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CAPTULO 1UMA ANLISE ECONMICA DOJUDICIRIO BRASILEIRO
Este trabalho no o primeiro a apontar para a importncia das instituies legais
sobre a economia ou a necessidade do seu estudo pelos economistas. Tambm no o
primeiro a aplicar metodologias quantitativas e/ou econmicas a temas jurdicos. Entretanto,
ele pretende ser um dos primeiros a aprofundar na anlise qualitativa do objeto jurdico em
questo o Judicirio brasileiro , combin-la com o emprego de dados empricos
representativos do universo real e, com isso, refutar, ou corroborar, conhecimentos vindos
do senso comum, de evidncias anedticas ou de argumentos de autoridade. Estes
conhecimentos foram tomados como verdades por muito tempo, e assim continuam em
grande parte, no meio empresarial, no meio jurdico, e at mesmo entre acadmicos de
diversas reas, como o Direito e a Economia. O objetivo principal desta tese , ento, procurar
ir alm do debate tradicional sobre este tema, analisando-se algumas das caractersticas
conhecidas do Judicirio brasileiro, em particular, a (falta de) eficincia, o vis nas decises
judiciais e o respeito aos contratos privados. Ou seja, pretendemos preencher uma clara lacuna
existente na literatura cientfica desta rea.
Sobre este tema em particular, diversas so as informaes disseminadas de forma
anedtica e sem comprovao cientfica na rea de estudos sobre os sistemas judiciais, a
comear pela suposta falta de dados adequados para se fazer estudos quantitativos ou
economtricos. Particularmente no Brasil, quando se entra no tema propriamente dito o
funcionamento do Judicirio h ainda outras informaes que so pr-conceitos para os
estudiosos. Uma delas a ideia de que a eficincia (ou ineficincia) do sistema judicial de um
pas determinada pela origem de suas instituies legais. Isso implica dizer que, fazer parte
de um sistema de direito codificado, como o caso do Brasil, faz com que se torne
irremedivel o fato de possuir um sistema legal menos eficiente. Outra crena, esta talvez
mais comum entre juristas do que economistas, que existe um trade offentre eficincia e
qualidade do funcionamento das cortes; um seria excludente do outro. A conseqncia disso
que a busca por um maior nvel de eficincia poderia significar abrir mo da qualidade das
decises judiciais.
Quando se entram nos motivos da ineficincia do Judicirio brasileiro, a discusso
torna-se ainda mais subjetiva, muitas vezes baseada em achismos e no senso comum.Evidncias anedticas colhidas pelos praticantes ganham status de provas cientficas. O
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Banco Mundial (2004) mostrou que vrios dos conhecimentos comuns no sobreviveram ao
primeiro teste com dados estatsticos. Especificamente na identificao da causa da
ineficincia judicial, aponta-se freqentemente ao problema da falta de recursos materiais e
humanos, m qualidade das leis e do direito processual brasileiro, e cultura dos
integrantes do sistema, que seria pouco favorvel ao um funcionamento eficiente.
Mostraremos que estes problemas, apesar de reais, no so a principal causa do atual estado
de crise do Judicirio brasileiro. Estes fatores so comuns aos tribunais de todo o pas;
entretanto, como veremos nos captulos seguintes, alguns estados tm tribunais com
desempenho de eficincia muito superior a de outros estados. A suposta falta de recursos ou a
m qualidade das leis brasileiras no o impeditivo crucial para um bom funcionamento do
Judicirio.Finalmente, existe uma crena bastante disseminada no meio empresarial e na
academia econmica sobre a existncia de um suposto vis dos magistrados brasileiros a favor
dos devedores ou da parte mais fraca de relaes comerciais e/ou contratuais. Por causa deste
vis, instituies normalmente credoras como financeiras e investidores teriam fortes
desestmulos para oferecer crdito. A conseqncia disso seria um mercado financeiro pouco
desenvolvido, altas taxas de juros e baixo investimento. Muitos empresrios e advogados
baseiam-se na sua experincia de mercado para defender este argumento. Os acadmicos,por sua vez, pouco fizeram alm de disseminar esta tese em seus trabalhos cientficos, com
escassa ou nenhuma comprovao e testes empricos.
A manuteno destas informaes sem preocupao com a verificao cientfica
deve-se particularmente falta de um dilogo profundo, permanente e consistente entre
estudiosos das reas diferentes, neste caso, do Direito e da Economia. O investimento para
que este dilogo acontea relativamente alto para um e para outro lado. preciso conhecer
as linguagens especializadas, as metodologias, os objetos analisados. Para isso, anos de estudoconcentrado e dedicao podem ser pouco. Alm disso, uma boa dose de pr-conceito ainda
domina grande parte da academia, de todas as reas envolvidas. Economistas acreditam que,
com uma boa base de dados ou um punhado de nmeros em mos (ou no computador)
podem facilmente chegar a concluses sobre o funcionamento de todo o sistema judicial de
um determinado pas. Sentem-se confortveis em oferecer recomendaes de polticas
pblicas baseados somente nos resultados destes resultados empricos. Juristas, por sua vez,
acreditam que seu objeto de estudo suficiente por si s e impermevel a qualquer
metodologia quantitativa. Afirmam que os economistas no sabem o que esto fazendo
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quando empregam suas metodologias a aplicam-nas para os assuntos legais. Com isso,
desdenham qualquer trabalho que no tenha o formato jurdico tradicional (com absoluta
inexistncia de anlises objetivas e empricas).
Por todos estes motivos, apesar de os economistas terem reconhecido a
importncia do estudo das instituies legais desde o nascimento de sua cincia, pouco se
avanou desde ento. Por diversos motivos, os trabalhos empricos sobre os sistemas judiciais
tm sido infrequentes. Como mostram Buscaglia e Ulen [r]elativamente poucos estudos
empricos tm sido avanados[...] Observaes e verdades lgicas so abundantes, mas a
verificao emprica destas verdades lgicas parecem ser escassas (1997, p. 3, traduo
nossa). Os economistas tm uma intuio de que as instituies (legais) importam, mas nosabem quais, como e o quanto importam. verdade que novas reas de pesquisa que surgiram
nas ltimas dcadas forneceram instrumentais importantes; entre estas reas podemos destacar
a Nova Economia Institucional e a Anlise Econmica do Direito, que foram reconhecidas,
desde os anos 1960, como genunas reas da cincia econmica. Sherwood (2007), por
exemplo, mostra a contribuio do conceito de custos de transao para o estudo dos
impactos dos sistemas judiciais sobre o crescimento econmico. Contudo, para que se possa
chegar a uma compreenso mais aprofundada da relao entre estes dois objetivos seria aindapreciso, segundo o autor, um nvel maior de detalhes do que constitui, na essncia, o sistema
judicial. por isso, que os recentes trabalhos econmicos na rea, que se resumem a anlises
dos dados quantitativos colhidos, no so suficientes para a formulao de recomendaes
para boas polticas pblicas. Por um lado, este tipo de trabalho o que tem dominado os
estudos econmicos sobre o Judicirio brasileiro. Por outro lado, h os trabalhos
majoritariamente, mas no exclusivamente, de juristas, baseados em achismos e argumentos
de autoridade. Hammergren (2006) mostra que esses dois tipos de pesquisa tm servido, masrealmente no ajudam muito a fazer projetos (p. 11).
com o objetivo de preencher as lacunas desta rea de estudo, algumas das quais
apontadas pelos acima, que esta tese foi escrita. O captulo 2 faz uma reviso do surgimento e
da evoluo da Nova Economia Institucional e da Anlise Econmica do Direito. Veremos
quais foram os novos conceitos introduzidos na cincia econmica que ajudaram no melhor
entendimento da relao entre sistemas econmicos e sistemas legais. O captulo se
desenvolvea partir de uma survey dos principais trabalhos da Nova Economia Institucional e
da Anlise Econmica do Direito, tericos e empricos. Pelo fato destas duas reas serem
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ainda incipientes no Brasil, tanto entre economistas quanto entre juristas, a reviso das teorias
feitas neste captulo pode ser vista, por si s, como uma significativa contribuio acadmica.
Ainda neste captulo, dedicaremos uma parte significativa para a discusso do debate sobre as
origens legais. Exporemos quais so os principais argumentos daqueles a favor e contra a tese
de que a origem legal de um pas determinante do nvel de eficincia de seus atuais sistemas
legais/judiciais. Apresentaremos uma contribuio para o debate com base em trabalhos
tericos e empricos j feitos, e relacionados ao tema.
O captulo 3 faz uma breve apresentao descritiva do Judicirio brasileiro, suas
origens e sua situao presente. com ele que, como economistas, tentamos aprofundar no
objeto de estudo o Judicirio brasileiro para evitar o que outros economistas que
estudaram sistemas judiciais fizeram: a mera aplicao de metodologias quantitativas e/oueconmicas sobre um objeto jurdico, sem o pleno entendimento das suas caractersticas
particulares, o que levou a concluses superficiais, e at mesmo equivocadas, tornado tais
estudos inadequados para a criao de recomendaes de polticas pblicas. Tentamos atingir
um maior nvel de compreenso sobre a essncia do Judicirio brasileiro e, assim, preencher a
lacuna apontada por Sherwood, conforme descrito acima. nesse captulo que
identificaremos alguns dos conhecimentos baseados no senso comum, nos achismos
apontados por Hammergren, nas evidncias anedticas e nos argumentos de autoridade.Tentaremos discutir outras possveis causas para o atual estado de ineficincia do Judicirio.
O objetivo apontar nova luz sobre elementos pouco discutidos at agora, para futuramente,
testar estas novas hipteses de forma emprica e cientfica.
O captulo 4 quer testar, de forma emprica, algumas hipteses e crenas
previamente estabelecidas. Aqui, em particular, vamos verificar se a falta de recursos
materiais e humanos a causa principal para a ineficincia dos tribunais brasileiros.
Empregamos a metodologia da Anlise Envoltria de Dados (DEA) para avaliar dados doJudicirio brasileiro e criar um ranking de eficincia dos Tribunais Estaduais. Ser possvel
verificar que, mesmo sujeito a um conjunto bastante semelhante de restries de recursos
fsicos, mas tambm de regras legais de funcionamento, detalhadas pelo direito processual,
por exemplo alguns tribunais conseguem se sobressair em termos de eficincia em
comparao aos outros. Baseados em alguns dos elementos identificados no captulo 3,
oferecemos uma explicao no-tradicional para a eficincia de alguns tribunais, e para a falta
da mesma em outros.
