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7 - OS MAMÍFEROS AQUÁTICOS
Com o tombamento da ilha do Medo, em 1991, o Lab. de Nectologia da
UFBA, passou a estudar os mamíferos aquáticos que ocorriam na área de
influência da Unidade de Conservação, inclusive com o objetivo de gerar
conhecimentos para elaboração do plano de manejo.
A ilha do Medo está em uma posição estratégica, pois está situada nas
proximidades da foz do rio Paraguaçu.
O marco regulatório das pesquisas está publicado nos ANAIS DO I
ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM ÁREAS DE
MANGUEZAIS, realizado na cidade de Maragojipe, em 1993. Trata-se da
publicação: “Avistagem de botos, Sotalia fluviatilis, Gervais, 1853,
(CETACEA, DELPHINIDAE) na área de influência do rio Paraguaçu, baía de
Todos os Santos, Bahia, Brasil”, de autoria de Maria do Socorro Santos Reis
e do Prof. Everaldo Queiroz.
Sotalia guianensis – O boto da BTS. As águas da baía de Todos os Santos são consideradas como santuário para os mamíferos aquáticos, por DECRETO PRESIDENCIAL. Molestar, caçar, perseguir ou destruir os locais de ocorrência desse animais é crime previsto por lei. Os botos procuram abrigo, alimentação. Sendo uma área para procriação, também serve para aprendizado os indivíduos juvenis. A foz do rio Paraguaçu é considerada como site fidelity.
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A pesquisa aponta a importância da área para a espécie. A partir daí o
cetáceo odontoceto, da família Delphinidae passou a ser denominado – o
boto da baía de Todos os Santos, ou o boto da BTS.
Ao longo dos anos noventa, século XX, as pesquisa foram
incrementadas, inclusive com a identificação de outras espécies de cetáceos
que ocorrem no entorno da ilha do Medo, seguindo-se pelo canal de Itaparica
e curso do baixo Paraguaçu, incluindo as baleias. Destacamos: Megaptera
novaeangliae – a baleia jubarte, Balaenoptera edeni – a baleia de Bryde e
Steno bredanensis - golfinho de dentes rugosos.
A bióloga Msc Maria do Socorro Santos Reis, do Instituto Mamíferos
Aquáticos – IMA, ex-Projeto MAMA, professora universitária, destacada
pesquisadora na área dos mamíferos aquáticos, com outros colaboradores
continuou com suas pesquisas na região, inclusive com a instalação de uma
base de observações e educação ambiental, na localidade de Barra do
Paraguaçu. Foram elaboradas diversas cartilhas educativas e diversos
trabalhos foram publicados no Brasil e no exterior, sempre apontado a área
como importante para o ciclo de vida das espécies, especificamente, Sotalia
guianensis, que anteriormente, até o início do século XXI era classificado
pelos pesquisadores como Sotalia fluviatilis.
Incluímos nessa lista de colaboradores estudiosos de S. guianensis, o
biólogo Luciano Wagner Reis, pertencente ao mesmo Projeto MAMA,
sediado na Barra do Paraguaçu, no distrito de Maragojipe.
O trabalho da sua autoria: Observações comportamentais sobre o boto
Sotalia fluviatilis (Cetácea, Delphinidae) na baía de Todos os Santos,
descrevendo em etograma diversos comportamentos da espécie nas águas
da BTS, foi apresentado por ele e Maria do Socorro Reis, durante o 5º
Congresso Nordestino de Ecologia, realizado em Natal /RN, em 1993.
Nesse evento os autores destacam a degradação dos ecossistemas da BTS,
que:
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“(...) vem sendo profundamente descaracterizado (...) problema esse que vem destruindo indiscriminadamente o alimento dos botos e afetando diretamente o seu sistema de ecolocação, diminuindo assim a área de utilização da baía pelo botos.”.
O Laboratório de Nectologia também contribuiu para o conhecimento
de diversos aspectos da biologia de S. guanensis: reprodução, alimentação,
dinâmica populacional, comportamento, dentição e anatomia, com
informações amplamente utilizadas por pesquisadores do Brasil e do
exterior. Um desses trabalhos merece destaque – a região como site fidelity
para a espécie.
