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  • UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Cincias do Desporto e de Educao Fsica

    PROJECTO DE FORMAO EM FUTEBOL.

    UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUO DE UM PROCESSO DE FORMAO DE QUALIDADE.

    Estudo realizado no Departamento de Formao do

    Clube Desportivo Trofense.

    Hlder Manuel Teixeira Lemos

    Dezembro de 2005

  • PROJECTO DE FORMAO EM FUTEBOL.

    UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUO DE UM PROCESSO DE FORMAO DE QUALIDADE.

    Estudo realizado no Departamento de Formao do

    Clube Desportivo Trofense.

    UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Cincias do Desporto e de Educao Fsica

    Hlder Manuel Teixeira Lemos

    Dezembro de 2005

    Trabalho monogrfico realizado no mbito da disciplina de Seminrio Opo de Futebol do 5 ano da Licenciatura em Desporto e Educao Fsica, sob a orientao do Mestre Jos Guilherme Oliveira.

  • No gosto do futebol dos estdios vazios, desconfortveis e inseguros.

    No gosto do futebol das ameaas e das chantagens. No gosto dos

    dirigentes que tm a mania que mandam no pas. No gosto de ver os

    polticos de ccoras. No gosto de ver leis atropeladas em razo de

    outros valores. No gosto de um futebol sem tica. No gosto do futebol

    impune. No gosto de apelos e assomos violncia. No gosto de ver

    desculpabilizado o doping. No gosto de ver o rbitro como figura central

    do jogo. No gosto de observar esta irritante mania de os jogadores se

    atirarem para o cho. No gosto de ver treinadores sem pedagogia. Enfim,

    no gosto de um futebol em que se pretende ganhar a qualquer preo.

    Rui Santos (2003: 20)

    Treinar to importante como saber o que tenho para fazer.

    Figo (1999: 43)

    Estou convencido de que os jogadores no ganham os trofus de forma

    individual; os trofus ganham as equipas.

    Jos Mourinho (2004b)

    "A formao de um jogador uma histria interminvel.

    Louis van Gaal (1996: 19)

  • Agradecimentos

    III

    AGRADECIMENTOS

    Este trabalho representa o culminar de um conjunto de experincias e

    vivncias onde outras pessoas tornaram-se fundamentais para a realizao do

    mesmo. Assim, aproveito este espao para lhes prestar o meu agradecimento.

    Ao Professor Vtor Frade, pela sua sabedoria e pela forma apaixonada

    como comunica os seus conhecimentos que levaram mudana da minha

    forma de pensar o futebol.

    Ao Professor Jos Guilherme, pelos seus ensinamentos e pela sua

    disponibilidade que permitiram enriquecer os meus conhecimentos e,

    consequentemente, este trabalho.

    Ao Pedro S pela positividade e conhecimentos transmitidos ao longo

    destes ltimos dois anos e meio e, tambm, pela sua ajuda e disponibilidade

    para a participao neste trabalho.

    Ao Eugnio Cunha, pela amizade e pelo exemplo de vida que representa.

    Aos meus amigos e companheiros de faculdade, Tiago Leandro, Jos

    Tavares, Ana Lusa Campos, Bruno Guimares, Daniela Godinho, Bruno

    Nogueira e Vera Diogo, pelo constante apoio e compreenso.

    A todos os jogadores com os quais convivi e que me fizeram crescer como

    pessoa.

  • Resumo

    IV

    RESUMO

    A formao um aspecto fundamental para os clubes de futebol, pois pode

    representar um conjunto de vantagens financeiras, desportivas e sociais.

    Assim, o processo de formao deve ser orientado por objectivos e regras bem

    definidas, tendo por base um modelo de jogo, com o objectivo de formar

    jogadores multifuncionais e tacticamente cultos.

    Deste modo, no presente trabalho, procurou-se focar os aspectos

    supracitados atravs de uma reviso bibliogrfica e a posterior confrontao

    com a informao obtida a partir da entrevista realizada ao Coordenador

    Tcnico do Departamento de Formao do Clube Desportivo Trofense. Assim,

    a informao recolhida e seleccionada visou responder aos seguintes

    objectivos que orientaram este estudo: (1) verificar a importncia da formao

    para o clube; (2) verificar que valores so transmitidos aos jovens jogadores do

    clube; (3) verificar a importncia que os responsveis tcnicos atribuem

    formao integral dos seus jogadores; (4) identificar os aspectos fundamentais

    para se obter um processo de formao de qualidade; (5) identificar as

    principais dificuldades na implementao do projecto de formao; (6)

    identificar as funes do Coordenador Tcnico e a sua importncia para a

    construo do processo de formao; e, (7) verificar que ligao existe entre o

    Departamento de Formao e o Departamento Snior do clube.

    Com base na reviso bibliogrfica e na entrevista realizada possvel

    afirmar: (1) a formao um aspecto fundamental para o clube dado estar a

    promover jogadores para o plantel snior; (2) a implementao de um Projecto

    de Formao importante para se verificar continuidade de processos; (3) o

    processo de formao deve fomentar a cultura tctica e a formao integral dos

    seus jovens jogadores; e, (4) o Coordenador Tcnico assume um papel

    fundamental, sendo o garante da implementao da filosofia do Projecto de

    Formao.

    Palavras-chave: FUTEBOL FORMAO PROJECTO DE FORMAO COORDENADOR TCNICO.

  • ndice

    NDICE

    AGRADECIMENTOS....................................................................... III

    RESUMO......................................................................................... IV

    NDICE..............................................................................................V

    1. INTRODUO............................................................................. 1

    2. REVISO DA LITERATURA........................................................ 4

    2.1. A importncia da formao. A formao como um meio de optimizar financeiramente os recursos humanos .............................4 2.1.1. O futebol como um factor econmico ................................................................. 4 2.1.2. A formao como uma das solues para a viabilidade econmica dos clubes

    de futebol ............................................................................................................ 6

    2.2. A necessidade de construir o processo de formao tendo como primado a organizao de jogo sustentada por uma cultura de exigncia, de vitria e de colectivo ..............................................9 2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor.................................................................................. 10 2.2.2. Esprito ganhador, ambicioso e positivo ........................................................... 12 2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo ................................................. 13

    2.3. Da formao meramente futebolstica preocupao com a formao integral ............................................................................14 2.3.1. A importncia da formao escolar e acadmica ............................................. 15 2.3.2. A relao Sistema Desportivo/Sistema Educativo............................................ 18

    2.4. A procura de identidade atravs da implementao de uma filosofia de clube e de um modelo de formao .............................20 2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como referencial fundamental

    do Departamento de Formao ........................................................................ 21 2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais .................................. 23 2.4.3. Corpo tcnico deve estar identificado com o modelo de jogo .......................... 25 2.4.4. Dificuldades na implementao do modelo de clube........................................ 27 2.4.5. Ajax: a escola de formao de referncia......................................................... 28

    V

  • ndice

    2.5. Coordenador Tcnico como regulador e dinamizador de todo o processo de Formao ...................................................................31 2.5.1. Funes do Coordenador Tcnico.................................................................... 31

    3. MATERIAL E MTODOS........................................................... 36

    3.1. Caracterizao da amostra......................................................36

    3.2. Metodologia de investigao ...................................................36

    3.3. Recolha de dados....................................................................36

    4. APRESENTAO E ANLISE DA ENTREVISTA .................... 37

    4.1. A importncia financeira, desportiva e social da formao para o Clube Desportivo Trofense ..........................................................37 4.1.1. Vantagens da integrao de jovens jogadores formados no Departamento de

    Formao no plantel snior do clube................................................................ 38

    4.2. Projecto de formao: a continuidade como princpio fundamental ....................................................................................40 4.2.1. A filosofia de clube como ideal de difcil concretizao .................................... 41 4.2.2. O Projecto de Formao como soluo de continuidade ................................. 42 4.2.3. Identidade ao nvel de treino e de jogo ao longo do processo de formao .... 43 4.2.4. Formar jogadores de qualidade ........................................................................ 45 4.2.5. Treinadores identificados com o Projecto de Formao................................... 50 4.2.6. Principais dificuldades encontradas na implementao do Projecto de

    Formao.......................................................................................................... 53

    4.3. Coordenador Tcnico como o garante do Projecto de Formao........................................................................................54 4.3.1. Funes do Coordenador Tcnico do Clube Desportivo Trofense................... 54

    5. CONCLUSES.......................................................................... 57

    6. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS........................................... 60

    7. ANEXO....................................................................................... 66

    VI

  • Introduo

    1. INTRODUO

    A formao de jovens jogadores por parte dos clubes de futebol pode

    representar um aspecto decisivo para o sucesso dos mesmos quer no plano

    desportivo, quer no plano financeiro.

    A integrao de jovens jogadores nos planteis seniores dos respectivos

    clubes onde realizaram a sua formao leva a uma poupana ao nvel

    financeiro. Pois, se o clube forma os seus prprios jogadores, acaba por no

    precisar de contratar jogadores a outros clubes, sendo que, na maioria dos

    casos, os jovens jogadores auferem ordenados muito inferiores a um jogador

    contratado. Por outro lado, os jovens jogadores j conhecem o clube onde

    trabalham, evitando a necessidade de perodos de adaptao nova realidade

    que um jogador contratado teria de se confrontar. Como refere Adriaanse

    (1993: VII), no Ajax nunca contratamos jogadores feitos: so mais caros e

    trazem vcios difceis de emendar, pelo menos para jogarmos da forma que ns

    queremos.

    Parece-nos urgente o investimento forte na formao de jovens jogadores

    de futebol, pois, como afirma Vale (2003b: XX), a formao um aspecto

    rentvel. Penso que esta a via para os clubes portugueses.

    Contudo, a formao no pode ser uma formao qualquer, sendo

    primordial que esse processo esteja direccionado para a excelncia. Isto

    porque a integrao desses jovens jogadores no planteis snior dos clubes

    est altamente dependente da qualidade dos prprios jogadores. Ou seja, o

    processo de formao tem de ser bem orientado e com objectivos bem

    definidos.

    A criao de Projectos de Formao , desta forma, eminentemente

    importante para o estabelecimento de uma cultura desportiva, com princpios e

    regras coerentes e bem definidas, que tenha por base um modelo de jogo que,

    por sua vez, orientar a concepo de um modelo de treino, de um complexo

    de exerccios, de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador

    (Leal & Quinta, 2001: 27).

    1

  • Introduo

    Na perseguio desse objectivo, a partir da poca desportiva 2002-2003

    gerou-se no Clube Desportivo Trofense um contexto favorvel ao

    desenvolvimento de um Projecto de Formao.

