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8 Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013. MARTINS, Ricardo Ramos 1 , CALCANHOTTO, Flávio Abreu 2 , MARTINS, Bibiana Volkmer 3 , FRANCO, José Boaventura da Rosa 4 Resumo A evolução da secagem e armazenagem de grãos nas pequenas propriedades do Estado do Rio Grande do Sul, embora seja um tema estratégico aos produtores, somente nas úl- timas duas décadas vem ocupando o devido espaço. Tanto a secagem, como a armazena- gem, passam a ser ações importantes na po- lítica pública de assistência técnica e exten- são rural (ATER) promovida pela Emater/RS. Desde o final da década de setenta, várias tecnologias de armazenagem têm sido dispo- nibilizadas aos produtores, cujas primeiras inovações tecnológicas foram o paiol de tela com estrutura construída em madeira, silo A armazenagem sustentável como inovação para a pequena propriedade 1 Engenheiro Agrônomo, Extensionista de Nível Superior da Emater/RS. Mestre em Pré-Processamento de Produtos Agrícolas pela Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (FEAGRI – UNICAMP). E-mail: [email protected] 2 Engenheiro Agrônomo, Extensionista de Nível Superior da Emater/RS. Mestre em Economia Rural pela Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FCE/IEPE-UFRGS). E-mail: fl[email protected] 3 Doutoranda em Administração, Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA-EA/UFRGS). Mestre em Administração, PPGA-EA-UFRGS. E-mail: [email protected] 4 Engenheiro Agrônomo, Consultor Técnico na área de Pós Colheita de Grãos. E-mail: [email protected] plástico subterrâneo, tonéis de metal, paiol modelo Chapecó, o armazém graneleiro com aeração forçada e, mais recentemente o seca- dor solar com coletor armazenador em leito de pedra britada e o silo secador armazenador de alvenaria armada, que utiliza ar natural na secagem dos grãos. Todas estas inovações tecnológicas tiveram como objetivo oferecer aos produtores maior autonomia na gestão da comercialização ou mesmo para uso dos grãos na propriedade, tendo como ponto de partida a economia no processamento da secagem e armazenagem, uma maior flexibilidade para a tomada de decisão no momento de comer- cializar ou usar os produtos, e reflexos na melhoria substancial da qualidade dos grãos secos e armazenados, bem como um menor gasto energético no processamento.

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88Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

MARTINS, Ricardo Ramos 1, CALCANHOTTO, Flávio Abreu 2, MARTINS, Bibiana Volkmer 3, FRANCO, José

Boaventura da Rosa 4

ResumoA evolução da secagem e armazenagem de grãos nas pequenas propriedades do Estado do Rio Grande do Sul, embora seja um tema estratégico aos produtores, somente nas úl-timas duas décadas vem ocupando o devido espaço. Tanto a secagem, como a armazena-gem, passam a ser ações importantes na po-lítica pública de assistência técnica e exten-são rural (ATER) promovida pela Emater/RS. Desde o final da década de setenta, várias tecnologias de armazenagem têm sido dispo-nibilizadas aos produtores, cujas primeiras inovações tecnológicas foram o paiol de tela com estrutura construída em madeira, silo

A armazenagem sustentável como inovação para a pequena propriedade

1 Engenheiro Agrônomo, Extensionista de Nível Superior da Emater/RS. Mestre em Pré-Processamento de Produtos Agrícolas pela Faculdade de Engenharia Agrícola da Universidade Estadual de Campinas (FEAGRI – UNICAMP).

E-mail: [email protected] 2 Engenheiro Agrônomo, Extensionista de Nível Superior da Emater/RS. Mestre em Economia Rural pela Faculdade de

Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FCE/IEPE-UFRGS). E-mail: [email protected] Doutoranda em Administração, Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande

do Sul (PPGA-EA/UFRGS). Mestre em Administração, PPGA-EA-UFRGS. E-mail: [email protected] Engenheiro Agrônomo, Consultor Técnico na área de Pós Colheita de Grãos. E-mail: [email protected]

plástico subterrâneo, tonéis de metal, paiol modelo Chapecó, o armazém graneleiro com aeração forçada e, mais recentemente o seca-dor solar com coletor armazenador em leito de pedra britada e o silo secador armazenador de alvenaria armada, que utiliza ar natural na secagem dos grãos. Todas estas inovações tecnológicas tiveram como objetivo oferecer aos produtores maior autonomia na gestão da comercialização ou mesmo para uso dos grãos na propriedade, tendo como ponto de partida a economia no processamento da secagem e armazenagem, uma maior flexibilidade para a tomada de decisão no momento de comer-cializar ou usar os produtos, e reflexos na melhoria substancial da qualidade dos grãos secos e armazenados, bem como um menor gasto energético no processamento.

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99Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

Palavras-chave: Secagem. Armazenagem. Sustentabilidade. Agricultura familiar.

AbstractThe evolution of drying and storage of crops in small farms from Rio Grande do Sul State, although a strategic issue for producers, only in the two last decades has been occupying the proper spot. Both the drying and stora-ge, become important actions in technical assistance and rural extension public policy (ATER) promoted by Emater/Rio Grande do Sul State. Since the late seventies, several storage technologies have been available to producers, whose first innovations were the screen with barn structure built in wood, underground plastic silo, metal barrels, Chapecó’s barn model, the warehouse grain with forced aeration and, more recently the dryer with solar collector storer in the bed of crushed stones and the silo dryer storer from reinforced masonry, which uses natural air drying of grains. All these innovations were designed to offer farmers greater autonomy in the commercialization management as well for the use of grains in the property, taking as its starting point the economy in the process of drying and storage, greater flexibility for taking the time to decision making about the proper time to commercialize or use the pro-duct, reflects in substantial improvement of the quality of grain dried and stored, as well as a lower energy expenditure in processing.

Keywords: Drying. Storage. Sustainability. Family farms.

1 INTRODUÇÃO A armazenagem nas unidades familiares

do Rio Grande do Sul tem sido um tema re-corrente, ao longo dos últimos anos, nos en-contros técnicos sobre o cultivo de grãos em diversos eventos ocorridos no estado. Arma-zenar grãos em pequenos silos, principalmen-te o milho, além de ser mais econômico para o agricultor, conduz a uma maior qualidade do produto processado, refletindo em melhor desempenho das criações e quando da moa-

gem para produção de farinha, apresenta um produto altamente competitivo em nível de mercado. Existe uma tendência dos consumi-dores em cidades de menor porte no estado em adquirir, mesmo a preços mais altos, fa-rinhas de grãos originários de silos secadores e com moagem realizada através de sistemas tradicionais como os moinhos de pedra.