Finalmente, o captulo 5 quer testar duas crenas bastante difundidas no meio
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empresarial e no meio acadmico econmico nos ltimos anos: (i) que os magistrados
brasileiros tendem a favorecer, atravs de suas decises judiciais, os devedores e as partes
mais fracas (hipossuficientes) de relaes comerciais e/ou contratuais; (ii) que o Judicirio
brasileiro gera alto grau de insegurana jurdica atravs de decises inconsistentes ao longo do
tempo. Estes dois problemas, se reais, tm grandes impactos no ambiente de negcios do pas,
levando a fortes desincentivos para investimentos e para o crescimento econmico. Para testar
estas duas hipteses, foi criada uma base de decises do Superior Tribunal de Justia (STJ).
Estas decises so o universo de Recursos Especiais decididos entre Outubro de 1998 e
Outubro de 2008, relacionados a dvidas privadas (excludos todos aqueles que tm como uma
das partes a Unio, os Estados, Municpios ou autarquias). O tamanho da base de dados de
1687 decises. Com os resultados economtricos derivados desta anlise, tentaremos avaliarempiricamente a dimenso dos problemas identificados pelas evidncias at ento anedticas.
Este exerccio , segundo nosso conhecimento, indito na literatura econmica que estuda o
Judicirio brasileiro.
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CAPTULO 2INSTITUIES, ECONOMIA, CORTES E FIRMAS
Justificativas do captulo
O objeto principal desta tese fazer uma anlise econmica do Judicirio.
Aparentemente uma mera aplicao de instrumentais econmicos para a anlise de mais um
assunto no-tradicional. Entretanto, estudos como este esto inseridos num grande contexto,
o da Anlise Econmica do Direito, ou do Law and Economics, como o movimento
conhecido desde o seu surgimento nos Estados Unidos durante os anos 1960. Por sua vez, o
Law and Economics surge a partir da Economia Institucional, cujas origens esto em fins do
sculo XIX. Percebe-se, portanto, que existe todo um desenvolvimento temporal da rea de
pesquisa ao qual pertence esta tese. H uma herana histrica e um conjunto de contribuies
intelectuais feitas por dezenas (ou centenas) de estudiosos que no podem ser simplesmente
esquecidos. Como toda rea de pesquisa que vigora no momento atual, o Law and Economics
repousa sobre ombros de gigantes. E a ideia deste captulo justamente recuperar algumas
das contribuies doLaw and Economics e tambm das duas reas-me que o precederam: a
Velha e a Nova Economia Institucional.
Alm da importncia de se relembrar as origens, este captulo tem outra
importante justificativa: o fato doLaw and Economics, e at mesmo a Economia Institucional,
serem ainda reas de pesquisa incipientes no Brasil, tanto entre economistas quanto entre
juristas. Por este motivo, se o objetivo fazer uma anlise econmica do Judicirio, no se
pode simplesmente supor conhecimento comum de toda a teoria por trs do tema, ela ainda
no conhecimento comum. Acreditamos, assim, que a reviso detalhada da teoria daEconomia Institucional e do Law and Economics, mesmo que parea excessivamente
detalhista e pouco relacionada ao objeto da tese em algumas passagens, deve ser vista, por si
s, como uma contribuio acadmica.
Vamos s origens.
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2.1 Origens: o papel das instituies legais na economia
Tudo comeou em 1937. As instituies legais tiveram, pela primeira vez, papel
decisivo na teoria econmica, deixando de lado a funo de pano de fundo. Seria injusto e
incorreto afirmar que os economistas antes disso nunca se atentaram para a importncia das
leis e dos seus mecanismos de enforcement(e.g., as cortes) na economia. Desde os clssicos,
como Adam Smith, tinha-se a idia de que o sistema das leis era imprescindvel para o bom
funcionamento dos mercados1. Em particular, os chamados velhos economistas
institucionalistas, e mais precisamente, John Commons (e.g., 1932, 1936), tiveram como um
dos objetivos ligar o estudo da economia com o das questes legais. Entretanto, antes doadvento da Nova Economia Institucional, todas as tentativas de discutir as variveis legais no
contexto econmico falharam em incorpor-las teoria econmica prevalecente, por
incapacidade ou falta de interesseos Velhos Institucionalistas, por exemplo, eram contrrios
a formulao de uma teoria institucionalista. Coase, com The Nature of the Firm (1937)
trouxe para o centro do palco da teoria econmica os custos de transao, mostrando serem
eles atores importantes na determinao do resultado econmico. Sua inquisio comeou na
tentativa de entender porque algumas transaes eram realizadas atravs do mercado o queele chamou de mecanismos de preos enquanto outras eram realizadas dentro das firmas,
cuja caracterstica marcante a supresso dos mecanismos de preos (p. 389). A sua
concluso que existem transaes para as quais o uso do mercado implica custos menores,
enquanto que h outras em que isso verdade para o uso de mecanismos internos firma. Os
custos em questo so os que futuramente ficaram conhecidos como custos de transao.
Por sua vez, os custos de transao so afetados pelas regras vigentes naquele
ambiente, ou seja, pelas instituies formais e informais existentes. Especificamente,instituies formais fortes podem ajudar a minimizar ou eliminar os custos de transao
existentes. Por outro lado, instituies fracas podem manter ou mesmo aumentar os custos de
transao em vigor. por isso que Mancur Olson (1996) mostra que existem, na verdade,
critrios objetivos para se avaliar a qualidade das instituies, possvel afirmar que umas so
1 Nas palavras de Smith: Commerce and manufactures can seldom flourish long in any state which does notenjoy a regular administration of justice, in which the people do not feel themselves secure in the possession oftheir property, in which the faith of contracts is not supported by law, and in which the faith of contracts is not
supported by law, and in which the authority of the state is not supposed to be regularly employed in enforcingthe payment of debts from all those who are able to pay. Commerce and manufactures, in short, can seldomflourish in any state in which there is not a certain degree of confidence in the justice of government (p. 862,Book V, Chapter III, On Public Debts).
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melhores e outras piores. Pode-se dizer que as instituies agem de duas formas sobre o
resultado econmico: ex-ante, elas determinam o nvel dos custos de transao daquela
economia. Ex post, elas tem o potencial de correo de resultados ineficientes. Esta ideia
talvez esteja mais bem ilustrada no segundo trabalho de impacto de Coase, este de 1960, The
Problem of Social Cost. Quando os custos de transao so significativos, a determinao
legaldefinida por uma deciso judicial ou por uma lei criada no legislativo, por exemplo
pode trazer resultados ineficientes. As livres foras do mercado, neste caso, no so capazes
de garantir a eficincia do sistema como um todo, diferentemente do que a teoria tradicional
conclui. A partir deste momento, s instituies legais cortes judiciais, leis, Poder
Executivo, etc.cabem parcela da responsabilidade pelo alcance de maximizao do bem-
estar social. por isso que Coase afirma que na verdade, so as instituies que governam odesempenho de uma economia (1998, p. 73, traduo nossa).
Com esta nova percepo nasce a Nova Economia Institucional. Esta uma parte
da teoria econmica que no veio para contradiz-la, mas para complement-la. velha teoria
clssica incorpora-se agora a no-trivial observao de que as instituies, as regras do jogo, e
a forma como sua garantia ocorre afetam o resultado econmico final.
2.1.a) A (sempre difcil) definio de instituies
A definio do que sejam instituies uma tarefa que j dura vrias dcadassem uma concluso final. Apesar do vcuo terico deixado, os Velhos Institucionalistas
tiveram sua importante contribuio por terem alertado, pela primeira vez, para a necessidade
de um estudo srio das instituies pelos economistas. interessante buscar neles o
entendimento que tinham quando se referiam a instituies.
Commons, em 1931, afirmava que a dificuldade em bem definir o termo poderia
impactar na prpria definio da rea de estudo da economia institucional. Ele mesmo
entende instituies como sendo um conceito abrangente:
Sometimes an institution seems to mean a framework of laws or naturalrights within which individuals act like inmates. Sometimes it seems to meanthe behavior of the inmates themselves. Sometimes anything additional to orcritical of the classical or hedonic economics is deemed to be institutional.Sometimes anything that is "economic behavior" is institutional. Sometimesanything that is "dynamic" instead of "static," or a "process" instead ofcommodities, or activity instead of feelings, or mass action instead ofindividual action, or management instead of equilibrium, or control insteadof laissez faire, seems to be institutional economics (1931, p. 648)
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Na tentativa de relacionar todos estes fenmenos num s conceito, Commons
estabeleceu que uma instituio poderia ser entendida como uma ao coletiva em
controle, liberao e expanso de aes individuais (1931, 1936). Alm disso, ele a
diferencia de institutos, que seriam o resultado do controle, ou seja, direitos,
responsabilidades, liberdades, e at as exposies s liberdades dos outros, bem como a longa
lista econmica de crditos, dbitos, propriedade, boa f, etc. (1936, p. 247, traduo nossa).
Assim, Commons refere-se especificamente a instituies legais e legalizveis. E com isso, o
autor acaba por definir o que seria o objeto de estudo da ento nova rea. A anlise da forma
como o controle coletivo ocorre relaciona a economia com o direito e com a tica. E, para o
autor, a correlao entre estas trs reas o pr-requisito para uma teoria de economia
institucional (1931). Outra definio importante foi a negao do que ele entende ser como aunidade bsica de anlise da teoria econmica. Ao invs de estudar o bem produzido ou
consumido, como fizeram os clssicos, a economia institucional analisar a unidade de
atividade, ou seja, a transao. Assim, no se analisam mais a troca de bens, mas a troca de
direitos de propriedade, estes definidos socialmente e/ou legalmente, antes mesmo da
produo, da troca ou do consumo dos bens fsicos. Resumindo: as transaes no mercado so
definidas pelos institutos; estes, por sua vez, so frutos das instituies em sociedade.