    A filosofia adoptada no Departamento de Formao do Clube Desportivo

    Trofense com a implementao deste novo projecto consiste numa atitude

    competitiva constante baseada no rigor e no esforo individual para um elevado

    rendimento colectivo. Procura-se, assim, implementar uma forma de estar que

    conduza aquisio e desenvolvimento de comportamentos de excelncia

    futebolstica nos jovens jogadores, contribuindo, igualmente, para a formao

    integral dos jovens nos seus mais elevados valores morais, cvicos e de

    urbanidade, bem como, no desenvolvimento das suas capacidades cognitivas

    (Departamento de Formao do Clube Desportivo Trofense, 2002: 6).

    Actualmente, podemos encontrar no Departamento de Formao do Clube

    Desportivo Trofense: um modelo de jogo e uma metodologia de treino comuns

    a todos os escales; um grupo de treinadores identificado com a filosofia do

    projecto; um documento orientador do processo; a integrao de jovens

    jogadores na equipa snior do clube formados neste Departamento de

    Formao; e, a existncia de um Coordenador Tcnico que regula e

    supervisiona todo o processo de formao.

    Este estudo surge como uma oportunidade para compreender mais

    aprofundadamente esta realidade. Desta forma estabelecemos como objectivos

    para o estudo:

    i. Verificar a importncia da formao para o clube;

    ii. Verificar que valores so transmitidos aos jovens jogadores do clube;

    iii. Verificar a importncia que os responsveis tcnicos atribuem

    formao integral dos seus jogadores;

    iv. Identificar os aspectos fundamentais para se obter um processo de

    formao de qualidade;

    v. Identificar as principais dificuldades na implementao do projecto de

    formao;

    vi. Identificar as funes do Coordenador Tcnico e a sua importncia

    para a construo do processo de formao;

    2

  • Introduo

    vii. Verificar que ligao existe entre o Departamento de Formao e o

    Departamento Snior do clube.

    O presente estudo monogrfico ser estruturado em sete pontos.

    O primeiro, Introduo, tem como objectivo apresentar o estudo, os seus

    objectivos e a sua estrutura.

    No segundo ponto, pretendemos apresentar o levantamento bibliogrfico

    sobre temticas relacionadas com a formao de jovens jogadores de futebol.

    No terceiro ponto, apresentaremos a caracterizao da amostra, a

    metodologia de investigao e, por fim, a recolha de dados.

    No quarto ponto, anlise e discusso dos resultados, estabeleceremos uma

    relao entre a literatura e a opinio do entrevistado.

    No quinto ponto, sero apresentadas as concluses do estudo.

    No sexto ponto, sero indexadas todas as referncias bibliogrficas

    mencionadas no texto dos pontos anteriores.

    No stimo ponto, ser anexada a entrevista efectuada.

    3

  • Reviso da Literatura

    2. REVISO DA LITERATURA

    2.1. A IMPORTNCIA DA FORMAO. A FORMAO COMO UM MEIO DE OPTIMIZAR FINANCEIRAMENTE OS RECURSOS HUMANOS

    O mundo do futebol move-se ao redor de duas rbitas distintas, uma que desportiva e outra que a comercial. Ou

    seja, por um lado um jogo, por outro um negcio.

    Valdano (2002: 16)

    O futebol , na verdade, um jogo, mas tambm um espectculo. Devemos isso ao pblico. E tambm um negcio,

    no podemos perder o nosso valor.

    Robson (2003: 44)

    O Benfica dever ter sempre jovens talentos na sua escola de jogadores uma vez que eles so o futuro.

    Camacho (in Alves, 2004: 84)

    No gosto de um plantel extenso e quero apenas contar com 21 jogadores de campo. Se tiver uma equipa mais

    reduzida tambm poderei ter mais ateno para as camadas jovens.

    Mourinho (2004b)

    O fenmeno desportivo e, nomeadamente, o mundo do futebol esto a

    tornar-se num verdadeiro negcio e este ltimo ser cada vez mais uma

    actividade econmica envolvendo verbas enormes (Carraa, 2003a: 82).

    Contudo, como qualquer outro negcio da nossa sociedade, o futebol sofre

    igualmente com os altos e baixos da economia nacional e internacional.

    Segundo Ferreira (1999: 9), Portugal ter sempre um futebol mediano no

    plano financeiro, e um campeonato abaixo dos campeonatos mais ricos. O que

    Portugal pode ter a possibilidade de, atravs do talento dos seus jogadores,

    conseguir que as nossas equipas sejam mais fortes financeiramente, porque

    assim faro uma gesto mais correcta daquilo que investem e daquilo que

    depois rentabilizam desses investimentos.

    Pensamos que ser essencial que os responsveis de clubes, treinadores e

    directores, se mostram sensveis questo da formao e sua importncia

    quer do ponto de vista desportivo, quer do ponto de vista financeiro.

    2.1.1. O futebol como um factor econmico

    No dia 11 de Fevereiro de 2002, surgia no Jornal O Jogo um artigo de Rui

    Oliveira (2001: 12) intitulado O futebol portugus e a indstria do futebol.

    4

  • Reviso da Literatura

    Nesse artigo, o autor apontava alguns dos motivos do fracasso a nvel das

    competies europeias por parte das equipas portuguesas:

    Ao longo dos ltimos anos temos assistido a uma perda de poder de

    competitividade dos clubes de futebol portugueses em relao aos seus

    congnitos dos pases mais desenvolvidos da Europa tendo como causa bvia

    a fragilidade econmica dos nossos clubes em relao aos ltimos. A forma

    abrupta e rpida da industrializao deste fenmeno social acabou por

    fortalecer os clubes mais ricos e, pelo contrrio, obrigou aqueles com menor

    capacidade econmica a verem partir a maioria dos seus talentos, ficando,

    como lgico, mais enfraquecidos em relao aos seus opositores. O futebol

    portugus, do ponto de vista desportivo, acabou por sofrer a eroso normal de

    qualquer indstria que, pelo seu menor poder econmico, no conseguiu

    resistir ao poder dos grandes grupos econmicos que esto por detrs da

    maior parte dos grandes clubes europeus.

    Constantino (2002: 152) confirma a ideia do autor anterior afirmando que a

    livre circulao dos praticantes num mercado aberto introduziu uma dinmica

    em que a lgica dos pases economicamente mais fortes prevalece sobre os

    mais fracos, criando uma situao onde tendencialmente os melhores

    praticantes se concentrem nos mercados com maior poder aquisitivo.

    Assim, com a conjuntura actual os clubes dos campeonatos com maior

    poder econmico acabam por ter os melhores jogadores tornando-se

    superiormente competitivos comparados com campeonatos com menor poder

    econmico como o campeonato portugus.

    Tendo em linha de conta o supracitado, concordamos com Oliveira (2001:

    12) quando este afirma que perante este contexto, consequente da

    globalizao, pensamos que se torna urgente encontrar medidas que permitam

    minorar ou mesmo estagnar o enfraquecimento competitivo a que se tem

    assistido nos ltimos anos, para no corrermos o risco de, no futuro, em termos

    globais, e por no termos lugar nas grandes competies, acabarmos por ver

    ainda mais alargado o fosso econmico e o desequilbrio que o mesmo reflecte

    ao nvel da competio.

    5

  • Reviso da Literatura

    Uma das medidas fundamentais para contrariar esta tendncia seria investir

    na formao e nos jovens talentos. No entanto, segundo alguns autores a

    realidade est longe do que seria ideal. Carraa (2003b) e Pacheco (2001)

    afirmam mesmo que em Portugal no se verifica um investimento claro e uma

    aposta sria na formao. Campos (2003: 82) alerta para o facto de num

    futebol em que a crise financeira se est a fazer sentir de uma forma violenta, o

    grande contra acaba por se fazer reflectir, essencialmente, na no explorao

    do futebol de formao, o que seria mais econmico e rentvel.

    Desta forma, e em virtude da actual situao de crise econmica no

    panorama internacional em geral e no futebol em particular, torna-se

    necessrio que cada vez mais os clubes formem jogadores de qualidade no

    sentido de assim os integrarem nas suas equipas seniores evitando, dessa

    forma, o pagamento de quantias elevadas na aquisio de jogadores a outros

    clubes. Por outro lado, ao investirem na formao de jogadores aumentam a

    possibilidade de obterem no futuro dividendos desse investimento numa

    possvel venda para outros clubes (Leandro, 2003: 3).

    Mediante a realidade do futebol portugus e da economia em que est

    inserido entendemos que os clubes de futebol tm de investir na formao de

    forma a rentabilizar os seus recursos humanos e, ao mesmo tempo, manterem-

    se competitivos.

    2.1.2. A formao como uma das solues para a viabilidade econmica dos clubes de futebol

    O objectivo da formao foi-se alterando ao longo dos anos. Pensamos

    que, tal como no Real Madrid, o investimento na formao em Portugal estava

    sobretudo relacionado com questes de origem histrica e social (Girldez,

    2003). Com a conjuntura actual podemos afirmar que a formao desportiva

    readquiriu uma nova centralidade. Ela deixou de ser apenas um processo de

    assegurar a qualidade desportiva dos clubes, para ser tambm um meio de

    optimizar financeiramente os recursos humanos (Constantino, 2002: 153).

    Na opinio de Oliveira (2001: 12), uma das grandes solues para o

    problema econmico dos clubes apostar inequivocamente na formao,

    6

  • Reviso da Literatura

    criando estruturas, alterando conceitos e metodologias, de forma que o nmero

    de jovens com talento seja maior ao da realidade actual.

    necessrio ter presente que os jogadores so activos neste mundo

    economicista. Pois, para alm do patrimnio imobilirio que s alguns clubes

    ou sociedades desportivas possuem, so exactamente estes activos [entenda-

    se jogadores] a nica riqueza, o nico bem de possvel rentabilizao (Carraa,

    2003a: 82).

    Mourinho (2002a: 17) refere que um clube com a dimenso do Futebol

    Clube do Porto precisa de ter os seus activos elevados [entenda-se jogadores]

    ao expoente mximo, de modo a que um determinado momento tenha

    condies para vender, caso isso seja necessrio.

    Segundo Camacho (in Alves, 2004: 84) o lanamento de jovens

    futebolistas est muitas vezes relacionado com os condicionalismos

    econmicos de cada clube. Equipas que no tm grande capacidade financeira

    a nvel internacional tm nos jogadores formados nas suas escolas a

    oportunidade de reforarem os seus planteis e de, ocasionalmente, venderem

    jogadores, o que lhes podem trazer importantes contrapartidas financeiras.

