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A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? Uma teoria do radicalismo da classe média * Klaus Eder RBCS Vol. 16 n o 46 junho/2001 A classe social tem importância? Por que a classe social deveria ter importância? A preocupação com a classe na teoria e na análise dos movimentos sociais parece suscitar antigas questões que foram ultrapassadas pela evolução da sociedade moderna. A classe não cumpre mais um papel nos discursos diagnósti- cos sobre as sociedades modernas avançadas. Tornou-se até elegante fazer diagnósticos críticos das sociedades modernas além e contra o discur- so em termos de classe. A queda dos regimes comunistas e a ascensão do nacionalismo deram um ímpeto adicional a argumentos em favor da obsolescência da análise de classe para as socie- dades modernas. A classe tem a ver com a socie- dade industrial e suas ideologias, e como essas sociedades e suas ideologias não mais existem, deveríamos nos livrar das velhas concepções e ferramentas analíticas usadas para entender a so- ciedade moderna. Seguimos uma estratégia que é completa- mente oposta. Estamos interessados em saber em que medida os novos movimentos sociais são indicadores de novas e profundas divisões ou antagonismos sociais na sociedade moderna. Os novos movimentos sociais foram louvados por introduzirem novas questões, serem portadores de um novo paradigma de existência social e aponta- rem para novas divisões nas sociedades modernas além das religiosas e étnicas tradicionais. As novas divisões introduzidas por esses grupos são então percebidas como substitutas da antiga divisão ba- seada na classe, a divisão entre capital e trabalho. Esse argumento normalmente implica que, com a institucionalização do conflito de classe, a noção de classe não mais se aplica. Este argumento confunde explicação históri- ca e explicação estrutural. O argumento histórico da institucionalização pode ser verdadeiro, mas isso não implica necessariamente que temos de aceitar o argumento estrutural. Pode ser que o conflito de classe industrial não mais domine os conflitos de classe. Aceitamos até a idéia de que esteja diminuin- do a importância desse tipo de conflito de classe, * Publicado originalmente em Louis Maheu (ed.), Social movements and social classes. The future of collective action, Londres, Sage, Sage Studies in International Sociology, 46, 1995. Tradução de Otacílio Nunes. Revisão de Brasílio Sallum Jr.

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A CLASSE SOCIAL TEMIMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOSMOVIMENTOS SOCIAIS?Uma teoria do radicalismoda classe média*

Klaus Eder

RBCS Vol. 16 no 46 junho/2001

A classe social tem importância?

Por que a classe social deveria ter importância?A preocupação com a classe na teoria e na

análise dos movimentos sociais parece suscitarantigas questões que foram ultrapassadas pelaevolução da sociedade moderna. A classe nãocumpre mais um papel nos discursos diagnósti-cos sobre as sociedades modernas avançadas.Tornou-se até elegante fazer diagnósticos críticosdas sociedades modernas além e contra o discur-so em termos de classe. A queda dos regimescomunistas e a ascensão do nacionalismo deramum ímpeto adicional a argumentos em favor daobsolescência da análise de classe para as socie-dades modernas. A classe tem a ver com a socie-dade industrial e suas ideologias, e como essassociedades e suas ideologias não mais existem,deveríamos nos livrar das velhas concepções e

ferramentas analíticas usadas para entender a so-ciedade moderna.

Seguimos uma estratégia que é completa-mente oposta. Estamos interessados em saber emque medida os novos movimentos sociais sãoindicadores de novas e profundas divisões ouantagonismos sociais na sociedade moderna. Osnovos movimentos sociais foram louvados porintroduzirem novas questões, serem portadores deum novo paradigma de existência social e aponta-rem para novas divisões nas sociedades modernasalém das religiosas e étnicas tradicionais. As novasdivisões introduzidas por esses grupos são entãopercebidas como substitutas da antiga divisão ba-seada na classe, a divisão entre capital e trabalho.Esse argumento normalmente implica que, com ainstitucionalização do conflito de classe, a noçãode classe não mais se aplica.

Este argumento confunde explicação históri-ca e explicação estrutural. O argumento histórico dainstitucionalização pode ser verdadeiro, mas issonão implica necessariamente que temos de aceitar oargumento estrutural. Pode ser que o conflito declasse industrial não mais domine os conflitos declasse. Aceitamos até a idéia de que esteja diminuin-do a importância desse tipo de conflito de classe,

* Publicado originalmente em Louis Maheu (ed.), Socialmovements and social classes. The future of collectiveaction, Londres, Sage, Sage Studies in InternationalSociology, 46, 1995.Tradução de Otacílio Nunes.Revisão de Brasílio Sallum Jr.

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mas argumentaremos contra a idéia de que oconflito de classe está tendendo a desaparecer como desaparecimento de sua primeira corporificação:o conflito de classe organizado em torno da contra-dição entre capital e trabalho.1

Por que então mantemos a classe como umelemento estrutural na explicação dos movimentossociais? A opção teórica e conceitual pelo conceitode classe tem a ver com o modo como a sociedademoderna é organizada. Ao analisar as arenas dosmovimentos sociais em sociedades baseadas numacultura igualitária e libertária, restam duas arenas:direitos políticos e relações industriais. Analisamosentão ou a luta pela extensão de direitos universaisou a luta entre classes de pessoas cujos interesses,normas e valores são incomensuráveis. A lógicados direitos políticos é a inclusão universal de todoser humano em estruturas que garantam essesdireitos; a lógica das relações industriais é relacio-nar umas às outras classes antagônicas de pessoas.Qual das duas é a escolhida ao se constituir a açãocoletiva é algo que varia empiricamente. O movi-mento operário combinava os dois aspectos; se osnovos movimentos sociais também o fazem, ou seeles são predominantemente ações coletivas doprimeiro tipo, é também uma questão empírica.Assumimos que, como o velho movimento, osnovos movimentos sociais contêm ambos os ele-mentos. Eles são movimentos que lutam por maisjustiça, por mais direitos e liberdade, e são simulta-neamente movimentos que opõem categorias depessoas a outras categorias,2 criando assim umaarena de conflito sobre questões nas quais osganhos de alguns são necessariamente casadoscom as perdas de outros.3 Portanto, a fundamenta-ção para a persistência no conceito de classe tem aver, primeiro, com a suposição de que os novosmovimentos sociais não podem ser reduzidos amovimentos que demandam inclusão universal.Queremos descobrir se esses movimentos (defini-dos como movimentos-questão) revelam que emuma questão estão em jogo interesses, normas evalores antagônicos e até incomensuráveis. A se-gunda fundamentação é que queremos conceituaros novos movimentos sociais de um modo que nãoexclua de antemão a possibilidade de eles seremparte de novos antagonismos sociais emergentes.

Classificações conceituaisA pergunta sobre se as classes sociais têm

importância na análise dos movimentos sociais nãopode ser respondida sem que sejam discutidos osproblemas subjacentes à análise de classe e àanálise de movimento. Na análise de classe há oproblema de se ainda existem classes no sentido decaracterísticas partilhadas de existência social, aopasso que na análise de movimento o problemaestá em se os movimentos ainda podem ser vistoscomo classes mobilizadas no sentido de atoreshistóricos com consciência de classe. Ao adotar asversões extremistas de cada um deles, temos, porum lado, a análise de classe como uma análise decondições objetivas de existência de grupos sociaise, por outro, a análise de movimento como umaanálise das práticas coletivas e criativas de gruposde atores sociais. Como as duas perspectivas po-dem ser conciliadas?

Poder-se-ia, por exemplo, perguntar em quemedida a classe social é uma variável independen-te que explica a ascensão e a queda dos movimen-tos sociais. Essa pergunta pressupõe que tenhamosuma idéia do que é uma classe. Devemos definiralguns critérios que constituem a classe como umavariável independente. Poderíamos perguntar atéque ponto o conceito de classe pode ser aplicadopara caracterizar grupos sociais específicos nassociedades modernas, e então analisar o statuseconômico, político e cultural desses grupos.4 Aclasse é vista conseqüentemente como externa àprática coletiva de atores do movimento social, e éisso que a torna uma variável independente naexplicação de práticas mobilizadoras. Uma talperspectiva implica também que podemos definiros movimentos sociais como independentes declasse, e conceituá-los em termos de uma teoria daação coletiva. Os movimentos sociais são definidoscomo práticas coletivas nas quais interesses, nor-mas e valores racionais determinam o resultado daação coletiva. Esses critérios não são impostoscomo restrições estruturais à ação, mas são vistoscomo opções no curso da ação coletiva.

A construção teórica das duas variáveis deixade lado, pela própria conceituação, o problema deseu inter-relacionamento. Poderíamos resolveressa questão — como é feito usualmente — por

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meio de considerações metodológicas de probabi-lidade. Por exemplo, poderíamos perguntar qual aprobabilidade de que indicadores de classe te-nham a ver com indicadores de mobilização, econcluir que há um inter-relacionamento entre osfenômenos observado a partir da probabilidade decovariância. A questão de se a mobilização podeser atribuída à classe é conseqüentemente resolvi-da identificando-se ocorrências conjuntas no espa-ço e no tempo. Todavia, tais ocorrências conjuntasnão autorizam uma explicação causal. Uma dasrazões para isso é simplesmente que, na medidaem que uma explicação causal funcione, são des-truídas as premissas para uma causalidade adicio-nal do mesmo conjunto de condições. A idéia deuma determinação estrutural de cursos de ação temum efeito paradoxal: quanto mais as estruturassociais produzem cursos de ação que têm efeitossobre as estruturas, que até mesmo criam estrutu-ras, menos essa estrutura tem um efeito determi-nante. A propriedade paradoxal da teoria da classeé que sua realização empírica destrói as condiçõesde sua adequação empírica. Resolver esse parado-xo simplesmente desistindo da análise e da expli-cação estrutural leva a uma teoria individualista daagência e a um retorno aos princípios do individu-alismo metodológico. Defenderemos, em oposi-ção a essas estratégias reducionistas, uma teoria“estruturalista” da agência. A idéia é que devemosanalisar a ação coletiva como um tipo de ação cujanatureza coletiva é constituída por aspectos estru-turais da sociedade. A classe é uma desses aspec-tos. A ação coletiva se corporifica não só politica-mente, mas também socialmente. Portanto, a per-gunta geral é: Em que medida a ação coletivareproduz formas tradicionais de conflito de classe,e em que medida contribui para sua reorganiza-ção e, finalmente, para a emergência de novasformas de conflito de classe?

