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Pharmacia Brasileira - Jul/Ago 2001 12 FARM`CIA HOSPITALAR A CONSTRU˙ˆO DO MODERNO Pelo jornalista Aloísio Brandªo, editor desta revista Um mergulho no universo da farmÆcia hospitalar brasileira, atravØs de entrevistas com as figuras mais expressivas do setor, revela uma disparidade assustadora. Nele, coabitam atrasos e finas flores do hiperdesenvolvimento. Mas a busca por melhores conhecimentos estÆ dimi- nuindo essa diferença e transformando para melhor o panorama do setor. Com todas as dificuldades, Ø visível a busca por uma farmÆcia hospitalar moderna. E o que Ø uma FH moderna? É aquela que, alØm das tradicionais funçıes administrativas, econômicas e tØcnicas, Ø capaz de agregar atividades relacionadas à farmacoepidemiologia, farmacoe- conomia e terapia baseada em evidŒncias, que resultem na melhoria da qualidade da assis- tŒncia prestada ao paciente, responde um dos mais respeitados farmacŒuticos hospitalares brasileiros, professor Tarcísio Palhano. Visªo geral da Ærea interna da câmara de fluxo, com o farmacŒutico realizando o preparo da dose unitÆria, assessorado por um funcionÆrio da unidade FOTO: ALEXANDRE GAMA

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Pharmacia Brasileira - Jul/Ago 200112

FARMÁCIA HOSPITALAR

A CONSTRUÇÃODO MODERNO

Pelo jornalista Aloísio Brandão,editor desta revista

Um mergulho no universo da farmácia hospitalar brasileira, através de entrevistas com asfiguras mais expressivas do setor, revela uma disparidade assustadora. Nele, coabitam atrasose finas flores do hiperdesenvolvimento. Mas a busca por melhores conhecimentos está dimi-nuindo essa diferença e transformando para melhor o panorama do setor.

Com todas as dificuldades, é visível a busca por uma farmácia hospitalar moderna. E o que éuma FH moderna? �É aquela que, além das tradicionais funções administrativas, econômicase técnicas, é capaz de agregar atividades relacionadas à farmacoepidemiologia, farmacoe-conomia e terapia baseada em evidências, que resultem na melhoria da qualidade da assis-tência prestada ao paciente�, responde um dos mais respeitados farmacêuticos hospitalaresbrasileiros, professor Tarcísio Palhano.

Visão geral da área interna da câmara de fluxo, com o farmacêutico realizando o preparo da dose unitária, assessorado por um funcionário da unidade

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A PHARMACIA BRASILEIRAtraz, a partir desta página, uma vastamatéria sobre a farmácia hospitalar, noBrasil. A matéria abriga quatro entre-vistas e outros textos, com o objetivode focar o segmento, desde o seu pas-sado, para, daí, chegar a uma perspec-tiva, dentro de uma abordagem técni-co-científica, social, humana e crítica.A primeira visão que se tem é de umsetor díspar, onde coabitam o atraso eo hiperdesenvolvimento. Mas nuncapor culpa do farmacêutico, ansioso,sempre, em puxar para cima o nível daatividade. Essa desigualdade é a carado Brasil.

Ainda se vê proprietários e di-retores de hospitais e clínicas refratá-rios à idéia de implantação de um pro-grama moderno de farmácia e de con-tratação de farmacêuticos, em núme-ro desejável e levados à qualificação,em seus estabelecimentos. Entretan-to, se vê, também, farmácias hospita-lares vicejando progressos fantásti-cos, com requintes da mais alta espe-cialização, a exemplo da farmácia dohospital filantrópico Erasto Gaertner,em Curitiba, toda voltada para a on-cologia. A revista entrevistou a far-macêutica Vânia Mari Salvi Andrzeje-vski, coordenadora daquela farmáciae de um curso de especialização mi-nistrado, ali dentro.

Outro exemplo de franco pro-gresso do setor é o interesse, cadavez maior, no País, pela instalação dosistema de dose unitária. A PHAR-

MACIA BRASILEIRA ouviu uma dasmaiores autoridades brasileiras no as-sunto, o farmacêutico George Wa-shington Bezerra da Cunha, diretor doServiço de Farmácia do Incor (Institu-to do Coração) do Hospital das Clíni-cas da Universidade de São Paulo e co-ordenador do “I Congresso Brasileirode Medicamentos em Dose Unitária”,realizado, recentemente, em São Paulo.

Uma radiografia nacional do se-tor veio de uma entrevista com o pre-sidente da Sbrafh (Sociedade Brasi-leira de Farmácia Hospitalar), Maurode Castro. A revista falou também coma farmacêutica Lúcia Noblat, que estáà frente da revolução que está trans-formando a farmácia do Hospital Ed-gard Santos, em Salvador, pertencen-te à Universidade Federal da Bahia, ecom Josué Schostack, farmacêuticodo Hospital de Clí-nicas de Porto Ale-gre, que vem minis-trando cursos deFarmácia Hospitalarpelo Norte e Nor-deste do País, aconvite do Conse-lho Federal de Far-mácia.

Mas a portade entrada da revis-ta nesse conjuntode matérias foi uma entrevista com oprofessor Tarcísio Palhano, um doshomens que escreveram a história damoderna farmácia hospitalar brasilei-ra, dentro do Hospital das Clínicas deNatal (RN), hoje, Hospital Onofre Lo-pes. Não sem, antes, sondar o farma-cêutico que esteve na retaguarda dosacontecimentos, no Rio Grande doNorte, onde se instalou a vanguardado setor: o professor Aleixo Prates.

A ousadia de Cimino - Pratescita o professor de Farmacotécnica daFaculdade de Ciências Farmacêuticasda Universidade de São Paulo, JoséSylvio Cimino, como o homem queplantou a moderna farmácia hospita-lar, no Brasil, cujo primeiro fruto cres-ceu no Hospital das Clínicas de Natal.De descendência italiana, Cimino eraum desses homens audaciosos, paraquem o desafio era uma festa.

Para se ter uma idéia, Ciminomontou, no final da década de 60, noHospital das Clínicas de São Paulo,aquela que era a maior farmácia hos-pitalar do mundo, com nada menos que5 mil metros quadrados, de acordocom a avaliação do professor AleixoPrates. Se o tamanho assusta, aindahoje, imagina, há mais de 30 anos. Aárea colossal era ocupada com a pro-dução magistral e industrial de medi-camentos, toda ela absorvida pelopróprio hospital.

Antes, a farmácia ocupava a mo-desta área de 400 metros quadrados,que, aliás, não é modesta coisa ne-nhuma mesmo para os padrões dehoje. Aquela, de 400 metros, foi a pri-meira farmácia do HC da capital pau-lista, criada pelo mesmo Cimino, umfarmacêutico com profundos conhe-

cimentos de quí-mica que chegoua produzir matériaprima dentro doestabelecimentoque dirigia.“Quando faltavaalguma matériaprima, ele fazia cál-culos estequiomé-tricos, misturavasubstâncias eproduzia os insu-

mos”, lembra Aleixo Prates, aluno deCimino num dos estágios que minis-trou. O pioneiro ousado do HC de SãoPaulo faleceu, na década de 70, dei-xando a mais importante de suasobras: gerações de farmacêuticos hos-pitalares espalhados por todo o Bra-sil.

Por uma questão de registro his-tórico, vale salientar que a história dafarmácia hospitalar brasileira está mui-to ligada às santas casas de miseri-córdia. Todas elas possuíam as suasfarmácias, embora nem todas elas es-tivessem em mãos de farmacêuticos.No conjunto de matérias que se se-gue, não foi possível ouvir ou citar osnomes de todos aqueles que colabo-ram para o engrandecimento da far-mácia hospitalar. Mas a todos eles, osparabéns da revista PHARMACIABRASILEIRA.

Professor Aleixo Prates

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O Conselho Federal de Farmá-cia está determinado a criar um outropanorama para a farmácia hospitalarbrasileira. O CFF age em vários flan-cos, principalmente no campo do co-nhecimento. Busca alterar os currícu-los dos cursos de Farmácia, com vis-tas a que se intensifique o ensino deFarmácia Hospitalar, e vem bancandocursos de educação continuada peloPaís. “Estamos muito oti-mistas, porque estamospresenciando e sendo osagentes de uma mudan-ça substancial na farmá-cia hospitalar do nossoPaís”, diz o presidente doCFF, Jaldo de Souza San-tos.

Em 1999 e 2000, oCFF realizou, no Norte eNordeste, o curso “Atu-alização em FarmáciaHospitalar”, ministradopelos farmacêuticos hospitalares Jo-sué Schostack, do Hospital de Clíni-cas de Porto Alegre, pertencente àUFRS (Universidade Federal do RioGrande do Sul), também professor deFarmácia Hospitalar da PUC (Pontifí-cia Universidade Católica) da capitalgaúcha e da pós-graduação da As-sociação dos Hospitais do Rio Gran-de do Sul; Márcia Elisa Carraro do

O esforço do CFF pordisseminar conhecimentos

Nascimento, especialista em farmáciaclínica e integrante da farmácia dohospital público Nossa Senhora daConceição, em Porto Alegre; e IaraAydos, da Farmoterápica, empresa es-pecializada em Nutrição Parenteral eQuimioterapia. A farmacêutica tam-bém é de Porto Alegre.

O curso foi realizado em JoãoPessoa e Campina Grande (PB), Reci-

fe, Maceió, Fortaleza, SãoLuiz, Terezina, Palmas eSalvador. Em nenhum doslugares, registrou-se fre-qüência inferior a 100 par-ticipantes, entre farmacêu-ticos e estudantes de Far-mácia. No dia 21 de setem-bro, iniciou-se a segundarodada de cursos, destavez, sobre atenção farma-cêutica em farmácias co-munitárias e hospitalares.

Mudança na gradua-ção – Farmacêutico hospitalar, há 30anos, Josué Schostack fez um diag-nóstico um pouco sombrio da farmá-cia hospitalar, nos lugares onde mi-nistrou o curso. “Os farmacêuticos eestudantes não tinham muito conhe-cimento técnico-científico sobre oassunto, não sabiam, por exemplo, daspossibilidades e áreas de atuaçãoprofissional, dentro de uma farmácia

hospitalar”, lamenta. Schostack acres-centa que muitos não sabiam comotrabalhar em um saneante, como agirnuma comissão de controle de infec-ção, como preparar e dispensar umantineoplásico etc.

Para ele, mudanças somente vi-rão com o conhecimento. E a primeiraprovidência, nesse sentido, terá quepartir dos cursos de Farmácia. JosuéSchostack defende que as institui-ções de ensino criem a Cadeira obri-gatória de Farmácia Hospitalar noscursos de Farmácia. Critica o fato deque, hoje, poucos a possuem. “Essenúmero não chega a 10%”, garante.A PUC de Porto Alegre, onde ensina,é uma das pioneiras na criação da Ca-deira obrigatória de FH.

Veja, ao final deste conjunto dematérias, as resoluções do ConselhoFederal de Farmácia dispondo sobrea atividade do farmacêutico na farmá-cia hospitalar.

Josué Schostack

Jaldo de Souza Santos

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

Natal, pólo irradiadorO professor Tarcísio Palhano, diretor da farmácia do Hospital Onofre Lopes, daUniversidade Federal do Rio Grande do Norte, foi um dos lançadores da pedra

fundamental da moderna farmácia hospitalar brasileira

Escrever sobre a farmácia hospitalar brasileira, como propósito de investigar um tanto do seu passado e doseu presente e abrir uma perspectiva crítica para o seuporvir, abalizado em evidências, fatos, conhecimentos,como é o caso desse conjunto de entrevistas que a revista

PHARMACIA BRASILEIRA está fazendo, requer um ro-teiro mínimo que inclui alguns nomes obrigatórios, entreoutras observações básicas. O professor Tarcício JoséPalhano é um desses nomes.

Unanimidade entre farmacêuticos brasileiros, quan-

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do se fala no assunto, Palhano é um dos basti-ães que ancoraram a farmácia hospitalar, quan-do ela muito precisava de apoio intelectual, deconhecimento e de homens de boa vontadepara crescer, dentro de uma visão moderna. Eo que é uma farmácia hospitalar moderna? Opróprio Tarcísio Palhano é quem descreve: “Éaquela que, além das tradicionais funções ad-ministrativas, econômicas e técnicas, é capazde agregar atividades relacionadas à farmaco-epidemiologia, farmacoeconomia e terapia ba-seada em evidências, que resultem na melho-ria da qualidade da assistência prestada ao paciente”.

Meticuloso, devotado ao trabalho, desbravador,Tarcício Palhano, o homem que ajudou a solidificar a mo-derna farmácia hospitalar, no País, tem um currículo tãorico, que é impossível resumi-lo, sem deixar de fora algu-mas de suas grandes ações. Professor adjunto do Cursode Farmácia, da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, professor e coordenador de Farmacolo-gia Aplicada e do Estágio Supervisionado Far-macêutico da mesma Faculdade; diretor, desde1991, de Farmácia do Hospital UniversitárioOnofre Lopes, antes - e ainda - chamado deHospital das Clínicas, o farmacêutico já inte-grou a Comissão de Ensino do Conselho Fe-deral de Farmácia e a Comissão de Revisão daFarmacopéia Brasileira.

Raramente, tem uma folga em sua agenda.Mesmo assim, como se possuísse o dom daonipresença, viaja pelo País, pregando o que

sabe sobre essa que é uma de suas paixões. Nesta entre-vista que deu à PHARMACIA BRASILEIRA, TarcísioPalhano conta um pouco da história da implantação donovo conceito de farmácia hospitalar no Onofre Lopes, daUFRN. Uma história para a história da Farmácia brasileira.Fala ainda sobre farmácia clínica, sobre a atuação do far-macêutico nos hospitais etc. Veja a entrevista.

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

Tarcísio Palhano

PHARMACIA BRASILEIRA - Écerto dizer que o embrião da farmáciaclínica hospitalar brasileira foi geradona farmácia do Hospital da Universi-dade Federal do Rio Grande do Norte,sob o seu comando? Pode contar umpouco dessa história?

Tarcísio Palhano - Sim. Tudo co-meçou com o professor Aleixo Prates,em 1977. Convidado pelo reitor da Uni-versidade Federal do Rio Grande doNorte, professorDomingos Gomesde Lima, para mo-dernizar o Niquifar,laboratório-escolaque funcionavanas dependênciasdo Curso de Farmá-cia, como campo deestágio para osalunos da habilita-ção em Indústria, também, pretendiadesenvolver um projeto que resultas-se na completa reestruturação da far-mácia do Hospital das Clínicas, o queincluía a ampliação do laboratóriode farmacotécnica magistral e a im-plantação de um serviço de farmá-cia clínica.

Para viabilizar esse projeto, oprofessor Aleixo convidou alguns far-macêuticos e também alguns alunosdo último período do Curso de Farmá-cia, entre os quais Júlio Maia, Socor-

ro Oliveira e eu. Colamos grau, em de-zembro de 1977. Em fevereiro do anoseguinte, prestamos concurso para aUniversidade e, em março, já estáva-mos, em São Paulo, para fazer estágio.