O acadêmico do curso de Ciências Biológicas da UFBA, André
Figueiredo, em 1996, nos ANAIS DOS TRABALHOS TÉCNICOS-
CIENTÍFICOS – I CONGRESSO BAIANO DE MEIO AMBIENTE , resultado
de suas pesquisas sobre S. guianensis, publicou um trabalho onde propõe a
criação de uma área de proteção para espécie, incluindo a foz do rio
Paraguaçu na baía de Todos os Santos, reconhecendo a região na condição
de site fidelity para espécie – “Proposta de áreas de restrição à navegação e
pesca na baía de Todos os Santos, pela presença de Sotalia fluviatilis
GERVAIS, 1853 (Cetácea, Delphinidae)”.
As áreas sugeridas foram, in verbis:
“(...) Sendo assim, e baseado nos dados coletados, estamos propondo que duas áreas sejam consideradas como áreas de navegação restrita e de pesca proibida, por entendermos serem áreas onde Sotalia fluviatilis tem uma parte importante de seu ciclo de vida, que ainda não conseguimos definir. São estas áreas: entre os paralelos 12º 50’ S e 12º 53 S e os meridianos 38º 36’ W e 38º 41’ W, e a partir do meridiano 38º 46’ W, na entrada do rio Paraguaçu, bem como no interior deste, em direção ao lagamar do Iguape, onde, em ambos dos casos, foram feitas cerca de 73% de nossas observações, caracterizando a áreas de concentração da espécie. Nestas áreas,
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deve-se, inclusive ter um controle efetivo sobre as artes de pesca empregadas”.
A consagração da área na condição de site fidelity, corroborando com o
trabalho acima, ocorreu durante a 8ª Reunião de Trabalho de
Especialistas em Mamíferos Aquáticos da América do Sul / 2º
Congresso da Sociedade Latinoamericana de Especiali stas em
Mamíferos Aquáticos – SOLAMAC, em Olinda – PE, em 1998, com
pesquisadores do Lab. de Nectologia / UFBA.
Diversos pesquisadores, ao longo do litoral brasileiro, preocupados
com as poucas informações sobre S. guianensis, tem publicado diversos
trabalhos, inclusive demonstrando outras áreas no mesmo status de site
fidelity.
A Revista Brasileira de Zoologia (Rev. Bras. Zool. vol. 25 no.2),
publicada em Curitiba, em junho de 2008, trás o conceito de site fidelity para
o boto cinza, que ocorre no litoral do Rio de Janeiro. O título é: Site fidelity of
Sotalia guianensis (Cetacea: Delphinidae) in Sepetiba Bay, Rio de Janeiro,
Brazil. Os autores estudaram a região, durante oito anos. Os dados servirão
para produção de um plano de manejo e conservação da espécie na área.
No estado da Bahia, S. guanensis foi estudada, por quatro anos, no
estuário do rio Caravelas, extremo sul do estado, quando, também, chegou-
se a conclusão que a região funciona com uma site fidelity para esse
mamífero aquático.
Podemos, grosseiramente, definir como site fidelity, um conceito
biológico, como uma área onde uma determinada espécie está distribuída
mais freqüentemente, pois ali, pode encontrar abrigo, alimento disponível e
ser uma região adequada para algumas fases do seu ciclo reprodutivo. Para
os mamíferos aquáticos podem representar uma área para ensinamentos
dos juvenis pelos adultos.
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Através de fotoidentificação, durante dois anos, pesquisadores de
Santa Catarina definiram uma parte do litoral daquele estado, estuário de
Laguna e em Tramandaí – RS, como site fidelity para o golfinho-nariz-de-
garrafa – Tursiops truncatus (Montagu).
Essa é uma prática que tem se tornado comum, a partir do momento
que as pesquisas vão aprofundando-se ao longo do litoral brasileiro. Uma
contribuição para que esses animais saiam da condição de espécie
insuficientemente conhecida.
Essas definições são preocupações legítimas, que visam proteger uma
espécie, que até serve de atrativo, da extinção.
Oceanógrafos e biólogos do Rio de Janeiro, estudiosos em mamíferos
aquáticos, no início desse ano, sistematizaram as pesquisas sobre S.
guianensis, no trabalho: “ Comportamento do boto-cinza (Sotalia
guianensis) (Cetácea: Delphinidae): amostragens, termos e definições”.