Thornstein Veblen, outro autor representante da Velha Economia Institucional (eanterior a Commons) explica as instituies como sendo os princpios de ao sustentando a
estrutura da vida econmica. So, portanto, bases prticas de conduta, diretamente
relacionadas com as regras legais vigentes. Assim, os homens organizam suas vidas com base
nas instituies, que so os hbitos amplamente aceitos na comunidade: Isso o que se quer
dizer ao denominarmo-nas instituies: elas so hbitos de pensamentos estabelecidos pela
generalidade dos homens (p. 626, traduo nossa). A importncia das instituies sobre a
economia j era apontada por Veblen, que criticava a teoria clssica por consider-las comoelementos dados e imutveis, ao invs de variveis do prprio sistema econmico, com
dinmica prpria. Para o autor, a teoria limitava muito o entendimento do mundo real ao
deixar a anlise institucional de lado, pois a ao humana no era to simplista como descrita
pela teoria marginalista:
The wants and desires, the end and aim, the ways and means, the amplitudeand drift of the individuals conduct are functions of an institutional variablethat is of a highly complex and wholly unstable character. [...] It is, of
course, on individuals that the system of institutions imposes thoseconventional standards, ideals, and canons of conduct that make up thecommunitys scheme of life (1909, p. 629).
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Percebe-se, com isso, a relao de sua definio com aquela de Commons, para quem as
instituies so controle, liberao e expanso de aes individuais. Ambos os autores
indicam que as instituies atuam no sentido de delimitar a tomada de deciso pelos
indivduos.
Dcadas mais tarde, com a disseminao da Nova Economia Institucional (NEI),
mas com a continuada dificuldade em delimitar o conceito, Matthews tenta capitular a
literatura existente at ento, e mostra que o conceito de instituies poderia ser entendido
segundo quatro linhas diferentes: no sentido de direitos de propriedade (segundo o autor, a
linha adotada pelo Law and Economics), no sentido de convenes (informais, portanto), no
sentido de contratos, e no sentido de autoridade. A caracterstica comum s quatro linhas algo similar ao conceito original de Commons: instituies so conjuntos de direitos e
obrigaes afetando as pessoas em suas vidas econmicas (MATTHEWS, 1986, p. 905,
traduo nossa).
Williamson (1998) oferece uma importante taxonomia das instituies ao mesmo
tempo em que identifica as reas da NEI e de outros campos das cincias sociais que se
associam ao estudo de cada um dos tipos institucionais. Ele classifica as instituies em
quatro diferentes nveis, que indicam no somente a sua natureza, a sua interao com osoutros nveis, mas tambm a inrcia de sua mudana. Descendo do topo para a base da
classificao, encontraremos instituies que regulam as atividades econmicas do nvel mais
macro para o mais micro; ao mesmo tempo, elas apresentam nvel de inrcia decrescente.
Vale a pena reproduzir o esquema por ele criado, de forma adaptada:
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Esquema 1Taxonomia dos Tipos InstitucionaisFonte: Williamson (1998), adaptado.
No nvel mais alto, que Williamson chama de nvel do enraizamento social
(social embeddedness), esto as instituies informais representadas por normas, costumes,
tradies, e religies. Aqui esto o que se chama comumente e coloquialmente de variveis
culturais. Normalmente consideradas exgenas pelos economistas, so objeto de anlise de
cincias sociais como a histria, sociologia, antropologia, etc2. Uma caracterstica importante
dos elementos deste nvel que levam sculos ou at milnios para serem mudados. Estas so
as instituies informais cujo poder de influncia no longo prazo tanto intrigava Douglass
North (1991).
O segundo nvel representa o ambiente institucional, mais assemelhado ao
conceito de Commons. Aqui estariam todas as estruturais formais e legais que delimitam o
funcionamento da economia. Includos aqui estariam o Judicirio, a burocracia e toda a
2 Contudo, Posner (1998b) mostra os recentes desenvolvimentos de trabalhos econmicos nesta rea,principalmente aqueles refletindo os avanos na Teoria dos Jogos e na teoria do Public Choice.
Instituiesinformais,costumes, tradio,normas, religio
Regras formais dejogo (Poltica,Judicirio,Burocracia)
O jogo (contratos,estruturas degovernana etransaes)
Tomada dedecises (preos equantidade,
alinhamento deincentivos)
Nvel 1:Enraizamento Social
Nvel 2:Ambiente Institucional
Nvel 3:Governana
Nvel 4:Alocao de Recursos
Freqncia de mudana:
100 a 1000 anos
Freqncia de mudana:10 a 100 anos
Freqncia de mudana:1 a 10 anos
Freqncia de mudana:contnua
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estrutura que garante os direitos de propriedade formais. Grande parte da literatura da Anlise
Econmica do Direito (Law and Economics), e mais precisamente da Economia dos Direitos
de Propriedade, foca-se neste nvel. Apesar da vasta literatura que mostra a importncia das
instituies encontradas neste nvel para o funcionamento da economia, Williamson adverte:
mudanas cumulativas so difceis de serem orquestradas neste nvel e os momentos em que
tais mudanas acontecem so mais excees do que regra na histria da humanidade, muitas
vezes catalisados por guerras, crises e choques exgenos (p. 28). Este o nvel-foco da
anlise central desta tese e, por isso, esta observao de Williamson ser de extrema
importncia quando analisarmos a questo das mudanas necessrias no Judicirio brasileiro,
no captulo seguinte. Apesar das dificuldades, a inrcia encontrada neste nvel j menor do
que a do nvel anterior.O terceiro nvel o das instituies que regulam a governana das organizaes.
Quer se entender aqui quais so os custos de se fazer valerem regras de forma privada, em
contraposio aos custos de enforcement legal. Como podemos lembrar, este foi o teor
integral do artigo de Coase em 1937. A concluso do autor que as firmas surgem da
necessidade de se reduzir os custos de transao existentes no mercado, dado que o
enforcement interno menos custoso. Assim, este o nvel de estudo da Teoria Econmica
dos Custos de Transao. Nas palavras de Williamson, se no nvel 2 o que importa so asregras do jogo, no nvel 3 o que importa o jogo em ao (the play of the game) (p. 29).
Por fim, na base da estrutura, esto as instituies que governam as atividades
analisadas pela teoria econmica tradicional, referentes determinao de preos e
quantidades nos mercados. A moderna Teoria da Agncia herdou esta anlise, mas
incorporou-a com os conceitos de incentivos eficientes sob diferentes circunstncias de
averso a risco dos agentes participantes.
Em tempos mais recentes, diversos autores fizeram notveis contribuies teoriadas instituies, baseando-se sobretudo em observaes do papel desempenhado por elas ao
longo da histria do desenvolvimento econmico dos pases3. Em determinadas situaes, as
instituies desenvolveram-se de forma a aumentar a eficincia da economia, permitindo
maiores ganhos de trocas; em outras, o contrrio aconteceu: as regras vigentes obstruram o
ganho das trocas e mantiveram a economia em estgio primitivo por sculos. Dentre os vrios
trabalhos nesta linha, destacam-se os de Douglass North. E perceptvel a semelhana de sua
definio do que vem a ser instituies com a definio de John Commons. North afirma:
3 NORTH & THOMAS (1973), NORTH (1981), NORTH & WEINGAST (1989) e MILGROM, NORTH &WEINGAST (1990).
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Institutions are the rules of the game in a society or, more formally, are thehumanly devised constraints that shape human interaction. In consequence,they structure incentives in human exchange, wheter political, social, or
economic. Institutional change shapes the way societies evolve through timeand hence is the key to understanding historical change (1990, p.3).
Assim, as instituies, juntamente com as restries tradicionais previstas na teoria clssica,
indicam a atratividade de todas as atividades econmicas e formam a base sobre a qual as
decises dos agentes se baseiam. Mais ainda, North mostra explicitamente que instituies
eficazes levam ao crescimento econmico. Isto ocorre atravs de uma equao simples e
clara: as instituies e a eficcia de seu enforcement[...] determinam o custo [de transao
de um ambiente]; por sua vez, os custos de transao so determinantes crticos dodesempenho econmico (1989, p. 803). Como conseqncia, instituies eficazes so
aquelas que aumentam os benefcios de solues cooperativas[...] reduzem custos de
produo e transao de cada troca, de forma que os ganhos potenciais das trocas sejam
realizveis (1991, p. 98). Mais adiante, discutiremos alguns dos trabalhos empricos recentes
que indicam os impactos das instituies sobre o crescimento econmico.
2.1.b) Definindo boas instituies
Se definir instituies pura e simplesmente j uma tarefa complicada, mais
espinhosa ainda a tarefa de explicar o que seriam boas instituies. Alm da dificuldade
tcnica, soma-se a necessidade de uma definio normativa do que seja boa. Aos olhos dos
economistas, que pretendem lanar sua cincia ao patamar das cincias exatas, qualquer
avaliao normativa, com juzos de valor envolvidos, chega a ser um sacrilgio (apesar disto
no significar que a teoria clssica, que mais se molda s cincias exatas, seja completamente
isenta de normatividade). Entretanto, a Economia Institucional (a Nova e a Velha) e, mais
precisamente, o Law and Economics, no escondem o fato de que seu objeto de estudo (as
leis, as regras vigentes num sistema, etc.) bastante prtico e, as concluses derivadas tm,
por conseqncia, um componente para polticas pblicas; isso, de forma direta ou indireta,
envolve avaliaes subjetivas do que deveria e no deveria ser feito. Contudo, no quer dizer
que os estudos dos quais se extraem concluses para polticas sejam necessria e
integralmente formados por opinies pessoais, ideologias individuais e achismos sem
fundamento objetivo. O que pode ser feito a criao de afirmaes normativas (esta poltica
deve ser implementada, aquela no deve), mas baseadas em resultados empricos colhidos no
mundo real e tratados por bons mtodos economtricos, por exemplo.
