41 - qualidade e licitação de obras públicas -dissert uff - andre kuhn

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CENTRO TECNOLÓGICO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL ANDRÉ KUHN QUALIDADE E LICITAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS: UMA ANÁLISE CRÍTICA NITERÓI 2002

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Page 1: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CENTRO TECNOLÓGICO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL

ANDRÉ KUHN

QUALIDADE E LICITAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS: UMA ANÁLISE CRÍTICA

NITERÓI 2002

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ANDRÉ KUHN

QUALIDADE E LICITAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS: UMA ANÁLISE CRÍTICA

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Produção Civil.

Orientador: Prof. Dr. SÉRGIO ROBERTO LEUSIN DE AMORIM

NITERÓI 2002

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ANDRÉ KUHN

QUALIDADE E LICITAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS:

UMA ANÁLISE CRÍTICA

Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Engenharia Civil da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do Grau de Mestre. Área de Concentração: Produção Civil.

Aprovado em dezembro de 2002

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________ Prof. Dr. Sérgio Roberto Leusin de Amorim - Orientador

Universidade Federal Fluminense

________________________________________________ Prof. Dr. Miguel Luiz Ribeiro Ferreira

Universidade Federal Fluminense

________________________________________________ Prof. Dr. Nélio Domingues Pezzolato

Universidade Federal Fluminense

________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Antônio Silveira Lopes

Instituto Militar de Engenharia

NITERÓI 2002

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À minha mãe, que muito contribuiu para minha formação.

À minha esposa e filha, pela força e compreensão.

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AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Sérgio Roberto Leusin de Amorim - meu orientador, pelo

apoio e dedicação, uma luz de conhecimento nos momentos mais

difíceis.

Aos professores do Mestrado - pelos conhecimentos adquiridos.

A todos que contribuíram, direta e indiretamente, para a realização

deste trabalho.

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SUMÁRIO 1 CONCEITOS, IMPORTÂNCIA E JUSTIFICATIVA, p. 10 1.1 INTRODUÇÃO, p. 10 1.1.1 Objetivos, p. 10 1.1.2 Estrutura de trabalho, p. 10 1.2 DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA DA LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO PÚBLICA, p. 12 1.2.1 Princípios da Licitação Pública, p. 13 1.2.2 Legislação Atual – Lei 8.666/93, p. 15 1.2.2.1 Conceitos Básicos, p. 15 1.2.3 Classificações: Regimes de Execução, Tipos e Modalidades de Licitação, p. 17 1.3 DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA DA QUALIDADE, p. 20 1.3.1 Definição de Qualidade, p. 20 1.3.2 Importância da Qualidade, p. 21 1.3.2.1 ISO 9000, p. 22 1.3.2.2 PBQP-H, p. 23 2. A QUALIDADE NA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO, p. 26 2.1 SISTEMAS DE QUALIDADE APLICADOS À INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO, p. 27 2.2 A GARANTIA NA CONCLUSÃO DA OBRA, p. 31 3. MODELOS DE LICITAÇÕES E CONTRATOS NO BRASIL E NO EXTERIOR, p. 35 3.1 A LICITAÇÃO NO BRASIL, p. 35 3.1.1 Dificuldades Encontradas, p. 35 3.1.2 Falhas e Vícios Comuns em Licitações Públicas, p. 38 3.2 O CONTRATO ADMINISTRATIVO, p. 40 3.3 O CONTRATO PRIVADO, p. 41 3.3.1 Principais Formas de Contratação, p. 42 3.4 A LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO NO MUNDO, p. 44 3.4.1 Licitações e Contratos nos Estados Unidos, p. 44 3.4.2 Licitações e Contratos no Japão, p. 47 3.4.3 Licitações e Contratos na Europa, p. 49

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4. ANÁLISE DOS PROBLEMAS INERENTES A CONTRATAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS, p. 51 4.1 O MENOR PREÇO PARA OBRAS PÚBLICAS, p. 51 4.2 AVALIAÇÃO DA EMPRESA VERSUS AVALIAÇÃO DA PROPOSTA, p. 56 4.3 DIFICULDADE PARA SE EXIGIR QUALIDADE NO PROCESSO LICITATÓRIO DA OBRA PÚBLICA, p. 57 5. SUGESTÕES PARA GARANTIR QUALIDADE NA OBRA PÚBLICA, p. 63 5.1 SISTEMA DE QUALIDADE NA OBRA PÚBLICA, p. 63 5.2 SUGESTÕES PARA OS REGULAMENTOS LICITATÓRIOS, p. 64 5.2.1 Sugestões sem Alteração da Legislação, p. 64 5.2.2 Sugestões com Alteração da Legislação, p. 68 6. CONCLUSÃO, p. 72 7. OBRAS CITADAS, p. 74 8. APÊNDICES, p. 78 8.1 ANÁLISE DE CUSTO DE CAPITAL EM RELAÇÃO AO ATRASO DE PAGAMENTO DE ÓRGÃOS PÚBLICOS, p. 78 8.2 ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DO CRONOGRAMA FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA, p. 86 8.3 ANÁLISE DO PREÇO INEXEQÜÍVEL PARA OBRAS PÚBLICAS, p. 89 8.4 SUGESTÃO DE ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE PROPOSTAS EM LICITAÇÕES DE OBRAS PÚBLICAS, p. 92

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LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS

ABC Associação Brasileira de COHABs

ABCP Associação Brasileira de Cimento Portland

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas

ABPC Associação Brasileira dos Produtores de Cal

ADEMI-RJ Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado

Imobiliário do Rio de Janeiro

ANAMACO Associação Nacional dos Comerciantes de Materiais de

Construção

ANFACER Associação Nacional de Fabricantes de Cerâmica para

Revestimento

ANTAC Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído

Art. Artigo

BDI Bonificações e Despesas Indiretas

CAIXA Caixa Econômica Federal

CBIC Câmara Brasileira da Indústria da Construção

COBRACON/ABNT Comitê Brasileiro de Construção Civil da Associação

Brasileira de Normas Técnicas

CONFEA Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia

CREA Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia

CRO/3 Comissão Regional de Obras da 3º Região Militar do

Exército Brasileiro

CTECH Comitê Nacional de Desenvolvimento Tecnológico da

Habitação

DOD U.S. Department of Defense

EIC European International Contractors

EMOP Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro

EPC Engineering, Procurement and Construction

EUA Estados Unidos da América

FAR Federal Acquisition Regulation

FINEP Financiadora de Estudos e Projetos

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GSA General Services Administration

IBS Instituto Brasileiro de Siderurgia

inc. Inciso

INMETRO Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade

Industrial

ISO International Standard Organization

MLIT Ministry Of Land, Infrastructure And Transport Government

Of Japan

NSPE National Society of Professional Engineers

OCC Organismos Certificadores Credenciados

OECD Organisation For Economic Co-Operation And Development

PBQP-H Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat

QUALIHAB-SP Programa de Qualidade do Governo do Estado de São Paulo

QUALIOP-BA Programa de Qualidade das Obras Públicas do Governo do

Estado da Bahia

QUALIPAV-RJ Programa da Qualidade na Pavimentação, Obras de Arte

Especiais e Drenagem Urbana da Cidade do Rio de Janeiro

SEAP Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio

SEBRAE Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

SEDU/PR Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano da

Presidência da República

SINAENCO Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e

Engenharia Consultiva

SINAOP Simpósio Nacional de Auditoria em Obras Públicas

SINDUSCON-RIO Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado do Rio

de Janeiro

SiQ-C Sistema de Qualificação de Empresas de Serviços e Obras –

Construção

TMA Taxa mínima de atratividade

VE Value Engineering

VPL Valor presente líquido

§ Parágrafo

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RESUMO

Este trabalho apresenta a situação atual do processo licitatório e contratação de obras públicas no Brasil e seus problemas; questiona as dificuldades de se obter qualidade em obras públicas e sugere procedimentos para melhoria do processo.

