a construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas * Este trabalho, orientado pelo professor Leonel Aguiar, é resultado de um estudo realizado quando Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann terminava o curso de Comunição Social - Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Atualmente, Daniela é formada em Jornalismo e Ciências sociais, tem curso de pós-graduação em Educação a Distancia e é mestre em Estudos da Infância.

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Um dos objetivos deste estudo é analisar de que modo as revistas femininas constroem um padrão estético de beleza para a mulher. O que se vê nas revistas, anúncios publicitários e na televisão são mulheres cada vez mais parecidas, com tipos padronizados e muito similares. O objetivo, portanto, é tentar pensar de que forma as revistas femininas constroem um padrão de beleza feminina ideal. Para pensar a relação entre meios de comunicação e a chamada “ditadura da beleza”, o presente trabalho faz uma análise do discurso de reportagens veiculadas em revistas dirigidas ao público feminino cujo tema principal ou um dos temas principais é a beleza da mulher - Corpo a Corpo, Boa Forma, Nova e Claudia -, publicadas no mês de março de 2007.

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Page 1: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann

A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

* Este trabalho, orientado pelo professor Leonel Aguiar, é resultado de um estudo realizado quando Daniela Figueiredo Moreira Hoffmann terminava o curso de Comunição Social - Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Atualmente, Daniela é formada em Jornalismo e Ciências sociais, tem curso de pós-graduação em Educação a Distancia e é mestre em Estudos da Infância.

Page 2: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

2

SUMÁRIO

DEDICATÓRIA......................................................................................................... 3

INTRODUÇÃO........................................................................................................... 4

CAPÍTULO I - Meios de comunicação como disseminadores de idéias e padrões de comportamento.............................................................................................................

5

CAPÍTULO II - “Ditadura da beleza”: a preocupação com a aparência física........... 8

CAPÍTULO III - Meios de comunicação e a “ditadura da beleza” feminina............ 10

CAPÍTULO IV - A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas... 12

4.1 - A padronização da beleza............................................................................... 16

4.2 - O combate...................................................................................................... 18

4.3 - Em busca da árvore da juventude.................................................................. 21

4.4 - Em busca de um modelo: famosas como referência do padrão de beleza..... 24

4.5 - Esforço pessoal e responsabilidade do indivíduo: basta querer!.................... 25

4.6 - Imediatismo: você pode e pode imediatamente............................................. 27

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 28

REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 31

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3

Dedico este estudo à minha família, base e fundamento da minha vida, e

ao meu querido irmão, que permanece vivo em doces lembranças e

pensamentos.

Page 4: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

4

Introdução

É interessante o modo como, de alguma maneira, a beleza passou a ser em alguns

momentos uma exigência social. E os meios de comunicação parecem importantes

instrumentos no processo de difusão desses ideais e modelos de beleza. A mídia

constantemente nos bombardeia com dicas de beleza e imagens de modelos ideais que

devemos seguir.

Alguns sinais da preocupação com a aparência são passíveis de constatação. Basta, por

exemplo, verificar a existência de um índice elevado de academias de ginástica, de clínicas

de cirurgia plástica e a quantidade de oferta de produtos de beleza à venda no mercado. A

grande quantidade de revistas de beleza que existem, hoje, no mercado editorial também

pode de algum modo ser visto como um sinal do que alguns autores chamam de

“corpolatria” ou da importância da aparência física.

Miriam Goldenberg (2002), ao estudar o contexto brasileiro, afirma que a preocupação com

a aparência e a juventude ganhou uma dimensão social inédita e passou a ser disseminada

por todas as classes econômicas e faixas etárias. Na segunda metade do século XX,

segundo a autora, o culto ao corpo ganhou uma dimensão social muito grande. A obsessão

com a magreza, as cirurgias plásticas, as academias de ginástica são, para a autora,

evidencias da importância que a aparência ganhou nos tempos atuais.

Um dos objetivos deste estudo é analisar de que modo as revistas femininas constroem um

padrão estético de beleza para a mulher. O que se vê nas revistas, anúncios publicitários e

na televisão são mulheres cada vez mais parecidas, com tipos padronizados e muito

similares. O objetivo, portanto, é tentar pensar de que forma as revistas femininas

constroem um padrão de beleza feminina ideal.

Para pensar a relação entre meios de comunicação e a chamada “ditadura da beleza”, o

presente trabalho faz uma análise do discurso de reportagens veiculadas em revistas

dirigidas ao público feminino cujo tema principal ou um dos temas principais é a beleza da

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5

mulher - Corpo a Corpo, Boa Forma, Nova e Claudia -, publicadas no mês de março de

2007.

I. Meios de comunicação como disseminadores de idéias e padrões de comportamento

Os meios de comunicação assumiram papel significativo na sociedade, já que, no mundo

atual, é geralmente a eles que recorremos quando queremos nos informar, nos entreter ou

nos orientar sobre determinado assunto. Hoje em dia pode-se afirmar que as novas formas

de comunicação, surgidas no século XIX / XX, têm em comum o fato de estabelecerem

contato direto com o público, substituindo, muitas vezes, as instituições tradicionais de

socialização, como a Igreja, a escola, a família e o Estado (Babo e Jablonsky, 2002).

Umberto Eco (1987) apresenta os principais pontos apontados por autores que fazem a

defesa da chamada cultura ou comunicação de massa, aos quais Eco chamou de integrados.

Segundo a visão desses pensadores, os veículos de comunicação são instrumentos de

democratização e disseminação da cultura e da informação, que até então circulavam

apenas entre alguns grupos minoritários. Assim, segundo este ponto de vista, os veículos de

comunicação possibilitam que ocorra socialização da informação e dos bens culturais. Eco

(1987) enumera ainda as principais acusações contra os veículos de comunicação,

apontadas por importantes autores. Um deles é Theodor Adorno, teórico da Escola de

Frankfurt, que junto com Max Horkheimer criou o termo indústria cultural para se referir

aos veículos midiáticos que, para ele, tem como principal atividade a produção e

exploração de bens culturais com fins lucrativos e mercantis. Assim, a visão apocalíptica,

segundo o autor, concebe a indústria cultural como um projeto de dominação e alienação

das massas. Os meios de comunicação seriam, portanto, um instrumento de imposição e

disseminação da ideologia dominante.

Segundo Giovandro Marcus Ferreira (2001), entretanto, a teoria crítica elimina, no processo

de massificação, a possibilidade de uma postura contestadora e crítica dos indivíduos. Ao

contrário, defende que ocorre uma certa adesão das idéias e valores propagados, sem que

haja reação dos indivíduos às proposições emanadas pela indústria cultural. Ferreira (2001)

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apresenta ainda uma outra fragilidade teórica apontada pelo sociólogo John Thompson

acerca da teoria crítica. Para Thompson, não é evidente que os indivíduos ao consumirem

os produtos dos veículos de comunicaçç aderem sem crítica e reação à ordem social. Uma

coisa é dizer que os produtos são padronizados, outro é dizer que aqueles que consomem

tais produtos apenas os reproduzem, de forma acrítica. Para efeito deste estudo, levaremos

em conta o fato de que as pessoas são uma audiência ativa e, portanto, participam do

processo de negociação dos significados do conteúdo midiático.

Os debates em torno dos meios de comunicação são bastante contraditórios e

diversificados. Mas todos parecem demonstrar que os meios de comunicação são

importantes instrumentos de disseminação de valores e idéias e, por isso, assumiram papel

significativo na sociedade atual. Segundo Rüdiger (2001), os pensadores da Escola de

Frankfurt desde já perceberam que instituições tradicionais, tais como a família e a escola,

estavam perdendo sua influência socializadora para os veículos de comunicação.

Atualmente, os meios de comunicação colocam a sociedade frente a um amplo repertório

de idéias, emoções, escolhas, imposições e práticas. E constroem, ao mesmo tempo, um

universo ideológico, composto por representações sociais que são elaboradas, construídas,

repetidas e transformadas pela veiculação dos textos e imagens de anúncios publicitários,

jornais, novelas, revistas, noticiários, filmes, etc. A produção de idéias, padrões e modos de

viver apresentados pela indústria cultural influencia o imaginário da sociedade que a

recebe. Desta forma, os meios de comunicação ganharam na contemporaneidade um papel

central na disseminação de ideais e de estilos de vida (Everardo, 2001).