    Vale (2003b: XX) confirma as ideias expressas anteriormente afirmando que

    a formao um aspecto rentvel, isto , formar jogadores e eventualmente

    vend-los, se estes tiverem qualidade. Penso que esta a via para os clubes

    portugueses.

    Da que um investimento forte e srio na formao acabe por ser a

    mdio/longo prazo um excelente investimento. necessrio apostar nos jovens

    jogadores de forma a evitar gastos e, eventualmente, rentabiliz-los com a sua

    venda.

    Mesmo em grandes clubes e com enorme potencial financeiro, como o

    caso do Chelsea Football Club (Inglaterra), a estratgia passa pelo

    investimento nas camadas jovens. Kenyon (2004: 25), director executivo do

    referido clube, menciona que a alma do clube tem de vir das Academias. Isto

    para que no tenhamos de estar a gastar dinheiro em jogadores. E passa por

    aqui o equilbrio financeiro.

    7

  • Reviso da Literatura

    Assim, uma aposta nos jovens jogadores permitir uma melhor gesto quer

    dos recursos humanos, quer dos recursos financeiros dos clubes.

    Por outro lado, Oliveira (2001: 12) afirma que fundamental que

    entendamos que, da forma como se est a desenvolver esta indstria, o nosso

    pas ter forosamente de ser mais exportador do que importador e, que

    quando tenha de importar, que o faa de forma pontual e com o garante de que

    tais importaes constituiro uma mais-valias no s desportivas, mas,

    tambm, econmicas.

    Assim, como afirma Constantino (2002: 152), um forte investimento na

    formao desportiva passa a ser, nova dimenso internacional do trabalho

    desportivo, um objectivo estratgico fundamental para aumentar o grau de

    competitividade dos pases com economias de desporto mais fracas.

    Os treinadores das grandes equipas portuguesas esto atentos a este

    fenmeno e importncia da formao no futebol. Segundo Mourinho (2003b:

    20), em Portugal, preciso repensar o investimento na formao, apostar em

    jogadores mais novos e nacionais. Camacho (2003b: 9) da mesma opinio

    afirmando que jogadores como Cristiano Ronaldo ou Ricardo Quaresma no

    aparecem todos os anos. Para isso preciso apostar nas camadas jovens.

    Assim, parece-nos consensual a premncia do investimento na formao e

    nos jovens talentos de forma a facilitar a sanidade econmica dos clubes de

    futebol e, ao mesmo tempo, garantir uma maior competitividade desportiva

    quer ao nvel das competies internas, quer ao nvel das competies com os

    restantes clubes/pases da Europa.

    8

  • Reviso da Literatura

    2.2. A NECESSIDADE DE CONSTRUIR O PROCESSO DE FORMAO TENDO COMO PRIMADO A ORGANIZAO DE JOGO SUSTENTADA POR UMA CULTURA DE EXIGNCIA, DE VITRIA E DE COLECTIVO

    At nas peladinhas gosto de ganhar. Desfruto todos os dias e, antes dos jogos, penso sempre nos adeptos e na

    necessidade de me esforar, para lhes provar que sou um bom jogador.

    Gonzalez (2003: 50)

    Nenhum jogador est acima da equipa. Aprendi, muito cedo, essa lio.

    Casillas (2003: 50)

    Temos de melhorar a cada dia, do princpio ao fim da carreira. Quero aprender coisas novas todos os dias.

    Crespo (2005: 10)

    [Cristiano Ronaldo] tem de continuar a ser humilde, a perceber que tem muito ainda a aprender, a evoluir e a associar

    as suas qualidades eficincia e aos condicionalismos da equipa.

    Queiroz (2005: 38)

    A formao de um jogador de futebol um processo moroso e com

    particularidades com as quais os treinadores devem estar identificados de

    forma a poderem rentabilizar ao mximo esse mesmo processo. Como afirmam

    Leal & Quinta (2001: 20), o futebol juvenil tem impresses digitais prprias,

    isto , possui caractersticas que lhe do autonomia peculiar, o que pressupe,

    evidentemente, uma metodologia que se identifique com as suas necessidades

    e particularidades.

    Apesar destas especificidades da formao e, nomeadamente, as

    especificidades de cada escalo, somos da opinio de que o processo de

    formao deve ter como principal referencial o que exigido na equipa

    principal. Esta exigncia dever atingir o seu mximo grau de rigor nos ltimos

    escales de formao, isto tendo em conta que a rentabilizao da formao

    passa pela capacidade de se formar jogadores com qualidade suficiente para

    entrarem na equipa principal e pela introduo dos maiores talentos de forma

    mais consistente na equipa principal (Paul, 2003: XXVII). Ou seja, o objectivo

    final do todo o processo de formao passa pela integrao do maior nmero

    possvel de jogadores na equipa snior dos respectivos clubes.

    Assim, a formao em futebol tem que ser uma actividade guiada pelos

    mais rigorosos padres de exigncia (Oliveira, in Leal & Quinta, 2001) de

    forma a preparar os jovens jogadores para o mundo do futebol profissional.

    9

  • Reviso da Literatura

    Apesar de defendermos que, tal como para Mourinho (in Loureno, 2003:

    121), a organizao de jogo de uma equipa o factor mais importante de

    todos, existem outros valores que tm de ser ponderados ao longo de todo o

    processo de formao de forma a sustentarem essa mesma organizao de

    jogo.

    Carraa (2005a: 46) afirma que o jovem jogador do Sport Lisboa e Benfica

    deve ter as seguintes caractersticas: um bom desenvolvimento motor,

    competitividade, um pensamento bem organizado e estruturado, disciplina e

    perseverana.

    Segundo Vale (2004: 16), um jogador pode ter muito talento, mas na nossa

    opinio o carcter que conta. So esses os grandes jogadores do futuro.

    um aspecto decisivo no jogador de elite. De acordo com o mesmo autor, o

    jovem jogador de futebol tem de revelar carcter, inteligncia especfica de

    jogo, tcnica evoluda e com princpios de educao para se comportar como

    ser social. Para alm disso tem de ter ambio, gostar de futebol e uma grande

    vontade de se tornar um jogador de elite (Vale, 2004: 16).

    Valente (2005: II) afirma que um jogador de futebol de alto nvel tem de ter

    um nvel mental muito forte.

    Ento, o processo de formao deve ter como primado a organizao de

    jogo da equipa num contexto de exigncia, de vitria e de colectivo. O

    Coordenador Tcnico dever fomentar estes valores intervindo junto dos

    treinadores.

    2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor

    Pensamos que a formao de um jovem jogador de futebol tem de ser um

    processo com cunho exigente. De acordo com Girldez (2002), o xito reside

    no facto do jogador querer ser melhor em cada dia que passa. O Real Madrid

    procura a melhoria dos jogadores desde o primeiro dia em que chegam a esta

    casa. Essa parece ser a mesma filosofia do Ajax: O jovem jogador do Ajax

    tem de possuir talento e vontade de aprender: a nossa obrigao fazer

    jogadores melhores a cada dia que passa (Adriaanse, 1996: 21).

    10

  • Reviso da Literatura

    Vale (2003a: LXXVI) parece concordar com as ideias anteriores: para que

    um jovem jogador seja formado com sucesso este tem de ser eficaz do ponto

    de vista tctico-tcnico, fsico e fundamentalmente mental. Para poder alcanar

    este perfil o jogador tem de ter capacidade de trabalho, rigor, disciplina,

    organizao, grande ambio em tornar-se jogador de alto nvel. Portanto, est

    relacionado com o nvel de empenhamento que consiga ter no dia-a-dia, no

    sentido de se tornar cada vez mais forte do que no dia anterior.

    Valdano (2002: 16), reportando-se sua experincia enquanto jogador

    profissional de futebol, afirma que teve de colocar em funcionamento a

    vontade, o esprito de sacrifcio, e a houve uma aprendizagem no apenas

    desportiva, mas tambm pessoal que lhe possibilitou fazer incurses por outros

    campos.

    Para Mourinho (2003c) mais problemtico que as debilidades tcticas so

    as debilidades ao nvel psicolgico afirmando mesmo que adora encontrar um

    jogador com debilidades tcticas, receber um jogador cru a nvel tctico. Mas

    no tem pachorra para jogadores com debilidades psicolgicas ao nvel do

    sacrifcio, da crena e da entrega. Ou seja, os grandes treinadores pretendem

    jogadores com qualidade, mas que tenham motivao em cada dia que passa

    e um interesse grande em aprender aquilo que lhes transmitido (Mourinho,

    2002a: 20).

    Dada a exigncia do futebol profissional, o processo de formao deve

    integrar os mesmos valores. Como refere Adriaanse (in Kormelink &

    Seeverens, 1997: 69) se tu ests no Ajax tens de ser treinvel e ser capaz de

    entender as instrues, mesmo que s tenhas 7 anos.

    Deste conjunto de ideias supracitadas depreendemos que as competncias

    sociais e psicolgicas esto tambm elas relacionadas com as capacidades

    futebolsticas e que h valores e atitudes que devem ser fomentados dentro e

    fora do terreno de jogo de forma a construir a personalidade e o

    comportamento dos jovens jogadores.

    No entanto, e de acordo com Adriaanse (1997: 66) a sociedade est em

    mudana em muitas dimenses, sendo que os jovens de hoje em dia do mais

    importncia ao lazer do que ao trabalho. Porm, as regras do futebol de elite

    11

  • Reviso da Literatura

    no se alteraram. Este aspecto pode trazer alguns entraves ao processo de

    formao devido ao confronto de valores fundamentais deste processo e os

    valores que os jovens jogadores vivenciam no seu dia-a-dia. Ser importante

    transmitir aos jovens jogadores que o fundamental numa equipa de futebol o

    rendimento individual em prol da equipa e que somente o trabalho que leva

    ao sucesso (Mourinho, in Loureno, 2003: 41).

    Pensamos que a exigncia relativamente ao trabalho dirio, disciplina,

    correco e procura de uma constante melhoria deve surgir e ser fomentada

    pelos treinadores ao longo de todo o processo de formao.

    2.2.2. Esprito ganhador, ambicioso e positivo

    Denoueix (2003: 46) afirma que o Nantes conseguiu aproximar-se das

    grandes equipas francesas e ganhar vrios ttulos, controlando ansiedades e

    acrescentando optimismos. Quando praticamos um desporto temos que ser

    optimistas, positivos e ter vontade de ganhar, para vencer os mais fortes. Isso

    consegue-se com muito trabalho dirio.

    Valdano (2002: 21) defende esta perspectiva afirmando que para se atingir

    o sucesso no futebol necessrio ser-se uma pessoa positiva e a descoberta

    dos erros que levaram ao fracasso deve ser um exerccio que nos torna

    melhores.