O professor Júlio foi estagiar, nafarmácia da Santa Casa de Misericór-dia, com o Dr. Cláudio Daffre; a pro-fessora Socorro foi encaminhada paraestágio com o Dr. Paulo Marques, nafarmácia Drogamérica, e eu fui recebi-

do pelo Dr. JoséSylvio Cimino, noHospital das Clí-nicas da Faculda-de de Medicina daUSP.

Confesso que ocomeço foi difícile cheguei a pen-sar em desistir.Apesar de ainda

saber muito pouco sobre farmácia clí-nica, não conseguia correlacioná-la aoestágio que realizava. Foi então queconheci o Dr. George Washington,chefe do Serviço de Farmácia do Ins-tituto do Coração do Hospital das Clí-nicas da USP. Foi lá, no InCor, junta-mente com as colegas Izabella Bo-lyhos e Sônia Cipriano – hoje, direto-ra da Divisão de Farmácia do Hospitaldas Clínicas da USP - que comecei,efetivamente, o meu estágio, sob asupervisão e orientação do Dr. Geor-

ge. Concluído o estágio, viajei para oChile, onde permaneci, de agosto adezembro, fazendo curso de FarmáciaClínica, sob a orientação da professo-ra Inés Ruiz, da Universidade do Chi-le.

Enquanto isso, os professoresJúlio e Socorro já haviam concluídoos seus estágios, em São Paulo, e,antes de voltarem para Natal, haviamestado em Buenos Aires, para conhe-cer a Farmácia Florida, então, modelode farmácia magistral, na América doSul. De volta a Natal, o professor Jú-lio assumiu a chefia da Seção de Far-mácia do Hospital das Clínicas e co-meçou a executar o projeto de rees-truturação idealizado pelo professorAleixo.

No início do ano seguinte, a pro-fessora Inés veio para Natal, com amissão de coordenar a implantação deum Serviço de Farmácia Clínica, noHospital das Clínicas da Universida-de Federal do Rio Grande do Norte.Foi, assim, que surgiu o primeiro Se-tor de Farmácia Clínica do Brasil, ofi-cialmente implantado, em 15 de janei-ro de 1979, conforme “Termo de Ins-talação”, lavrado, na ocasião, paradocumentar tão importante feito.

Naquela mesma oportunidade,foi criado o primeiro Centro de Infor-mação de Medicamentos do Brasil,vinculado à Farmácia Clínica, visan-

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do, principalmente, adar o suporte técni-co-científico indis-pensável ao adequa-do desempenho dasações que passariama ser executadas pe-los farmacêuticos. Aprimeira informaçãofornecida, por escrito(contra-indicaçõesdo Trilergon em paci-entes com enfermida-de cardiovascular),data de 23 de janeirode 1979.

Desde então,passei a dirigir a Farmácia Clínica. Écerto que sua criação havia se consti-tuído em um marco histórico. Porém,era apenas o começo, o primeiro pas-so; era preciso seguir a caminhada.

Não foi difícil perceber que opasso seguinte seria constituir umaequipe. Foi, então, que sugeri ao pro-fessor Aleixo a contratação de duascolegas de turma, que haviam se des-tacado, durante o curso de gradua-ção como alunas estudiosas e aplica-das. Refiro-me a Lúcia Costa, que, porassumir o sobrenome do esposo, pas-sou a se chamar Lúcia Noblat, e a Ivo-nete Batista. Seria também uma ma-neira de desfrutar, o máximo possível,dos indescritíveis conhecimentos daprofessora Inés, que iria permanecer,em Natal, por três meses.

No mesmo ano, as professorasLúcia e Ivonete fizeram seus cursosde Farmácia Clínica, no Chile, de modoque, ao final de 1979, já contávamoscom uma equipe formada por três far-macêuticos clínicos. A partir daí, a far-mácia clínica deslanchou. Cada farma-cêutico clínico integrou-se à equipede uma especialidade médica, a come-çar pela cardiovascular, seguindo-sea gastrenterologia e a pneumologia, ecomeçou a participar ativamente dodia-a-dia de cada uma delas.

Implantado o Serviço e efetiva-mente implementadas ações pelos far-macêuticos clínicos, era preciso fazeruma primeira grande avaliação da far-mácia clínica, no País. Foi o que inspi-rou a realização do “I Seminário Brasi-

leiro de Farmácia Clí-nica”, de primeiro acinco de junho de1981, do qual partici-param 111 farmacêuti-cos de 14 Estadosbrasileiros, além dosprofessores Juan Ro-bayo e Thomas Moo-re, dois consultoresinternacionais em Far-mácia Clínica, trazidosdos Estados Unidos,graças ao convênioMEC/BID.

O Semináriocontou, ainda, com as

presenças de representantes de diver-sos organismos nacionais e interna-cionais, das áreas de saúde e educa-ção, de várias autoridades da nossaUniversidade, a começar pelo reitor,diretor do Centro de Ciências da Saú-de, coordenadora do Curso de Farmá-cia, diretor do Hospital das Clínicas,além de médicos e enfermeiros perten-centes às equipes em que os farma-cêuticos clínicos atuavam. Os depoi-mentos destes últimos foram extrema-mente favoráveis e gratificantes, poisrealçaram, sobremodo, a importânciada nossa participação nos trabalhosdas suas equipes.

Como os resultados do “I Semi-nário” haviam sido bastante favorá-veis, nos animamos a dar um novopasso. Refiro-me ao “I Curso Brasilei-ro de Farmácia Clínica”, realizado, dedois a 27 de maio de1983, do qual partici-param 180 farmacêuti-cos de sete Estadosbrasileiros.

PHARMACIABRASILEIRA - Comoeram os ambienteshospitalares do País,em que pesem as ati-vidades farmacêuti-cas, antes da farmáciado HC de Natal?

Tarcísio Palha-no - Não disponho dedados suficientes pararesponder a esta per-gunta, especialmente

pela grande dimensão do nosso País.Sei, no entanto, que, muito antes denós, vários farmacêuticos já militavamna farmácia hospitalar, pelo Brasil afo-ra. Mesmo correndo o risco de come-ter injustiças por eventuais omissões,poderia destacar os nomes dos dou-tores José Sylvio Cimino, CláudioDaffre, George Washington, VictorHugo, Myrcio de Paula, Amílcar Car-leal, José Antônio, Geovani Fernan-des, Michel Kfouri, Márcio Fonseca,Ernesto Galvão, entre outros, em SãoPaulo; professor Levy Gomes e Dr.Mário Teixeira, no Rio de Janeiro; pro-fessores Antônio Basílio e ZildetePereira, em Minas Gerais; Dr. JosuéShostack, no Rio Grande do Sul; Dr.Oscar Vilaça, em Pernambuco; profes-sor José Alexandrino, na Bahia, alémdos Drs. Antônio Macedo e GrijalvaViana, aqui mesmo em Natal.

PHARMACIA BRASILEIRA -Em 1978, a farmácia do HC de Natalassumia a condição de vanguarda dafarmácia hospitalar brasileira, inclusi-ve, irradiando influências para todo oPaís. Ela já possuía moderna estrutu-ra e alcançava várias áreas de ativida-de? O senhor pode citar e comentarcada uma dessas áreas?

Tarcísio Palhano - O projeto dereestruturação da farmácia do Hospi-tal das Clínicas começou a ser imple-mentado, em agosto de 1978. Portan-to, ainda não havia qualquer possibi-lidade de assumir posição de vanguar-da, àquela altura. A implementação

desse projeto foi en-tregue ao professorJúlio Maia, tendo emvista que a ele coubechefiar a farmácia.Com o seu afasta-mento, devido aomestrado que foi fa-zer, a chefia passou aser exercida pela pro-fessora Socorro Oli-veira, vindo, em se-guida, as professo-ras Ana Maria Mari-nho, Ivonete Batistae, finalmente, eu, apartir de 1991.

A estrutura era

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

�...ao final de 1979, jácontávamos com uma

equipe formada por trêsfarmacêuticos clínicos. A

partir daí, a farmáciaclínica deslanchou. Cada

farmacêutico clínicointegrou-se à equipe de

uma especialidademédica, a começar pelacardiovascular, seguindo-se a gastrenterologia e apneumologia, e começoua participar ativamente do

dia-a-dia de cada umadelas�

�A morte do presidenteTancredo Neves, em 1985,supostamente decorrentede infecção hospitalar,

além de ter causado umaverdadeira comoçãonacional, trouxe uma

tremenda dor de cabeçapara as autoridades desaúde do Brasil. Como

explicar ao mundo que umpresidente da Repúblicanão poderia tomar posse,por ter sido vítima de um

problema, até certo ponto,controlável?�

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bastante precária e, além da farmáciade dispensação, dispunha apenas deum pequeno laboratório de manipula-ção, no subsolo do hospital, que, ape-sar de ter sido considerado muito im-portante, estava desativado. Os pri-meiros passos consistiram na elabo-ração de uma padronização de medi-camentos e na ampliação do quadrofuncional.

PHARMACIA BRASILEIRA -O Ministério da Saúde, há anos, im-plantou um curso de farmácia hospi-talar, no HC, voltado para o controleda infecção. Por que o curso não exis-te mais?

Tarcísio Palhano - A morte dopresidente Tancredo Neves, em 1985,supostamente decorrente de infecçãohospitalar, além de ter causado umaverdadeira comoção nacional, trouxeuma tremenda dor de cabeça para asautoridades de saúde do Brasil. Comoexplicar ao mundo que um presidenteda República não poderia tomar pos-se, por ter sido vítima de um proble-ma, até certo ponto, controlável? Foi,aí, que o Ministério da Saúde consti-tuiu um Grupo de Trabalho, lideradopelo Dr. Luiz Carlos Romero, cujo prin-cipal objetivo seria o de avaliar a atu-ação das Comissões de Controle deInfecção Hospitalar (CCIH), instituí-das, através da Portaria 196/83, pelopróprio Ministério. Após analisar odesempenho dos dis-tintos profissionaisque já estavam atuan-do em algumas destascomissões, o Grupoconcluiu, sem maioresdificuldades, pela im-periosa necessidadede capacitar farma-cêuticos, a fim de que,também, pudessem sedesempenhar adequa-damente nessa áreade atuação.

O Grupo passou,então, a visitar farmá-cias hospitalares dediversos Estados bra-sileiros, em busca deum serviço que ofere-cesse condições téc-

nicas adequadas à mi-nistração de cursospara farmacêuticos. Afarmácia do Hospitaldas Clínicas foi a es-colhida, especialmen-te pelo entusiasmoque o Grupo demons-trou, ao conhecer otrabalho, aqui desen-volvido, através dafarmácia clínica. Foiassim que, de 85 a 92,foram realizados, emnosso Hospital, oito cursos de Espe-cialização em Farmácia Hospitalar parao Controle de Infecção Hospitalar, ini-cialmente, coordenados pela profes-sora Lúcia Noblat e, em seguida, pelaprofessora Ivonete Batista. Participa-ram desses cursos 191 farmacêuticosde todos os Estados brasileiros.

Acredito que o curso não existemais, por uma certa falta de interessedo próprio Ministério da Saúde. Denossa parte, em que pese o imensodesgaste, fazíamos um esforço sobre-humano para conciliar as atividadesdos cursos com nossas funções do-centes e assistenciais que, obviamen-te, não eram interrompidas, durante arealização dos mesmos. Apesar dis-so, quando olhamos para trás, senti-mo-nos felizes e recompensados portudo que foi feito, pois temos a certe-

za do quanto pude-mos contribuir parareescrever a históriada farmácia hospita-lar do Brasil.

PHARMACIABRASILEIRA - Falarem infecção hospita-lar, que ações vocêsestão desenvolven-do, com vistas a con-tê-la, hoje? Qual o ín-dice de infecção, aí,no HC?

Tarcísio Palha-no - A Comissão deControle de Infecçãodo nosso Hospitaldesempenha as suasações, satisfatoria-mente, de acordo

com nossa avalia-ção. Dentre suasações, podem serdestacadas:

1) A vigilânciaepidemiológica dasinfecções, através dométodo de busca ati-va; 2) o controle douso de todos os an-timicrobianos pres-critos, terapêutica eprofilaticamente; 3) olevantamento dos

indicadores epidemiológicos de infec-ção, de sensibilidade/resistência bac-teriana, bem como de consumo de an-timicrobianos, profiláticos e terapêu-ticos; 4) a elaboração, atualização eimplantação de rotinas referentes aocontrole das infecções; e, 5) a partici-pação em atividades de educação con-tinuada, especialmente junto a médi-cos residentes, pessoal de enferma-gem e funcionários do setor de higie-nização.

As taxas de infecção, referentesao primeiro semestre deste ano, foramde 5,4%, 7,5% e 11,2%, na clínica ci-rúrgica, clínica médica e UTI, respec-tivamente.

PHARMACIA BRASILEIRA -Apesar da extinção do curso, a farmá-cia do Hospital das Clínicas continuaaberta a estudantes e farmacêuticos,que, aí, vão fazer estágio e especiali-zação? Como ambos são ministradose de que se compõem?

Tarcísio Palhano - Infelizmente,não oferecemos mais estágio e nemministramos cursos de especializaçãoem nossa farmácia, tendo em vista asdificuldades por que passam a Uni-versidade e os hospitais universitári-os brasileiros, como um todo, e pelosproblemas de infra-estrutura e de pes-soal, no nosso caso particular. O úni-co estágio que continuamos a ofere-cer é destinado aos alunos do últimoperíodo do Curso de Farmácia da nos-sa Universidade, pois faz parte da dis-ciplina curricular obrigatória EstágioSupervisionado Farmacêutico.

Esta disciplina tem uma carga ho-rária total de 360 horas, 120 das quaissão ministradas na farmácia do nosso

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

�Infelizmente, nãooferecemos mais estágio enem ministramos cursos deespecialização em nossafarmácia, tendo em vistaas dificuldades por que

passam a Universidade eos hospitais universitáriosbrasileiros, como um todo,

e pelos problemas deinfra-estrutura e de

pessoal, no nosso casoparticular�

�Não são raros os casos,não só de hospitais, mas

também de clínicasprivadas, que estão

incorporando ofarmacêutico a seus

quadros funcionais. E oque é ainda mais

animador é que essadecisão tem sido tomada,

cada vez mais, nãoapenas para darcumprimento a

dispositivos legais, mas seespelha em exemplos de

trabalhos muito bemsucedidos, realizados por

esses profissionais emoutras instituições�

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Hospital, para uma média de 30 a 40alunos, por semestre. Embora os alu-nos também participem de atividadesrelativas à farmácia hospitalar propri-amente dita, como dispensação de me-dicamentos e correlatos, reconstitui-ção de antineoplásicos, manipulaçãode fórmulas oficinais e magistrais, etc.,o estágio tem comoponto forte a práticada farmácia clínica,pois, a partir da se-gunda semana, elescomeçam a acompa-nhar pacientes, parti-cipam de sessões clí-nicas, fazem aconse-lhamento a pacientessobre o uso de medi-camentos e concluemo Estágio com a apre-sentação dos casosclínicos dos pacien-tes por eles acompa-nhados. As outras 240 horas do Está-gio são ministradas na farmácia-esco-la e no laboratório de farmacotécnicado Curso de Farmácia.

PHARMACIA BRASILEIRA -A farmácia do HC encontra alguma di-ficuldade? Quais?