Concluem os autores, baseados em publicações do IBAMA (Mamíferos
aquáticos do Brasil: plano de ação) , que:
“(...) O boto-cinza é um objeto de estudo difícil, especialmente em pesquisas de comportamento animal. Apesar disto, o conhecimento do comportamento de S. guianensis tem aumentado recentemente devido ao número de pesquisas que vem sendo realizadas. Contudo, é necessário que mais estudos sejam conduzidos para descrever um repertório mais detalhado do comportamento da espécie”.
Nós, os baianos, pelo contrário, queremos destruir a principal área de
ocorrência dos botos da BTS. Não só de botos, mas de outras espécies de
mamíferos aquáticos.
A presença do golfinho-de-dentes rugosos - Steno bredanenesis
(Lesson, 1828) na BTS, em águas costeiras com influência do rio Paraguaçu,
está registrada naquela mesma reunião científica, em que outros trabalhos
sobre o boto da BTS (S. guainensis), foram apresentados.
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A socialização dessas informações, para que não haja reclamações
que os conhecimentos gerados nas academias ficam retidos nos gabinetes
de seus professores, tem sido, sistematicamente feita, pelo Lab. de
Nectologia da UFBA, através do GECET – Grupo de Estudo de Cetáceos,
bem como, pelo Projeto MAMA e o IMA, em diversas reportagens na
imprensa televisiva e impressa, que alertaram para a necessidade de
preservação da BTS, como uma área importante no ciclo de vida dos
mamíferos aquáticos.
Os trabalhos com S, guianensis continuam a demonstrar a importância
da área em debate para a espécie.
Na última reunião científica sobre mamíferos aquáticos: V ENCONTRO
NACIONAL SOBRE CONSERVAÇÃO E PESQUISA DE MAMÍFEROS
AQUÁTICOS NO BRASIL, realizada em São Vicente – SP, em 2008 e que
teve como tema central das discussões: Os mamíferos aquáticos e a
conservação dos ambientes eatuarinos, foi apresentado o seguinte
resumo que trata sobre S. guianensis: Uso da área pelo boto-cinza
Sotalia guianensis no estuário do rio Paraguaçu – Bahia, de autoria de
Alexandre Schiavetti, do Programa de Pós-Graduação em Zoologia,
Universidade Estadual de Santa Cruz – Ilhéus, e outros colaboradores. Entre
outras conclusões os pesquisadores afirmam:
(...) A fidelidade ao estuário do rio Paraguaçu pode ter ocorrido pelo fato do local apresentar condições ideais para a espécie, com benefícios que excedem os custos, que pode refletir no pequeno tamanho das áreas de vida. Áreas com latas densidades de presas podem fazer com que os animais não utilizem grandes áreas para alimentação, resultando em alta fidelidade de área.”
Ou seja, um dos motivos que os botos estão ali é a presença de
alimento farto.
A confirmação da área como site fidelity.
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Entre outros mamíferos aquáticos, citados para BTS, podemos listar os
Mysticetos. Sua importância histórica já foi referida em outra secção.
A baleia de bryde (Balaenoptera edeni Anderson, 1878) passou a ser
registrada para o litoral brasileiro, no início dos anos oitenta, século passado,
no litoral paranaense e no litoral paulista. Porém, já havia sido descrita para
o Brasil, na década de sessenta, no periódico Sci. Rep. Whal. Res. Inst.,
Tokio, possivelmente, resultante de observações de caçadores de baleias.
Devido ao declínio das populações da espécie, em 1986, em virtude da caça,
a Comissão Internacional das Baleias determinou a moratória da caça
comercial dessas baleias. É considerada uma espécie insuficientemente
conhecida.
Balaenoptera edeni Anderson, 1878, é uma espécie de hábitos
costeiros e dos ambientes tropicais. Alimentam-se de pequenos crustáceos e
pequenos peixes. (Informações retiradas do guia: BALLENAS, DELFINES Y
MARSOPAS DEL PACIFICO NORORIENTAL Y DE AGUAS ARTICA S
ADYACENTES – Uma guia para sua identificación. Informe especial nº 6,
publicado pela Comision Interamericana Del atun tropical, por diversos
autores, em 1988).
A baleia de bryde foi descrita para o litoral baiano, pela primeira vez,
pelos integrantes do GECET, em águas do rio Paraguaçu, na localidade de
Nagé, distrito de Maragojipe, em 1995, XIV Seminário Estudantil de
Pesquisa – Primeiro Registro de Baleanoptera edeni iAnderson, 1878, baía
de Todos os Santos – litoral da Bahia, promovido pela UFBA e, em 1996 e
durante o XXI Congresso Brasileiro de Zoologia, promovido pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, evento realizado em Porto
Alegre – “Sobre a ocorrência de Balaenoptera edeni Anderson,1878
(Balaenopteridae), baía de Todos os Santos, litoral da Bahia”.
