a comunicaÇÃo humana em hipnosec*) · a hipnose considerada como uma forma de conduta...

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A COMUNICAÇÃO HUMANA EM HIPNOSEC*) DR. MIGUEL RENDON BLANCO(**) A comunicação é a transmissão de pensamentos, sentimentos e estados voliU vos, sem transporte efetivo de material, de um indivTduo a outro, de um individuo a um grupo, do grupo ao sujeito, do ambiente ao humano ou vice-versa. A hipnose considerada como uma forma de conduta hêtero-sugerida, auto-suge rida, fundamentalmente por estímulos psicológicos, estabelece uma forma especial comunicação. 0 homem se comunica com seu mundo circundante ãs expensas de seus órgãos sensitivos, sensoriais e suas respostas psicomotoras, em íntima relação com seus aprendizados prévios: cada estimulo exteroceptivo, interoceptivo e proprioceptivo marca uma impressão mnésica que terá diferente gradiente de retenção segundo o im pacto afetivo, para a integridade psicobiológica, existência e conservação do indT vTduo. Toda conduta está sujeita aos aprendizados prévios durante o desenvolvimen- to e interação dosujeito e as características de comunicações vivenciais, em base de sua constituição. No campo da biologia molecular, os descobrimentos crescentes começam a es- clarecer de forma prodigiosa a fenomenologia psicoquTmica do cérebro e do sistema nervoso, desvendando pouco a pouco os enigmas do estado consciente, da memória, do aprendizado e do sono, entre outros processos mentais. Estes conhecimentos levam a novos horizontes na compreenção e comunicação com os doentes mentais, a codificação bioquímica formada pelas gigantescas molecu las de A.D.N., que determinara o "Padrão Mental", sustentando-se a hipótese atuali- zada de que o ADN não só especifica a estrutura do cérebro, como também regula di- reta ou indiretamente, todos os processos de atividades mentais, mediante um códi- go molecular que algum dia o homem logrará dominar. No sistema nervoso, a unidade desde o ponto de vista fisiológico, neuro- nal, possui uma organização genicocromossômica, rnacromolecular enzimática e eletrõ nica específicas e próprias de cada tipo de neuronio. No neuronio reside o poten - ciai gênico do ser histórico, que se manifesta como ser anímico, que 'Tõrma em re- lação com suas aquisições culturais, relacionadas com as diferentes formas de comu nicação, a integração do conceito de humano, como "Unidade Bio-Psico, Histórica,So ciai, Têmporo-espacial". Os ácidos ADN e ARN devem intervir em todas as funções superiores do cére- bro. HYDÉN descobriu que, ao estimular experimentalmente o cérebro com algum exer cio de aprendizagem (comunicação de conhecimentos), aumenta a produção de ARNe uma porção deste teria diferente sequência básica ou composição química ã de outro ARN achado em neurónios de animais de experimentação aos quais não se haviam treinado previamente. Tem-se estabelecido a hipótese de que os impulsos sensitivos-sensoriais iri duzem a ativaçao do ADN do neuronio, de gens recessivos que produzem um novo ARN, ou frações de ARN, que, por sua vez, determinam a integração das proteínas ou subs tãncias transmissoras específicas necessárias para armazenar e reproduzir um apreH dizado que tenha sido previamente comunicado. (*) Trabalho apresentado no IV9 Congresso Panamericano de Hipnologia e Medicina Psicossomática. Rio de Janeiro, agosto de 1973. (**) O autor é renomado hipnólogo do México. - 41 -

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Page 1: A COMUNICAÇÃO HUMANA EM HIPNOSEC*) · A hipnose considerada como uma forma de conduta hêtero-sugerida, ... parte de nossa vida cotidiana, sendo necessário o contato físico, torcar-seas

A COMUNICAÇÃO HUMANA EM HIPNOSEC*) DR. MIGUEL RENDON BLANCO(**)

A comunicação é a transmissão de pensamentos, sentimentos e estados voliU vos, sem transporte efetivo de material, de um indivTduo a outro, de um individuo a um grupo, do grupo ao sujeito, do ambiente ao humano ou vice-versa.

A hipnose considerada como uma forma de conduta h ê t e r o - s u g e r i d a , auto-suge rida, fundamentalmente por estímulos p s i c o l ó g i c o s , estabelece uma forma especial dê comunicação.