Tarcício Palhano - As dificulda-des são incontáveis. As dependênci-as físicas da farmácia deixam muito adesejar, tendo em vista as precarieda-des da estrutura do próprio hospital,no qual está localizada; temos carên-cia de pessoal auxiliar, decorrente devagas não preenchidas pelo Ministé-rio da Educação e do Desporto. Osrecursos financeiros destinados àaquisição de medicamentos e correla-tos nem sempre são suficientes, pos-to que são provenientes, exclusiva-mente, da receita gerada pelo própriohospital, esta já comprometida em cer-ca de 50% somente com o pagamentode pessoal.

Essas dificuldades, no entanto,começam a ser superadas. O Hospi-tal, que já não é mais “das Clínicas”,e, sim, Hospital Universitário OnofreLopes, desde 1985, está passando porprofundas reformas físicas e estrutu-rais, graças ao empenho e à dedica-ção do seu atual diretor, professor Ri-

cardo Lagreca, que tem conseguidocaptar recursos provenientes do Or-çamento Geral da União, através deemendas coletivas da bancada fede-ral do Estado do Rio Grande do Norte.Esta elogiável atitude dos nossos par-lamentares decorre, certamente, do re-conhecimento da importância social

deste nosocômiopara todo o povo po-tiguar.

Inserida nestecontexto, a farmáciatambém será contem-plada, tanto nos as-pectos físicos, comoestruturais, funcio-nais e, também, noque se refere a pesso-al. Já está em fase deconclusão o prédiodestinado à Centralde AbastecimentoFarmacêutico (CAF),

com uma área de 300m2. O Serviço dafarmacotécnica está sendo reestrutu-rado, sendo a principal mudança aadaptação de uma área, onde serãocentralizados os procedimentos refe-rentes à diluição de antineoplásicos,preparação de soluções para nutriçãoparenteral e de outras misturas intra-venosas.

O serviço de dispensação farma-cêutica também passará por reformas,com as quais pretendemos dotá-lo dascondições necessárias à prática dosmodernos procedimentos de dispen-sação de medicamentos e de correla-tos. Recentemente, foi feita uma sele-ção, através de uma fundação ligadaà nossa Universidade, visando a pre-encher vagas existentes nos diversossetores do hospital. A Farmácia estásendo contemplada com seis funcio-nários, o que resolverá o nosso pro-blema de carência de pessoal auxiliar.Quem sabe se, ao cabo de todas es-sas melhorias, poderemos voltar asonhar com estágios e até mesmo comcursos de especialização.

PHARMACIA BRASILEIRA -Como o senhor avalia a farmácia hospi-talar brasileira, nos últimos dez anos?

Tarcísio Palhano – Ela melho-rou, e muito. Só para você ter uma

idéia, em 1990, foi realizado, no Rio deJaneiro, o “I Congresso Brasileiro deFarmácia Hospitalar”. Dois anos de-pois, também no Rio de Janeiro, ocor-reu o segundo. Observe que estesdois congressos aconteceram, antesda criação da Sociedade Brasileira deFarmácia Hospitalar (Sbrafh), que datade 1995.

A criação da Sbrafh constituiuum marco na história da farmácia hos-pitalar brasileira. Dentre as suas maisimportantes realizações, gostaria dedestacar os três Congressos Nacio-nais de Farmácia Hospitalar, todoscom participação de expressiva par-cela de farmacêuticos de todo País, o“I Encontro de Professores da disci-plina Farmácia Hospitalar”, e a elabo-ração do manual “Padrões Mínimospara Farmácia Hospitalar”. Recente-mente, realizou-se, em São Paulo, o “ICongresso Brasileiro de Medicamen-tos em Dose Unitária”. Creio que es-tes fatos, por si só, dão uma idéia doquanto tem evoluído a farmácia hos-pitalar, nos últimos anos. As perspec-tivas apontam para um futuro aindamais promissor.

PHARMACIA BRASILEIRA -O senhor acredita que a mentalidadedos proprietários e administradoreshospitalares, em geral, está evoluin-do para a aceitação plena da verdade,segundo a qual hospital algum podefuncionar, com sucesso, sem uma far-mácia verdadeiramente boa e sem osseus farmacêuticos?

Tarcísio Palhano - Não tenhodúvida de que sim. Embora se trate deum processo gradual e que, portanto,demandará algum tempo, a evoluçãoé inconteste. Não são raros os casos,não só de hospitais, mas também declínicas privadas, que estão incorpo-rando o farmacêutico a seus quadrosfuncionais. E o que é ainda mais ani-mador é que essa decisão tem sidotomada, cada vez mais, não apenaspara dar cumprimento a dispositivoslegais, mas se espelha em exemplosde trabalhos muito bem sucedidos,realizados por esses profissionais emoutras instituições.

PHARMACIA BRASILEIRA -Fale sobre a farmácia clínica, no Brasil.

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

�A moderna farmáciahospitalar é aquela que,

além das tradicionaisfunções administrativas,

econômicas e técnicas, écapaz de agregar

atividades relacionadas àfarmacoepidemiologia,

farmacoeconomia eterapia baseada em

evidências, que resultemna melhoria da qualidadeda assistência prestada ao

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Tarcísio Palhano - Desde queiniciamos o trabalho, aqui em Natal,tivemos a preocupação de divulgá-loo máximo possível, na expectativa deque outros tantos fossem implemen-tados. Seria impossível dizer de quan-tos eventos as professoras Lúcia e Ivo-nete e eu já participamos, ao longo detodos esses anos, sempre divulgandoa mensagem da farmácia clínica. Eumesmo só não estive, ainda, nos Esta-dos do Amapá e do Tocantins.

Igualmente impossível seria di-zer quantos farmacêuticos brasileirosjá participaram de cursos de FarmáciaClínica, pelo mundo afora, especial-mente no Chile, desde 1977. Baseadonestas informações, era de se esperarque inúmeros serviços já houvessemsido implantados, por todo o País. Noentanto, posso garantir, e o faço comextremo pesar, que as experiências, nes-ta área, ainda são bastante tímidas.

PHARMACIA BRASILEIRA -Como é a relação entre farmacêuticose médicos, no HC? O espírito que devemover a equipe multidisciplinar estápresente, aí? E nos demais hospitaisdo País?

Tarcísio Palhano - Gostaria decomeçar a responder esta pergunta,comentando um pouco sobre o orga-nograma do nosso hospital. No iní-cio, a farmácia era uma seção, subor-dinada à Diretoria Técnica. Daí, a far-mácia clínica ter sido estruturada comoum setor. Com o passar dos anos, afarmácia foi galgando posições na hi-erarquia da instituição, até chegar, em1996, à condição de Diretoria, atingin-do, assim, o mesmo nível de subordi-nação hierárquica das demais direto-rias. Em decorrência disso, a farmáciaclínica ascendeu ao nível de Divisão.

Não estou querendo dizer, comisso, que a simples posição ocupadano organograma garante, por si só,que o espírito de equipe esteja pre-sente. Porém, facilita, sobremodo, ten-do em vista que, além de possibilitar oestabelecimento de um diálogo per-manente entre os profissionais de to-das as categorias, favorece a tomadade decisões.

Mesmo assim, não posso falarem unanimidade, até porque, em qual-quer parte do mundo e em qualquertipo de atividade, sempre vão existir

os céticos, os indiferentes, os auto-suficientes, e, até mesmo, os tímidos,que, por razões óbvias, têm dificulda-de para o trabalho em equipe.

Considero, no entanto, que onosso ambiente é o melhor possível,pois o espaço (re)conquistado por nósna equipe multiprofissional de saúdefoi pautado, desde o início, pelo res-peito, pela responsabilidade, pela per-severança, e, porque não dizer, pelaqualidade dos serviços prestados,que só a competência possibilita al-cançar. Quanto aos demais hospitaisdo País, apesar de saber da existênciade bons trabalhos, considero temerá-rio fazer uma avaliação global.

PHARMACIA BRASILEIRA -O que é uma moderna farmácia hospi-talar?

Tarcísio Palhano - É aquela que,além das tradicionais funções admi-nistrativas, econômicas e técnicas, écapaz de agregar atividades relacio-nadas à farmacoepidemiologia, farma-coeconomia e terapia baseada em evi-dências, que resultem na melhoria daqualidade da assistência prestada aopaciente.

ENTREVISTA / TARCÍSIO PALHANO

ENTREVISTA / GEORGE WASHINGTON

Medicamento certo,na dose certa, na hora certa,para o paciente certoO sistema de distribuição de medicamentosem dose unitária atrai, cada vez mais, ointeresse do farmacêutico hospitalar brasileiro

Ela não é nova, no Brasil, mas muitos farmacêuti-cos hospitalares ainda não a conhecem, com intimidade.Também, não é nenhuma panacéia que cura todos os ma-les do hospital doente, como pensam alguns. Mas podesalvá-lo, inclusive do velho – e repetitivo - mal dos preju-ízos astronômicas com medicamentos. Mais: torna a tera-pêutica muito mais eficiente, além de servir de plataformapara a instituição de uma ampla política de atenção farma-cêutica, no estabelecimento. Luzes para a dose unitária.

Ela foi a estrela única de umimportante evento farmacêu-tico, o “I Congresso Brasi-leiro de Medicamentos emDose Unitária”, realizado, emSão Paulo, de 16 a 18 de agos-to de 2001.

O Congresso, que atraiu mais de 800 participantes,é um revelador inequívoco do tamanho interesse do far-macêutico brasileiro pelo assunto. Idealizado e organiza-do pelo farmacêutico George Washington Bezerra da Cu-nha, com o apoio do Conselho Federal de Farmácia (CFF),o evento trouxe recomendações objetivas e factíveis, para

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reforçar o sistema de dose unitária, nos hospitais brasilei-ros.

Duas dessas recomendações são de que os hospi-tais aproximem-se da indústria farmacêutica para uma par-ceria especial na produção e fracionamento de medica-mentos em embalagens unitarizadas, e a criação do Insti-tuto Ibero-brasileiro de Medicamentos em Dose Unitária,com a finalidade de assessorar indústrias, hospitais, far-mácias e profissionais envolvidos com fármacos.

A PHARMACIA BRASILEIRA entrevistou o far-macêutico coordenador do “Congresso de Dose Unitá-ria”. O cearense George Washington é um dos pioneirosem dose unitária, no Brasil, e um dos seus maiores estudi-osos. Desde 1975, ele dirige o Serviço de Farmácia doIncor (Instituto do Coração) do Hospital das Clínicas daUniversidade de São Paulo, onde vivencia a utilização do

sistema de dose unitária. Farmacêutico-bioquímico pelaUniversidade Federal do Ceará com especialização em Far-macologia e Farmácia Clínica pela Long Beach MemorialHospital, na Califórnia (Estados Unidos), George chefioua Farmácia Privativa do Hospital Albert Einstein, foi con-sultor farmacêutico da Organização Pan-americana de Saú-de (Opas)/OMS para a América do Sul e presidiu a Centralde Medicamentos (Ceme), do Ministério da Saúde, já ex-tinta.

Homem de atividade intelectual ativa, escreveuvários livros conhecidos no meio farmacêutico, como “OPerigo das Interações de Drogas Injetáveis em SoluçõesParenterais – Soros”, “Guia Farmacoterapêutico Cardio-vascular”, entre outras publicações. A entrevista é cen-trada no tema dose unitária. Veja o que diz George Wa-shington.

ENTREVISTA / GEORGE WASHINGTON

PHARMACIA BRASLEIRA -No segmento dose unitária, que ru-mos foram apontados pelo “I Con-gresso Brasileiro de Medicamentos emDose Unitária”?

George Washington - O nossoCongresso, que contou com a presen-ça de mais de 800 participantes devários países do mundo ibero-latino-americano, consubstanciou a sua mis-são no seguinte tripé:

• Estímulo aos profissionais desaúde na troca de experiências dentroda racionalização da far-macoterapia e na otimi-zação do acesso ao me-dicamento.

• Convite à indús-tria farmacêutica parauma parceria especial naprodução e fracionamen-to de medicamentos emembalagens unitariza-das.

• Criação, no País,do Instituto Ibero-brasi-leiro de Medicamentosem Dose Unitária, com afinalidade de assessorarindústrias, hospitais,farmácias e profissio-nais envolvidos com fár-macos.

P H A R M A C I ABRASILEIRA - Quaisas vantagens da adoçãoda dose unitária pelohospital, dos pontos de

vista da saúde do usuáriodo medicamento, da agili-dade da atividade do far-macêutico e demais inte-grantes da equipe de saú-de, e também financeiro?

George Washington- O Sistema de Distribui-ção de Medicamentos emDose Unitária (SDMDU)pode ser comparado aoBom-Bril, um produto com1001 utilidades. Entre as utilidades da

dose unitária, estão asseguintes:1. elimina desperdício,desvios e cobranças in-devidas na conta do pa-ciente;2. garante ao médicoque o seu paciente vaireceber o remédio cer-to, na hora certa, com aprescrição certa;3. libera o pessoal deEnfermagem das tarefasresiduais de preparar,diluir e fracionar, acon-dicionar e reembalar me-dicamentos;4. proporciona ao far-macêutico uma intera-ção efetiva no acompa-nhamento da medica-ção e melhor gerencia-mento na previsão/pro-visão do arsenal tera-pêutico;

5. estabelece parâmetros admi-nistrativos de entrada e saída, tempode aquisição, incidência de prescriçãoe outros indicadores da boa gestãode estoques.

PHARMACIA BRASILEIRA -Apesar dos proveitos, por que o sis-tema de dose unitária ainda não é uti-lizado largamente pelos hospitais?Que estabelecimentos mais se utilizamdesse sistema: os públicos ou priva-dos? Que percentual da rede hospita-lar brasileira implantou a dose unitária?

George Washington - Esta per-gunta deveria ser dirigida à Socieda-de Brasileira de Farmácia Hospitalar(Sbrafh). Considero-me um pouco de-sinformado sobre o assunto de quan-titativos. No InCor, a Dose Unitáriaestá funcionando, há 20 anos, e tor-nou-se atração turística dos profissi-onais de saúde que visitam o comple-xo Hospital das Clínicas.

Acredito que ela seja válida, emqualquer tipo de hospital, público ouprivado. Em termos de números, não

�Ele (o Ministério daSaúde) já estáanalisando a

possibilidade deestimular a indústria

farmacêutica aproduzir

medicamentos emdose unitária, com

todas as informações(nome genérico, nomecomercial, lote, prazode validade e código

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artesanal emanualizada, nadistribuição de

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Computador é ferramenta importante na farmácia hospitalar

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possuímos indicadores oficiais, masexiste uma grande quantidade de hos-pitais que já a possui, mais do que agente imagina.

PHARMACIA BRASILEIRA -Que avaliação o senhor faz do nívelde conhecimento do farmacêutico bra-sileiro sobre a dose unitária? O pro-fissional está qualificado para implan-tar e atuar no sistema?

Geoge Washington - O farmacêu-tico brasileiro, além de auto-didatacontumaz, é um garimpador nato detecnologias e procedimentos avança-dos praticados em outrospaíses. Todavia, da teoriaà prática, existe uma dis-tância abissal. A capaci-tação pressupõe cursosde aprimoramento, visitase estágios em centros maisadiantados. É preciso maissuor do que papo. Menos“achologia” e mais evi-dências. O nosso Con-gresso funcionou comoum facilitador destas tran-sações culturais, que fa-zem da informação a cha-ve, do compromisso a fe-chadura, da comunicaçãoa porta de acesso ao País,cuja moeda de troca é aqualidade.