Essa pergunta básica nos permite uma dife-renciação entre dois tipos de efeito que emergemna interação de classe e ação coletiva. O primeiroefeito é aquele tradicional da classe “determinar” aação coletiva. O segundo é o efeito da açãocoletiva sobre a classe. Esse último efeito é menosvisível porque só se torna manifesto quando aclasse (tradicional!) não mais tem efeitos sobre a

ação coletiva. Se mostrarmos que o primeiro efeitonão existe, não estamos ainda autorizados a con-cluir que a classe não desempenha nenhum papel.Há ainda a possibilidade de que os movimentossociais dêem à ação coletiva um novo significadoque não só se manifesta nela, mas até contribuipara a redefinição da estrutura de classe e doconflito de classe tradicional a ela ligado.

Enquanto só procuramos uma resposta paraa primeira parte da pergunta acima, não temos delevar em conta as condições estruturais do aspecto“criativo” da análise de movimento social. Mas tãologo o façamos, um segundo aspecto estruturaltem de ser introduzido: a cultura como o repertóriode entendimento da ação coletiva. Em uma situa-ção histórica na qual uma velha estrutura de classeperde seu significado para a ação coletiva, redefini-ções da situação social tornam-se uma parte centralda ação do movimento. A ação coletiva tem deentender a si própria, tem de inventar um significa-do, mas é restringida nesse entendimento pelorepertório cultural de significados possíveis. Oprimeiro efeito, como descrito acima, opera sem acultura; a cultura pode ser reduzida a uma ideolo-gia que reproduz uma dada estrutura de classe. Osegundo efeito não pode ser descrito sem referên-cia à cultura. Nosso interesse passa então para aspossibilidades contidas nesses novos significadosde identificação e referência a um novo conflito declasse além das divisões políticas, religiosas ouculturais que abundam em qualquer sociedade. Aclasse, concluímos, tem importância no estudo demovimentos sociais de dois modos muito diferen-tes, e é o segundo efeito que é nossa principalpreocupação. Portanto, temos de olhar para os“novos” significados culturais imputados às açõescoletivas que levam a conflitos sociais diversos, à“mobilização” e à “contramobilização” fora dosrelacionamentos de classe tradicionais. Se essesnovos significados a dissolvem ao reduzi-la ameras divisões políticas que podem ser manejadaspor procedimentos institucionalizantes de resolu-ção de conflito, é o tema de um debate controver-so. Nossa hipótese é que os novos movimentossociais, vistos pelo lado “criativo” da ação coletiva,criam significados que não mais se relacionam aoconflito de classe tradicional.

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Tomamos essa proposição teórica como umponto de partida para uma reinterpretação da liga-ção entre classe e movimento. Conceituamos aatividade “criativa” nos novos movimentos sociaiscomo uma interação entre ação e cultura e tentare-mos dar conta do caráter “criativo” da ação coletivapor meio da análise dos interesses, das normas edos valores que a orientam. Para incluir a classecomo uma variável, postulamos que há diferentesmodos de relacionar movimentos com classe social:ou o caráter de classe da ação coletiva ou adefinição cultural de relações de classe. O modelopara explicar essas diferentes ligações entre classe ea geração ou reprodução de mobilização dos movi-mentos pode ser representado como segue:

ação coletiva cultura

estrutura de classe

A implicação teórica para a teoria da classe éque a classe tem dois efeitos. Tem um efeitodeterminante que é o teste “conservador” do papelda classe. Ela tem relevância e poder explicativoporque afirmamos que basear práticas de protestoem posições sociais específicas de classe permiteexplicar a força e a durabilidade específicas dessaspráticas. O primeiro efeito da classe, então, é servircomo uma “estrutura de oportunidade social” paraa ação coletiva. É isso que descrevemos como oprimeiro tipo de relação entre classe e movimento.Todavia, a estrutura de classe não é invariante; elapode ser redefinida pela ação coletiva. O segundoefeito implica que estruturas de classe dadas nãomais determinam a ação coletiva e que a culturanão mais pode ser reduzida a uma ideologiaespecífica de classe. A ação coletiva ganha assimum aspecto “criativo”. Ela cria uma arena de confli-tos sociais na qual são redefinidos os princípios deseparação e oposição de classes de pessoas. Nossomodelo contém portanto um circuito de retroali-mentação no qual a cultura funciona como avariável mediadora entre ação coletiva e classe,permitindo uma dinâmica da estrutura de classe nocurso da própria ação coletiva.

Surge disso uma pergunta simples e básica:os movimentos sociais produzem práticas e signi-

ficados dessas práticas que nos autorizam a descre-vê-los como parte de uma nova divisão de classenas sociedades modernas? Ou essas práticas pro-duzem significados que podem ser tratados nointerior do sistema de resolução institucionalizadade disputas? Para testar essas questões, propõe-sea teoria de que os novos movimentos sociais sãoformas de radicalismo de classe média e protestode classe média que se caracterizam por doisaspectos estruturais que indicam essas novas práti-cas e significados antagônicos. O primeiro é que osnovos movimentos sociais são portadores de proje-tos de identidade que não podem ser tornados oobjeto de formas políticas de resolução de conflito.O segundo é que os novos movimentos sociaisestão preocupados com questões que são inegociá-veis no interior das estruturas institucionais exis-tentes. No que segue mostraremos como umaconcepção revisada de classe pode esclarecer as-pectos estruturais emergentes do relacionamentoentre classes médias e movimentos sociais vistoscomo uma expressão da ação coletiva ligada àclasse.

As classes médias na teoria: anecessidade de um novo quadroconceitual

A história das classes médias e a teoria da classetradicional

A noção de classe tradicional foi usada pararealizar duas diferentes intenções normativas. Aprimeira foi identificar aqueles que são exploradoscomo uma classe. Classe nesse sentido tornou-sequase sinônimo de exploração.5 O outro interessenormativo foi a identificação dos exploradores, daspessoas que estão numa posição estruturalmentevantajosa ou que possuem poder pessoal diretosobre outras, tal como a classe capitalista, como acorporificação dos estruturalmente favorecidos.Esse modelo de classe foi generalizado num mode-lo de poder. As classes são relacionadas umas àsoutras em termos de poder ou falta de poder: ossem poder são aqueles sem nenhum controle dascondições materiais de sua existência; são simples-mente os pobres. Por outro lado, temos classes de

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pessoas com poder econômico, social ou mesmocultural; a chamada “nova classe”6 é a corporifica-ção dessa dominação política e cultural.

Entre as duas motivações normativas paraidentificar classes, nunca houve um lugar sistemá-tico para as classes médias.7 Elas simplesmentenão podiam mobilizar a atenção teórica exceto emfórmulas depreciativas tais como “classes peque-no-burguesas”, “aristocracia do trabalho” ou “pe-quenos proprietários”.8 Não houve nenhuma preo-cupação normativa em lidar com esses grupos, quesó propunham dificuldades para as teorias declasse tradicionais (que não contribuíam para umadequado entendimento deles). A primeira preo-cupação sistemática foi motivada por uma experi-ência negativa: o papel das classes médias naascensão do fascismo. Foi só na década de 1970que as classes médias voltaram a receber atençãoteórica,9 e pela primeira vez de modo não depre-ciativo, devido ao seu papel no surgimento do quefoi chamado de novos movimentos sociais. Asclasses médias eram vistas como uma classe socialque se tinha tornado um ator histórico, desenvol-vendo desse modo uma consciência que tinhaefeitos inovadores na sociedade e efeitos significa-tivos no quadro institucional das sociedades mo-dernas.10 Isso explica o renascimento do interessenas classes médias, o que, é claro, deu suporte àsuposição de que a classe baixa e seu embutimentono conflito de classe industrial não mais servemcomo o modelo para um entendimento da classemédia emergente.

Argumentarei que a expressão “classe média”tem sentido, historicamente, no contexto de umarelação de classe definida pela classe trabalhadorae pela classe capitalista.11 Sua posição intermediá-ria explica a reação específica e os movimentos degrupos sociais que não se tornaram uma classe. Éa exclusão das classes médias de uma relação declasse, sua existência como não-classe, que mostrater poder explicativo em relação à ação coletiva; oradicalismo de classe média pode ser explicadopor sua tendência a evitar ser identificada com asclasses baixas e seu fracasso em tornar-se umaclasse dominante. Essa situação das classes médias,todavia, muda com a ascensão da “nova” classemédia. Para esclarecer essa nova situação, nós

recorreremos à suposição controversa da “novaclasse média” como a base de classe dos “novosmovimentos sociais”.

O conceito de uma “nova classe média”levanta o problema de se ela pode ser vista emcontinuidade ou em descontinuidade com as ve-lhas classes médias. O argumento central em favorda descontinuidade foi que a perda de uma culturade classe trabalhadora levou a uma cultura não-classista de protesto e recolhimento privado. Háduas versões deste argumento, uma afirmando aemergência de uma cultura de massa universal, aoutra afirmando a emergência de diferenças cultu-rais que dissolvem a cultura em culturas extrema-mente individualizadas.12 Os desenvolvimentos,por mais contraditórios que sejam, têm algo emcomum: negam a própria possibilidade de umacultura que esteja relacionada a conflitos de classee a relações de classe como tinha sido característi-co da classe trabalhadora. A nova classe média —como sua antecessora histórica, a velha classemédia — desenvolveu sua cultura fora da relaçãode classe dominante; mas, com o surgimento dosnovos movimentos sociais, tornou-se um elementoconstitutivo de uma nova estrutura de classe emer-gente. A “velha” estrutura de classe excluía asclasses médias sistematicamente e as via comogrupos fronteiriços. Nós vemos os novos movi-mentos sociais como o mecanismo que cria umanova estrutura de classe nas sociedades modernas,dando a essas classes médias um papel central nareestruturação das relações de classe nessas socie-dades.