Para atingir tais metas foi feito um estudo aprofundado sobre a legislação vigente, consultando leis, decretos, atos normativos e publicações. Foi desenvolvida também uma pesquisa dos sistemas de qualidade aplicados à indústria da construção, além de uma pesquisa sobre o panorama mundial em relação à licitação e contratação de obras.

Ao analisar problemas inerentes à licitação de obras públicas no Brasil, foram apresentadas sugestões para melhoria do processo licitatório, buscando garantir a qualidade da obra pública.

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ABSTRACT

This work presents the current situation of the auction process and public

works contracts in Brazil and theirs problems; questions the difficulties of to obtain quality in public works and suggests procedures for improvement of the process.

To reach such goals it was made a deepened study about the effective legislation, consulting laws, ordinances, normative acts and publications. It was developed a research of the quality management systems also applied to the construction industry, besides a research on the world panorama in relation to the auction and recruiting of works.

When analyzing inherent problems to the public works auction in Brazil, suggestions were presented for improvement of the auction process, looking for to guarantee the quality of the public work.

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1. CONCEITOS, IMPORTÂNCIA E JUSTIFICATIVA

1.1. INTRODUÇÃO 1.1.1. Objetivos

O objetivo deste trabalho é apresentar a situação atual do processo

licitatório e contratação de obras públicas no Brasil e seus problemas; questionar

as dificuldades de se obter qualidade em obras públicas e sugerir procedimentos

para melhoria do processo.

1.1.2. Estrutura do Trabalho

Para atingir tais metas foi feito um estudo aprofundado sobre a legislação

vigente, consultando leis, decretos, atos normativos e publicações dos mais

conceituados juristas na área de Direito Administrativo. Foi desenvolvida também

uma pesquisa dos sistemas de qualidade aplicados à indústria da construção,

através de estudo das normas International Standard Organization (ISO-9000) e

seus comentários em publicações de diversos autores, além do Programa

Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H), através de artigos

de diversos órgãos públicos e privados disponíveis na Internet. Para obter uma

contribuição externa para o trabalho, por falta de publicações de licitações e

contratos de obras públicas voltadas diretamente para a engenharia civil, foi

realizada uma pesquisa na Internet sobre os Estados Unidos, Japão e Europa,

obtendo informações que retratam o panorama mundial em relação à licitação e

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contratação de obras. Pelo mesmo motivo, no Brasil, foi utilizada a experiência

profissional do próprio autor em grande parte da dissertação.

O estudo englobou um período a partir de 1993, data de publicação da

atual lei de licitações no Brasil, até os dias atuais. Pela dificuldade encontrada em

caracterizar a prática aplicada nas licitações de obras públicas, tanto pelos

administradores como pelos licitantes, foi feita uma análise lógica do processo, e

não uma pesquisa de campo, que possa servir de base para trabalhos futuros.

Tendo em vista a falta de conhecimento de termos e conceitos sobre

licitações e contratos e sistemas de qualidade, o primeiro capítulo, além de

apresentar os objetivos e a estrutura do trabalho, objetiva também descrever

algumas definições necessárias para o perfeito entendimento do estudo

desenvolvido, além de procurar demonstrar a importância do tema.

O segundo capítulo trata da qualidade na indústria da construção, as

exigências contratuais quanto a certificados de qualidade e garantias de

conclusão de obra. Já no terceiro capítulo são apresentados modelos de

licitações e contratos de obras no Brasil e no exterior, não somente modelos

públicos, mas privados também, onde os países analisados são Estados Unidos e

Japão, mais a Europa de forma genérica.

No quarto capítulo são analisados problemas inerentes à licitação de obras

públicas no Brasil, abordando alguns temas polêmicos: menor preço para obras,

processos de avaliação de propostas, exigência de qualidade na fase licitatória e

artifícios possíveis de serem utilizados pelos licitantes.

O quinto capítulo é uma apresentação de sugestões para melhoria do

processo licitatório, buscando garantir a qualidade da obra pública. As sugestões

apresentadas se dividem em duas partes: sugestões com e sem alteração da

legislação vigente no Brasil. E, por fim, o sexto capítulo, onde são apresentadas

as conclusões do trabalho.

Para ilustrar alguns procedimentos de possível ocorrência no processo

licitatório, mas que sua apresentação no corpo principal do trabalho poderia

prejudicar o seu entendimento, foram inseridos quatro apêndices, que são textos

apresentados pelo autor em seminários e aulas.

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O apêndice 8.1. é uma simulação de um atraso de pagamento de uma obra

fictícia, onde é analisado o custo do capital para cada situação de atraso

permitida em Lei.

O apêndice 8.2. é a apresentação, através de uma simulação, de uma

manobra possível de ser aplicada de acordo com a Lei atual, para se obter um

ganho maior em uma obra.

O apêndice 8.3 apresenta a explicação da fórmula, prevista em Lei, para

definição do preço inexeqüível em uma obra pública. Foram utilizador valores

aleatórios em uma simulação, somente para facilitar o entendimento da regra.

O apêndice 8.4. é uma sugestão do autor de um roteiro para elaboração de

propostas em licitações de obras públicas, baseado no processo licitatório atual.

1.2. DEFINIÇÕES E IMPORTÂNCIA DA LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO PÚBLICA

Quando uma empresa privada deseja adquirir um produto ou serviço, ela

tem liberdade para escolher a forma de seleção e contratação que melhor se

adaptar às suas necessidades e às exigências do empreendimento. Um Órgão

Público não tem tal poder, pois seus procedimentos são pré-determinados por leis

e normas, que limitam a liberdade do administrador e definem a seleção e o

contrato de uma forma genérica, muitas vezes mantendo processos iguais para

necessidades muito distintas.

Justifica-se a diferença de procedimentos nas duas situações, pois o dono

da empresa não vai tomar atitudes que possam prejudicar aquilo que é seu, mas

o administrador público cuida daquilo que não lhe pertence, obrigando assim a

necessidade de regras para garantir o cumprimento dos princípios básicos que

devem reger a licitação pública, como a igualdade, publicidade, probidade

administrativa e outros. Mas o extremo também é prejudicial, a rigidez da norma

muitas vezes obriga o administrador a abrir mão da qualidade para atender à Lei.