    Para Mourinho (in Loureno, 2003: 128) ser campees tem de ser

    sempre o nosso objectivo. Um objectivo dirio, uma motivao consistente e

    permanente, uma luz que tem de guiar o nosso trajecto. Cada treino, cada jogo,

    cada minuto da nossa vida profissional e social tem de se centrar nesse

    objectivo que nosso.

    Desta forma, os jogadores devem ser formados dentro de uma cultura de

    vitria. Os jogadores tm de estar habituados a ganhar (Mourinho, 2002a: 20).

    Mourinho (in Loureno, 2003: 104) afirma mesmo que uma equipa de futebol

    s digna desse nome quando todos os jogadores, sem excepo, querem

    ganhar, querem ganhar muito, independentemente de jogarem ou no.

    Mas ganhar no se deve cingir ao resultado. Ganhar significa igualmente

    ganhar cada treino, ganhar capacidade para jogar, ganhar capacidade de

    12

  • Reviso da Literatura

    sofrer, ganhar vontade de jogar e ganhar, ganhar espao para jogar, ganhar

    cada duelo, ganhar cada combinao ofensiva, ganhar cada situao de

    finalizao, ganhar uma equipa (Departamento de Formao do Clube

    Desportivo Trofense, 2002). Ou seja, o jovem jogador de futebol deve

    desenvolver a capacidade de auto-superao individual e colectiva, exigindo

    sempre mais de si e da sua equipa.

    Defendemos que o processo de formao tem de ter o seu enfoque na

    positividade, na capacidade de ultrapassar as adversidades com determinao

    e na vontade de querer ganhar todas as situaes.

    2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo

    Sendo o futebol um desporto colectivo e institucionalizado fundamental

    que os jovens jogadores privilegiem os interesses do seu clube e da sua equipa

    em detrimento dos seus prprios interesses.

    Para Mourinho (in Loureno, 2003: 121) a ideia de clube mais importante

    do que qualquer jogador tratando-se de um valor que tem de se passar por

    todo o clube, em especial pelas camadas jovens. O respeito pelo clube, pelas

    normas institudas, pela filosofia de clube mais importante do que qualquer

    indivduo, ou seja, ningum est acima do clube.

    De acordo com Denoueix (2003: 46) fala-se muito em craques individuais,

    mas, no seu entender, o colectivo prioritrio.

    Valdano (2002: 20) corrobora com as ideias anteriores referindo que a

    estrutura e a cultura do Real Madrid tm de estar sempre acima das

    pretenses dos jogadores. Aqui a mensagem foi clara: chega uma grande

    figura internacional, mas aceita as regras comuns, as regras que esto

    definidas no Real Madrid h muito tempo; uma maneira de explicar que a

    instituio est acima dos jogadores.

    Parece-nos fundamental que se transmita aos jovens jogadores durante o

    processo de formao que o clube, as regras institudas e a ideia de jogo

    implementada so o mais importante e que tm de ser respeitados.

    Segundo Mourinho (2003d: 61) o conceito de equipa muito mais

    importante do que o conceito de individualidade e que a melhor equipa no

    13

  • Reviso da Literatura

    aquela que tem os melhores jogadores, mas aquela que joga como equipa.

    Assim, todos os jogadores tm de transformar as suas motivaes pessoais

    em motivaes colectivas (Mourinho, 2003e: 33), sendo fundamental para

    poder jogar ao mais alto nvel, cada jogador sentir-se confiante, ser solidrio e

    cooperante com os seus companheiros e acreditar neles (Mourinho, in

    Loureno, 2003: 141).

    Valdano (2002: 22) refere ainda que precisamos sobretudo de metas e

    necessitamos de um estado de nimo colectivo que nos permita trabalhar com

    um determinado nvel de entusiasmo. Necessitamos de uma retaguarda de

    cultura corporativa para ter um determinado sentido de pertena. Ou seja,

    torna-se importante a partilha de objectivos e de cumplicidades de forma a

    formar um grupo coeso para que todos os elementos da equipa se dirijam no

    mesmo sentido.

    Pensamos que o processo de formao deve ser orientado para os valores

    colectivos da equipa e do clube em detrimento dos valores individuais.

    2.3. DA FORMAO MERAMENTE FUTEBOLSTICA PREOCUPAO COM A FORMAO INTEGRAL

    Retirei-me com trinta e tantos e espero viver at aos setenta e tal. Um dia pensei: o que vai ser da minha vida quando

    no for conhecido, quando o meu rival for um cidado normal que tem duas profisses? Pensai bem.

    Butragueo (in Palomino, 2002)

    Formar Homens que jogam.

    Departamento de Formao do Clube Desportivo Trofense (2002: 9)

    A formao desportiva no pode prejudicar a formao escolar dos jovens. Mas, por outro lado, a escola no deve

    hipotecar o futuro dos jovens desportistas com talento.

    Jos Carvalho (2002: 12)

    A formao no se trata apenas de treinar, muito mais do que isso:

    educar (Leal & Quinta, 2001: 21). Desta forma, o processo de formao do

    jovem integra, como no poderia deixar de ser, a componente escolar. Tal

    significa que a prestao desportiva no pode acarretar o prejuzo do

    rendimento escolar. Os jovens jogadores devem entender que o desporto

    contribui para a sua formao, ao ser um espao de formao, por excelncia,

    promotor da auto-afirmao e da auto-superao. Todavia, tudo isto perde o

    14

  • Reviso da Literatura

    sentido se ele deixar de prestar ateno aos estudos, na medida em que estes

    constituem, no presente, o acesso para a construo de um futuro slido

    (Mesquita et al, 2002: 9).

    2.3.1. A importncia da formao escolar e acadmica

    Para o jovem jogador de futebol muito difcil conciliar a sua actividade

    desportiva com a actividade escolar. Como afirma Jos Carvalho (2002: 13),

    um dado adquirido que a opo pela carreira desportiva na via da alta

    competio acarreta uma srie de problemas na organizao da vida

    desportiva, escolar e social do jovem jogador. Vale (2003a: LXXVII) confirma

    esta ideia afirmando que em Portugal, hoje em dia extremamente difcil

    conseguir obter sucesso do ponto de vista desportivo e escolar ao mesmo

    tempo. Tudo isto so factores a ter em conta num processo de formao. Da

    a emergncia do apoio escolar aos jovens jogadores dada as dificuldades em

    conciliar a actividade desportiva com a actividade escolar.

    Jos Carvalho (2002: 26), afirma que a cobertura meditica realizada aos

    futebolistas profissionais torna muito atraente esta carreira para os jovens

    jogadores. No entanto, esta opo, por vezes, tem como consequncia a

    falncia da carreira acadmica, o que se revela negativo, principalmente se o

    jovem por qualquer motivo no atinge o profissionalismo.

    Gomes (2004: 25) afirma que seria bom que estes jovens estudassem e

    obtivessem as mximas competncias possveis para que sejam homens mais

    preparados para a vida, independentemente de triunfarem ou no no futebol.

    Caador (2003: 9), afirma que os jovens jogadores e os seus pais devem

    investir na formao escolar e acadmica dos primeiros: Temos de nos

    preocupar com a formao acadmica dos jogadores, sermos exigentes. No

    possvel que um jovem de 20 anos seja s futebolista e que os seus pais

    tenham a feliz ideia de os apoiar quando abandonam a escola. No h um

    jovem que se possa considerar no bom caminho se abandonar a escola ao 9

    ano. Queremos que concluam o 12 [ano de escolaridade] e entrem nas

    faculdades, aproveitando o estatuto de alta competio. essa a grande

    revoluo que temos de fazer: apostar na qualidade de jogadores e no seu

    15

  • Reviso da Literatura

    nvel cultural. Esses homens, a mdio prazo, podero transformar o futebol

    portugus.

    Tendo em conta as ideias anteriormente descritas, um processo iniciado

    com um percurso de formao concertado e qualificado, em que o aspecto de

    aprendizagem desportiva e acadmica ou tcnico-profissional deveras

    importante. Isto porque, temos de ter a conscincia de que a esmagadora

    maioria dos jovens jogadores nunca sero jogadores profissionais de futebol.

    Os outros, os mais aptos, aqueles que durante as vrias fases de formao

    demonstraram ter capacidades e potencial para poderem ser profissionais de

    primeiro plano, tero de se disponibilizar para assumirem uma carreira: dura,

    desgastante, arriscada, meditica. Mas compensadora e envolvente para

    aqueles que a saibam gerir com inteligncia e sensatez (Carraa, 2003a: 82).

    Como afirma o mesmo autor (Carraa, 2003b: 9), apenas 5% dos profissionais

    de futebol do nosso pas que no fim da carreira e se gerirem bem os seus

    rendimentos no necessitam de desenvolver outra actividade. Os outros 95%

    tm de assumir uma nova profisso para sobreviver. Amealharam algum

    dinheiro, mas deixaram de estudar muito cedo.

    Assim, a formao escolar e acadmica surgem como apoio a uma melhor

    gesto dos rendimentos e como uma garantia de um futuro mais estvel e

    seguro no caso de a carreira futebolstica terminar ou no ser bem sucedida

    por diversos factores, como por exemplo, as leses.

    De acordo com Rocha (2003: 39), jogador profissional de futebol da

    Acadmica de Coimbra e licenciado em fisioterapia, no vale a pena fazer

    planos a longo prazo [no futebol], porque h imponderveis, como as leses. E

    determinadas leses, dependendo da sua gravidade, podem determinar o fim

    de qualquer carreira. Desta forma concordamos com Rocha (2003: 39) ao

    afirmar que parece importante que o jogador que pense no seu futuro: tem de

    estar preparado para entrar no mercado de trabalho e sem uma licenciatura

    bastante mais difcil conseguir isso.

    Do ponto de vista desportivo, segundo Mourinho (2002c), um jogador culto

    no tem mais capacidade de evoluo e de aproveitamento, mas antes um

    16

  • Reviso da Literatura

    jogador inteligente: quem inteligente assimila mais depressa as coisas

    acelerando a aquisio dos objectivos do treino.

    Mas, por outro lado, concordamos com Vale (2003a: LXXVII) quando afirma

    que um jogador quanto mais culto for, no s do ponto de vista tctico, mas

    tambm intelectual, mais disponvel estar para apreender coisas novas que

    faam apelo fundamentalmente sua capacidade de anlise e inteligncia,

    tem a ver com a inteligncia tctica. Mil Homens (2004: 6) da mesma opinio

    afirmando que as pessoas mais cultas e melhor formadas pensam, entendem

    e desempenham melhor qualquer actividade.

