a agroecologia e direito humano à alimentação adequada

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  • 7/21/2019 A Agroecologia e Direito Humano Alimentao Adequada

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    AgroecologiA e o Direito HumAno AlimentAo ADequADA

    ra d ov d Sh, ra espa daonu Paa D Aa, apsad acsh d Ds HasDcima sexta sesso - Item 3 da agenda Promoo e proteo de todos os di-reitos humanos, direitos civis, polticos, econmicos, sociais e culturais, inclusiveo direito ao desenvolvimento

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    Agradecimentos

    Ao Olivier de Schutter, Relator Especial sobre Direito Alimentao da Organiza-

    o das Naes Unidas (ONU), que autorizou a publicao de seu relatrio e que

    tem desempenhado importante papel no movimento internacional pelo direito

    humano alimentao adequada.

    Ao Ministrio das Relaes Exteriores (MRE), especialmente ao ministro Milton

    Rond Filho, Coordenador-Geral de Aes Internacionais de Combate Fome do

    MRE, que viabilizou a traduo do relatrio e tem sido parceiro constante nas

    aes de segurana alimentar e nutricional e na garantia do direito humano ali-

    mentao.

    Ao Ministrio do Meio Ambiente, especialmente equipe tcnica do Departa-

    mento de Extrativismo da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sus-

    tentvel (SEDRS) e a Roberto Vizentin, Presidente do Instituto Chico Mendes de

    Conservao da Biodiversidade (ICMBio), pela reviso tcnica do documento e por

    toda a contribuio na discusso e divulgao de temas relativos segurana ali-

    mentar e nutricional e agroecologia.

    A todas as pessoas que apoiaram e contriburam, direta ou indiretamente, para

    que a publicao deste relatrio se tornasse realidade.

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    Cmara Interministerial de Segurana Alimentar e Nutricional.Conselho de Direitos Humanos. Dcima sexta sesso. Item 3 da agen-da Promoo e proteo de todos os direitos humanos, direitos civis,polcos, econmicos, sociais e culturais, inclusive o direito ao desen-volvimento. Relatrio apresentado pelo Relator Especial sobre direito alimentao, Olivier de Schuer.-- Braslia, DF: MDS, 2012. p. ; cm.

    1. Agroecologia; 2. Segurana Alimentar e Nutricional, Brasil. 3. PolcaNacional de Segurana Alimentar e Nutricional, Brasil. 3. Direito HumanoAlimentao; 4. Polcas Pblicas.

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    CMARA INTERMINISTERIAL DE SEGURANA ALIMENTAR E NUTRICIONAL - CAISAN

    TEREZA CAMPELLO Ministra do Desenvolvimento Social e Combate FomePresidenta

    Pleno Ministerial da CAISAN

    MINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE FOME TEREZA CAMPELLOCASA CIVIL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - GLEISI HOFFMANNMINISTRIO DA AGRICULTURA, PECURIA E ABASTECIMENTO - JORGE ALBERTO PORTANOVA MENDES RIBEIRO FILHOMINISTRIO DAS CIDADES - AGUINALDO VELLOSO BORGES RIBEIROMINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRRIO - PEPE VARGASMINISTRIO DA EDUCAO - ALOIZIO MERCADANTEMINISTRIO DA FAZENDA - GUIDO MANTEGAMINISTRIO DO MEIO AMBIENTE - IZABELLA TEIXEIRAMINISTRIO DO PLANEJAMENTO, ORAMENTO E GESTO - MIRIAM BELCHIORMINISTRIO DA SADE - ALEXANDRE PADILHAMINISTRIO DO TRABALHO E EMPREGO - BRIZOLA NETOMINISTRIO DA INTEGRAO NACIONAL - FERNANDO BEZERRA DE SOUZA COELHOMINISTRIO DA CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO - MARCO ANTONIO RAUPPMINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES - ANTNIO PATRIOTAMINISTRIO DA PESCA E AQUICULTURA - MARCELO BEZERRA CRIVELLASECRETARIA GERAL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - GILBERTO CARVALHOSECRETARIA DE POLTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - ELEONORA MENICUCCISECRETARIA DOS DIREITOS HUMANOS DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - MARIA DO ROSRIO NUNESSECRETARIA DE POLTICAS DE PROMOO DA IGUALDADE RACIAL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA -LUIZA HELENA DEBAIRROS

    Pleno Execuvo da CAISAN

    Secretria-Execuva Substuta da Secretaria-Execuva da CAISANVALRIA BURITY

    MINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE FOME MAYA TAKAGICASA CIVIL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - DARCI BERTHOLDOMINISTRIO DA AGRICULTURA, PECURIA E ABASTECIMENTO - SILVIO ISOPO PORTOMINISTRIO DAS CIDADES - ROBERTO DE OLIVEIRA MUNIZMINISTRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRRIO - ARNOLDO ANACLETO DE CAMPOSMINISTRIO DA EDUCAO - ALBANEIDE MARIA LIMA PEIXINHOMINISTRIO DA FAZENDA - ALOSIO LOPES PEREIRA DE MELO e MNICA AVELAR ANTUNES NETTOMINISTRIO DO MEIO AMBIENTE - ROBERTO RICARDO VIZENTINMINISTRIO DO PLANEJAMENTO, ORAMENTO E GESTO - ESTHER BEMERGUY DE ALBUQUERQUE

    MINISTRIO DA SADE - PATRCIA JAIMEMINISTRIO DO TRABALHO E EMPREGO - RINALDO MARINHO DA COSTA LIMAMINISTRIO DA INTEGRAO NACIONAL - SERGIO DUARTE DE CASTROMINISTRIO DA CINCIA, TECNOLOGIA E INOVAO - VERA LCIA LEMOS SOARESMINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES - MILTON ROND FILHOMINISTRIO DA PESCA E AQUICULTURA - VALRIA MORAESSECRETARIA GERAL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - SELVINO HECKSECRETARIA DE POLTICAS PARA AS MULHERES DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - MARIA DO CARMO GODINHO

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    SECRETARIA DOS DIREITOS HUMANOS DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - LUIZ CLVIS GUIDO RIBEIROSECRETARIA DE POLTICAS DE PROMOO DA IGUALDADE RACIAL DA PRESIDNCIA DA REPBLICA - SILVANYEUCLNIO DA SILVA

    CMARA INTERMINISTERIAL DE SEGURANA ALIMENTAR E NUTRICIONAL - CAISAN

    TEREZA CAMPELLO Ministra do Desenvolvimento Social e Combate Fome

    Presidente

    MAYA TAKAGI Secretaria Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional (SESAN).Secretria

    Coordenao-Geral de Apoio Implantao e Gesto do Sistema Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional -CGSISAN

    Coordenadora-Geral - Valria Torres Amaral BurityCoordenadora Tcnica - Roberta Marins de SAssessora Tcnica - Roziney Alencar Melo WeberAssessora Tcnica - Telma Castello Branco

    Assistente Tcnica - Carmem Cardoso Teixeira SilvaApoio Administravo - Luciana Cardoso de Almeida

    RedaoOLIVIER DE SCHUTTER

    Reviso TcnicaMINISTRIO DO MEIO AMBIENTE

    TraduoMINISTRIO DAS RELAES EXTERIORES

    Projeto Grfco e diagramaoRAFAEL ZART PUBLICIDADE/ASCOM MDS

    FotosROBERTA MARINS DE S

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    Apresentao

    A proposta da srie cadernos SISAN abordar temas relavos gesto do Sistema Nacional de Segu-

    rana Alimentar e Nutricional, bem como da Polca Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional

    PNSAN, instuda pelo Decreto n 7.272 de 25 de agosto de 2010.

    Com a presente publicao, espera-se fortalecer a Diretriz II do Plano Nacional de Segurana Alimentar

    e Nutricional Promoo do Abastecimento e Estruturao de Sistemas Descentralizados, de Base

    Agroecolgica e Sustentveis de Produo, Extrao, Processamento e Distribuio de Alimentos.

    notvel o esforo que rgos do governo realizam para inserir o tema da agroecologia na agenda

    das polcas pblicas do pas. Cabe destacar, por exemplo, a ao coordenada e integrada de vrios

    ministrios na elaborao da Polca Nacional de Agroecologia e Produo Orgnica, estabelecida

    como uma das metas do Plano Nacional de Segurana Alimentar e Nutricional, que foi recentemente

    lanada pela Presidenta Dilma.

    H algum tempo diversos setores da sociedade, em todo o mundo, vm procurando implementar e

    disseminar prcas e mtodos agroecolgicos idenficados como o caminho mais adequado para

    um desenvolvimento agrcola com foco no direito alimentao, na autonomia das populaes mais

    vulnerveis e em uma relao mais equilibrada com os recursos naturais. Este relatrio apresentadono Conselho de Direitos Humanos pelo Relator Especial sobre direito alimentao pode se tornar

    um marco neste processo de disseminao da agroecologia, contribuindo no processo de criar as

    condies para que esta supere os limites das experincias locais, acusao injusta muitas vezes fei-

    ta, como se sistemas alternavos de desenvolvimento agrcola baseados em prcas agroecolgicas

    esvessem intrinsecamente condenados a uma distribuio esparsa, de pequena escala e impregna-

    dos de uma irracionalidade econmica e em muitos casos tambm tcnica.

    O relatrio de Olivier de Schuer possui o inegvel mrito de colocar o debate sobre a agroecolo-

    gia em um novo frum e sob um novo patamar, ao mesmo tempo em que a conecta diretamente

    com o direito bsico e universal alimentao. Baseado em compilaes que tm por base uma

    ampla gama de iniciavas levadas a cabo principalmente em pases da frica e da Amrica Lana,

    o relatrio apresenta dados concretos que evidenciam os resultados de sistemas agroecolgicos,

    contribuindo tambm para superar outro falso esgma, o de que tais sistemas seriam ineficientes e

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    carentes de comprovao emprica. Ao contrrio, o relatrio aponta que dadas mnimas condies

    favorveis e uma razovel instucionalidade, a agroecologia apresenta resultados muito sasfatrios

    com infinitamente menos efeitos colaterais se comparada a outros mtodos de explorao agrcola.

    O que se depreende das inmeras iniciavas apontadas por Schuer que assim como os aparatos

    dos Estados, os arcabouos legais, os mercados, o desenvolvimento tecnolgico, etc., combinaram-

    se para criar os ambientes favorveis ao desenvolvimento da agricultura de larga escala baseada em

    monoculturas de gros o mesmo pode se feito para a agroecologia.

    A iniciava de traduzir e ampliar a divulgao do relatrio acontece num momento em que cresce a

    centralidade da agroecologia nas pautas e nos projetos de desenvolvimento rural elaborados pelos

    movimentos sociais. Ao mesmo tempo, notvel o esforo que rgos do governo realizam para

    inserir o tema da agroecologia na agenda das polcas pblicas do pas. Cabe destacar, por exemplo,

    a ao coordenada e integrada de vrios ministrios na elaborao da Polca Nacional de Agroe-

    cologia e Produo Orgnica, estabelecida como uma das metas do Plano Nacional de Segurana

    Alimentar e Nutricional, que foi recentemente lanada pela Presidenta Dilma.

