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A compreensão da real importância de toda a obra de Galileu e, de modo particular, de suas observações astronômicas em 1609, tem como pressuposto o conhecimento da ciência e da filosofia na época de Galileu.
Não podemos avaliar devidamente a grande contribuição galileana para a nova concepção de mundo dos séculos XVI e
XVII sem nos reportarmos ao pensamento pré-galileano.
Galileu nasceu mais de vinte anos após a morte de Copérnico.
Copérnico retomou depois de quase dois mil anos a hipótese
revolucionária do antigo grego Aristarco de Samos:
O Sol está no centro do universo e a Terra possui dois movimentos: o movimento de rotação em torno de seu próprio eixo em 24 horas e
o movimento de translação em torno do Sol, completando uma
volta em 365 dias.
Nicolau Copérnico(1473 – 1543)
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1564 – Nascimento
1589 – Prof. da Universidade de Pisa
1592 – Prof. da Universidade de Pádua
1610 - Mensagem das Estrelas
1616 - Primeira condenação pela Santa Inquisição
1623 – O Ensaiador dedicado também ao seu admirador, Papa Urbano VIII
1632 - Diálogos sobre os Dois Máximos Sistemas do Mundo
1633 - Segunda condenação pela Santa Inquisição
1638 - Discurso e Demonstrações sobre Duas Novas Ciências
1642 - Morte
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Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.)
Filósofo grego, aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande, é
considerado um dos maiores pensadores de todos os tempos.
São Tomás de Aquino (1225 – 1274)
Frade dominicano, teólogo, proclamado santo e cognominado Doctor
Communis ou Doctor Angelicus pela Igreja Católica .
São Tomás de Aquino “cristianizou” Aristóteles, isto é, fez a síntese do cristianismo com a visão aristotélica do mundo mas rejeitou o materialismo
aristotélico.
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-Mundos sublunar (Terra) e supralunar (céus).
- Aqui embaixo é diferente dos céus. Portanto há uma Física sublunar e outra supralunar.
-As coisas aqui embaixo são constituídas por Quatro Essências - terra, água, ar e fogo - sendo as duas primeiras “graves”
(pesadas) e as duas últimas “leves”.
- Os corpos celestes são constituídos pela Quinta Essência que é incorruptível e
perene.
- A Matemática somente pode ser aplicada aos céus pois esses são
perfeitos e incorruptíveis.
Não é possível uma Física matematizada para o mundo
abaixo da Lua.
- A mais sofisticada forma de explicação científica é a explicação finalista ou teleológica, isto é, a explicação deve indicar o objetivo que a
coisa ou o processo persegue.
Exemplo:
Os corpos graves ou pesados caem pois esse processo os leva ao seu LUGAR NATURAL que é embaixo, o mais perto possível do centro do
universo.
Sistema geocêntrico de Ptolomeu (140 d.C.)
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A teoria dos planetas de Ptolomeu, desenvolvida no Almagesto, atingiu
um grande grau de sofisticação matemática (geométrica) com o
objetivo de “salvar as aparências”, isto é, descrever com precisão os
movimentos planetários.
A figura representa a órbita de Vênus. Nota-se que a Terra não está
no centro do deferente de Vênus (excêntrico). Adicionalmente o
deferente de Vênus não se move com velocidade angular constante
em relação ao seu centro. A velocidade angular é constante em
relação a um outro ponto, o equante.
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A grande revolução científica dos séculos
XVI e XVII foi possível a partir de uma mudança radical e revolucionária nas concepções sobre a posição da Terra no
Universo. Nicolau Copérnico (1473 –
1543) retirou a Terra do centro do Universo, colocando o Sol no
centro.
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No meio de todos os assentos, o Sol está
no trono. Neste belíssimo templo poderíamos nós
colocar esta luminária noutra posição melhor de onde ela iluminasse
tudo ao mesmo tempo?
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Chamaram-lhe corretamente a Lâmpada, o Mente, o
Governador do Universo; Hermes Trimegisto chama-lhe o Deus Visível, a Electra
de Sófocles chama-lhe O que vê tudo. Assim, o Sol senta-se como num trono real governando os seus filhos, os planetas que
giram à volta dele.Copérnico (1543)
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Em primeiro lugar, a menos que talvez um cego possa negá-lo perante ti, dentre todos
os corpos do universo o mais notável é o Sol, cuja essência integral nada mais é que a mais pura das luzes que pode existir em qualquer
estrela; que é por si só, o produtor, conservador e aquecedor de todas as coisas;
é uma fonte de luz, rico em frutífero calor, absolutamente claro, límpido e puro para a vista, a fonte da visão, pintor de todas as cores, denominado rei dos planetas (...)