As representações e imagens que habitam nosso imaginário formam uma espécie de texto

ou roteiro com o qual encenamos a experiência cotidiana. As mensagens veiculadas pela

mídia podem ser pensadas como um discurso que é detentor de grande potencial para

revelar o imaginário cultural e é capaz de disseminar ideologias e impor consensos

(Everardo, 2000). É importante analisar os meios de comunicação para entender a cultura

contemporânea. Ao analisar os discursos dos conteúdos transmitidos pelos meios de

comunicação podemos enteder muitos aspectos culturais e sociais de grande relevância.

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Como afirma Everardo Rocha, “o universo de especulação simbólica que a Comunicação

de Massa projeta é, provavelmente, a mais formidável máquina de criação do imaginário

coletivo de nosso tempo” (Rocha, 1995: 24).

Falar de mídia, entretanto, implicar falar de consumo. Everardo Rocha (2001) em um

estudo sobre a identidade feminina nos anúncios publicitários defende que, na cultura

contemporânea, são os meios de comunicação de massa e o marketing as instâncias que

patrocinam o processo que permite a experiência do consumo. Ele afirma que são os meios

de comunicação que classificam e oferecem sentido aos produtos, que fornecem o código

cultural que transforma cada produto em uma necessidade. “(...) É a decodificação das

mensagens veiculadas pela mídia que formata a experiência das práticas que entendemos

como consumo. Nesse sentido, o sistema simbólico formado pelos meios de comunicação

organiza o comportamento do consumidor (...)” (Everardo, 2001).

A mídia adquiriu um grande poder de influência sobre os indivíduos, expandiu o consumo

de produtos de beleza e tornou a aparência uma dimensão essencial da identidade tanto para

homens quanto para mulheres. Os meios de comunicação, sem dúvida, possuem um papel

central no que se refere à disseminação desses padrões estéticos que são construídos e

assimilados pelos indivíduos (Goldenberg, 2002).

Santos e Jablonsky (2003) afirmam que uma pesquisa realizada pelo Núcleo de Estudos

sobre Mídia e Política (UnB) na década de 1990 revela que a maior fonte de suprimento de

informações para crianças entre 6 e 14 anos era a TV (75%), seguida de jornais (52%),

revistas (52%) e Internet (50%). Pais e amigos vêm depois. Deste modo, a transmissão

cultural e a transmissão de valores têm deixado de ser ensinadas pela família e pela escola

para se basear na relação que as crianças e os adolescentes estabelecem com as redes

midiáticas.

A TV, e mesmo outros veículos de comunicação, como revistas, são altamente atraentes e,

por isso, mobilizam e exercem um grande fascínio em adultos e crianças, jovens e idosos.

Estes meios se transformaram de simples aparelhos eletrodomésticos em poderosos agentes

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de transformação das relações familiares. Nas classes média e alta, no Brasil, por exemplo,

não é difícil encontrar dois ou três aparelhos de TV numa mesma casa. Assim, a

convivência e o compartilhamento de momentos entre os membros da família são

substituídos, em certa medida, por produtos televisivos de qualidade e ética bastante

questionáveis (Santos e Jablonsky, 2003).

Tais pesquisas demonstram justamente que os veículos midiáticos estão aumentando

significativamente a sua influência no cotidiano social e revelam a grande participação que

eles têm na vida da sociedade, tanto como disseminadores de ideais, quanto como

construtores de padrões e modelos. Diante de toda essa influência, a qualidade dos

programas exibidos pela televisão tem sido extensamente debatida e estudada, em seus

diferentes gêneros – programas jornalísticos, esportivos, de auditório, humorísticos,

novelas, filmes, musicais, desenhos animados, etc.

O estudo do espaço midiático abre um importante canal para a compreensão da

contemporaneidade e a discussão dos modelos de relações, comportamentos e expressões

ideológicas da nossa sociedade. O mundo retratado pela mídiamuitas vezes parece um

mundo fantasioso e ideal: compõe-se de prazer e desfrute absolutos, onde, por exemplo, a

criança está constantemente sorridente e satisfeita, a mulher, belíssima, desejosa e sedutora,

e o homem, bem-sucedido e viril. (Santos e Jablonsky, 2003). É um mundo mágico e

sedutor.

II. “Ditadura da beleza”: a preocupação com a aparência física

O corpo, como demonstra José Carlos Rodrigues é apropriado pelas mais diversas

sociedades como um sistema de expressão. Em “Tabu do corpo”, Rodrigues chama a

atenção para o fato de que o corpo humano é socialmente concebido. Segundo ele, o corpo

é um sistema simbólico que revela as representações de uma sociedade.

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(...) a Cultura dita normas em relação ao corpo; normas a que o indivíduo tenderá, à custa de castigos e

recompensas, a se conformar, até o ponto de estes padrões de comportamento se lhe apresentarem

como tão naturais quanto o desenvolvimento dos seres vivos (...). (Rodrigues, 1980, p. 45).

Portanto, para o autor, ao corpo se aplicam crenças e sentimentos que estão na base da vida

social. O corpo é um sistema de símbolos que revela inclusive o lugar que ocupamos

socialmente. Segundo Rodrigues, “(...) reconhecemos no nosso corpo e no das pessoas que

conosco se relacionam um dos diversos indicadores da nossa posição social e o

manipulamos cuidadosamente em função desse atributo” (Rodrigues, 1980: p. 45).

A estética corporal assumiu grande importância em muitas formações sociais nos tempos

atuais1. Como afirma Novaes (2001), a imagem, hoje, ganha uma importância decisiva.

Vivemos na era das imagens. Existir é ser visto, e o corpo passou a ser um passaporte para

a felicidade, bem-estar e realização pessoal. O culto ao corpo, como afirma Novaes, é

imposto na atualidade como um valor mercadológico a ser conquistado (Novaes, 2001).

Segundo Novaes (2001), hoje há uma hipervalorização da construção corporal, seja por

meio de cirurgias estéticas, pelas dietas, pela prática da musculação, etc. Apreendidas

inicialmente como uma disciplina, com o passar do tempo essas práticas, vão sendo

incorporadas ao cotidiano dos indivíduos.

Em “Perdidas no espelho? Sobre o culto ao corpo na sociedade de consumo”, a autora

defende que a proliferação das academias de ginástica, a grande quantidade de

anabolizantes que são consumidos, os produtos naturais que prometem saúde perfeita nos

levam a crer que o corpo passou a ocupar um novo lugar em nossa sociedade. A

preocupação com a aparência, no entanto, não é um fenômeno atual. Novaes (2001) nos

lembra que historicamente as pessoas sempre se preocuparam com a aparência. O que

mudou na contemporaneidade foi que as pessoas passaram a ser responsáveis por ela. Se,

no passado, a natureza podia ser culpada pela falta de beleza, hoje a culpa recai sobre o

1 Reconheço as limitações de utilizar expressões como “tempos atuais”, “contemporaneidade”, “atualmente”, “contemporânea”, “sociedade atual”, já que há grande diversidade de formações sociais. No entanto, quando utilizar tais termos, estarei me referindo às formações sociais capitalistas, regidas sob a lógica do consumo, em que os meios de comunicação possuem um papel importante nas dinâmicas culturais e sociais, como é o caso do Brasil.

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próprio indivíduo. A multiplicação das técnicas corporais e a difusão cada vez maior de

modelos de beleza provocaram uma pressão ainda maior. O indivíduo é agora responsável

por moldar o seu próprio corpo. Sua beleza e aparência são vistos como um dever e uma

responsabilidade própria.

O mercado editorial parece nos alertar para o novo espaço ocupado pela aparência física.