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nesse contexto, portanto, que pode ser obtida a definio do que seriam boas
instituies. Avaliaes histricas ou comparativas entre casos poderiam ajudar a oferecer
evidncias de instituies de maior ou menor qualidade. Olson (1996), por exemplo, depois
de analisar e refutar empiricamente as tradicionais explicaes para o desenvolvimento dos
pases, conclui que a nica explicao plausvel remanescente que as grandes diferenas na
riqueza das naes devem-se primordialmente s diferenas na qualidade de suas instituies
e de suas polticas econmicas (p. 19, traduo nossa). , contudo, Acemoglu e seus co -
autores que vo mais alm e dedicam-se longamente ao estudo emprico-economtrico da
qualidade das instituies e seus impactos sobre o crescimento econmico. Um dos cuidados
que tiveram foi de evitar a definio de boas instituies como sendo aquelas que geram
crescimento econmico, o que, como advertem, seria incorrer numa tautologia. Baseados nosresultados de seus estudos empricos, Acemoglu et al (2004) afirmam:
[W]e think of good economic institutions as those that provide security ofproperty rights and relatively equal access to economic resources to a broadcross-section of society. Although this definition is far from requiringequality of opportunity in society, it implies that societies where only a verysmall fraction of the population have well-enforced property rights do nothave good economic institutions (p. 9).
V-se, portanto, que uma definio til para polticas pblicas, pois indica o que deveria e
no deveria ser feito, mas passvel de uma anlise objetiva, e derivada de resultados
empricos, obtidos em casos reais e histricos.
2.1.c) Instituies Formais vs. Informais
Muita ateno dada para as instituies legais, sobretudo na rea do Law and
Economics e na rea da Economia Poltica. Entretanto, o estudo da Economia Institucional
no pode deixar de dispensar uma ateno cuidadosa aos mecanismos informais. Alm de
terem, por si s, importncia inegvel, eles interagem continuamente com os mecanismosformais e legais. A incapacidade das instituies legais de atender s demandas da populao,
por exemplo, pode gerar como resultado a forte dependncia dos cidados com relao s
instituies informais (BUSCAGLIA & STEPHAN 2005). Isso explica a predominncia de
regras sociais e informais em vrios pases subdesenvolvidos; como Weder mostra, isso no
somente uma preferncia cultural, mas uma necessidade econmica, dada a
disfuncionalidade dos sistemas legais destes ambientes (2005, p. 24, traduo nossa). Alm
disso, a presena dos mecanismos informais atuantes por longo tempo pode criar uma granderesistncia contra sistemas formais, quando estes so eventualmente usados como substitutos
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dos primeiros: um pessoa que tenha sempre vivido num ambiente institucional informal
baseado sobretudo na reputao e confiana ter grande dificuldade de sair dele e passar a
viver num sistema baseado em enforcement formal e impessoal (WEDER, idem). Por isso,
policymakers devem ter cautela especial quando decidem pela implantao de reformas ou
criao de novas regras legais. Mesmo com bom planejamento prvio, elas podem ser mal-
sucedidas se no houver uma adequada avaliao de quais so as instituies ativas de facto
na sociedade e como fazer para que os indivduos transitem de um sistema para o outro, se
isso for efetivamente possvel no curto ou mdio prazo4.
Posner (1998a) enfatiza a importncia das instituies informais, ao lembrar que
mecanismos de enforcementde direitos de propriedade e cumprimento de contratos extra-
legais existiam muito antes da criao de regras legais. Alm disso, e trabalhos empricosseguintes confirmaro este ponto, mesmo em pases avanados e com significativo uso dos
sistemas legais, a grande maioria das disputas continua sendo majoritariamente resolvida pela
via informal5.
Atualmente, o estudo das relaes informais inclui no somente as reas de estudo
identificadas por Williamson, mas tambm novas reas como a economia experimental, o
comportamento organizacional, a psicologia, e envolve novos conceitos como reputao (e.g.,
GREIF, 1989 e 1994; DOLLINGER et al, 1997), confiana (e.g., ZAK & KNACK, 2001;MAYER & SCHOORMAN, 1995), capital social (e.g., KNACK & KEEFER, 1997 e GUISO
ET AL, 2004), normas sociais (e.g., POSNER, 1998a e ELLICKSON, 1998), contratos
relacionais (e.g., BAKER, GIBBONS & MURPHY, 2002), redes sociais (e.g., UZZI, 1996),
cls e famlias estendidas (e.g., GREIF, 2009), grupos (e.g., GRANOVETTER, 1995;
WEDER, 1995), etc. O resultado emprico conforma a observao feita por North (1991) e
outros tericos: estas instituies informais tm efeitos duradouros e eficazes, muitas vezes
mais do que as de suas similares legais, e, elas so especialmente poderosas nas relaes delongo prazo.
Representante da linha conhecida comoLaw and Society, Robert Ellickson (1991)
realizou um trabalho que se tornou referncia no estudo da importncia das regras informais
vis a vis as regras legais. O autor visitou uma regio de numerosos ranchos criadores de gado
na Califrnia e percebeu que a maior parte dos conflitos entre vizinhos rancheiros eram
4 Como vistos na tipologia de Williamson, os mecanismos informais so os mais duradouros, levando de 100 a
1000 anos para serem alterados.5 Posner usa esta constatao para explicar a dificuldade de se obter resultados economtricos robustos quandose tenta medir o impacto das instituies sobre a economia: a influncia dos mecanismos informais significativa, mas difcil de ser capturada e medida.
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resolvidos atravs de regras informais, conhecidas e respeitadas por todos por muito tempo.
Forasteiros que desconheciam estas regras locais ou no as respeitavam eram penalizados
socialmente. Diferentemente do que uma ingnua interpretao de Coase (1960) poderia
sugerir, os conflitos entre os agentes econmicos, neste caso, no eram solucionados via lei.
Greif (1989, 1994) aplica a anlise de teoria dos jogos a estudos histricos e
mostra a importncia de instituies puramente informais como relaes sociais,
networking, e graus de parentesco no desenvolvimento do comrcio medieval europeu, o
que eventualmente levou ao Renascimento e Idade Moderna. Em trabalho mais recente
(GREIF & SASSON, 2009), ele e seu co-autor mostram ainda como diferentes mecanismos
informais levaram as civilizaes a diferentes trajetrias de crescimento e desenvolvimento.
Especificamente, a forma como as famlias ou os cls eram organizados foi determinante parao desenvolvimento da Inglaterra e o no-desenvolvimento da China no incio da Idade
Moderna, quando ambas naes partiram de pontos de desenvolvimento equivalentes.
Stone, Levy e Paredes (1996) mostram como mecanismos informais podem
substituir, de forma eficiente, a falta de sistemas formais adequados. Os autores comparam os
sistemas legais do Chile e no Brasil e, no tm dificuldades em mostrar como existem muito
mais obstculos para a realizao de atividades privadas no segundo; ou seja, o alto nvel de
formalismo e burocracia brasileiros gera altos nveis de custos de transao para os seusagentes. Para contornar esta situao e ajustar s suas necessidades, os agentes desenvolveram
vrios mecanismos institucionais. Aparentemente, esses mecanismos, que j fazem parte da
cultura cotidiana, conseguem atender eficientemente s necessidades dos cidados, que,
diferentemente dos chilenos, no podem contar com o suporte de um sistema legal confivel,
propcio s suas atividades.
Alguns trabalhos mostram como as instituies informais e as formais interagem e
se complementam no decorrer do desenvolvimento das economias. Muitos mostram que osmecanismos informais, como a reputao entre comerciantes, so efetivos para garantir o
cumprimento de promessas sob duas condies: (i) a rede de pessoas envolvidas tem extenso
limitada, (ii) e a interao entre os participantes repetida, ou seja, freqente. medida que a
rede se expande e o nmero de comerciantes envolvidos aumenta, reduz-se a probabilidade de
dois indivduos voltarem a se encontrar depois de uma interao momentnea; nestas
situaes, os mecanismos informais comeam a perder a eficcia. No entanto, isso acontece
porque a gerao e a transferncia de informaes (sobre a reputao dos agentes envolvidos)
passam a ter custos significativos; no a freqncia de interaes entre os agentes per se que
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determinar quando os mecanismos formais entraro em ao. Tanto o caso da Lei Mercantil
e dos juzes privados em Milgrom, North and Weingast (1990), quanto o caso das guildas
mercantis em Greif, Milgrom & Weingast (1994) so exemplos de instituies formais que
surgiram na Europa no incio da Era Moderna como formas de complementar e tornar mais
efetivos os sistemas informais de reputao unilateral ou bilateral entre os mercadores. Estas
instituies formais foram capazes de reduzir os custos de se transmitir a informao
necessria sobre a idoneidade dos comerciantes e garantir o comrcio honesto. O que
interessante que elas funcionaram de forma eficiente apesar de no contarem com a garantia
do Estado para execuo de suas decises. No caso das guildas mercantis, isso foi possvel
atravs de ameaas crveis de punio aos detratores, tais como a imposio de ostracismo e
embargos. Em todos os casos, a interao entre os sistemas informais e formais foi crucial,pois nem o mecanismo de reputao e nem as instituies [formais] podem, por si s, ser
efetivos. Eles so partes complementares de um sistema total que atua conjuntamente para
garantir o comportamento honesto (MILGROM, NORTH AND WEINGAST, 1990, p. 19,
traduo nossa).
Outras disciplinas bastante distintas, mas com resultados igualmente importantes
para a Nova Economia Institucional, tm se dedicado a estudar o tema dos mecanismos
informais e seus impactos sobre a economia ou os relacionamentos entre os agentes de formageral. Estes novos estudos, principalmente nas reas da psicologia social e economia
comportamental, chegam a utilizar experimentos desenhados na tentativa de alcanar
resultados generalizveis. Um exemplo de Malhotra e Murnighan (2002), que usaram um
experimento com alunos de faculdade. Os resultados de seu experimento indicam que em
relaes contratuais informais, onde inexiste um instrumento que garanta o cumprimento das
promessas, o nvel de confiana entre as partes e o conseqente nvel de cooperao entre elas
tende a se desenvolver mais facilmente. Por outro lado, o emprego de instrumentos formaispara a garantia do cumprimento de promessas, tais como contratos escritos, mostrou-se um
obstculo para a formao de confiana e cooperao entre as partes. Este trabalho revelou
evidncias importantes sobre os mecanismos de funcionamento de fatores tais como reputao
e confiana. Tambm, os autores concluem com seu trabalho que muito ainda resta para
entendermos sobre a natureza dos relacionamentos regidos por instrumentos informais e
aqueles regidos por instrumentos formais.