PHARMACIA BRSILEIRA -Existem dificuldades de comunicaçãoque emperrem a divulgação do siste-ma de dose unitária, dentro dos hos-pitais brasileiros?

George Washington - As dificul-dades existentes estão limitadas àvontade de querer fazer ou tentar rea-lizar o melhor, para aquele que conti-nua sendo a razão de ser do nossotrabalho: o paciente. Para ele e por ele,fazemos qualquer negócio.

PHARMACIA BRASILEIRA -O Ministério da Saúde tem estimula-do a adoção da dose unitária?

George Washington - O Minis-tério da Saúde, através da Anvisa,na pessoa do seu presidente, umex-colega de turma na Fundação Ge-túlio Vargas, o Dr. Gonzalo VecinaNeto, tem o maior interesse na viabili-zação do assunto dose unitária na área

hospitalar. Ele já está analisando apossibilidade de estimular a indústriafarmacêutica a produzir medicamentosem dose unitária, com todas as infor-mações (nome genérico, nome comer-cial, lote, prazo de validade e códigode barra) que irão agilizar, em muito, agestão farmacêutica, que, hoje, prati-ca o retrabalho, de forma artesanal emanualizada, na distribuição de medi-camentos e produtos afins.

PHARMACIA BRASILEIRA -A dose unitária pode ser entendidatambém como uma base sobre a qual

vários serviços farmacêu-ticos, a exemplo da aten-ção farmacêutica, podemser adotados?

George Washington -A dose unitária é concei-tuada como uma quanti-dade ordenada de medica-mentos, com formas e do-sagens prontas para se-rem administradas a umpaciente, de acordo coma prescrição médica, porum período determinadode tempo (24 horas é ousual). Ela é consideradao meio e o fim na práticada assistência farmacêu-tica. Em termos farmacoe-

conômicos, alguns administradorescomparam-na como uma verdadeirasimbiose entre profissionais (médico,enfermeiro e farmacêutico) e clientes(paciente, acompanhante e familiar).

PHARMACIA BRASILEIRA -Que estratégias um hospital deve apli-car, para instituir o seu sistema dedose unitária? Ele pode ser inviável aum algum tipo de hospital?

George Washington - Como es-tratégia de implantação, o hospital po-deria criar um grupo de trabalho mul-tiprofissional, contratar um consultorfarmacêutico com experiência compro-vada, visitar farmácias hospitalarescom sistema de dose unitária, fazer umdiagnóstico da situação atual da dis-tribuição de medicamentos, definir umprojeto adequado aos objetivos dohospital, elaborar um planejamentoestratégico de ação.

PHARMACIA BRSILEIRA - O

que há de mitos e verdades na doseunitária?

George Washington - Na doseunitária, como em qualquer outra ati-vidade da área hospitalar, existem al-gumas verdades que nunca é demaisse repetir. A primeira é que só se fazdose unitária, investindo pesado emtreinamento de pessoal e conscienti-zação de funcionários e executivos.A segunda é que, sem uma equipe defarmacêuticos (no mínimo dois) trei-nados, não existe dose unitária, masum simples quebra-galho. A terceira éo quanto ela pode economizar. Unsfalam em 50% e outros 30%. Na ver-dade, o sistema é muito mais de ga-rantia da qualidade e de racionaliza-ção da terapêutica, do que de valoreseconômicos. Segurança não tem pre-ço.

Falando de mitos, poderíamoslembrar que alguns donos de hospi-tais ainda pensam que podem implan-tar a dose unitária, sem farmacêuticosespecializados. Além da dispensaçãoser uma atribuição privativa nossa,outros profissionais não estão habili-tados, o que pode configurar exercí-cio ilegal da profissão farmacêutica.Que os Conselhos Regionais de Far-mácia fiquem em estado de alerta, paraestas aberrações que costumam acon-tecer no nosso espectro de ação. Afarmácia é do farmacêutico e sem elenão há remédio e muito menos a dis-tribuição individualizada de medica-mentos.

PHARMACIA BRASILEIRA -O senhor, em parceria com a profes-sora doutora Isabel Cristina KowalOlm Cunha, do Departamento de En-fermagem da Escola Paulista de Me-dicina da Unifesp e diretora da Escolade Enfermagem da Universidade deSanto Amaro, apresentou, no ano pas-sado, no “I Congresso Mundial deMedicamentos em Doses Unitárias”,em Alicante, na Espanha, um trabalhosobre a interação entre enfermeiro e ofarmacêutico, na distribuição de me-dicamentos por dose unitária. O tra-balho ajudou a desfazer a opinião doseuropeus, de que, no Brasil, poucagente estava estudando, com profun-didade e tanto acerto, o sistema. Per-

ENTREVISTA / GEORGE WASHINGTON

“A relaçãofarmacêutico-enfermeiro é o

segredo do sucessoprofissional na

restituição da saúdee do bem-estar. Nocaso específico da

dose unitária, opreparador e oministrante sãocomponentes

estratégicos naqualidade do

atendimento e nosresultados

terapêuticos”

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gunto ao senhor: como é a relaçãoentre farmacêutico e enfermeiro, no Bra-sil, no que diz respeito à dose unitária?

George Washington - A confe-rência que fizemos, em Alicante, tevecomo título “A interação enfermeiro-farmacêutico na qualidade da doseunitária”. Apresentada, originalmen-te, em espanhol, ela foi considerada apalestra mais original do Congresso.Ficamos felizes, porque, graças a ela,o Brasil foi escolhido como sede do IICongresso Mundial, realizado em SãoPaulo, de 16 a 18 de agosto.

A relação farmacêutico-enfer-meiro é o segredo do sucesso profis-sional na restituição da saúde e dobem-estar. No caso específico da doseunitária, o preparador e o ministrantesão componentes estratégicos naqualidade do atendimento e nos re-

ENTREVISTA / GEORGE WASHINGTON

sultados terapêuticos. O enfermeirotalvez seja, hoje, o profissional de saú-de mais completo, no que se refere aoesquema holístico de tratamento. Como farmacêutico, ele forma uma dosedupla de eficácia e eficiência, comobjetivos comuns no cuidar e no dis-pensar.

PHARMACIA BRASILEIRA -Que países mais adotam o sistema dedose unitária? Onde ele adquiriu me-lhor nível de evolução? Como se colo-ca o Brasil, diante dos demais países?

George Washington - Os Esta-dos Unidos e a Espanha são líderes eestão alguns anos mais avançados doque nós, mas, um dia, chegaremos, lá,podem ter certeza. Na América do Sul,o Chile e o Brasil detêm a hegemoniana atenção farmacêutica clínica. Ou-tros países vizinhos ao nosso estão

muito interessados na dose unitária.Não temos indicadores que forneçamum ranking da posição em que estásituado o Brasil.

PHARMACIA BRSILEIRA - Dadose unitária, deve-se evoluir para queoutro sistema?

George Washington - Uma gran-de farmacêutica, a doutora Sônia Ci-priano, com quem tive o privilégio detrabalhar, por mais de 20 anos, no In-Cor, parafraseando um sábio antigo,costumava dizer que “não há nadapermanente, exceto a mudança”. Adistribuição de medicamentos, nestes50 anos, passou, inicialmente, pela for-ma coletiva, a individualizada, a formamista, chegando até a dose unitária.Já existe a distribuição eletrônica e arobótica será a próxima atração. Quemviver, verá.

ENTREVISTA / MAURO DE CASTRO

Sbrafh: uma análise brasileiraQue dificuldades enfrenta o farmacêutico hospitalar brasileiro

para desenvolver o seu trabalho? Quais os velhos erroscometidos, ainda hoje, por diretores de hospitais, resultando emprejuízos astronômicos para a saúde do paciente e do próprio

estabelecimento e o que o setor precisa para chegar ao nível dafarmácia hospitalar dos países referência? Essas e outrasperguntas são respondidas pelo presidente da Sociedade

Brasileira de Farmácia Hospitalar, Mauro Silveira de Castro.

Tudo o que se tem falado (e provado) sobre apoderosa ação do farmacêutico hospitalar conseguiu sen-sibilizar alguns proprietários e diretores de hospitais? Arevista PHARMACIA BRASILEIRA entrevistou o presi-dente da Sbrafh (Sociedade Brasileira de Farmácia Hospi-talar), Mauro Silveira de Castro, para traçar, a partir desuas palavras, uma radiografia do setor.

Professor de Farmácia Hospitalar da Faculdade deFarmácia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grandedo Sul), assessor de Farmácia Hospitalar e Clínica do Hos-pital de Clínicas de Porto Alegre, Mauro de Castro dizque alguns estabelecimentos perduram em erros primári-os e clássicos, como o da omissão de distribuição demedicamentos, a dispensação de dose inadequada ouextra, o fracionamento impróprio, a troca do medicamento

ou da forma farmacêutica, manutenção do medicamentovencido ou com problemas de qualidade, produto forne-cido sem prescrição e interpretação inadequada da pres-crição.

Mas não se pode prevenir contra esse rosário dedescalabros, apenas com a contratação de um ou maisfarmacêuticos, alerta o presidente da Sbrafh. Além dasações profissionais, é essencial montar a infra-estruturanecessária ao desenvolvimento das atividades da farmá-cia hospitalar, gerar processos de qualidade e controlarresultados. Faltam ainda outros itens para completar areceita de uma boa farmácia hospitalar, os quais Maurode Castro detalha na conversa com a PHARMACIA BRA-SILEIRA. Ele pondera, entretanto, que há uma evoluçãoconsiderável no setor. Veja a entrevista.

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ENTREVISTA / MAURO DE CASTRO

PHARMACIA BRASILEIRA -Os hospitais brasileiros estão maisconvencidos da necessidade decontratar farmacêuticos? Comoagem hospitais públicos, privadose militares, nesse sentido?

Mauro de Castro - Por suascondições continentais, o Brasilpossui distinções entre suas regi-ões e mesmo entre as micro-regiõesde um Estado da Federação. Portan-to, possuímos distintas realidades.Em regiões altamente desenvolvidase com a presença de faculdades deFarmácia ou cursos de Farmácia,existe uma maior conscientização danecessidade da atuação do farma-cêutico na farmácia hospitalar.

Esta evolução chega a refletirno número de farmacêuticos contra-tados. Verificamos que, em muitoshospitais, não existe a contrataçãode um só profissional, mas de umnúmero suficiente para as ativida-des desenvolvidas, tanto em nívelpúblico, como privado. De certa for-ma, começa a existir a especializa-ção da Farmácia, em nível hospita-lar. Mas, em outros casos, temos anão contratação de profissionaisfarmacêuticos, mediante a alegaçãode que o hospital não possui farmá-cia, mas, sim, um dispensário demedicamentos, devido ao baixo nú-mero de leitos hospitalares. Não le-vam em consideração o que o pro-fissional pode trazer de benefíciopara a instituição.

PHARMACIA BRASILEIRA -Muitos hospitais são pródigos emdesperdiçar dinheiro com erros gra-ves e corriqueiros, como comprasmal feitas de medicamentos e dis-

pensações extravagan-tes, com mais de um me-dicamento de ação simi-lar etc. Quais são os prin-cipais erros cometidospor farmácias hospitala-res?

Mauro de Castro - Nofinal do ano de 1999, oIntitute of Medicine, dosEstados Unidos, publi-cou um livro denomina-

do “To err is human: building a sa-fer health system”, que, de certaforma, conta o que todos já deveri-am saber: por nossa condição hu-mana, erramos e devemos buscarrealizar nossas tarefas assistenciais,considerando esse fator. A não con-sideração do fator humano leva aoaparecimento de erros, durante oprocesso de medicação de um paci-ente.

Existe um elenco de situaçõesque leva ao erro de medicação, bemcomo algumas tipologias que clas-sificam estes erros. Como exemplo,alguns dos erros apontados nestastipologias, no que se refere à farmá-cia, são: a omissão de distribuiçãode medicamentos, a dispensação dedose inadequada ou de dose extra,o fracionamento inadequado de me-dicamentos, a troca do medicamen-to ou da forma farmacêutica, medi-camento vencido ou com problemasde qualidade, medicamento forneci-do sem prescrição e interpretaçãoinadequada da prescrição.

Some-se a isto a questão doserros neste processos, referentes àscaracterísticas intrínsecas ao medi-camento (como a rotulagem), à pres-crição e à administração de medica-mentos. O universo de possibilida-des é grande.

PHARMACIA BRASILEIRA -Essas situações dificilmente ocor-reriam, se a farmácia daquele hospi-tal estivesse em mãos de um farma-cêutico, não é? Será que os hospi-tais não estão devidamente infor-mados sobre as vantagens do ser-viço farmacêutico? Fale sobre es-sas vantagens, que fazem com que

o farmacêutico seja um profissionalindispensável à farmácia hospitalar.

Mauro de Castro - A preven-ção destes eventos pode ser inicia-da com uma farmácia hospitalar ade-quada, mas não basta apenas con-tratar o farmacêutico. O essencial émontar a infra-estrutura necessáriaao desenvolvimento das atividadesda farmácia hospitalar, desenvolverprocessos de qualidade e controlarresultados, sempre levando em con-sideração o fator humano citadoacima. Além disso, deve-se qualifi-car os sistemas de atenção à saúdehospitalares com um bom processode acreditação hospitalar. Devemospartir para o desenvolvimento deum processo que determine quaisos parâmetros mínimos de qualida-de para que um serviço de farmáciahospitalar venha a ser acreditado e,desta forma, prestar uma assistên-cia farmacêutica de qualidade.

PHARMACIA BRASILEIRA -Está mudando aquela visão atrasa-da e comprometedora de certos di-retores de hospitais, de que a far-mácia deve funcionar no porão úmi-do e mofento, com paredes racha-das, iluminação e temperatura ina-dequadas? Essa visão não é, por sisó, um atestado de pouca importân-cia dada à farmácia? Onde fica o far-macêutico, nessa história?

Mauro de Castro - Veja, comonão temos uma legislação específi-ca da farmácia hospitalar, onde seestabeleça o mínimo de condiçõespara a sua implantação e funciona-mento, culturalmente, então, existea idéia de que a farmácia pode estarem qualquer lugar. Ela pode até fun-cionar em um porão, mas vai depen-der de como são as condições des-te, como é sua ligação com o exteri-or e interior e assim por diante.

Acredito que somente com umalegislação forte, neste sentido, bemcomo uma maior orientação nos cur-sos de Administração Hospitalarsobre o que é realmente a farmáciahospitalar, é que conseguiremos re-verter esta situação. Por outro lado,temos já a reestruturação de muitas

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Ambiente de farmácia hospitalar

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farmácias hospitalaresque estão começandoa demonstrar que, casoa administração dê aatenção merecida aoproblema e dependen-do do poder de con-vencimento do farma-cêutico, muito se podefazer para resolver es-tes problemas.

PHARMACIABRASILEIRA - Exis-tem padrões de acredi-tação para farmáciashospitalares, no Brasil? Um progra-ma de padronização é importante?