    Para alm do alcance imediato das recomendaes do relatrio, sua traduo e divulgao contri-

    buiro para mobilizar, subsidiar e qualificar o debate preparatrio da Rio + 20, indicando elementos

    estratgicos para a formulao de uma nova gerao de polcas agroambientais, construdas em

    dilogo com a sociedade, capazes elevar a produo de alimentos a parr de uma matriz tecnolgicaambientalmente sustentvel e socialmente includente.

    Que o chamado repercuta, amplie e esmule o engajamento de indivduos e sujeitos colevos que

    protagonizam na sociedade brasileira aes para a Boa leitura.

    Maya TakagiS N S A N

    Roberto VizennP I C M C B (ICMB)

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    Conselho de Direitos Humanos - Dcima sexta sesso - Item 3 da agenda Promoo

    e proteo de todos os direitos humanos, direitos civis, polcos, econmicos, so-

    ciais e culturais, inclusive o direito ao desenvolvimento

    Relatrio apresentado pelo Relator Especial sobre direito alimentao, Olivier de Schuer

    Resumo

    O reinvesmento na agricultura, desencadeado pela crise no preo dos alimentos de 2008, essen-cial para a plena realizao do direito alimentao. Entretanto, em um contexto de crises ecolgi-cas, alimentares e energcas, a questo mais premente relava ao reinvesmento no o quan-to, mas o como. Este relatrio explora como os Pases podem e devem obter uma reorientao deseus sistemas agrcolas para meios de produo que sejam altamente produvos, altamente susten-tveis e que contribuam para a realizao progressiva do direito humano alimentao adequada.

    Baseado em uma ampla reviso da literatura cienfica publicada nos lmos cinco anos, o RelatorEspecial idenfica a agroecologia como um meio de desenvolvimento agrcola que no apenas apre-senta fortes conexes conceituais com o direito alimentao, mas tem resultados comprovadospara um rpido progresso na concrezao deste direito humano para muitos grupos vulnerabili-zados em diversos pases e ambientes. Alm disto, a agroecologia proporciona vantagens que socomplementares s abordagens convencionais mais bem conhecidas, tais como a criao de varie-dades de alta produvidade. E ela contribui bastante para um maior desenvolvimento econmico.

    O relatrio sustenta que a disseminao destas experincias o principal desafio que precisa ser

    planejado hoje. possvel criar um ambiente propcio para esses modos de produo sustentveismediante polcas pblicas adequadas, entre as que se incluem: dar prioridade a aquisio de benspblicos com despesas pblicas em vez de apenas subsidiar insumos; invesr em conhecimento parao reinvesmento em servios de pesquisa e extenso agrcola; invesr em formas de organizaosocial que esmulem parcerias, incluindo escolas de campo para agricultores e redes de inovaode movimentos de agricultores; invesr em sistemas de pesquisa e extenso agrcola; empoderaras mulheres; e criar um ambiente macroeconmico propcio, por exemplo, pondo em contato aspropriedades agrcolas com mercados justos.

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    Sumrio

    Apresentao........................................................................................................................

    I. Introduo..........................................................................................................................

    II. Diagnsco: trs objevos dos sistemas alimentares.......................................................

    III. Contribuio da Agroecologia ao Direito Alimentao..................................................

    A. Disponibilidade: a agroecologia aumenta a produvidade no nvel do campo..........................

    B. Acessibilidade: a agroecologia reduz a pobreza rural.................................................................

    C. Adequao: a agroecologia contribui para melhorar a nutrio.................................................

    D. Sustentabilidade: a agroecologia contribui para a adaptao mudana climca..................E. Parcipao dos agricultores: um avo para a disseminao das boas prcas........................

    IV. Polcas Pblicas para a Ampliao da Agroecologia.......................................................

    A. Priorizando Bens Pblicos..........................................................................................................

    B. Invesndo em Conhecimento.....................................................................................................

    C. Fortalecimento da organizao social mediante a construo conjunta....................................

    D. Empoderamento da mulher........................................................................................................

    E. Organizando Mercados ..............................................................................................................

    V. Recomendaes.......................................................................................................................

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    I. I

    1.Neste relatrio anual apresentado ao Conselho dos Direitos Humanos de acordo com a Resolu-o 13/4 do Conselho, o Relator Especial sobre direito alimentao mostra porque a agricultura

    deve ser fundamentalmente redirecionada para meios de produo que sejam mais sustentveis

    ambientalmente e socialmente justos e como isto pode ser obdo. O relatrio baseado em uma

    ampla gama de apresentaes recebidas de especialistas de todas as regies, bem como em um

    seminrio internacional especializado sobre agroecologia convocado pelo Relator Especial em Bru-

    xelas, Blgica, em 21-22 de junho de 2010, com o apoio da King Baudouin Foundaon.

    2.A agricultura est em uma encruzilhada. Por quase 30 anos, desde o incio da dcada de 1980, nemo setor privado nem os governos estavam interessados em invesr em agricultura. Isto agora est mu-

    dando. Nos lmos anos, as empresas agroalimentares tm observado um aumento no invesmento

    direto como um meio de reduzir os custos e assegurar a viabilidade a longo prazo dos insumos1: o

    invesmento direto estrangeiro em agricultura passou de uma mdia de US$ 600 milhes anualmentena dcada de 1990 para US$ 3 bilhes em 2005-20072. O choque criado pela crise mundial no preo

    dos alimentos de 2007-2008 levou ao surgimento ou fortalecimento de outras iniciavas, tais como a

    Iniciava de Segurana Alimentar Aquila, o Programa Global de Agricultura e Segurana Alimentar (GA-

    FSP) ou o Programa de Desenvolvimento Integral da Agricultura da frica (CAADP) do NEPAD na frica.

    Os governos esto prestando maior ateno agricultura do que no passado.

    3.O aumento na produo de alimentos condio necessria, mas no suficiente para sasfazeras necessidades futuras. Ele no permir um progresso significavo no combate fome e desnu-

    trio se no for combinado com medidas de garana de maior renda e melhores condies de vidapara os mais pobres - parcularmente agricultores que pracam agricultura de pequena escala em

    pases em desenvolvimento. E os ganhos de curto prazo sero compensados por perdas de longo

    prazo se isto levar a uma maior degradao dos ecossistemas, ameaando a capacidade futura de

    manter os nveis de produo atuais. possvel, entretanto, melhorar significavamente a produ-

    vidade agrcola onde ela tenha sido deixada para trs e, portanto, aumentar a produo onde ela

    mais precisa ser aumentada (isto , em pases pobres e com dficit alimentar3) ao mesmo tempo

    em que so melhoradas as condies de vida de agricultores que pracam agricultura em pequena

    escala e preservados os ecossistemas. Isto reduziria a velocidade da tendncia de urbanizao nos

    pases relacionados, que est produzindo uma tenso sobre os servios pblicos destes pases. Istocontribuiria para o desenvolvimento rural e preservaria a capacidade das prximas geraes para o

    suprimento das suas necessidades. Contribuiria tambm para o crescimento de outros setores da

    economia ao esmular a demanda por produtos no agrcolas como conseqncia de invesmentos

    em reas rurais.

    1. Consulte A/HRC/13/33.2.Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio e Desenvolvimento (UNCTAD), Transnaonal Corporaons, Agricultural Producon and Develop-ment (Relatrio de Invesmento Mundial 2009. Empresas Mulnacionais, Produo Agrcola e Desenvolvimento), Nova York/Genebra, 2009.3. Apesar deste relatrio se concentrar nestes pases, o Relator Especial est convencido que a transio para a agricultura de baixos insumos externose sustentvel e necessria em todas as regies, inclusive nos pases industrializados.

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    4.Para obter isto, entretanto, despejar dinheiro na agricultura no ser suficiente; o mais impor-tante adotar medidas que facilitem a transio para um po de agricultura com baixas emisses

    de carbono e conservao de recursos que beneficie os agricultores mais pobres. Isto no ocorrer

    por acaso, mas dever ser fruto de um planejamento deliberado atravs de estratgias e programas

    respaldados pela vontade polca e baseado no enfoque relacionado ao direito alimentao. Este

    relatrio explora como a agroecologia, um meio de desenvolvimento agrcola que tem apresentadonotvel sucesso na lma dcada (consulte a Seo III), pode desempenhar um papel importante

    na consecuo deste objevo.

    II. D:

    5.Garanr o direito alimentao significa garanr a possibilidade de se alimentar diretamente deterras produvas, ou atravs de outros recursos naturais ou comprar alimentos. Isto implica asse-

    gurar que o alimento esteja disponvel, acessvel e seja adequado. Disponibilidade est relacionada

    com a existncia de alimento suficiente no mercado para suprir as demandas. Acessibilidade implica

    acesso tanto sico quanto econmico: acessibilidade sica significa que o alimento deve estar aces-

    svel a todas as pessoas, inclusive aos fisicamente vulnerabilizados como crianas, idosos ou pessoas

    com deficincia; acessibilidade econmica significa que o alimento deve ser economicamente aces-

    svel sem comprometer outras necessidades bsicas como educao, assistncia mdica ou habita-

    o. Adequao requer que os alimentos sasfaam as necessidades nutricionais (levando em conta

    a idade, condies de vida, sade, profisso, sexo etc., de uma pessoa), sejam seguros para consumo

    humano, isentos de substncias adversas e culturamente aceitveis. A parcipao de grupos em

    situao de insegurana alimentar e nutricional na elaborao e implantao das polcas que maisos afetam tambm uma dimenso essencial do direito alimentao.

    6.De acordo com as obrigaes assumidas pelos Pases em virtude dos tratados internacionais dedireitos humanos para adotar medidas eficazes para que se cumpra o direito alimentao, siste-

    mas alimentares devem ser desenvolvidos para cumprir os trs objevos abaixo.

    7.Em primeiro lugar, os sistemas alimentares devem garanr a disponibilidade de alimento paratodos, isto , a oferta deve adaptar-se s demandas mundiais. As esmavas mais amplamente cita-

    das mostram que um aumento global na produo agrcola deve angir 70% at 20504

    , levando emconta o crescimento demogrfico, bem como mudanas na composio das dietas e nveis de con-

    sumo associados maior urbanizao e maior renda familiar. Esta esmava, sem dvida, precisa

    ser colocada em uma perspecva adequada, pois ela d como certas as curvas de demanda atuais.

    Atualmente, aproximadamente metade da produo mundial de cereais ulizada para produzir

    4. J.A. Burney, et al., Greenhouse gas migaon by agricultural intensificaon, Proceedings of the Naonal Academy of Sciences, 107:26, 2010,pgs. 12052-12057.