São inúmeras as revistas especializadas que ensinam-nos qual corpo que se deve ter e

desejar e como atingir esse ideal. Nas capas das revistas, mulheres que materializam o

modelo ideal de beleza a ser alcançado. Hoje, muitos autores falam em “cultura do corpo”

ou “corpolatria” para definir esse fenômeno (Novaes, 2001). Jurandir Freire Costa, em “O

vestígio e a aura – corpo e consumismo na moral do espetáculo” (2004), diz, citando Guy

Debord, que o dilema moral da contemporaneidade não é mais o da escolha entre “ser” e

“ter”, porém o da escolha entre “ser” e “parecer”. O indivíduo comum esgota seus prazeres

e dias no trabalho obsessivo de tomar posse do corpo perfeito, que nada lhe garante, exceto

a fantasia de pertencer a um mundo do qual está, na realidade, excluído, já que o corpo

ideal dificilmente será alcançado.

III. Meios de comunicação e a “ditadura da beleza” feminina

A mídia é uma das responsáveis por construir códigos culturais que fornecem padrões para

se pensar a própria identidade do indivíduo. “As identidades, tanto do homem quanto da

mulher, se traduzem na mídia pelos seus aspectos relacionais, gramaticais, como códigos

ou padrões onde a sociedade cruza idéias, estilos, práticas e nelas aloja atores sociais”

(Everardo, 2001, p. 19). Segundo Santos e Jablonsky (2003) os meios de comunicação têm

profundo impacto sobre a percepção dos indivíduos sobre si mesmos, o que muitas vezes

cria distorções e limitações sobre o que é considerado normal e aceitável.

Já desde a programação infantil, a televisão mostra imagens padronizadas e diferenciadas para

descrever os interesses e comportamentos de meninos e meninas, influenciando as crianças na

formação da visão sobre os papéis que homens e mulheres ocupam na sociedade. (Santos e Jablonsky,

2003, p. 45).

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Novaes (2001) acredita que a utilização do corpo como objeto por parte dos meios de

comunicação é ainda mais abusiva em relação ao corpo feminino, ainda que a figura

masculina não esteja ausente dos apelos dos meios de comunicação. Embora o número de

homens freqüentadores de academias vem aumentando, a presença feminina nesses espaços

ainda é esmagadora. Nos discursos sobre a mulher, como defende Novaes, é freqüente

encontrar a idéia de que a imagem e a beleza são fundamentais, e está ligada à própria

construção da feminilidade. A mulher deve se cuidar, ser feminina, ser sedutora e ser

atraente. Assim, a beleza passa a ser uma marca da identidade feminina. A mulher deve ser

bonita, trata-se de uma exigência (Novaes, 2001). Segundo Novaes (2001), para a mulher, a

beleza é representada como um dever cultural. A imagem da mulher pública é sempre

associada a sua aparência, apresentação e atração. “A imagem da mulher na cultura

confunde-se com a da beleza. Este é um dos pontos mais enfatizados no discurso sobre a

mulher – a mulher pode ser bonita, deve ser bonita – do contrário não será totalmente

mulher” (Novaes, 2004: 74.)

Para Costa (2004), a cultura do corpo, ou culto ao corpo, fez da aparência física um

referente privilegiado para a construção das identidades pessoais. Referir o sentimento de

identidade ao corpo significa definir o que somos e devemos ser, a partir de nossos

atributos físicos.

Na propaganda e na mídia em geral, os estereótipos de papéis sociais e, principalmente, dos

papéis de gênero, são abertamente reforçados. A existência de um modelo estético ideal

veiculado nos meios de comunicação oprime e gera sentimento de inferioridade em

mulheres e homens que não se enquadram nesse padrão de beleza exposto pela cultura de

massa. São inúmeros os indivíduos correndo atrás de uma imagem corporal idolatrada,

fabricada para ser desmontada em pouco tempo. (Santos e Jablonsky, 2003).

Com respeito à auto-imagem sexual dos jovens, a força da influência da mídia exerce igualmente um

impacto que pode suplantar o das interações familiares. A exposição a imagens de personagens

especialmente atraentes pode também causar impacto no julgamento desses telespectadores quanto à

beleza e atratividade física das pessoas à sua volta (...). (Santos e Jablonsky, 2003).

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A exposição a imagens de personagens atraentes pode causar um significativo impacto no

julgamento dos espectadores quanto à beleza e à atração física das pessoas ao redor.

Kenrick e Gutierres, psicólogos americanos, demonstraram em sua pesquisa que estudantes

universitários do sexo masculino foram muito mais severos em seu julgamento sobre a

aparência de alunas universitárias mostradas em fotografia imediatamente depois de terem

assistido a um programa de televisão que apresentava mulheres muito atraentes (Santos e

Jablonsky, 2003).

IV. A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

A primeira revista de que se tem registro foi publicada em 1663, na Alemanha, e chamava-

se Erbauliche Monaths-Unterredungen (ou Edificantes Discussões Mensais). Dentre as

revistas femininas atuais destaca-se a revista Cosmopolitan, a qual existe até hoje e é

publicada em vinte e cinco diferentes idiomas. No Brasil, ela se chama Nova. A revista

surgiu a partir de um livro escrito pela secretária Helen Gurley Brown e chamado Sex and

the Single Girl (O Sexo e as Solteiras). O sucesso deste livro foi tão grande que, em 1962, a

escritora propôs a um editor o projeto de uma revista com os mesmos temas abordados em

sua obra. Criou-se, então, a revista Cosmopolitan (Scalzo, 2000).

A primeira revista brasileira voltada para mulheres no país foi O Espelho Diamantino,

fundada em 1827. Era um periódico de política, literatura, belas artes, teatro e modas

dedicado às senhoras brasileiras, que trazia textos leves e didáticos sobre política nacional e

internacional, trechos de romances estrangeiros, críticas de literatura, música, belas-artes,

teatro e notícias sobre moda, além de crônicas e anedotas. A partir de então, em Recife, São

Paulo e Rio de Janeiro, as publicações femininas multiplicaram-se (Scalzo, 2000).

No final dos anos 1980, foram lançadas diversas revistas dedicadas ao público feminino,

cujo tema central é o corpo e sua beleza, tais como “Corpo a Corpo”, “Nova beleza” e

depois a revista “Boa Forma”, entre outras. As dietas, os exercícios e as dezenas de

tratamentos de beleza entratam como agendamento da imprensa feminina (Petterle, 2005, p.

30).

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Segundo o Instituto de pesquisa IPSOS-Marplan, que faz estudos de veículos de

comunicação, 40 dos 85 títulos de revistas pesquisados são estritamente voltados para o

público feminino. As revistas deste segmento com maior número de leitoras, em 1999,

eram “Claudia”, “Marie Claire” e “Nova” (Petterle, 2005, p. 30).

O conteúdo das revistas é recheado de dicas para fazer a mulher se tornar mais atraente e

bela. Nas revistas femininas, sobretudo se incluirmos a publicidade como parte do conteúdo

editorial, “talvez se possa dizer que beleza e moda dominem pelo menos uns 70% das

páginas publicadas. Basta darmos uma breve folheada em revistas como ‘Marie Claire’,

‘Claudia’ ou ‘Elle’, sem falar nas já citadas ‘Boa Forma’ e ‘Corpo a Corpo’”. (Petterle,

2005, p. 30).

O mesmo estudo do Instituto de pesquisa IPSOS-Marplan aponta que do universo de

pessoas que consomem algum tipo de mídia, 53% são mulheres. Sendo que seis entre cada

dez mulheres declaram o consumo de revistas. Veja (16%) é o título com maior número de

leitoras, seguido por Claudia (9%). A pesquisa revela também que 73% das mulheres

consomem revistas femininas. Ainda segundo o instituto, o perfil de leitoras das maiores

revistas femininas, que são Claudia, Marie Claire e Nova é de mulheres entre 20 e 39 anos,

de classe A/B. No que se refere à revista Claudia, 85% das leitoras são mulheres, 64% são

da classe A/B e 51% tem entre 20 e 30 anos. Já a respeito das leitoras de Nova, 84% são

mulheres, 68% são da classe A/B e 58% tem de 20 à 30 anos (Petterle, 2005).