A classe média no século XIX não era muitonumerosa mas cumpria papéis-chave na estruturasocial, no sentido de que aqueles que a ela perten-ciam controlavam o fluxo da comunicação coti-diana na sociedade. Comerciantes e artesãos ofere-ciam cenários sociais onde as pessoas se encontra-vam e trocavam idéias. Professores e funcionárioscuja função socializante é constitutiva de seu papelprofissional tinham contato cotidiano com as pes-soas.13 Estruturalmente, as classes médias foramdefinidas por sua localização no setor de serviços.Esse setor cresceu desde então, passando a incluiros artesãos e os comerciantes não-proletarizados,os grupos emergentes de colarinhos-brancos des-

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de o começo do século XX, e finalmente gruposprofissionais nas atividades de serviço social quecresceram em número nas quatro últimas déca-das.14 O desenvolvimento das classes médiascomo uma cultura mostra, todavia, um perfil errá-tico. Esses grupos foram definidos em discussõesrecentes como partilhando o habitus do “pequeno-burguês”. Esse rótulo originalmente se referia maisà cultura de pequenos proprietários (em oposiçãoaos grandes proprietários, aos capitalistas e àsclasses proprietárias de terra tradicionais) do que àsua exata posição de classe. A expressão, original-mente restrita aos pequenos proprietários (arte-sãos e comerciantes), foi estendida a outros gruposnão ligados à produção, e finalmente a grupos declasse média em geral. Entre as guerras mundiaisesses grupos tinham sido descritos como umaclasse baseada no consumo conspícuo15 e comosendo politicamente reacionários.16

É suficiente notar que, em relação à expres-são “classes médias”, as definições existentes sina-lizam a impossibilidade de classificação dessesgrupos na relação de classe vinculada à sociedadecapitalista industrial. Ademais, essa discussão mos-tra que a descrição das classes médias em termosde classe contém uma ambivalência fundamental.Não há consenso na discussão de se as classesmédias deveriam ser vistas como uma classe domi-nante ou como uma classe dominada. As interpre-tações da nova classe média divergem radicalmen-te: para alguns elas são o novo proletariado; paraoutros, uma nova classe dominante.17 Essa ambi-valência básica não se deve a má teoria, mas aofenômeno em si. Em vez de isso nos motivar adesistir do uso da classe como um conceito expli-cativo, afirmamos que ambas as conceituaçõesestão corretas. As classes médias são constituídas— dentro da estrutura de classe tradicional — tantode classes dominantes quanto de classes domina-das; elas contêm em si relações de dominaçãocomo uma relação social latente. A ambivalênciateórica pode ser tomada como um indicador de umenigma não resolvido, o de que a construçãoteórica das classes médias tenta assimilar o fenô-meno das classes médias ao modelo de classecaracterístico das relações de classes tradicio-nais.18

Esse enigma tem de ser resolvido hoje porduas razões: em primeiro lugar, usar um modelo deanálise de classe no qual a maioria da populaçãofica no meio das classes19 obviamente mina arelevância da estrutura de classe tradicional; emsegundo lugar, as classes médias tornaram-se oelemento mais dinâmico na modernização da so-ciedade moderna — elas mostraram ser um impor-tante suporte da mobilização coletiva, cumprindo,portanto, um papel social atribuído às classesbaixas pela teoria tradicional. As duas razões nosdeixam com duas opções: ou desistir das explica-ções em termos de teoria da classe, ou revisar aabordagem da teoria da classe. Nossa proposta é“revisionista”: levar em conta a mudança na socie-dade moderna que deslocou o lugar das relaçõesde classe, das relações industriais para outroscampos. Para argumentar em favor dessa posição,olharemos mais de perto a “nova” classe média.Suspeitamos que a nova classe média atraiu aten-ção, basicamente, não por causa de sua localiza-ção, mas por causa de sua cultura específica.Vemos nessa predominância da análise cultural ummodo implícito de lidar com o que chamamos oefeito criativo da cultura sobre a classe. Mas asclasses médias, não baseadas socialmente nem emrelações de classe nem numa cultura de inclusãouniversal (numa sociedade civil), até agora nãotiveram sucesso em definir seu papel e sua identi-dade nesses termos. Sua cultura foi de permanentefracasso. Elas falharam quando se envolveram emconflitos sobre inclusão universal, e quando parti-ciparam de conflitos de classe, terminaram do ladoda classe dominante.20 Nossa suposição teóricacentral é que, com as novas classes médias mobi-lizadas, essa história de fracassos políticos e cultu-rais chegou ao fim.

Operacionalizando a classe: rumo a uma noçãoconstrucionista de classe

A análise histórica das classes médias lançaos fundamentos para uma discussão das mudançasprovocadas pela emergência das novas classesmédias e por sua mobilização nos novos movimen-tos sociais. Todavia, ela deixa de lado o questiona-mento metodológico sistemático. O desenvolvi-mento de uma teoria revisada da classe em geral, e

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da classe média em particular, obviamente nosforça a evitar o procedimento metodológico geral-mente usado para comprovar uma base de classenos movimentos sociais. Portanto, é imperativolançar algum fundamento metodológico para quea teoria avance.

Na busca de medidas de uma base de clas-se, alguns pesquisadores recorreram à análise dacomposição social dos ativistas de um dado mo-vimento. Esses pesquisadores realmente defende-ram a idéia de que uma classe consiste em ativis-tas. A mesma estratégia foi seguida em relação àcomposição social dos apoiadores (definidoscomo aqueles que se identificam com metas ado-tadas por um movimento), mas nem uma nemoutra é um indicador do caráter de classe dasmobilizações. O que aconteceria se aplicássemosesse argumento à classe operária? A existência deativistas ou de apoiadores do movimento operá-rio teria se tornado o critério da existência deuma classe operária. É óbvio que há muito maisno movimento operário do que seus ativistas ouseus apoiadores. Eles fazem parte — e esse é olugar sistemático de tais análises — do que foichamado a “estrutura de oportunidade social”para a constituição de uma classe. A análise dacomposição dos ativistas diz de onde vêm aspessoas que se engajam em ações de protesto,mas não diz por que as ações dessas pessoasdevem ser consideradas como um elemento declasse. A classe de origem de alguém não é ga-rantia de que sua ação seja uma ação de classe.

Um segundo passo na análise seria investigarmais intensamente as dimensões da cultura deprotesto que emerge entre pessoas de classe médiamobilizadas. Propriedades simbólicas compartilha-das adicionam às características socioestruturais adimensão de uma unidade cultural de radicalismode classe média. Essa não é ainda uma medida declasse; ela permite, todavia, a adição de umasegunda série de condições necessárias para que aclasse emerja.21 O critério é uma certa unidadecultural surgida da ação coletiva que possa sergeneralizada nos grupos mobilizados e além deles.Na perspectiva marxiana e weberiana clássica,essas características partilhadas podem ser dividi-das em interesses, normas e valores.

Interesses partilhados são um critério defini-dor elementar da cultura de movimento. Esse crité-rio é ele próprio variável, dependendo de interpre-tações de quais são os interesses de alguém. Histori-camente, os interesses dos proletários se inscreviamna moldura da injustiça,22 e dentro dessa molduraeles foram capazes de definir seus interesses. Seessa moldura é universal é uma questão aberta(exceto para os mais ferrenhos teóricos da escolharacional). Dada a dominância da moldura da injusti-ça, pelo menos para as sociedades ocidentais mo-dernas até o presente, podemos definir interessespartilhados como o cálculo de que recebemosmenos do que deveríamos. Essa moldura foi domi-nante até agora na transição da sociedade tradicio-nal para a moderna e para a modernização.23

Normas partilhadas são um segundo aspectode uma cultura de movimento. Assim o critériodefinidor de classe se torna dependente de qua-dros institucionais dados. Isso se aplica à noção decolarinho “azul” e “branco”, que é basicamenteuma definição legal. As normas diferenciam tiposde cidadãos e criam um sentido de comunidadebaseado em normas que definem o status de umcidadão. Essas definições normativas não coinci-dem necessariamente com o critério de interessespartilhados. Mas a definição normativa do que seaplica em conjunto tem o efeito de criar um círculomais amplo de pertencimento cultural, transfor-mando conseqüentemente a cultura de protestoem uma cultura de grupo mais abrangente.24

Um terceiro mecanismo para transformar enormalizar uma cultura de movimento são osvalores partilhados. Ele foi o objeto da “psicologiasocial de classe” e foi usado na pesquisa deestratificação tradicional para provar e refutar aexistência de classes em termos de valores partilha-dos.25 Esse critério novamente mede em quemedida as pessoas foram socializadas em umacultura, algo que não é necessariamente um aspec-to de classe. Ele nos dá informação sobre o grau emque as pessoas classificam a realidade social emtermos avaliativos e o grau em que elas são capazesde dar respostas nesse sistema de classificação.Ficamos, em última instância, com um indicadordo grau em que uma sociedade está integrada nonível das orientações de valor.

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Tentativas de construir uma noção de classesimplesmente acrescentando a dimensão socioes-trutural e cultural de constituição de grupos sociaisde atores mostraram-se inúteis. Os procedimentosde procurar correlações entre posições ocupacio-nais e atitudes, de correlacionar os novos estilos devida a-racionais, não-racionais ou irracionais adiferenças de classe tradicionais (medidas princi-palmente pela ocupação do pai), não medem oque deveriam, que é a classe. Para identificar osefeitos de culturas de protesto emergentes sobre aredefinição do campo de conflito de classe, temosde definir classe de um modo que vá além doscritérios demográficos e culturais.26 Assim, umadas dificuldades em operacionalizar a relação entremovimento e classe é metodológica: o procedi-mento escolhido para sua verificação pode facil-mente ser tornado representativo e confiável, masnão é necessariamente válido. Ele mede até queponto essa cultura é capaz de se estender a outrasclasses. Isso vira o modo de medir a ação de classede cabeça para baixo: o que foi tomado comoclasse manifesta não é nada mais que uma medidado grau em que uma cultura de classe podeproduzir a imagem de sua ausência de condição declasse.

Problemas metodológicos podem levar anovas teorias. Portanto, proporemos um quadro dereferência que lança as bases para uma teoria daclasse na qual a classe média possa ser vista comoassumindo o papel que a classe trabalhadora tinhana teoria da classe da sociedade industrial. Essateoria da classe (na qual basearemos depois nossateoria do radicalismo da classe média) é basica-mente uma versão construcionista da teoria daclasse.27 Esse construcionismo pressupõe dois ele-mentos: a agência e o contexto dentro do qual e noqual a agência é situada. Há um terceiro elemento,o resultado estrutural de agir dentro de e em umasituação culturalmente definida, que vai da inter-nalização do conflito no sujeito por meio da insti-tucionalização das divisões sociais e políticas até oconflito de classe. Esse terceiro elemento é avariável que ainda deve ser explicada.