A assistência técnica e extensão rural (ATER) promovida pela Emater/RS, vem tra-balhado ao longo dos últimos trinta anos, na adaptação de tecnologias sustentáveis e de menor custo para a armazenagem nas peque-nas propriedades. O escopo deste artigo, em um primeiro momento é resgatar a história da armazenagem dos grãos nas propriedades familiares, e em um segundo momento, ofe-recer tecnologias que conduzam a uma maior sustentabilidade no gerenciamento dos grãos colhidos bem como discute o tema da sobera-nia alimentar a ser trabalhado junto às co-munidades rurais quando das ações exten-sionistas, e concluindo, com a apresentação de alguns cases de sucesso nos municípios de Casca, Nova Alvorada e Santa Cruz do Sul.

2 A EVOLUÇÃO DA ARMAZENAGEM NA PEQUENA PROPRIEDADE Para que se entenda a real importância

dos grãos – principalmente do milho – é fun-damental que antes se conheça de forma breve, a história da colonização no Estado do Rio Grande do Sul e a influência cultural da subsistência alimentar para as famílias imi-grantes.

A colonização alemã no solo gaúcho foi motivada pela necessidade de povoar o sul do Brasil, garantindo a posse do território, ameaçada pelos vizinhos castelhanos. A pri-meira leva de 39 imigrantes que chegou ao Estado remonta ao ano de 1824 e foi desti-nada à região do Vale do Rio dos Sinos. Para convencê-los a vir para o Brasil, o governo brasileiro à época acenou com uma série de vantagens: passagens a custas do governo; concessão gratuita de um lote de terra de 78 hectares; subsidio diário de um franco ou 160 réis a cada colono no primeiro ano e me-

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tade no segundo; bem como certa quantida-de de animais tais como bois, vacas, cavalos, porcos e galinhas, proporcional ao número de pessoas de cada família.

A partir de 1875, chegaram os primeiros grupos de imigrantes italianos, vindos das re-giões do Piemonte e da Lombardia, e depois do Vêneto, e se instalaram nas colônias Conde d’Eu (atual cidade de Garibaldi), Dona Isabel (atual cidade de Bento Gonçalves) e Caxias do Sul. Ali eles passaram a viver da plantação de milho, trigo e outros produtos agrícolas; porém, a introdução do cultivo da videira na região tornou a vinicultura a principal econo-mia dos colonos italianos.

A criação de animais e o cultivo dos grãos nessas regiões, principalmente o milho, re-montam à época da vinda dos colonos ale-mães e italianos para o Estado. A utilização desse cereal tanto na alimentação humana como dos animais, apresentava problemas de provisão ao longo do ano devido a sua sazona-lidade, o que obrigou os colonos a providencia-rem a construção de locais destinados a sua estocagem, como os paióis simples de madei-ra, que dividiam espaço com outros produtos, ferramentas e mesmo as próprias criações.

Com o passar do tempo houve evolução nas formas de armazenagem dos grãos no que concerne à sofisticação das construções, ao ponto de alcançar estruturas capazes de constituir uma rede de silos e armazéns para estocagem de grãos. Apesar destes enormes avanços ocorridos na armazenagem há que se levar em conta dois temas fundamentais: a distribuição espacial das unidades de estoca-gem e o custo de investimento para construí--las. Tais fatores têm sido a causa de perdas tanto quantitativas como qualitativas dos grãos colhidos anualmente no Estado, bem como, têm resultado na baixa rentabilidade dos pequenos produtores, os quais vendem antecipadamente suas safras ou a transpor-tam para fora da propriedade e depois preci-sam fazer o caminho inverso em virtude do uso dos grãos para alimentação dos animais. Na verdade, em algum momento da história parece ter havido a perda da identidade cul-

tural da armazenagem de grãos. O conheci-mento trazido com a colonização, de um sis-tema simples de estocagem nas propriedades não teve inovações tecnológicas que acompa-nhassem pari passu o desenvolvimento atin-gido com o modo de produzir (dos insumos e das máquinas agrícolas). Pode-se dizer que de certa forma houve um descuido em apon-tar soluções atualizadas para com a armaze-nagem, capazes de ser compatíveis com a ca-pacidade de investimento e de conhecimento dos produtores familiares. Esta situação é preocupante na medida em que se compa-ra com a realidade de países que têm uma estratégia de segurança alimentar consoli-dada. O Canadá chega a 85% dos grãos ar-mazenados nas próprias fazendas, enquanto que nos Estados Unidos é de 65% e Argenti-na 35%. Já no Brasil esse montante chega a apenas 14%, sendo que no início da década de oitenta este número não ultrapassava 4%. No Brasil ainda se paga um alto preço pela ineficiência das políticas públicas de estoca-gem. Tal postura acarreta em perdas em vá-rios níveis. Para o País, porque deixa de ar-recadar mais impostos; para os produtores, porque depois de correrem todos os riscos na lavoura dividem seu lucro ao expor os grãos às pragas, tais como os insetos e roedores, e também com os intermediários; para os consumidores as perdas se traduzem em au-mento dos custos de aquisição de produtos agrícolas, porque além de pagarem mais, a qualidade, não raro, é duvidosa.

No sentido de promover mudanças nas ca-deias produtivas dos grãos, o serviço de as-sistência técnica e extensão (ATER) oficial do Estado praticado pela Emater/RS vem buscando inovações tecnológicas de secagem e armazenagem de grãos que preconizam se-rem sistemas de baixa complexidade e de cus-to reduzido. As tecnologias mais recentes de secadores solares e silos secadores de alvena-ria que utilizam ar ambiente na secagem dos grãos têm se demonstrado ao alcance dos pro-dutores e podem representar ganhos expres-sivos por meio de uma adequada estocagem de suas safras (MARTINS et al., 2002a).

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5 b.u.= umidade expressa em base úmida. 6 Na forma de espiga, para o milho, cada metro cúbico

de paiol armazena apenas 270 kg ou 4,5 sacos de 60 kg.

3 O SURGIMENTO DE TECNOLOGIAS APROPRIADAS À PEQUENA PROPRIEDADE A partir do início dos anos oitenta, os técni-

cos da extensão rural, dos órgãos de pesquisa e empresas governamentais buscavam desen-volver estruturas viáveis para armazenagem de grãos, principalmente de milho, como al-ternativas aos paióis comuns de madeira uti-lizados pelos produtores que já se mostravam ineficientes (COMPANHIA BRASILEIRA DE ARMAZENAMENTO, 1981; FRAGA et al., 1981; BRESOLIN et al., 1985). As alternati-vas para armazenagem de milho em espiga com palha, o paiol de tela e o paiol de alvena-ria, modelo Chapecó e as granelizadas, tonéis, silo plástico subterrâneo e armazém granelei-ro com aeração forçada, apresentavam a épo-ca as seguintes considerações (BRESOLIN et al., 1985):

a) Paiol de tela: as vantagens desta tecno-logia é ser economicamente viável; não é de custo elevado; evita o acesso de ratos; permite a colheita e armazenagem do milho em espigas com teores elevados de umidade; permite uma secagem rápida do milho e uma aeração intensa. Como desvantagens têm-se: parte do milho é molhada quando ocorrem chuvas acom-panhadas de vento; umidade relativa muito alta em certas regiões impossibili-ta o seu uso; não há facilidade para con-trole de pragas como carunchos e traças; é específico para armazenar milho em espiga; não é próprio para armazenagem por períodos longos.