    Parece-nos que a formao escolar e acadmica tm um papel fundamental

    na sociedade e que no dever ser descurada pelos agentes orientadores do

    processo de formao desportiva. E essa mesma formao escolar/acadmica

    ajudar o jovem jogador no seu dia-a-dia futebolstico, pois no futebol de

    hoje no basta s ser bom jogador ou pelo menos saber o que fazer em

    campo. necessrio aprender ao pormenor as regras deste novo raciocnio do

    espectculo profissional, no esquecer a importncia da imagem, saber

    comunicar e ter sempre presente o papel fundamental que a comunicao

    social pode ter na evoluo (ou retrocesso) de uma carreira (Carraa, 2003a:

    82). Assim, a formao escolar/acadmica surge tambm como um meio de

    apoio carreira de futebolista. Da a necessidade do profissionalismo, esprito

    de sacrifcio, viso e uma abrangente e competente gesto da carreira,

    aspectos prioritrios a ter em conta pelos jogadores, por forma a poderem

    acompanhar a diria evoluo a que esta indstria a est sujeita (Carraa,

    2003a: 82).

    Assim, ao longo do processo de formao os jovens jogadores devem ser

    incentivados a empenharem-se nos seus estudos. O Coordenador Tcnico

    dever intervir junto dos treinadores para que estes alertem os seus jogadores

    da importncia do estudo e, se necessrio, desenvolver estratgias de

    remediao caso se verifique insucesso escolar. Este responsvel dever

    igualmente comunicar com os pais dos jogadores sempre que se verifique essa

    necessidade.

    17

  • Reviso da Literatura

    2.3.2. A relao Sistema Desportivo/Sistema Educativo

    Pensamos que a relao entre o Sistema Desportivo e o Sistema Educativo

    no suficientemente cooperante de forma a ajudar os jovens desportistas, em

    geral e os jovens jogadores de futebol, em particular, a conciliarem as duas

    actividades. Segundo Jos Carvalho (2002: 15), a conciliao entre as

    actividades desportivas e as actividades escolares dos jovens tm-se revelado

    com um problema de difcil soluo. Este problema agudiza-se de

    sobremaneira quando pretendem enveredar por um percurso que os conduza a

    resultados de excelncia.

    Dado este problema parece-nos fundamental que a Escola e o Clube se

    aproximem de forma a compatibilizar os horrios das actividades escolares e

    das actividades desportivas para que os jovens jogadores tenham oportunidade

    de obter sucesso nos dois processos de formao.

    A lei do estatuto de alta competio prev medidas de apoio ao nvel do

    regime escolar e do acesso a formao superior, especializada e profissional.

    Todavia, o tempo despendido nos treinos e competies e nas respectivas

    deslocaes fazem com que essas medidas, como por exemplo, a relevao

    de faltas e a alterao de provas de avaliao, pouco beneficiem os jovens

    jogadores (Maria Carvalho, 2002: 77). Concordamos com esta autora quando

    afirma que tempo de equacionar novas formas de enquadramento da vida

    destes praticantes desportivos (Maria Carvalho, 2002: 77).

    Assim, e no sentido de promover uma melhor conciliao entre as duas

    actividades, os programas desportivos em alguns pases tm vindo a

    desenvolver modelos de organizao pedaggica baseados em parcerias com

    escolas, sendo que escolas, clubes e federaes, assumem compromissos

    bem definidos nesses programas (Marques, 1999, in Jos Carvalho, 2002: 47).

    Alguns clubes em Portugal parecem ter adoptado medidas idnticas.

    Segundo Mil Homens (2004: 6), director-geral do Futebol de Formao e da

    Academia do Sporting Clube de Portugal, o principal objectivo formar

    homens que possam vir a integrar a equipa principal, mas sem esquecer o

    desenvolvimento pessoal e social dos jovens. Desta forma, este clube criou

    um curso tcnico-profissional para os jovens jogadores que vivem em regime

    18

  • Reviso da Literatura

    de internato. O Sporting Clube de Portugal conta ainda com um gabinete

    psicopedaggico constitudo por uma professora e por uma psicloga que tm

    como tarefa o acompanhamento escolar de todos os jovens jogadores.

    Para incentivar os jovens jogadores nas suas tarefas escolares foi criado

    um quadro de honra, que premeia trs jovens por ano avaliando os seguintes

    comportamentos: rea escolar (assiduidade e avaliao acadmica) e rea

    desportiva (fair-play, assiduidade/pontualidade, comportamento nos balnerios

    e atitude/comportamento nos treinos) (O Jogo, 2004: 6).

    No Futebol Clube do Porto, segundo Jos Carvalho (2002: 26), tambm

    parece haver essa preocupao. Este autor realizou um estudo de forma a

    fundamentar a necessidade da criao de uma estrutura especfica (Centro de

    Formao) de apoio formao de jogadores de futebol no Futebol Clube do

    Porto. O objectivo deste centro, em termos escolares, ser o de fornecer

    dentro da estrutura do prprio clube, uma alternativa formao tradicional,

    com vista ao prosseguimento de estudos. Atravs desta alternativa, os

    problemas relacionados com a conciliao de horrios escolares com os

    horrios dos treinos, o tempo gasto no transporte da escola para o local do

    treino e a rentabilizao dos espaos de treino seriam ultrapassados. Por outro

    lado, um currculo mais ajustado s caractersticas e necessidades desta

    populao poder favorecer uma maior motivao, evitando o abandono

    escolar precoce.

    Nos grandes clubes europeus a formao acadmica e escolar e a

    preocupao com a formao integral parecem ser aspectos fundamentais.

    No Real Madrid h a preocupao com a formao acadmica dos jovens

    sendo necessrio apontar a formao dos jovens para a formao integral

    (Valdano, 2002: 20). Inclusivamente, este clube organizou um evento intitulado

    Jornadas de Orientao Professional direccionado para os jogadores do

    Departamento de Formao e para os pais dos mesmos. Este acontecimento

    teve a presena de antigos jogadores de futebol e de basquetebol do clube

    (Sanchis, Emilio Butragueo, Vicente Ramos e Jos Manuel Beirn) que

    transmitiram o seu testemunho relativamente compatibilizao da prtica

    desportiva com os estudos universitrios. Posteriormente, outros temas foram

    19

  • Reviso da Literatura

    abordados, como por exemplo, as sadas profissionais dos cursos

    universitrios (Palomino, 2002).

    No Ajax, os maus resultados na escola tm implicaes ao nvel do clube.

    Segundo Blind (2004: 23), os jovens jogadores para se tornarem talentos tm

    de aplicar o mesmo carcter quer no clube quer na escola. Da que, quando as

    classificaes escolares descem, os responsveis do clube se dirijam aos pais

    e a titularidade na equipa passa a ser muito difcil de concretizar. Mais de

    metade dos jogadores do Ajax concluem o secundrio e iniciam os estudos

    universitrios.

    Concluindo, verificamos que a formao escolar e acadmica so

    instrumentos teis para todos os jovens jogadores mesmo para a sua

    actividade futebolstica e que os clubes de maior renome nacional e

    internacional no descuram esta vertente da vida social dos seus jogadores.

    2.4. A PROCURA DE IDENTIDADE ATRAVS DA IMPLEMENTAO DE UMA FILOSOFIA DE CLUBE E DE UM MODELO DE FORMAO

    A formao tem de ser a base dos plantis [das equipas profissionais].

    Girldez (2002)

    "Um treinador de um clube como este [Futebol Clube do Porto] no pode viver dissociado daquilo que o futebol-

    formao".

    Mourinho (2002a: 15)

    Desde o primeiro dia que um jogador pode ver o que o Ajax. A Academia fantstica, porque as crianas crescem e

    aprendem as coisas maneira do Ajax!.

    Koeman (s/d)

    Para que a formao tenha uma lgica coerente e racional parece-nos

    fundamental que todo o processo seja norteado por objectivos bem definidos e

    que estes se possam espelhar em todas as equipas do Departamento. Assim,

    torna-se necessrio promover o estabelecimento de um conjunto de linhas

    gerais e especficas que procuram direccionar e orientar a trajectria da

    organizao do mesmo (Leal & Quinta, 2001: 27), ou seja, um modelo de

    clube/filosofia de clube.

    Faria (2003: LXXVIII) da mesma opinio referindo que um projecto de

    formao ter a definio de um conjunto de caractersticas que se pretende

    20

  • Reviso da Literatura

    que esses jogadores quando formados possuam. Portanto, tem a ver com algo

    que tem de estar definido a nvel estrutural no clube. Isto porque, como

    afirmam Leal & Quinta (2001: 28) parece-nos difcil conceber que ao longo do

    processo de formao sejam escolhidos determinados jogadores em

    detrimento de outros, sem que haja uma definio das caractersticas do

    jogador que se pretende, tendo em conta as exigncias do modelo de jogo do

    clube.

    Desta forma, o ponto referencial de qualquer clube no que respeita

    formao deve ser alicerado numa filosofia que contemple a existncia de um

    modelo de jogo, o qual, por sua vez, orientar a concepo de um modelo de

    treino, de um complexo de exerccios, de um modelo de jogador e mesmo de

    um modelo de treinador (Leal & Quinta, 2001: 27).

    Vale (2003a: LXXVIII) refere o caso do Futebol Clube do Porto. Segundo

    este autor, a formao num clube deve nortear-se por princpios bem slidos e

    se alguma coisa mudar devem mudar as pessoas, mas no devem mudar os

    princpios que so aquilo que caracterizam e que so a identidade de um

    clube. Conforme o mesmo o Futebol Clube do Porto tem uma cultura

    desportiva muito prpria e os jogadores tm de a entender. O clube rege-se por

    valores prprios, desportivamente tem uma forma de jogar. uma forma de

    jogar do Futebol Clube do Porto e de mais ningum (Vale, 2004: 16).

    Esta forma de trabalhar levar a que todos os intervenientes do processo de

    formao assimilem ao longo do tempo uma forma de treinar e de jogar,

    criando uma noo de identidade.

    2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como referencial fundamental do Departamento de Formao

    Pensamos que o grande referencial para a implementao de um modelo

    de clube ou modelo de formao passa pelo estabelecimento de um modelo de

    jogo comum a todos os escales de formao. Esta forma de trabalhar

    implicaria que todos se direccionassem no mesmo sentido e que os jogadores

    se confrontassem todos os dias com uma determinada lgica. bvio que esse

    modelo a referncia que faz com que nas diversas etapas de formao no

    21

  • Reviso da Literatura

    aconteam coisas distintas, isto porque as ideias so comuns e os princpios

    so os mesmos (Faria, 2003: LXXXVIII). E esse referencial tem de ser o

    referencial mximo que aquilo que se faz no topo que a equipa principal de

    um clube (Vale, 2003a: LXXIII), pois o objectivo final da formao dos jovens

    jogadores passa pela integrao na equipa snior.