A fim de tentar pensar a questão da construção da imagem feminina nos veículos de

comunicação, será feita uma análise de discurso do conteúdo de reportagens veiculadas em

revistas dirigidas ao público feminino cujo tema principal ou um dos temas principais é a

beleza da mulher. Será feita análise ainda de que tipo de padrão de beleza é exposto nas

capas das revistas e ilustram as matérias e reportagens dessas publicações, a fim de

entender qual é o modelo ideal de beleza proposto por essas revistas. Para tal, o objeto de

análise serão as edições publicadas no mês de março das revistas Boa Forma, Nova,

Cláudia e Corpo a Corpo, já que são algumas das mais conhecidas e vendidas revistas do

segmento.

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A Boa Forma é uma revista mensal, publicada pela Editora Abril, fundada em 1985. A

tiragem da publicação é de 297.580 exemplares, sendo que a estimativa do número total de

leitores é de 1.509.000, com base nos estudos Marplan Consolidado 2006, disponíveis no

site da editora. Entre seus leitores, 58% têm idade entre 20 e 39 anos, podemos dizer então

que é um perfil relativamente jovem. Outro dado interessante é que, apesar de ser uma

revista que fala exclusivamente sobre a mulher e que é voltada diretamente para esse

público, a Boa Forma tem 20% dos seus leitores do sexo masculino. Do total de seu

público, 24% pertencem à classe A, 41% à classe B e 28% à classe C. Interessante notar

que, mesmo a revista apresentando tratamentos e produtos de beleza considerados caros e

acessíveis apenas à classe A, esta é a menos participativa no total de leitores.2

A Corpo a Corpo é publicada mensalmente pela Editora Símbolo e foi fundada em 1987. A

descrição da revista feita pelo site da editora é a seguinte:

Corpo a Corpo é a mais completa, bonita, glamourosa e atualizada revista feminina de beleza do país,

feita sob medida para mulher ficar bonita, jovem e saudável por mais tempo. Todo mês, traz as últimas

novidades sobre beleza, maquiagem, cabelo, pele, dieta, nutrição, moda, ginástica e saúde. Uma revista

atual feita para a mulher antenada, que sabe o quanto beleza é fundamental na vida contemporânea3.

A partir desse texto fica impossível negar a exaltação à beleza feita pela publicação. De

acordo com dados do mesmo site, a tiragem é de 124.100 exemplares, e a estimativa de

leitores fica em torno de 220.000. Ainda de acordo com a editora, o público alvo da revista

são as mulheres das classes A e B e que tenham entre 18 e 29 anos. Ou seja, o perfil é ainda

mais jovem na Corpo a Corpo e também mais restrito. É possível presumir, a partir dos

dados, que as meninas estão cada vez mais cedo se interessando pela incansável busca pela

perfeição estética. Segundo a revista, o perfil de suas leitoras é de mulheres “ligadas no

visual e, por isso mesmo, interessadas em tudo a respeito de beleza - pele, cabelo,

maquiagem, fitness, dieta e saúde. Mulheres que querem saber tudo sobre estes mercados,

pois estão sempre ávidas por informações e novidades que possam beneficiar seu corpo

e/ou rosto. Leitoras que vêem, no corpo esteticamente agradável, uma forma de poder,

2 Disponível no site http://publicidade.abril.com.br/homes.php?MARCA=7, acessado em Abril de 2007 3 Disponível no site http://publicidade.abril.com.br/homes.php?MARCA=7, acessado em Abril de 2007

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sedução, força e auto-estima”. Ainda no site da revista, é possível encontrar dados a

respeito dos hábitos e do consumo das leitoras da Corpo a Corpo. Alguns são

extremamente significativos: em relação ao consumo, 86% dele está ligado à beleza e

apenas 56% à saúde; entre as entrevistadas, 76% afirmaram que pretendem fazer cirurgia

no corpo ou no rosto. 4

A revista Nova, publicada mensalmente, pertence à Editora Abril e foi fundada em 1972.

Ela faz parte da rede Cosmopolitan internacional, que é a revista feminina mais vendida no

mundo atualmente.5 A Nova é uma revista que atende a uma demanda das mulheres do

século XXI por assuntos relacionados principalmente ao sexo. Segunda descrição do site da

Editora Abril, a “Nova incentiva e orienta a mulher na busca pela realização pessoal e

profissional. Estimula a ousadia e a coragem para enfrentar os desafios, a busca pelo prazer

sem culpa e a construção da auto-estima e da autoconfiança.”

O total de leitores da revista é de 1.111.000, e a tiragem é de 328.500 exemplares. Ainda

segundo dados do site, 76% dos leitores têm idade entre 18 e 49 anos. Entre os leitores,

16% são homens e 84% são mulheres. Outro dado diz respeito ao perfil da classe social:

25% pertencem à classe A, 46% à classe B e 21% à classe C.6 Apesar de não ser uma

revista exclusivamente voltada para a estética feminina, como as outras duas, a Nova

também exalta um modelo ideal de beleza, a começar pelas mulheres escolhidas para as

capas. São sempre mulheres famosas, consideradas bonitas, e super produzidas, em trajes

mínimos, que evidenciam as formas “esculturais”.

A Claudia é uma revista mensal publicada pela Editora Abril, e foi lançada em

1961. De acordo com o site da publicação, a tiragem da revista é de 523.200 exemplares,

sendo que a estimativa do número de leitores é de 1.974.000, com base nos estudos da 4 Disponível no site http://www.simbolo.com.br/institucional/Conteudo/0/artigo5340-1.asp, acessado em Abril de 2007. 5 Disponível no site http://www.jornalismo.ufsc.br/redealcar/anais/gt1_impressa/corpo%20e%20midia%20-%20fragmentos%20hist%F3ricos%20da%20imprensa%20feminina%20n.doc, acessado em Maio de 2007. 5 Disponível no site http://publicidade.abril.com.br/homes.php?MARCA=32, acessado em Maio de 2007

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Morplan Consolidado 2006. De todas as revistas analisadas, Claudia é a que apresenta

maior variedade no conteúdo. A beleza, entretanto, é um assunto bastante recorrente, que

ganha sessões como “Fique mais bonita”, “Balcão de beleza”, “Aula de beleza” e “Consulta

de beleza” e ainda ganha espaço em algumas matérias no interior da publicação. Em

relação ao perfil dos leitores da revista Claudia, 49% têm entre 18 e 39 anos. Sendo que

86% dos leitores são do sexo feminino. Em relação às classes sociais que consumidora,

25% são da classe A, 39% da B e 28% da classe C.

4.1. A padronização da beleza

O que chama a atenção nas revistas dirigidas ao público feminino é que parece existir um

padrão de beleza exaltado, que é apontado como o modelo ideal a ser seguido pelas leitoras.

Não são raros os momentos em que as matérias exaltam as características do corpo e da

aparência perfeitos.

(...) Não basta ser uma profissional de sucesso, uma mãe dedicada, uma esposa comprometida com a

saúde do relacionamento – todos imperativos midiáticos contemporâneos. É preciso também ter seios

na medida certa, nádegas firmes, pele lisa, cabelos sempre brilhantes e sem fios brancos, barriga

modelada. (Petterle, 2005, p. 32).

Um aspecto interessante é que os padrões freqüentemente anunciados como modelos de

beleza ideais reportam-se à modelos fotográficos. Eles são apresentados como

representantes de uma estética da perfeição. É belo o corpo cirúrgico, esculpido, fabricado e

produzido (Novaes, 2001). Miriam Goldenberg e Marcelo Silva (2002), em uma pesquisa

com homens e mulheres das camadas médias do Rio de Janeiro apontam que o corpo

desejado é apontado como o corpo “malhado”, “sarado”, “trabalhado”.

Como afirma Novaes, as imagens veiculadas através dos meios de comunicação

disseminam justamente o modelo de beleza ideal: corpos trabalhados e jovens. “As imagens

refletem corpos super trabalhados, sexuados, respondendo sempre ao desejo do outro ou

corpos medicalizados, lutando contra o cansaço contra o envelhecimento ou mesmo contra

a constipação”. (Novaes, 2004, p. 11).

Page 17: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

17

Na reportagem da própria revista Boa Forma “Dê um up nele”, o assunto é o aumento da

procura pelo implante de prótese de silicone no bumbum. A matéria diz: “(...) ótima notícia

para algumas de nós, que, apesar da nacionalidade, não nasceram com o bumbum bem

recheado e, por causa do tipo físico, os exercícios podem ajudar pouco. É o seu caso?