0 homem se comunica com seu mundo circundante ãs expensas de seus órgãos sensitivos, sensoriais e suas respostas psicomotoras, em íntima r e l a ç ã o com seus aprendizados p r é v i o s : cada estimulo exteroceptivo, interoceptivo e proprioceptivo marca uma impressão mnésica que terá diferente gradiente de retenção segundo o im pacto afetivo, para a integridade p s i c o b i o l ó g i c a , e x i s t ê n c i a e conservação do indT vTduo. Toda conduta está sujeita aos aprendizados p r é v i o s durante o desenvolvimen­to e interação dosujeito e as c a r a c t e r í s t i c a s de comunicações vivenciais, em base de sua c o n s t i t u i ç ã o .

No campo da biologia molecular, os descobrimentos crescentes começam a es­clarecer de forma prodigiosa a fenomenologia psicoquTmica do cérebro e do sistema nervoso, desvendando pouco a pouco os enigmas do estado consciente, da memória, do aprendizado e do sono, entre outros processos mentais.

Estes conhecimentos levam a novos horizontes na compreenção e comunicação com os doentes mentais, a codif icação bioquímica formada pelas gigantescas molecu las de A.D.N., que determinara o "Padrão Mental", sustentando-se a h i p ó t e s e atuali-zada de que o ADN não só especifica a estrutura do c é r e b r o , como também regula di-reta ou indiretamente, todos os processos de atividades mentais, mediante um c ó d i ­go molecular que algum dia o homem l o g r a r á dominar.

No sistema nervoso, a unidade desde o ponto de vista f i s i o l ó g i c o , neuro­nal, possui uma organização genicocromossômica, rnacromolecular enzimática e e l e t r õ nica e s p e c í f i c a s e própr ias de cada tipo de neuronio. No neuronio reside o poten -ciai gênico do ser h i s t ó r i c o , que se manifesta como ser anímico, que 'Tõrma em re­lação com suas aquisições culturais, relacionadas com as diferentes formas de comu nicação, a integração do conceito de humano, como "Unidade Bio-Psico, H i s t ó r i c a , S o ciai, Têmporo-espacial".

Os ácidos ADN e ARN devem intervir em todas as funções superiores do c é r e ­bro. HYDÉN descobriu que, ao estimular experimentalmente o cérebro com algum exer cio de aprendizagem (comunicação de conhecimentos), aumenta a produção de ARNe uma porção deste teria diferente sequência básica ou composição química ã de outro ARN achado em neurónios de animais de experimentação aos quais não se haviam treinado previamente.

Tem-se estabelecido a hipótese de que os impulsos sensitivos-sensoriais iri duzem a ativaçao do ADN do neuronio, de gens recessivos que produzem um novo ARN, ou frações de ARN, que, por sua vez, determinam a integração das p r o t e í n a s ou subs tãncias transmissoras e s p e c í f i c a s necessárias para armazenar e reproduzir um apreH dizado que tenha sido previamente comunicado.

(*) Trabalho apresentado no IV9 Congresso Panamericano de Hipnologia e Medicina Psicossomática. Rio de Janeiro, agosto de 1973.

(**) O autor é renomado hipnólogo do México.

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O homem se comunica através da linguagem, a linguagem em qualquer sistema decomuni cação entre seres, mediante símbolos convencionais, podendo ser linguagem p r é - v e r b a l (atitudes que comunicam afeto), linguagem verbal ( p a l a v r a s , g u t u r a ç õ e s ) , linguagem simból ica (símbolos e sinais falados e escritos), não tendo relação o símbolo com o fato, linguagem gesticulada ou icônica (mímica em relação com a ação, objeto e fato).

A comunicação é um processo eminentemente sensitivo-sensorial de percepção e configurativo de expressão. Segue os traçados gerais do esquema:

Estímulo + organismo •+ resposta. A comunicação relaciona o homem com o mundo exterior e interior, e permite

adaptar-se ao meio e ser congruente com a realidade, o que se traduz em uma condu­ta sa (saúde mental).

As primitivas tribos humanas aprenderam a emitir sons inarticulados, a ges_ ticular, a estabelecer rudimentãrios signos e sinais que lhe permitiram estabele­cer formas de comunicação.