Fonte: Emater/RS-Ascar. [198-].

b) Paiol de alvenaria (modelo Chapecó): as vantagens são a redução sensível das quebras físicas, pela secagem natural e pouca movimentação do produto; é uma técnica economicamente viável; permite a colheita das espigas com palhas com até 24 a 25 % de umidade b.u.5; seca as espigas no próprio paiol; protege o mi-lho do ataque de ratos; é de fácil carga e descarga; permite o expurgo e o reex-purgo para combate aos gorgulhos e tra-ças sempre que necessário, sem remover o milho; reduz a incidência de fungos que produzem substâncias tóxicas aos animais e ao homem; pode ser utilizado para expurgar outros grãos ensacados com umidade inferior a 12% b.u.; permite operações de carga e descarga com qual-quer tempo; permite descarga paulatina, sem prejuízo da armazenagem; permite a armazenagem em boas condições e sem perdas por períodos longos; as varandas podem ser utilizadas como abrigo para veículos, máquinas, e implementos agrí-colas; permite a contratação de Emprés-timo do Governo Federal (E.G.F.) sem opção de venda, em nível de propriedade. Como desvantagem, apresenta um custo inicial elevado.6

Fonte: Emater/RS-Ascar. [198-].

c) Silo plástico subterrâneo: dentre as vantagens desta tecnologia esta a de evi-tar as perdas devido ao ataque de insetos

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e roedores; se mantida a hermeticidade é um método que permite perfeita estoca-gem por longos períodos. Como desvan-tagens: se houver perfurações no plástico a infiltração de água deteriorará o pro-duto; carga e descarga trabalhosa; nor-malmente os tubulões são utilizados uma única vez; o custo é elevado.

Fonte: Emater/RS-Ascar. [198-].

d) Tonéis: tecnologia de baixo custo; ex-termina os gorgulhos e traças pela in-suficiência de oxigênio (asfixia); não há perdas pelo ataque de ratos. Como des-vantagens: requer a secagem do milho previamente; armazena pequenas quan-tidades; tonéis que serviam para deter-minados produtos químicos, não poderão ser utilizados.

Fonte: BRESOLIN et al., 1985.

e) Armazém graneleiro com aeração forçada: armazena grande quantidade de milho em espaço reduzido; facilidade para o controle de pragas e moléstias; facilita os trabalhos de moagem e ela-

boração de rações caseiras; através da aeração forçada evita o aquecimento dos grãos. Desvantagens: custo elevado; exige um bom nível de conhecimento do produtor.

Fonte: BRESOLIN et al., 1985.

Tais sistemas de armazenamento em face às mudanças tecnológicas da produção de grãos foram sendo gradativamente aban-donadas. Atualmente, em virtude dos agri-cultores na sua grande maioria colherem os produtos a granel, os paióis de espiga es-tão em desuso. Os tonéis, além dos riscos decorrentes da contaminação dos produtos originalmente neles embalados poderem causar aos grãos, tornaram-se escassos com a grande procura, e com isto, houve um au-mento significativo nos preços o que tem inviabilizado sua utilização. O silo plásti-co subterrâneo, além da pouca praticidade para carga e descarga do milho, apresentou desde o início sérios problemas de estan-queidade, uma vez instalado em solos pe-dregosos ou com excesso de raízes, segui-damente era perfurado e parte do produto era perdida em função da entrada de água. Tanto nos tonéis como no silo plástico o mi-lho necessita ser seco abaixo de 13%, o que na época era feito espalhando-se o produto em uma lona ao sol, processo pouco prático e que com o passar do tempo também foi abandonado. Sobraram então os armazéns graneleiros com aeração forçada. Por um equívoco na concepção do projeto foi conce-bido no formato retangular, o que conduz a um maior “gasto” estrutural e inviabiliza,

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7 Vale lembrar que as partes que formam o grão rea-gem com o ambiente de forma diferente: a casca – pra-ticamente não reage com a umidade e com o oxigênio contido no ar ambiente; o interior – é altamente reativo e facilmente deteriorável; o grão não protegido com os seus envoltórios deteriora com maior velocidade.

em função do custo, sua utilização nas pro-priedades familiares.

Outro fator restritivo que se apresenta aos produtores diz respeito a necessidade de recorrer a prestação de serviços de ter-ceiros para o pós-colheita. Embora a seca-gem e armazenagem em grandes unidades (engenhos, cooperativas, cerealistas, etc.) apresentem um menor custo de processa-mento em função da escala, os pequenos produtores ficam impedidos de utilizar tais estruturas, em virtude do preço do frete, principalmente se forem consumir os grãos para as criações na propriedade. Além dis-so, o custo fica elevado para o transporte de grãos com excesso de água (umidade) e impurezas. Constata-se também que a qualidade dos produtos armazenados é in-versamente proporcional ao tamanho das unidades. Ou seja, quanto maior forem os depósitos dos grãos, menor tende a ser a qualidade apresentada pelos produtos neles estocados. Assim, o produtor colhe um produto de excelente qualidade, mas ao levar para as unidades de secagem o seu produto perde a identidade. E quando o produtor necessita o produto ele recebe normalmente um grão em piores condições, principalmente pelo excesso de grãos trin-cados e quebrados7 e que resultam em me-nor conservação do produto.

Neste sentido, a Emater/RS foi em busca de inovação tecnológica capaz de atender às exigências contemporâneas de modo a proporcionar aos produtores uma forma de secagem e armazenagem de grãos eficiente e aliada à relação custo versus benefício.

4 SILO DE ALVENARIA ARMADA COM CONTENÇÃO DE TELA METÁLICA SOLDADA Um novo passo no sentido de buscar tec-

nologias sustentáveis foi o que fizeram os técnicos da Emater/RS e da Embrapa Suí-nos e Aves, aliando as soluções, economia e eficiência para armazenar os produtos nas propriedades. Foi então que no início dos

anos noventa desenvolveram um silo de al-venaria com contenção de telas metálicas soldadas. (Figura 1).Figura 1 – Vista geral de silos de alvenaria ar-mada

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-]. Nota: Observa-se também o uso de madeira roliça na constru-ção do galpão, município de Cruzeiro do Sul/RS.