Então, saiba o que o avanço da medicina estética pode fazer por você” (p. 101). Interessante

perceber que em todas as revistas, assim como na Boa Forma, o tratamento para com a

leitora apresenta-se de forma intimista, por meio da utilização do pronome na segunda

pessoa do singular e da utilização de uma fala bastante usual e coloquial. O que chama a

atenção nesta reportagem é que o “bumbum recheado” aparece como algo a ser buscado por

aquelas leitoras que, naturalmente, não o possuem. Mais uma vez o bumbum bem

desenhado e farto é evidenciado como um modelo a ser atingido.

Já a matéria da revista Corpo a Corpo com a modelo da capa (Ver anexos), Luciana

Gimenez faz uma descrição significativa da beleza da apresentadora, que nos ajuda a pensar

o ideal de beleza construído pelas revistas femininas. Diz a matéria: “(...) mulherão de

pernas bem torneadas, barriga sequinha, seios firmes e curvas bem marcadas (...)” (p. 38).

Assim, o corpo trabalhado aparece como aquele que apresenta um bumbum firme e

empinado, barriga sarada, pernas firmes e bem trabalhadas.

A hegemonia do padrão estético veiculado nos meios de comunicação é representada por

mulheres jovens, brancas e magras. Tão logo aprendem a reconhecer a própria imagem no

espelho, as pessoas passam a perseguir o ideal de beleza física do momento, hoje marcado

pela cintura fina, as pernas esguias e o corpo quase esquálido (Santos e Jablonsky, 2003).

A magreza aparece como uma das exigências para se enquadrar nos padrões estéticos

ideais. Na revista Boa Forma, a matéria intitulada “Barriga chapada com 5 exercícios” (Ver

anexos) apresenta alguns exercícios para manter a barriga “sequinha”. O texto da

reportagem diz:

Dizem os filósofos que a gente não pode fazer só o que gosta. Tudo bem que fitness não é bem a praia

deles, mas quase ninguém ama fazer abdominais. Mas não dá para negar: eles são absolutamente

necessários. Tanto para você conquistar uma barriguinha seca, desenhada, linda, como para ter postura

de bailarina. (p. 32).

Page 18: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

18

Importante notar que fazer abdominais é apresentado como algo “absolutamente

necessário”. A descrição da barriga como sendo “seca, desenhada e linda” indica o modelo

de corpo ideal que deve ser buscado pelas leitoras. O famoso “pneuzinho” é sempre visto

como algo indesejado.

Na capa da revista Claudia (Ver anexos) uma das chamadas diz: “Morta de preguiça de

entrar em forma? Um programa para enxugar medidas feito para você”. Repare que o termo

“estar em forma” é utilizado como sinônimo de diminuir medidas, ou seja, estar magra. E

enxugar medidas aparece como algo já dado como um desejo das leitoras.

Mas não é só a magreza que se apresenta como um dos pré-requisitos para se encaixar no

modelo ideal de beleza. Basta percorrer as páginas das revistas e observar as modelos que

posam para as fotos. Geralmente são donas de cabelos longos, brilhosos e lisos, pernas

finas e trabalhadas, nariz pequeno, pele lisa e sem mancha, seios firmes e redondos,

bumbuns empinados e durinhos, cintura fina, barriga chapada e lábios grossos. O modelo

de beleza atinge desde as pernas e os quadris até os fios do cabelo. Nada escapa da

padronização.

A revista Nova, cuja capa traz a atriz Paola Oliveira em uma pose sensual e provocadora,

traz uma reportagem intitulada “Cabelo propaganda” (Ver anexos), em que modelos de

comerciais de xampu revelam seus segredos e dicas para manter seus cabelos sempre

“deslumbrantes”. Na reportagem, as modelos das propagandas aparecem como modelos

ideais daquilo que deve ser alcançado por todas as mulheres. Conforme apontam a

reportagem e as modelos, o cabelo ideal deve ter brilho e balanço e deve ser hidratado. Ao

contrário, não pode ser nem ressecado e nem oleoso, não pode estar danificado e nem ter

pontas duplas.

4.2. O combate

Além do padrão de beleza exaltado, a análise das publicações aponta para um outro modelo

de beleza que é demarcado como algo que deve ser superado. Assim, ao mesmo tempo em

Page 19: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

19

que é exaltado o modelo estético ideal, é também depreciado qualquer outro tipo físico que

destoe da beleza padrão. De modo que, por exemplo, se a magreza é exaltada, o excesso de

peso é depreciado. Se a barriga “sequinha” é valorizada, o mesmo não ocorre com os

chamados “pneuzinhos”. Uma das chamadas da capa da revista Boa Forma (Ver anexos)

refere-se a uma dieta “contra as gordurinhas”, em que as refeições são feitas de três em três

horas. Na reportagem, uma das recomendações para se seguir a dieta é a seguinte:

Imagine-se linda. Esse exercício ajuda a tornar realidade o que deseja. Se você concentrar na gordura

que não quer, continuará com ela. Então, se enxergue com o corpo mais enxuto, dentro de um vestido

justo. (...) Você está sorrindo, feliz da vida. Faça esse exercício de visualização todos os dias

‘enxergando-se’ sempre numa situação positiva. (p. 79).

Podemos observar, no texto, que as gordurinhas aparecem como algo indesejado. O ideal

perseguido e exaltado é a magreza. Além disso, vemos que a felicidade parece ser

diretamente relacionada à posse de um corpo mais enxuto, quando se diz: “Então, se

enxergue com o corpo mais enxuto (...). Você está sorrindo, feliz da vida”. Como diz o

texto, imaginar-se em uma situação “positiva” é imaginar-se enxuta e esbelta.

Assim, como podemos perceber, a veiculação do padrão de beleza é tão intenso, que

qualquer desvio do padrão é apontado como uma espécie de transgressão. Novaes (2004)

aponta a feiúra como uma das mais penosas formas de exclusão social. Segundo a autora,

problemas como a má aparência são concebidos como uma transgressão moral, traduzindo

um modo inadequado de relacionamento com o corpo. A obesidade é, segundo ela, uma das

mais radicais formas de exclusão. “Carregada de estereótipos depreciativos, a gordura dá

lugar a magreza, que é, então, positivada e exaltada” (Novaes, 2004:106). Ser feio, de

acordo com a autora, é justamente não ter o corpo e a estética aceitos socialmente, ou seja:

ser jovem, ser magro e ser saudável.

O surgimento de inúmeras práticas corporais e técnicas de modelagem física aparece ancorado na

mesma idéia de autonomia e auto-regulação do sujeito com relação ao eu corpo, reforçando, com isso,

um comportamento de aversão aos corpos que desviam do padrão de beleza dominante. (Novaes, 2004,

p. 16).

Page 20: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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Em todas as revistas analisadas dificilmente há uma imagem de mulher acima do peso. Ao

longo de toda a revista Corpo a Corpo, por exemplo, não há uma única imagem de mulher

acima do peso. Todas as modelos são magras e donas de uma barriga “sequinha”. A única

imagem de uma mulher acima do peso é a de Preta Gil, na sessão “Confissões de estrela – o

que as famosas pensam e fazem em nome da beleza”. A frase destacada de Preta Gil é:

“Não tem problema, eu sou mais gorda do que olho gordo”.

O vocabulário utilizado pelas revistas é ainda bastante elucidativo. A superação do corpo

que foge aos padrões estéticos ideais é tratada como uma espécie de guerra em que o

inimigo deve ser eliminado. É uma luta, um combate contra os adversários do corpo

perfeito e da beleza. As “gordurinhas” a mais são tratadas nas publicações como um

oponente que deve ser combatido e extinguido. Ao contrário, o corpo ideal aparece como

um aliado que deve ser conquistado.