Por isso, mesmo em contratos públicos, a seleção e o contrato deveriam se

adaptar ao empreendimento, e não o contrário.

Ao se estudar a licitação e contratação de obras públicas, observa-se que o

foco da preocupação da Administração Pública, da Sociedade, da mídia e de

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outros setores está no desvio de recursos públicos, mas também deveria haver

uma atenção maior com produto final a ser recebido, o objeto do contrato. O

prejuízo decorrente de obras mal feitas ou inacabadas pode ser tão ou mais

nocivo aos cofres públicos quanto à corrupção e ao desvio de verbas. Já o estudo

de aplicação de sistemas de qualidade é uma forma de se tentar garantir que uma

empresa contratada atenda às necessidades da Administração Pública. Mas,

muitas vezes, essa tentativa esbarra nos obstáculos legais.

Ao se analisar esses obstáculos legais, deve-se atentar às definições e

procedimentos previstos na Lei, a começar pelo próprio termo Licitação1, que é

um procedimento administrativo que visa selecionar a proposta mais vantajosa

para a Administração Pública, atendendo conjuntamente o princípio constitucional

da isonomia entre os participantes.

Nos dias atuais, com a constante exposição de fatos pela mídia, o tema

Licitações sempre está em pauta, e geralmente sendo explorado negativamente.

Os aspectos mais criticados são o superfaturamento e a péssima qualidade das

obras públicas.

A legislação atual pode ser considerada falha por muitos, mas o fato é que

o desconhecimento das leis e regulamentos é, em grande parte, causa de

constantes erros de administradores públicos e licitantes.

Segundo Justen Filho (2000, p. 502), o Contrato Administrativo é um

acordo de vontades entre um Órgão da Administração Pública e o particular, onde

serão gerados direitos e deveres entre as partes. Ele difere do contrato privado

em relação ao interesse público, que sempre prevalecerá sobre o interesse

privado e tornando, na prática, o contato administrativo sujeito a alterações

unilaterais previstas em Lei, por parte da Administração Pública.

1.2.1. Princípios da Licitação Pública

A legislação pertinente a Licitações e Contratos deve atender a princípios

que, segundo Justen Filho (2000, p.57), são as origens das normas, pois todas

1 Destinação prevista no art.3º, da Lei 8.666/93.

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elas são interpretadas à sua luz. Sendo assim, os princípios servirão de base para

solução de dúvidas.

A própria legislação vigente2 cita, em seu artigo 3o, os princípios básicos

que regem a Licitação Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade,

igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento

convocatório e julgamento objetivo.

A igualdade entre os participantes não significa proibição de diferenciação

entre eles, mas sim que este critério de diferenciação deverá ser bem claro no

processo licitatório. A própria Administração, ao procurar escolher alguém para

contratar, o fará baseado em uma diferença entre os participantes. De acordo

com Meirelles (2002, p. 30), a igualdade é o "princípio primordial da licitação",

inclusive previsto na Constituição Federal, em seu Art. 37, inc. XXI, mas não é

impedimento para o estabelecimento de requisitos mínimos para participação do

processo licitatório.

O princípio da legalidade refere-se à lei, que define as condições de

atuação dos agentes administrativos. A Lei permite a liberdade de escolha da

Administração Pública em relação ao objeto, especificações, condições de

pagamento e outros. Isto é, o Administrador pode escolher as condições do

contrato futuro, desde que o faça com antecedência. Tais escolhas farão parte do

instrumento convocatório, que também como a Lei, determinará as condições da

licitação. Desta forma o princípio da vinculação ao instrumento convocatório

garante o atendimento do que é determinado pelo Edital de Licitações e seus

anexos.

Os princípios da impessoalidade e do julgamento objetivo determinam um

critério objetivo de julgamento que não considera as preferências pessoais ou

vontades do julgador. A moralidade e probidade estão relacionadas à reprovação

de condutas incompatíveis com os valores jurídicos, determinando um ambiente

de honestidade e seriedade na licitação, tanto por parte da administração quanto

por parte dos licitantes.

A publicidade visa permitir que qualquer pessoa tenha acesso a todas as

informações do processo licitatório, garantindo assim uma transparência dos

certames e a regularidade dos atos praticados. 2 Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993

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1.2.2. Legislação Atual – Lei 8.666/93

As normas gerais sobre licitações e contratos públicos no Brasil são

estabelecidas pela Lei n.º 8.666, de 21 de junho de 1993. Conforme artigo 1o,

parágrafo único, subordinam-se ao regime dessa Lei, além dos órgãos da

administração, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as

empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades

controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e

Municípios.

Cada Instituição Pública pode ter suas normas próprias para Licitações e

Contratos, mas sempre atendendo ao estabelecido na Lei n.º 8.666 e aos seus

princípios básicos. Todavia, de acordo com a Emenda Constitucional 19, de 04 de

junho de 1998, foi dada nova redação ao art. 173, § 1º, inc. III, onde ficou claro,

segundo Meirelles (2002, p. 102), que empresas públicas que exercem atividade

econômica, quanto à licitação e contratação, ficarão somente sujeitas aos

princípios da Administração Pública, não se sujeitando às regras rígidas da Lei

8.666/93. Tal afirmação é compartilhada por outros juristas, como Lomar (2000, p.

13 et. seq.). Sendo assim, esse respaldo legal permite à Petrobrás, por exemplo,

aplicar procedimentos licitatórios mais flexíveis.

Algumas definições técnicas, apesar de serem conhecidas por todos os

profissionais de Engenharia, são importantes de serem abordadas, pois muitas

vezes a legislação vigente pode ter uma interpretação diferente do que é

ensinado nos bancos escolares. Outras definições são de uso comum na

Administração Pública, não fazem parte do Ensino Acadêmico, mas são

importantes para o estudo dos processos de licitação e contratação de obras

públicas.

1.2.2.1. Conceitos básicos

“Entende-se por Licitação aquele procedimento administrativo (somatório de vários atos administrativos vinculados no qual o antecedente informa e fundamenta o conseqüente) destinado a selecionar a melhor proposta de

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16

fornecimento, aquela que seja a mais vantajosa para a administração, e onde todos os ofertantes devem ser tratados com absoluto respeito e igualdade, incluindo-se aí o exame da situação técnica e econômica dos interessados”. (Mukai, 1995, p.1)

Diversos juristas brasileiros, que comentam a Lei de 8.666/93, deixam bem

claro o objetivo da Licitação, que é a classificação da melhor proposta, e não a

escolha da melhor empresa a ser contratada.

Obra e Serviço3: De acordo com a Lei n.º 8.666/93, obra é toda construção,

reforma, fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou

indireta. Já serviço é toda atividade destinada a obter determinada utilidade de

interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação,

montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção,

transporte, locação de bens, publicidade, seguro ou trabalhos técnico -

profissionais. Observa-se que tais conceitos são falhos, pois não houve uma

definição para obra, e sim a citação de diversas atividades que são consideradas

obras. Quanto à definição de serviço, ela é insuficiente, pois uma obra também

pode se encaixar nesta definição: ser uma atividade destinada a obter

determinada utilidade de interesse para a Administração. A importância de se

discutir a diferença entre obra e serviço é devido à forma de se distribuir recursos

na Administração Pública. O administrador não pode utilizar um recurso financeiro

numa destinação diferente daquela a que foi prevista, podendo vir a responder

processo administrativo.