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Baleia de Bryde. Espécie insuficientemente conhecida. Um espécime foi encontrado na região de Maragojipe. Sabe-se que a prática do whalewatching é uma forma de gerar recursos para comunidades costeiras, sem prejuízos dos animais. Imagens da internet.
O animal foi encontrado morto
por pescadores, estava prenha e um
volume expressivo de peixes,
vulgarmente conhecidos como
pititingas, foi identificado em seu
conteúdo estomacal. Os autores
discutem a possibilidade da espécie ter
acompanhado os cardumes de peixes,
em busca de alimentação e devido a
topografia de fundo, como aqui já foi
descrito, atingido o lagamar do Iguape.
O problema é que, mais uma
vez, não temos dados pretéritos para
confirmar o que a BTS representa para
a baleia de Bryde. Sabemos da
importância da BTS para baleias
jubartes e outros cetáceos citados. A
presença de um animal em águas tão
interiores, pode ser fruto de um “movimento errático”. Porém, o que devemos
fazer é conservar o presente para que possamos entendê-lo no futuro, tendo
como chave os elementos do passado.
Um exemplo clássico sobre essa questão envolve a baleia franca.
Antes a sua distribuição geográfica estava limitada às águas sub-tropicais,
mas por uma descrição contida no livro do Contra Almirante Antônio Alves
Câmara, em 1919, a partir da tradição oral e com dados coletados pelo
Projeto Baleia Jubarte, admite-se a existência da baleia franca baiana .
(Livro: PESCA E PEIXES DA BAHIA).
Por isso, esses animais continuam listados na condição de dados
insuficientes.
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Em um dos livros publicados pelas Edições IBAMA , em 2001, sobre
Mamíferos Aquáticos do Brasil – Plano de ação ( Versão II), que trata da
Relação das Espécies Registradas em Águas Jurisdicionais Brasileiras e
Respectivos Graus de Ameaça, que tiramos as próximas informações.
1 - Sotalia fluviatilis / S. guainensis
Classificação IUCN: DD (2000)
CITES (*): Apêndice I
Classificação PA II: DD (Dados insuficientes – data deficient).
Um animal é incluso nessa categoria quando não existem informações
adequadas para fazer-se uma avaliação. A classificação DD não
significa uma categoria de ameaça, ou de ausência de ameaça, mas
apenas a constatação de que os dados conhecidos não permitem uma
avaliação; corresponde à classificação Indeterminado (I), (no critério
adotado pela IUCN antes de 1994).
(*) CITES: Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e da Fauna Selvagens
em Perigo de Extinção
Principais ameaças : destruição de habitats, poluição por efluentes
industriais, agrotóxicos, construções de barragens, projetos de
irrigação, desmatamentos das matas ciliares, destruição de lagos e
rios; aumento do tráfego de embarcações; urbanização das regiões
costeiras; exploração de áreas de manguezais e estuários; capturas
acidentais; pesca com bombas; molestamentos intencionais e turismo
desordenado
2 - Megaptera novaeangliae
(VU) – Vulnerável. Alto risco de extinção na natureza, a médio prazo.
Classificação IUCN: VU 2000
CITES: Apêndice I
Classificação PA II: VU
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Consta da Lista Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de
Extinção.
Principais ameaças : turismo, trafego de grandes navios e de lanchas
rápidas e indústria petrolífera
No filme promocional do empreendimento – Pólo Naval, eles
reconhecem que a BTS é importante pata as baleias jubartes.
3 – Balaenoptera edeni
(DD) – Dados insuficientes.
4 – Steno bredanensis
(DD) – Dados insuficientes
No mesmo documento encontramos as seguintes propostas para
projetos e ações prioritárias:
1. Estudos sobre a dinâmica populacional e história natural para fornecer subsídios essenciais para conservação e ma nejo;
2. Identificação e quantificação da degradação de h abitat e seus efeitos sobre os mamíferos aquáticos (formas de pol uição, instalações portuárias, tráfego hidroviário, repres as, assoreamentos, destruição de manguezais, etc.)