Os silos são conceituados como unidades armazenadoras de grãos, caracterizadas por células ou compartimentos estanques, cuja função consiste em permitir o míni-mo de incidências ou trocas de influências entre o meio externo e o ambiente de esto-cagem. (Figura 2). Pelas próprias caracte-rísticas construtivas, os silos oferecem con-dições de armazenagem por períodos mais longos que os armazéns, pois propiciam um controle das fontes de deterioração muito mais eficiente (CALIL JUNIOR, 1983). A carência de informações técnicas para pro-jetos e construção de silos tem sido causa de fissuras e deformações e até mesmo rom-pimentos em diversas instalações. As pres-sões desenvolvidas nas laterais e sobre o fundo são alguns dos fatores responsáveis por esses acidentes (BAÊTA, 1980).

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Figura 2 – Interior de um silo

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-]. Nota: Observa-se o fundo de madeira ripada e as paredes ele-vadas com tijolos em espelho.

Todavia, os silos construídos durante a década de 90 eram somente armazenadores, sem aeração forçada, sendo necessários se-cadores para diminuir a umidade dos grãos em níveis seguros para uma estocagem de longo prazo. O primeiro silo construído em alvenaria e contenção com telas metálicas soldadas, no Estado, foi na propriedade dos produtores Arno e Alexandre Becker, na Pi-cada Felipe Essig, município de Travesseiro, no ano de 1992.

A partir da necessidade de secagem dos grãos surge um novo desafio para Emater/RS: desenvolver uma inovação que supere os limites já existentes da tecnologia tradicio-nal que implicam diretamente na qualidade final do produto.

5 OS SECADORES DE GRÃOS TRADICIONAIS E OS PROBLEMAS RELACIONADOS A secagem artificial dos produtos agrí-

colas com altas temperaturas, particular-mente os cereais (milho, arroz, trigo e sor-go), consiste em uma rápida eliminação do conteúdo de água de modo que garanta uma boa conservação (ZANCHE, 1991).

Entre o final da década de oitenta e a década de noventa foram instalados diver-sos equipamentos utilizados por pequenos

produtores, com secagem artificial em altas temperaturas, na maioria das regiões do Estado. As fornalhas para queima de lenha e aquecimento do ar de secagem eram de fogo direto, ou seja, os gases da combustão atravessam diretamente a massa de grãos. Normalmente os secadores eram utilizados de forma comunitária, porém a armazena-gem era realizada em silos de alvenaria ou tulhas de madeira a granel nas proprieda-des rurais.

Os principais tipos de secadores de fogo direto eram os de leito fixo e os intermiten-tes, com capacidades de carga variando de 10 a 40 sacos e de 30 a 140 sacos respectiva-mente. Poucos secadores utilizavam siste-mas de fogo indireto com trocador de calor e estes, embora apresentassem um produ-to de melhor qualidade, caíram em desuso em virtude da pouca mão de obra existente nas propriedades. Como operavam em mais baixas temperaturas demoravam muito tempo para secar um lote de grãos, com tempos ao redor de 12 h, em contraponto, os secadores de leito fixo de fogo direto, por exemplo, com projetos adequados, levavam 4 h para efetuar a mesma secagem, ou seja, um terço do tempo. A qualidade tem custo, mas infelizmente ainda para o milho não ti-nha preço e se os produtores não lucravam mais, então, porque entregar um milho de maior qualidade?

A combustão nas fornalhas de fogo direto é um fator determinante na qualidade final do produto. A lenha, largamente emprega-da para o aquecimento do ar de secagem de produtos agrícolas no país, é um combustí-vel sólido de queima relativamente difícil e que libera, durante o processo de combus-tão, quantidade muito grande de produtos químicos, alguns de periculosidade compro-vada (NOLL, 1993). Dentre os produtos, es-tão os compostos de hidrocarbonetos polia-romáticos (HPAs), formados em processos de combustão incompleta de todas as espé-cies de matérias orgânicas, os quais podem ser encontrados como contaminantes em matrizes complexas do meio ambiente, in-

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cluindo os alimentos. Outros componentes conferem cor e cheiro aos produtos secados, numa segura indicação de contaminação física e química. Os HPAs são famílias de produtos com características mutagênicas e carcinogênicas comprovadas (WONGTS-CHOWSKI, [1998]).

A legislação brasileira vigente não esta-belece tolerância para a presença de HPAs em alimentos. Países como a Alemanha, Áustria e Polônia limitam em 1 μg/kg o teor máximo de B(a)P8 em carne defumada e este valor tem sido utilizado como limi-te referencial para avaliar a contaminação de outros alimentos (LARSSON, 1986 apud CAMARGO, 1998). Tem-se conhecimento de países importadores de grãos, recusa-rem cargas de milho e arroz por conta de contaminação por HPAs, o que poderá em um futuro próximo comprometer a exporta-ção do Brasil para países com legislação e controle mais rigoroso. Fica ainda a ques-tão do consumo interno frente aos níveis de contaminantes encontrados em amostras de vários produtos e a questão da soberania alimentar do nosso país.

6 A GRANDE VIRADA: AMBIENTE, SUSTENTABILIDADE E SOBERANIA ALIMENTAR A grande virada que a extensão rural

começou a desenvolver junto aos produto-res rurais foi a partir da necessidade de criar formas de autossuficiência no arma-zenamento dos grãos na propriedade pela superação dos limites impostos pelas tec-nologias disponíveis: reduzindo os custos de produção e minimizando os impactos ao meio ambiente. A adoção de tecnologias sustentáveis foi somente uma questão de tempo. Segundo Zacher (2000) postula, o aumento da interdependência entre os Es-tados faz com que os problemas como os ambientais, por exemplo, necessitem de um planejamento mundial. Para Pinheiro e Milani (2012), as relações internacionais passaram a englobar um leque mais vasto

de questões, como meio ambiente, seguran-ça alimentar, direitos humanos, educação, saúde e cultura – os quais necessitariam de conhecimentos e expertises específicos, re-sultando no envolvimento de uma diversi-dade de atores nos assuntos internacionais, tais como: “[...] empresas, organizações não governamentais, meios de comunicação so-cial, movimentos sociais, organismos públi-cos da esfera municipal ou estadual.” (PI-NHEIRO; MILANE, 2002, p. 15-16).

Nesse sentido, trabalhar para a produ-ção de conhecimento no que tange tecno-logias rurais, dentro do campo específico da agricultura familiar, mostra-se rele-vante para dois sistemas do que se inti-tula governança global9.