Obras de grande vulto4: são aquelas, segundo a legislação vigente, que

possuem um valor estimado superior a vinte e cinco vezes o limite estabelecido

para concorrência de obras, que equivale a R$ 37.500.000,00. A Lei não faz

diferenciação de tipo de obra, disponibilidade de recursos ou qualquer outro

parâmetro para definição desse valor.

Projeto Básico e Projeto Executivo5: De acordo com a Lei 8.666/93, o

projeto básico é o "conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de

precisão adequada, para caracterizar a obra ou serviço, ou complexo de obras ou

3 Art. 6º, inc. I e II, da Lei 8.666/93. 4 Art. 6º, inc. V, da Lei 8.666/93. 5 Art. 6º, inc. IX e X, da Lei 8.666/93.

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serviços objeto da licitação". Na prática ele deve conter os seguintes elementos:

plantas de arquitetura, especificações técnicas e orçamento. Já o projeto

executivo, segundo a Lei, é "o conjunto dos elementos necessários e suficientes à

execução completa da obra". Segundo o art 7º, § 2º da Lei 8666/93, as obras e

serviços só podem ser licitados, dentre outras exigências, quando houver projeto

básico aprovado por autoridade competente. A qualidade do projeto básico está

diretamente relacionada com o perfeito desenrolar do processo licitatório e

execução do contrato de obras públicas. As definições de projeto básico e

executivo estão melhor definidas e exemplificadas no Manual de Obras Públicas -

Edificações da Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio (Práticas

SEAP), citadas no Capítulo 3, que é um documento público federal de grande

utilidade, que apesar de ser de uso obrigatório, é pouco conhecido por parte dos

Administradores Públicos envolvidos em licitações de obras.

Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT- NBR 6492),

as definições de projeto são menos completas que a Lei 8.666/93 e as Práticas

SEAP. A norma denomina as duas etapas de Anteprojeto e Projeto Executivo:

"Anteprojeto: Definição do partido arquitetônico e dos elementos construtivos, considerando os projetos complementares (estrutura, instalações, etc.). Nesta etapa o projeto deve receber aprovação final do cliente e dos órgãos oficiais envolvidos e possibilitar a contratação da obra".

Projeto Executivo: Apresenta, de forma clara e organizada, todas as informações necessárias à execução da obra e todos os serviços inerentes" (ABNT - NBR 6492).

1.2.3 Classificações: Regimes de Execução, Tipos e Modalidades de Licitação

De acordo com a Lei de Licitação, as obras e serviços podem ser

executados de duas formas6: "execução direta", onde é feita pelos próprios meios

da Administração, e "execução indireta", quando a Administração Pública contrata

terceiros para a execução do objeto7.

6 Art. 10, da Lei 8.666/93 7 Art. 6º, inc. VII e VIII da Lei 8.666/93

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A "execução indireta" se divide em quatro regimes8, que definem as formas

de contratação das obras e serviços de engenharia: "empreitada por preço

global"9, onde a obra ou serviço é contratado por um preço certo e total, muito

utilizada em construções de edificações, reformas em prédios e outros, onde a

quantidade de serviço é facilmente mensurável; "empreitada por preço unitário"10,

quando o serviço ou obra é contratado por preço certo de unidades determinadas.

Este regime é utilizado quando é inviável a quantificação total do serviço ou obra

a ser executado, como por exemplo, a sondagem e a fundação; "tarefa"11, para

pequenos trabalhos por preço certo; e "empreitada integral"12, quando se contrata

o empreendimento em sua integralidade.

A Lei classifica também os tipos de licitação13 para obras públicas, sendo

uma classificação baseada nos critérios para seleção das propostas mais

vantajosas, que são: "menor preço", é o mais usual em licitação de obras

públicas, onde o que determina o vencedor é a proposta que, após atender as

condições do edital, ofertar o menor preço; "melhor técnica", quando o julgamento

se baseia primeiramente nas propostas técnicas, onde o vencedor da melhor

técnica aceita ou não o menor preço dos selecionados; e "técnica e preço",

quando julgadas separadamente, às propostas técnicas e de preço se atribuem

pesos a diversos requisitos, inclusive o menor preço, sendo vencedora a proposta

que obtiver maior pontuação, conforme critérios pré-determinados no edital. O tipo

"maior lance ou oferta" é utilizado somente para leilões.

Outra classificação prevista em Lei é a modalidade de licitação, que define

os procedimentos com que a obra será licitada As modalidades de licitação14 que

ocorrem em obras públicas são: "convite", "tomada de preços" e "concorrência". O

"concurso" é a modalidade para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico

e o "leilão" é para venda de bens móveis inservíveis, venda de produtos

apreendidos ou penhorados e alienação de bens imóveis, não sendo utilizados

para licitação de obras. Outra modalidade só aplicada por Órgãos Públicos

8 Art. 10, inc. II da Lei 8.666/93 9 Art. 6º, inc. VIII, alínea a) da Lei 8.666/93 10 Art. 6º, inc. VIII, alínea b) da Lei 8.666/93 11 Art. 6º, inc. VIII, alínea d) da Lei 8.666/93 12 Art. 6º, inc. VIII, alínea e) da Lei 8.666/93 13 Art. 45, da Lei 8.666/93. 14 Art. 23, da Lei 8.666/93

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Federais é o "pregão", mas só pode ser usado em licitações para aquisição de

bens e serviços comuns, previstos em decreto15.

Quanto à modalidade de licitação, o que define qual vai ser aplicada à obra

é o valor previamente orçado pela Administração Pública. Esses limites de valores

entre as modalidades são os seguintes, para obras e serviços de engenharia16:

Até o valor de R$ 15.000,00: Dispensa de licitação. A Unidade

Administrativa fica dispensada de realizar licitação, podendo empenhar

diretamente para a empresa escolhida.

Até o valor de R$ 150.000,00: "Convite", que é a modalidade mais simples,

onde as exigências são menores. O prazo mínimo para abertura das propostas é

de 05 dias úteis após a sua divulgação.

Até o valor de R$1.500.000,00: "Tomada de preços". As exigências são

maiores, a licitação é dividida em duas partes: análise da habilitação e abertura

das propostas. O prazo mínimo para entrega das propostas, a contar da última

publicação do edital, é de 30 dias, para o tipo "melhor técnica" ou "técnica e

preço", ou 15 dias, para "menor preço".

Acima de R$1.500.000,00: "Concorrência". Tem poucas diferenças em

relação à tomada de preços, sendo um valor maior e tendo mais prazo para

elaboração das propostas. O prazo mínimo para entrega das propostas, a contar

da última publicação do edital, é de 45 dias, para o tipo "melhor técnica" ou

"técnica e preço", ou 30 dias, para "melhor preço".