Na sessão “Louca para saber” da revista Nova (Ver anexos), a matéria intitulada “Pílula

antibarriga” (Ver anexos) diz: “(...) o anúncio de um remédio que promete vencer vários

rounds na luta contra esse mal (a obesidade) moderno é mesmo motivo de comemoração”

(p. 42). Ainda no texto da matéria, faz-se referência aos conselhos de um médico dizendo

que “a fórmula mais eficaz para exterminar os pneuzinhos” é queimar as calorias

excedentes com malhação e diminuir o que se come. Expressões como “rounds na luta

contra esse mal moderno” e “exterminar os pneuzinhos” tratam o excesso de gordura na

barriga como uma espécie de inimigo da mulher, que devem ser eliminados. A superação

da gordura, por sua vez, é tratada como uma “luta” que deve ser combatida e vencida.

Assim, a análise do discurso das revistas feminas brasileiras indica que não só ocorre a

padronização do modelo ideal de beleza, ao qual as mulheres devem procurar se adequar,

como também é ocorre a padronização daquilo que deve ser combatido e superado.

Page 21: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

21

4.3. Em busca da árvore da juventude

Um aspecto interessante que mostrou-se bastante recorrente nas revistas femininas

analisadas foi a exaltação da juventude em detrimento dos efeitos da idade. A juventude

aparece constantemente como um alvo a ser alcançado pelas leitoras. Voltar no tempo é

impossível, mas prevenir e ocultar as marcas da idade é apresentado como algo necessário.

O envelhecimento é, como vimos, freqüentemente apontado como um defeito que deve ser

superado e adiado. Ao contrário, a juventude e a jovialidade são exaltadas como ideais que

devem ser perseguidos pelas mulheres. Em sua análise sobre a representação da mulher em

anúncios publicitários, Petterle (2005) afirma que “a julgar pelos incontáveis anúncios de

cosméticos capazes de suspender a passagem do tempo, pode-se pensar que, mais do que

nunca, envelhecer é vergonhoso – estar sujeito à ação do tempo é prova de

‘incompetência’” (p. 31).

A capa da revista Corpo a Corpo traz a apresentadora e modelo Luciana Gimenez. Na

legenda encontram-se os seguintes dizeres: “Mais linda do que nunca, ela revela seus

segredos para driblar os efeitos da idade”. Na matéria que a revista traz sobre a modelo da

capa, Luciana revela seus segredos de beleza. E o texto começa dizendo: (...) Aos 36 anos

de idade esbanja juventude e um corpo invejável. Não é à toa. Ela se cuida, e muito!” (p.

37). Assim, podemos perceber que o não aparentar a idade é valorizado pela matéria.

Embora tenha seus 36 anos, a apresentadora não aparenta a idade que tem, e consegue

driblar as marcas da idades. Outro exemplo de como a juventude é valorizada em

detrimento dos efeitos da idade, aprece na revista Boa Forma. A publicação traz na sessão

“Pulo da gata”, a atriz Ana Paula Tabalipa, que revela o que faz para manter seu corpo,

mesmo depois de ser mãe de dois filhos. Diz o texto: “Aos 28 anos, 48 quilos e 1. 60 metro

de altura, ela parece uma menina” (p. 24).

Na sessão “Papo de academia” um outro exemplo. A revista revela o segredo da atriz e

cantora americana Jennifer Lopez para manter seu bumbum bem empinado e firme, mesmo

depois dos 34 anos. O texto diz: “Para manter cada milímetro de suas estonteantes curvas

Page 22: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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no lugar, Jennifer Lopez malha com fé. Aos 34 anos, ela desafia a lei da gravidade ao

manter seu bumbum – avantajado, para os padrões dos Estados Unidos – firme e empinado.

O segredo é fazer exercícios localizados com carga pesada (...)” (p. 28). O esforço pessoal

aparece como pré-requisito para manter-se com o corpo “em cima” (ver capítulo) mesmo

na idade adulta. E manter-se com uma aparência jovem “desafiando até mesmo a lei da

gravidade” aparece como uma grande qualidade.

No que se refere à prevenção das marcas da idade, a reportagem com a modelo da capa da

revista Boa Forma, Isis Valverde, revela os segredos da atriz para prevenir desde já, aos 20

anos, futuros problemas com a pele. A matéria afirma: “A atriz sabe que é nova, mas, como

tem a pele sensível, optou por cuidar bem dela desde já, para prevenir manchas e rugas

(...)” (p. 68). Podemos observar que as rugas e as manchas da idade aparecem como

“inimigas” da juventude e, por isso, devem ser combatidas. A mulher que se cuida, como

parece defender a revista, deve manter-se com uma aparência jovem.

A reportagem da revista Nova, intitulada “A verdade sobre ter 30 anos”, é bastante

significativa para se pensar o modo como as revistas femininas apresentam a chegada de

alguns anos a mais de vida. A matérias traz a experiência da própria editora da revista

acerca de sua nova idade. Já no início do texto ela diz: “Ok, admito que fazer trintinha

significa 1 temer que o bumbum despenque de repente 2 achar que os pés-de-galinha vão

aparecer na festa sem ser convidados (...)” (p. 152). E ela continua:

(...) venho investigando cada centímetro do meu rosto em busca de uma dobra na pele suspeita, Aliás,

antes mesmo da inspeção, já havia adquirido meu primeiro creme anti-rugas. E mais outro para o

contorno dos olhos. Melhor me antecipar do que correr atrás do prejuízo... E, me diga, quem consegue

comer o bolo do próprio parabéns tranquilamente ao saber que o metabolismo vai ficar mais lento e....

que o jeans poderá não mais fechar? Esses fantasmas do espelho me assustam! (...). (p.152)

Pela leitura do fragmento, podemos perceber que a idade é apontada como um grande

problema, já que traz consigo rugas e uns quilos a mais. Assim, novamente neste exemplo,

vemos que, no que se refere à aparência física, a perda da juventude é apresentada como

uma grande inimiga e um problema a ser combatido. As marcas da idade, como o bumbum

Page 23: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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caído, os pés-de-galinha, as rugas e o aumento do peso devem ser evitados. Na busca pelo

padrão estético ideal, a juventude aparece como outro pré-requisito que aparece como

indispensável para manter-se bela e com o corpo perfeito. Ao contrário, os efeitos da idade

aparecem como algo que deve ser evitado. Deve-se buscar a juventude ao menos na

aparência, ou seja, faz-se necessário ocultar as marcas da idade.

4.4. Em busca de um modelo: famosas como referência do padrão de beleza

A análise das revistas aponta para um fato interessante. As famosas aparecem em inúmeras

páginas como o modelo de beleza ideal a ser buscado pelas mulheres “comuns”. Nas

páginas das revistas, elas revelam seus segredos e dicas para manterem-se belas e “em

forma”. E justamente por corporificarem o padrão ideal de perfeição que, como assinalam

as revistas, devem ser seguidas e copiadas. São, portanto, espécies de espelho que devem

servir de exemplo para as leitoras. Na revista Corpo a Corpo, a matéria intitulada “Linda,

cheirosa e gostosa”, que traz dicas de produtos de beleza, diz: “Se você acha que incorporar

esses três adjetivos na sua vida é missão impossível, está enganada! Com o arsenal de

beleza certo para o seu cabelo e sua pele, dá sim para conquistar um visual de estrela” (p.

46). Repare que o “visual de estrela” é colocado como o ideal a ser alcançado pelas leitoras.

As “estrelas” aparecem como a corporificação do padrão de perfeição a ser conquistado

pelas demais mulheres.

Ainda na mesma revista, Corpo a Corpo, a matéria intitulada “Elas são as belas da vez”,

destaca as mulheres famosas que foram eleitas em diversas categorias de beleza pelas

próprias leitoras da revista. Logo no início, a matéria, que traz os segredos de beleza dessas

famosas, diz: “(...) inspire-se nesses exemplos” (p.74). Vera Fisher é apresentada como a

“eternamente linda”, Danielle Winits como aquela dotada da “plástica perfeita”, Cláudia

Raia como a dona do “corpão em forma” e Solange Frazão como um “exemplo para a vida

inteira”. Mais uma vez os exemplos que devem inspirar as leitoras e servirem de espelho

são os das mulheres famosas, as quais representam justamente a materialização o modelo

da aparência perfeita. Basta olhar a capa das publicações para observar que as modelos são

geralmente famosas em evidência no momento, que destacam-se também por sua beleza.