Mauro de Castro – Atualmen-te, existe uma proposta de acredita-ção para hospitais, em geral, que foi,primeiramente, veiculada pelo Mi-nistério da Saúde e que, depois, foiadaptada pela Organização Nacio-nal de Acreditação, a organizaçãonão-governamental responsávelpela acreditação, no Brasil. Aindanão temos desenvolvido um padrãode acreditação específico para far-mácia hospitalar, no País, como oexistente no mundo. A Sbrafh pos-sui uma indicação de padrões míni-mos para a farmácia hospitalar. Estaé uma das metas de nossa entidade:reformular os padrões mínimos paratentar chegar a um acordo sobrequais os elementos que devem seravaliados para que uma farmáciahospitalar venha a ser acreditada.

PHARMACIA BRASILEIRA -Que avaliação o senhor faz da qua-lificação do farmacêutico hospita-lar brasileiro, tanto na graduação,como depois?

Mauro de Castro - As univer-sidades brasileiras, em sua maioria,ainda possuem uma maneira de for-mação profissional muito voltada àspráticas de ensino que não ajudama desenvolver as práticas profissi-onais. Existe necessidade de mudaro projeto pedagógico para o ensinoda Farmácia Hospitalar, junto com adiscussão de qual o perfil de pro-fissional que se quer para o SistemaÚnico de Saúde. Com a junção des-

tes fatores, pode-separtir para uma melhorotimização da farmáciahospitalar. Por exem-plo, hoje em dia, naEspanha, depois deuma longa caminhadaprofissional, para che-gar a ser farmacêuticohospitalar, o profissi-onal, depois de con-cluído o seu curso deFarmácia, presta umconcurso nacional, emque escolhe o local

onde vai realizar sua Residência emFarmácia Hospitalar.

Somente depois de quatro anosde Residência é que pode exerceresta especialidade. Portanto, o en-sino da Farmácia Hospitalar, no Bra-sil, está no início de um caminho, jáexistindo cursos que estão inovan-do, em termos de graduação, e exis-tem outros que estão realizando omesmo, em nível de pós-graduação.Temos, pela frente, um longo cami-nho para otimizar, cada vez mais,nossas atividades e construir jun-tos, universidades,organismos públicose nossas entidades declasse, um modelobrasileiro de farmáciahospitalar.

PHARMACIABRASILEIRA - ASbrafh sabe qual é aopinião consensualdos professores deFarmácia Hospitalarsobre o ensino dessesegmento farmacêuti-co, no País. Que opi-nião é essa e como osenhor, que também éprofessor da disciplina,comenta o ensino deFarmácia Hospitalar?

Mauro de Castro- A Sbrafh promoveu, há poucosanos, um encontro de professoresde Farmácia Hospitalar. Nesse en-contro, ficou ressaltada nossa pre-ocupação com a nova Lei de Dire-

trizes e Bases, a qual, de certa for-ma, deixa a critério de cada institui-ção de ensino superior o que vaiconstituir o ensino de cada área doconhecimento. Preocupados comisto, conseguimos estabelecer umelenco mínimo de conhecimentos quedeve receber um estudante sobre Far-mácia Hospitalar, bem como os conhe-cimentos prévios para melhor poderempreender estes estudos. Todo estematerial encontra-se disponível na pá-gina WEB da Sbrafh.

PHARMACIA BRASILEIRA -Falemos um pouco de infecção hos-pitalar. Como está o seu controle? Asequipes de controle estão devidamen-te formadas e atuando, plenamente?

Mauro de Castro - Não se podefalar de controle de infecção, em ní-vel nacional, mas, sim, em nível ins-titucional. Existem muitas institui-ções hospitalares que estão empe-nhadas em exercer este controle.Outras, continuam mantendo nopapel as atuações das equipes decontrole. Verificando o número depessoas que participam dos con-gressos nacionais sobre o tema,

pelo número de enti-dades existentes naárea, bem como o ní-vel dos trabalhosapresentados emcongressos, existe,sim, uma massa críti-ca atuante, no Brasil,e de alta qualificação.

Mas, muitasvezes, estes profissi-onais encontram bar-reiras em sua atua-ção, principalmente,devido ao estigma deque “querem contro-lar” e não no enten-dimento de que a ati-vidade de controle épara apresentar indi-cadores de qualidade

para melhorar substancialmente aatividade assistencial hospitalar.

PHARMACIA BRASILEIRA -O uso irracional de antimicrobianosainda é muito alto, dentro dos hos-

ENTREVISTA / MAURO DE CASTRO

�Devemos partir parao desenvolvimentode um processo quedetermine quais os

parâmetros mínimosde qualidade paraque um serviço defarmácia hospitalar

venha a seracreditado e, destaforma, prestar uma

assistênciafarmacêutica de

qualidade�

�Atualmente, existeuma proposta deacreditação para

hospitais, em geral,que foi, primeiramente,

veiculada peloMinistério da Saúde e

que, depois, foiadaptada pela

Organização Nacionalde Acreditação. Ainda

não temosdesenvolvido um

padrão de acreditaçãoespecífico para

farmácia hospitalar, noPaís, como o existente

no mundo�

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pitais, contribuindo para o aumen-to da infecção no ambiente hospi-talar. Como os farmacêuticos devemagir, para plantar a consciência douso racional de antimicrobianosjunto aos prescritores? E qual o ní-vel de consciência dos farmacêuti-cos sobre esse seu papel?

Mauro de Castro - Os profissi-onais farmacêuticos que trabalhamem Comissões de Controle de Infec-ção ou em de Farmácia e Terapêuti-ca possuem uma conscientizaçãoplena sobre esta situação, atuando,sempre, na busca de melhores pa-drões de uso. O que poderíamos re-alizar é uma melhora das técnicas deatuação, por meio de atividades li-gadas à farmacoepidemiologia,como, por exemplo, os estudos deutilização de medicamentos, osquais forneceriam dados essenciaispara modificar esta situação.

PHARMACIA BRASILEIRA -Faltam protocolos hospitalares es-tabelecendo quais devem ser os an-timicrobianos utilizados, dentro doestabelecimento, para determinadasdoenças. Que importância têm es-ses protocolos?

Mauro de Castro - A importân-cia dos protocolos não se resumeapenas a esta questão, mas está im-plicada em toda a gama de ativida-des assitenciais prestada em hospi-tais. Por meio deles, pode-se esta-belecer padrões racionais de utili-zação de medicamentos para o ma-nejo de diversas situações clínicas.Também, serve como elemento deformação continuada e deve ser fun-damentado numa abordagem volta-da para as evidências clínicas, dis-ponibilizando, desta forma, informa-ção atualizada e abalizada.

PHARMACIA BRASILEIRA -Que propostas e programas a Sbra-fh vem desenvolvendo para melho-rar o nível da assistência farmacêu-tica, nos hospitais?

Mauro de Castro - Em primeirolugar, queremos estruturar melhornossa entidade. Para tanto, estare-mos implantando, brevemente, uma

sede fixa da Socieda-de. Isto está se tornan-do possível, graças aum acordo de coope-ração que está sendofirmado entre o Conse-lho Regional de Farmá-cia de São Paulo e aSbrafh. Com uma sedefixa, que nos possibili-te montar uma estrutu-ra administrativa ágil,poderemos melhoratuar.

O outro grandeprojeto trata do diag-nóstico da farmáciahospitalar, no Brasil.Não possuímos dadossuficientes para o es-tabelecimento de umaestratégia, em nível nacional para odesenvolvimento desta área. Com aparceria com a Organização Pan-americana da Saúde (Opas), a qual,por seu caráter não segmentário,coordena o projeto, com o Conse-lho Federal de Farmácia e com o Nú-cleo de Atenção Farmacêutica daFundação Oswaldo Cruz, apresen-tamos o projeto ao Ministério daSaúde e à Anvisa, tendo o mesmosido aprovado. Estamos em fase deadequação do projeto aos recursosdisponíveis, visto o alto custo domesmo. Com a análise dos dados,poderemos realizar o planejamentodo desenvolvimento do setor, noBrasil.

Um dos grandes desenvolvi-mentos da Farmácia mundial diz res-peito à adoção do paradigma da aten-ção farmacêutica, o qual deve serum consenso por cada país. A Opasestabeleceu, como uma de suas me-tas, realizar um pré-consenso, paraser encaminhado à Conferência Na-cional de Atenção Farmacêutica,conforme acima citado. Estamosnessa parceria, conjuntamente coma Secretaria da Saúde de Fortaleza(CE), a Gerência de Assistência Far-macêutica do Ministério da Saúde,o CFF e a Fenafar. Somente com a

ENTREVISTA / MAURO DE CASTRO

realização deste con-senso, poderemosiniciar uma maior di-vulgação deste novomodelo de práticaprofissional e a cor-respondente identifi-cação das estratégiaspassíveis de seremutilizadas para suaimplantação.

Também, va-mos desenvolvercom a Unidade deFarmacovigilância daAnvisa a “Oficina so-bre o Uso Seguro eVigilância de Medica-mentos em Hospi-tais”, neste mês desetembro. Pretende-

se, com a mesma, dar início ao esta-belecimento de um programa paraidentificar e desenvolver medidasde prevenção sobre o uso insegurode medicamentos, incluindo os er-ros de medicação. Com isto, estarí-amos dando os primeiros passospara a concretização da farmacovi-gilância, em nível hospitalar.

Outro programa que estamosdesenvolvendo, em conjunto com aSecretaria de Assistência à Saúde éo de implantação de um projeto pi-loto de Curso de Especialização emFarmácia Hospitalar. Com ele, daría-mos o ponta pé inicial para umanova fase de programas de especi-alização em Farmácia Hospitalar.

Gostaríamos de aproveitar aoportunidade e solicitar a todos osassociados que preenchessem oformulário que se encontra encarta-do na presente edição e nos forne-cessem novamente os seus dados,pois muitos têm reclamado de queseus dados estão incorretos. Por-tanto, esta contribuição seria valio-sa, para que conseguíssemos man-tê-los informados dos novos acon-tecimentos e dos resultados de nos-sos projetos acima expostos. Bre-vemente, estaremos remodelandonosso site, na Internet.

�As universidadesbrasileiras, em sua

maioria, aindapossuem uma maneira

de formaçãoprofissional muito

voltada às práticas deensino que não

ajudam a desenvolveras práticas

profissionais. Existenecessidade de mudaro projeto pedagógico

para o ensino daFarmácia Hospitalar,junto com a discussão

de qual o perfil deprofissional que se

quer para o SistemaÚnico de Saúde�

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ENTREVISTA / VÂNIA MARI SALVI

O avançado estágioda especialização

A farmácia do Hospital Erasto Gaertner, em Curitiba (PR),atinge um avançado nível de especialização em oncologia

O universo da farmácia hospitalar, no Brasil, é mes-mo muito díspar. Se alguns hospitais afundam-se nos er-ros repetitivos de não desenvolver políticas e protocolosmodernos para as suas farmácias e de não contratar far-macêuticos em número necessário e com a devida especi-alização, há outros que vicejam progressos notáveis nes-se setor. Um exemplo é o Hospital Erasto Gaertner, emCuritiba (PR). A sua farmácia encontra-se no avançadíssi-mo nível da especialização, no caso, a oncologia.

Chegar a esse estágio de alta especialização e com-plexidade requer conhecimento técnico-científico e muitaexperiência. Mas como obter isso, em um país que aindanão oferece tal qualificação em nível acadêmico? A revis-ta PHARMACIA BRASILEIRA entrevistou a farmacêuti-ca Vânia Mari Salvi Andrzejevski, diretora da farmácia doErasto Gaertner, para obter dela a resposta a esta e a ou-tras perguntas.

Farmacêutica industrial, formada, em 1987, pelaUniversidade Federal do Paraná, Vânia, ao entrar para afarmácia do Erasto Gaertner, teve que fazer, primeiramente,um verdadeiro trabalho de desbravamento, tanto junto àdiretoria do estabelecimento, quanto a outros profissio-nais de saúde, inclusive, para a auto-afirmação farmacêu-tica e reconhecimento do profissional, ali dentro.

Não foi fácil, mas os resultados foram surgindo e,melhor que palavras, eles provaram aquilo de que é capazo farmacêutico e o quanto um hospital não pode prescin-dir deste profissional dentro de sua equipe. Vânia é espe-cialista em Engenharia da Qualidade, farmacêutica clínicapela Universidade do Chile, especializanda em Gestão dePessoas pela UFPR, ex-vice-presidente da Sbrafh - Socie-dade Brasileira de Farmácia Hospitalar -, avaliadora da ONA- Organização Nacional de Acreditação - e do IPASS -

Instituto Paranaense de Acre-ditação em Serviços de Saú-de; diretora da Sobrafo (Soci-edade Brasileira de Farmacêu-ticos em Oncologia), entida-de recém-criada.

Com o patrimônio de conhecimentos específicosque adquiriu, em várias áreas, a farmacêutica, que tambémé conselheira regional de Farmácia pelo Paraná, foi aju-dando a trançar o fio dessa que, hoje, é considerada umareferência nacional em farmácia hospitalar, no País. O Hos-pital Erasto Gaertner é uma entidade filantrópica e integraa Liga Paranaense de Combate ao Câncer (LPCC). Funcio-na, desde dezembro de 1972.

De acordo com a Portaria 3.535, de dois de setem-bro de 1998, do Ministério da Saúde, o estabelecimentofoi reconhecido como Centro de Alta Complexidade emOncologia (Cacon), em nível 2, o único, no Paraná, nestenível. O HEG, com os seus 158 leitos, atende, em média, a85% de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Aespecialização atrai para o Erasto Gaertner, diariamente,pacientes procedentes de todas as regiões do Paraná, bemcomo de Estados vizinhos e até mesmo de Mato Grosso,Minas e Rondônia. Setenta por cento dos pacientes queali chegam são portadores de tumores malignos e 30% detumores benignos, entre outras patologias.

No ano passado, o HEG fez uma média de 1.996atendimentos, por dia. A PHARMACIA BRASILEIRA trou-xe ao leitor a oportunidade de conhecer um pouco da rea-lidade e da rotina - de ritmo puxado, diga-se de passagem- da farmácia do Hospital Erasto Gaertner, nas próximaspáginas desta conversa com Vânia Mari Salvi. Veja a en-trevista.

PHARMACIA BRASILEIRA -O Hospital Erasto Gaertner possui umafarmácia oncológica. O que o farma-cêutico deve fazer, para chegar a essenível de tão alta especialização e com-plexidade, que requer conhecimentostécnico-científicos de ponta e tão es-pecíficos, considerando-se a pouquís-sima oferta de formação nessa área?

Vânia Mari Salvi - No segundosemestre de 1990, o Hospital precisoucontratar um farmacêutico, para aten-der o requisito da Portaria número 196/83, do Ministério da Saúde, que exigiaa presença do farmacêutico como

membro das comissões de controle deinfecção hospitalar. Nesta ocasião, osdiretores do Hospital não tinham no-ção de quais eram, exatamente, as res-ponsabilidades do farmacêutico e quala importância de sua integração naequipe multidisciplinar de assistênciaà saúde. Não sabiam quais eram osconhecimentos e a capacitação do far-macêutico e que atividades poderiame deveriam desempenhar.

Iniciei minhas atividades, em no-vembro de 1990, com contrato de seishoras/dia e, a princípio, para executarsomente as atividades relacionadas ao

controle de infecção. Nesta época, afarmácia era um local de recebimentoe guarda de medicamentos e materi-ais, chefiada por um profissional denível secundário, tendo em seu qua-dro de pessoal mais dois funcionári-os de nível médio, não dispondo denenhum dos cuidados e controles es-tabelecidos para a gestão dos produ-tos farmacêuticos. Em 1995, quandodeixei a chefia da farmácia hospitalar, jáéramos 19 funcionários e já realizáva-mos a dispensação individualizada para24 horas, com cobertura de atendimen-to para 24 horas, nos 365 dias do ano.