Deve-se ressaltar que a Administração Pública nunca deve parcelar uma

obra, visando realizar assim mais de uma Licitação numa modalidade abaixo17. O

objetivo dessa manobra errada é facilitar a parte formal e reduzir os prazos

fixados em Lei, mas certamente uma auditoria pode trazer sanções para os

responsáveis pelo Ato Administrativo em questão.

Quanto à dispensa de licitação, o limite até R$ 15.000,00 é somente uma

das situações que a Lei permite a sua dispensa, sendo os demais casos

relacionados no Artigo 24, da Lei 8.666/93. Mas cabe destacar os casos de

15 Decreto 3.555, de 08 de agosto de 2000, que aprova e regulamenta a modalidade de licitação denominado Pregão. 16 Art. 26, inc. I, da Lei 8.666/93. 17 Art. 23, § 5º, da Lei 8.666/93.

Page 22: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

20

inexigibilidade de licitação18, que se diferenciam da dispensa por haver

inviabilidade de competição, como o caso de contratação de serviços técnicos por

profissionais de notória especialização19.

1.3 DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA DA QUALIDADE

1.3.1 Definição de Qualidade Segundo Limmer (1997, p. 186), três aspectos devem ser atingidos em um

empreendimento: prazo, custo e qualidade. O prazo e o custo são relativamente

fáceis de serem mensurados e definidos, pois derivam das atividades a serem

realizadas, suas seqüências e inter-relacionamentos. Porém "almejada por todos,

a qualidade varia de acordo com as aspirações de cada um, sendo por isso difícil

defini-la" (Limmer, 1997, p. 187). Pode-se citar definições de diversos autores

para qualidade, por exemplo: "qualidade se entende como o estado de um

conjunto de atributos do empreendimento, com relação a um determinado

referencial, imposto no processo de planejamento para o seu desenvolvimento"

(Rocha Lima Jr., 1995, p. 8). Mas de acordo com a NBR ISO 9000, qualidade é "a

totalidade das características de uma entidade, que lhe confere a capacidade de

satisfazer às necessidades explícitas e implícitas".

Porém, no âmbito da relação contratual, as necessidades explícitas são

claramente definidas nas cláusulas e anexos do contrato de uma obra. A

dificuldade está na busca de se atender às necessidades implícitas, isto é, aquilo

que o cliente espera ser satisfeito, mesmo não estando visível no acordo entre as

partes. Incluem-se nesta categoria aspectos normativos e regulamentares, nem

sempre incluídos no escopo contratual, mas também aspectos que a boa prática

recomende e que o contratante não tenha considerado.

Pode-se verificar que a inserção da questão da qualidade em licitações

passa por dois aspectos: a explicitação das necessidades nas clausulas

18 Art. 25, da Lei 8.666/93. 19 Segundo Art. 25, § 1º, da Lei 8.666/93, notória especialização é o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialização "permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto".

Page 23: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

21

contratuais e a possibilidade de que as necessidades implícitas também estejam

corretamente consideradas. Ao longo deste trabalho veremos que nenhum destes

dois aspectos tem sido tratado de modo adequado, pois tanto as necessidades

não têm sido bem explicitadas, como não encontramos sistemas que levem a

consideração daquelas implícitas .

1.3.2 Importância da Qualidade Apesar da baixa qualidade da obra pública ser um aspecto muito criticado

por todos, a legislação atual pode ser um obstáculo para exigências licitatórias e

contratuais no que diz respeito à qualidade, mas é importante a implementação

de um modelo que permita a busca da qualidade na elaboração de propostas e

cumprimento dos contratos.

O tema sobre Contratos e Licitações Públicas é de grande interesse para a

Sociedade, pois a União, Estados, Municípios e empresas públicas aplicam

anualmente quantias substanciais em obras. O Cidadão quer uma construção que

atenda suas necessidades; a Construtora almeja um contrato que permita a

execução de uma obra bem feita e por um preço justo e a Administração Pública

deseja pagar o menor preço pela máxima qualidade. Para se atender às três

partes interessadas, os processos licitatório e contratual devem ser estudados e

bem conhecidos, tanto pelos licitantes como pelos funcionários públicos

envolvidos no processo.

Por não constar na legislação vigente, os sistemas de qualidade não são

incorporados diretamente ao processo licitatório no Brasil, ao contrário de

diversos países, que utilizam modelos mais modernos para seleção e contratação

de obras. Buscando soluções para os problemas gerados pelas falhas no

processo licitatório de obras, pode-se sugerir a aplicação de sistemas de gestão

da qualidade. Dentre os sistemas, destaca-se a ISO 9000 (International Standard

Organization) e, na construção civil, o PBQP-H (Programa Brasileiro de Qualidade

e Produtividade do Habitat).

Page 24: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

22

1.3.2.1 ISO 9000

A ISO é uma norma organizacional, pois ela não impõe uma uniformidade

na estrutura de sistemas de gestão de qualidade ou uniformidade de

documentação (Kanholm, 2001). As normas ISO 9000 são internacionais e

possuem suas versões no Brasil pela ABNT, através das NBR 9000. A norma

NBR ISO 9001:2000 (que substitui as antigas normas: ISO 9001:1994, ISO

9002:1994 e ISO 9003:1994) especifica requisitos para um sistema de gestão da

qualidade, focada na eficácia em atender aos clientes, tanto a jusante como a

montante do processo. A norma NBR ISO 9004:2000 (que substitui a antiga

norma: ISO 9004:1994) fornece orientação para um sistema de gestão da

qualidade, com objetivos mais amplos que a NBR ISO 9001:2000, especificando

no que tange à melhoria contínua do desempenho global de uma organização e

sua eficiência e eficácia. A NBR ISO 9004:2000 é uma norma guia, complementar

a NBR ISO 9001:2000, que é uma norma certificável. Em relação às mudanças

apresentadas pela nova norma, ao se analisar a comparação da ISO 9001:1994

com a ISO 9001:2000 feita por Ketola & Roberts (2001), observa-se que a

modificação apresenta em três pontos importantes de reconceituação:

Responsabilidade da Direção; Orientação para o Cliente e Satisfação dos

Fornecedores.

Como em qualquer país onde são implantados sistemas de gestão da

qualidade, o Brasil possui um órgão responsável pelo credenciamento dos OCC

(Organismos Certificadores Credenciados). Esse órgão é o INMETRO (Instituto

Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial)20. As OCC são

empresas de auditoria e têm por objetivo auditar as organizações que, após

implantarem um sistema de gestão da qualidade, pleiteiam a obtenção do

certificado relativo ao sistema implantado.

A ISO 9000, como todo sistema de qualidade, garante que a organização

certificada estará estruturada para atender aos requisitos pré-determinados e ao

que foi inicialmente acordado entre as partes. Isso indica que o produto terá muito

provavelmente qualidade em relação ao especificado, e não no sentido de

20 Instituído pela Lei nº 5.966, de 11 de Dezembro de 1973.

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23

excelência ou conformidade do produto, conceito este que causa muita confusão

aos leigos. Mas a grande resistência da aplicação desse sistema nas construtoras

não está somente no desconhecimento dos seus objetivos, mas no fato de que a

execução de uma obra representa uma fábrica de um único produto, que possuirá

características bem distintas em cada obra. Esta peculiaridade da Construção

Civil é um fator de dificuldade para implantação da ISO 9000, pois ela exige uma

padronização e documentação de processos, sempre mais fácil se a produção é

repetitiva.