3. Estudos comportamentais, sobre baleia jubarte, e specialmente acasalamento e relacionamento das fêmeas com baleot es.
4. Estimativas de abundância populacional, de Sotalia fluviatilis, preferencialmente obtidas em áreas representativas dos diferentes habitats utilizados pela espécie;
5. Caracterização dos habitats preferidos por S . fluviatilis e dos movimentos diários e sazonais para definição de áre as mínimas para conservação da espécie.
6. Estudos para determinação dos níveis de poluente s, em Sotalia fluviatilis, (metais pesados, organoclorados e compostos organoestânicos) para populações em regiões de maio r impacto antrópico.
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Baleia jubarte – Implacavelmente perseguida na BTS. Com a extinção da caça às baleias, voltaram a frequentar nosso litoral. Com o Pólo Naval renascem as ameaças sobre a espécie. Imagens do Projeto Baleia Jubarte, patrocinado pela PETROBRÁS.
A verdade é que muitas ações
antrópicas que são levadas a cabo,
envolvendo prejuízos para os
mamíferos aquáticos aqui citados,
estão associadas ao molestamento
desses animais.
Recomendações encontradas no
documento : Áreas prioritárias para a
conservação, utilização sustentável
e repartição de benefícios da
biodiversidade brasileira:
“(...) • Estudar e adotar procedimentos que visem à redução da mortalidade durante atividades de pesca em relação a Pontoporia, Sotalia, Eubalaena e Megaptera; • Dar continuidade aos estudos de Eubalaena e Megaptera visando prioritariamente a determinar os tamanhos das populações que ocorrem em águas brasileiras e suas tendências; • Pesquisar as intensidades das pressões antrópicas, em especial a interação com atividades pesqueiras e os efeitos da degradação dos habitats, sobre as populações de Sotalia e implantar medidas que permitam
minorá-las; • Dar atenção especial aos mamíferos marinhos, com ênfase em Trichechus manatus, na criação e no estabelecimento de Unidades de Conservação; • Manter atualizado, mediante revisões periódicas, e divulgar o Plano de Ação para Mamíferos Aquáticos no Brasil (IBAMA).
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Golfinho-dos-dentes rugosos - Espécie identificada nas águas adjacentes a foz do rio Paraguaçu. As águas jurisdicionais brasileiras são consideradas santuário para os mamíferos aquáticos. Imagem da internet.
6.1 - As águas jurisdicionais e
o ambiente costeiro
Outro ponto que merece
destaque, tem lastro na Constituição
Federal e na Constituição do Estado da
Bahia. Ambos tratam de nosso
ambiente costeiro e das águas
jurisdicionais brasileira.
Tratando-se de mar, é imperioso
resgatar o Decreto nº 5.377, de
23.02.2005, que aprova a Política
Nacional para os Recursos do Mar –
PNRM.
“(..) A PNRM tem por finalidade orientar o desenvolvimento das atividades que visem à efetiva utilização, exploração e aproveitamento dos recursos vivos, minerais e energéticos do Mar Territorial, da Zona Econômica Exclusiva e da Plataforma Continental, de acordo com os interesses nacionais, de forma racional e sustentável para o desenvolvimento socioeconômico do País, gerando emprego e renda e contribuindo para a inserção social.”
A PNRM trata dos Recursos do Mar, definindo-os dessa forma:
“(...) Recursos do mar são todos os recursos vivos e não-vivos existentes nas águas sobrejacentes ao leito do mar, no leito do mar e seu subsolo, bem como nas áreas costeiras adjacentes, cujo aproveitamento sustentável é relevante sob os pontos de vista econômico, social e ecológico.
Os recursos vivos do mar são os recursos pesqueiros e a diversidade biológica, incluindo os recursos genéticos ou qualquer outro componente da biota marinha de utilidade biotecnológica ou de valor para a humanidade.”