    Da mesma opinio, Leal & Quinta (2001: 41) afirmam que a formao com

    base na existncia de um modelo de jogo vai permitir ao jovem jogador estar

    rotinado numa forma de jogar e desenvolver caractersticas definidas, que lhe

    permitiro, com mais possibilidades de sucesso, integrar a equipa snior. Para

    isso importante que o modelo de jogo implantado no departamento juvenil

    tenha como referncia o modelo da equipa snior porque para esta que se

    pretende formar o jogador.

    Caso o modelo de jogo do Departamento de Formao no corresponda ao

    modelo de jogo da equipa principal corre-se o risco de se estar a formar

    jogadores com caractersticas diferentes daquelas que so exigidas pela

    equipa snior o que torna mais difcil a integrao e aproveitamento dos

    jogadores oriundos dos escales de formao (Leal & Quinta, 2001: 41). Ou

    seja, tem de haver uma similaridade de processos ao nvel do treino e do jogo

    entre a equipa principal e as equipas do Departamento de Formao.

    Tendo em linha de conta o anteriormente enunciado, parece-nos mais

    coerente que os critrios da contratao do treinador principal da equipa snior

    do clube tenham como principal referencial a filosofia do clube e,

    nomeadamente, o modelo de jogo adoptado para a formao. De acordo com

    Vale (2003a: LXXIX), a partir do momento que existe um modelo de jogo, uma

    filosofia de formao, uma cultura desportiva, julgamos que seria impensvel

    as pessoas no pensarem no tipo de treinador que vo escolher. Guilherme

    Oliveira (2003: XXIV) da mesma opinio referindo que se um clube tem um

    modelo de jogo para a formao deve contratar um treinador cujas ideias so

    em funo desse modelo de jogo.

    Assim, parece-nos fundamental que a escolha do treinador da equipa

    principal deve ter em linha de conta a filosofia do clube para que no se

    22

  • Reviso da Literatura

    verifique um desfasamento entre o que exigido nas equipas do Departamento

    de Formao e na equipa snior.

    2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais

    A realidade do futebol Portugus mostra-nos que o cargo de treinador

    principal de uma equipa profissional de futebol faz parte de uma estrutura muito

    voltil (Paul, 2003: XXVIII), isto porque est dependente dos resultados, e

    est permanentemente exposto comunicao social e ao pblico (Camacho,

    in Alves, 2004: 169).

    Desta forma, se no existir uma poltica de clube relativamente

    contratao do treinador snior que v de encontro com aspectos fundamentais

    do prprio clube, h a necessidade ento que o Departamento de Formao

    tenha um modelo de jogo que considere ajustado evoluo dos jogadores de

    forma a potenciar esses jogadores (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII). Isto

    porque, no nos parece coerente confrontar os jovens jogadores com a

    necessidade de ano aps ano lhe serem exigidos comportamentos

    completamente diferentes e em determinadas alturas mesmo antagnicos

    estamos a limitar completamente as suas capacidades e a sua evoluo em

    toda a plenitude (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII).

    Desta forma concordamos com Camacho (in Alves, 2004: 86) quando

    afirma que um clube no pode depender de um treinador da equipa principal

    que pode mudar todos os anos e pode mesmo ter uma filosofia diferente da do

    clube. Um clube no pode ficar dependente das posies efmeras do seu

    treinador principal, tem de ter uma estratgia prpria.

    Paul (2003: XXVIII) da mesma opinio afirmando que no faz sentido que

    a formao esteja constantemente a adaptar-se ao que se passa na equipa A.

    O que faz sentido que ns sejamos capazes de formar jogadores aptos para

    se adaptarem a qualquer modelo ou qualquer sistema, isso sim faz sentido.

    Na realidade, parece-nos que o mais importante que o processo educativo

    na formao do jogador consiga alcanar a formao de um jogador

    inteligente, capaz de agir por ele prprio, utilizando os seus conhecimentos e

    as suas experincias (Bayer, 1994, in Leandro, 2003: 3).

    23

  • Reviso da Literatura

    Independentemente das mudanas na equipa snior, o Departamento de

    Formao dever promover a estabilidade do projecto e formar jogadores

    inteligentes com grande capacidade de adaptao a diversos modelos de jogo.

    Vale (2003a: LXXIX) afirma que no Futebol Clube do Porto o objectivo no

    passa somente por formar jogadores para a equipa principal, mas jogadores

    que sejam capazes de se adaptar a qualquer modelo de jogo. Porque achamos

    que se dotarmos os nossos jogadores de grande riqueza do ponto de vista

    tctico-tcnico, eles tm condies para jogarem em qualquer modelo, em

    qualquer um dos futebis que se joga por esse mundo fora e esse o nosso

    grande objectivo.

    Mourinho (2002a: 22) afirma que cada vez mais os jogadores de primeira

    linha tm de ser multifuncionais. Este treinador afirma mesmo que no pode

    ter um jogador no seu plantel que s sabe jogar no seu modelo de jogo, porque

    no final do seu vnculo contratual vem outro treinador que, eventualmente, joga

    num modelo diametralmente oposto, e os jogadores tm de se adaptarem a um

    novo modelo. Assim, todos temos de nos adaptar a diversas funes, diversas

    filosofias, diversos sistemas (Mourinho, 2002a: 22), ou seja, os jogadores tm

    de possuir uma cultura tctica que lhes permita desempenhar diversas funes

    independentemente do modelo de jogo adoptado.

    Pensamos que o processo de formao deve proporcionar ao jovem

    jogador a aquisio de uma vasta cultura tctica de forma a adquirir uma maior

    capacidade de adaptao aos diversos modelos de jogo que, certamente,

    encontrar ao longo da sua carreira.

    24

  • Reviso da Literatura

    2.4.3. Corpo tcnico deve estar identificado com o modelo de jogo

    cada vez mais importante este clube ter um documento com uma ideia, uma filosofia orientadora de todo esse

    processo.

    Mourinho (2002a: 15)

    Porque o futebol um jogo, pode-se ganhar ou perder. [As pessoas] Deveriam, antes, preocupar-se sobre se trabalho

    bem ou mal.

    Camacho (2003a: 51)

    "O homem mais importante num clube o treinador. quem decide, orienta, planeia e desenvolve um projecto".

    Jacquet (2003: 79)

    Para que haja uma linha de coerncia em todo o processo de formao, os

    tcnicos envolvidos num projecto de formao devem possuir uma concepo

    unitria quer de clube, quer de jogo, quer de treino, quer do prprio modelo de

    jogador a formar. Unificar os critrios dos diferentes treinadores dos diferentes

    escales eliminar a possibilidade de conflitos perturbadores da normal

    evoluo do jovem jogador (Leal & Quinta, 2001: 48). Isto no dever implicar

    restries ao nvel da criatividade individual dos treinadores limitando a

    evoluo dos mesmos. No entanto, parece-nos uma medida essencial, porque

    permitir uma harmonizao das ideias acerca do modelo de jogo adoptado

    fazendo com que todos tomem a mesma direco dando continuidade e

    identidade ao trabalho realizado independentemente do escalo em que o

    jovem jogador se encontre.

    Faria (2003: XCI) da mesma opinio afirmando que o importante definir

    um perfil, de forma a encontrar a ligao com uma determinada forma de

    trabalhar e de treinar que permita operacionalizar as ideias fundamentais do

    modelo.

    Para Vale (2003a: LXXIX) o mais importante num grupo de treinadores de

    um Departamento de Formao que estes funcionem no mesmo

    comprimento de onda, que a linguagem seja a mesma sobre as questes

    fundamentais. Depois fundamental levarem prtica aquilo que definem do

    ponto de vista terico.

    Outro aspecto importante a formao contnua dos treinadores, mas

    sendo esta promovida pelos prprios clubes. Esta medida teria como objectivo

    25

  • Reviso da Literatura

    principal fazer com que os treinadores se identifiquem com uma determinada

    forma de trabalhar (Leal & Quinta, 2001: 48). O Coordenador Tcnico poder

    assumir um papel fundamental a este nvel fomentando este gnero de

    iniciativas.

    Segundo Girldez (2002), o Real Madrid forma os seus prprios tcnicos

    atravs de sesses onde se explicam e clarificam um conjunto de conceitos,

    isto tambm tendo em vista a unificao de critrios dos treinadores. Ou seja,

    indo de encontro identidade que se pretende instituir no clube.

    O Sporting Clube de Portugal tem igualmente esta preocupao. Segundo

    Mil Homens (2004: 6), este clube tambm promove a formao dos seus

    prprios tcnicos atravs das Jornadas Tcnicas da Academia onde

    abordado um conjunto de temas ministrados por tcnicos do prprio clube ou

    por tcnicos de outros clubes, entre os quais Manchester United, Nantes e Real

    Madrid.

    Um outro passo essencial para a unificao dos critrios e para uma melhor

    identificao e entendimento do modelo de jogo e do modelo de treino a

    sistematizao do pretendido em documento.

    Segundo Mourinho (in Loureno, 2003: 121) um documento deste tipo

    extremamente importante porque orientador de um processo tendo como

    objectivo definir o modelo de jogo com que me identifico assim como os

    respectivos princpios inerentes ao mesmo e dar a conhecer a todos os

    tcnicos do clube objectivamente as ideias chave que lideram todo o processo

    de construo da equipa e assim possa objectivar o trabalho de formao de

    jogadores compatveis com as nossas necessidades (Mourinho, 2003a: 19).

    Com a elaborao deste documento verificar-se- mais facilmente uma

    identidade ao nvel do treino e do jogo e em funo do pretendido na equipa

    snior do clube ou do projecto de formao.

    Posteriormente, necessrio encontrar dentro da estrutura do clube

    pessoas capazes de em conjunto com o treinador principal controlar o processo

    de formao, nomeadamente, o Coordenador Tcnico, para que a

    operacionalizao do documento seja a mais aproximada possvel.

    26

  • Reviso da Literatura

    2.4.4. Dificuldades na implementao do modelo de clube

    So vrias as dificuldades identificadas na implementao do modelo de

    clube:

    A no estabilizao de uma estrutura directiva (Leal & Quinta, 2001); Pouca estabilidade do treinador da equipa principal (Faria, 2003; Leal &

    Quinta, 2001; Graa, in Vieira, 2004; Paul, in Vieira, 2004; Vale, in

    Vieira, 2004);

    Inexistncia de qualquer projecto bem elaborado com regras bem definidas (Faria, 2003);

    A formao dos treinadores, a necessidade de se identificarem com um determinado projecto e a capacidade de operacionalizao condizente

    com esse projecto (Faria, 2003);

    O no estabelecimento de objectivos a mdio e a longo prazo (Leal & Quinta, 2001).