Diferentemente do que se pode imaginar, a incluso do estudo das instituies
informais na Economia Institucional no reflete um desvio de percurso, ou uma trajetria
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inesperada. Na verdade, Commons j reconhecia a sua importncia e, juntamente com as
instituies formaisaquelas impostas pelo mercado e pelas leisconsiderava as informais
como um dos trs grandes grupos de restries ao comportamento do indivduo em sociedade
(1931). O autor no s aponta para a importncia e o impacto de cada uma destas restries
(legal, econmica e informal), como ao fato de que a eficincia de cada uma delas varia de
acordo com as circunstncias. Por isso, Commons mostra que elas no so mutuamente
excludentes, no perdem espao com o passar do tempo, e so igualmente merecedoras da
ateno da Economia Institucional. Ou seja, mesmo com o desenvolvimento dos mercados e
das leis, as regras informais continuaro a existir e a ter o seu papel. O autor claramente
entendia o poder das instituies informais, muito tempo antes que a metodologia cientfica
tenha comprovado o poder da cultura, dos costumes, dos hbitos e de toda a sorte de regrasinformais de um ambiente sobre os indivduos.
Entretanto, pelo foco escolhido, as instituies informais e seus mecanismos de
atuao sero deixados de fora deste trabalho. Em determinados momentos, porm, a
discusso das instituies informais ser inevitvel, pela forte interao com o sistema legal.
Veremos ainda que, algumas instituies informais podem, com o passar do tempo, tornar-se
quase formais, sendo reconhecidas pelo prprio sistema legal. Esta a situao, por
exemplo, dos mecanismos alternativos de soluo de conflitos, tais como mediao earbitragem, que discutiremos a seguir.
2.1.d) Cortes vs. Formas Alternativas de Soluo de Conflitos
Mesmo abstraindo-se das instituies informais, preciso reconhecer que as
instituies legais no so as nicas que geram restries ao comportamento dos indivduos
em sociedade. Mais precisamente, o enforcementda leipor exemplo, via decises judiciais
no a nica forma de moldar a escolha e a interao entre os agentes. Na verdade, a
relativa pouca ateno dada aos mecanismos alternativos de soluo de conflitos e o tribunal-centrismo uma crtica frequentemente direcionadas queles que estudam a eficincia das
cortes (HAMMERGREN, 2007). Mesmo dentro da NEI, h aqueles que se opem ao foco nas
cortes. Como mostra Williamson (1998), o que diferencia os estudiosos do nvel 3 aqueles
mais preocupados com a governana, o jogo em ao daqueles do nvel 2 aqueles
dedicados ao ambiente institucional e, precisamente burocracia e ao Judicirio est
justamente no fato de que os primeiros levam em considerao que o funcionamento da
estrutura legal no tem custos zeros. Assim, o mais plausvel seria focar a ateno num nvel
mais baixo, por exemplo, no do funcionamento dos contratos, que onde atua a economia dos
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custos de transao. Poder-se-ia ainda argumentar que uma interpretao do artigo de Coase
de 1960 poderia levar mesma concluso de que o resultado eficiente no garantido por
decises judiciais, mas sim por transaes privadas que ocorrem com custos negligenciveis.
Apesar disso, Coase no explicitou preferncias normativas sobre a forma de se alcanar a
maximizao de ganhos, se via transaes privadas ou via decises legais.
Independente da discusso terica, o reconhecimento de que existem formas
extra-judiciais para a definio do comportamento dos agentes e para soluo de conflitos
mais importante ainda na formulao de polticas pblicas. Veremos nos captulos seguintes
que, quando o funcionamento do Judicirio est longe de atender as demandas dos indivduos
transacionadores, a ateno deve ir alm de propostas para a melhoria da eficincia das cortes.
Deve incluir, por exemplo, projetos para a disseminao de mediao e arbitragem, deconciliaes pr-audincia, de juizados especiais de pequenas causas, entre outros. A
discusso parece ser desvirtuada para outros elementos, mas o objetivo o mesmo: reduzir
os custos de transao existentes para a maximizao dos ganhos6.
Novamente, por problemas de limites deste trabalho, e apesar de reconhecer a
importncia dos mecanismos alternativos de soluo de conflitos, o foco aqui ser dado s
cortes e as decises judiciais, exceto em passagens explicitamente identificadas.
2.2 Discusso recente: medindo o impacto das instituies legais na economia
Com o desenvolvimento da Nova Economia Institucional (NEI) ficou claro que o
funcionamento das instituies no poderia ser considerado dado, ou uma varivel exgena
como tradicionalmente considerada pela teoria econmica. Institutions matter (instituiesimportam), so variveis de estudo e, como qualquer outra varivel econmica, so passveis
de anlises objetivas, mensuraes, e previses (MATTHEWS, 1986).
Uma vez que a NEI trouxe luz o estudo das instituies na teoria econmica,
uma gama de questes antes negligenciadas pelos economistas passou a ocupar o centro das
atenes: Se regras so importantes, se instituies so importantes, se decises legais so
importantes, que impactos elas geram sobre a economia? O que afeta estes impactos? Que
resultados so previstos dado que se tem instituies com caractersticas X, Y ou Z? Com o
6 Obviamente este o objetivo a ser seguido pelos economistas. Para os advogados, seria o maior acesso aJustia, o que quer que seja entendido por estes termos.
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avano recente dos mtodos quantitativos em geral, e dos economtricos em particular,
tornou-se possvel ir alm das conjecturas e responder a estas perguntas de forma sistemtica
e geral. O estudo da NEI tornou-se ainda mais rico e, cada vez mais, observam-se trabalhos
empricos tentando entender o que as instituies podem causar.
Os primeiros trabalhos economtricos, e os mais dominantes ainda hoje,
perguntam: qual o papel das instituies sobre o crescimento econmico? Nestes trabalhos,
as instituies legais so a varivel explicativa, e o crescimento a varivel dependente, ou
seja, quer-se medir a dimenso do impacto das primeiras sobre a segunda. Muitos trabalhos
apareceram desde os fins da dcada de 1980 e incio de 1990s nesta linha. Os resultados
mostram que, de fato, institutions matter para o crescimento, e que a diferena na qualidade
das instituies formais ainda sem entrar em detalhes sobre o que vem a ser qualidade pode ser uma das variveis significativas na previso de quais pases atingem maiores taxas
de crescimento, e quais atingem taxas menores. Esta rea de trabalhos que incluem
instituies formais como variveis explicativas tem tido tanto sucesso que Williamson
compara-a com uma indstria para a qual economistas minimamente associados NEI tm
dado contribuies (2000, p. 608, traduo nossa). possvel perceber a importncia
metodolgica de incluir as instituies formais como variveis, pois isso permite comparaes
dentro de um pas (ou regio) e entre diferentes pases (regies). Entretanto, como serdiscutido mais tarde, estes trabalhos empricos encontram grandes obstculos na produo de
resultados aplicveis e de robustez inquestionvel.
Os trabalhos de Douglass North, alguns em colaborao com outros autores, so
exemplos deste tipo de anlise comparativa. Em North (1991), o autor mostra como as
instituies legais tm tido papel destacado no desenvolvimento econmico. Historicamente
possvel encontrar momentos em que as instituies formais e informais no se
desenvolveram de forma a garantir uma trajetria de eficincia. Nestes casos, o que houve foia ausncia de elementos que catalisassem a organizao voluntria de organizaes que
eventualmente levassem eficincia. Dentre estes, pode-se citar uma efetiva estrutura legal e
um sistema de cortes para garantir o cumprimento de contratos, o que por sua vez, depende do
desenvolvimento de instituies polticas que criem tal estrutura. Sem a presena destes
elementos legais, no h incentivos para alterar o sistema e buscar regras geradoras de
eficincia, ou seja, mais crescimento econmico.
O artigo de Barro (1991) um exemplo de trabalho da economia mainstream, no
representante da economia institucional, que mostra empiricamente que institutions matter.
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O autor, depois de analisar dados de 98 pases em 25 anos, conclui, entre outras coisas, que
variveis relacionadas garantia de direitos de propriedade so significativamente
relacionadas com crescimento. Ambientes de alta instabilidade poltica que no asseguram
direitos de propriedadetm o seu crescimento impactado de forma negativa.
Por terem sido os trabalhos pioneiros, foi pouca a preocupao destes artigos em
entrar em detalhes. Por exemplo, no foi definido quais so os tipos de instituio que so
cruciais para se promover o crescimento econmico, ou, em outras palavras, quais so as
caractersticas desejadas de uma boa instituio, que v alm da idia um tanto quanto vaga
de promoo de eficincia. Mais deficiente nestes trabalhos foi a falta de uma mensurao
quantitativa do impacto das instituies sobre a economia. Os trabalhos que se seguiram,
aproveitando-se do contnuo desenvolvimento das tcnicas metodolgicas, comearam arefinar as perguntas e, consequentemente, passaram a ter respostas tambm cada vez mais
detalhadas.
2.2.a) Instituies Legais, Judicirio e Economia: os Resultados de Alguns Trabalhos
2.2.a).1.Instituies Legais de Uma Forma Geral
Economistas so unnimes em afirmar que um sistema legal ruim gera impactos
altamente perversos sobre a economia. Este discurso j era feito desde os tempos de o
nascimento da cincia econmica com Adam Smith. Mas o emprego de tcnicas quantitativas,sobretudo desde o comeo da dcada de 1990, permitiu-os passar dos argumentos tericos
para a comprovao por evidncias empricas. Entre os efeitos apontados esto: piora na
desigualdade empresarial (BECK; DEMIRG-KUNT & MAKSIMOVIC, 2002), maior
intervencionismo estatal e, conseqentemente, maior ineficincia na economia (CASTELAR
PINHEIRO, 2003), reduo dos investimentos e reduo do valor dos ativos das empresas
(KEEFER & KNACK, 2002), reduo do nvel de emprego e aumento do nvel de
desemprego, principalmente das classes mais vulnerveis (FELDMANN, 2009), aumento dainformalidade (FRIEDMAN ET AL, 2000), somente para mencionar alguns.