(...) por seu poder, olho do mundo; por sua beleza, único que podemos considerar
merecedor do Deus Altíssimo.
Pois se os germânicos elegem como César o que tem o poder máximo em todo o império,
quem hesitaria em conferir votos dos movimentos celestes àquele que já vem
administrando todos os demais movimentos e mudanças por graça da luz, que é a sua posse
exclusiva?
Portanto, como não é próprio ao criador difundir-se em uma órbita,
mas antes, proceder a partir de um certo princípio, nenhuma parte do mundo e nenhuma estrela é merecedora de tão
grande honra; então, pelas razões mais elevadas, voltamos ao Sol, o único que parece, em virtude de sua dignidade e poder, adequado a essa missão motora e digno de
tornar-se a morada do próprio Deus.
Kepler - 1593
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O sistema heliocêntrico de Copérnico sofria de importantes objeções astronômicas e mecânicas, além das conhecidas objeções
religiosas dos católicos e protestantes.
Ou seja, havia importantes OBJEÇÕESCIENTÍFICAS à hipótese copernicana relativa aos dois movimentos da Terra, o movimento
diário de rotação em torno de seu próprio eixo e o movimento anual de translação em
torno do Sol.
− Marte e Vênus deveriam sofrer grandes modificações no seu tamanho aparente
quando observados da Terra.
−Vênus deveria exibir fases como a Lua.
− Paralaxe das estrelas .
A hipótese de Copérnico - hipótese dos dois movimentos da Terra, o movimento anual de translação em torno do Sol e o movimento diurno em torno de seu
próprio eixo - é contraditória com a experiência do senso comum: baseados em nossas percepções
imediatas, somente podemos crer que a Terra está em repouso.
Adicionalmente, essa hipótese predizia fatos que nunca foram observados até Galileu, com por exemplo, as
variações nos tamanhos aparentes dos planetas e as fases de Vênus.
Assim sendo, Galileu admirava os heliocentristas que sustentaram tal hipótese mesmo quando todas as
experiências a negavam.
Estas são as dificuldades que me fazem admirar como é que Aristarco e Copérnico (...) tenham acreditado tanto no que a razão lhes ditava, a
ponto de confiadamente terem afirmado não poder a
estrutura do universo ter outra forma que a por eles
apontada.
Galileu emOs dois máximos
sistemas do mundo (1632)
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Como já afirmei antes, ter ele (Copérnico) continuado a afirmar, guiado pelas razões aquilo que as experiências sensíveis mostravam o contrário: porque eu não posso deixar de surpeender-me que ele tenha constantemente persistido
em dizer que Vênus gire em torno do Sol, e que está afastado de nós mais de seis vezes num caso do que no outro, embora se mostre
sempre igual a si mesmo, quando deveria mostrar-se quarenta vezes
maior.
Galileu emOs dois
máximos sistemas do
mundo (1632)
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A física de Galileu, em especial a teoria do movimento, foi fortemente motivada na necessidade de dar
suporte à teoria de Copérnico.
Ou seja, de viabilizar do ponto de vista mecânico o movimento da Terra. A única forma de colocar a Terra
em movimento era criando uma nova teoria dos movimentos. Caso fosse mantida a Física de
Aristóteles, a Terra não poderia estar em movimento.
A nova física deveria ser capaz de superar as importantes objeções mecânicas ao movimento da
Terra.
As objeções mecânicas ao movimento de rotação da Terra, refutadas por
Galileu nos Diálogos sobre os dois máximos sistemas do mundo,
destacam-se as seguintes:
−Argumento da torre: um objeto abandonado no topo de uma torre não
pode cair verticalmente se a Terra estiver em movimento.
− Argumento do canhão: o alcance de um projétil de canhão não pode ser o mesmo para o leste e para o oeste caso a Terra esteja em movimento.
− Argumento da extrusão: caso a Terra esteja em movimento, os corpos
deveriam ser expelidos, expulsos da sua superfície.
Se dois móveis compartilham do mesmo movimento, o movimento de um em relação
ao outro não existe, não é perceptível ou operante.
O movimento impresso a um corpo somente pode ser alterado se lhe for
impresso um outro movimento.
Simplício:E vós, esta experiência, fizeste-la,
para dela falar com tanta segurança. Pois se nem vós nem os outros a fizeram, a discussão é
frívola, pois quando se trata de coisas tão afastadas da razão
humana, só a experiência pode fornecer uma conclusão.