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Além de abrangente, tratando dos recursos vivos e não vivos, a PNRM,
quando trata da exploração e o aproveitamento sustentável dos recursos
marinhos, inclui ações conservacionistas, que podem ser consideradas e
ponta e que coloca o país em destaque nas ações antrópicas no ambiente
marinho. Destacamos quatro itens:
“(...) - promover a gestão integrada dos ambientes costeiro e oceânico, visando ao uso sustentável dos recursos do mar, e a proteção dos ecossistemas, da biodiversidade e do patrimônio genético, cultural e histórico das áreas marinhas sob jurisdição nacional;
- sugerir a atualização da legislação brasileira visando a sua aplicação em todos os aspectos concernentes aos recursos do mar, à gestão integrada das zonas costeiras e oceânicas e aos interesses marítimos nacionais;
- sugerir a fixação, com base nos melhores dados científicos disponíveis, de normas, critérios e padrões de uso para os recursos vivos do mar, com ênfase para as espécies sobreexplotadas ou ameaçadas de sobreexplotação;
- fomentar projetos e atividades que visem a assegurar, de forma sustentável, o aumento da disponibilidade dos recursos pesqueiros, provenientes da maricultura e da pesca, em águas jurisdicionais brasileiras;
- promover a elaboração de planos, programas e ações para orientar e estimular o desenvolvimento de atividades turísticas vinculadas ao mar e à zona costeira”.
É muito mais avançado em outros itens. Por outro lado, busca a
sustentabilidade com a inclusão da dimensão social, econômica e cultural
Senão vejamos, in verbis:
“(..) - incorporar os princípios da sustentabilidade, sob o ponto de vista social, econômico, ambiental e cultural, em todos os programas, projetos e iniciativas para pesquisa, avaliação, exploração e aproveitamento dos recursos do mar;
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- implementar programas e ações para a proteção do ambiente marinho e dos recursos do mar frente às atividades baseadas em terra”.
Por fim, promove a proteção a biodiversidade, quando trata de seus
princípios básicos:
“(...) - a proteção da biodiversidade e do patrimônio genético existente nas áreas marinhas sob jurisdição nacional e zona costeira adjacente.”
A CF no art. 20, item IV, trata o mar territorial na condição de um bem
da união.
A definição de mar territorial advém de conceitos relativos ao Direito
Internacional Público, inclui conceitos de: território, mar territorial e espaço.
Nesses termos o conceito de mar territorial pode ter como sinônimo:
domínio marítimo, águas territoriais, mar litoral, mar adjacente, águas
nacionais, litoral flutuante, águas jurisdicionais e faixa litorânea. O
nosso mar territorial não se extende por mais de 12 milhas, mas temos a
nossa ZEE – Zona Econômica Exclusiva.
O importante nessa citação e incursão superficial sobre conceitos
jurídicos é que, o Decreto nº 6.698, de 17.12.2008, considera que as águas
jurisdicionais marinhas brasileiras são Santuário d e Baleias e Golfinhos
do Brasil, com base no art. 84, inciso IV, da CF, em acordo com a
Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, que foi aprovada pelo
Decreto Legislativo nº 5, de 9 de novembro de 1987, e promulgada pelo
Decreto nº 1.530, de 22 de junho de 1995, art. 56 e 65 da Convenção e Lei
nº 7.643, de 18.12.1987.
Alguns artigos contidos no referido Decreto:
“(...) Art. 1º As águas jurisdicionais marinhas brasileiras são declaradas Santuário de Baleias e Golfinhos do Brasil, com a finalidade de reafirmar o interesse nacional no campo da preservação e proteção de cetáceos e promover o uso não-letal das suas espécies.
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Art. 2º Estão permitidos a pesquisa científica e o aproveitamento turístico ordenado, nos termos da legislação em vigor.
Art. 3º A União promoverá, por meio dos canais diplomáticos e de cooperação competentes, a atuação do País nos foros internacionais, a articulação regional e internacional necessária a promover a integração em pesquisa e outros usos não-letais dos cetáceos no Santuário de Baleias e Golfinhos do Brasil, bem como buscará a conservação dessas espécies no âmbito da bacia oceânica do Atlântico Sul.”
Ou seja, se os mamíferos aquáticos já estavam protegidos por um
corolário de leis, agora, as águas onde eles ocorrem são o seu santuário.
As normas para evitar o molestamento de mamíferos aquáticos estão
dispostas na Portaria 117, de 26.12.1996, que reformula a Portaria nº 2306,
de 22.11.90. Regulamenta aproximação de embarcações em relação a
grupos de mamíferos aquáticos.
A Lei dos Crimes Ambientais nº 9.605, trata na Seção I - Dos crimes
contra a Fauna , alguns tópicos que incluem os mamíferos aquáticos e
Unidades de Conservação. Vale lembrar que estamos na APA BTS, na zona
de influência da Estação Ecológica da Ilha do Medo e na RESEX do Iguape:
“(...) Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1 . Incorre nas mesmas penas:
I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;
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(...) 3°. são espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes as espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras. § 4 . A pena e aumentada de metade, se o crime e praticado: I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração;
(...) V - em unidade de conservação;
VI - com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa.