1.3.2.2 PBQP-H

Com a globalização e o crescimento do número de construtoras

certificadas, a tendência é aumentar a quantidade de contratos com cláusulas

exigindo certificação de qualidade. Como exemplo dessa tendência pode-se citar

o PBQP-H, que é um sistema de qualidade desenvolvido pelo Governo Federal,

baseado na ISO 9000 e instituído pela Portaria no 134, de 18 de dezembro de

1998, do Ministério do Planejamento e Orçamento. Ele tem como objetivo:

"apoiar o esforço brasileiro de modernidade pela

promoção da qualidade e produtividade do setor da construção habitacional, com vistas a aumentar a competitividade de bens e serviços por ele produzidos, estimulando projetos que melhorem a qualidade do setor". (Portaria no 134, 1998)

A condição básica para o sucesso do programa está na parceria do

Governo com o Setor Privado, sendo que a adesão é voluntária e dividida em

quatro categorias: agentes da cadeia produtiva do setor privado: por meio de

programas setoriais da qualidade; agentes do setor público e privado: por meio de

Termo de Adesão firmado entre o representante da entidade e o representante da

coordenação geral do programa; agentes financiadores e de fomento: pela

participação em projetos que busquem utilizar o poder de compra como indutor da

melhoria da qualidade e aumento da produtividade e agentes de fiscalização e de

direito econômico: através da promoção da isonomia competitiva do setor. O

Page 26: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

24

PBQP-H se tornou um instrumento capaz de permitir a aplicabilidade de um

sistema de gestão da qualidade em Obras Públicas, pois através de acordos

setoriais viabiliza exigências contratuais de certificação sem ferir o princípio

constitucional da isonomia21. Seus objetivos específicos constam no próprio

documento que o criou e são eles:

"- Estimular o inter-relacionamento entre agentes do setor; - Promover a articulação internacional com ênfase no Cone Sul; - Coletar e disponibilizar informações do setor e do PBQP-H; - Fomentar a garantia de qualidade de materiais, componentes e sistemas construtivos; - Fomentar o desenvolvimento e a implantação de instrumentos e mecanismos de garantia de qualidade de projetos e obras; - Estruturar e animar a criação de programas específicos visando a formação e a requalificação de mão-de-obra em todos os níveis; - Promover o aperfeiçoamento da estrutura de elaboração e difusão de normas técnicas, códigos de práticas e códigos de edificações; - Combater a não conformidade intencional de materiais, componentes e sistemas construtivos; - Apoiar a introdução de inovações tecnológicas; - Promover a melhoria da qualidade de gestão nas diversas formas de projetos e obras habitacionais." 22

Um exemplo da eficácia do Programa é retratado no crescente número de

empresas certificadas, chegando a 1441 em outubro de 2002 (Empresas, 2002).

A importância do Programa se reflete nos acordos setoriais, como o acordo entre

a Caixa Econômica Federal, o SINDUSCON-RIO (Sindicato da Indústria da

Construção Civil do Estado do Rio de Janeiro) e a ADEMI-RJ (Associação de

Dirigentes de Empresas do Mercado Imobiliário do Rio de Janeiro), onde o

objetivo é a melhoria da qualidade e o aumento da produtividade na execução de

obras financiadas pela Caixa Econômica, em particular na produção habitacional.

Conforme o acordo setorial, as empresas da construção civil deverão atingir 21 Segundo Meirelles (2002, p.30) "não pode haver procedimento seletivo com discriminação entre participantes (...)". Mas o acordo setorial representa atitudes e procedimentos de uma maioria em um determinado setor, descaracterizando assim uma restrição discriminatória à participação em um determinado processo de seleção de propostas. 22 Portaria nº 134, de 18 de dezembro de 1998, ANEXO - Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat - PBQP-H.

Page 27: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

25

níveis de qualificação para obter financiamentos pela Caixa Econômica Federal.

(PBQP-H. Acordo, 2002).

Não só no Rio de Janeiro, mas também em quase todos os outros Estados,

A Caixa Econômica Federal (CAIXA), a Secretaria Especial de Desenvolvimento

Urbano da Presidência da República (SEDU/PR) e a Câmara Brasileira da

Indústria da Construção (CBIC), firmaram acordo, no âmbito do PBQP-H, com o

objetivo de estabelecer critérios e prazos para implantação gradual do processo

de qualificação das empresas construtoras, de acordo com Sistema de

Qualificação de Empresas de Serviços e Obras – Construção (SiQ-C). Com esta

atuação da CAIXA nos diversos Estados, os prazos para vigência do SiQ-C vêm

sendo negociados caso a caso, junto às empresas e entidades representativas do

setor da construção civil de cada Estado, e formalizados por meio da assinatura

de Acordos Setoriais da Qualidade.

Atualmente, desde setembro de 2000, os seguintes Estados assinaram, em

ordem de adesão, os acordos setoriais: Santa Catarina, São Paulo, Espírito

Santo, Rio de Janeiro, Ceará, Minas Gerais, Goiás, Distrito Federal, Maranhão,

Bahia, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Pará, Alagoas,

Mato Grosso do Sul, Piauí, Rio Grande do Sul e Sergipe. (PBQP-H. Acordos com

a CAIXA, 2002)

Page 28: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

2 A QUALIDADE NA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO

Nos anos oitenta, a administração japonesa já surpreendia o mundo com

sua supereficiência. Em contrapartida as empresas americanas passavam por

grandes dificuldades e um dos fatores que as trouxe novamente à luz foi a

publicação do livro: “Em Busca da Excelência1". A partir daí surgiu um movimento

em busca da qualidade de produtos e serviços no mundo. Empresas, em diversas

partes do mundo, criavam normas e procedimentos, descrevendo processos e

registrando políticas. Os governos passaram a criar normas para contratação de

serviços, como as normas 10-CFR-50 para construção de usinas nucleares,

também utilizadas no Brasil, e a série de normas canadenses: Z-299, usadas

como exigências contratuais para fornecimento nos mercados nacionais e

internacionais (Floriano, 2002).

Com o crescimento da aplicação das normas de qualidade como

exigências contratuais e a falta de uma padronização, o mundo ficou repleto de

regulamentos para fornecimento de bens e serviços, dificultando as relações

comerciais e criando-se exigências absurdas, em alguns casos. Para resolver o

problema, o comércio internacional buscou a aplicação de normas comuns a

todos. Com a base nas normas inglesas (BS-5750)2 e da necessidade de normas

internacionais de qualidade, foram criadas as normas da série 9000 pela ISO

(International Standard Organization). A ISO foi fundada em 1947, com sede em

Genebra, na Suíça e, em 1979, foi criado o Comitê Técnico TC-176 da ISO para

1 WHIETELEY, Richard C. A Empresa Totalmente Voltada para o Cliente. Rio de Janeiro: Campus, 1992. 2 Segundo FLORIANO, o país mais desenvolvido na época, em relação à normalização da qualidade era a Inglaterra.