O primeiro deles abrange a governança global da segurança alimentar. A preocu-pação com a segurança alimentar tornou--se premente, principalmente entre 2007 e 2010, quando o número de pessoas em si-tuação de insegurança alimentar subiu de 850 milhões para um bilhão. Situação que reflete, principalmente, os casos de países pobres situados na África, Ásia, América Latina e Caribe. Instabilidade econômica e flutuações nos preços dos alimentos contri-buíram para isso (MARQUES, 2010). Ou-tro fator que confere relevância ao tema é o fato de “acabar com a fome e a miséria” ser um dos objetivos do milênio da Organização das Nações Unidas (ONU).

Alardear que se deva ter segurança ali-mentar, é dizer que se necessita ter ofer-ta abundante de alimentos e a baixo custo;

8 Benzo (a) pireno.9 A Comissão sobre Governança Global define o

termo como: “Governança é a totalidade das diver-sas maneiras pelas quais os indivíduos e as ins-tituições, públicas e privadas, administram seus problemas comuns. É um processo contínuo pelo qual é possível acomodar interesses conflitantes ou diferentes e realizar ações cooperativas. Gover-nança diz respeito não só a instituições e regimes formais autorizados a impor obediência, mas tam-bém a acordos informais que atentam aos interes-ses das pessoas e instituições.” (COMISSÃO SO-BRE GOVERNANÇA GLOBAL,1996, p. 2).

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políticas orientadas para a modernização agrícola; multiplicação das relações mer-cantis; orientação produtivista – reforça a importância do setor agroindustrial para a segurança alimentar -, ou seja, o comér-cio internacional de alimentos constitui fator chave para a segurança alimentar; atualmente bastante contestada devido seus efeitos sociais e ambientais perver-sos. Em vez disso, é importante lembrar o que trata o artigo vigésimo quinto da De-claração Universal dos Direitos Humanos:

1. Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principal-mente quanto à alimentação, ao vestuá-rio, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessá-rios, e tem direito à segurança no desem-prego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. [...]” (DE-CLARAÇÃO ..., 2013).

Dentro dessa proposta mais ampla se enquadra outro aspecto importante nos dias de hoje, a soberania alimentar, que trata do acesso ao alimento em quanti-dade e qualidade e não pode resumir-se simplesmente à oferta abundante de ali-mentos de baixo custo para os consumi-dores. A alimentação adequada associa as dimensões étnicas e culturais, o que leva a pressupor a validade de medidas protecionistas e de apoio às agriculturas locais; necessidade de medidas para as-segurar o acesso à água, às sementes, ao crédito, entre outros. Se as políticas pú-blicas vão apoiar as agriculturas locais na produção de alimentos sadios elas de-veriam montar uma logística de abasteci-mento e armazenamento de grãos de for-ma descentralizada e com qualidade, nas propriedades ou no máximo nas comuni-dades mais próximas. Esta ação faz par-te da lógica das cadeias curtas, ou seja, que os alimentos possam ser consumidos

localmente, de imediato e minimamente processados (o que permite o acesso ao alimento mais próximo possível das suas propriedades naturais). É a ideia do mer-cado local, para a revalorização de ali-mentos tradicionais como também para construção ou consolidação de cadeias curtas de produção e consumo (CRUZ; SCHNEIDER, 2010).

De acordo com nota publicada no site das Nações Unidas no Brasil, no últi-mo dia 5 de junho, o relatório “Peque-nos Agricultores, Segurança Alimentar e Meio Ambiente”, elaborado pelo Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrí-cola (IFAD), apontou que o investimen-to em pequenos agricultores é a melhor maneira de superar a pobreza. (NAÇÕES UNIDAS, 2013). O relatório também es-clarece que investimentos no setor agrí-cola oferecem mais retorno em prol da superação da pobreza (IFAD, 2013).

Na mesma nota, o diretor da Divisão de Clima e Meio Ambiente do Fundo In-ternacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA), Elwyn Grainger Jones, afirmou que “[...] os pequenos agricultores pos-suem conhecimentos locais que podem oferecer soluções práticas, necessárias para a agricultura atingir um patamar mais sustentável. [...]” (NAÇÕES UNI-DAS, 2013). A afirmação coaduna-se com o posicionamento assumido neste traba-lho de que é fundamental agir localmente para que benefícios globais sejam alcan-çados.

O outro sistema de governança global, para o qual o desenvolvimento de tecno-logias rurais se torna importante é o do meio ambiente. Algumas considerações sobre o tema foram analisadas em recen-te matéria publicada sob o título, “Gover-nança ambiental global: atores e cená-rios”, sendo em parte reproduzido abaixo:

Inicialmente, observa-se a urgência da cons-trução de decisões relativas à implantação de

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1717Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

Utilizar tecnologias limpas, susten-táveis e que economizem mão de obra é de fundamental importância para a pro-dução da agricultura familiar. Dentro desses conceitos deve se encaixar a pós--colheita. Em um mundo globalizado, países importadores de alimentos, além da exigência de qualidade, encaminham missões para in loco verificarem como são produzidos e manipulados os alimentos e se existe respeito ao ambiente em que são produzidos (meio ambiente, processos, pessoas envolvidas, animais, etc.). Mas, e se a agricultura familiar produzir somen-te para o consumo interno? Qual a dife-rença? O cidadão brasileiro merece tanto quanto os estrangeiros consumir alimen-tos saudáveis e produzidos com respeito à natureza.

A partir dessas premissas, no final da década de noventa, a Emater/RS passa a repensar a armazenagem nas proprie-dades familiares, com o objetivo final de preservação ambiental e a melhoria da qualidade dos produtos processados. E investe em inovações tecnológicas de fácil acesso e baixo custo para os agricultores familiares, as quais serão apresentadas a seguir.

7 SECADOR SOLAR COM COLETOR ARMAZENADOR EM LEITO DE PEDRA BRITADA Os primeiros dois secadores solares,

instalados com coletor armazenador em leito de pedra britada, na Região do Vale Rio do Taquari, no Rio Grande do Sul, foram construídos na propriedade dos agricultores familiares, Cleto e Altair Jo-hner, e também na propriedade do Celor Lorenz, ambos no município de Cruzeiro do Sul. O Cleto e o Altair instalaram um equipamento de 450 sacos de milho de capacidade estática e o Celor Lorenz, um equipamento com capacidade de 140 sa-cos (Figura 3), no ano de 1999.