    Todos estes factores dificultam a implementao de um projecto

    direccionado para a formao.

    De acordo com Guilherme Oliveira (2003: XXIV) a estabilidade do treinador

    e a poltica do clube deve passar por uma definio de um processo de

    formao em que o modelo de jogo deve ser um dos aspectos fundamentais. E

    isto tem de pertencer a uma poltica de clube. O clube tem de achar que isto

    importante e fazer disso um dos aspectos fundamentais da formao. Quando

    um clube no tem pessoas que sejam sensveis a este aspecto, muito

    dificilmente ser possvel que o modelo de jogo seja implementado. Ou seja,

    tem de se desenvolver entre os diversos responsveis do clube uma crena no

    desenvolvimento do projecto para que este resulte. Neste aspecto, o

    Coordenador Tcnico pode desenvolver um papel fundamental como

    responsvel pela unificao dos critrios e verificao do cumprimento dos

    mesmos.

    27

  • Reviso da Literatura

    2.4.5. Ajax: a escola de formao de referncia Nunca nos podemos dar por satisfeitos e manter uma viso crtica de cada um de ns. Uma constante vontade para

    evoluir. este o princpio do Ajax e do Departamento de Formao do Ajax.

    Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 77)

    "Um pas no se mede pela dimenso das fronteiras, mas pelas ambies, valores e ideias.

    Queiroz (2003a: 10)

    A parte humana e ateno para o talento fazem do Ajax um grande clube.

    Adriaanse (2004: 21)

    O Ajax uma das melhores escolas formadoras de jogadores de futebol do

    mundo, onde se formaram jogadores de renome internacional, tais como,

    Johan Cruyff, Marco van Basten, Frank Rijkaard, Frank De Boer, Dennis

    Bergkamp, Marc Overmars, Edgar Davids, Patrick Kluivert, Clarence Seedorf,

    Edwin Van der Sar, e mais recentemente, os jovens jogadores Rafael Van der

    Vaart e Van der Meyde.

    A filosofia inviolvel do Ajax est enraizada no clube desde os anos 30: a

    combinao de tcnica, inteligncia, personalidade e velocidade de execuo

    so melhor expressas de uma forma criativa, logo, com um futebol de ataque.

    A filosofia do clube est acima de qualquer resultado: jogar um futebol ofensivo

    e de risco, e no aceitar nada mais do que a expresso deste futebol no

    terreno de jogo (Kormelink & Seeverens, 1997: X).

    Para fazer corresponder o processo de formao ao que pretendido para

    o jogo, o Departamento de Formao utiliza o acrnimo TIPS para descrever

    os pontos fortes do jovem jogador do Ajax (Adriaanse, in Kormelink &

    Seeverens, 1997: 63):

    T (technique), tcnica: um jovem jogador do Ajax tem de ser tecnicamente evoludo;

    I (intelligence e insight), inteligncia e perspiccia. Capacidade de observar e de antecipar de forma a surpreender o adversrio.

    P (personality), personalidade. Um talento do Ajax ter de ser capaz de comunicar com os outros, ser lder e criativo, demonstrar audcia, ser

    receptivo aos seus companheiros de equipa e de trabalhar de forma

    disciplinada.

    28

  • Reviso da Literatura

    S (speed), velocidade. Velocidade de marcao, de mobilidade, de execuo e velocidade em grandes distncias.

    Desta forma, pretende-se que um jovem jogador do Ajax seja tecnicamente

    dotado, futebolisticamente inteligente, com personalidade interessante e com

    boa velocidade (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 64).

    Segundo Adriaanse (1993: VI) o grande segredo da formao do Ajax est

    no facto de os nossos jogadores habituarem-se a jogar no nosso sistema

    desde muito jovens. medida que vo crescendo, vo melhorando as suas

    capacidades para o lugar que lhes destinado e quando tiverem 18 ou 19

    anos, caso a equipa principal necessite deles, esto prontos, desde logo, a

    integrarem-se sem estranharem diferenas na forma de jogar. J sabem

    perfeitamente quais as tarefas que tm de desempenhar.

    Por outro lado, tambm se defende a ideia de que necessrio encontrar

    jogadores multifuncionais. Eles tm de ter a capacidade de mudar de posies.

    No futuro, no haver lugar no futebol de alto rendimento para jogadores que

    s sabem jogar numa posio (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997:

    65). Assim, dada a importncia da universalidade, durante o processo de

    Formao os jogadores jogam em duas ou trs posies para alm da posio

    inicial para a qual foram seleccionados.

    Outros factores de sucesso apontados por Adriaanse (1993: VII) so a

    forma de treinar em que se d alta importncia ao jogo enquanto meio de treino

    e a manuteno das mesmas pessoas a trabalhar nos escales de formao

    de forma a perceberem melhor o clube e a sua mstica que transmitem aos

    mais novos.

    No Ajax no se descura a formao integral dos jovens jogadores. Segundo

    Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 74), o Ajax d alta prioridade

    educao. No entanto, rejeitamos a ideia de colocar todos os jogadores na

    mesma escola. essencial para o desenvolvimento da personalidade das

    crianas permitir o seu crescimento no seu meio, ou seja, com a sua famlia, na

    sua rua, com os seus amigos e na sua escola. por esse motivo que no

    temos hotis na academia. Assim, s os temos c cerca de seis horas por dia

    (Holsheimer, 2004: 23).

    29

  • Reviso da Literatura

    Desta forma, o clube estabeleceu protocolos entre o clube e as escolas

    onde os jogadores esto matriculados que lhes permite frequentar a escola

    com currculos e horrios especiais. Assim, os jovens jogadores tm a

    possibilidades de permanecer no clube entre as 13 e as 19 horas. Durante este

    espao de tempo, o clube responsvel por: uma refeio, um treino, um

    tempo de estudo e pelo transporte escola/clube e clube/casa. Na estrutura do

    clube, existem espaos prprios para o apoio escolar, onde esto colocados

    um determinado nmero de professores, contratados pelo clube, que do apoio

    aos jogadores com dificuldades escolares e que os acompanham nas

    deslocaes compensando as aulas a que estes foram autorizados a faltar.

    Cerca de 50 por cento dos jogadores do Centro de Formao concluem

    estudos pr-universitrios e alguns deles prosseguem um curso superior,

    mesmo depois de integrados na equipa snior (A Bola, 1996: 20).

    No interior do centro de treino De Toekomst (que significa em portugus

    O Futuro) existe uma lista de regras de disciplina que, caso no sejam

    acatadas, podem, inclusivamente, levar expulso do clube (Revista 10,

    2004: 23). As regras principais so as seguintes: nenhum jogador pode

    participar em jogos de futsal; uma aco violenta ou anti-desportiva no

    detectada pelo rbitro est sujeita a punio no interior do clube; no

    permitido usar brincos e cabelo comprido; o uso de caneleiras obrigatrio nos

    treinos, para qualquer idade; as meias so obrigatoriamente puxadas para cima

    e a camisola tem de estar por dentro dos cales; cada jogador responsvel

    pela limpeza e manuteno das suas botas no final dos treinos; proibida a

    utilizao de telemveis (A Bola, 1996: 20).

    Assim, o sucesso do Ajax enquanto clube de formao parece estar

    relacionado com uma filosofia de clube bem definida e instituda ao longo de

    vrios anos. Filosofia essa que tem em conta a formao futebolstica e social

    dos jovens jogadores formao integral e onde imperam regras rigorosas

    de forma a criar jogadores disciplinados quer do ponto de vista tctico, quer do

    ponto de vista social.

    30

  • Reviso da Literatura

    2.5. COORDENADOR TCNICO COMO REGULADOR E DINAMIZADOR DE TODO O PROCESSO DE FORMAO

    [O Coordenador Tcnico assume] uma tarefa importante e difcil.

    Mourinho (2002a: 15)

    Na implementao de um Modelo de Clube/Modelo de Formao

    necessrio que se verifique continuidade e similaridade de processos nos

    diferentes escales quer ao nvel do treino, quer ao nvel do jogo.

    Mourinho (2002a: 15) da mesma opinio ao afirmar que um projecto de

    formao quando implementado torna-se fundamental que os treinadores das

    camadas jovens saibam que direco tomar e saibam de que maneira podem

    colaborar com o futebol mais importante do clube, que o futebol snior. Tem

    de haver uma similaridade nos processos todos e tem de haver um

    acompanhamento dirio do futebol de formao, para ver de que forma h, de

    facto, similaridade entre o que se pretende e aquilo que realizado.

    Assim, necessrio que exista algum que faa a interligao entre os

    diversos departamentos, os diversos escales e os diversos treinadores do

    clube, uniformizando para isso critrios de seleco, de orientao e,

    fundamentalmente, de aco (Leal & Quinta, 2001: 49). Esse elemento dever

    ser o Coordenador Tcnico (Leal & Quinta, 2001; Latorre, 2004).

    Este cargo implica um grande conhecimento do funcionamento do clube e

    de toda a sua filosofia. Da que Mourinho (2002a:15) refira que importante

    encontrar dentro da estrutura do clube pessoas capazes de estarem ao lado do

    treinador principal no controlo desse processo de treino. Adriaanse (1996: 21)

    concorda com esta viso afirmando que este cargo precisa de algum

    identificado com toda a filosofia do clube.

    2.5.1. Funes do Coordenador Tcnico

    Mourinho (2003e: 33) afirma que o Coordenador Tcnico ter como

    principal funo realizar a relao pedaggica e metodolgica entre a rotina da

    equipa principal e a rotina dos escales de formao. Desta forma, este tcnico

    observar os treinos e dialogar com o treinador principal que forma a perceber

    o que este ltimo privilegia e o porqu de trabalhar de determinada forma.

    31

  • Reviso da Literatura

    Posteriormente, a verificao da implantao do modelo de jogo realizada

    atravs da aco do Coordenador Tcnico, que assiste a treinos e jogos das

    diferentes equipas do Departamento de Formao (Adriaanse, in Kormelink &

    Seeverens, 1997; Girldez, 2003; Paul, 2003).

    No entanto, as tarefas e funes do Coordenador Tcnico ultrapassam as

    questes estritamente relacionadas com o jogo e o treino propriamente ditos.

    Segundo Girldez (2002), as funes do Coordenador Tcnico do Real Madrid

    esto relacionadas com a coordenao dos treinadores das equipas de

    Formao, desde o Real Madrid B at aos Benjamins e com a coordenao de

    todas as actividades dirias que existam na Cidade Desportiva das equipas de

    Formao (treinos, formao de treinadores, comunicao com os pais,

    eventos desportivos).