Galileu emOs dois
máximos sistemas do
mundo (1632)
Salviati:E eu, sem experiência, estou
certo de que o efeito se seguirá como vos digo, pois é necessário
que ele se siga; e além disso acrescento que vós mesmos
sabeis que ele não se pode seguir de outra maneira; ainda que
pretendais ou tenteis fingir que não o sabeis. Mas eu sou um
parteiro de cérebros tão bom que vo-lo farei confessar à força.
Galileu em“Os dois máximos
sistemas do mundo” (1632)
Em dezembro de 1609 Galileu aponta o seu “óculo astronômico” ou “perspicillium” para os céus, ou seja, uma luneta construída com uma objetiva convergente e uma ocular divergente,
capaz de ampliações de 9 a 10 vezes.
Passa então a fazer observações cujos relatos se constituirão em argumentos a favor da
hipótese copernicana.
Em março de 1610 é publicado os relatos dessas observações no livro Sidereus nuncius
ou A mensagem das estrelas.
O relevo da Lua
Além de Galileu ver uma “monstruosa” cratera na Lua, ele somente viu montanhas
longe da bordas do disco lunar. Atribui esse fato inusitado à atmosfera lunar.
Kepler, posteriormente, “viu” chuva na Lua.
Observações das estrelas fixas
Os astros medicianos
ou
Os satélites de Júpiter
A recepção de A mensagem da estrelas foi positiva por parte dos heliocentristas.
Kepler, mesmo sem olhar no telescópio, se pronunciou favorável aos relatos de Galileu.
Entretanto muitos cientistas e filósofos questionaram veementemente as
observações e as idéias galileanas expostas no livro de 1610.
A não aceitação das observações astronômicas de Galileu por
cientistas e filósofos da época revela simplesmente uma
“mentalidade tacanha”, um “preconceito religioso” ou havia de fato “boas razões” para que assim
eles procedessem?
Alguns aspectos a serem ponderados para a resposta:
- Não existia uma “teoria óptica” que suportasse a ‘verdade’ das observações
com a luneta.-A “teoria da percepção” aristotélica-tomista afirmava que qualquer artefato interposto
entre o mundo e os órgãos dos sentidos se constituía em obstáculo para a percepção
fidedigna.
-Diversas pessoas, inclusive discípulos de Galileu, ao olharem os céus com a luneta
se decepcionaram pois não viram as “maravilhas” relatadas por Galileu.
Desta forma era plausível desconfiar das observações com a luneta,
principalmente quando não havia uma “teoria óptica” sobre o seu
funcionamento.
Nos anos subseqüentes Galileu realiza novas observações e consegue observar
importantes mudanças no tamanho aparente de Marte (1:60) e Vênus (1:40).
Observou também as fases de Vênus.
Observou as “orelhas” de Saturno.
Observou as manchas solares.
Desenhos de Galileu para as observações telescópicas das fases de
Vênus no Ensaiador
Nos Diálogos sobre os dois máximos sistemas do mundo ptolomaico e copernicano
( fevereiro de 1632) Galileu reafirma as conseqüências copernicanas das observações
astronômicas.
Rebate diversas objeções mecânicas ao movimento da Terra com uma nova Física dos
movimentos. A refutação das objeções mecânicas mostra que a Terra pode estar em
movimento mas não demonstra que está de fato.
Na Quarta Jornada, último capítulo dos Diálogos sobre os Dois Máximos Sistemas do Mundo, Galileu “prova” que a Terra possui os dois movimentos: de rotação em torno de seu eixo polar e o de
translação em torno do Sol.
A “prova” constitui-se na sua teoria das marés.
Aproveita para “dar um puxão de orelhas em Kepler” :
Kepler é o que me causa maior espanto, por ter ele, que é de engenho livre e agudo, e que tinha em mãos os movimentos
atribuídos à Terra, dado ouvido e assentimento ao predomínio da Lua sobre as águas, a propriedades ocultas e
a semelhantes infantilidades.
Ele não olhou os céus apenas com a sua luneta!Ele olhou os céus como um COPERNICANO convicto a priori e “viu” diversas corroborações da nova concepção
de universo, da nova metafísica neoplatônica-copernicana. “Viu” até o que não poderia ter visto!!
A CIÊNCIA efetivamente se faz assim e, freqüentemente, apenas uma parte da história é
contada: apenas aquela parte que a posteridade deu como correta.