Aí o jeito é comer, tem família pra alimentar”Jangadeiro.
No tocante aos agravos à saúde, observa-se que tanto os jangadeiros da praia “A” quanto os
da praia “B”, estão sujeitos a acidentes provenientes do convés escorregadio, peixes
venenosos, lesões corporais causados por instrumentos de trabalho precários (enferrujados)
como a âncora e o bicheiro. Os depoimentos a seguir comprovam a existência de situações
semelhantes dadas pesquisa de Neto, Cordeiro e Haddad Jr (2005): “...isso aqui foi na hora
que eu peguei no peixe... tava aqui na ponta do barco...barco molhado... mas quando tá
dentro da água isso aqui (convés da jangada) fica tudo molhado e agente escorrega ....
Jangadeiro. “vez uma arraia pegou na perna do colega, e ficou seis meses parado...”
Jangadeiro.
Outra situação com grande potencial para agravos a saúde e que reflete negativamente na
atividade jangadeira, conforme discutido por Teles Vidal, (2000) e Neto, Cordeiro e Haddad
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Jr, (2005) consiste no consumo de álcool a bordo: “é difícil, é raro você encontrar um
pescador que não beba né, e ta de ressaca né, e essa ressaca atrapalha..”Jangadeiro.
Com relação ao processo de comercialização da produção da pesca artesanal, percebe-se que
este é dominado por uma rede de intermediação. Ela vai do atravessador individual,
geralmente alguém da comunidade que se especializou na compra e venda de pescado, até os
representantes de empresas que compram e financiam a produção (SANTOS e CÂMARA,
2002). Estes atravessadores ficam em terra firme a espera da jangada e negociam o peixe
capturado diretamente com o jangadeiro, na maioria das vezes pressionando-os e impondo-os
o preço para compra do pescado. Na praia “A”, o pagamento do pescado, pelos
atravessadores, é baseado na relação de confiança. O atravessador leva o peixe, sem nenhuma
técnica de acondicionamento, vende-o e paga aos jangadeiros com o apurado. Segundo um
dos jangadeiros entrevistado, o atravessador tem lucro de 50% com a venda do pescado. Com
relação à comercialização na praia “B”, como nesta praia existe um Mercado para este fim, o
mestre ou o dono da jangada é responsável pela venda do pescado, que pode realizá-la
diretamente com os comerciantes do mercado, com os atravessadores ou vendê-lo em seu
próprio box, no Mercado do Peixe. Observa-se que do lucro obtido na pescaria, 50% é
destinado aos pescadores, independente de sua função e os 50% restantes são destinados ao
dono da embarcação, que retira deste valor cerca de 25% para custear a pescaria. Estes valores
podem sofrer variações de acordo com o volume do pescado, número de jangadeiros, espécie
do peixe e condições climáticas, podendo ocasionar oscilações na produtividade. Tais
oscilações têm sido verificadas através da queda da produtividade de pescado, conforme fala
de jangadeiro “A pesca tá cada dia mais difícil, existem diferenças na pesca de antigamente
para a de hoje”; “o peixe tá reduzido”. Segundo os pescadores, estes recebem em média
entre R$ 500,00 a R$ 800,00 reais por mês, sendo difícil definir o valor devido às variações
mencionadas.
4.1.1 Análise das demandas na atividade jangadeira
Com base na análise global, nas pesquisas documentais e complementares, foi possível
identificar as demandas das instituições, dos jangadeiros e as latentes (Tabela 2).
DEMANDAS FONTE DAS DEMANDAS
Hipóteses Situadas Instituc.