Page 29: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

27

tratar da Qualidade. As normas ISO da série 9000 foram emitidas em 1987,

traduzidas e editadas no Brasil em 1990 e revisadas em 1994. (Floriano, 2002).

A última revisão e atualização das normas NBR ISO 9000 foi realizada em

2000, com a substituição das normas NBR ISO 9001:1994, NBR ISO 9002:1994

e NBR ISO 9003:1994 pela norma NBR ISO 9001:2000; e as normas NBR ISO

9004-1:1994, NBR ISO 9004-2:1993 e NBR ISO 9004-3:1999 pela norma NBR

ISO 9004:2000. Substituições válidas a partir de 29 de janeiro de 2001.

2.1 SISTEMAS DE QUALIDADE APLICADOS À INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO

A indústria da construção não poderia ficar excluída dessa tendência

mundial. Já em 1995, a primeira construtora brasileira conseguiu sua certificação.

Mas, apesar do setor da construção estar entre os mais importantes da economia

brasileira, é um dos que menos investem em programas de qualidade (Leon,

2002).

A indústria da construção, além de ser um dos setores mais importantes da

economia brasileira, é, segundo o Instituto Mckinsey (1999, p.100), uma grande

fonte de emprego. Só o segmento da construção residencial representa quase

três vezes e meia o peso da indústria automobilística no PIB e emprega treze

vezes mais, mas não recebe a mesma atenção da imprensa.

Apesar dessa representatividade, os índices de produtividade da

construção civil no Brasil estão muito afastados da produtividade americana, por

exemplo, chegando apenas a 32% da indústria nos Estados Unidos. Essa

defasagem se dá não pela qualidade de mão-de-obra, que não difere muito da

americana em algumas regiões dos Estados Unidos, mas sim ao sistema de

produção. Basicamente, o que diferencia as duas realidades são o projeto e a

organização de funções e tarefas (Instituto Mckinsey, 1999, p. 100).

Entretanto, existe qualidade na indústria da construção brasileira, como

retrata o artigo da revista Banas: "Muitas construtoras brasileiras já deram

mostras de que têm qualidade e padrão internacional. O exemplo mais conhecido

Page 30: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

28

está no setor da construção pesada. Poucos países no mundo dominam tão bem

essa tecnologia."3

Como apresentado no capítulo anterior, a aplicação de um sistema de

qualidade na indústria da construção resulta na melhoria de seus produtos,

indicando assim melhora na eficácia e conseqüentemente um aumento de

produtividade4. Mas existe uma barreira que não permite uma adesão maciça das

construtoras aos sistemas de qualidade: além dos custos de implantação, que

para pequenas e médias empreiteiras torna-se representativo, a dificuldade de se

implantar um sistema ISO 9000, que é genérico para atender a todo tipo de

organização e difícil de ser adaptado para a indústria da construção, pois

possuem características muito diferentes das demais empresas. Parte dessa

dificuldade se deve a questões culturais, pois desde 1995, com a certificação da

primeira construtora, até 25 de outubro de 1999, somente 52 empresas foram

certificadas pela ISO 9001:1994, sendo que atualmente apenas 86 empresas

possuem o certificado ISO 9001:2000 (INMETRO.Distribuição, 2002). Os números

podem ser considerados pouco representativos, mas segundo Leon (2002), as

causas estão nos problemas levantados, que são: falta de comprometimento das

pessoas; operacionalização das rotinas impostas pelo Sistema; grande esforço de

manutenção da documentação atualizada; choque do sistema da qualidade com a

cultura organizacional; adequação dos requisitos da norma ISO à realidade da

construção civil; burocracia excessiva e engessamento das atividades.

Apesar das dificuldades na indústria da construção, a ISO 9000:2000 veio

favorecer este tipo de indústria, ao mesmo tempo em que a prática esclarece as

muitas dúvidas que surgem com sua implantação. Além disso, as vantagens de

se implantar um sistema de gestão de qualidade, como a ISO 9000, podem ser

observadas em diversos aspectos: do ponto de vista do cliente há um aumento da

confiança, além de servir como requisito de contrato e buscar a melhor

qualificação do contratado; o marketing, por possuir um certificado de qualidade

com reconhecimento internacional; o processo, que atende aos padrões

internacionais e é uma base para a melhoria contínua; e a gestão, sistematizando

3 EXISTE Qualidade na Construção, sim. Revista Banas Qualidade nº 71. Abril 1998. p 34 4 Segundo Limmer (1997, p.189): "Uma gestão da qualidade resulta obrigatoriamente em melhoria de produtividade (...)"

Page 31: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

29

e monitorizando processos, e servindo para a avaliação de performance. Segundo

a própria norma, os principais benefícios da ISO 9000 são os seguintes: Melhoria

nos Sistemas da Qualidade; Melhoria nas operações internas; Melhoria na

qualidade dos produtos e serviços; Redução do número de auditorias de clientes;

Tempo para desenvolvimento de parceria; Tempo para atividade de melhoria

contínua e vantagem competitiva no mercado.

Porém, o Sistema de Gestão de Qualidade ISO 9000 não é o único

existente. O PBQP-H, baseado nas normas ISO 9000, versão 1994, foi criado

pelo Governo Federal para atender às necessidades e características da indústria

da construção habitacional. A partir da experiência do QUALIHAB-SP5 e para

acompanhar a implementação do PBQP-H, foi criado o Comitê Nacional de

Desenvolvimento Tecnológico da Habitação - CTECH, constituído por

representantes indicados por diversos órgãos e entidades, no total de 14:

Secretaria de Política Urbana da Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano

da Presidência da República; Secretaria de Desenvolvimento da Produção do

Ministério do Desenvolvimento, Indústria Comércio e Turismo; Secretaria do

Desenvolvimento Tecnológico do Ministério da Ciência e Tecnologia;

Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP; Caixa Econômica Federal - CAIXA;

Associação Brasileira de COHABs - ABC; Associação Brasileira de Cimento

Portland - ABCP; Instituto Brasileiro de Siderurgia - IBS; Associação Nacional dos

Comerciantes de Materiais de Construção - ANAMACO; Associação Nacional de

Tecnologia do Ambiente Construído - ANTAC; Comitê Brasileiro de Construção

Civil da Associação Brasileira de Normas Técnicas - COBRACON/ABNT; Câmara

Brasileira da Indústria da Construção - CBIC; Serviço de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas - SEBRAE e Sindicato Nacional das Empresas de

Arquitetura e Engenharia Consultiva - SINAENCO.