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    rao animal e o consumo de carne tem a previso de aumentar em 37,4 kg/pessoa/ano em 2000

    para mais de 52 kg/pessoa/ano at 2050, de modo que at a metade do sculo, 50% da produo

    total de cereais possa ser desnada ao aumento da produo de carne5. Portanto, a realocao dos

    cereais usados em rao animal para consumo humano, uma opo altamente desejvel em pases

    desenvolvidos onde o consumo excessivo de protena animal uma fonte de problemas de sade

    pblica, combinada ao desenvolvimento de alimentos alternavos baseados em nova tecnologia,

    resduos e descartes, pode ser um atalho para o atendimento s maiores demandas. O Programa

    Ambiental das Naes Unidas (UNEP) esma que, mesmo contabilizando o valor energco da car-

    ne produzida, a perda de calorias que resulta da alimentao animal com cereais em vez do uso de

    cereais diretamente como alimento humano, representa a necessidade calrica anual para mais de

    3,5 bilhes de pessoas6. Alm disto, as perdas alimentares no campo (entre o plano e a colheita)

    podem alcanar entre 20 a 40% da safra em potencial nos pases em desenvolvimento, devido a

    pragas e a doenas e s perdas mdias ps-colheitas, resultantes da armazenagem e conservao

    inadequadas, chegam no mnimo a 12% e at 50% para frutas, legumes e hortalias 7. Finalmente,

    como resultado de polcas para promover a produo e emprego de agrocombusveis, o desvio

    das safras do suprimento das necessidades alimentares para suprir as demandas energcas con-tribui para uma maior presso sobre os insumos agrcolas. Apesar de todos estes serem domnios

    nos quais poderiam ser adotadas medidas, a necessidade de superar o desafio do lado da oferta

    permanece.

    8. Em segundo lugar, a agricultura deve se desenvolver de maneira que aumente a renda dospequenos proprietrios. A disponibilidade de alimentos , em primeiro lugar e acima de tudo, uma

    questo de nvel familiar e as causas da fome so associadas, principalmente, no a insuficincia

    de estoques ou oferta global incapaz de atender a demanda, mas pobreza; aumentar a renda

    dos mais pobres a melhor maneira de combat-la. As comparaes entre pases demonstram queo crescimento do PIB originrio da agricultura no mnimo duas vezes mais eficaz na reduo da

    pobreza do que o crescimento do PIB que se origina fora da agricultura8. Mas alguns pos de inves-

    mentos so mais efevos do que outros na consecuo deste objevo. Os efeitos mulplicadores

    so significavamente maiores quando o crescimento desencadeado pela maior renda dos peque-

    nos proprietrios, esmulando a demanda por produtos e servios de vendedores e prestadores de

    servio locais. Quando as grandes propriedades aumentam sua receita, a maior parte dela inves-

    da em insumos e mquinas importadas e uma parte muito menor vai para os comerciantes locais9.

    Apenas ao apoiarmos os pequenos produtores ns poderemos ajudar a romper o crculo vicioso que

    leva da pobreza rural expanso de favelas urbanas, nas quais a pobreza gera mais pobreza.

    5. Organizao de Alimentos e Agricultura (FAO), World Agriculture: towards 2030/2050, Relatrio Provisrio, Roma, 2006.6. Programa Ambiental das Naes Unidas (UNEP), The environmental food crisis The environments role in averng future food crises, 2009, pg. 27.7. Programa Ambiental das Naes Unidas (UNEP), The environmental food crisis The environments role in averng future food crises, 2009, pgs.30-318. Banco Mundial, World Development Report 2008: Agriculture for Development, Washington D.C., 2007, pg. 6. Consulte tambm J. Alston et al.,A meta-analysis of rates of return to agricultural R&D, Relatrio de Pesquisa 113, Washington D.C., Instuto Internacional de Pesquisa de PolcaAlimentar (IFPRI), 2002.9. Ulrich Hoffmann, Assuring food security in developing countries under the challenges of climate change: Key trade and development issues of aprofound transformaon of agriculture, Documento de Discusso n 201, UNCTAD, novembro de 2010, pg. 15.

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    9. Em terceiro lugar, a agricultura no deve comprometer a sua capacidade de sasfazer as neces-sidades futuras. A perda de biodiversidade, uso insustentvel da gua e contaminao dos solos e

    da gua so problemas que comprometem a capacidade connua dos recursos naturais apoiarem

    a agricultura. A mudana climca, que se traduz em eventos meteorolgicos mais frequentes e ex-

    tremos, tais como secas e inundaes e precipitaes pluviomtricas menos previsveis, j est ten-

    do um grave impacto sobre a capacidade de determinadas regies e comunidades se alimentarem edesestabilizando os mercados10. A mudana nas temperaturas mdias est ameaando a capacidade

    de regies inteiras, parcularmente as que sobrevivem de agricultura de sequeiro para manterem os

    nveis reais de produo agrcola11. Menos gua doce estar disponvel para a produo agrcola e o

    aumento no nvel do mar j est provocando a salinizao da gua em determinadas reas costeiras,

    tornando as fontes de gua imprprias para fins de irrigao. At 2080, mais 600 milhes de pessoas

    podem estar sob risco de fome, em resultado direto da mudana climca 12. Na frica subsaariana,

    a projeo que as reas ridas e semiridas aumentem de 60 milhes a 90 milhes de hectares,

    enquanto que no sul da frica esma-se que a produvidade da agricultura irrigada por chuva possa

    ser reduzida em at 50% entre 2000 e 202013

    . As perdas na produo agrcola em diversos pases emdesenvolvimento poderiam ser parcialmente compensadas pelos ganhos em outras regies, mas o

    resultado global seria uma reduo de no mnimo 3% na capacidade produva at a dcada de 2080

    e at 16% se os efeitos previstos da ferlizao do carbono (incorporao do dixido de carbono no

    processo de fotossntese) deixarem de se materializar14.

    10. A maioria dos esforos no passado se concentrou no aperfeioamento das sementes e emassegurar que os agricultores recebam um conjunto de insumos que possa aumentar a produvida-

    de, replicando o modelo de processos industriais nos quais insumos externos servem para produzir

    os resultados em um modelo de produo linear. Ao contrrio, a agroecologia busca aperfeioar a

    sustentabilidade dos agroecossistemas imitando a natureza e no a indstria15. Este relatrio sugere

    que a propagao das prcas agroecolgicas pode aumentar simultaneamente a produvidade

    agrcola e a segurana alimentar, melhorar a renda e os meios de vida rural e reverter e conter a

    tendncia de perda de espcies e eroso genca.

    11.As sees abaixo explicam o que agroecologia e de que maneira contribui para tornar efevoo direito alimentao adequada em suas diferentes dimenses: disponibilidade, acessibilidade,

    adequao, sustentabilidade e parcipao (Seo III). Entretanto, na movimentao para sistemas

    10. Para uma maior verificao da mudana climca sobre os direitos humanos, inclusive o direito a alimentos, consulte A/HRC/10/6111. Stern Review on the Economics of Climate Change, Cambridge, Reino Unido, Cambridge Univ. Press, 2007, pg. 67.12. Programa de Desenvolvimento das Naes Unidas (UNDP), Relatrio de Desenvolvimento Humano de 2007/2008. Combatendo a mudana clim-ca: solidariedade humana em um mundo dividido, Nova York, 2007, pg. 90.13. Painel Intergovernamental sobre Mudana Climca (IPCC), Climate Change 2007: Impacts, Adaptaon and Vulnerability. Contribuio do Grupode Trabalho II ao Quarto Relatrio de Avaliao do Painel Intergovernamental sobre Mudana Climca, Cambridge, Reino Unido, Cambridge Univ.Press, Captulo 9.14. William R. Cline, Global Warming and Agriculture. Impact Esmates by Country, Washington D.C., Centro para Desenvolvimento Global/PetersonInstute for Internaonal Economics, 2007, pg. 96.15. Miguel A. Aleri, Agroecology: The Science of Sustainable Agriculture, 2 edio, Boulder, Colorado, Westview Press, 1995; S. Gliessman, Agroeco-logy: the ecology of sustainable food systems, Boca Raton, Flrida, CRC Press, 2007.

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    16. M.A. Aleri, Agroecology: The Science of Sustainable Agriculture, citado acima no n 15.17. Avaliao Internacional de Conhecimento Agrcola, Cincia e Tecnologia para Desenvolvimento (IAASTD), Summary for Decision Makers of theGlobal Report, aprovado por 58 governos em Johannesburg, abril/2008, consulte a Descoberta Principal 7; consulte A. Wezel et al., A quantaveand qualitave historical analysis of the scienfic discipline of agroecology, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 7:1, 2009, pgs. 3-18(mostrando o crescente interesse de agroecologia na literatura cienfica).18. Miguel A. Aleri and Clara I. Nicholis, Agroecology and the Search for a Truly Sustainable Agriculture, UNEP, Mxico, 2005.19. Polca de Agricultura Sustentvel e Desenvolvimento Rural (SARD), Resumo 11, 2007.20. Para verificar os desenvolvimentos neste quatro pases, consulte: A. Wezel et al., Agroecology as a science, a movement and a pracce. A review,Agronomia para Desenvolvimento Sustentvel, 29, 2009, pgs. 503-515.21.Miguel A. Aleri and Clara I. Nicholis, Agroecology and the Search for a Truly Sustainable Agriculture, citado acima no n 18.22.D.P. Garrity et al., Evergreen Agriculture: a robust approach to sustainable food security in Africa, Food Security 2:3, 2010, pgs. 197214.

    agrcolas mais sustentveis, o tempo o maior fator limitador. O sucesso ou o fracasso depender

    da nossa capacidade de aprender mais rapidamente as inovaes recentes e disseminar os trabalhos

    de maneira mais ampla. A Seo IV dedicada s polcas pblicas que os pases devem adotar para

    ampliar a agroecologia.

    III. C A D A

    12.A agroecologia tanto uma cincia quanto um conjunto de prcas. Ela foi criada pela con-vergncia de duas disciplinas cienficas: agronomia e ecologia. Como uma cincia, a agroecologia

    a aplicao da cincia ecolgica ao estudo, projeto e gesto de agroecossistemas sustentveis16.

    Como um conjunto de prcas agrcolas, a agroecologia busca maneiras de aperfeioar os sistemas

    agrcolas imitando os processos naturais, criando, portanto, interaes biolgicas benficas e siner-

    gias entre os componentes do agroecossistema. Ela apresenta as condies de solo mais favorveis

    para o crescimento das plantas, parcularmente pela gesto de matria orgnica e pelo aumentona avidade bica do solo. Dentre os princpios bsicos da agroecologia destacam-se: a reciclagem

    de nutrientes e energia nas propriedades agrcolas, em vez da introduo de insumos externos;

    integrar culvos agrcolas e a pecuria; diversificar as espcies e os recursos gencos dos agroe-

    cossistemas no tempo e espao; e concentrar-se em interaes e produvidade em todo o sistema

    agrcola e no se concentrar em espcies individuais. A agroecologia faz um uso altamente intensivo

    do conhecimento, baseado em tcnicas que no so transmidas a parr dos nveis superiores, mas

    desenvolvidas com base no conhecimento e experimentao dos agricultores.

    13.Como uma maneira de melhorar a resilincia e a sustentabilidade dos sistemas alimentares, aagroecologia conta atualmente com o respaldo de um nmero de especialistas na comunidade cien-

    fica17e por agncias e organizaes internacionais, tais como a Organizao de Alimentos e Agri-

    cultura das Naes Unidas (FAO), UNEP18 e Biodiversity Internaonal19. Ela tambm est ganhando

    terreno em pases to diversificados quanto os Estados Unidos, Brasil, Alemanha e Frana20.