    2.5.1.1. Comunicao com as equipas tcnicas Uma das tarefas fundamentais do Coordenador Tcnico est relacionada

    com a escolha dos treinadores do Departamento de Formao e com a

    comunicao que estabelece com estes de forma a assegurar que todos

    estejam bem informados e que todos se direccionem no mesmo sentido.

    Desta forma, no Ajax o Coordenador Tcnico realiza reunies todas as

    semanas com os treinadores e com os prprios directores de jogo (Adriaanse,

    in Kormelink & Seeverens, 1997: 72): Todas as semanas reno-me com cada

    treinador e observo cada equipa a jogar pelo menos uma vez em cada duas

    semanas. Ou seja, a comunicao entre os diferentes agentes dentro da

    estrutura do prprio clube e a observao do trabalho das diferentes equipas

    do Departamento de Formao por parte do Coordenador torna-se fundamental

    para se verificar identidade.

    Segundo Girldez (2002), no Real Madrid esta preocupao tambm se

    verifica: com Jorge Valdano [director desportivo na altura] havia uma reunio

    de direco todas as semanas onde todos os treinadores expunham as

    diversas situaes ocorridas nos treinos e jogos. Com Vicente del Bosque

    [treinador principal na altura] havia um dilogo muito directo.

    Assim, o Coordenador Tcnico do Clube deve harmonizar as expectativas

    dos treinadores com os princpios e os objectivos propostos pelo clube, com o

    32

  • Reviso da Literatura

    fim de favorecer um trabalho em equipa e implicar ao mximo todos os agentes

    educativos do clube no processo de formao integral do jogador de futebol. O

    coordenador deve igualmente oferecer ideias contnuas de trabalho para

    aumentar a qualidade dos treinadores. O trabalho em equipa determinar o

    xito do planeamento anual (Latorre, 2004: 42).

    2.5.1.2. Regulamento interno Outra tarefa do Coordenador Tcnico passa pelo estabelecimento e/ou

    fazer cumprir do regulamento interno.

    Este documento tem como objectivo, atravs das situaes tipificadas,

    garantir a coerncia desejvel das atitudes e dos comportamentos dos jovens

    jogadores (Departamento de Formao do Clube Desportivo Trofense, 2002:

    82).

    Segundo Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 66), o

    comportamento em grupo extremamente significante para o jovem jogador do

    Ajax e isso significa que tm de aprender a ter considerao para com os

    outros. Desta forma, estabeleci um conjunto de regras disciplinares s quais os

    jogadores tm de aderir em absoluto. Acordos foram estabelecidos tendo em

    vista o comportamento durante os jogos e os treinos. A disciplina no tem de

    ser rgida, mas essencial que as mesmas regras sejam aplicadas a todos os

    nveis. Nem mesmo as regras de comportamento para a hora do almoo

    podem diferir de uma equipa para outra. Da a razo de colocar em documento

    escrito o regulamento.

    Este mesmo princpio seguido no Real Madrid, pois as regras de

    comportamento no conhecem privilgios seja qual for o jogador. As normas

    dos treinos e dos jogos, nas concentraes servem para incutir nos jovens

    jogadores o que significa representar o Real Madrid (Girldez, 2002). Ou seja,

    pensamos que a cultura de clube incorpora um conjunto de valores e de

    princpios que devem ser respeitado por todos e transmitido aos jovens

    jogadores desde muito cedo. Isto permitir fomentar uma cultura distinta, no

    s ligada a forma de jogar, mas, tambm, a um vasto sentimento prprio que

    cada clube deve ter (Neves, 2003: 37).

    33

  • Reviso da Literatura

    O estabelecimento de um regulamento interno torna-se fundamental de

    forma a normalizar os comportamentos dos jovens jogadores e pelo

    desenvolvimento de uma cultura especfica do clube.

    2.5.1.3. Comunicao com os Pais A comunicao com os pais dos jogadores dever tambm ela ser

    assegurada pelo Coordenador Tcnico.

    No Ajax, este aspecto considerado muito importante, pois os pais devem

    estar informados acerca do processo de formao dos seus filhos (Adriaanse,

    in Kormelink & Seeverens, 1997: 62).

    Esta mesma preocupao verifica-se no Real Madrid: os Pais so uma

    figura vital para qualquer ser humano. E damos grande importncia a este

    facto, pois temos organizado reunies peridicas com os pais dos jogadores

    para trocarmos informaes e adiantarmos os problemas que podem ter as

    situaes que ocorrem no processo de formao: quando um jovem jogador

    chega ao clube, quando joga muito, quando no joga, quando deve abandonar

    o clube, quando no vive em Madrid. So situaes peridicas que se repetem

    todos os anos (Girldez, 2002).

    Desta forma, os Pais devem ser informados acerca do processo de

    formao dos seus filhos e o Coordenador Tcnico dever assumir essa tarefa.

    2.5.1.4. Outras tarefas Para alm das tarefas supracitadas, Latorre (2004: 35) sistematizou em dez

    pontos um vasto conjunto de tarefas de coordenao:

    1. Criao de uma normativa interna geral.

    2. Elaborao de organigrama tcnico, horrios, grupos de treino,

    distribuio de espaos.

    3. Organizao de competies para os grupos de Escolas.

    4. Formao dos tcnicos.

    5. Controlo dos tcnicos.

    5.1. Reunies.

    5.2. Mecanismos de controlo de planificao, controlo de contedos, de

    sesses e tarefas de treino.

    34

  • Reviso da Literatura

    5.3. Desenvolvimento de sesses prticas conjuntas com base em

    contedos tctico-tcnico determinados.

    5.4. Testes e sociogramas.

    5.5. Assistncia aos jogos.

    6. Comunicao com os pais e encarregados de educao dos jogadores.

    7. Organizao de actividades de final de semestre e de curso.

    8. Formao dos Directores de Equipa.

    9. Trabalho multidisciplinar com outros agentes (mdicos, massagistas,

    enfermeiros, directores).

    10. Autoformao.

    O Coordenador Tcnico assume assim papel fundamental na construo de

    todo o processo de formao sendo o regulador e o verificador da identidade

    que se pretende instalar no clube ao nvel do jogo, do treino e de todos os

    comportamentos fora e dentro do terreno de jogo, sendo um elemento

    essencial na dinamizao desse mesmo processo.

    35

  • Material e mtodos

    3. MATERIAL E MTODOS

    3.1. CARACTERIZAO DA AMOSTRA

    A amostra constituda por uma entrevista ao Mestre Pedro S,

    Coordenador Tcnico do Departamento de Formao do Clube Desportivo

    Trofense.

    3.2. METODOLOGIA DE INVESTIGAO

    A parte terica deste trabalho sustentou-se numa pesquisa bibliogrfica e

    documental, de forma a seleccionar a informao pertinente para o estudo da

    problemtica seleccionada.

    A nvel prtico, a metodologia utilizada na recolha dos dados consistiu numa

    entrevista registada atravs de um gravador Mini-disc digital Sony MZ-NH900 e

    a sua posterior transcrio para o papel com a devida autorizao do

    entrevistado.

    importante salientar que as questes eram abertas, de modo a que o

    entrevistado pudesse expor os seus pontos de vista de uma forma clara e

    pessoal. Posteriormente, as entrevistas foram transcritas para o programa

    Microsoft Office Word 2003 do sistema operativo Windows XP Professional.

    3.3. RECOLHA DE DADOS

    A recolha de dados referente a este trabalho decorreu no dia 9 de

    Novembro de 2005, na Escola Secundria da Trofa, sendo que posteriormente

    tiveram lugar mais do que um encontro com o entrevistado para esclarecimento

    de dvidas.

    36

  • Apresentao e anlise da entrevista

    4. APRESENTAO E ANLISE DA ENTREVISTA

    Aps a realizao da reviso bibliogrfica e da entrevista, ser efectuada a

    anlise das respostas do entrevistado, no sentido de se comparar e discutir o

    contedo das mesmas, tendo em vista os aspectos tratados na reviso

    bibliogrfica.

    4.1. A IMPORTNCIA FINANCEIRA, DESPORTIVA E SOCIAL DA FORMAO PARA O CLUBE DESPORTIVO TROFENSE

    A nossa formao s faz sentido se formos capazes de a rentabilizar, se isso no acontecer, mais vale no termos

    formao.

    Paul (2003: XXVII)

    A melhor e nica forma de preparar e antecipar o futuro cuidar da preparao dos jovens que esto no clube.

    Assim sendo, teremos de encontrar as solues para o presente, mas preparando o futuro deste clube.

    Queiroz (2003b)

    Esta direco deixou bem claro que, desde que cheguei ao clube, a essncia madridista devia estar presente no seu

    projecto e que a sua essncia a formao. Quando chegamos seis jogadores estavam na primeira equipa; hoje esto

    treze. Acredito neste modelo, que arriscado, mas estamos convencidos que vai dar resultados.

    Butragueo (2004)

    A formao no Clube Desportivo Trofense tem, segundo S, uma

    importncia vital, porque est a formar jogadores para o plantel snior do

    clube. Esta viso sobre a formao parece estar condizente com a reviso

    bibliogrfica por ns efectuada.

    Como afirma Frade (2002, in Vieira, 2004: 26), a formao a base do

    futebol profissional, por isso tem de haver uma preocupao elevada com ela.

    Giraldez (2002) da mesma opinio afirmando que a formao tem de ser a

    base dos plantis [das equipas profissionais].

    Desta forma, clubes como o Ajax (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens,

    1997) e o Sport Lisboa e Benfica (Carraa, 2005b) definiram como objectivo a

    integrao de, pelo menos, 3 jogadores por poca desportiva no plantel snior,

    tal como no Clube Desportivo Trofense (S).

    Segundo S, o plantel snior do Clube Desportivo Trofense tem 10 jovens

    jogadores que realizaram a sua formao no Departamento de Formao do

    37

  • Apresentao e anlise da entrevista

    clube, sendo que, neste momento, 5 desses jogadores competem

    regularmente.

    Neves (2003: 34) reitera que nos clubes do seu estudo (Futebol Clube do

    Porto, Vitria de Guimares, Sporting Clube de Portugal, Celta de Vigo e Real

    Madrid) os escales de formao tm objectivos muito claros, que se prendem

    com a formao de jogadores de qualidade, para que possam competir na

    equipa mais representativa do clube, ou melhor na sua equipa de elite.

    Desta forma, poderemos afirmar que o Clube Desportivo Trofense investe

    na form