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Hoje, a farmácia do Eras-to é composta por vários seto-res (abastecimento, farmaco-técnica, dispensação, satélitedo centro cirúrgico), com umtotal de 18 funcionários, sen-do dois farmacêuticos, e aCMIV (Central de Misturas In-travenosas), da qual sou a res-ponsável, onde dispomos demais três farmacêuticos, trêsauxiliares e um assistente ad-ministrativo, além da farmacêu-tica residente, que fica lotadana própria CMIV. O hospitalainda dispõe de um farmacêutico ex-clusivo para a CCIH, com carga horá-ria de 20 horas/semanais.

A CMIV só foi inaugurada, emjaneiro de 1994, e, desde essa data, éresponsável pelo preparo de todas asdoses de antineoplásicos, de uso EV(endovenoso), administradas, no hos-pital, quer seja para pacientes inter-nados ou ambulatoriais.

Em relação aos conhecimentostécnico-científicos relacionados à re-alidade de oncologia, a descoberta foium desafio, pois, há 12 anos, quandoiniciamos as atividades, nesta área,praticamente não existia material bi-bliográfico disponível, em língua por-tuguesa, e esse assunto não era abor-dado, nas universidades, de uma for-ma geral (Medicina, Farmácia e Enfer-magem). Portanto, existia uma grandecarência de conhecimento.

Os médicos dispunham de cur-sos de especializações, mas o farma-cêutico, muitas vezes, desconheciasobre medicamentos antineoplásicos.As poucas bibliografias disponíveiseram em inglês ou espanhol e não tí-nhamos a Internet. Todo o conheci-mento foi auto-adquirido e houve umaexcelente troca de informações entrevários farmacêuticos. Alguns já havi-am iniciado um trabalho, neste senti-do, no Rio Grande do Sul (Hospital deClínicas da Universidade Federal doRio Grande do Sul), em São Paulo (noHospital AC Camargo ou em empre-sas de tercerização de serviços), noParaná (Hospital das Clínicas da Uni-versidade Federal do Paraná e noHEG) e no Rio de Janeiro. Na verdade,

houve um aprendizado em conjunto.PHARMACIA BRASILEIRA -

Falar em formação, que idéia a senho-ra tem sobre as especializações, emáreas clínicas, a exemplo da oncolo-gia, na farmácia hospitalar brasileira?É ainda muito incipiente?

Vânia Mari Salvi - A atuaçãoclínica do farmacêutico está compro-metida, pois, praticamente, não exis-tem cursos de formação específicapara a área. Todos os nossos profis-sionais foram formados, no exterior,principalmente, no Chile, Espanha eInglaterra, ou são autodidatas. Vale apena lembrar que a disciplina de Far-mácia Hospitalar, conteúdo mínimopara quem vai gerenciar uma farmáciahospitalar, ainda não é obrigatória, namaior parte das universidades e/oufaculdades de Farmácia do País. Exis-te uma grande necessidade de cria-ção das especialidades. E não falta-rão hospitais interessados na contra-tação de farmacêuticos especialistas.

É preciso salientar que algunshospitais americanos dispõem de umfarmacêutico clínico para cada setemédicos do hospital. No Brasil, a mai-or parte dos hospitais não possui ofarmacêutico em seu quadro de pes-soal (exceto aquele destinado a análi-ses clínicas, que não têm absoluta-mente nada a ver com as atividadesadministrativas, clínicas ou de gestãodesempenhadas pelo farmacêuticohospitalar).

PHARMACIA BRASILEIRA -A especialização, por área, é uma rea-lidade, nos países do Primeiro Mun-do, em se tratando de atenção farma-

cêutica? Ela pode tornar-se umatendência ou uma obrigatorie-dade, no Brasil?Vânia Mari Salvi - Devido àcomplexidade de procedimen-tos, variações de condutas,necessidade de conhecimentosdiversos, número de especiali-dades farmacêuticas disponí-veis e os avanços que deverãoocorrer, nos próximos dez ou 15anos, os hospitais brasileirosdeverão ofertar farmacêuticosclínicos especializados em pe-diatria, geriatria, imunossupri-

midos (transplantados), neonatologia,HIV+, necologia/obstetrícia (gestan-tes), pacientes crônicos, como os hi-pertensos, diabéticos, oncologia, etc.,como já ocorre, em vários países.

Espero que a necessidade de cri-ação de programas/cursos de especi-alização sejam mais uma imposição domercado, devido à crescente necessi-dade de melhoria da qualidade de as-sistência prestada, ao Programa Naci-onal de Acreditação das Instituiçõesde Saúde, à crescente exigência doMinistério da Saúde, através da Agên-cia Nacional de Vigilância Sanitária, àsexigências que estão sendo implanta-das pelo Ministério da Saúde ou, emúltima análise, à própria concorrênciade mercado, acabando por fazer valero ditado de que “quem não têm com-petência, não se estabelece”. Infeliz-mente, já observamos essa situaçãona área da saúde.

PHARMACIA BRASILEIRA -A senhora criou, no Erasto Gaertner,o curso de residência farmacêutica emoncologia, com duração de dois anose dedicação exclusiva. Fale sobre ocurso e o que o farmacêutico interes-sado deve fazer, para realizá-lo.

Vânia Mari Salvi - Nos últimostrês anos, o Hospital vinha ofertandoum curso de especialização, na áreade Oncologia, com duração de 360horas e, posteriormente, 400 horas/aula. Observamos que não era o sufi-ciente para que o aluno estivessepronto para desempenhar todas asatividades de um hospital com essacomplexidade. E não havia tempo paraabordar a parte clínica. O aluno saía

ENTREVISTA / VÂNIA MARI SALVI

As farmacêuticas Juliane Hwang e Maria Lucivânia Silva Lima em uma das etapasde entrevista e orientação farmacêutica realizadas com uma criança e sua mãe

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sem um alicerce seguro, para realizar aatenção farmacêutica em oncologia.Com o apoio do corpo clínico, da dire-ção do Hospital e da LPCC (Liga Para-naense de Combate ao Câncer), e con-siderando que o Hospital já dispõe decursos de residência na área médica(cirurgia, oncologia, radioterapia, ana-tomia patológica) e na área de Fisio-terapia e de Enfermagem, acreditamosque teríamos condições de assumiresse desafio.

Muitas vezes, questionamos serealmente dispúnhamos de conheci-mento para assumir tal responsabili-dade, perante a sociedade brasileira,mas, por outro lado, se ficássemosaguardando o momento ideal, a equi-pe plenamente formada, demoraría-mos, muitos anos, para tomarmos taliniciativa, pois teríamos que sair parao mestrado e o doutorado, no exterior,e, só então, iniciar esta atividade.

Quando pensamos que muitosfarmacêuticos, hoje, saem das univer-sidades/ faculdades sem saber o queé um medicamento antineoplásico,suas características, requisitos, pecu-liaridades, o que é um protocolo detratamento, o que é câncer, seus ris-cos, necessidades do paciente, etc.,etc., etc., acreditamos que, assim comooutros grupos, no País, temos condi-ções de assumir essa orientação emelhorar significativa-mente o quadro atual.Mesmo porque não te-mos plano de estacio-nar. Muito pelo contrá-rio, o nosso planeja-mento é de aprimorar ecrescer, cada vez mais.E crescer com a Resi-dência, crescer e apri-morá-la, tornando-auma obrigação e umincentivo.

Todas as informa-ções sobre o Curso deEspecialização em Far-mácia Hospitalar, comênfase em Oncologia Clínica, encon-tram-se disponíveis na homepage daLiga ([email protected]), inclusi-ve com conteúdo para as provas deseleção, período de inscrição e reali-

zação das provas e do-cumentação necessária.

O que vale a penareforçar é que o nossoresidente recebe umabolsa no valor de 80%da bolsa destinada aosresidentes de Medicina(valor definido pelo MEC). Isso, en-quanto não conseguirmos a aprova-ção do Curso junto ao MEC (os docu-mentos estão tramitando) e existe, noCongresso Nacional, um projeto de Leipara a criação das residências farma-cêuticas. (NR.: o Projeto é de autoriado deputado Zaire Rezende - PMDB-MG). Esse, talvez, seja um bom mo-mento para cobrarmos uma agilizaçãodo seu trâmite.

PHARMACIA BRASILEIRA -A senhora tem percebido interesse deoutros hospitais em criar cursos dogênero?

Vânia Mari Salvi - Eu sei que aUniversidade Federal da Bahia, atra-vés da professora Lúcia Costa Noblat,chefe do Serviço de Farmácia, deveráiniciar um curso de especialização naárea da farmácia hospitalar, assimcomo o INCA (Instituto Nacional doCâncer), através da sua equipe de tra-balho. Vale salientar que a USP (Uni-versidade de São Paulo) também dis-põe de um curso, que está sob a res-

ponsabilidade da pro-fessora Sílvia Storpi-des.

PHARMACIABRASILEIRA - Não sepode praticar atençãofarmacêutica hospitalar(nem comunitária), semconhecimento de far-mácia clínica. Comoestá esse conhecimen-to, no Brasil?

Vânia MariSalvi – Infelizmente, noBrasil, está área do co-nhecimento precisa serquase que totalmente

explorada. Quando avaliamos o núme-ro de estabelecimentos (hospitais, far-mácias, postos de saúde, etc.) que ain-da não dispõe de assistência do pro-fissional farmacêutica constatamos

isso. Por outro lado,muitos de nós, que es-tamos nos hospitais,infelizmente, ainda nãosabemos exatamente oque fazer para fazer aatenção farmacêutica.

É importante fri-sar que essa realidade não deve serum motivo de desânimo para a cate-goria. Muito pelo contrário, devemosassumir essa deficiência como um de-safio e uma oportunidade, pois o mer-cado de trabalho é imenso e pratica-mente inexplorado. E o mais importan-te é a melhora significativa de atendi-mento, que os usuários destes servi-ços receberão com a incorporação doprofissional farmacêutico em seusquadros de pessoal.

PHARMACIA BRASILEIRA -A farmácia oncológica do Erasto Ga-ertner, além de preparar medicamen-tos e acompanhar o paciente, realizaplenamente a farmácia clínica, inclusi-ve, interferindo no tratamento do pa-ciente?

Vânia Mari Salvi - O farmacêuti-co é parte integrante do trabalho deatenção ao paciente oncológico. So-mos ouvidos e ouvimos os demaisprofissionais. Considero que a inser-ção/integração do farmacêutico já éuma etapa vencida, em nossa Institui-ção. Temos credibilidade junto à equipemultiprofissional, pois sempre procu-ramos atuar, com seriedade, afinco ena busca de melhores condições detrabalho e segurança para todos (paraa equipe e, especialmente, para o nos-so paciente, razão de ser da Institui-ção).

Também, vale lembrar que fuimuito bem recebida, desde o início domeu trabalho na Instituição, pelo cor-po clínico e pela equipe de enferma-gem, nossos principais parceiros, oque facilitou a implantação das refor-mas necessária e para chegarmosonde estamos. A farmácia do Hospi-tal Erasto só conseguiu chegar ondeestá - e esperamos avançar muito mais- devido à colaboração, parceria, críti-cas e sugestões de toda a equipe (in-terna e externa à farmácia).

PHARMACIA BRASILEIRA -

�A atuação clínica dofarmacêutico está

comprometida, pois,praticamente, nãoexistem cursos de

formação específicapara a área�

�Nos próximos dez ou15 anos, os hospitaisbrasileiros deverão

ofertar farmacêuticosclínicos especializadosem pediatria, geriatria,

imunossuprimidos(transplantados),

neonatologia, HIV+,necologia/obstetrícia(gestantes), pacientes

crônicos, como oshipertensos, diabéticos,

oncologia, etc.�

ENTREVISTA / VÂNIA MARI SALVIFA

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Lidar com antineoplásicos requer cui-dados muito especiais, sob pena depor em risco tanto quem os manipula(os farmacêuticos), quanto quem osadministra (os enfermeiros) e quem osrecebe (os pacientes). Quais são osriscos e por que tantos cuidados? Equais são eles?

Vânia Mari Salvi - Os antineo-plásicos, medicamentos utilizados notratamento das neoplasias malignas,infelizmente, podem causar vários ris-cos aos profissionais envolvidos como preparo (farmacêuticos) e a admi-nistração (enfermeiros), quando estesnão dispõe e/ou utilizam EPI´s (Equi-pamentos de Proteção Individual) eEPC´s (Equipamentos de ProteçãoColetiva) na sua rotina diária. Os prin-cipais problemas são alergias de pele,perda de cabelo, emagrecimento, po-dendo, em alguns casos, levar ao de-senvolvimento de uma neoplasia.

O primeiro requisito a cumprir étrabalhar, atendendo a todas as reco-mendações descritas para os manu-seios com técnica asséptica, uma vezque todos os pacientes ficam imunos-suprimidos, em maior ou menor grau,em decorrência da ação destes pro-dutos.

Alguns dos cuidados básicospara quem vai manipular antineoplá-sicos inclui o uso de EPI´s (dupla luvade látex ou similar desentalcada, aven-tal de manga longa e fechado nas cos-tas, óculos de segurança, máscara de

carvão ativado ou similar (cartucho decarvão ativado) e EPC (câmara ou ca-bine de segurança biológica classe II- tipo B II - também conhecida comocâmara de fluxo laminar vertical, com100% de exaustão externa). Além dis-so, é preciso realizar, semestralmente,os testes de acompanhamento médi-co, com todos os funcionários queestão em contato com esses produ-tos e a manutenção da câmara, paraprevenir a contaminação do ambientede trabalho.

Além de todos esses requisitos,a capacitação e a educação continua-da da equipe (médico, enfermeiro, far-macêutico e seus auxiliares) é de fun-damental importância para atender osrequisitos de qualidade e segurançade que estes pacientes e profissionaisnecessitam.

PHARMACIA BRASILEIRA -Fazer pesquisa com medicamentos emseres humanos – e os oncológicos deuso hospitalar não fogem à regra –não é algo simples. As pesquisas pre-cisam submeter-se a toda uma regula-mentação e a um código de ética. Asenhora pode falar sobre isso?

Vânia Mari Salvi - O Brasil jádispõe, desde 1996 (Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde),da Conep (Comissão Nacional de Éti-ca em Pesquisa) cuja principal funçãoé garantir a segurança dos sujeitos dapesquisa (pacientes), através da im-plementação de normas e diretrizes re-

gulamentadoras de pesquisas queenvolvam seres humanos.

Através da Conep, são criadosos CEP (Comissão de Ética em Pes-quisa), com composição muitidiscipli-nar e da qual o farmacêutico pode, edeve, fazer parte, uma vez que grandeparte das pesquisas envolvendo se-res humanos está relacionada a medi-camentos, vacinas, novos testes di-agnósticos, procedimentos, biosse-gurança, genética, etc., áreas do co-nhecimento que fazem parte de nossaformação acadêmica.

PHARMACIA BRASILEIRA -Vocês fazem pesquisa com medica-mentos, aí, na farmácia do Erasto Ga-ertner? Que pesquisas?