Agência tem a ver com a capacidade degrupos sociais para definir e redefinir os interesses,as normas e os valores que os separam além da

diferenciação demográfica de outros grupos soci-ais. Nós localizamos a agência na capacidadeespecífica de gerar — por meio da mobilizaçãocoletiva — definições coletivas de interesses, nor-mas e valores. Cada mobilização tem ou cria suaprópria cultura. Conseqüentemente, a agência estáintricadamente relacionada ao espaço cultural quecria e no qual se baseia para se constituir e sereproduzir como uma capacidade coletiva para aação. Todavia, a relação entre cultura e mobiliza-ção permaneceu um problema em aberto. A cultu-ra da mobilização foi analisada usando teorias demédio alcance de psicologia de massa, privaçãorelativa ou mobilização de recursos para explicar amobilização coletiva.28 A Grande Teoria tomouqualquer tese elegante que estivesse disponívelpara fazer generalizações indiscriminadas sobre acultura subjacente à mobilização em movimentossociais: pós-materialismo, mundo da vida, coloni-zação e individualização são exemplos dessasabordagens.29 Essas teorias supõem que a culturaque elas medem de diferentes maneiras já estádada. O pós-materialismo, por exemplo, foi explí-cito nessa suposição. As teorias do mundo da vidasupõem um modo comunitário com existênciaanterior à sociedade. As teorias da individualizaçãosupõem uma cultura moderna de individualismocomo uma orientação cultural geral nas sociedadesmodernas. As teorias da escolha racional simples-mente pressupõem uma cultura partilhada de inte-resses, normas e valores, na qual atores coletivosse comportam com base no cálculo de seus recur-sos disponíveis e dos possíveis ganhos a seremobtidos dada sua “estrutura de preferência”.30 Emoposição a essas abordagens, tem de ser enfatizadaa construção de tais culturas no processo de açãocoletiva, o que reduz essas teorias a meras hipóte-ses sobre princípios organizacionais alternativosde culturas de mobilização emergentes.31

O segundo elemento envolve o contexto, istoé, a arena de conflitos sociais na qual os novosmovimentos sociais se situam. Estes são antes demais nada movimentos culturais que transcendemo campo das relações industriais. Os termos usadospara definir o novo campo de conflitos sociais sãoidentidade, expressividade e a boa vida.32 Definiro campo de agência desse modo implica tipos e

A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? 13

racionalidades de ação além do cálculo utilitárioconstitutivo do modelo de relações industriais econflito de classe industrial. Definir um novo cam-po de conflito social não implica necessariamenteque esse campo não esteja mais conectado a umpossível conflito de classe e portanto a um novotipo de estrutura de classe. Essa conclusão domi-nou a idéia teórica de “individualização” nas so-ciedades modernas (Beck, 1992; Melucci, 1995). Aalternativa é olhar para as novas fronteiras criadasno processo de individualização. Contrariamente àimagem de uma sociedade de pessoas extrema-mente individualizadas distintas umas das outras eenvolvidas em demarcar tais distinções, defendere-mos a imagem de uma sociedade organizada emtorno da tentativa de refazer-se de tal modo que aexclusão dos meios de produção não mais seja ocritério dicotomizante. A dicotomia social que éinventada e em última instância defendida é umana qual o critério dominante é a exclusão de umasociedade que permite a identidade e o individua-lismo expressivo. A cultura dos novos movimentossociais contém um elemento de dicotomização darealidade social, a saber, a idéia de exclusão dosmeios sociais de realização de identidade.

Podemos agora especificar nossa meta expli-cativa: a mobilização de uma nova cultura deprotesto além da cultura de protesto industrial temalgum efeito sobre a estrutura de classe? Podemostambém especificar uma suposição básica de nossateoria, que é a de que as pessoas em diferentesclasses sociais que são mobilizadas em movimen-tos sociais (como ativistas), ou que se identificampelo menos com as metas de movimentos sociais(como espectadores), o fazem porque se identifi-cam com valores culturais e não porque experi-mentam uma falta de poder (seja em termos econô-micos, políticos ou culturais). O mecanismo demobilização aparece em resposta não à diferencia-ção de classe e à competição de classe, mas aodesejo de tomar medidas acerca de assuntos quesão do interesse das pessoas. Ao fazê-lo, essa açãocria um sentido de identidade coletiva entre grupossociais. Ele define quem faz parte e quem não fazparte da ação e de suas metas. Na medida em queum tal conjunto de limites, uma tal criação deidentidade coletiva, possa ser relacionado a posi-

ções sociais (a “status”, seja ocupacional, educaci-onal ou político), isso mudará a estrutura de classe,tanto em sua diferenciação quanto nas formas decompetição de classe. Assim, a resposta a nossapergunta será: que as classes realmente têm impor-tância no estudo dos movimentos sociais, não sócomo causas de mobilização, mas também comoefeitos da mobilização. Os movimentos sociaistambém criam relações de classe. A classe não éum fato social, mas é — além de uma construçãoteórica — uma construção social. Isso obriga aoabandono de qualquer idéia de existência naturalda classe. Não há nenhuma classe baixa, nemmédia, nem dominante enquanto tal.

Essa abordagem construcionista da classe,todavia, tem limites que são estabelecidos pela“estrutura de oportunidade social” das sociedadesmodernas avançadas. A estrutura de oportunidadesocial é entendida como os processos socioestrutu-rais (diferenciação ocupacional, diferenciação cul-tural, diferenciação de renda, diferenciação deestilo de vida etc.) que abrem o espaço social paraa diferenciação de classe e as relações de classe. Acapacidade da nova classe média para redefinir ocampo do conflito de classe depende da suasituação objetiva em termos de ocupação e forma-ção educacional. Processos contrabalanceadoresno nível das instituições também têm de ser leva-dos em conta. A teoria da institucionalização doconflito de classe argumenta que as instituições,acima de tudo a regulação política institucionaliza-da, definem as fronteiras entre classes e moldam asrelações de classe. Essa teoria foi especialmentebem-sucedida em relação à institucionalização doconflito de classe industrial nas sociedades ociden-tais modernas. Se ela tem valor explicativo emrelação a um conflito de classe pós-industrial aindaé algo a ser visto. As condições que limitam aeficácia da ação coletiva têm de ser integradascomo condições contextuais no quadro de referên-cia teórico. Nossa teoria não obstante declara quea mobilização de ação coletiva é o mecanismobásico que muda as fronteiras entre classes emolda as relações de classe.3 Essa teoria nos seráútil agora na reformulação da teoria do radicalismode classe média e em sua transformação numanova teoria dos “novos movimentos sociais”.

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Classes médias e movimentos sociais:uma teoria do radicalismo de classe

Novos movimentos sociais e as novas classesmédias: uma crítica de Pakulski

É um esforço teórico inútil buscar uma expli-cação do protesto contemporâneo em termos declasse? Esse é o ponto de vista defendido vigorosa-mente por Pakulski (1995),34 que argumenta queos novos movimentos sociais têm uma base socialque atravessa as linhas de classe. São a geração, aposição e a mobilidade que são características dosgrupos de pessoas que se engajam na política dosnovos movimentos ou simpatizam com ela. Umsegundo argumento que explica a falta de correla-ção entre classe e movimentos tem a ver com suaorientação cultural e conseqüentemente não-soci-al. Os novos movimentos sociais são movimentoscarregados de valor que não se ligam diretamentea características socioestruturais relacionadas àdesigualdade social;35 portanto sua composiçãosocial não seguirá as divisões que têm a ver comdesigualdades sociais, mas as divisões que têm aver com conflitos culturais (tais como conflitosgeracionais e conflitos locais).

A contrateoria foi a de que é o “habituspequeno-burguês” (Bourdieu, 1984) que servecomo uma ligação entre as novas classes médiasdas sociedades modernas avançadas e os novosmovimentos sociais.36 Nossa suposição é que elessão ainda mais que isso. São a parte mais visível deum novo tipo emergente de antagonismo de clas-se, centrado em questões além da exploração e dainjustiça. Isso leva às seguintes perguntas: os novosmovimentos sociais são capazes de tornar suasorientações culturais a base para um novo conflitode classe? ou eles são grupos definidos por critériosatributivos que contribuem para um ciclo de pro-testo na história do protesto da classe médiamoderna? Gostaríamos de seguir a primeira estraté-gia explicativa e argumentar que o radicalismo declasse média contemporâneo não é uma manifesta-ção de ciclos de protesto, mas um momento naconstituição de uma nova relação de classe paracuja análise a classe “média” é a chave. Argumen-tos em favor de uma interpretação cíclica foram

usados na pesquisa recente em estratificação so-cial.37 O argumento é que o retorno à normalidadedemográfica, ou seja, à estratificação social “nor-mal” depois dos efeitos niveladores iniciais daexpansão educacional desde a década de 1970,levará a uma normalidade cultural no sentido deum retorno a um nível normal de protesto nasociedade, a uma redução das formas não-conven-cionais de comportamento político e a uma redu-ção dos estilos de vida hedonistas. Nosso argu-mento contra teorias que deduzem ciclos culturaisdos demográficos se baseará na distinção entre as“causas acionadoras” e os “efeitos estruturais” des-sas mudanças demográficas no potencial de mobi-lização para o comportamento de protesto. Comrelação às causas acionadoras, adotaremos o argu-mento de que a geração do pós-guerra é transitóriaem suas características socioestruturais: ela experi-mentou a reorganização de diferenças sociais naestrutura social em razão da expansão educacio-nal, do adiamento do casamento e de novospadrões de curso de vida. Considera-se tambémcomo dado que ocorreu um reequilíbrio da estru-tura social em conformidade com as formas tradi-cionais de desigualdade. A estrutura social foi“normalizada”. A geração seguinte à geração doprotesto viverá de novo em um sistema caracteriza-do por padrões de estratificação modernos; asdiferenças entre as classes baixa, média e alta setornarão novamente formas normais de vida socialmoderna (exceto por um fator — a migração —cujos efeitos sobre a estrutura social não podem sercalculados). Aceitamos portanto o argumento deque a mobilização estava vinculada a essa geração“excepcional”, mas acrescentamos a observaçãoqualificadora de que essa excepcionalidade teveum efeito acionador sobre a mobilização. Tão logoesse efeito tenha ocorrido, as conseqüências setornam independentes das causas.38

Contra a interpretação metodologicamentesofisticada mas teoricamente mecânica que afirmaque os movimentos ascenderão e cairão com oreembaralhamento socioestrutural desses grupos,uma interpretação sociocultural argumentaria queessa geração conseguiu libertar as culturas declasse média tradicionais de seus laços culturaishistóricos, de sua prisão cultural e de sua depen-

A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? 15

dência ideológica tradicional em relação ao Esta-do. A geração excepcional das décadas de 1960 e1970 foi a promotora de uma mudança na culturade grupos de classe média, criando a “nova culturado movimento social” que entrou na vida econô-mica, política e cultural, e até mesmo na religiosa.Esse efeito cultural pode ser atribuído a umageração demograficamente atípica. Mas a atipicida-de não explica por que essa geração produziu oefeito cultural que produziu. Este tem a ver com acultura específica criada na mobilização dessesgrupos estruturalmente definidos.