Sobrecarga física e mental (PIMENTA, VIDAL, 2000); X X
Extensa jornada de trabalho (TELES, VIDAL, 2000); X X
Dores de origem neuromusculares e articulares (DALL’OCA, 2004); (ROSA,
MATTOS, 2007); (PINTO et al, 2007); X X
Queilite actínica, Carcinoma epidermóide e alergias (SILVA, et al, 2006);
(ROSA, MATTOS, 2007); X X
Doenças infecto-contagiosas e doenças não-transmissíveis (problemas visuais,
diabetes) (ROSA, MATTOS, 2007); X X
Estresse, insônia e elevação da pressão arterial (BARBOSA, 2004); (ROSA,
MATTOS, 2007); X X
Alimentação inadequada para o tipo de atividade com baixo consumo de frutas
e verduras (MURRIETA, 2001); X X
Monotonia / consumo de álcool e entorpecentes a bordo; (TELES, VIDAL,
2000); (NETO, CORDEIRO, HADDAD JR, 2005); (ROSA, MATTOS, 2007); X X
Manipulação inadequada dos alimentos e contaminação da água e alimentos
(Gastroenterites) (ANDRADE, 2000); (ROSA, MATTOS, 2007); X X
Manipulação inadequada do pescado (SINDIPI, 2008); X X
Limpeza inadequada das embarcações (VIEIRA,2004); X X
Espaço reduzido e difícil habitabilidade (PIMENTA, VIDAL, 2000); X X
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(MARQUES, 2000);
Precários instrumentos de trabalho (MARQUES, 2000); X X
Condições climáticas adversas (NETO, CORDEIRO, HADDAD JR, 2005); X X
Ocorrência de lesões (NETO, CORDEIRO, HADDAD JR, 2005); (ROSA,
MATTOS,2007); X X
Acidentes provocados pelo mergulho livre (desmaios e afogamentos)
FERREIRA, DONATELLI, REIS JR, 2002); X X
Poluição do ambiente de trabalho e escassez de consciência ambiental
(REPINALDO, TONINI, 2007); (STORI, 2000); X X
Submissão aos atravessadores (FERREIRA, DONATELLI, REIS JR, 2002); X X
Crescimento urbano e do turismo (MONTEIRO, 2007); X X
Ausência de condições financeiras para aquisição dos equipamentos de
salvatagem; X
Importância do cadastro na Colônia Z4 de Aqüicultura e Pesca de Natal; X
Autorização para a pesca da lagosta; X
Postura ao cortar iscas; colocação do mastro em alto mar; puxar a âncora; X
Dificuldade de locomoção da embarcação (dependência do vento). X
Queda da produtividade de pescado; X
Ausência de controle e registro do número de jangadeiros em atividade; X
Descumprimento das normas da Marinha (BENEVIDES, 2007); X X
Sobreexploração dos recursos pesqueiros (ABDALLAH, BACHA 1999);
(SOARES, 2003); X X
Risco de acidentes com os banhistas; X
Força para virar/empurrar/puxar jangada; movimento de jogar água na vela. X
Tabela 2 – Demandas da Atividade Jangadeira: hipóteses e demandas situadas
4.2 Formulação das propostas das ações para a intervenção na comunidade
A confrontação e análise das demandas possibilitou a identificação de demandas que
envolvem ações de gestão, de capacitação e de modificações no projeto da jangada. Estas
ações, fundamentadas nos ensinamentos da antropotecnologia e tecnologia social, requerem
uma Análise Ergonômica da Atividade, desenvolvida através de uma construção sócio-
técnica, para definir os conteúdos e especificar os sistemas de gestão integrados e as
alterações no projeto da jangada. (Tabela 3).
Ações Proposta de desenvolvimento
Ações de
Gestão
Ações voltadas ao alcance de melhorias na gestão das instituições e nas inter-relacionadas com
os jangadeiros. Organização do trabalho envolvendo os setores interligados
Oficinas de
Capacitação
Segurança na atividade jangadeira
Pretendem contribuir com orientações técnicas para evitar o surgimento de incidentes e
acidentes, através de conhecimentos sobre segurança e, minimizar as conseqüências quando estes
ocorrerem através de capacitação em primeiros-socorros.
Elaboração de cartilha: Segurança do trabalho na atividade jangadeira. Atenção postural aos jangadeiros
Busca evidenciar a relação entre postura, trabalho e saúde através da capacitação para auto-
cuidado por meio das orientações posturais, exercícios terapêuticos, auto-massagem, respiração
contribuindo para a melhoria na qualidade de vida.