Vânia Mari Salvi - O HospitalErasto participa de várias modalida-des de pesquisas e todas são regis-tradas junto ao Centro de ProjetosEnsino e Pesquisa do HEG, órgão res-ponsável pelo acompanhamento econtrole destas atividades em nossaInstituição. De acordo com o descritona Resolução 196/96 do CNS, o HEGdispõe de uma Comissão de Ética emPesquisa, da qual faço parte, junta-mente com outros profissionais daárea da saúde, como médicos, enfer-meiros, psicólogo, fisioterapeuta, pes-soal da área administrativa e represen-tantes da comunidade e dos usuári-os. Todos os projetos precisam seraprovados por esse comitê, para quea pesquisa seja realizada.

HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UFBA

Mudar em busca da essência

Mais que uma simples reforma, atransformação total por que passa afarmácia do Hospital das Clínicasde Salvador vai atingir, em cheio,não só aspectos físicos, masrevolver antigos conceitos queanimavam aquela Casa. A estrelada reforma é o farmacêutico e oensino da Faculdade de Farmáciada Universidade Federal da Bahia.

ENTREVISTA / VÂNIA MARI SALVI FAR

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Fachada do Hospital das Clínicas (BA)

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HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UFBA

Quem chega ao Hospital Uni-versitário Professor Edgard Santos(Hupes), no campus da Universida-de Federal da Bahia (UFBA), no bu-cólico bairro do Canela, no centrode Salvador, é incapaz de imaginarque, no primeiro andar daquele pré-dio imponente - um palacete em for-ma de H, com 11 andares, sem con-tar os prédios do Centro PediátricoProfessor Hosannar de Oliveira(CPPHO) e o Pavilhão de Ambula-tórios Magalhães Neto - construí-do, em 1950, com 30.158 metros qua-drados e bem ao gosto da arquite-tura histórica da capital baiana - estáem marcha uma das mais frutíferasrevoluções farmacêuticas hospita-lares do País. A transformação estáajudando a modificar a imagem dofarmacêutico no contexto da aten-ção ao paciente, na Bahia, atingin-do, em cheio, o coração de velhosconceitos, revolvendo aspectos fi-losóficos e edificando o que seráuma das mais modernas e mais beminstaladas farmácias de hospitaisuniversitários do Brasil.

Quando for inaugurada, em ou-tubro deste ano, a farmácia do Hu-pes, também chamado de Hospitaldas Clínicas de Salvador, estará aptaa desenvolver relevantes pesquisascom medicamentos em sua moder-na unidade de ensaios clínicos e setornará referência para o SistemaÚnico de Saúde e para o Ministérioda Saúde. Para este último, será re-ferência principalmente no que dizrespeito à farmacovigilância. A far-mácia do Hupes, que abrigará umousado programa de treinamento emserviço, sob a forma de residênciapara farmacêuticos, em níveis pós-graduação, vai comemorar uma ou-tra importante conquista: ela deixade ser um Serviço e ascende, na hi-erarquia do hospital, ao nível de Di-visão. O status lhe garantirá maisautonomia e poder junto à direçãogeral da Casa.

O início - A pedra fundamen-tal da revolução por que passa a far-mácia do Edgard Santos é a inver-são do paradigma conceitual, que,agora, põe o farmacêutico e o ensi-

no de Farmácia da UFBA no frontde suas atividades. Tudo começou,quando a professora Lúcia Noblat,em 1995, recém-chegada da Univer-sidade Federal do Rio Grande doNorte (UFRN), propôs ao então di-retor do Hospital, Antônio CarlosMoreira Lemos, trazer o ensino dadisciplina de Farmácia Hospitalar daFaculdade para o hospital, inte-grando as práticas de ensino ao ser-viço e à pesquisa.

A preocupação da professoravinha, segundo ela própria, do fatode a disciplina ser ministrada den-tro da própria faculdade de Farmá-cia, ou seja, fora do ambiente hos-pitalar, impondo aos acadêmicos umprejudicial estado de isolamento emrelação à prática em saúde. “O quehavia de prática era apenas visitasaos hospitais, sendo muito superfi-cial para a formação do estudante”,critica a professora.

O diretor aceitou a proposta deLúcia Noblat, mas sobuma condição: que elaprópria assumisse o Ser-viço de Farmácia do hos-pital. Era o sinal que fal-tava para concretizar osonho de mudar o ensi-no da Farmácia Hospita-lar da UFBA.

Os passos – A pro-vidência inicial de No-blat foi reunir o recém-concursado professor deFarmácia da UFBA, Lin-demberg Assunção Costa (seu ir-mão), e toda equipe de farmacêuti-cos do hospital e também um grupo

de arquitetos, todos lotados noHupes, para conceber a espinha dor-sal do projeto de reforma, observan-do-se a implantação de novos ser-viços, e para gerar uma nova con-cepção filosófica para aquela farmá-cia. O projeto foi aprovado pela Di-retoria do hospital. Em seguida, foiapresentado ao Reforsus, o progra-ma de Reforma do Sistema Unifica-do de Saúde/SUS, do Ministério daSaúde.

O Reforsus dispunha de umalinha de crédito para reforma dehospitais, que, à época, não contem-plava as suas farmácias. Mas, comose tudo se conspirasse em favor doprojeto, o Ministério da Saúde aca-bou revendo a questão da limitaçãodo financiamento do Reforsus e re-passou uma verba de R$ 1 milhãopara a sua reforma física e para aaquisição de equipamentos e mobi-liários. Aliás, ela foi a primeira far-mácia hospitalar a se beneficiar comessa linha de financiamento.

A reforma - A farmácia doHospital das Clínicas de Salvadorpossui uma área de 400 m2. A gi-gantesca reforma contempla áreaspara quimioterapia, para nutriçãoparenteral, para ensaios clínicos.Também, uma área para abrigar oCentro de Informações de Medica-mentos (CIM), outra para farmaco-vigilância, para administração, paraa secretaria, para dispensação demedicamentos, para a farmacotécni-ca, para farmacocinética clínica, para

farmácia ambulatorial, alojamentopara os residentes e os farmacêuti-cos e para depósito.

Professora Lúcia Noblat

Diretor do Hospital das Clínicas, farmacêutico Lindemberg Costa

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A unidade de ensaios clínicosé moderna e bem equipada. A cen-tralização desses ensaios no servi-ço de farmácia hospitalar estará soba responsabilidade do farmacêutico.Hoje, no Brasil, há uma exigência,por parte da indústria farmacêutica,bem como de organismos internaci-onais, a exemploda FDA (Food,Drugs and Admi-nistration), nessesentido.

Os medica-mentos envolvi-dos nas pesqui-sas serão aquelesque se encontra-ram nas fases 3 e 4 da pesquisa clí-nica (que antecedem a comerciali-zação do produto). A centralizaçãodos ensaios na própria farmácia éalgo fundamental, segundo explicaa diretora. “Uma das vantagens éque a farmácia se responsabilizarápelo armazenamento e pela conser-vação dos medicamentos, o que re-sulta na garantia da eficácia dosmesmos nos testes clínicos. Outravantagem está em fazermos a guar-da ou a custódia dos medicamen-tos. Com isso, não há possibilidadede os produtos em teste serem utili-zados para outros fins que não oprevisto no protocolo de pesquisa”,explica.

É que o medicamento, sem es-ses devidos controles, pode, porexemplo, ser usado em um pacienteque não faz parte da pesquisa, situ-ação que, aliás, fere princípios éti-cos previstos em testes do gênero.Os referidos controles, possíveisgraças à concentração dos ensaios,na farmácia do hospital, e ao fatode ficarem sob a responsabilidadedo farmacêutico, vão permitir, ain-da, o cumprimento da metodologiado protocolo de pesquisas.

Além disso a farmácia garanteos processos de inclusão e exclu-são de pacientes, a randomizaçãocuja execução ficará sob a exclusi-va responsabilidade do farmacêuti-co, e a “cegueira” (método de pes-quisa com medicamento, em que um

ou mais envolvidos - o médico pes-quisador e/ou o paciente - sabe doque está acontecendo).

Um medicamento em testepode ter utilização hospitalar, se-gundo explicação da coordenadorada farmácia hospitalar do Hupes,quando a pesquisa clínica que o

envolve visa atrazer algum be-nefício ao paci-ente e a contri-buir para o com-bate a uma doen-ça. A autoriza-ção para essetipo de pesqui-sa, em hospital,

está prevista pelo Conatem e pelaResolução 196, do Conselho Fede-ral de Medicina. Os resultados dapesquisa vão para a indústria far-macêutica que a financia, ou para oMinistério da Saúde.

A centralização dessas pesqui-sas, na farmácia hospitalar, sob aresponsabilidade única do farma-cêutico, é uma exigência tamanhapor parte da indústria farmacêutica,bem como por parte do FDA (Foodand Drog Administration) e de al-guns órgãos não-governamentaisdo setor, que muitas delas não acei-tam financiar os estudos, sem es-sas condições.

E tudo o que a farmácia doHospital das Clínicas deSalvador não quer é quese inviabilizem as parceri-as com a indústria e ór-gãos públicos, pois, semelas, não há recursos fi-nanceiros. E, sem estes, aspesquisas morrem no ni-nho. Antes da reforma,lembra Lúcia Noblat, ohospital perdeu, por vári-as vezes, o direito de sebeneficiar do financiamento, porqueas pesquisas não estariam sob a co-ordenação de farmacêuticos e por-que os trabalhos não seriam desen-volvidos, de forma coordenada, nafarmácia.

Hoje, com as mudanças, a far-mácia do Hupes está realizando pes-

quisas com o imunomodulador In-terferon e com o antiviral Ribaveri-na. Os dois produtos, associados,estão sendo utilizados no tratamen-to de portadores da hepatite C vi-ral. Além do Hupes, somente o Hos-pital das Clínicas da USP (Universi-dade de São Paulo) de Ribeirão Pre-to realiza o mesmo ensaio. O estudoé financiado pelo laboratório Roche,da Suíça, e se iniciou, em março.

Dose unitária - Atenção espe-cial também está sendo dada a uni-dade de dispensação de medicamen-tos em doses unitárias. Isso, por-que o setor será cercado de algu-mas mudanças conceituais. “Atual-mente, no Brasil, o conceito de dis-tribuição de dose unitária (SDMDU)é, quase todo ele, colocado como ofim do processo de distribuição demedicamentos, com a simples entre-ga do produto identificado ao paci-ente. Mas, na verdade, o sistema éum meio de se garantir uma utiliza-ção racional do medicamento pelopaciente, o que, hoje, fundamenta aprática da atenção farmacêutica hos-pitalar”, explica o professor Lindem-berg Assunção Costa.

Outra unidade que também me-recerá a atenção da Diretoria da far-mácia do Hupes é a farmácia ambu-latorial. Com os seus amplos e con-fortáveis espaços e mobiliários, aunidade reunirá dois consultórios

farmacêuticos para atendimento aopúblico.

Filosofia - A nova filosofia im-plantada na farmácia do Hospitaldas Clínicas de Salvador é assenta-da, toda ela, no farmacêutico e noacadêmico de Farmácia. Na verda-de, a farmácia hospitalar transfor-

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Reforma trouxe dependências confortáveis

Nova farmácia ocupa área de 400m2

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ma-se, a partir de agora, num gran-de laboratório de aprendizado prá-tico da profissão, cujo eixo é o far-macêutico, quaisquer que sejam asatividades ali desenvolvidas, da di-reção geral à pesquisa.

A Residência Farmacêutica ga-nha, ali, o reconhecimento do Mi-nistério da Educação. Aliás, é umadas primeiras residências a ser refe-rendada pelo MEC. Farmacêuticos,durante 24 horas, vão se revezar, emplantões de quatro horas, para vi-venciar, na rotina farmacêutica, ocorre-corre, as dificuldades, as ur-gências e as alegrias da atividade,dentro de um hospital de grandeporte. E mais: em total integraçãocom os demais profissionais da saú-de, dentro do verdadeiro espírito deequipe. Os residentes terão acomo-dações confortáveis e estarão, emtempo integral, sob a coordenaçãode um profissional, que dividirá comeles as acomodações, que contamcom camas, sofás, armários indivi-duais etc. Ao lado, uma cantina vaigarantir-lhes o lanche e o cafezinho.

Atenção farmacêutica - A es-trela de todo esse esforço será aatenção farmacêutica. “Estamos se-guindo, à risca, a filosofia que sus-tenta a atenção farmacêutica, pre-conizada pela Organização Mundi-al de Saúde e pela Opas, e que é,também, a referência farmacêutica,no mundo inteiro”, explica Lindem-berg Costa, acrescentando que essafilosofia priorizar a relação farma-cêutico/paciente. “Nossa intençãoé fazer com que o farmacêutico es-teja integrado às equipes de sáude,aqui, no Hospital Universitário, in-clusive, assumindo postos de lide-rança nas mesmas”, acrescenta.

Mas outra estrela brilhará na far-mácia do Hupes: a pesquisa. A idéiada diretoria é a de realizar várias de-las, em todas as áreas da farmácia (noarmazenamento, no doseamento, naatenção, na nutrição parenteral (estaé uma outra unidade devidamenteequipada com o que há de mais mo-derno no setor), nos ensaios clínicos,na farmacocinética clínica, na farma-covigilância, na farmacotécnica etc.

Antes mesmo da reforma, mas já nu-trida das mudanças conceituais, a far-mácia já havia criado o seu formuláriode medicamentos próprio, o primeirodo Hupes, em seus 50 anos de exis-tência.

Autonomia - A reforma está in-serindo a Faculdade de Farmácia daUniversidade Federal da Bahia no

Conselho Deliberativo do Hospitaldas Clínicas, antes, composto ape-nas pelas faculdades de Medicina,Enfermagem e Nutrição. “Isso sig-nifica ganho de poder político, o quevai nos ajudar muito, quando tiver-mos que tomar decisões “, explicaLúcia Noblat. Agora, é colher osfrutos do plantio.

HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA UFBA

O ganho no aprendizadoO farmacêutico Jorge Antônio Piton

Nascimento, da Bahia, membro da Comissão deIndústria do Conselho Federal de Farmácia, co-nhece a história da farmácia do Hospital EdgardSantos (o Hospital das Clínicas de Salvador, daUniversidade Federal da Bahia - UFBA), muitoantes de a professora Lúcia Noblat deixar Natalpara morar, na Bahia. A pedido do presidente doCFF, Jaldo de Souza Santos, Piton visitou asobras da farmácia daquele hospital e faz algunscomentários sobre o que viu. “Essas mudanças,inclusive de visão, implantadas pelos irmãosLúcia Noblat e Lindemberg Costa estão dando uma nova dimensão àfarmácia hospitalar, inclusive com o fortalecimento da farmácia clíni-ca, em um momento importante para sua afirmação”, explica Piton.

Um aspecto destacado pelo farmacêutico é o ganho queterão os estudantes de Farmácia da UFBA. Segundo Piton, eles, ago-ra, poderão acompanhar todo o trâmite do medicamento-paciente etoda a realidade de uma grande farmácia hospitalar, no seu dia-a-dia.Comenta: “Terão um aprendizado maior em todos os trânsitos ineren-tes à farmácia hospitalar, pois não vão apenas dispensar o medica-mento, mas também aprender a fazer uma análise do receituário médi-co, para checar se há alguma incoerência na prescrição. Também, vãopoder acompanhar o desenvolvimento do paciente, observando apossibilidade de interação medicamento-medicamento, medicamen-to-alimento etc. Enfim, poderão realizar a essencial atenção farma-cêutica”.