O que define um sistema legal ruim? Buscaglia (1997) cita exemplos
empiricamente observados em vrios pases subdesenvolvidos: confisco de propriedade,
imposio no-antecipada de altos impostos, incidncia repetida destes sobre as mesmas
operaes econmicas, definio no-clara das obrigaes contratuais, aplicao inconsistente
da lei juntamente com a existncia de corrupo, criao de regulamentaes ad hoc, etc. O
resultado disso, afirma o autor, bastante claro: a criao de um ambiente instvel,
representado por uma maior taxa de desconto intertemporal nas interaes sociais que, por sua
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vez, gera uma menor predisposio para investimentos, poupana e consumo de bens
durveis, que so, por natureza, incertos e de longo prazo.
Muitos autores mostram empiricamente a relao entre a qualidade do sistema
legal de um pas e o seu desempenho econmico. Antes mesmo do fim da Guerra Fria e da
imploso das economias socialistas, Scully (1988) mostrou que os pases onde o rule of law
respeitado observaram um aumento, em mdia, de 2,75% em suas economias, comparados
com os 1,23% dos pases onde os direitos individuais no so respeitados pelo estado. Pases
onde os direitos de propriedade privada e a alocao de recursos pelo mercado eram
garantidos observaram um aumento de 2,76% em mdia, comparados com os 1,10% dos
pases onde os direitos de propriedade no eram respeitados e/ou o estado intervinha na
alocao de recursos da economia. Finalmente, o autor mostra que as sociedades onde aliberdade (poltica, econmica e individual) restringida tm nvel de eficincia inferior
metade daquele observado em pases livres. Isso quer dizer que a capacidade de transformar
recursos em riqueza produtiva relacionada com o grau de liberdade observado numa
sociedade. Estes resultados confirmam o argumento do autor que afirma que a segurana das
instituies legais leva a maiores nveis de acumulao de capital.
North & Weingast (1989) mostram a relao explcita entre instituies, poder
poltico e crescimento econmico que favoreceu a Inglaterra Moderna, permitindo-lhecaminhar em direo Revoluo Industrial e tornar-se a potncia europeia e mundial dos
sculos seguintes. Os autores mostram que, ao contrrio da teoria clssica, que assume
simplesmente a existncia de relaes de mercado, o que foi mais importante naquele
contexto foi a forma e a natureza das instituies que se desenvolveram ao longo do tempo.
Estas moldaram o poder poltico que, da forma especfica como ocorreu delimitando o
poder da Coroa e criando a separao de facto dos poderes permitiu a criao de um
ambiente favorvel ao enforcement dos direitos de propriedade, com impactos explcitos noresultado econmico. Talvez uma das contribuies mais importantes de North e Weingast
neste trabalho, e bem em linha com os princpios da Nova Economia Institucional, seja a
evidncia mostrando como as instituies que governam a sociedade podem (e devem) ser
analisadas endogenamente.
Acemoglu & Johnson (2005) perguntam: que tipo de instituies tem mais
impactos sobre a economia? Para tanto, usam a separao de North (1981) de instituies de
contratos e de direitos de propriedade. O primeiro grupo refere-se aos mecanismos que
existem para facilitar a transao entre agentes privados. O mais importante destes
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mecanismos seria o funcionamento dos sistemas legais. Por sua vez, as instituies de direitos
de propriedade referem-se aos mecanismos de proteo dos direitos dos agentes econmicos
contra a expropriao feita pelo estado ou por outros agentes de maior poder poltico. Seus
resultados indicam que as instituies de direitos de propriedade tm impacto bastante
significativo na renda per capita, no nvel de investimento, no nvel de crdito e no
desenvolvimento de mercados de capitais dos pases. Por outro lado, o efeito das instituies
contratuais mais limitado, mas significativo, atuando sobre a formao dos mercados de
capitais. A explicao dos autores para esta diferena nos impactos remete-nos de volta
interessante discusso sobre a interao entre instituies formais e informais:
legal rules and procedures primarily affect the contractual relations betweenprivate individuals, in particular between debtors and lenders or upstreamand downstream producers. As long as these legal institutions are notextremely dysfunctional, individuals can avoid most of the adverse effects ofbad legal rules by changing the terms of their contracts or by developinginformal arrangements [...] [Thus], the effect of contracting institutions oninvestments and growth may be relatively limited. When it comes toarrangements regulating property rights and the relationship between thestate and individuals [...] the option to engage in ex ante contracts to avoidex post distortions is not available [...] Therefore, property rights institutionshave a more important effect on economic outcomes than contractinginstitutions do (p. 984).
De uma forma ou de outra, os trabalhos de Acemoglu e co-autores, mostram de
forma explcita, como a diferena no desenho instituicional pode ter impactos explcitos no
resultado econmico.
Rodrik, Subramanian & Trebbi (2004), num trabalho envolvendo dados de 137
pases, encontram que a qualidade das instituies supera todas as outras variveis quando se
averiguam os determinantes do nvel de renda nacional. No caso, as outras variveis usadas
foram o nvel de comrcio internacional que os autores chamam de integrao (pois aliteratura argumenta o poder do comrcio internacional na integrao dos mercados locais)e
geografia, tradicionalmente apontadas como importantes explicadores do crescimento das
naes. Os resultados dos autores mostram que, uma vez controlada pelas instituies, nem
integrao e nem geografia tm impactos significativos. Por outro lado, as variveis de
direitos de propriedade e rule of law sempre entram com sinais esperados e so
estatisticamente significativas. Mais precisamente, os resultados indicam que, quando se
aumenta a qualidade das instituies em um desvio padro, o impacto (positivo) na renda per
capita de nada menos do que 6 vezes. Esta magnitude de diferena na qualidade
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institucional e na renda resultante exatamente aquela observada empiricamente entre a
Bolvia e a Coria do Sul.
2.2.a).2.O Judicirio de Forma Especfica
Linn Hammergren, uma especialista em reforma judicial do Banco Mundial,
assim define um bom Judicirio:
Well-functioning judicial systems are supposed to control governmentabuses and protect basic human and civil rights; create an environment that
fosters the development of market-based economies; deter crime and civilviolence; reduce levels of societal conflict; support the development oflegitimate democratic governance; and reduce social inequities by helpingspread the benefits of development to marginalized groups (2007, p. 4, grifonosso).
O Judicirio , portanto, a garantia do enforcementlegal das instituies, cuja importncia j
foi discutida acima. Algumas caractersticas definem a qualidade de funcionamento do
Judicirio: honestidade, imparcialidade, independncia e estmulo s atividades entre atores
privados (SHERWOOD, 2004). No difcil perceber que muitos dos pases
subdesenvolvidos tm Judicirios que no atendem a alguns dos requisitos acima, e muitas
vezes, a nenhum deles. Por isso mesmo, o Banco Mundial tem atribudo papel crucial para o
Judicirio no processo de desenvolvimento econmico dos pases. A ateno , sobretudo,
naqueles que passaram por recentes processos de democratizao ou de extino de regimes
socialistas. Vrios relatrios, grupos de trabalhos e fundos de ajuda financeira foram criados
no intuito de desenvolver o sistema judicial de pases em vrias partes do mundo 7. Para o
Banco, a relao entre um Judicirio forte e crescimento econmico explcita e
inquestionvel. Para isso, deixa claro quais so as funes esperadas de um bom Judicirio.
Ibrahim Shihata, ento Vice-Presidente Snior do Banco, afirmou:
A well functioning law enforcement apparatus and judiciary in which
7 Mais precisamente, o Banco Mundial preocupa-se com o rule of law de um pas. Shihata afirma que, para ospropsitos do trabalho do Banco Mundial em governana [dos pases], o rule of law pode ser definido comosendo: um sistema que assume que: a) existe um conjunto de regras [legais] que so conhecidosantecipadamente; b) tais regras tm efeito de facto; c) existem mecanismos para se garantir a aplicaoapropriada das regras mas tambm para se permitir desvios quando necessrios, que sero realizados de acordocom procedimentos previamente estabelecidos; d) conflitos na aplicao das regras podem ser resolvidosatravs de decises mandatrias (binding) de um sistema judicial independente ou de rgos arbitrais; e e)existem procedimentos conhecidos para a emenda de regras quando elas no mais servirem aos seus propsitos[1999, p. xviii, traduo nossa]. Mais adiante: Claramente, o Judicirio tem um papel particularmente
importante num sistema basedo no rule of law [p. xx, traduo nossa]. V-se assim, que o papel do Judicirioem cada pas seria o de garantir o efetivo cumprimento do rule of law, que, por sua vez, o requisito para obom funcionamento dos mercados e da economia.
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administrators and judges respectively apply the law in a fair, even andpredictable manner, without undue delays or unaffordable costs, is in myview part and parcel of the legal framework needed for a market economy The judiciary may also identify inconsistencies in the applicable rules orbetween them and the basic law or the constitution. It serves as the finalmonitor of allegations of corruption, arbitrariness and lack of accountabilityby other branches of government (1999, p. xx).
A idia de que as falhas no funcionamento do Judicirio pode ser uma das principais causas
do subdesenvolvimento de muitos pases ficou cristalizada na corrente da literatura jurdica
conhecida como Law and Development. Esta corrente foi bastante ativa, principalmente na
dcada de 1970 nos EUA, mas foi perdendo suporte com o passar do tempo, por deficincias
metodolgicas e, principalmente, pela falta de bons resultados derivados das misses dos
organismos internacionais, tais como o Banco Mundial. Entretanto, desde fins da dcada de
1990, com a ateno cada vez maior conquistada pelo Law and Economics e, sobretudo, com
o avano das metodologias empricas, a discusso do papel do Judicirio no desenvolvimento
das economias tem voltado a todo vapor. Os trabalhos recentes nesta literatura, alguns dos
quais apresentamos a seguir, atesta o reavivamento deste tema.
Buscaglia e Ulen (1997), por exemplo, focam no caso dos pases latino-
americanos. Eles mostram que o fortalecimento do Judicirio um complemento necessrio
aps a transio de uma economia fortemente dependente do setor pblico como eram
caracterizadas as economias da regiopara uma economia descentralizada, privada e aberta.