Vemos duas implicações principais desseefeito. Em primeiro lugar, os novos movimentossociais remoldaram o sistema institucional dassociedades modernas.39 Eles introduziram — aomenos parcialmente — novas divisões políticas.Em segundo lugar, eles estão traçando novas fron-teiras sociais nas sociedades modernas, redefinin-do desse modo as velhas relações de classe. Opapel dos novos movimentos sociais no processode democratização, e suas conseqüências preten-didas bem como as não pretendidas, foram oobjeto de extensa discussão.40 Mas a questão deaté que ponto a cultura dos novos movimentossociais teve sucesso em redesenhar não só politica-mente mas também socialmente as fronteiras nassociedades modernas não foi tratada seriamente. Aprópria questão, ao lado de seu fundamento teóri-co, foi proposta muito tempo atrás na obra fecundade Touraine. A hipótese de Touraine é que osnovos movimentos sociais não mais se identificamcom forças naturais mas com forças sociais (Tourai-ne, 1981). Tradicionalmente, a classe operária foiligada a forças naturais, as forças da produção. Aidéia da classe operária carregava uma ambivalên-cia fundamental: ela era ao mesmo tempo umfenômeno natural e também social. O conceito declasse herdado dessa tradição é um conceito ade-quado a uma sociedade que ainda está ela próprialigada a formas naturalizadas. Definindo moderni-dade como desnaturalização da realidade social, asociedade industrial aparece como uma sociedade“semimoderna”. Dissolver a visão naturalizada darealidade social significa realizar a modernidade. Acrítica teórica do Materialismo Histórico como umateoria naturalista da sociedade é um indicador

dessa “modernização”. Os novos movimentos soci-ais são seu indicador concreto, e o denominadorcomum entre eles é que eles se distanciam donaturalismo subjacente ao movimento operário e àclasse operária.41 A desnaturalização da sociedadeindustrial semimoderna nos força a definir a arenae o objeto dos conflitos sociais e as classes deatores envolvidos de um modo que não é natura-lista mas genuinamente social. Isso significa que ocampo de conflito de classe não é dado, mas é elepróprio produzido nas práticas sociais, e que osatores coletivos envolvidos não são coletivos pre-definidos (o que está implícito na idéia de umaclasse “em si”), mas estão se constituindo comoclasse por meio de sua ação coletiva.

Em relação ao primeiro aspecto, a definiçãosocial do campo de conflito de classe, os novosmovimentos sociais contribuíram para sua defini-ção genuinamente social. Eles transformaram ocampo de conflito de classe em “arenas” que sãocriadas por esses movimentos por meio de suaação. O conceito de “arena” indica a mudança deênfase de um campo de conflito de classe dado emtermos históricos (e até de história mundial) paraarenas fluidas de conflito social.42 Em relação aosegundo aspecto, a noção de classe, esses novosmovimentos sociais não mais se referem a classecomo definidora de sua identidade coletiva. Aidentidade coletiva é buscada fora de padrões pré-fabricados de identidade que foram transportadosna noção semimoderna de classe. Portanto, nãomais podemos usar o modelo tradicional de classee de conflito de classe com relação aos novosmovimentos sociais. Faz sentido ainda, então, falarsobre a base de classe média dos novos movimen-tos sociais?

Eu afirmo que sim. O conceito de classemédia é um estudo de caso ideal da modernizaçãoda ação coletiva que ocorre no contexto da evolu-ção do movimento operário e da ascensão dosnovos movimentos sociais. Ele nos permite desen-volver uma crítica sistemática do conceito de classee de sua naturalização na tradição marxista esocialista. Se concebemos classe de um modo não-naturalista, temos de definir classe independente-mente de critérios naturalistas. Isso não nos levará,nas páginas seguintes, nem à redução do conceito

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de classe a uma variável demográfica composta,nem a sua eliminação. Antes, tentaremos desenvol-ver um conceito de classe que corresponda a umasociedade que cruzou sua fase semimoderna, etentaremos mostrar que o conceito de movimentosocial é preponderante para esse esforço.

Uma explicação dos novos movimentos sociais emtermos de teoria da classe: uma crítica de Melucci

A conclusão que foi extraída dessa coinci-dência é que os dois (classe e movimentos sociais)estão inter-relacionados. De acordo com a análisede classe tradicional, nós simplesmente verificaría-mos se os “membros” (ativistas, apoiadores, votan-tes de protesto etc.) dos novos movimentos sociaissão recrutados nas novas classes médias (e/ou emoutras frações das classes médias) definindo classemédia em termos de características socioestrutu-rais.43 Isso explica por que os processos demográ-ficos (especialmente a expansão educacional euma estrutura ocupacional cambiante) fornecemoportunidades para mobilização. Mas podemosexplicar esses fenômenos igualmente bem sem oconceito de classe (ver Pakulski, 1995). Sabemosque um grupo social, tendo tido a experiência demobilidade cultural para cima em termos de educa-ção e sendo ativo no setor de serviço social, estápropenso a maior mobilização nesse campo deconflitos. A discussão do radicalismo da classemédia a que nos referimos demonstra que há umaestrutura de oportunidade social para a “constitui-ção de uma classe”. Esses grupos de classe médiasão aqueles engajados em ocupações qualificadasde produção e serviço, isto é, aqueles com umaformação educacional que os distingue da culturada classe operária, e aqueles que produzem ereproduzem os recursos culturais nas sociedadesmodernas.

Até aqui discutimos os elementos fornecidospor uma estrutura de oportunidade social para aconstrução de uma classe social. É um problemaem aberto em que medida esses elementos levama um todo unificado, a mais que uma agregação detraços individuais. Para procurar fatores adicionaisque constituem uma classe eu proponho olharpara o espaço cultural no qual esses grupos depessoas se entendem.44 Nossa análise histórica

mostrou que a história das classes médias e suaposição socioestrutural entre a classe operária e aclasse capitalista dentro da velha relação de classedeixaram o problema da identidade como umapreocupação central para as classes médias. Asclasses médias vivem com uma noção tradicionalda boa vida, com as relações sociais consensuaiscumprindo um papel proeminente. Portanto, com-plementamos a idéia de uma estrutura de oportu-nidade social com a idéia de uma “estrutura deoportunidade cultural” específica. A definição deum novo campo de conflitos, centrado nos meiossociais de realização de identidade, nos permitereunir os “novos movimentos sociais” e a “novaclasse média”.45

Entre os recursos semânticos disponíveisnessa estrutura de oportunidade, dois conceitostêm importância central: o conceito de boa vida eas idéias relacionadas de comunidade e mundo davida; e o conceito de relações sociais consensuais,que tem de ser visto junto com o conceito decomunicação. O primeiro conceito, boa vida, foi abusca da classe média por mais de um século. Eleé acima de tudo uma noção religiosa: a boa vida élevada por pessoas boas. Os grupos religiosos sebaseiam nessa bondade — e essas noções religio-sas não sobreviveram nem na classe baixa nem naalta, tornando-se, por eliminação, um fenômenode classe média. A busca dos jovens por alternati-vas para a cobiça, o materialismo e a violência dageração mais velha é uma expressão da dinâmicainterna da cultura de classe média que nuncaabandonou sua busca por boa vida. A abominaçãodos valores de classe média se expressava naliberdade sexual, na oposição à guerra do Vietnã,e assim por diante. Hoje, as classes médias estãoobcecadas com o engrandecimento pessoal, aautonomia e a competição. Essa é a base culturalsobre a qual foram construídos os novos movimen-tos sociais, e da qual eles extraíram suas fontesmotivacionais e ideacionais.46 A cultura da boavida é mais que uma idéia filosófica: é a expressãode um estilo de vida específico de classe.47 Pode-mos aplicar essa idéia ao protesto e à inquietaçãosocial contemporâneos relacionados principal-mente a questões ambientais: riscos e dano ambi-entais são exatamente aquelas coisas que mais

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ameaçam uma boa vida porque ameaçam o mundofísico e, cada vez mais, o mundo psíquico.

O segundo conceito, relações sociais con-sensuais, alimenta a idéia de um estilo de vidaautêntico no qual as pessoas interagem comoiguais e livres. A comunicação é um aspecto centraldo estilo de vida da classe média. Desde assuntosdidáticos (como educar os filhos) até questõespessoais (como resolver conflitos com seus parcei-ros), essa cultura da comunicação começou a servircomo um código integrador da cultura de classemédia.48 As classes baixas estavam tradicional-mente e objetivamente fadadas a negar o primadoda comunicação (elas simplesmente não eramcapazes de se comunicar do modo como as outrasclasses podiam). A comunicação das classes domi-nantes, por outro lado, tinha de ser exclusiva(portanto elas se engajavam em códigos de comu-nicação ritualizados e especializados). A comuni-cação de risco parece ser a versão mais nova daascensão da cultura de classe média em protesto emobilização coletiva.49 Parece que tudo isso con-feriu às relações sociais consensuais o papel que aantiga burguesia atribuía a elas duzentos anosatrás.