    14. A agroecologia um conceito coerente para projetar os sistemas agrcolas futuros, pois estfortemente enraizada tanto na cincia quanto na prca e porque apresenta fortes conexes com

    os princpios do direito alimentao adequada (Seo III). Ela pode ser vista como englobando - ou

    inmamente relacionada a - abordagens como ecoagricultura21e agricultura perene22, enquan-

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    to que os conceitos de intensificao ecolgica e agricultura de conservao frequentemente

    seguem determinados princpios agroecolgicos. A agroecologia est relacionada ao enfoque sis-

    tmico para a intensificao sustentvel da produo agrcola, recentemente apoiada pelo Comit

    sobre Agricultura da FAO (COAG)23. A discusso das diferenas detalhadas entre estes conceitos est

    alm do escopo deste relatrio.

    15. A seleo genca na agropecuria e a agroecologia so complementares. Por exemplo, me-diante a seleo genca vegetal se obtm novas variedades com ciclos mais curtos de culvo, o

    que possibilita com que os agricultores connuem realizando a agricultura em regies nas quais a

    temporada de cultura j tenha diminudo. A seleo genca pode tambm melhorar o nvel de

    resistncia seca das variedades de plantas, um avo para os pases nos quais a falta de gua um

    fator limitante. O reinvesmento em pesquisa agrcola deve, consequentemente, significar esforos

    connuos no mbito da seleo genca. Entretanto, a agroecologia mais abrangente, pois apia

    a construo de sistemas agrcolas resistentes seca (incluindo solos, plantas, agrobiodiversidade

    etc.) e no apenas plantas resistentes seca.

    A. Disponibilidade: a agroecologia aumenta a produvidade no nvel do campo

    16. Uma ampla gama de tcnicas baseadas na perspecva agroecolgica tem sido desenvolvidae testada com sucesso em diversas regies24. Estas abordagens envolvem a manuteno ou intro-duo de biodiversidade agrcola (diversidade de culturas, pecuria, agrofloresta, pesca, poliniza-dores, insetos, biota do solo e outros componentes que ocorrem nos e em relao aos sistemas deproduo) para angir os resultados desejados na produo e sustentabilidade. A gesto integradade nutrientes reconcilia a necessidade de fixar o nitrognio dentro dos sistemas agrcolas com a im-

    portao de fontes inorgnicas e orgnicas de nutrientes e a reduo de perdas de nutrientes atra-vs do controle da eroso. A agrofloresta incorpora rvores mulfuncionais aos sistemas agrcolas.Na Tanznia, 350.000 hectares de terras foram reabilitados nas provncias a oeste de Shinyanga eTabora usando agrofloresta25; h projetos de larga escala similares desenvolvidos em outros pases,incluindo Malawi, Moambique e Zmbia26. A captao de gua em reas de terra seca permite oculvo de terras anteriormente abandonadas e degradadas e melhora a produvidade hdrica dosculvos. No oeste da frica, barreiras de pedra construdas ao longo dos campos de culvos redu-zem o escoamento da gua durante a temporada das chuvas, permindo uma melhoria na umidadedo solo, o reabastecimento dos tabuleiros dgua e redues na eroso do solo. A capacidade de re-teno de gua mulplicada de 5 a 10 vezes, a produo de biomassa se mulplica de 10 a 15 vezes

    e o gado pode se alimentar da grama que cresce ao longo das barreiras de pedra aps as chuvas27

    .23. Relatrio da 22 Sesso do Comit sobre Agricultura (COAG), Roma, 16-19 de junho de 2010 (CL 140/3 (C 2011/17).24. Consulte Jules Prey, Agricultural sustainability: concepts, principles and evidence, Philosophical Transacons of the Royal Society B, 363(1491),2008, pgs. 447-465.25. C. Pye-Smith A Rural Revival in Tanzania: How agroforestry is helping farmers to restore the woodlands in Shinyanga Region, Trees for ChangeNo. 7, Nairobi, World Agroforestry Centre (ICRAF), 2010, pg. 15.26. D.P. Garrity et al., Evergreen Agriculture: a robust approach to sustainable food security in Africa, Food Security 2:3, 2010, pg. 200; K. Linyungaet al., Accelerang agroforestry adopon: A case of Mozambique, ICRAF Agroforestry Project, Paper apresentado no Congresso da IUFRO, Roma,12-15 de julho de 2004.27. A.M. Diop, Management of Organic Inputs to Increase Food Producon in Senegal, em Agroecological innovaons. Increasing food produconwith parcipatory development, N. Uphoff (ed.), London, Earthscan Publicaons, 2001, pg. 252.

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    28. Jules Prey et al., Resource-conserving agriculture increases yields in developing countries, Environmental Science and Technology, 40:4, 2006,pgs. 11141119. O nmero de 79 por cento refere-se s 360 comparaes de produvidade confiveis de 198 projetos. Houve um grande espalha-mento dos resultados, com 25 por cento dos projetos informando um aumento de 100 por cento ou mais.29. Fora-tarefa de Capacitao da UNEP-UNCTAD sobre Comrcio, Meio Ambiente e Desenvolvimento (CBTF), Organic Agriculture and Food Securityin Africa, Nova York/Geneva, Naes Unidas, 2008, pg. 16.30. Tais como os aperfeioamentos na mandioca, para os quais o NaCRRI desenvolveu variedades resistentes desenvolvidas localmente em Uganda ouaperfeioamentos no tef na Epia, onde o Debre Zeit Agricultural Research Centre desenvolveu uma nova variedade chamada Quncho.31. J. Prey et al., Sustainable intensificaon in African agriculture, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 9:1, a ser publicado em 2011.

    A integrao da pecuria nos sistemas agrcolas, tais como gado leiteiro, porcos e aves, proporcionauma fonte de protena para a famlia, bem como um meio de ferlizar os solos; assim como a incor-porao de peixes, camares e outros recursos aqucos nos sistemas agrcolas, tais como camposde arroz irrigados e tanques de peixes.

    17. Estas tcnicas de conservao de recursos com baixos insumos externos tm um comprovadopotencial para melhorar significavamente a produvidade. No que pode ser o estudo mais siste-mco do potencial destas tcnicas at a presente data, Jules Prey et al. compararam os impactosde 286 projetos agrcolas sustentveis recentes em 57 pases pobres cobrindo 37 milhes de hecta-res (3% da rea culvada em pases em desenvolvimento). Eles concluram que estas intervenesaumentaram a produvidade em 12,6 milhes de propriedades agrcolas, com um aumento mdiona safra de 79%, ao mesmo tempo em que melhoraram a oferta de servios ambientais essenciais 28.Os dados desagregados desta pesquisa demonstraram que a produo alimentar mdia por proprie-dade aumentou em 1,7 tonelada por ano (at 73%) para 4,42 milhes de agricultores que pracamagricultura em pequena escala culvando cereais e tubrculos em 3,6 milhes de hectares e que oaumento na produo de alimentos foi de 17 toneladas por ano (at 150%) para 146.000 agricul-tores em 542.000 hectares culvando tubrculos (batata, batata doce, mandioca). Aps a UNCTADe UNEP terem reanalisado o banco de dados para apresentar um resumo dos impactos na frica,descobriu-se que o aumento na produvidade mdia na safra foi at maior para estes projetos doque a mdia global de 79%, com um aumento de 166% para todos os projetos africanos e um au-mento de 128% para os projetos no leste da frica29.

    18. O estudo de larga escala mais recente aponta para as mesmas concluses. A pesquisa enco-mendada pelo projeto Foresight Global Food and Farming Futures do Governo do Reino Unido reviu40 projetos em 20 pases africanos nos quais a intensificao sustentvel foi desenvolvida durante

    a dcada de 2000. Os projetos incluram entre outros, a ampliao nas colheitas (parcularmenteos aperfeioamentos atravs do culvo de plantas parcipavas em culturas rfs negligenciadasat ento)30, manejo integrado de pragas, conservao do solo e agrofloresta. At o incio de 2010,estes projetos nham benecios documentados para 10,39 milhes de agricultores e suas famliase aperfeioamentos em aproximadamente 12,75 milhes de hectares. A produvidade nas culturasmais que dobrou na mdia (aumentando 2,13 vezes) em um perodo de 3-10 anos, resultando emum aumento na produo agregada de alimentos de 5,7 milhes de toneladas por ano, equivalentea 557 kg/propriedade agrcola31.

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    19.Algumas vezes, inovaes aparentemente menores podem proporcionar altas produvidades.No Qunia, pesquisadores e agricultores desenvolveram a estratgia atrao-expulso para contro-lar ervas daninha e insetos que danificam as culturas. A estratgia consiste em expulsar as pragasdo milho pelo consrcio do milho com culturas repelentes a insetos, como o Desmodium, ao mesmotempo em que os atrai para os pequenos lotes de capim Napier, uma planta que excreta uma gomapegajosa que atrai e aprisiona as pragas. O sistema no apenas controla as pragas, mas tambm temoutros benecios, porque o Desmodium pode ser usado como forragem para o gado. A estratgiaatrao-expulso dobra a produvidade de milho e produo de leite, ao mesmo tempo em quemelhora o solo. O sistema j foi difundido para mais de 10.000 propriedades no leste da frica pormeio de reunies municipais, transmisses nacionais em rdio e escolas de campo para agricultores32.No Japo, os agricultores descobriram que patos e peixes eram to eficazes quanto pescidas para ocontrole de insetos nos arrozais, ao mesmo tempo em que proporcionavam protena adicional parasuas famlias. Os patos comem ervas daninhas, sementes de ervas daninhas, insetos e outras pragas,reduzindo, portanto, a mo de obra com capina, de outra forma feita manualmente por mulheres, eas fezes dos patos fornecem nutrientes s plantas. O sistema foi adotado na China, ndia e Filipinas.Em Bangladesh, o Internaonal Rice Research Instute relatou um aumento de 20% na produvida-

    de das culturas e o rendimento lquido com base no custo monetrio aumentou em 80%33.

    20.A agroecologia tambm est ganhando espao em Malawi, um pas que esteve no centro daateno nos lmos anos. Malawi lanou com sucesso um programa de subsdio a ferlizantes em2005-2006, aps a dramca crise alimentar devida seca de 2004-2005. Entretanto, est atual-mente implantando sistemas de agrofloresta, usando rvores fixadoras de nitrognio, para assegu-rar o crescimento sustentado na produo de milho em preparao para a situao de mdio prazoquando os subsdios a ferlizantes possam ter diminudo ou verem sido rerados34. At meados de2009, mais de 120.000 agricultores de Malawi haviam recebido treinamento e mudas de rvore do

    programa e o apoio da Irlanda possibilitou agora a extenso do programa para 40% dos distritos deMalawi, beneficiando 1,3 milho das pessoas mais pobres. A pesquisa demonstra que isto resultaem um aumento na produvidade de 1 tonelada/ha para 2-3 toneladas/ha, mesmo que os agriculto-res no possam pagar os custos dos ferlizantes nitrogenados comerciais. Com uma aplicao de 1/4da dose de ferlizante mineral, a produvidade do milho pode ultrapassar 4 toneladas/ha. Entretan-to, isto demonstra que, apesar do invesmento em tcnicas de ferlizao orgnica deva ser umaprioridade, isto no deve excluir o uso de outros ferlizantes. Uma soluo ma que poderia seruma estratgia de sada dos esquemas de subsdio a ferlizantes seria vincular diretamente essesinvesmentos agrofloresta no campo o que proporciona sustentabilidade de longo prazo no forne-cimento de nutrientes e estabelecer a sade do solo como base para uma produvidade sustentadae uma melhor eficincia da resposta dos ferlizantes35. Malawi est supostamente explorando esta

    abordagem de subsdio sustentabilidade36.