um efetivo sistema de governança ambiental global, capaz de assegurar a participação de atores representativos dos diferentes interes-ses envolvidos quando o tema é proteção do meio ambiente. O debate se estende, eivado de disputas e de insatisfações, mas o que é mais grave: sem que o sistema de governança socialmente construído para responder aos desafios ambientais que ameaçam o planeta se demonstre capaz de atender, seja a urgên-cia da situação, seja ao clamor da sociedade por uma efetiva participação. O que nos leva a questionar se Hermet (2005, p. 35) não te-ria razão ao associar o termo ’governança‘ à imagem de um processo ’de organizações, por organizações e para as organizações – sejam elas públicas ou privadas, empresa-riais ou associativas, com ou sem fins lucra-tivos‘, o qual assumiria as características ’de um jogo, progressivamente codificado e no interior do qual as autoridades públi-cas clássicas têm cada vez mais dificuldade para fazer valer seus recursos específicos‘. Por outro lado, compartilhamos a crença no slogan da conferência de Estocolmo, que co-loca ser fundamental agir localmente para vislumbrar benefícios globais. Isso implica também criar espaço no âmbito das decisões globais para que sejam consideradas as es-pecificidades locais, inclusive, no que se re-fere às formas de participação. Como aponta Fernandes (1994), com base na análise da sociedade brasileira, ao limitar-se a partici-pação apenas aos atores formalmente orga-nizados em instituições, corre-se o risco de desconsiderar parcelas especialmente signi-ficativas da sociedade. Caberia, pois, rever os atributos exigidos como condição ao direi-to de participar dos fóruns internacionais, de modo a tornar possível também a parti-cipação de novos movimentos sociais. Postu-lamos que maior dedicação acadêmica deve ser direcionada às contribuições das instân-cias informais, na medida em que tais espa-ços têm apresentado vigor ímpar, principal-mente, através das configurações sociais em rede. Quanto à participação do setor privado na governança ambiental, atenção especial deve ser dada a análise da legitimidade das intenções desses atores. Não podemos es-quecer que a referência à ’responsabilidade social’, não raramente, oculta interesses me-ramente mercadológicos. (LORENZETTI; CARRION, 2012, p. 732).

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1818Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

Figura 3 - Secador solar com capacidade de 140 sacos de milho de carga estática e coletor solar ar-mazenador com leito de pedra britada coberto com plástico de estufa

Crédito: Katia Marcon, 1999.Nota: Produtor Celor Lorenz, Cruzeiro do Sul/RS.

As pesquisas com secadores solares, com ar forçado, porém, é bem mais antiga, tanto no Brasil como nos Estados Unidos. Como exem-plo, podemos citar, o Grupo de Energia da Universidade de Campinas, no estado de São Paulo (UNICAMP), que nos anos 70 desenvol-viam trabalhos nesta área, pelos pesquisado-res Luiz Gabriel Villa e Gonzalo Roa.

Os trabalhos gerados neste período eviden-ciaram que a secagem poderia ser feita de duas maneiras:

a) exposição direta dos raios solares e às condições atmosféricas do ar;

b) uso de equipamentos que utilizam o ar aquecido como agentes de desumidifi-cação.

O primeiro método apresenta uma série de desvantagens como: dependência das con-

dições climáticas, longo tempo de secagem e deterioração por insetos; já o segundo apre-senta algumas vantagens sobre o anterior como: rapidez de secagem, alta capacidade, uniformidade do produto e independência das condições atmosféricas (PINTO NETO, 1988).

O equipamento desenvolvido levou em con-sideração vários fatores quando da sua con-cepção, sendo que se destacam os seguintes aspectos (MARTINS et al., 2002b)

a) demanda baixa potência elétrica para acionar o motor do ventilador. Enquanto um secador convencional de 50 sacos de capacidade estática e fornalha a lenha utiliza um motor de 5 CV, um secador que usa energia solar, de igual capaci-dade estática, necessita de somente 1 CV. Este fator torna-se importante uma vez que as companhias de eletrificação, no Vale do Rio Pardo no Estado, têm vinculado a utilização de motores com maior potência aos horários de menor demanda, como se constata em alguns equipamentos instalados no município de Venâncio Aires/RS, que só podem ser acionados nos horários compreendidos entre as 6 e as 18 horas;

b) utiliza para o aquecimento do ar de se-cagem uma fonte de energia renovável (energia solar);

c) a radiação solar é uma fonte limpa de energia, o mesmo não ocorrendo com a le-nha, grandemente utilizada na secagem de grãos em nosso país;

d) o secador que utiliza energia solar é um poupador de mão de obra na pequena propriedade, pois, uma vez carregado o equipamento e ligado o motor do venti-lador, o agricultor não precisa acompa-nhar o processo de secagem. O mesmo não ocorre com os equipamentos que uti-lizam lenha;

e) o secador solar foi projetado para ser construído com material e mão de obra local, em princípio somente o ventilador é adquirido fora da localidade. Esta é uma

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1919Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

grande vantagem quando o equipamen-to apresenta algum defeito; o agricultor não perde tempo com as demoras da as-sistência técnica das indústrias, além do equipamento possuir menor custo de ma-nutenção, pois o produtor tem condições de ele mesmo ou alguém muito próximo executar o conserto;

f) a qualidade do produto é muito superior. Como os grãos são secos em temperatu-ras baixas, em média 5°C acima da tem-peratura ambiente, o produto não trinca, não perde a cor e reduz muito pouco de volume, o que comprova que a secagem com altas temperaturas retira do produ-to algo mais do que simplesmente água.

8 SILO SECADOR ARMAZENADOR A busca permanente por maior raciona-

lização na secagem dos grãos, fez com que a construção de silos, em meados da déca-da de 2000, buscasse o aprimoramento do sistema de secagem nas propriedades fami-liares. O secador solar que já era uma tec-nologia bastante difundida, principalmente no município de Casca/RS e com resultados em outros municípios do Estado, demons-trava ser uma tecnologia simples, eficiente e sustentável. Porém os produtores necessi-tavam de dois equipamentos: o secador e o silo armazenador. Foi então, a hora de mais uma vez a Emater/RS inovar e difundir o uso de silo secador no Estado para as uni-dades familiares.

Segundo Silva, Afonso e Donzelles (2000), na secagem com ventilação forçada se pode empregar baixa temperatura, alta tempe-ratura, secagem combinada e outros. Seca-gem em baixas temperaturas é um méto-do artificial de secagem em que se utiliza ar natural ou ar levemente aquecido – até 10ºC acima da temperatura ambiente. A se-cagem com alta temperatura é aquela em que o ar de secagem é aquecido a uma tem-peratura superior a 10ºC acima da tempe-ratura ambiente. Naturalmente, esse limi-te não é rígido, mas esta é a diferença que

caracteriza o processo como não sendo mais de baixa temperatura.