Mas a teoria, nós propomos, dá um passoadiante acrescentando um terceiro elemento alémda estrutura de oportunidade social e da estruturade oportunidade cultural. Ela afirma que os novosmovimentos sociais contêm mais que característi-cas socioestruturais e histórico-culturais específi-cas. Antes, ela interpreta esses movimentos dentroda estrutura de classe de um tipo emergente desociedade. Na medida em que a teoria de classe foiaplicada a esses movimentos, esta acabou sendouma aplicação dominada pelo modelo de classe davelha sociedade industrial. A teoria “ortodoxa” éassociar a nova classe média com a relação declasse tradicional estendendo a classe dominadapara além da classe operária tradicional. Então osnovos movimentos sociais são simplesmente vari-ações do conflito de classe baseado “em últimainstância” na classe operária. A teoria “heterodoxa”é definir as classes médias como situadas fora dasclasses sociais ou entre elas. Então esses movimen-tos aparecem de modo negativo; eles estão preo-cupados com questões que são mantidas fora dos

conflitos de classe tradicionais, estão preocupadoscom questões que não são de classe; em vez delutar por uma participação nos recursos societais,eles “defendem” um mundo da vida.50 Contraessas teorias de classe ortodoxa e heterodoxa dosnovos movimentos sociais, proporemos a teoria deque a nova classe média é um elemento de umnovo tipo de relação de classe.

Essa teoria argumenta que há uma novarelação de classe emergente que tem sua lógicaprópria e diferente, mas não nega a existência derelações que não são de classe fora dessas classesmédias. Certamente, gênero e etnicidade são for-mas alternativas e concorrentes de relação social econflito social, mas essas são coletividades social-mente construídas com base em “símbolos natu-rais”. As classes, ao contrário, existem como fatossociais, ou seja, como coletividades socialmenteconstruídas com base em símbolos definidos soci-almente. Essa é a diferença básica entre a classe eoutros critérios que identificam coletividades. Asclasses médias estão relacionadas umas às outrasnão mais por condições objetivas de existência,mas por suas práticas coletivas para definir ummodo de existência social. O antagonismo funda-mental que subjaz esse modo de existência é,como argumentado acima, o conflito sobre osmeios de uma existência “identitária”. Ademais,esse conflito não resolve a questão do que é aidentidade. A forma específica da classe média deexperimentar e perceber o mundo é, como jádeclarado, caracterizada pelo uso de dois concei-tos cruciais e prediletos: boa vida e relações sociaisconsensuais. O que dá às classes médias o statusde uma classe potencial não é a sua história, que asliga a um conflito de classe antigo, mas sua inser-ção direta numa relação social antagônica que édefinida pelo controle sobre os meios de criaçãode uma identidade, de um estilo de vida identitário.Esse conflito tem um caráter de classe porque nãohá nenhuma outra solução para esse antagonismoque não seja por mudanças estruturais na distribui-ção de poder. Como a identidade é um bemindivisível, o conflito sobre a identidade não podeser submetido a resolução judicial; o conflito estáestruturalmente inscrito no problema e nos gruposnele envolvidos.

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Nossa teoria consiste, conseqüentemente, detrês elementos. O primeiro é a estrutura de opor-tunidade social que se desenvolveu a partir dosconflitos de classe do período que antecedeu asformas contemporâneas de mobilização e conflito.Nessa estrutura de oportunidade social, as classesmédias são definidas meramente por sua localiza-ção específica nas relações de classe tradicionais.Essa posição média continua a fornecer um tipoespecífico de experiência e percepção do mundoque torna esses grupos propensos a se engajaremem questões além das questões de classe tradicio-nais. O segundo elemento são os temas culturaiscaracterísticos da história do radicalismo da classemédia que estão intricadamente relacionados àlocalização socioestrutural das classes médias. Oterceiro — e decisivo — elemento de nossa teoriaé que uma nova relação de classe deve se basearno critério do controle dos meios de uma existên-cia social “identitária”, no sentido de garantir iden-tidade e relações sociais expressivas. Esses meiosde existência social não mais são descritos comomeios de produção, mas como meios de expressãocultural. Diferenças de poder se referem ao modocomo a oportunidade de realizar identidade édefinida e seus ativos são desigualmente distribu-ídos. Esses três elementos contribuíram para umaforma de mobilização que conseguiu redefinir arealidade social em termos dicotômicos. Isso tornaos grupos de classe média, que até agora foramdefinidos como um caso problemático na teoria daclasse tradicional, o centro não-problemático deuma nova relação de classe. Argumentamos que as“classes médias” são classes potenciais, e devemosidentificar as condições específicas nas quais aclasse vai dominar as lutas contemporâneas relati-vas a uma existência identitária.

A classe social tem importância

Nossa pergunta original pode então ser res-pondida com um claro “sim”: as classes sociais têmimportância. A classe é uma construção social quereúne categorias sociais para formar um todo maisabrangente. Isso pressupõe uma prática coletiva.Analisamos a prática das classes médias como umaprática coletiva e criativa desse tipo; identificamos

nela a construção social do campo de conflito declasse assim como a construção social de umaidentidade coletiva como classe social além dosdeterminantes naturais e naturalizados da existên-cia social. A classe acabou sendo a variável quenecessitava de explicação. O principal resultado denossa teoria é uma mudança radical na questão depesquisa. Essa questão é: quais são os fatores quecontribuem para a capacidade de agência coletivacom o objetivo de definir suas características emtermos de conflitos ou antagonismos estruturais?Aqui identificamos variáveis socioestruturais (aascensão de grupos de classe média dentro daestrutura de classe tradicional) e variáveis culturais(uma história das preocupações da classe média talcomo são expressas nas diversas formas de radica-lismo de classe média). Acrescentamos finalmenteuma terceira variável para fazer uma distinçãoentre conflitos e antagonismos sociais que podemse tornar o campo das relações de classe e aquelesque não podem fazê-lo. A proposição teórica édefinir como um elemento de uma nova relação declasse emergente qualquer conflito que tenha a vercom a exclusão dos meios de uma existência social“identitária”. Os novos movimentos sociais preocu-pados com a realização de uma existência “identi-tária” são, portanto, aqueles que alimentam aconstrução de novas relações de classe. Nessesentido a classe tem importância nos novos movi-mentos sociais.

A pergunta sobre se os novos movimentossociais atravessam linhas de classe ou manifestamnovas divisões de classe emergentes em socieda-des industriais avançadas levou às hipóteses con-correntes de “radicalismo de classe média” versus“comportamento de protesto individualizado”.Uma análise da história do radicalismo pequeno-burguês permitiu a identificação entre algumascontinuidades em seu desenvolvimento e formasde protesto atuais. Variáveis adicionais são locali-zadas na estrutura social (na emergência e nadiferenciação interna dos grupos sociais não-pro-letários). O argumento em favor de uma perspec-tiva de classe foi ainda sustentado por uma críticametodológica da literatura “anticlasse” sobre movi-mentos sociais, mostrando que a suposição anti-classe é o produto de pressupostos metodológicos

A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? 19

individualistas na pesquisa atual do movimentosocial. Os novos movimentos sociais não são certa-mente um movimento de classe no sentido tradici-onal do século XIX. Todavia, eles podem ser vistoscomo uma manifestação de um novo tipo derelação de classe no qual ocorre a “constituição daclasse média” nas sociedades modernas avança-das.

NOTAS

1 Essa questão foi levantada de novo por Clark e Lipset(1991), que argumentam em favor da teoria de que asclasses estão se extinguindo. Essa afirmação foi enfra-quecida em Clark et al. (1993), que a reduz ao declíniodo significado político da classe. A resposta de Pakulskiestá de acordo com a idéia proposta no seguinte: queessas hipóteses e teorias talvez se devam à noçãotradicionalista de classe (Pakulski, 1993). Eu acrescenta-rei um outro argumento ao debate afirmando que aligação entre determinação estrutural e ação coletiva émuito mais complexa que o que pode ser representadopela idéia de uma “correlação” entre classe e ação.

2 O termo “categoria” ainda deixa aberta a questão de seestamos lidando ou não com classes. Ser capaz deidentificar categorias de pessoas não é uma condiçãosuficiente, mas uma condição necessária para a existên-cia de classe. A segunda condição a ser introduzida é omundo simbólico no qual uma sociedade interpreta asdiferenças categoriais que existem numa sociedade.Esse segundo elemento é historicamente variável, e essaé a razão pela qual a idéia de classes determinadas“economicamente” é uma interpretação culturalmente ehistoricamente específica das diferenças categóricasentre as pessoas.

3 O movimento ambientalista é um bom exemplo. Suauniversalidade consiste no apelo a uma integração danatureza na sociedade, a uma extensão gradual dedireitos dos humanos aos direitos da natureza. Seucaráter de classe está fundamentado no fato de que aação ambientalista produzirá categorias de pessoas comganhos (aqueles com interesse em uma economia eco-logicamente modernizada) e categorias de pessoas comperdas (aqueles que são excluídos da natureza comoum mundo da vida esteticamente recompensador). Omeio ambiente é um campo de luta de classe assimcomo um campo de demandas por mais direitos políti-cos de modo a incluir direitos para animais ou para anatureza como um todo.

4 Isso também exclui a redução das classes a grupos quepartilham um “habitus” específico. Ao definir as classesem termos relacionais e não em termos substanciais,estaremos mais bem equipados para ver os antagonis-mos que separam as classes sociais. Nossa teoria, comoa de Bourdieu (1984), dá ênfase à diferença entre uma

construção teórica da classe em termos de antagonis-mos sociais e a realidade empírica da classe (Bourdieu,1987). Todavia, ele se desvia de sua proposição emrelação aos indicadores empíricos de classe, que são,em última instância, idênticos aos traços sociopsicológi-cos de grupos de status.

5 Isso é básico para a concepção marxista de classe, acimade tudo em sua variante socialista. A variante comunistafoi orientada mais para a determinação estrutural dospoderosos (a qual, a propósito, poderia explicar osefeitos reais desse tipo de pensamento).