Neste processo, natural que cidados e empresas privadas passem a demandar maior clareza
na definio de direitos e deveres que regulam as sua atividades econmicas. Veremos no
prximo captulo que, no Brasil, foi exatamente isso o que ocorreu nos fins da dcada de 1980
e incio da dcada de 1990, logo aps a promulgao da Constituio de 1988. Estes
movimentos representaram, de certa forma, a resposta para as novas demandas que surgiram
com o desenvolvimento da economia. Evidentemente, as demandas por novas leis traziamconsigo, implicitamente, tambm a demanda de seu efetivo enforcement. Ou seja, de nada
adiantaria explicitar os novos direitos civis, se a execuo por um Judicirio forte no fosse
tambm garantida. Neste momento da histria brasileira, o papel fundamental do Judicirio
sobre a economia tornou-se ainda mais claro.
Com base em dados coletados em entrevistas a empresrios em pases da Amrica
Latina, Weder (1995) mostra que 23% da variao do crescimento per capita pode ser
explicado pela qualidade das regras de funcionamento judicial de um pas, apesar de acausalidade desta sobre aquela no poder ser imediatamente derivada. Isso se deve a usuais
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problemas economtricos na definio do sentido de causalidade nesta rea de estudo (como
ser visto mais adiante). Entretanto, pode-se dizer com confiana, baseado nestes resultados,
que o bom funcionamento do Judicirio est associado a um maior nvel de crescimento
econmico. Por estes motivos, Santiso (2003a) aponta a falta de credibilidade no Judicirio
como sendo uma das mais importantes razes da crise institucional que ameaa a democracia
em muitos pases da Amrica Latina.
O trabalho de Sherwood (2004), resultante de uma pesquisa realizada em sete
pases (Argentina, Brasil, Canad, Peru, Filipinas, Portugal e Espanha) entre os anos de 1996
e 2002, mostra que o mau funcionamento do Judicirio foi o responsvel pela falta de
crescimento nestes pases da ordem de 20%, e pela reduo no crdito de 10%. O autor
mostra que, se o Judicirio funcionasse de forma adequada definindo adequado como aforma com que ele funciona nos pases de primeiro mundo os pases investigados teriam
um aumento no investimento de 14%, no emprego de 12% e nas vendas de mais de 18%.
Em outro trabalho emprico, Feldmann (2009) mostra que a independncia
judicial diretamente associada ao nvel de emprego e inversamente associada ao nvel de
desemprego de longo prazo. Alm disso, a quantidade de vis nas decises das cortes
inversamente correlacionada com o nvel de emprego dos jovens8.
Finalmente, Hayo e Voigt (2008) mostram, atravs de uma amostra de 67 pases,que as normas judiciais presentes em um pas tm impactos estatisticamente significativos e
economicamente relevantes. Seus resultados opem-se ao de Djankov et al (2003), que
indicaram que nos sistemas judiciais mais formalizados existe uma maior interferncia do
Estado, portanto uma menor independncia judicial e tambm um maior nvel de corrupo e
de rent-seeking. Hayo e Voigt mostram que algumas das normas presentes nos sistemas mais
formalizados tm, na verdade, impactos positivos sobre o nvel de investimentos. Exemplo
so os procedimentos judiciais escritos ao invs de procedimentos orais (estes ltimosapontados por Djankov et al como mais eficientes). Os autores mostram que os
procedimentos mais formalizados tendem, na verdade, a aumentar a previsibilidade das
decises judiciais.
No Brasil, inexistem at o momento presente, segundo nosso conhecimento,
pesquisas economtricas medindo quantitativamente os efeitos do Judicirio sobre a
economia. Isso no significa, no entanto, que os economistas neguem a existncia de tais
8 A mensurao das variveis independentes de qualidade judicial usadas pelo autor independncia,imparcialidade, proteo de direitos de propriedade, interferncia militar e integridade foram retiradas doEconomic Freedom of the World. Para mais detalhes, checar Feldmann (2009).
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efeitos. Castelar Pinheiro (2000), num trabalho que se tornou referncia na literatura nacional
sobre este assunto, mostra indcios dos efeitos perversos de um Judicirio deficiente sobre a
economia brasileira. Sua pesquisa baseada em entrevistas a empresrios de mdias e grandes
empresas no pas. Mais de 96% deles v o mau funcionamento do Judicirio como prejudicial
ao funcionamento da economia; 51% afirma que a ineficincia judicial chega a reduzir
decises de investimentos em seus respectivos setores de atividade. Quando indagados sobre
experincias reais, 21% dos empresrios entrevistados afirmou j ter efetivamente deixado de
realizar um investimento, que de outra forma teriam realizado, unicamente por conta da
deficincia das cortes brasileiras; 32% deixou de terceirizar tarefas por medo de
descumprimento de contratos com fornecedores, apoiados seguidamente por decises
judiciais; e, finalmente, dos entrevistados, 50,4% afirmou que j deixou de contratar mais mode obra por causa da parcialidade da Justia Trabalhista em favor dos empregados. Apesar dos
usuais (e no insignificantes) problemas com pesquisas baseadas em entrevistas (como
veremos logo adiante), o trabalho de Castelar Pinheiro pode ser um bom indicativo dos reais
impactos da ineficincia da Justia brasileira sobre a economia.
Existe uma literatura recente, relativamente ampla e que est gerando uma
significativa reputao, criada por economistas mainstream, que mede quantitativamente o
impacto do funcionamento do Judicirio sobre os mercados financeiros. Basicamente, ostrabalhos desta rea empregam variveis que, de alguma forma, medem a qualidade do
Judicirio, e avaliam econometricamente qual o impacto delas sobre o desenvolvimento
financeiro dos diferentes pases. Como a premissa que a capacidade de alavancagem
financeira de um pas muito claramente associada ao seu grau de desenvolvimento
econmico, o que eles esto medindo exatamente o que os outros trabalhos discutidos acima
medem: a importncia do bom funcionamento do Judicirio sobre o desenvolvimento
econmico. Esta literatura veio a ser conhecida como Law and Finance. Apesar do nomefamiliar, autores desta rea no compartilham a metodologia analtica doLaw and Economics
ou da NEI. Diferentemente de grande parte dos autores do Law and Economics, a
preocupao em unicamente utilizar a metodologia quantitativa de maneira robusta fez com
que, muitas vezes, entendimentos bsicos sobre as questes legais fossem negligenciados.
Com isso, suas concluses dos efeitos da lei sobre a economia so, no raro, precipitadas e
limitadas.
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Dada a ateno que conseguiu chamar na academia econmica, e dada tambm a
contribuio que gerou para trabalhos empricos na rea, discutiremos a literatura do Law and
Finance com mais detalhes na seo sobre o debate das origens legais.
2.2. b) Dificuldades na realizao de trabalhos empricos
Apesar de esta literatura ter gerado uma quantidade inestimvel de novos
conhecimentos para a cincia econmica, os trabalhos empricos envolvendo avaliao de
instituies so muitas vezes postos em dvida. A maior vulnerabilidade destes trabalhos s
crticas se explica pela prpria natureza do estudo das instituies. Matthews (1986), mesmo
que muito animado com as conquistas da Nova Economia Institucional, advertia que trabalhos
empricos com instituies confrontam-se com dificuldades especficas, dada a complexidade
das instituies econmicas, e a conseqente dificuldade de sua mensurao quantitativa. Porisso, previu que a perspectiva estatstica facilmente aplicada em economia no seria
diretamente aplicvel no estudo da economia institucional. Os trabalhos recentes provam que
esta aplicao da econometria no impossvel; todavia, aplic-la de forma robusta, e sem
negligenciar os conceitos institucionais e legais, , sem dvida, uma tarefa longe de ser trivial.
Edgardo Buscaglia e Thomas Ulen vem o mesmo problema no caso especfico
do Law and Economics: Relativamente poucos estudos empricos tm sido avanados[...]
Observaes e verdades lgicas so abundantes, mas a verificao emprica destas verdadeslgicas parece ser escassa (1997, p. 3, traduo nossa). Particularmente com relao ao
impacto do Judicirio sobre a economia, Sherwood et al (1994) afirmam: Por mais auto-
evidente que seja, a proposio de que processos judiciais fortes estimulam o desempenho
econmico est longe de ser provada. A extenso de tal estmulo no foi ainda estimada e nem
sequer adivinhada (p. 102, traduo nossa). muito evidente que a rea tem se baseado
longamente e intensamente em verdades lgicas, e no empricas. Muitas vezes, o que
ocorre que ao partir para a mensurao quantitativa, tais verdades lgicas tornam-se muitomais difceis de serem comprovadas do que se imaginava inicialmente. Por exemplo, uma das
verdades lgicas mais conhecidas no Law and Economics e na NEI que direitos de
propriedade seguros e sistemas legais eficientes geram bons resultados econmicos.
Entretanto, Santiso (2003a) mostra que, apesar de esta relao ser bem entendida na teoria
estudos recentes sugerem que [estas relaes entre estruturas legais e economia] no so to
diretas quanto inicialmente se assumiu (p. 115, traduo nossa).
Algumas das principais dificuldades encontradas pelos trabalhos empricos na
NEI e, especificamente, noLaw and Economics podem ser resumidas em:
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Nexo causal entre sistema legal e sistema econmico difcil de ser comprovado.
Os prprios estudiosos que tm feito as mensuraes quantitativas, reportam
obstculos difceis de serem superados para o alcance de resultados confiveis. Os autores
identificam que a relao entre regras legais e economia no direta, nem unidirecional e nem
nica. Por exemplo, Feldmann (2009), apesar de ter encontrado resultados robustos dos
impactos do sistema legal sobre o mercado de trabalho, admite serem necessrios mais
estudos para se averiguar como de fato ocorre a transmisso da qualidade do sistema legal
para o desempenho do mercado. Muitos esclarecimentos ainda so necessrios, tanto no nvel
terico, quanto no nvel emprico. a mesma concluso a que chegam Acemoglu & Johnson
(2003) ao fim do trabalho onde mediram os impactos das instituies contratuais e de
propriedade privada sobre variveis econmicas. Mesmo com os resultados quantitativos emmos, os autores afirmam que continuam sem saber como exatamente as instituies[...]
afetavam investimentos, crdito e crescimento; tudo aquilo como uma caixa preta (p.
989).