Dificuldades – A farmácia do Hupes já viveu outros bonsmomentos, lembra Piton. Foi quando a professora Neusa OliveiraAlmeida, sua ex-responsável técnica, às custas de um esforço sobre-humano, levou a farmácia a produzir até injetáveis. “Mas com a suaaposentadoria e com dificuldades crescentes de administração dasempresas públicas e carência de recursos, a farmácia abandonou aprodução de semi-injetáveis”, diz. Neusa Oliveira Almeida já faleceu.

Os demais hospitais brasileiros, pediu Jorge Piton, devembuscar esse mesmo crescimento registrado, hoje, na farmácia do Hu-pes. Aliás, a busca por crescimento é sempre uma conclamação feitanos eventos da Sbrafh (Sociedade Brasileira de Farmácia Hospitalar),lembra o integrante da Comissão de Indústria do CFF. Piton torcepara que os verbas destinadas aos hospitais públicos não venham aminguar, prejudicando iniciativas desse porte.

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Jorge Piton

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CFF edita resoluções dispondosobre farmácia hospitalar

RESOLUÇÕES

CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA

RESOLUÇÃO Nº 300de 30 de janeiro de 1997

Ementa: Regulamenta o exercício profissionalem farmácia e unidade hospitalar, clínicas ecasa de saúde de natureza pública ou privada.

O CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA, no exer-cício das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 6º,alíneas “g” e “m”, da Lei 3.820/60 e o artigo 6º do Decreto85878/81;

Considerando a necessidade de aperfeiçoar e atualizaro conceito de Farmácia Hospitalar, bem como disciplinar oseu funcionamento;

Considerando o dispositivo no art.15 da lei 5.991/73,bem como a necessidade de ampliar e definir a competênciaprivativa profissional do farmacêutico, conforme o dispostono art.1º do Decreto retro, RESOLVE:

Art.1º - Para os efeitos desta Resolução, entende-secomo:

I - FARMÁCIA DE UNIDADE HOSPITALAR: uni-dade clínica de assistência técnica e administrativa, dirigidapor farmacêutico, integrada, funcional e hierarquicamente, àsatividades hospitalares.

Art. 2º- A farmácia hospitalar tem como principal fun-ção: garantir a qualidade de assistência prestada ao paciente,através do uso seguro e racional de medicamentos e correla-tos, adequando sua utilização à saúde individual e coletiva,nos planos: assistencial, preventivo, docente e de investiga-ção, devendo, para tanto, contar com farmacêuticos em nú-mero suficiente para o bom desempenho da assistência far-macêutica.

Art. 3º - Nas atividades de assistência farmacêutica, éde competência da farmácia hospitalar.

I - Assumir a coordenação técnica nas discussões paraseleção e aquisição de medicamentos, germicidas e correla-tos, garantindo sua qualidade e otimizando a terapia medica-mentosa.

II - Cumprir normas e disposições gerais relativas aoarmazenamento, controle de estoque e distribuição de medi-camentos, correlatos, germicidas e materiais médico-hospi-talares.

III - Estabelecer um sistema, eficiente, eficaz e segurode dispensação para pacientes ambulatoriais e internados, deacordo com as condições técnicas hospitalares, onde ele seefetive.

IV - Dispor de setor de farmacotécnica composto deunidades para:

a)manipulação de fórmulas magistrais e oficinais;b)manipulação e controle de antineoplásicos;c)preparo e diluição de germicidas;d)reconstituição de medicamentos, preparo de mistu-

ras intravenosas e nutrição parenteral;e)fracionamento de doses;f)análises e controles correspondentes;g)produção de medicamentos;h)outras atividades passíveis de serem realizadas. se-

gundo a constituição da farmácia hospitalar e característicasdo hospital.

V - Elaborar manuais técnicos e formulários próprios.VI - Manter membro permanente nas comissões de sua

competência, principalmente:a)na comissão de farmácia e terapêutica ou de padroni-

zação de medicamentos;b)na comissão de serviço de controle de infecção hos-

pitalar;

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As atividades do farmacêu-tico na farmácia hospitalar é o obje-to de três resoluções do ConselhoFederal de Farmácia. A última de-las, de número 300, editada, em 1997,avança para a função clínica da far-mácia, centrada no paciente. “Issoé de fundamental importância paraa realização profissional do farma-cêutico, pois, através dela, terá ascondições de exercer as suas ativi-dades em toda a sua plenitude eobter o reconhecimento de seu tra-balho no âmbito hospitalar”, argu-

menta o secretário geral do CFF,Arnaldo Zubioli, no livro “Deonto-logia e Farmácia”, ainda em gesta-ção, de sua autoria. O livro deveráser lançado, em março de 2002. Astrês resoluções foram editadas, du-rante a sua gestão como presiden-te do Conselho Federal.

Portanto, as atribuições dafarmácia hospitalar, de acordo coma Resolução número 300, de 30 dejaneiro de 1997, promulgada peloCFF, são as seguintes (veja a Reso-lução, na íntegra):Arnaldo Zubioli

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c)na comissão de licitação ou parecer técnico;d)na comissão de suporte nutricional.VII - Atuar junto à Central de Esterilização na orienta-

ção de processos de desinfecção e esterilização de materiais,podendo inclusive ser o responsável pelo setor.

VIII - Participar nos estudos de ensaios clínicos e noprograma de farmacovigilância do hospital.

IX - Exercer atividades formativas sobre matérias desua competência, promovendo cursos e palestras e criandoum Setor de Informações de Medicamentos, de acordo comas condições do hospital.

X - Estimular a implantação e o desenvolvimento dafarmácia clínica.

XI - Exercer atividades de pesquisa, desenvolvimentoe tecnologia farmacêuticas no preparo de medicamento e ger-micidas.

Art. 4º - Ao farmacêutico diretor-técnico, em particu-lar, compete:

I - Cumprir e fazer cumprir a legislação atinente àsatividades hospitalares e relativas à assistência farmacêuti-ca.

II - Organizar, supervisionar e orientar, tecnicamente,todos os setores que compõem a farmácia hospitalar, de for-ma a assegurar-lhe características básicas, bem como contri-buir para seu funcionamento em harmonia com o conjunto daunidade hospitalar.

Art. 5º - Revogam-se a Resolução 208/90 e demais dis-posições em contrário.

Art. 6º - Esta Resolução entrará em vigor na data desua publicação no “Diário Oficial da União”

Sala das Sessões, 30 de janeiro de 1997.

ARNALDO ZUBIOLIPresidente

ANTINEOPLÁSICOSA manipulação de drogas antineoplásicas pelo farma-

cêutico foi regulamentada pelo Conselho Federal de Farmá-cia, através da Resolução número 288, de 21 de março de1996. Veja, na íntegra, o texto das normas.

RESOLUÇÃO N.º 288de 21/03/1996

Ementa: Dispõe sobre a competência legalpara o exercício da manipulação de drogas an-tineoplásicas pela farmacêutico.

O Conselho Federal de Farmácia, no exercício das atri-buições que lhe são conferidas pela alínea “m”, do artigo 6º,da Lei 3.820, de 11 de novembro de 1960, e modificada pelaLei 9.120/95;

Considerando o disposto na Resolução N.º 04, de 11de abril de 969, do Conselho Federal de Educação, e o dis-posto no Decreto N.º 85.878, de 07 de abril de 1981, emArtigo 1º, incisos I e VI;

Considerando o disposto na Resolução N.º 208/90 emseus Artigos 2º, 3º e 4º deste Conselho;

Considerando a necessidade de assegurar condiçõesadequadas de formulação, preparo, armazenagem, conserva-ção, transporte, segurança do farmacêutico que manipula,bem como os resíduos oriundos das drogas antineoplásicasnos estabelecimentos de saúde;

Considerando a necessidade de regulamentar as nor-mas e condições na formulação e preparo de drogas antineo-plásicas nos estabelecimentos de saúde.

RESOLVE:Art. 1º - É atribuição privativa do farmacêutico a com-

petência para o exercício da atividade de manipulação de dro-gas antineoplásicas e similares nos estabelecimentos de saú-de;

Art. 2º - No exercício da atividade de quimioterapianos estabelecimentos de saúde, caberá ao farmacêutico:

I - Selecionar, adquirir, armazenar e padronizar os com-ponentes necessários ao preparo dos antineoplásicos;

II - Avaliar os componentes presentes na prescriçãomédica, quanto a quantidade, qualidade, compatibilidade, es-tabilidade e suas interações;

III - Proceder a formulação dos antineoplásicos, se-gundo prescrição médica, em concordância com o preconiza-do em literatura;

IV - Manipular drogas antineoplásicas em ambientes econdições assépticos, e obedecendo critérios internacionaisde segurança;

V - Orientar, supervisionar e estabelecer rotinas nosprocedimentos de manipulação e preparação dos antineoplá-sicos;

VI - Preencher adequadamente o rótulo de cada unida-de de antineoplásico preparado, assinar e carimbar, identifi-cando o nome do cliente da terapêutica, a quantidade de cadacomponente adicionado, bem como efetuar as devidas reco-mendações para sua estabilidade e administração;

VII - Determinar o prazo de validade para cada unida-de de antineoplásico, de acordo com as condições de preparoe características da substância;

VIII - Assegurar o controle de qualidade dos antineo-plásicos, após o preparo até a administração;

IX - Registrar cada solução de antineoplásico prepara-do em livro de registro exclusivo, com termo de abertura,onde constará: data do preparo, nome completo, número doprontuário do paciente e localização, número seqüencial depreparo, diagnóstico, protocolo de referência, quantidadepreparada, concentrações do produto;

X - Assegurar destino seguro para os resíduos dos an-tineoplásicos;

XI - Assegurar a observância das normas de segurançaindividuais e coletivas para a manipulação de antineoplási-cos recomendadas em nível nacional e internacional;

XII – Informar, periodicamente, ou quando solicitado,o custo de cada componente de solução após o preparo;

XIII - Compor a equipe multidisciplinar nas visitasaos clientes submetidos ao tratamento com antineoplásicos;

XIV - Participar das reuniões, discussões de casos clí-nicos e atividades didáticas e científicas da equipe multidis-ciplinar;

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XV - Possibilitar estágios supervisionados à farma-cêuticos e acadêmicos de farmácia;

XVI - O farmacêutico deverá dispor de dados quanto aqualidade destes produtos, sobretudo garantindo os seguin-tes parâmetros: solubilidade, estabilidade, homogeneidade,viscosidade, osmolaridade, esterilidade, teor e pureza;

XVII - Participar, desenvolver, elaborar pesquisas deantineoplásicos, não só na área de saúde, bem como na áreaindustrial;

XVIII - Participar e atuar em toda divulgação técnicacientífica vinculada ao marketing do suporte quimioterápi-co.

Art. 3º - Esta Resolução entrará em vigor na data desua publicação.

Sala das Sessões, 21 de março de 1996.

ARNALDO ZUBIOLIPresidente

O CFF também editou a Resolução n.º 292, de 24 demaio de 1996, dispondo exclusivamente sobre o exercício daatividade de nutrição parenteral e enteral pelo farmacêutico.É uma medida adotada com vistas a estabelecer uma práticaprofissional correta. Na íntegra, a matéria.

NUTRIÇÃO PARETERAL E ENTERAL

RESOLUÇÃO N.º 292,de 24/05/1996

Ementa: Ratifica competência legal para oexercício da atividade de nutrição parenteral eenteral, pelo Farmacêutico.

O Conselho Federal de Farmácia, no exercício das atri-buições que lhe são conferidas pela alínea “m”, do Artigo 6º,da Lei 3.820/60 , de 11 de novembro de 1960;

Considerando o disposto na Resolução N.º 04, de 11de abril de 1969, do Conselho de Educação e o disposto noDecreto N.º 85.878, de 07 de abril de 1981, em seu Artigo 1º,inciso IV;

Considerando que a atividade de nutrição parenteral eenteral se dá nos estabelecimentos de saúde, em nível hospi-talar, público, privado e conveniado, pequenas clínicas, in-dústrias e centros especializados no preparo, para adminis-tração em regime hospitalar, ambulatorial ou domiciliar;

Considerando a necessidade de assegurar condiçõesadequadas de formulação, preparo, armazenamento, conser-vação e de transporte de nutrição parenteral e enteral nosestabelecimentos de saúde.

RESOLVE:Art. 1º - Ratificar a competência do profissional far-

macêutico para o exercício da atividade de nutrição parente-ral e enteral.

Art. 2º - No exercício da atividade de nutrição parente-ral, cabe exclusivamente ao farmacêutico:

I - Avaliar os componentes presentes na prescriçãomédica da nutrição parenteral, quanto à quantidade, qualida-de, compatibilidade, interações e estabilidade;

II - Proceder a formulação da nutrição parenteral, se-gundo prescrição médica;

III - Preparar a nutrição parenteral, utilizando metodo-logia rigorosamente asséptica;

IV - Orientar, supervisionar e estabelecer rotinas nosprocedimentos básicos de manipulação e preparação de nu-trição parenteral; V - Preencher adequadamente o rótulo de cada unidade denutrição parental preparada, colocando nome e localizaçãodo paciente, data do preparo, prazo de validade, instruçõespara administração, composição, nome e inscrição do profis-sional farmacêutico no respectivo CRF;

VI - Determinar o prazo de validade para cada unidadede nutrição parenteral, de acordo com as condições de prepa-ro;

VII - Assegurar a qualidade e integridade da nutriçãoparenteral, desde o preparo, até a sua administração;

VIII - Registrar cada solução de nutrição parenteralpreparada, em livro de registro exclusivo, com termo de aber-tura, onde constará: data de preparo, nome completo, núme-ro do prontuário do paciente e localização, número seqüenci-al de preparo, diagnóstico, quantidade de frascos preparadospara cada vinte e quatro horas;

IX - Supervisionar estagiários farmacêuticos e acadê-micos de farmácia no preparo das soluções de nutrição pa-renteral;

Art. 3º - Cabe ao farmacêutico aos demais membros daequipe:

I - Selecionar, adquirir e padronizar os componentesnecessários ao preparo da nutrição parenteral;

II - Informar, quando solicitado, o custo de cada com-ponente e da solução de nutrição parenteral e enteral, após opreparo;

III - Determinar a qualidade dos produtos adquiridospara a elaboração das misturas em nutrição enteral, sobretu-do garantindo: solubilidade, estabilidade, homogeneidade,viscosidade, osmolaridade e esterilidade;

IV - Visitar os clientes submetidos a nutrição parente-ral e enteral;

V - Participar da Comissão de Suporte Nutricional emcada unidade hospitalar, para promover discussões de casosclínicos e atividades didáticas e científicas;

VI - Participar, desenvolver e elaborar pesquisas emsuporte nutricional, não só na área de saúde, como tambémna área industrial e atuar em toda a divulgação técnico e cien-tífica vinculado ao marketing.

Art. 4º - Esta Resolução entrará em vigor, na data desua publicação, revogando-se os termos da Resolução 247/93.

Sala das Sessões, 24 de maio de 1996.

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