Page 24: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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No interior da revistas, elas revelam o que fazem para manterem-se “em forma” e sempre

com a aparência perfeita. Na revista Corpo a Corpo, por exemplo, a apresentadora Luciana

Gimenez é a modelo da capa. Luciana é conhecida por sua beleza, inclusive faz propaganda

de um produto para emagrecimento e de outros diversos produtos de beleza. A matéria que

a Corpo a Corpo traz com ela no interior da publicação diz: “Confira os segredos, truques e

fraquezas (sim, elas as tem) dessa beldade que por onde passa desvia os olhares para si.

Também pudera...” (p.38). Assim, é como se a revelação das fraquezas, truques e segredos

servissem de espelho para que as leitoras pudessem, assim como a famosa, tornar-se bela e

dona de um corpo perfeito.

Já na revista Claudia, a modelo da capa é a jornalista de televisão Renata Vasconcellos, que

é chamada de “a bela das manhãs” pela revista. Na reportagem no interior da publicação,

Renata revela quais as marcas de cosméticos que prefere e como faz para manter o seu

corpo. Do mesmo modo, a revista Nova traz na capa a atriz Paola Oliveira, na época ela

atuava como protagonista de uma das novelas da Rede Globo. Dentro da revista, a atriz fala

do que faz para se cuidar de seu corpo e revela que fez uma lipo nas coxas que a deixou

bastante satisfeita. Assim, tanto Paola, quanto Renata revelam o que fazem para manter-se

segundo os padrões de beleza, revelam os caminhos que percorreram a fim de alcançar o

padrão ideal de beleza.

A revista Boa Forma traz na capa a atriz Isis Valverde. Na reportagem com Isis (Ver

anexos) são apresentados os segredos da atriz para manter-se “bela” e “em forma”. Ela

revela, por exemplo, seu cardápio, seus segredos de malhação e seu tratamento para a pele.

Isis parece ser apresentada como um modelo ideal a ser perseguido. Seus segredos são

revelados para que sirvam de exemplo para que as leitoras, assim com ela, possam

conquistar o corpo ideal e a beleza perfeita.

As dicas, receitas e truques das famosas estão por toda a revista. Desde o tratamento para o

fio de cabelos até o cardápio, quase todos os segredos são revelados para as leitoras. Os

exemplos são inúmeros. A revista Boa Forma traz na sessão “olho mágico” famosas

revelando seus segredos para aumentar seu pique na hora de malhar. Já na sessão “Fio

Maravilha” da revista Corpo a Corpo é revelado o segredo de atrizes, como Débora Secco e

Page 25: A construção de um padrão estético ideal em revistas femininas

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Camila Pitanga, para recuperar a saúde de seus cabelos. Assim, como dito anteriormente, as

artistas são apontadas como as mulheres que por excelência materializam de algum modo

os arquétipos da aparência perfeita e, por isso, devem ser vistas como o alvo a ser atingido:

é com elas que deve-se parecer.

4.5. Esforço pessoal e responsabilidade do indivíduo: basta querer!

Basta folhear as revistas femininas para perceber que a mensagem transmitida encoraja as

leitoras a acreditar que elas podem, assim com as estrelas e modelos, ser belas, atraentes e

alcançar o corpo perfeito; é só querer. As técnicas, dicas e truques de beleza são inúmeros

e, portanto, basta a mulher se esforçar para conquistar a aparência desejada. Só não fica

bonita quem é relaxada, quem não se cuida e quem não quer.

A preocupação com a aparência, como afirma Novaes (2001) não é um fenômeno atual.

Entretanto, se historicamente as pessoas sempre se preocuparam com a aparência, hoje elas

são responsáveis por ela. Se no passado a natureza podia ser culpada, hoje a culpa recai

sobre o próprio indivíduo. A multiplicação das técnicas corporais e a difusão cada vez

maior de modelos de beleza provocaram uma pressão ainda maior. O sujeito é agora

responsável por moldar o seu próprio corpo. Sua beleza e aparência são vistas como um

dever e uma responsabilidade própria.

A matéria da revista Corpo a Corpo com a modelo da capa, Luciana Gimenez, diz: (...)

como toda mulher vaidosa, Luciana se cuida e não mede esforços para exibir-se l-i-n-d-a de

morrer” (p.38). Na mesma reportagem é evidenciado que a atriz mantém sua beleza por

meio de seu esforço próprio: “(...) ela malha, e muito!” (p. 38). E a reportagem frisa ainda:

“(...) A pele de menina, sem um sinal do tempo, olheiras ou manchas é resultado de seu

estilo de vida” (p. 40). Assim, a reportagem parece apontar para o fato de que é por meio de

um trabalho árduo que Luciana consegue manter-se em forma. O que pode significar que,

assim como ela, as leitoras também podem tornar-se belas, basta querer e se esforçar.

A reportagem da revista Boa Forma, intitulada “Cynthia Howleet: Beleza em dobro”

também apresenta um exemplo de como o esforço pessoal na busca pela aparência perfeita

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é ressaltado como algo indispensável. A matéria diz: “Grávida, a apresentadora está mais

bonita do que nunca. E não é para menos: ela pega firme nos exercícios e capricha na

alimentação. Assim é que se chega lá. Anote a receita” (p. 80). Veja que “pegar firme nos

exercícios” é o que garante que ela mantenha o seu corpo “no lugar”.

Além do esforço pessoal ser apontado como um pré-requisito para torna-se bela, é também

afirmado constantemente que é uma questão de vontade e responsabilidade própria manter-

se atraente. A beleza ideal pode ser conquistada, é só seguir rigorosamente as receitas e

dicas da revista. Basta desejar e se esforçar que se alcançará o corpo ideal e a beleza

perfeita. Uma das principais chamadas, em destaque, da capa da revista Nova é intitulada

“Beleza já!”. Logo abaixo tópicos a respeito do tema: “a nova pílula antibarriga”, “injeção

que paralisa as rugas pela metade do preço” e “segredos das modelos dos comerciais de

xampu” Abaixo dos tópicos os seguintes dizeres: “É ler e arrasar corações”. O título

“beleza já” parece evidenciar que basta querer para alcançar a beleza ideal: é só seguir as

dicas da revista, é só “ler para arrasar corações!”.

Além disso, o discurso parece afirmar que toda e qualquer mulher pode tornar-se bela, basta

desejar e se esforçar. Em todas as revistas pesquisadas, por exemplo, há uma sessão em que

mulheres comuns passam por uma transformação na aparência. No caso da revista Corpo a

Corpo, a matéria “Mudei e arrasei!” apresenta a mudança de seis leitoras. Na revista

Claudia há uma sessão intitulada “De visual novo”, em que uma personagem comum passa

por alterações. Na sessão “Banho de nova” da revista Nova, uma pessoa comum é

modificada por profissionais da área da beleza. A mensagem para as leitoras parece ser:

você pode, basta ter em mãos os produtos certos, esforçar-se e querer.

Assim, o discurso tconstruído pelas revistas parece afirmar que basta esforçar-se para

conquistar a beleza ideal. Estar feia é visto como responsabilidade do próprio indivíduo. O

indivíduo é responsável por conquistar o corpo perfeito e a aparência ideal. É ele o culpado

por ser desleixado e descuidoso com sua aparência física. A beleza e a aparência são vistas

como responsabilidade do próprio indivíduo, que só não fica bonito se não quiser.

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4.6. Imediatismo: você pode e pode imediatamente

Um aspecto que ficou evidenciado por meio da análise das revistas femininas foi a questão

do imediatismo. A idéia é de que é possível atingir o ideal de beleza rapidamente. Já na

capa das revistas, é possível observar que a aparência física ideal é prometida de forma

imediata, basta querer. A chamada de maior evidência da capa da revista Corpo a Corpo

anuncia curvas “poderosas” em apenas dois meses. Outra promessa da capa, que refere-se a

uma matéria intitulada “Dieta das horas”, que apresenta que alimentar-se em certos

intervalos de tempo é o grande segredo para se perder peso, diz: “1 kg a cada 7 dias sem

fazer dieta”. Assim, como anuncia à revista, é possível perder os quilinhos indesejados em

poucos dias e sem grandes sacrifícios.