Alm disso, o caminho da causalidade pode ser perturbado por vrias outras
foras que normalmente geram rudos nas mensuraes. Por exemplo, Beck, Demirg-Kunt
& Maksimovic (2002) mostram que apenas a medida geral do ambiente legal afeta o
crescimento das empresas, mas no as variveis especficas, e que o mecanismo pelo qual osistema legal afeta o desempenho das firmas ainda no bem entendido.
Como no poderia ser diferente, no Brasil, a relao entre estruturas legais e
resultados econmicos tambm difcil de ser claramente compreendida. Castelar Pinheiro
(2003) encontrou que os empresrios, crticos tradicionais do funcionamento judicial no pas,
no so capazes de explicar com exatido como ocorre o impacto do (mau) funcionamento do
Judicirio sobre suas empresas, apesar de eles serem unnimes em afirmar que tal impacto
existe (p. 12). Difcil quantificao e mensurao das variveis envolvidas e difcil especificao da
forma funcional dos modelos analticos.
Faltam ainda formas adequadas de se medir o impacto das variveis institucionais
sobre a economia. A dificuldade de se obter a correta especificao dos modelos nos trabalhos
economtricos parece difcil de ser sanada. Muitas vezes a definio do problema bsico
carece ainda de uma formulao acurada. Por exemplo, o que um sistema judicial
(in)eficiente? Mais ainda, como medir tal eficincia? Existe ainda um problema que os
econometristas chamam de variveis omitidas: os impactos das variveis legais esto afetando
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indiretamente outras variveis. Nestes casos, necessariamente, ocorrer subestimao dos
impactos medidos9. Relacionado ao problema das variveis omitidas esto os problemas de
endogeneidade e causalidade reversa, to frequentemente observados em trabalhos nesta rea.
Especificamente o segundo problema, caracterizado pelo erro na determinao do que
constitui a causa e do que constitui a conseqncia de um fato observado, pode gerar
concluses bastante equivocadas na criao de polticas pblicas. Rodrik, Subramanian &
Trebbi (2004) enfatizam:
The extent to which an economy is integrated with the rest of the world andthe quality of its institutions are both endogenous, shaped potentially not justby each other and by geography, but also by income levels [...]Institutionalists have to worry about different kinds of reverse causality.
They need to show that improvements in property rights, the rule of law andother aspects of the institutional environment are an independent determinantof incomes, and are not simply the consequence of higher incomes (p.133-4).
A dificuldade de se encontrar variveis adequadas maior ainda quando se trata
de variveis legais e polticas, pois existe uma dificuldade inerente em se medir sistemas
polticos e legais. As poucas medidas que existem baseiam-se em ndices construdos por
consultorias ou ONGs, que podem ter ou no refletir fielmente os aspectos mais importantes
da realidade. Outras medidas foram criadas por autores de artigos clssicos, que foram depois
reproduzidos em trabalhos subseqentes. Na maior parte das vezes, pouco se discute sobre a
forma metodolgica com que foram construdas estas variveis: a necessidade da praticidade
acaba sacrificando a adequao das medidas utilizadas. O problema falsamente minimizado
pelos economistas, pois eles no tm costume de dialogar com profissionais de outras reas. A
falta de dilogo d a impresso de estar fazendo a coisa certa, mas o que falta, na verdade,
uma avaliao crtica daqueles que conhecem bem os temas abordados. To logo os trabalhos
ultrapassam as fronteiras da cincia econmica, tornam-se alvos de freqentes crticas pela
inadequao das formas de mensurar e definir as variveis no econmicas. Exemplo clssico
a forma tradicionalmente usada pelos economistas para se medir os sistemas legais. Uma
das nicas medidas conhecidas foi aquela usada pelo Law and Finance, j mencionado
anteriormente e que ser discutido mais detalhadamente adiante. Entretanto, poucos se deram
ao trabalho de avaliar a adequao desta medida, ou at mesmo do conceito. Mais difcil ainda
encontrar trabalhos que ofeream medidas alternativas, mais adequadas do que aquela.
9 Diversos outros problemas economtricos derivam quando ocorre a multicolinearidade das variveis, entre elesuma grande varincia, grande oscilao na estimao dos parmetros quando ocorrem pequenas mudanas nosdados, e pequena significncia estatstica (GREENE, 2004).
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verdade que, como Weder atesta, problemas de mensurao so particularmente difceis no
Judicirio (1995, p. 24, traduo nossa). Mas, por isso mesmo, esforos maiores deveriam
ser canalizados para a resoluo desta dificuldade. Enquanto os trabalhos econmicos no
demonstrarem preocupaes com a definio deste problema, continuar grande a
desconfiana pelo pblico no-economista com relao aos resultados alcanados.
Para auxiliar os economistas na escolha de variveis significativas, talvez valesse
a pena recorrer aos juristas. Se ao economista interessa a ideia de eficincia, ou seja, de
maximizao de bem-estar social, preciso identificar quais elementos do conjunto de regras
legais permite de fato esta maximizao. Se, por exemplo, os custos diretos de acesso s
cortes forem muito altos (taxas, honorrios advocatcios, custos de oportunidade do processo
legal, etc.) o acesso Justia pelas camadas mais pobres pode ser mais difcil; ainda nestecaso, se se acredita que as cortes geram algum tipo de bem-estar para os indivduos, ento,
todos os elementos que tornam o acesso Justia custoso deveriam ser eliminados para se
alcanar a eficincia. Para o economista importa a maximizao de bem-estar; para o jurista, o
acesso efetivo Justia. No fim, podem ser objetivos confluentes, pois morosidade, ineficcia,
insegurana, e alta reversibilidade so elementos reconhecidos como indesejveis, tanto por
um como por outro. Desta forma, um dilogo com os estudiosos de outras reas pode
clarificar a escolha de variveis que mais eficazmente levam resposta que se quer chegar.Uma dos pontos vulnerveis da literatura do Law and Finance, e o que o torna difcil de ser
aceito por outros pblicos, at mesmo economistas da NEI, justamente a falta de dilogo
com profissionais que poderiam ajudar a clarificar muitos dos elementos (legais) envolvidos
em seus trabalhos. por isso que, talvez a soluo seja a busca por trabalhos
interdisciplinares que empreguem os conceitos e as metodologias de cada um das disciplinas
envolvidas. No uma tarefa fcil, por exigir um mltiplo esforo dos estudiosos, mas
certamente necessria para se alcanar resultados mais condizentes com o que observado narealidade, fora dos modelos tericos limitados s fronteiras de uma disciplina em particular.
Pesquisas de opinio como fonte principal de dados, argumentos fortemente baseados
em evidncias anedticas e senso comum.
Devido dificuldade de mensurao das variveis e da especificao do modelo
funcional que acabamos de discutir acima, muitos dos trabalhos acabam baseando-se em
evidncias anedticas. Quando resultados empricos so apresentados, quase em sua
totalidade, eles so derivados de estudos de caso e/ou pesquisas de opinio. exatamente o
que fazem os clssicos trabalhos nesta rea: de Castelar Pinheiro (2000), para o Brasil, e
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tambm do Law and Finance, para o mundo. Os dados encontrados nestes trabalhos
originam-se exclusivamente de questionrios enviados a empresas e indivduos, que indicam
sua opinio a respeito das instituies legais, com as quais se deparam em suas atividades
econmicas. Entretanto, o Banco Mundial alerta que as opinies de usurios e mesmo
operadores do Judicirio no podem ser usados como representao fiel da situao (Banco
Mundial 2004, p. 69). Portanto, preciso cuidado quando se quer derivar concluses baseadas
nestes trabalhos. Os resultados ali encontrados podem mostrar apenas uma perspectiva parcial
do sistema legal em questo.
Difcil derivao de recomendaes para polticas pblicas:
Talvez mais complicado do que medir quantitativamente as relaes entre
estruturas legais e resultados econmicos seja derivar polticas pblicas (assumindo que asmedidas tenham sido preliminarmente e corretamente feitas). Hammergren (2007) afirma que
mesmo as reformas judiciais implantadas pelas agncias internacionais em diversos pases nos
anos 80 e 90 foram feitas sem se saber preliminarmente quais seriam os resultados
alcanados, pois havia pouca evidncia emprica de que o Judicirio [...] [tinha] algum
impacto sobre o desenvolvimento econmico (p. 12, traduo nossa). E mesmo quando as
evidncias empricas vieram, elas tiveram relativamente pouco valor aplicado. Uma das
razes para isso ter acontecido a ainda falta de informao de quais so os canais pelos quaisse d o impacto da qualidade das instituies sobre a economia. Ou seja, mesmo quando os
trabalhos foram relativamente bem-sucedidos em medir os impactos, no se sabe na verdade
como ocorreu o impacto. Assim, todo o efeito ainda fica fora do controle dos policymakers
que no conseguem replicar os bons resultados e nem ao menos interpret-los de forma
acurada.
Rodrik, Subramanian & Trebbi (2004) mostram que mesmo a correta
identificao dos determinantes da riqueza das naes no garante guias seguros para aspolticas pblicas, e a dificuldade maior quando se trata de explicar como alcanar as boas
regras ou boas instituies:
For example, finding that the rule of law' is causally implicated indevelopment does not mean that we actually know how to increase it underthe specific conditions of individual countries (p. 136). [Anotherexample:] our findings indicate that when investors believe their propertyrights are protected, the economy ends up richer. But nothing is impliedabout the actual form that property rights should take. We cannot evennecessarily deduce that enacting a private property-rights regime would
produce superior results compared to alternative forms of property rights (p.157).
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Eles enfatizam que os resultados no servem como guia para polticas pblicas; assim, a
pergunta de quais so as instituies efetivamente mais significativas para o desenvolvimento
econmico e como adapt-las s especificidades de cada pas, permanece no respondida
(ARNER, 2007, p. 19).
2.3 Obstculos mais comuns para o bom funcionamento das cortes
Feitas as breves consideraes sobre as dificuldades de se realizar estudos sobre
os impactos das instituies, no geral, e das cortes judiciais, no particular, vamos partir agorapara uma anlise do objeto em questo.
Pode-se observar, pelos argumentos apresentados acima, que existem poucas
dvidas com relao importncia do bom funciona