    32. Z. Khan et al., Push-pull technology: a conservaon agriculture approach for integrated management of insect pests, weeds and soil health inAfrica, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 9:1, a ser publicado em 2011.33. Integrated rice-duck: a new farming system for Bangladesh, em Innovaons in Rural Extension: Case Studies from Bangladesh, P. Van Mele et al.(eds.), Oxfordshire, Reino Unido/Cambridge, EUA, CABI Publishing, 2005.34. D.PG. Garrity et al., Evergreen Agriculture: a robust approach to sustainable food security in Africa, Food Security 2:3, 2010, pg. 203.35. Consulte O.C. Ajayi et al., Labour inputs and financial profitability of convenonal and agroforestrybased soil ferlity management pracces inZambia, Agrekon, 48, 2009, pgs. 246292: [] os mtodos agroecolgicos de gesto da ferlidade do solo so compaveis com ferlizantes mine-rais e seu uso combinado tem efeitos sinergscos produvidade, (pg. 288).36. D.PG. Garrity et al., Evergreen Agriculture: a robust approach to sustainable food security in Africa, Food Security 2:3, 2010, pg. 204. Para ava-liaes desta experincia, consulte Ann Quinion et al., Do agroforestry technologies improve the livelihoods of the resource poor farmers? Evidencefrom Kasungu and Machinga districts of Malawi, Agroforestry Systems, 80:3, 2010, pgs. 457-465.

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    37. Em escala global, as culturas de cobertura leguminosa podem fixar nitrognio suficiente para substuir a quandade de ferlizantes sintcosatualmente em uso. Consulte C. Badgley et al., Organic agriculture and the global food supply, Renewable Agriculture and Food Systems, 22, 2007pgs. 86-108.38. Nicholas Minot e Todd Benson, Ferlizer subsidies in Africa: Are vouchers the answer? Resumo da Edio 60 IFPRI, julho de 2009.

    B. Acessibilidade: a agroecologia reduz a pobreza rural

    G

    21.Ao aperfeioar a ferlidade da produo agrcola, a agroecologia reduz a dependncia dosagricultores a insumos externos e subsdios estatais. Isto, por sua vez, faz com que os pequenos

    proprietrios vulnerabilizados dependam menos dos varejistas e atravessadores locais. Uma dasprincipais razes pela qual a agroecologia ajuda a manter as rendas nas reas rurais pelo fato delapromover a ferlizao nas reas agrcolas. De fato, o fornecimento de nutrientes ao solo no exigenecessariamente a adio de ferlizantes minerais. Ele pode ser feito pela aplicao de esterco degado ou pela adubao verde. Os agricultores tambm podem criar uma fbrica de ferlizantes nasreas de culvo, plantando rvores que reram nitrognio do ar e o fixam em suas folhas, poste-riormente incorporados ao solo. Isto, em essncia o resultado do plano da Faidherbia albida, umaespcie de accia fixadora de nitrognio nava da frica e amplamente espalhada por todo o con-nente. Visto que esta rvore entra em estado de dormncia e perde sua folhagem durante o incio datemporada chuvosa, no momento em que as culturas esto sendo estabelecidas, ela no concorre

    significavamente com as outras por luz, nutrientes ou gua durante a estao de crescimento; aomesmo tempo permite um aumento significavo na produvidade do milho com o qual ela com-binada, parcularmente em condies de baixa ferlidade do solo. Na Zmbia, a produvidade domilho no ferlizado nas proximidades das rvores Faidherbia angiu em mdia 4,1 toneladas/ha,comparada com 1,3 tonelada/ha que se obnham quando era plantada nas proximidades, mas nodebaixo das copas das rvores. Resultados semelhantes foram observados em Malawi, onde estarvore tambm amplamente ulizada. O uso destas rvores fixadoras de nitrognio evita a depen-dncia por ferlizantes sintcos, cujo preo tem aumentado cada vez mais e se tornado voll noslmos anos, ultrapassando os preos das commodies alimentares, mesmo quando este lmoangiu o pico em julho de 2008. Desta forma, os recursos financeiros podem ser ulizados para cus-tear outras necessidades essenciais como a educao e a sade.

    22. A agrofloresta ou tcnicas semelhantes, tais como o uso de culturas de cobertura de legumi-nosas para fixar nitrognio, tambm tem um enorme potencial37. Isto parcularmente importantepara os agricultores mais pobres, que tm menor probabilidade de obter recursos para comprarferlizantes qumicos convencionais e que frequentemente no so alcanados pelos sistemas co-merciais agrcolas convencionais, parcularmente pelo fato do setor privado ter pouca probabilida-de de invesr em reas mais remotas nas quais a comunicao falha e uma pequena economia deescala pode ser angida. Mas tambm importante para os pases de baixa renda, que importam osferlizantes inorgnicos para suprir suas necessidades. Na frica subsaariana, o uso de ferlizantes

    muito baixo [mdia de 13 quilogramas (kg) de nutrientes de ferlizante por hectare]38

    em parte, porcausa dos considerveis custos fiscais envolvidos na importao e distribuio deles.

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    2

    E :

    23.Os mtodos agroecolgicos podem ter uso intensivo de mo de obra durante o perodo deimplantao, devido complexidade das tarefas da gesto da propriedade e reciclagem dos resduosproduzidos. Entretanto, a pesquisa demonstra que o uso mais intensivo de mo de obra da agroeco-logia uma realidade parcularmente de curto prazo39. Alm disto, apesar de polcas de proteo

    de empregos terem sido geralmente priorizadas pelos governos, a criao de empregos nas reasrurais dos pases em desenvolvimento, onde o subemprego atualmente macio e o crescimentodemogrfico permanece alto, pode constuir uma vantagem, e no um problema, e pode reduzira migrao rural-urbana. O custo de se criar empregos na agricultura significavamente menordo que em outros setores: no Brasil, dados do INCRA, que a instuio responsvel pela reformaagrria, demonstraram que cada emprego gerado em um assentamento custa para o governo US$3.640, enquanto que o custo seria 128% mais caro na indstria, 190% maior no comrcio e 240%maior em servios40. De acordo com organizaes de agricultores, a agroecologia tambm maisatraente para eles, porque proporciona caracterscas agradveis para aqueles que esto trabalhan-do na terra um longo tempo, tais como a sombra das rvores ou a ausncia do cheiro e toxicidadedos produtos qumicos41.

    24. Em Burkina Faso, em vez de migrarem, grupos de trabalho de jovens especialistas em tcnicasde reabilitao de terras, tais como tassas e poos de sombra zai, vo de vila em vila para sasfazero crescente interesse dos agricultores no aperfeioamento de suas prprias terras. Os agricultoresesto atualmente comprando terras degradadas para que possam melhor-las pagando estes traba-lhadores para cavar poos zai e construir as paredes de rocha e estruturas em meia lua que podemtransformar a produvidade42. Esta uma das razes pelo fato de mais de 3 milhes de hectares deterra em Burkina Faso estarem agora reabilitadas e produvas.

    25. Apesar de criarem empregos, os mtodos agroecolgicos so totalmente compaveis comuma mecanizao gradual da agricultura. A necessidade de produzir equipamentos para tcnicasagrcolas de conservao, tais como no-ll e plano direto na realidade resulta na criao de maisempregos no setor de fabricao. Isto real, parcularmente na frica, que ainda importa a maiorparte do seu equipamento, mas que fabrica cada vez mais equipamentos simples43. O emprego podetambm resultar da expanso da agrofloresta. No sul da frica, os agricultores produzem rvorescomo um negcio, apoiados por uma linha de crdito de financiamento estabelecida pelo WorldAgroforestry Centre (ICRAF). Durante o seu primeiro ano, o Programa de Segurana Alimentar deAgrossilvicultura do Malawi distribuiu sementes de rvores, implantando 17 viveiros que produzi-ram 2.180.000 mudas e estabeleceu 345 grupos de agricultores44.

    39. Consulte O.C. Ajayi et al., Labour inputs and financial profitability of convenonal and agroforestrybased soil ferlity management pracces inZambia, Agrekon, 48, 2009, pgs. 246292: a pesquisa sobre agrosilvicultura na Zmbia no sustenta a noo popular de que as prcas de agrosil-vicultura tm um uso mais intenso de mo de obra (pg. 279).40. Miguel Carter (org.), Combatendo a desigualdade social: O MST e a reforma agrria no Brasil, So Paulo, Editora Unesp, Centro para Estudos Bra-sileiros, Universidade de Oxford, NEAD, MDA, 2010, pg. 69.41. P. Rosset et al. Revolucin agroecolgica: El Movimiento de Campesino a Campesino de la ANAP en Cuba, Havana, La Via Campesina e ANAP, 2010.42. J. Prey et al., Sustainable intensificaon in African agriculture, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 9:1, a ser publicado em 2011.43. No leste da frica, este desenvolvimento foi facilitado pelo intercmbio de tecnologia de fabricantes brasileiros para os seus parceiros no leste dafrica: consulte Brian Sims et al., Agroforestry and Conservaon Agriculture: Complementary pracces for sustainable development, 2 CongressoMundial de Agrosilvicultura, Nairobi, Kenya, 23-28 de agosto de 2009.44. C. Pye-Smith, Farming Trees, Banishing Hunger: How an agroforestry programme is helping smallholders in Malawi to grow more food and improvetheir livelihoods, Nairobi, Centro Mundial de Agrosilvicultura, 2008, pg. 10.

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    45. M.W. Demment et al., Providing micronutrients through food based soluons: a key to human and naonal development, Journal of Nutrion,133, 2003, pgs. 3879-3885.46. E. Frison et al., Agricultural biodiversity, nutrion and health: making a difference to hunger and nutrion in the developing world, Food andNutrion Bullen, 27:2, 2006, pgs. 167-179.47. Consulte See B.J. Alloway (ed.), Micronutrient deficiencies in global crop producon, Springer Verlag, 2008, pg. 354; e F.A.J. DeClerck et al., Eco-logical Approaches to Human Nutrion, Food and Nutrion Bullen, a ser publicado em 2011.48. B. Campbell et al., Local level valuaon of Savannah resources: A case study from Zimbabwe, Economic Botany, 51, 1997, pgs. 5777.49. The use of agrobiodiversity by indigenous and tradional agricultural communies in adapng to climate change, paper resumido, Plataformapara Pesquisa de Agrobiodiversidade - Projeto de Mudana Climca, Bioversity Internaonal e The Christensen Fund, 2010.