í medida que o homem evolui na escala de i n t e l i g ê n c i a , a linguagem se de­senvolve paralelamente ã sua i n t e l i g ê n c i a , convertendo-se no meio principal de en­tendimento e v i n c u l a ç ã o inter-humana. As palavras sao s i m b ó l i c a s , e as que mais fa cilmente podem ser falsas, portanto nosso principal meio de comunicação nao é o mais efetivo para compreender os nossos congéneres, sao as atitudes com matiz afe-tivo as mais determinantes para a compreensão humana, projetando-se o "Eu", conju-gando-se em processo r e c í p r o c o de t r a n s f e r ê n c i a .

A tendência de ir mais além da comunicação verbal e m a n i f e s t ã - l a em ação é parte de nossa vida cotidiana, sendo necessário o contato f í s i c o , torcar-seas mãos, sentar-se junto, ver-se com i n s i s t ê n c i a , etc...

Desde a vida p r é - v e r b a l , a cr iança se encontra com essa micro-sociedadeque é a c é l u l a da mesma sociedade, "a f a m í l i a " , uma f a m í l i a que pode estar bem estrutu rada se existe entre eles uma boa comunicação, crescendo a cr iança em ambiente de t o l e r â n c i a e compreensão, desenvolvendo-se em um encontro contínuo com ele mesmo e seus semelhantes, através deaprendizados cheios de e x p e r i ê n c i a s positivas, que o formarão como um i n d i v í d u o sao e ú t i l a comunidade, estabelecendo os mecanismos po sitivosde integração social e de comunicação s a t i s f a t ó r i a para o intento de sua adaptação social.

A comunicação entre os i n d i v í d u o s tem como objetivo aparente conhecer-semu tuamente e, como finalidade real, o tratar de conhecer a si mesmo.

A pedra angular da comunicação é a interação espontânea entre os membros de uma f a m í l i a , de um grupo,_da sociedade, dos povos, das nações, para chegar ao en­contro do entendimento e ã c o n v i v ê n c i a p a c í f i c a cujo denominador comum deve ser o amor.

A hipnose é uma forma de conduta induzida, o estado dinâmico emocional do transe h i p n ó t i c o pode ser referido, considerando a transformação t r a n s i t ó r i a e subs_ tancial do sujeito vivida como realidade, a consequência da estimulação de engra -mas a t r a v é s da palavra intencional, com finalidade a n a l í t i c a do médico operante.To da sugestão aceita durante a hipnose tem um valor positivo de apoio e reestrutura­ção da personalidade, ao estabelecer reaprendizagem de linhas de condutas passadas, que foram deteriorastes ao bom desenvolvimento da personalidade; durante a hipnose se estabelece uma comunicação entre o medico e paciente, que permite evitar a. re­s i s t ê n c i a em v i g í l i a e, ademais, por atuar em estado de fase neuro-funcional, em que a mente esta concentrada e polarizada nas ideias, sentimentos e estados voliti­vos sugeridos, sendo a porta de entrada ã pessoa profunda, o que nos permite encon trar os fatores inconscientes da conduta n e u r ó t i c a , produto das aprendizagens nega tivas, devido a comunicações t raumáticas, experimentais, particularmente na primeT

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ra etapa de nossa e x i s t ê n c i a . Para alcançar os p r o p ó s i t o s terapêuticos durante o estado h i p n ó t i c o , é ne­

c e s s á r i o fixar a atenção espontânea do sujeito, que é a que vai matizada de efeti-vidade e é um meio para obter os fins desejados, conseguir um bom relaxamento mus­cular. E conhecido e aceito que o individuo tem consciência do tempo, lugar, pos­tura e espaço, percebendo os limites do "Ego", graças ao tonus muscular. Se este diminui através do relaxamento muscular sugerido, a informação proprioceptiva se vai apagando e o sujeito pode experimentar a v i v ê n c i a oceânica de FREUD e as modi­ficações da realidade entre o_"Ego", o mundo exterior e o organismo em relação ao ser, estando a atenção espontânea ligada por prazer-desprazer, c o n f i a n ç a - s u b o r d i n a ção, segurança-temor, colaboração-obediência, etc.

Conforme a personalidade do paciente, haverá imperiosa necessidade de o r i e £ tar conscientemente nossa conduta para uma atitude positiva de absoluta compreen -são, e de estarmos advertidos quanto â convicção pessoal do respeito ã personali­dade do sujeito, estabelecendo o "rapport" adequado para o manuseio do paciente,evi^ tando a dependência do mesmo, devendo-se sentir apoiado pelos mecanismos da fixa -ção da atenção espontânea, concentrada nas sugestões de relaxamento muscular,haven do uma i n t e r i o r i z a ç ã o do operador (o hipnotista), "Engulfing", o que determina que o sujeito hipnotizado viva e aceite as sugestões como se fossem sugeridas por ele mesmo.