A secagem com ar natural em silos segue as seguintes características, de acordo com Hansen, Keener e Gustafson (2013): o pro-cesso de secagem é lento, geralmente reque-rendo 4 a 8 semanas; o conteúdo inicial de umidade é normalmente limitado na faixa de 22 a 24%; os resultados de secagem são conseguidos forçando o ar sem aquecimento, através dos grãos, em taxas de fluxo de ar entre 1,13 a 2,26 m³/min/t; a secagem e a ar-mazenagem ocorrem no mesmo silo, minimi-zando a movimentação do produto; os silos são equipados com fundo totalmente perfu-rado, um ou dois ventiladores de alta capaci-dade, um distribuidor de grãos e escadas; e máquinas de limpeza devem ser usadas para remoção de grãos quebrados e finos.

Nas máquinas de limpeza, para milho, tem sido usado a peneira superior com fu-ros redondos de 13mm de diâmetro e a infe-rior com furos redondos com 6,5mm de diâ-metro. É claro que o produto que está sendo colhido deve passar por uma avaliação em termos de tamanho dos grãos, e se neces-sário diminuir ou aumentar os diâmetros sugeridos.

Existe ainda a possibilidade da utiliza-ção de coletores solares acoplados nos silos secadores para locais com neblina cons-tante ou épocas de maior umidade relati-va ou, ainda, propiciar a entrada de milho com maior teor de umidade nos silos. Em trabalho desenvolvido por Converse, Fos-ter e Sauer (1978) foi testado o uso e o tipo de coletores solares em silos e demonstra-do que: o uso de aquecimento suplemen-tar reduziu o consumo de energia elétri-ca dos ventiladores; o uso de coletores na secagem torna o processo efetivo, nos pe-ríodos de menor temperatura e maiores umidades relativas do ar. Todos os testes com coletores acoplados nos silos tiveram o tempo de secagem menor do que os silos que utilizaram somente ar natural, entre outras observações. Na observação do tipo de coletor, aquele que armazenou energia

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2020Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

em leito de pedra foi mais eficiente nos pe-ríodos mais frios.

No Estado, os silos secadores são maneja-dos dependendo do produto e da região; em secagem com enchimento em uma única vez para silos de menor porte, ou em camadas, para silos de maior porte. Para o milho, o li-mite de sacos para um silo com secagem em camada única é de 2.500 sacos. Para o arroz, pode ser de até 3.000 sacos, mas é aconse-lhável que o produtor construa silos de me-nor porte. Em secagem e armazenagem de qualidade, o melhor é ser pequeno. O estudo da região onde o silo secador vai ser instala-do é de fundamental importância, somente após análise técnica detalhada é que se têm condições de definir o projeto. Cabe salientar também, que durante todo o processo decisó-rio da obra haja participação dos agriculto-res, pois é deles a opinião do melhor mane-jo, para um processo mais adequado à suas necessidades. Como o consumo elétrico está diretamente ligado ao volume de ar produ-zido pelas pás do ventilador e a pressão to-tal a ser vencida pelo ar no sistema, quanto mais alta for a camada de grãos no silo, tan-to maior será a pressão estática requerida e maior será o consumo energético.

A partir de 2012, houve inovação no modo de construção no que se refere à elevação dos silos. Há que se destacar a necessida-de de avaliar mudanças que impliquem em custo da mão de obra, visto que esta repre-senta algo ao redor de 35% do valor dos materiais para silos pequenos e de até 60% para silos de maior porte. Observando ino-vações introduzidas no mercado por empre-sas de construção no município de Lajeado/RS, foi possível identificar o uso de novo material na elevação das paredes internas e externas dos edifícios: as argamassas po-liméricas (alvenaria colada).

A partir desta experiência consolidada no mercado imobiliário, a Emater/RS adotou esta tecnologia na elevação dos silos de al-venaria. Um exemplo clássico é o produtor Daniel De Bona, no município de Dois Laje-ados/RS, que construiu dois silos de 600 sa-

cos de capacidade e somente necessitou de profissionais especializados para emboçar10 as paredes dos silos. Algumas vantagens são apontadas com esta nova prática, sendo: maior rapidez na elevação das paredes de tijolos, realizando o serviço em um terço do tempo do sistema tradicional com argamas-sa, e não necessidade de profissional especia-lizado; a parede colada é 30% mais leve que a tradicional; usa-se menos cimento – lembra-mos que a produção de 1 kg de cimento libe-ra 600 gramas de dióxido de carbono (CO2) para atmosfera; usa-se menos areia, evi-tando a constante mineração nos leitos dos rios; economia de 30% em relação ao sistema tradicional; sem perdas, diminui o entulho e mantém a obra limpa; não requer cal, água ou betoneira.

Segundo Meneguetti (2010), a possibilidade de construção com material e mão de obra lo-cal possibilita ampla difusão no País por tor-nar o sistema viável para pequenas e médias propriedades. Além disso, o consumo ener-gético para a produção de blocos cerâmicos é consideravelmente menor quando comparado ao do concreto e ao do aço. A energia utilizada para a produção destes materiais se relaciona numa proporção de 1:2, 5:15. Num período em que são discutidos métodos construtivos mais sustentáveis, este menor consumo energético é outro importante fator para utilização de blocos cerâmicos nesse estudo.

Todo o silo secador é, potencialmente, um controlador de insetos dos grãos armazena-dos de alta eficiência (WILKE, 2013). Como os fluxos de ar utilizados na secagem são bas-tante elevados e para aeração bem inferio-res, se for utilizado um fluxo de 2,5 m³/min/t, pode-se secar milho, em aproximadamente 15 dias e completar uma dose de aeração em 10 horas. A Emater/RS tem acompanhado por meio de medições frequentes a campo, temperaturas em silos secadores abaixo de 15 ºC, o que leva ao desenvolvimento muito lento dos insetos

10 Aplicar emboço ou base do reboco em uma parede (HOUAISS; VILLAR; FRANCO, 2009).

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2121Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

9 RESULTADOS ALCANÇADOS

9.1 Irmãos Damo: município de Casca/RS

Os irmãos Damo são criadores de suínos em ciclo completo, com plantel de 350 matri-zes. A aproximadamente uma década atrás enfrentavam sérios problemas de qualidade da ração fabricada na propriedade. Eles co-lhiam em média 17.000 sacos de milho e ter-ceirizavam a secagem e armazenagem.

Os índices reprodutivos do plantel da pro-priedade eram alarmantes. O retorno ao cio das matrizes suínas era de 24% e o núme-ro de abortos nas fêmeas eram 50 ao ano. A conversão alimentar nas fases de crescimen-to e terminação estava em 2,73 kg de ração consumida/kg peso vivo, além da necessida-de do uso contínuo de sequestrantes de to-xinas nas rações. Atualmente, os índices se encontram em um patamar diferenciado: o retorno ao cio está em 6,7% e os abortos são quase inexistentes. Enquanto que a conver-são alimentar passou para 2,30 kg de ração por quilo de peso vivo adquirido e o uso dos sequestrantes está muito reduzido. Os ir-mãos contam hoje com: dois secadores sola-res de 500 sacos de carga estática, um silo pulmão com capacidade de 1.000 sacos, dois silos armazenadores de 7.500 sacos cada, e recentemente foram construídos mais dois silos secadores de 2.500 sacos e um de 4.500 sacos de capacidade.Figura 4 - A qualidade do milho armazenado, com limpeza admirável, após 12 meses de arma-zenagem

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-].