    C. Adequao: a agroecologia contribui para melhorar a nutrio

    26.No passado, os mtodos da Revoluo Verde se concentraram principalmente no esmulo sculturas de cereais. Entretanto, arroz, trigo e milho so principalmente fontes de carboidratos: elescontm relavamente pouca protena e poucos dos outros nutrientes essenciais para dietas ade-

    quadas. A mudana de sistemas de culvos diversificados para sistemas simplificados baseados emcereais contribuiu, portanto, para uma das formas de desnutrio: a de micronutrientes, em mui-tos pases em desenvolvimento45. De fato, das mais de 80.000 espcies de plantas disponveis parahumanos, arroz, trigo e milho fornecem o grosso das nossas necessidades de protena e energia46.Os nutricionistas atualmente insistem cada vez mais na necessidade de agroecossistemas mais di-versificados, para assegurar uma produo de nutrientes mais diversificada dos sistemas agrcolas 47.

    27. A diversidade de espcies em propriedades agrcolas gerenciadas seguindo princpios agro-ecolgicos, bem como na agricultura urbana ou periurbana um avo importante neste sendo.

    Por exemplo, esmou-se que os frutos indgenas contribuem em mdia com aproximadamente 42%da cesta de alimentos naturais na qual as propriedades rurais se baseiam no sul da frica48. Estano apenas uma fonte importante de vitaminas e outros micronutrientes, mas tambm pode seressencial para o sustento durante os perodos de escassez de alimentos. A diversidade nutricionalpossibilitada pela maior diversidade no campo de importncia parcular para crianas e mulheres.

    D. Sustentabilidade: a agroecologia contribui para a adaptao mudana climca

    28. A agroecologia melhora a resilincia mudana climca. Mudana climca provoca fen-menos meteorolgicos mais extremos. O uso de tcnicas agroecolgicas pode amortecer significa-vamente os impactos negavos destes fenmenos, pois a resilincia fortalecida pelo uso e promo-o da biodiversidade agrcola no ecossistema, que promovem numerosos enfoques agroecolgicosem nvel de ecossistema, o sistema de explorao agrcola e o campo de culvo de cada agricultor49.Aps o furaco Mitch em 1998, um estudo de larga escala em 180 comunidades de pequenos pro-prietrios do sul ao norte da Nicargua demonstrou que lotes agrcolas culvados com mtodosagroecolgicos simples (inclusive diques ou barragens de rocha, adubo verde, rodzio de culturas e aincorporao de restolho, valetas, terraos, barreiras, folhas, vagens, rvores, arado paralelo ao ta-lude, no realizao de queimadas, cercas vivas e zero-llage) nham em mdia 40% mais umidade

    em solo superficial de campos superiores, menos eroso e menores perdas econmicas do que os

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    lotes de controle em propriedades agrcolas convencionais. Em mdia, os lotes agroecolgicos per-deram 18% menos terra arvel por deslizamentos de terra do que os lotes convencionais e apresen-taram 69% menos eroso dos rios em comparao com as propriedades agrcolas convencionais50.

    29. Secas e inundaes mais frequentes e mais severas podem ser esperadas no futuro; os modosagroecolgicos de agricultura so mais bem equipados para suportar estes fenmenos. O Programade agrofloresta desenvolvido no Malawi protegeu os agricultores da perda da safra aps as secas,graas melhor filtrao do solo permida por ele51. De fato, as experincias em campo na Epia,ndia e Pases Baixos demonstraram que as propriedades sicas de solos nas propriedades agrcolasorgnicas melhoraram a resistncia das culturas seca52.

    30. Alm disto, a diversidade de espcies e de avidades agrcolas que os mtodos agroecol-gicos proporcionam so maneiras de atenuar riscos de fenmenos meteorolgicos extremos, bem

    como a invaso de novas pragas, ervas daninhas e doenas, que resultaro do aquecimento global.A prca agroecolgica de consrcios de culvares aposta na diversidade genca nos campos paramelhorar a resistncia de culturas a doenas. Na Provncia Yunnan, na China, aps variedades dearroz susceveis a doena terem sido plantadas em misturas com variedades resistentes, a produ-vidade aumentou 89% e o surgimento de doenas no arroz foi 94% menos grave do que quando asvariedades eram culvadas em monocultura, levando os agricultores a abandonar o uso de agrot-xicos, tais como os sprays fungicidas que eram ulizados anteriormente53.

    31. A agroecologia tambm coloca a agricultura na trajetria da sustentabilidade pela desvincu-lao da produo de alimentos da dependncia da energia fssil (petrleo e gs). Ela contribui paraatenuar as mudanas climcas, tanto por aumentar os sumidouros de carbono na matria orgnicado solo quanto na biomassa da supercie do solo e por evitar emisses de dixido de carbono ou deoutros gases do efeito estufa pelas propriedades agrcolas pela reduo do uso direto e indireto deenergia. O Painel Intergovernamental sobre Mudana Climca (IPCC) esmou o potencial de ate-nuao tcnico global para agricultura em 5,5 a 6 Gt de CO2-equivalente por ano at 2030 54. A maiorparte deste total (89% ) pode vir do sequestro de carbono em solos, armazenando carbono comomatria orgnica do solo (hmus), algo que pode ser feito atravs da agroecologia55.

    50. Eric Holt-Gimnez, Measuring Farmers Agroecological Resistance Aer Hurricane Mitch in Nicaragua: A Case Study in Parcipatory, Sustainable

    Land Management Impact Monitoring, Agriculture, Ecosystems and the Environment, 93:1-2, 2002, pgs. 87-105.51. F.K. Akinnifesi et al., Ferliser trees for sustainable food security in the maize-based producon systems of East and Southern Africa. A review,Agrononomy for Sustainable Development, 30:3, 2010, pgs. 615-629.52. F. Eyhord et al., The viability of coon-based organic agriculture systems in India, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 5, 2007,pgs. 25-38; S. Edwards, The impact of compost use on crop yields in Tigray, Ethiopia, Conferncia Internacional da FAO sobre Agricultura Orgnicae Segurana Alimentar, Roma, 2-4 de maio de 2007.53. Y.Y. Zhu, et al., Genec diversity and disease control in rice, Nature, 406, 2000, pgs. 718722.54. IPCC, Climate Change 2007: Migaon of Climate Change, Contribuio do Grupo de Trabalho III ao Quarto Relatrio de Avaliao, 2007: seo8.4.3.55. Ulrich Hoffmann, Assuring food security in developing countries under the challenges of climate change: Key trade and development issues of aprofound transformaon of agriculture, Paper de discusso n 201, UNCTAD, novembro/2010, pg. 11. Sobre o potencial de atenuao da agricultura,consulte tambm FAO, Food security and agricultural migaon in developing countries: opons for capturing synergies, Roma, 2009.

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    56. Degrande, et al., Mechanisms for scaling-up tree domescaon: how grassroots organisaons become agents of change, ICRAF, 2006, pg. 6;E. Holt-Gimnez, Campesino a campesino: voices from Lan Americas farmer to farmer movement for sustainable agriculture, Oakland, Food FirstBooks, 2006; P. Rosset et al. Revolucin agroecolgica: El Movimiento de Campesino a Campesino de la ANAP en Cuba, Havana, La Via Campesina eANAP, 2010.57. E. Holt Giemenez, Linking farmers movements for advocacy and pracce, Journal of Peasant Studies, 37:1, 2010, pgs. 203-236.58. Henk Van den Berg e Janice Jiggins, Invesng in Farmers. The Impacts of Farmer Field Schools in Relaon to Integrated Pest Management, WorldDevelopment, 35:4, 2007, pgs. 663-686.59. David M. Amudavi, et al., Evaluaon of farmers field days as a disseminaon tool for push-pull technology in Western Kenya, Crop Protecon,28, 2009, pg. 226.60. P. Rosset, et al., The Campesino-to-Campesino agroecology movement of ANAP in Cuba: social process methodology in the construcon of sus-tainable peasant agriculture and food sovereignty, Journal of Peasant Studies, 38:1, a ser publicado em 2011, pgs. 29-30.

    E. Parcipao dos agricultores: um avo para a disseminao das boas prcas

    32. A parcipao de agricultores vital para o sucesso das prcas agroecolgicas. At o mo-mento, a agroecologia tem sido desenvolvida por organizaes de base e ONGs e tem se espalhadoatravs das escolas rurais de agricultores e de movimentos de agricultores, tais como o movimento

    Campesino a Campesino na Amrica Central56

    . A experincia com tcnicas agroecolgicas est cres-cendo diariamente dentro das redes de camponeses como A Via Campesina e a AgriCultures Ne-twork (anteriormente denominada LEISA) globalmente; Rseu des Organisaons Paysannes et desProducteurs Agricoles de lAfrique de lOuest (ROPPA), Eastern & Southern Africa Farmers Forum(ESAFF) e rede PELUM (Parcipatory Ecological Land Use Management) na frica, rede MASIPAG nasFilipinas (Magsasaka at Siyensta Tung sa Pag-unlad ng Agrikultura) ou Assessoria e Servios a Proje-tos em Agricultura Alternava (AS-PTA) e Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) no Brasil57.

    33. As escolas rurais para agricultores tm demonstrado uma reduo significava nas quanda-des de uso de agrotxicos, pois os insumos esto sendo substudos pelo conhecimento. Estudosde larga escala da Indonsia, Vietn e Bangladesh registraram uma reduo de 35 a 92% no uso deinsecidas no arroz e 34 a 66% de reduo no uso de agrotxicos em geral, combinados a ampliaode 4 a 14% na produvidade de algodo na ndia, China e Paquisto58. As escolas rurais de agricul-tores tm tambm invesdo no apoio a organizao dos agricultores e no esmulo ao aprendizadoconnuo. A disseminao bem sucedida da estratgia atrao-expulso (PPS) no leste de frica,promovida pelo Centro Internacional para Fisiologia de Insetos e Ecologia (ICIPE) amplamente de-vida demonstrao de campos modelo, gerenciados por agricultores, que atraem visitas de outrosagricultores durante os dias de campo e a parcerias com sistemas nacionais de pesquisa na Tanznia,Uganda, Epia e outros pases que fizeram esforos de pesquisa e desenvolvimento para realizar as

    adaptaes necessrias, tais como a escolha de culvares de milho59. O crescimento do movimentoCampesino a Campesino em Cuba se baseou nos assessores e coordenadores tcnicos apoiados pelaAssociao Nacional de Pequenos Agricultores (ANAB). Entre 2001 e 2009, o nmero de promo-tores aumentou de 114 para 11.935 e um total de 121.000 oficinas sobre prcas agroecolgicasforam organizadas60.

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    34. O apoio estatal pode impulsionar estes esforos. No Brasil, por exemplo, a Lei de 2010 sobre As-sistncia Tcnica e Extenso Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrria (Lei n 12.188/2010)61prioriza o apoio s avidades de extenso rural em agricultura ecolgica. Esta lei acentuar um saltoqualitavo nos servios brasileiros de extenso, que ocorre em paralelo s mudanas quantavas dalma dcada. De fato, as avidades de extenso organizadas sob a Polca Nacional de AssistnciaTcnica e Extenso Rural (2003) aumentaram de uma mdia de 2.000 avidades/ano em 2004-2005para uma mdia de aproximadamente 30.000/ano em 2007-200962. Estes esforos possibilitam umarpida disseminao das melhores prcas, incluindo prcas agroecolgicas, especialmente quandoos agricultores parcipam do sistema e no so meros receptores de treinamentos.