E decisivo termos estabelecido uma comunicação s a t i s f a t ó r i a , que nos permi ta que o sujeito possa viver suas exper iências traumáticas passadas com a maior in tensidade emocional, mobilize seus engramas (regressão) e estabeleça modificações estruturais anímicas, congruentes com o ambiente (reaprendizagens).E se tratarmos de explicar, a n í v e l bioquímico ou b i o e l é t r i c o de fisiologia cerebral, as trocas sucedidas no sujeito em questão, apoiaríamos nosso c r i t é r i o h i p o t é t i c o , nas trocas dos circuitos e l ê t r i c o s estabelecidos como memórias ou nas modif icações das ca­deias de ARN que se registram sob a forma de esquemas memorativos, sendo a memória a base da elaboração de pensamentos, afetos e estados volitivos, permitindo u t i l i ­zar o passado (aprendizagens por comunicação) como base da conduta presente e pro-jetar-se até o futuro.

HÃMBERGER e HYDEN (1961), MORREL (1961) e MAMO {1962)demonstraram que o fe nômeno de armazenagem se leva a efeito ao n í v e l do hipocampo, mediante um processo químico enzimático intercelular, no qual intervêm o ARN, suporte gênicocromossomi-co; a memorização f í s i c a desencadeia um processo de c o d i f i c a ç ã o do ARN (ácido ribo nucleico), que também se armazena para a memória imediata a n í v e l do neocõrtex bi-temporal, intervindo o neocõrtex p r é - f r o n t a l como ativador e s p e c í f i c o e de acordo com HASHLEY (1960), todo o neocõrtex.

Se recordarmos o modelo p s i c o l ó g i c o de: Estímulo -»• organismo + resposta de conduta

A hipnose ê o meio- facilitador através da regressão a n a l í t i c a do estado de hipersugestibilidade, hipermnésia e reforçamento do Ego, capaz de modificar os aprendizados comunicados durante o desenvolvimento do sujeito, em forma positiva, estabelecendo nova forma de conduta, mais s a u d á v e l , que permite ao paciente a ada£ tacão ao ambiente e ã congruência com a realidade, ficando agora o esquema modifi­cado na forma seguinte:

Estímulo •* organismo •* „ , _ „ « . , , A n „ „ „ J , I 4 . , resposta de conduta. Hi pno terapia •* r

A e x p e r i ê n c i a e o número de r e f e r ê n c i a s cada dia mais demonstrativas dos resultados curativos alcançados com a hipnoterapia me permitem concluir que:

A) A hipnose médica é uma metodologia t e r a p ê u t i c a fundamentada cientifica­mente.

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B) Que a conduta I o resultado dos aprendizados comunicados durante toda a evolução do individuo, interpretados segundo fatores constitucionais, temperamen tais e ambientais.

C) Que os aprendizados ficam memorizados no neocõrtex e hipocampo, ao ni-vel bioquímico do ARN.

D) Ao revi venci ar as e x p e r i ê n c i a s p r é v i a s , em forma afetiva a n a l í t i c a , se estabelecem novos aprendizados ou modificaçoes deles, que permitem ao sujeito con­duta adaptativa e controle da realidade.

* * * - RESUME -

1'auteur considere que 1 'hypnose é t a b l i t une forme s p é c i a l e de communication, que "la communication est un processus éminemment sensitif-sensoriel de perception et configuratif d'expression". II informe que durant 1'hypnose i l s ' é t a b l i t une communication entre le médecin et le patient, permettant é v i t e r la rés'istance qui survient en ê t a t de veille. II dit qu'i1 est important d ' é t a b l i r une communication satlsfactoire, permettant que le sujet puisse vivre ses expériences traumatiques passées avec le maximum d ' i n t e n s i t é é m o t i o n n e l l e .

* * *

- SUMMARY -

The author states that hypnosis establishes a special modeof communication; that "communication is an eminently sensitive-sensorial process of perception and representative of expression". He informs that during hypnosis communication between the doctor and the patient is established, allowing to come around resis-tance, common during vigi 1 state. He asserts the importance of a satisfactory communication to enable the patient to "live" his or her past traumatic expériences with maximum emotional intensity.

* * *

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