Outro exemplo do imediatismo está na capa da revista Boa Forma. Logo de início, é

prometida a diminuição de um número do manequim em quinze dias. Dentro da revistas, a

matéria traz exercícios de caminhada que “ajudam a dar adeus a 3 quilos em 15 dias” (p.

109). O subtítulo da matéria anuncia: “Sabe aquele jeans que você ama, mas emperra nos

quadris? Ele vai voltar a cair como uma luva no seu corpinho em 15 dias. A receita está a

seus pés” (p. 109). Como podemos observar, a receita milagrosa está dada. Basta fazer os

exercícios que imediatamente os “quilos a mais” serão eliminados.

Atualmente, como apresenta Novaes (2001), vivemos em alguns contextos sociais

brasileiros em sociedades imediatistas. Há uma promessa e uma exigência de conquista da

satisfação de maneira imediata. E, no que se refere ao uso do corpo, os efeitos de tal

exigência imediatista é que, na busca por uma sensação de prazer e auto-estima, recorre-se

freqüentemente a soluções milagrosas. Assim, o uso de anabolizantes acelera o lento

processo de preparação física em academias, pílulas garantem a modelagem do corpo de

modo mais rápido, eficiente e sem sacrifícios.

Na matéria presente no interior da revista Claudia traz, intitulada “Ginástica para quem

odeia ginástica”, fica evidenciada a promessa de resultados rápidos: “(...) montamos

programas sob medida para você escolher: suar bastante por apenas 15 minutos; exercitar-

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se com diversão em menos de 45 minutos (...)”. A matéria apresenta diversos equipamentos

como sendo o treinamento das estrelas (ver capítulo). Um aparelho é apresentado como o

“preferido da apresentadora Angélica”, o outro, por exemplo, é apontado como o

“queridinho da cantora Madonna”, e promete transformar o corpo rapidamente: apenas

quinze minutos de exercício garantem o mesmo resultado de uma hora de malhação em

aparelhos convencionais.

Outro exemplo significativo pode ser encontrado na sessão “Louca para saber” da revista

Nova. A matéria intitulada “Pílula antibarriga” traz uma nova descoberta a respeito de um

medicamento que é capaz de reduzir a gordura localizada no abdômen. A reportagem diz:

“(...) a novidade promove a perda de até 8 centímetros da gordura abdominal em menos de

um ano. É um número expressivo” (p. 42).

Assim, como aponta Novaes (2004), a cultura contemporânea apresenta a conquista da

satisfação de maneira imediata. Segundo a autora, a mídia-cultura parece estar sempre

afirmando: você pode, e pode imediatamente. Por meio dos exemplos dados, é possível

notar que a promessa da beleza traz consigo a promessa de um resultado imediato e sem

grandes sacrifícios. A mensagem passada pela leitora parece ser: é possível ficar bonita e

rapidamente, basta querer.

Considerações Finais

Os veículos de comunicação afirmam que cuidar do corpo é indispensável. A beleza é

apresentada como um caminho legítimo e seguro para a felicidade individual (Novaes,

2004). Revistas especializadas, por exemplo, de saúde à moda, apresentam, qual o corpo

que se deve ter e desejar, como atingir este ideal e como utilizá-lo da forma mais eficaz. O

corpo passou a ser uma espécie de passaporte para a felicidade, bem-estar e realização

pessoal. A imagem que os meios de comunicação oferecem para o público a respeito de

seus próprios corpos opera na construção da auto-estima e da auto-imagem, como defende

Novaes (2004).

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29

As práticas corporais atuais, segundo Novaes (2001), podem forjar “um determinado tipo

de subjetividade, onde o sujeito vê-se, freqüentemente, infeliz e incompetente, por estar em

dissonância com os modelos propostos em termos da estética corporal atual” (p. 67). A

autora cita uma pesquisa publicada no jornal “O Globo” (21/05/2000). O resultado do

estudo pode apontar que 98% da população investigada - 1197 estudantes universitários-,

demonstrava-se insatisfeita com o próprio corpo.

A hegemonia do padrão estético veiculado nos meios de comunicação, representado por

mulheres jovens, brancas e magras e homens musculosos pode gerar, segundo Santos e

Jablonsky (2003), sentimento de inferioridade em mulheres e homens que não se

enquadram nesse padrão de beleza exposto pela cultura de massa. Santos e Jablonsky

(2003) enfatizam ainda o surgimento de sentimentos de inadequação e baixa auto-estima

corporal em função de comparações com os padrões de estética repetidamente explicitados

nos meios de comunicação.

Entretanto, para se saber mais sobre os efeitos das revistas femininas em mulheres

brasileiras, é preciso realizar estudos sobre como as mulheres são afetadas por estas

revistas. Talvez seja muito simplista afirmar que os meios de comunicação são os

responsáveis por frustrar as mulheres e criar sentimentos de inadequação e baixa auto-

estima. Os meios de comunicação, é preciso lembrar, constroem, mas também reinforçam e

reproduzem modos de pensar e agir culturais já existentes nos contextos sociais. Além

disso, é preciso ter em mente o fato de que as mulheres, como todas as pessoas, podem

responder de maneira diversa ao mesmo conteúdo midiático, dependendo de suas

experiências pessoais e sua bagagem cultural. É preciso ainda considerar o fato de que as

mulheres são uma audiência ativa e, como tal, são capazes de criticar e negociar os

significados dos conteúdos midiáticos.

A análise das revistas femininas realizadas neste estudo que parece existir um padrão de

beleza ideal exaltado e, do mesmo modo, um outro modelo de beleza que é demarcado

como algo que deve ser superado. A análise das publicações aponta para a existência de um

modelo estético ideal a ser alcançado pelas leitoras.

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Um aspecto interessante que mostrou-se bastante recorrente nas revistas femininas

analisadas foi a exaltação da juventude em detrimento dos efeitos da idade. A juventude

aparece constantemente como um alvo a ser alcançado pelas leitoras. Voltar no tempo é

impossível, mas prevenir e ocultar as marcas da idade é apresentado como algo necessário.

A análise das revistas aponta ainda para um fato bastante revelador. As famosas aparecem

em inúmeras páginas como o modelo de beleza ideal a ser buscado pelas mulheres

“comuns”. Nas páginas das revistas, elas revelam seus segredos e dicas para manterem-se

belas e “em forma”. E justamente por corporificarem o padrão ideal de perfeição que, como

assinalam as revistas, devem ser seguidas e copiadas. São, portanto, espécies de espelho

que devem servir de exemplo para as leitoras.

Outro aspecto interessante revelado pela análise do discurso das revistas é que a mensagem

transmitida encoraja as leitoras a acreditar que elas podem, assim com as estrelas e

modelos, ser belas, atraentes e alcançar o corpo perfeito; é só querer. As técnicas, dicas e

truques de beleza são inúmeros e, portanto, basta a mulher se esforçar para conquistar a

aparência desejada. Só não fica bonita quem é relaxada, quem não se cuida e quem não

quer.

Além do esforço pessoal ser apontado como um pré-requisito para torna-se bela, é também

afirmado constantemente que é uma questão de vontade e responsabilidade própria manter-

se atraente. A beleza ideal pode ser conquistada, é só seguir rigorosamente as receitas e

dicas da revista. Basta desejar e se esforçar que se alcançará o corpo ideal e a beleza

perfeita.

Assim, o discurso transmitido parece afirmar que basta esforçar-se para conquistar a beleza

ideal. Estar feia é visto como responsabilidade do próprio indivíduo. O indivíduo é

responsável por conquistar o corpo perfeito e a aparência ideal. É ele o culpado por ser

desleixado e descuidoso com sua aparência física. A beleza e a aparência são vistas como

responsabilidade do próprio indivíduo, que só não fica bonito se não quiser.

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Um aspecto que ficou evidenciado por meio da análise das revistas femininas foi a questão

do imediatismo. A idéia é de que é possível atingir o ideal de beleza rapidamente. A

promessa de que se pode alcançar a beleza ideal traz consigo a promessa de um resultado

imediato e sem grandes sacrifícios. A mensagem passada pela leitora parece ser: é possível

ficar bonita e rapidamente, basta querer.

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