    IV. P P A A

    35. A ampliao da agroecologia para maximizar os seus impactos posivos sobre os rendimentos,produvidade dos agricultores e ao meio ambiente significa tanto (horizontalmente) aumentar asreas culvadas por tcnicas agroecolgicas quanto (vercalmente) criar uma estrutura de qualificaopara os agricultores. Maneiras inovadoras de assegurar a expanso horizontal incluem a estratgiade ampliao piloto, tal como a implantada com sucesso no Tringulo Chinyanja (Moambique,Malawi e Zmbia) e no oeste e centro da frica pelo Centro Mundial de Agrossilvicultura para aDomescao de rvores. A estratgia se baseia na idenficao das reas de Ampliao Piloto(PSUAs) e no estabelecimento de plataformas de ampliao na formao das equipes de mudanae na idenficao de parceiros: de organizaes de base a empresas privadas 63. O direcionamentodas zonas nas quais a adoo da agroecologia tem maior potencial, com base nos critrios sicos,

    pode ser facilitado pelos Sistemas de Informao Geogrfica (GIS), tais como os que tm sido usadostanto na Europa quanto no sul da frica para idenficar as reas adequadas para a ampliao dossistemas de agrofloresta64. Como mencionado anteriormente, a disseminao da estratgia atrao-expulso no leste da frica pelo Centro Internacional para Fisiologia de Insetos e Ecologia (ICIPE)foi baseada tanto nos campos modelo de demonstrao, gerenciados por agricultores, que atraemvisitas de outros agricultores nos dias de campo, quanto em parceria com os sistemas nacionais depesquisa em pases vizinhos que facilitaram a realizao desta abordagem. As inovaes localizadaspodem se espalhar rapidamente atravs destas abordagens.

    61. Brasil, Lei 12.188/2010, Assistncia Tcnica e Extenso Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrria.62. Comunicao pessoal de Fransisco Roberto Caporal, Coordenador Geral do Departamento de Assistncia Tcnica e Extenso Rural do Ministriodo Desenvolvimento Agrrio, Brasil, 20 de julho de 2010.63. K. Linyunga et al., Accelerang agroforestry adopon: A case of Mozambique, ICRAF Agroforestry Project, Paper apresentado no Congreso IUFRO,Roma, 12-15 de julho de 2004.64. E.A. Ellis et al., Computer-based tools for decision support in agroforestry: Current state and future needs, Agroforestry Systems, 61-62, 2004,pp. 401- 421.

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    65. O Relator Especial explorou estas dimenses nos relatrios anteriores (A/64/170 e A/65/281).66. J. Prey et al., Sustainable intensificaon in African agriculture, Internaonal Journal of Agricultural Sustainability, 9:1, a ser publicado em 201167. A.M. Diop, Management of Organic Inputs to Increase Food Producon in Senegal, in Agroecological innovaons. Increasing food produconwith parcipatory development, N. Uphoff (ed.), Londres, Earthscan Publicaons, 2001, p. 252.68. D. Byerlee et al., Agriculture for development: Toward a new paradigm, Annual Review of Resource Economics, 1, 2009, pgs. 15-3169. Banco Mundial, Relatrio de Desenvolvimento Mundial de 2008: Agricultura para Desenvolvimento, Washington D.C., 2007, pg. 41.70. Ramn Lpez and Gregmar I. Galinato, Should governments stop subsidies to private goods? Evidence from rural Lan America, Journal of PublicEconomics, 91, 2007, pg. 1085.

    36. Este relatrio se concentra na dimenso vercal da ampliao da agroecologia, a saber, oestabelecimento de uma estrutura de qualificao - apesar disto ser tanto uma condio quanto ocondutor da ampliao horizontal. Os governos tm um papel chave a desempenhar neste sendo,alm de apoiar o acesso a terra, gua e sementes para agricultores que pracam agriculturaem pequena escala65. Esta seo idenfica diversos princpios que poderiam apoiar a ampliaodas prcas agroecolgicas. Esmular uma mudana para a agricultura sustentvel pode ser umprocesso delicado associado aos custos de transio, pois os agricultores devem aprender novastcnicas que se afastam dos sistemas atuais, que so mais especializadas, menos adaptavose tm uma menor capacidade de inovao66. Portanto, os princpios abaixo devem ser aplicadoscom flexibilidade. As estruturas de incenvo que estas polcas criam para esmular a mudanapara agricultura sustentvel devem ser regularmente testadas e reavaliadas com a parcipao dosbeneficirios, transformando a polca em um modo de aprendizagem social e no um exerccio deautoridade polca67. A transio para a agroecologia deve ser baseada nos prprios agricultores- seus principais tulares. As tcnicas agroecolgicas so difundidas melhor de agricultor paraagricultor, visto que elas so frequentemente especficas de uma zona agroecolgica.

    A. Priorizando bens pblicos

    37. As prcas agroecolgicas exigem o fornecimento de determinados bens pblicos, tais comoservios de extenso, instalaes de armazenagem, infraestrutura rural (estradas, eletricidade,tecnologias da informao e comunicao) e, portanto, acesso aos mercados regional e local, acessoa crdito e seguro contra riscos relacionados a eventos meteorolgicos, pesquisa e desenvolvimentoagrcola, educao e apoio s organizaes e cooperavas de agricultores. Apesar disto exigircusteio, o invesmento pode ser significavamente mais sustentvel do que o fornecimento

    de bens privados, como ferlizantes ou pescidas que os agricultores tm condies de pagarapenas se forem subsidiados. Apesar de muitos esforos terem sido feitos a parr de 2008 parareinvesr em agricultura, muito pouca ateno foi dada s diferenas entre os diversos pos deinvesmento necessrios e para entender seus impactos sobre a reduo da pobreza rural. Istolevou os economistas do Banco Mundial a observarem que o sub-invesmento em agricultura () composto por um amplo desinvesmento68, com vis para o fornecimento de bens privados,algumas vezes movado por consideraes polcas69. Pesquisa baseada no estudo de 15 paseslano-americanos no perodo de 1985 a 2001, em que os subsdios governamentais para bensprivados foram diferenciados dos gastos com bens pblicos, indicou que, dentro de um oramentoagrcola nacional fixo, uma realocao de 10% dos gastos para o fornecimento de bens pblicosaumenta a renda per capita agrcola em 5%, enquanto que um aumento de 10% nos gastos pblicos

    em agricultura, mantendo a composio de despesas constante, aumenta a renda per capita agrcolaem apenas 2%70. Em outras palavras, mesmo sem alterar as despesas globais, os governos podem

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    melhorar o desempenho econmico de seus setores agrcolas dedicando uma parcela maior dessasdespesas a servios sociais e bens pblicos, em vez de subsdios no sociais 71. Assim, ainda que ofornecimento ou o subsdio de bens privados seja necessrio at um determinado ponto, os custosde oportunidade devem ser cuidadosamente considerados.

    B. Invesndo em conhecimento

    38. A agroecologia uma abordagem de alta densidade de conhecimentos. Requer que ascomunidades de agricultores adquiram conhecimentos ecolgicos e desenvolvam capacidades detomada de decises. Os invesmentos em avidades de extenso e pesquisa agrcola so essenciaisneste sendo. Apesar das despesas agrcolas, juntamente com as despesas pblicas em educao,sade e estradas72, estarem entre os quatro principais fatores contribuintes para aumentar o bemestar rural, nos pases em desenvolvimento, a pesquisa agrcola tem o maior impacto global sobre apobreza e produvidade agrcola. Na China, a pesquisa agrcola o fator que tem um maior impactosobre a produo agrcola e o segundo maior impacto sobre a reduo da pobreza (aps a educao

    rural), e na ndia, o segundo maior impacto sobre a reduo da pobreza nas zonas rurais (s ficaaps o invesmento em estradas)73. A pesquisa em prcas agroecolgicas, em parcular, deve serpriorizada, por causa do potencial considervel e amplamente inexplorado destas prcas. A cinciamoderna se combina com o conhecimento local na pesquisa agroecolgica. Na Amrica Central, porexemplo, os cafezais culvados sob rvores de copa alta foram aperfeioados pela idenficao dascondies mas de sombra, minimizando todo o complexo de pragas e maximizando a microflora efauna benficas ao mesmo tempo, maximizando a produvidade e a qualidade do caf74. Entretanto,talvez pelo fato destas prcas no poderem ser recompensadas por patentes, o setor privado esteveamplamente ausente desta linha de pesquisa75.

    C. Fortalecimento da organizao social mediante a construo conjunta

    39. As prcas agroecolgicas so melhor adotadas quando no impostas de cima para baixo,mas comparlhadas de agricultor para agricultor. Os servios de extenso desempenham um papelfundamental no favorecimento da expanso da agroecologia. A melhoria da disseminao deconhecimento por meios horizontais transforma a natureza do prprio conhecimento, tornando-oproduto de uma rede76. Essa disseminao deve esmular os agricultores, parcularmente aquelesque pracam agricultura em pequena escala e que vivem em reas mais remotas, a idenficarsolues inovadoras, colaborando com os especialistas rumo construo conjunta de conhecimentosque assegurem que os avanos iro benefici-los prioritariamente, em vez de beneficiar apenas

    71. Allco Hunt et al., Polical Instuons, Inequality, and Agricultural Growth: The Public Expenditure Connecon, Paper de Trabalho de Pesquisade Polca do Banco Mundial3902, abril/2006, pg. 24.72. S. Fan et al., Se ng priories for public spending for agricultural and rural development in Africa, IFPRI Policy Brief 12, Abril 2009, pg. 2.73. S. Fan, Public expenditures, growth, and poverty. Lessons from developing countries, IFPRI Issue Brief 51, agosto/2008.74. 75 C. Staver et al., Designing pest suppressive mulstrata perennial crop systems: shade-grown coffee in Central America, Agroforestry Systems,53, 2001, pgs. 151170.75. G. Vanloqueren and P.V. Baret, How agricultural research systems shape a technological regime that develops genec engineering but locks outagroecological innovaons, Research Policy, 38, 2009, pgs. 971983.76. K.D. Warner and F. Kirschenmann, Agroecology in Acon: Extending Alternave Agriculture through Social Networks, Cambridge, EUA, MIT Press,2007.