Figura 5 - Vista dos coletores solares armazena-dores e uma vista geral do pavilhão que abriga os silos, a moega e os secadores

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-].Nota: Atualmente os coletores estão recobertos com vidro o que melhorou sua eficiência.

9.2 Lauro Martello: Município de Nova Alvorada/RS

O produtor Lauro Martello é criador de leitões e, atualmente, tem um plantel de 80 fêmeas. Há algum tempo atrás che-gou a ter 150 fêmeas em produção. Foi produtor integrado junto a uma grande companhia, mas em virtude das sucessi-vas crises, diminuiu o plantel e acabou com a integração. Atualmente tem uma parceria com um vizinho: entrega os lei-tões para a engorda. Também pretende plantar milho que deverá ser vendido para um moinho local (moagem a pedra). Em virtude da excelente qualidade do seu milho processado, mesmo durante os anos de crise, conseguiu juntar um patri-mônio – está investindo na construção de um prédio de 15 apartamentos na cida-de de Nova Alvorada. Com a diminuição da criação de suínos, está pensando em montar um plantel leiteiro11. Possui um secador solar (Figura 6) de 500 sacos de

11 Uma unidade animal bovina (450 kg de peso vivo) pode comer no máximo 3 kg de milho por dia em uma ração concentrada. Na pequena propriedade é muito mais viável, em termos de área necessária e produção obtida, produzir milho para as vacas do que para os porcos.

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capacidade e quatro silos armazenadores de 2.000 sacos cada. (Figura 7). Confor-me palavras do produtor Lauro Martello “[...] as vantagens com o sistema implan-tado são: o ar frio acelera o processo de secagem e controla insetos; custo de seca-gem por saco é de R$0,17; em virtude de produzir ração de melhor qualidade hou-ve menor retorno de cio nas fêmeas, e me-nor ocorrência de abortos e praticamente inexistência de diarreia em leitões.”Figura 6 - Secador solar secando semente de aveia para plantio no inverno

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-].

Figura 7 - Vista externa de um silo

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-].

9.3 Família Kessler: Santa Cruz do Sul/RS

A família Kessler, do município de Santa Cruz do Sul, é plantadora de arroz irrigado e construiu dois silos de alvenaria armada, um

com capacidade para 6.000 sacos e outro com capacidade para 600 sacos de arroz. Estes dois silos mostram bem a versatilidade desse equi-pamento. O silo maior com capacidade para 6.000 sacos (Figura 8) utiliza um ventilador com motor de 20 CV12, e seca o produto em ca-madas durante um período de 40 dias. O silo menor de 600 sacos, usa motor de 3 CV no ven-tilador e seca o arroz com enchimento em uma única vez, em 14 dias. Evidentemente que a propriedade possui rede trifásica em virtude do motor maior (20 CV), mas se tivesse somen-te rede monofásica poderia assim mesmo cons-truir o silo menor de 600 sacos, em função da menor potência requerida. Antes de implantar o projeto dos silos secadores, os Kessler seca-vam e armazenavam o produto fora da pro-priedade, em um cerealista, e obtinham uma média de grãos inteiros de 58%13. Hoje dificil-mente baixam de 60% de grãos inteiros. Estes 2% a mais de rendimento de grãos inteiros im-plica num acréscimo de R$2,00 a mais por saco entregue em virtude da qualidade.

Figura 8 - Silo secador de 6.000 sacos utilizado para secar em camadas

Fonte: Emater/RS-Ascar, 2010.

12 Unidade de medida de potência. Equivale a 1 Cavalo Vapor (CV) = 0,9863 HP (ENTENDA..., 2008).

13 É importante lembrarmos que a quantidade de grãos inteiros do arroz que o produtor entrega aos ce-realistas, depende do processo de secagem. O produtor ganha menos em virtude do processamento deficiente, que não é dele, mas sim de quem compra. É, pois, dupla-mente penalizado, recebe pouco pelo seu produto e recebe menos ainda pelo trabalho que não fez. Quem deveria pagar esta conta é quem realizou o processo mal feito.

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2323Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

9.4 Moinho Soccol: Município de Casca/RS

O moinho Soccol produzia farinha de mi-lho em moinho de pedra, secando os grãos em alta temperatura, em um secador de leito fixo. A partir de 2004, construiu o primeiro silo secador com capacidade de 2.000 sacos de milho. Atualmente conta com mais um silo de 3.000 sacos (Figu-ra 7). O moinho aumentou significativa-mente o volume de farinha produzido e hoje conta com quatro pedras realizando moagem.

Na Figura 8 pode-se observar uma po-lenta feita com a farinha do moinho. A foto ilustra o momento exato em que a po-lenta foi retirada do cozimento e do prato de vidro que serviu de forma. Nota-se que a polenta não perde o formato original do prato. Na foto a direita, observa-se a sua elasticidade. Além do sabor e odores ca-racterísticos de um produto de qualidade superior, observa-se que a gelatinização da farinha foi alcançada o que mantém o produto com bom grau de aglutinação. Caso a polenta seja cortada em fatias e co-locada para fritar em óleo, os pedaços se mantém integrais, o que não ocorre com polentas feitas com farinhas oriundas de milhos secos em altas temperaturas e que durante a secagem iniciam o proces-so de gelatinização. Secar grãos com alta temperatura e umidade pré-gelatiniza o amido e pode ser até bom na nutrição de animais (MARTINS, 1997), porém jamais produzirá farinhas de qualidade. Farinha sem qualidade é produto final sem qua-lidade. O rendimento de farinha de um milho seco em silo secador é maior que os secos em secadores convencionais. Um saco de 60kg de milho processado em si-los rende de 7 a 10kg a mais de farinha, e é por isso, que o produtor que seca em silos recebe ao redor de R$5,00 a mais por saco de milho vendido.

Figura 9 - Silo secador com capacidade para 3.000 sa-cos de milho em construção

Fonte: Emater/RS-Ascar, [200-].

Figura 10 - Polenta fabricada com farinha do moinho Soccol, município de Casca/RS, com o milho seco em silos secadores

Fonte: Emater/RS-Ascar, 2013.

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2424Agroecologia e Desenv. Rural Sustentável, Porto Alegre, v. 6, n. 1/2, p. 8-25, jan./nov., 2013.

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