6 Essa noção generalizada de classe subjaz as análises dospobres como uma classe sem poder (Piven e Cloward,1972). O interesse na classe como uma elite de poder foiproposto por Mills (1956). Há também versões conser-vadoras da classe como uma elite de poder. São bonsexemplos não só as teorias clássicas das classes domi-nantes (Mosca e outros), mas também as teorias maisrecentes da “nova classe” (Schelsky, 1975; Gouldner,1979). Para uma boa discussão desses suposições verMcAdams (1987).

7 As classes médias são compostas de pelo menos trêsgrupos diferentes: os velhos e novos auto-empregados,os empregados de escritório e a nova classe média(aqueles que trabalham na indústria da cultura e nobusiness de saúde). Para essa distinção ver Bourdieu(1984). Dados sobre os novos auto-empregados (omenos conhecido desses três grupos) são apresentadospor Steinmetz e Wright (1989). Para dados sobre aAlemanha ver Bögenhold (1985) e, com uma perspecti-va mais histórica, Winkler (1983). Para uma análiseempírica da velha e da nova classe média na Alemanhaver Pappi (1981).

8 Esses termos podem ser encontrados em Marx, ondeeles também tinham uma função política. Essa cargaideológica e política é outro indicador do efeito pertur-bador que esses grupos tiveram para a teoria de classetradicional. Um bom resumo da discussão da classemédia com referência especial à nova classe média éapresentado por Burris (1986).

9 Isso se deve principalmente a Bourdieu, cujo trabalho éàs vezes visto como um tratado sobre a classe média.Isso é verdade pelo menos no caso de seu livro maisfamoso, A distinção (Bourdieu, 1984), mesmo conside-rando o fato de que ele se aferra à imagem negativatradicional da classe média. Uma visão mais positiva doradicalismo da classe média cumpriu um importantepapel na discussão do movimento ambientalista e nomovimento pela paz. Ver Parkin (1968) como umafigura inicial, assim como Cotgrove e Duff (1980 e1981), Kann (1986), Brand (1990) e Offe (1985c). Vertambém Eder (1993, pp. 141ss.).

10 Essa versão “nova classe” dessa hipótese pode serencontrada em idéias expressas por Ehrenreich (1989).Esta autora argumenta que aqueles que “descobrem”outras classes — profissionais, pessoal da mídia, admi-nistradores e intelectuais — são uma classe média comum enorme poder sobre nossa cultura e nossa própria

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auto-imagem como pessoas. Sua análise não lida comrelações de classe, mas com a vida interna dessa classe,com as sugestões de classe que tornam essa classereconhecível para seus membros.

11 Eu falo de classes médias apesar do fato de que se tratade grupos sociais definidos por sua exclusão de umarelação de classe. Isso é terminologicamente inconse-qüente, mas nós persistimos no termo porque nosacostumamos a descrever esses grupos como classesmédias. O uso do plural é julgado suficiente para indicara natureza específica de ser classe das classes médias.

12 Uma versão sofisticada da última explicação pode serencontrada em Pakulski (1988 e 1991). Ele argumentaem favor de uma interpretação em termos que não os declasse, usando os conceitos de “geração”, “posição” e“mobilidade” para explicar a base social dos novosmovimentos sociais. Mas essas variáveis não substituemuma análise de classe; elas simplesmente indicam quehá uma dimensão temporal, uma dimensão institucionale uma dimensão social para o fenômeno dos novosmovimentos sociais. Nem todas as gerações são igual-mente afetadas, e isso aponta portanto para conjunturashistóricas. Nem toda posição autônoma em um ambien-te institucional leva a mobilização; os membros daclasse rentista dos séculos XIX e XX viveram sem sermobilizados em seus nichos institucionais. Uma mobili-dade em direção à cidade não leva necessariamente àação de movimento; a ação desviante é obviamente umequivalente funcional. A questão interessante é sobquais condições esses fatores realmente levam à ação demovimento. A afirmação aqui é que essas condições têma ver com seu papel e sua função nas relações de classe.

13 Esse fenômeno é extensamente tratado em Eder (1985).A literatura sobre o espaço público emergente no finaldo século XVIII e no XIX é pertinente aqui.

14 Esse foi o objeto de estudos de um setor de serviçoemergente e mesmo de uma sociedade de classe deserviço. A discussão vai de Touraine (1969), passandopor Gershuny (1978 e 1983), até Esping-Andersen(1993).

15 Ver, por exemplo, Kracauer (1985). Argumentos seme-lhantes podem ser encontrados em Lederer (1912 e1979) e Dreyfuss (1933).

16 Ver Winkler (1971 e 1979), que fez uma extensa pesqui-sa sobre esses grupos. Ele argumenta que esse grupo setornou — ao menos na Alemanha — o portador do quefoi chamado a “refeudalização” das classes burguesas,que explica seu habitus social e político específico.Tendências contrabalanceadoras, tendo a ver com pro-cessos de sindicalização, são analisadas por Prinz (1981)e Kocka e Prinz (1983). As classes médias foram tambémresponsabilizadas pela ascensão do fascismo. Há litera-tura controversa sobre a questão de em que medida ofascismo foi uma mobilização de classes médias e umamanifestação de cultura de classe média. Esse argumen-to foi apresentado por Speier (1977) e por Hamilton(1982) e foi pesadamente criticado por Falter (1982 e1984).

17 A nova classe média é com freqüência considerada umanova elite tecnológica e cultural em razão de sua maiorcapacidade conceitual, seu melhor conhecimento e suamaior oportunidade de se envolver em política (Baker etal., 1981, pp. 10-11; Alber, 1985). Lipset (1988) tambémargumenta em favor da última hipótese. Para afirmaçõesmais completas ver Schelsky (1975), Gouldner (1979) eKonrad e Szelenyi (1979). Um argumento bem montadoem favor dessa posição é encontrado em Lash e Urry(1987, pp. 161ss.). Ver também Abercrombie e Urry(1988) e Carter (1985). Para a interpretação alternativareferente a uma novo proletariado de serviço ver Es-ping-Andersen (1993, pp. 7ss.).

18 A expressão “classe média” já é reveladora: ela implicaa tentativa de encontrar uma localização para grupossociais em uma relação de classe que não é realmenteuma localização. O paradoxo produzido pela expressão“classe média” é que há classes e há grupos que nãofazem parte da relação de classe definida por essasclasses e ao mesmo tempo são definidos em termosexatamente dessa relação. Importante nesse contexto éa discussão marxista sobre as classes médias. Ver Bech-hofer et al. (1978) e Bechhofer e Elliott (1981 e 1985).Para uma crítica ver Goldthorpe (1978). Outras explica-ções numa moldura marxista são encontradas em Burris(1980), Wright (1985, 1986 e 1990), Johnson (1982) eAbercrombie e Urry (1988).

19 Hamilton e Wright (1986) até falam simplesmente das“massas”. Para as excentricidades do discurso sobre aclasse média na América ver DeMott (1990).

20 As classes médias contribuíram muitas vezes para apatologia moderna do universalismo. Sendo as portado-ras de formas modernas de modalidades antiuniversalis-tas de cidadania (isto é, formas nacionalistas, populistasou até racistas), elas se impedem de tornar-se uma forçahistórica na realização de uma sociedade civil.

21 Elas também, a propósito, permitem o embutimento daformação de grupo na história cultural. Isso é importan-te no caso do radicalismo de classe média, que só podeser entendido em contextos históricos.

22 Aqui a obra muito negligenciada de Moore (1978) sobrea injustiça expressa como uma base de desobediência erevolta é pertinente.

23 Isso não significa que mais modernização ainda vádepender desse interesse. A discussão ecológica, pelomenos, levanta dúvidas sobre a dominância contínuadesse interesse. Para a discussão clássica ver Hirschman(1977 e 1982). Uma revivescência dessas discussõesocorre no que foi chamado de “Marxismo Analítico”(Roemer, 1986). A questão em todas essas discussõespermanece a mesma: os interesses desempenham umpapel importante, mas sem que sejam contextualizadosem normas e valores os interesses não funcionam. Paraum apelo em favor da introdução de normas em umquadro teórico baseado em interesses, ver Elster (1989).Para uma tentativa análoga de fazê-lo com valores verHechter (1989, 1990 e 1991).

A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? 21

24 Nesse contexto evitamos o termo “classe” pois ele éreservado para um nível de análise além dos gruposreais de pessoas. Mas na literatura o termo “classe” éusado frouxamente. As definições institucionais consi-deradas acima normalmente foram discutidas no con-texto da classe (ver as contribuições de Clegg, 1989).Um exemplo interessante do papel das normas institu-cionais na definição de grupos ocupacionais como umaclasse é o estudo da formação dos cadres na França(Boltanski, 1982). Uma aplicação das regulações norma-tivas da cidadania e de seus efeitos sobre a diferenciaçãode “classes” de cidadãos pode ser encontrada em Lo-ckwood (1987).

25 O trabalho clássico é o de Centers (1949), que discutiuclasse em termos de atitudes e orientações de valor. Osvalores foram proeminentes na Sociologia durante adominância da sociologia parsoniana. Uma obra impor-tante nessa tradição é Kluckhohn e Strodtbeck (1961).Desde então foi só com Inglehart (1977 e 1990a) que opapel dos valores voltou a receber atenção. Ver tambéma resposta negativa à pergunta “Os valores deveriam serescritos a partir do ‘léxico’ dos cientistas?” dada porHechter (1991).

26 A redução demográfica do conceito de classe é caracte-rística da maior parte da pesquisa sobre estratificação emobilidade. Para uma discussão recente do papel dateoria da classe na pesquisa quantitativa de estratifica-ção, ver Sørensen (1991). Ele sustenta que não precisa-mos de teoria de classe para explicar a desigualdade nomercado de trabalho ou diferenças de renda. Uma talirrelevância até sustentaria nossa exigência de umaperspectiva de teoria da classe. A teoria da classe não éuma teoria do funcionamento do mercado de trabalho,mas da construção social de campos de ação conflitan-tes. O argumento no que segue será que as dimensõesdemográficas são categorias pessoais, que a ocupação,o nível educacional e características do domicílio ga-nham sua força estruturante não em si, mas pelosignificado dado a eles pelos atores, pelas instituições epela cultura existente.