Art. 40. Causar dano direto ou indireto as Unidades de conservação e as áreas de que trata o art. 27 do Decreto n 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 1 . Entende-se por Unidades de conservação as Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, estações ecológicas, Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais, áreas de proteção Ambiental, áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas ou outras a serem criadas pelo Poder Publico.
§ 2 . A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de conservação será considerada circunstancia agravante para a fixação da pena.
A Constituição do Estado da Bahia, promulgada em 1989, em seu art.
212, incisos VII, XII e XIII, trata das espécies ameaçadas de extinção e
agressões ao meio ambiente:
“(...) VII – proteger a fauna e a flora, em especial as espécies ameaçadas de extinção, fiscalizando a extração, captura, produção, transporte, comercialização e consumo de seus espécimes e sub-produtos, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem sua extinção ou submetam os animais à crueldade”.
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(...) XII – promover medidas judiciais e administrativas, responsabilizando os causadores de poluição ou de degradação ambiental, podendo punir ou interditar temporária ou definitivamente a instituição causadora de danos ao meio ambiente;
XIII – estabelecer, na forma da lei, a tributação das atividades que utilizem recursos ambientais e que impliquem potencial ou efetiva degradação ambiental.
O art. 215, por sua vez, trata das áreas de preservação permanente,
incluindo os manguezais, matas ciliares, as áreas de proteção da s
nascentes e margens dos rios, as restingas, compree ndendo o espaço
necessário à sua preservação, as áreas que abriguem exemplares raros
da fauna, da flora e de espécies ameaçadas de extin ção, bem como
aquelas que sirvam como local de pouso ou reproduçã o de espécies
migratórias e as áreas estuarinas ( Incisos I, II, IV, V, VI, VII e VIII).
Adiante, o art. 216, trata dos patrimônios estaduais. O que dispõe a
Constituição Estadual:
“(...) Art. 216 – Constituem patrimônio estadual e a sua utilização far-se-á na forma da lei, dentro de condições que assegurem o manejo adequado do meio ambiente, inclusive quanto ao uso de seus recursos naturais, históricos e culturais:
(...) IV – a Mata Atlântica, a Chapada Diamantina e o Raso da Catarina;
V – a Zona Costeira, em especial a orla marítima das áreas urbanas, incluindo a faixa Jardim de Alá/Mangue Seco, as Lagoas e Dunas do Abaeté, a baía de Todos os Santos, o Morro de São Paulo, a baía de Camamu e os Abrolhos.”
(...) os vales dos rios Paraguaçu e das Contas.”
A proteção ao ambiente não pára por aí. Há quem afirme que as ações
que estão sendo propostas para APA BTS, podem ser instaladas, pois a UC,
não possui PLANO DE MANEJO (PM). De forma nenhuma! Esse raciocínio é
uma ignomínia! O PM é, apenas, mais um instrumento de gestão e promoção
de uso. O ambiente em si, aqui relativo a manutenção das espécies de
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mamíferos aquáticos, já está protegido por dispositivos maiores, a exemplo
da nossa Constituição Estadual.
A Constituição do Estado da Bahia, veta, sabiamente, em todo território
estadual, as ações que tragam degradação ambiental. Vejamos, in verbis, o
art. 226:
(...) São vedados, no território do Estado:
(...) a localização, em zona urbana, de atividades industriais capazes de produzir danos à saúde pública e ao meio ambiente, devendo aquelas em desacordo com o disposto neste inciso serem estimuladas a transferir-se para áreas apropriadas;
(...) a implantação e construção de indústrias que produzam resíduos poluentes, de qualquer natureza, em todo o litoral do Estado, compreendendo a faixa de terra que vai da preamar até cinco mil metros para o interior”.
Seja qual for a abordagem, os mamíferos aquáticos e a baía de Todos
os Santos e os seus ecossistemas associados estão protegidos por um
regime de leis que impedem, venia concessa, atividades do tipo que está
sendo anunciada – instalação de um Pólo Naval, no curso baixo do rio
Paraguaçu, em área adjacente às Unidades de Conservação.
Além de agressões ao ambiente, a ação prevista é uma afronta aos
dispositivos legais que tratam do tema.
Ou, então, rasgue-se a Constituição Estadual!