Elaboração de cartilha: Atenção postural aos jangadeiros.
Manipulação Segura dos Alimentos e do Pescado Comercializado
Pretende-se apresentar aos jangadeiros as formas de manipulação segura dos alimentos
(preservando a saúde e possibilitando hábitos alimentares saudáveis) e do pescado
comercializado (melhorando a qualidade do produto).
Elaboração da cartilha: “Boas Práticas de Manipulação do Pescado”
Educação Nutricional
Ênfase ao valor nutricional do peixe e a importância do seu consumo, pretendendo desenvolver
uma visão crítica sobre a escolha dos alimentos, respeitando as condições de acesso e a cultura
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alimentar desta população promovendo hábitos alimentares saudáveis.
Elaboração da cartilha: “Guia Alimentar dos jangadeiros”.
Educação Ambiental
Desenvolver um Programa de Sensibilização Ambiental, o qual, objetiva esclarecer os
jangadeiros em torno do equilíbrio ambiental indispensável ao bom andamento dessa atividade
de trabalho, enaltecendo boas práticas ambientais individuais e coletivas voltadas à
sustentabilidade do meio ambiente em que estão inseridos.
Elaboração de cartilha: O Mar, a Terra, a Jangada: o nosso meio ambiente
Modificações
no projeto da
jangada
A ação referente ao projeto da jangada visa contribuir na melhoria das condições de trabalho em
termos de segurança, saúde e incremento na qualidade e produtividade do pescado.
Tabela 3 – Demandas de ações de gestão, capacitações e modificações no projeto da jangada.
5. Considerações finais
Atualmente várias pesquisas estão sendo realizadas almejando a excelência e melhoria da
qualidade de vida das populações. No entanto, como saber o que é melhor para cada
população? A fim de alcançar boas ações que sejam efetivamente necessárias a determinados
grupos, precisa-se, acima de tudo, conhecer seus hábitos, costumes, crenças, enfim, conhecer
sua atividade de trabalho e as repercussões desta em sua vida, conforme preconizam os
ensinamentos de antropotecnologia e tecnologia social.
Observou-se através da metodologia baseada na AET que é possível aproximar-se da
realidade dos jangadeiros identificando as principais demandas nessa atividade. A partir desta
pesquisa conclui-se que as principais demandas estão relacionadas com a segurança, saúde,
organização do trabalho, manipulação do alimento e do pescado, meio ambiente e a
embarcação. Dessa forma, constatou-se a necesidade da elaboração de propostas de ações
voltadas à redução das problemáticas encontradas, visando assegurar a melhoria da qualidade
de vida da população, bem como, preservar as características dessa, em busca da
sustentabilidade da atividade.
Através deste estudo é possível confirmar as afirmações de Saldanha(2004) em relação a
importância da análise de situações de referência que vão além das questões já bastante
discutidas por Vidal (2001), Guérin (2001) e Daniellou (2002), vinculadas aos problemas
frequentemetne encontrados no início de grandes investimentos industriais, geradas pelo
conhecimento desconfigurado da realidade. Segundo a autora, “a análise referencial realizada
previamente a instrução da demanda em uma empresa, possibilita o conhecimento de um
referencial operativo comum, constituído pelas informações contextuais, linguagem específica
do setor e pelos partilhados que servem de base para as trocas cooperativas que ocorrem ao
longo de uma intervenção”. Acrescenta ainda que a “análise referencial produz
conhecimentos necessários e imprescindíveis para a sustentação da ação conversacional nos
diversos momentos da ação ergonômica, sendo, em muitos casos, decisivos tanto na instrução
como de forma mais contudente, na construção de demandas.”
Por fim, percebe-se que a engenharia de produção, através da Ergonomia, em um trabalho
multidisciplinas e do olhar gestor, intrínseco à área, contribuiu imensuravelmente para a
realização desse trabalho.
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