27 Essa teoria se opõe àquela que vê o problema da ordemsocial como o problema básico de uma teoria dasociedade. Isso não implica que o problema da ordemsocial seja irrelevante; só afirma que ele é um problemasecundário que surge da capacidade de agir nas ordenssociais existentes. Essas ordens são mesmo definidas demodos diferentes: como equilíbrios de interesses, or-dens normativas ou ordens baseadas em valores parti-lhados. A tradição sociológica não chegou a um acordoa respeito de qual era o aspecto central da ordem social.Nós simplesmente vemos essas como três diferentesformas de criar ordem social, o que implica que a teoriatem de explicar por que os atores escolhem uma delas.Uma primazia teórica do problema da agência é arespeito do problema da ordem. Esse argumento podese basear em argumentos teóricos apresentados, porexemplo, por Giddens (1973 e 1987) e Touraine (1981).

28 Para um sumário ver Eder (1993, pp. 42ss.); para umadiscussão do argumento da psicologia de massa ver

Moscovici (1985); para a teoria da privação relativa verGurr (1970); e para a teoria da mobilização de recursos,Zald e McCarthy (1979 e 1987).

29 Refiro-me em particular a Inglehart (1977 e 1990a),Habermas (1984 e 1987) e Beck (1992). Melucci (1995)também defende um programa individualista radical,centrando o problema da mobilização coletiva em tornodo problema da subjetividade.

30 Essa idéia foi adotada para reformular a velha teoria derelações de classe em um novo esquema conceitual. Aobra dos “marxistas analíticos” é central aqui; ver Roe-mer (1982 e 1986) e Elster (1982 e 1985b). Para umadiscussão ver Offe (1985a). A lógica diferencial raciona-lista subjacente ao conflito de classe industrial foimostrada muito bem em termos das “duas lógicas” deação coletiva representando as duas classes tradicionais;ver Offe e Wiesenthal (1980). O efeito paradoxal é quetão logo argumentemos em termos da teoria dos jogos,a imagem tradicional das relações de classe reaparece;essa teoria entende as relações de classe característicasde relações industriais, o que aponta para uma culturaimplícita contida mesmo em tais teorias “livres decultura”.

31 Um problema adicional tem a ver com o individualismometodológico subjacente à pesquisa de levantamentode crenças e opiniões. O individualismo metodológicodá às pessoas status igual: todos têm uma opinião (comalguns casos marginais que nunca têm opinião) e ésuficiente olhar para a distribuição dessas opiniões.Todos têm recursos (ter uma opinião é apenas um deles)para indicar diferenças e mesmo mudanças na cultura.Valores pós-materialistas podem ser combinados comvelhos e novos valores de diferentes modos, mas elesnão necessariamente covariam com preocupações eco-lógicas; eles têm diferentes impactos sobre a capacidadee o potencial de ação coletiva, dependendo de suarelevância-ação, que pode variar consideravelmente. Sótemos, conseqüentemente, indicadores que precisamde interpretação extensiva para ter relevância na expli-cação de culturas de mobilização.

32 O retorno do problema da identidade no discursopúblico moderno e seu papel na moldagem de relaçõessociais já são provas do poder que esses elementos têmna sociedade. É também um sinal de que as relações declasse tradicionais não mais desempenham um papelimportante nas lutas que caracterizam as sociedadesmodernas. A mudança na teoria sociológica para odomínio simbólico, para uma noção dramatúrgica deação social, também é significante. Ver, por exemplo, aintrodução de Gusfield à obra de Kenneth Burke (1990).

33 Touraine (1985a e 1985b) às vezes argumenta de ummodo que chega perto de uma tal teoria, mas elepermanece basicamente indefinido sobre o status dateoria da classe em sua teoria da ação.

34 Todavia, sua posição é ligeiramente menos radicalconsiderando-se seus argumentos em relação à tese deClark e Lipset (1991) de uma extinção da classe. Pakul-ski (1993) argumenta que as classes são encerradas num

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quadro de referência (o marxista) que exclui a possibi-lidade de vê-las no mundo pós-industrial emergente.Esse é também o argumento aqui: as classes existem, ealguns dos velhos modelos teóricos não mais nospermitem vê-las. Temos de testar novas teorias da classepara verificar se elas nos permitem ver mais.

35 Essa hipótese já foi defendida por Cohen (1985), Offe(1985c) e mais explicitamente por Melucci (1985, 1988 e1989). Ver também a discussão em Olofsson (1988), queafirma que os novos movimentos sociais são movimen-tos culturais. Este autor, porém, relativiza o papel dessesmovimentos, argumentando que eles não estão —como os velhos movimentos — necessariamente vin-culados a mudanças societais. Esse último argumentopermite uma explicação “fraca” em termos de teoria daclasse.

36 Essa é uma recapitulação de uma tese formulada porLederer em 1913! Ver Lederer (1979). Ver também minhadiscussão em Eder (1989).

37 Para esses argumentos ver, entre outros, Bürklin (1984e 1987) e, recentemente, Blossfeld e Shavit (1993).Bürklin voltou-se para as teorias cíclicas para explicar aascensão e a queda da mobilização e do protestosupondo uma estabilidade latente das instituições emrelação às vicissitudes do protesto. Blossfeld e Shavitradicalizam essa abordagem supondo um conservado-rismo latente na estrutura social e na estratificaçãosocial, que toma o protesto como manifestações de umreequilíbrio das estruturas sociais, como um fenômenotransitório na auto-organização das estruturas sociais.

38 Isso aponta novamente para os tipos autodestrutivos deanálise de classe que foram usados na discussão daclasse e dos movimentos sociais. Eles aderem a umaidéia determinista de classe que nega propriedadessocioculturais que emergem das relações entre classespor meio da redefinição dos interesses, normas e valo-res que estão em jogo. Esses efeitos emergentes, afirma-remos abaixo, podem ser explicados dentro de umamoldura de teoria da classe que defina as classes comoatores coletivos que criam arenas para lutas sociais econtribua para a diferenciação de classe segundo linhasque são diferentes daquelas que dominaram até agora asociedade industrial.

39 Eu evito atribuir um papel histórico a esses movimentos.O efeito é uma mudança nas estruturas políticas e nosprocedimentos de tomada de decisão tradicionais que,como um resultado do compromisso de classe com aclasse operária, dominaram até agora as sociedadesmodernas. Esse sistema institucional é posto em ques-tão, e temos de analisar os modos como essa reorgani-zação será efetivada.

40 A discussão dos novos movimentos sociais é centrada— implícita e mesmo explicitamente — principalmentenessa questão, de Habermas (1984 e 1987) e Touraine(1985a) à pesquisa de movimento orientada mais empi-ricamente (Rucht, 1991).

41 Esse, afinal, permanece o critério básico da “novidade”dos novos movimentos sociais: que eles se concebem

como práticas para as quais não existe razão histórica(= necessária = natural) de existir; antes, a natureza évista como algo a ser criado (ou defendido por meio daprática). Nesse sentido, o movimento ecológico é omovimento antinaturalista mais radical que pode serconcebido, pois ele toma a natureza não como umdeterminante da ação social, mas como uma meta deação, o que inverte completamente o naturalismo carac-terístico dos movimentos sociais dominantes do séculoXIX e da primeira metade do XX (Eder, 1988 e 1993).

42 A crescente importância do “discurso público” comomecanismo para criar essas arenas é refletida na viradaque a pesquisa de comunicação de massa e a análise dodiscurso público deram nos últimos anos. Ver, como umexemplo proeminente, Gamson (1988 e 1992) e Gam-son e Modigliani (1987 e 1989).

43 Para tais tentativas ver Bürklin (1984), Kriesi (1987) eHulsberg (1988). Kriesi (1989) argumenta em um estudoempírico dos novos movimentos sociais holandeses quea classe média é ela própria dividida, sendo os maisentusiásticos apoiadores a geração mais jovem de “espe-cialistas sociais e culturais” que inclui profissionais esemiprofissionais de ensino, serviços médicos e sociais,as artes e o jornalismo. Para uma análise sofisticadabaseada nessa teoria em relação ao caso alemão verVester (1983 e 1989).

44 Em vez de idealizar o espaço público como a esfera dodiscurso, uma explicação realista olha para o espaçopúblico como algo embutido na classe social. Para umatentativa de adotar a noção habermasiana de espaçopúblico numa perspectiva crítica antiilusionária ver Eder(1992).

45 Essa é uma idéia contrária à de Melucci (1995), queargumenta que os novos espaços públicos criam aoportunidade para um tipo auto-reflexivo global deação coletiva que deve ser visto como desligado daestrutura social. Ele substitui a metafísica do ator coleti-vo simplesmente por uma noção voluntária (ou noção“agência”) do ator coletivo que nos proíbe de verafirmações de identidade como socialmente enraizadase determinadas.

46 Há dois livros muito diferentes relacionados a essetópico: Baritz (1989) e Bourdieu (1984).

47 Uma das hipóteses interessantes é de Featherstone(1989), que argumenta que a nova classe média tem umefeito na ascensão do pós-modernismo. Uma teoriageral das posições da classe média e das culturas declasse média está contida em Bourdieu (1984). Vertambém Gans (1988) para uma tentativa de estender àclasse média como um todo a idéia de “individualismo”como uma orientação cultural básica.

48 Isso é verdade acima de tudo para a nova classe média;mas é também um aspecto importante dos outrosgrupos de classe média que usam a competência comu-nicativa para marcar sua diferença das classes baixas.Tem um espelho na discussão social-científica clássicade códigos restritos e elaborados como subjacentes aosestilos de vida da classe baixa e da classe média.

A CLASSE SOCIAL TEM IMPORTÂNCIA NO ESTUDO DOS MOVIMENTOS SOCIAIS? 23

49 A comunicação de risco está intricadamente emaranha-da na cultura das classes médias. Vista historicamente, avida da classe média foi arriscada em razão do impactoda economia capitalista. O alinhamento das classesmédias com o Estado as sensibilizou para o problema domundo da vida enquanto tal, acima de tudo para osriscos ambientais de hoje.

50 Para tentativas “heterodoxas” de integrar a perspectivade classe numa estrutura macrossociológica e sócio-histórica mais ampla ver Habermas (1987), Offe (1985be 1985c), Luke (1989) e Brand (1990), que tentamcombinar o tipo “europeu” de explicação dos novosmovimentos sociais com a análise de classe.

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