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    77. N. Uphoff, Instuonal change and policy reforms, em Agroecological innovaons. Increasing food producon with parcipatory development,N. Uphoff (ed.), Londres , Earthscan Publicaons, 2001, pg. 255.78. A/64/170, 54-55.79. Um exemplo bem conhecido o processo que levou adoo da Loi dorientaon agricole em Mali, a polca agrcola nacional de 2008: consulteFAO-IIED, The Right to Food and Access to Natural Resources - Using Human Rights Arguments and Mechanisms to Improve Resource Access for theRural Poor, Estudo de Direito a Alimentao, Roma, FAO, 2008.80. Michel Pimbert et al., Democrasing Agricultural Research for Food Sovereignty in West Africa, Bamako/Londres, IIED e outros, 2010.81. Jules Prey and Norman Uphoff, Human dimensions of agroecological development, em Agroecological innovaons. Increasing food produconwith parcipatory development, N. Uphoff (ed.), Londres, Earthscan Publicaons, 2001, pg. 245.

    os produtores em melhor situao77. A construo conjunta a chave para a realizao do direitoa alimentao. Em primeiro lugar, ela permite que as autoridades pblicas se beneficiem daexperincia e insights dos agricultores. Em vez de tratar esses agricultores como beneficirios daajuda, eles devem ser vistos como especialistas que detm conhecimentos que complementam oconhecimento de especialistas formais. Em segundo lugar, como j ilustrado pelo Relator Especialao descrever os processos parcipavos em fitogenca78, a parcipao pode assegurar que as

    polcas e programas apresentem respostas verdadeiras s necessidades de grupos vulnerabilizados,que quesonaro os projetos que deixem de melhorar sua situao. Em terceiro lugar, a parcipaocapacita os sujeitos empobrecidos - uma etapa vital para o alvio da pobreza. A falta de poder uma fonte de pobreza - pois comunidades marginais frequentemente recebem menos apoio queos grupos que esto mais conectados ao governo. A pobreza agrava esta falta de poder, criando umcrculo vicioso. Em quarto lugar, as polcas que so planejadas conjuntamente com agricultorestm um alto grau de legimidade e, portanto, favorecem o melhor planejamento do invesmentoe produo e a melhor aceitao por outros agricultores79. A parcipao de grupos em situao deinsegurana alimentar e nutricional nas polcas que os afetam deve se tornar um elemento crucialde todas as polcas de segurana alimentar e nutricional, da concepo das polcas avaliaodos resultados e deciso sobre as prioridades de pesquisa. De fato, a situao de insegurana

    alimentar e nutricional de milhes de camponeses no pode ser superada sem sua parcipao.

    40. necessrio combinar a valiosa experincia dos agricultores que pracam agricultura de pequenaescala com o melhor que os cienstas podem oferecer a fim de desenvolver modos de aprendizagemparcipavos. O desenvolvimento da parcipao pode ir alm da prpria tecnologia de campo. Nooeste da frica, por exemplo, jris de cidados sobre a governana da pesquisa alimentar e agrcolaforam constudos pelo Internaonal Instute for Environment and Development (IIED), CoordinaonNaonale des Organisaons Paysannes (CNOP) e outros parceiros, resultando na formulao pelosagricultores de 100 recomendaes aps terem ouvido especialistas sobre os modelos de agricultura,posse da terra e direitos de propriedade, questes macroeconmicas e a governana da pesquisaagrcola80. No apenas servios de pesquisa e extenso devem se desenvolver para organizaes deaprendizagem, mas tambm os ministrios e instuies educacionais e financeiras81. As organizaese redes de agricultores tm acumulado experincia na disseminao de prcas agroecolgicasna lma dcada, com resultados comprovados. Estes movimentos j esto funcionando comoorganizaes de aprendizagem; eles devem ser atualmente apoiados nesta funo.

    D. Empoderamento da mulher

    41. Devem ser formulados planos especficos e com objevos concretos para empoderar e esmulara parcipao das mulheres nesta construo de conhecimento. A vantagem dos homens no acessos fontes oficiais do conhecimento agrcola pode ser um contraponto com iniciavas parcipavas de

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    projetos que levem em considerao as parcularidades culturais, sejam executadas por mulheres econtem com grupos de trabalho integrados apenas por mulheres e com uma maior contratao localde mulheres nos servios de extenso agrcola e de promoo rural com menores barreiras culturaise lingscas a superar82. Uma fonte de preocupao para o Relator Especial que, enquanto asmulheres enfrentam diversos obstculos especficos (dificuldade de acesso ao capital e a terra, adupla carga de trabalho em suas funes produva e familiar e menor parcipao na tomada de

    deciso), as questes de gnero so incorporadas em menos que 10% dos projetos de assistnciapara desenvolvimento rural e as agricultoras recebem apenas 5% dos servios de extenso agrcolaem todo o mundo83. Em princpio, a agroecologia pode beneficiar mais as mulheres, porque so elasque encontram mais dificuldades no acesso aos insumos ou subsdios externos. Mas no se devesupor que a possibilidade das mulheres acessarem a agroecologia gerar resultados automcos, fundamental que sejam realizadas aes afirmavas dirigidas especialmente s mulheres.

    E. Organizando mercados

    42. Nos relatrios anteriores, o Relator Especial insisu na necessidade de facilitar a capacidadede agricultores que pracam agricultura de pequena escala a se unirem s cadeias de produoe distribuio84. Os agricultores tambm devem ser esmulados a aumentar a cadeia de valorpela agregao de valor aos produtos brutos atravs de uma maior parcipao nas avidades deembalagem, processamento e comercializao de seus produtos. As cooperavas podem ajud-los a angir as economias de escala e facilitar a agregao de valor85. Este objevo tambm podeser alcanado por novos pos de parcerias com o setor privado. Entretanto, essencial melhoraro acesso aos mercados, o que, por sua vez, exige o desenvolvimento de rotas de comunicao,parcularmente estradas rurais vicinais. Os retornos marginais dos gastos pblicos em estradasvicinais para a produvidade agrcola e reduo da pobreza foram esmados como sendo trsa quatro vezes maior que o retorno dos gastos pblicos nas estradas de murram (uma mistura de

    lama/argila e cascalho) e asfalto86. Alm disto, o apoio s prcas agroecolgicas no angiros resultados desejados se os mercados no forem organizados para proteger os agricultoresdos preos volteis e do dumping de produtos subsidiados em seus mercados locais, que podemafetar seriamente a produo local87. De maneira semelhante, os sistemas de compras pblicas,incenvos e crdito fiscal e polcas de posse de terras - todas as reas s quais o Relator Especialfez contribuies no passado - devem estar alinhados com a necessidade de fazer a transio paraos modos de produo de baixo carbono e baixo insumo externo nos quais os agricultores projetamem conjunto as polcas que os afetam. O Programa Nacional de Alimentao Escolar no Brasil, porexemplo, tem sido usado como uma alavanca para sustentar a agricultura familiar atravs de seuesquema de compras pblicas; os futuros esquemas de compras pblicas podem promover prcasagroecolgicas88.

    82. Sarah Jewi, Unequal Knowledges in Jharkhand, India: De-Romancizing Womens Agroecological Experse, Development and Change, 31:5, 2000,pgs. 961985.83. Women Organising for Change in Agriculture and NRM, Dilogo Women Leaders, 36 Sesso do Comit sobre Segurana Alimentar Mundial, 13 deoutubro de 2010.84. Consulte A/HRC/13/33, 28-50.85. Consulte A/HRC/13/33, 31.86. Samuel Benin et al., Agricultural Growth and Investment Opons for Poverty Reducon in Malawi, Paper de Discusso IFPRI 00794, setembro de2008, pg. 41.87. Consulte A/HRC/10/5/Add.2, 22-23.88. Consulte A/HRC/13/33/Add.6, 38. Em 2009, as compras pelo Programa de Aquisio de Alimentos (PAA) brasileiro totalizaram R$ 590,55 milhes(R$ 145,78 milhes em 2003); o alimento foi comprado de 137.169 propriedades familiares (em comparao com 42.329 propriedades em 2003), cominformaes do Governo Federal do Brasil, Execuo Global do Programa de Aquisio de Alimentos 2003-2009, Oramentos MDA e MDS, 16 de junhode 2010.

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    V. R

    43. Caminhar para a sustentabilidade vital para a segurana alimentar e nutricional futurae um componente essencial do direito alimentao adequada. Mas para ter sucesso nestatransformao, ser necessria consistncia em diversas reas. Os pases precisaro invesr emesforos plurianuais, baseados em estratgias de idenficao das medidas que devem ser adotadas

    para fazer esta transio.

    44. Como parte de sua obrigao de dedicar o mximo de seus recursos disponveis realizaoprogressiva do direito a alimentao, os pases devem implantar polcas pblicas que apoiem aadoo de prcas agroecolgicas ao:

    fazer referncia agroecologia e agricultura sustentvel em estratgias nacionais para a realizao do direitohumano a alimentao e pela incluso de medidas adotadas no setor agrcola em planos de ao e adaptaonacional (NAPAs) e na lista de aes de atenuao nacionalmente apropriadas (NAMAs) adotadas por pasesem seus esforos para atenuar as mudanas climcas;

    reorientar as despesas pblicas com agricultura priorizando o fornecimento de bens pblicos, tais como

    servios de extenso, de infraestruturas rurais e pesquisa agrcola e pelo estabelecimento de pontos fortescomplementares de sementes e culturas e mtodos agroecolgicos, alocando recursos a ambos e explorandoas sinergias, tais como ligando os subsdios de ferlizantes diretamente aos invesmentos agroecolgicos nocampo (subsdios sustentabilidade);

    apoiar a pesquisa parcipava descentralizada e a disseminao de conhecimento sobre as melhores prcasagrcolas sustentveis ao se basear nas organizaes e redes de agricultores existentes e incluso de esquemasdesignados especificamente para mulheres;

    melhorar a capacidade dos produtores pracarem agricultura sustentvel para acessar os mercados, usandoinstrumentos como compras pblicas, crdito, mercados de agricultores e criando uma estrutura comercial emacroeconmica de apoio.

    45. Os doadores devem: envolver-se em relaes de longo prazo com pases parceiros, apoiando programas e polcas ousados para

    ampliar as abordagens agroecolgicas para mudana duradoura, incluindo um engajamento mulpolarautnco com as autoridades pblicas e especialistas e organizaes locais existentes de fornecedores dealimentos (agricultores, pastores, moradores da floresta) e as redes que eles constuem, tal como ROPPA,ESAFF, A Via Campesina e PELUM, que

    acumular experincia que pode servir como base para a rpida ampliao das melhores prcas; esmular a cooperao sul-sul e norte-sul na disseminao e adoo de prcas agroecolgicas; apoiar o desenvolvimento agrcola invesndo em bens pblicos e no em bens privados e esmular abordagens

    parcipavas e a construo coleva das pesquisa, extenso e polcas pblicas; financiar plataformas de conhecimento regionais e nacionais para reunir e disseminar as melhores prcas

    em agroecologia .

    46. A comunidade de pesquisa, incluindo centros do Grupo Consulvo sobre Pesquisa AgrcolaInternacional e Frum Global sobre Pesquisa Agrcola, deve:

    aumentar o oramento para pesquisa agroecolgica no nvel do campo (projetos de sistemas agroecolgicossustentveis e resilientes), ao nvel da explorao agrcola e da comunidade (impactos de diversas prcassobre os rendimentos e meios de vida) em nveis nacionais e regionais (impacto sobre o desenvolvimentosocioeconmico, estratgias de ampliao parcipavas e impactos de polcas pblicas) e desenvolverpesquisa com os beneficirios pretendidos, de acordo com os princpios de parcipao e construo coleva;

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    capacitar especialistas no desenho de abordagens agroecolgicas, mtodos parcipavos de pesquisa eprocessos de consulta conjunta a agricultores e assegurar que sua cultura organizacional apie as inovaesagroecolgicas e pesquisa parcipava;

    avaliar projetos com base em um amplo conjunto de critrios de desempenho (impactos sobre a renda,eficincia de recursos, impactos sobre a fome e desnutrio