De acordo com os assuntos tratados, outras entidades também são

convidadas para participarem das reuniões do CTECH, como: Instituto Nacional

de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial - INMETRO; Associação

Brasileira de Normas Técnicas - ABNT; Associação Nacional de Fabricantes de

Cerâmica para Revestimento - ANFACER; Conselho Federal de Engenharia, 5 O Estado de São Paulo é um estado com grande número de empresas relacionadas à construção civil, e teve a iniciativa pioneira na área da qualidade, com o programa QUALIHAB. (PBQP-H. O Estado de São Paulo, 2002).

Page 32: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

30

Arquitetura e Agronomia - CONFEA; Associação Brasileira dos Produtores de Cal

- ABPC e outras.

As entidades envolvidas direta e indiretamente no CTECH demonstram a

importância que o Sistema PBQP-H vem tomando no contexto da Indústria da

Construção. Reflexo disso está no acordo setorial, citado no capítulo anterior,

entre a Caixa Econômica Federal, o SINDUSCON-RIO e a ADEMI-RJ,

objetivando a melhoria da qualidade e o aumento da produtividade na execução

de obras, em particular na produção habitacional.

O PBQP-H, na verdade, é um programa que qualifica a construtora num

nível de "A, B,C e D", através do SIQ (Sistema Integrado de Qualificação). Este

sistema faz referência na norma ISO 9000:1994, serviços específicos controlados

e também controles nos materiais da cesta básica da construção civil (A.

Naccarati Consultores, 2002).

Para obtenção de financiamento pela Caixa Econômica Federal, a

construtora deve, desde junho de 2002, obter qualificação de nível "B", e como há

uma previsão de revisão do PBQP-H em novembro de 2002, a tendência é a

exigência da qualificação "A", ou seja, a íntegra da norma ISO 9000 e os

controles adicionais já mencionados.

Esta nova realidade no setor de construção civil vem atender às

necessidades do crescente grau de exigência do cliente e é a oportunidade de,

através de um sistema de gestão de qualidade, diminuir desperdícios, capacitar a

mão de obra e incentivar os fornecedores a produzirem produtos normatizados,

diminuindo custos, e no final, obtendo uma obra de qualidade. O sucesso do

programa reflete-se em números, onde até novembro de 2002, 1441 empresas se

certificaram, representando um crescimento acentuado de adesões.

Um passo importante é a implantação dos requisitos de sistemas de

qualidade diretamente nas licitações de obras públicas, como foi apresentado na

Carta de Salvador, dentre as propostas do V SINAOP (Simpósio Nacional de

Auditoria em Obras Públicas), realizado em novembro de 2000, Salvador - BA

(PBQP-H. Carta de Salvador, 2000)

Page 33: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

31

2.2 A GARANTIA NA CONCLUSÃO DA OBRA

Uma das preocupações da Administração Pública e de qualquer

contratante é a conclusão da obra dentro do que for acordado entre as partes.

Para atender a essa necessidade, o dispositivo contratual utilizado, tanto no setor

público como privado, é a garantia contratual.

A legislação atual permite à Administração a exigência de garantia

contratual. Mas cabe ao contratado, e não ao contratante, a escolha da

modalidade de garantia6, que pode ser uma das seguintes: caução, em dinheiro

ou por título de dívida pública; seguro garantia; ou fiança bancária. Segundo a Lei,

a garantia não excederá a cinco por cento do valor contratado7, sendo permitido

aumentar esse percentual para dez por cento em obras de grande vulto, isto é,

aquelas superiores a R$ 37.500.000,00.

Para a construção civil, a garantia mais utilizada em licitações públicas é a

fiança bancária8, pois é aquela que tem o menor custo para o contratado, onde

ele consegue uma carta de fiança no banco, que cobrará um valor a ele

proporcional ao risco da operação e do cliente. Para a Administração Pública, a

fiança bancária não garante a conclusão satisfatória do contrato, principalmente

quando a empresa age propositalmente de má fé. Como foi demonstrado no

exemplo do Apêndice 8.2 ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DO CRONOGRAMA

FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA, onde a construtora altera a curva de

distribuição de seu orçamento, é possível que uma empresa receba muito mais do

que gastou para execução das etapas iniciais de uma obra e a abandone. O

prejuízo físico, nesses casos, é maior que o valor da garantia, e a obra

necessitará de novos prazos e recursos para ser concluída. Pode-se discutir que

esse fato representa uma exceção, mas a Lei foi criada para evitar a

desonestidade, e não para dar amparo a que isso ocorra.

A garantia em forma de caução poderia ser considerada a mais utilizada,

mas na prática as construtoras não abrem mão de seu capital de giro para cobrir

6 Art. 56, § 1º, da Lei 8.666/93. 7 Art. 56, § 2º, da Lei 8.666/93. 8 Fiança bancária é a modalidade de garantia na qual o banco fornece ao contratado uma carta de fiança, onde se compromete a pagar o valor do seguro, caso a garantia contratual seja acionada pelo contratante.

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32

garantias, preferindo custear a fiança do que o custo de capital imobilizado,

mesmo que ele seja obrigatoriamente corrigido.

O seguro garantia consiste em contratar uma seguradora, que avaliza a

execução do contrato. Para a Administração Pública essa garantia iria resolver a

questão da conclusão da obra e evitaria desgastes na fiscalização, pois a própria

seguradora fiscalizaria também a sua execução. A utilização dessa forma de

garantia esbarra em uma questão: a opção da modalidade cabe ao contratado,

que não escolhe o seguro-garantia por questões de custos. No Brasil, segundo o

Instituto Mckinsey (1999, p. 111), esse seguro garantia varia de 0,5% a 2,0% do

valor de contrato. Nos países da Europa e nos Estados Unidos é comum a

exigência contratual do Performance Bond, como é conhecido essa modalidade

de garantia, onde os empreiteiros garantem ao contratante a conclusão da obra,

mesmo que a empresa vá à falência.

Apesar do Performance Bond ser muito aplicado em outros países, a

maioria das empresas brasileiras que atua na área privada ainda trabalha com o

sistema cost plus (Instituto Mckinsey, 1999, p.111), mais conhecido como contrato

por administração, onde o preço de venda é o custo da obra mais a taxa de

administração. Esse sistema cria obstáculos para a busca de métodos e sistemas

mais eficientes, pois o lucro do contratado sempre estará garantido, independente

do processo de execução empregado e do prazo da obra, dificultando assim as

inovações tecnológicas no setor da construção civil. Mas um dos fatores que

ainda inibe a substituição do cost plus pelo performance bond é o custo elevado

do seguro garantia no Brasil. Tal custo é calculado da seguinte forma: quando

uma empresa é contratada com exigência de Performance Bond, a seguradora

garantirá a execução do contrato cobrando um percentual sobre o valor fixo da

obra, esse percentual varia de acordo com o risco, como foi explicado no

parágrafo anterior, mas também varia com as leis de mercado. Isto é, com um

número crescente de empreiteiros optando por esse tipo de garantia, a tendência

é baixar o custo do seguro.

Mesmo com o custo do Performance Bond baixando no Brasil, essa

tendência poderá não se refletir nos contratos de obras públicas, pois as

empresas que forem agir desonestamente de forma premeditada, continuarão a

não aceitar o seguro garantia como modalidade de garantia.

Page 35: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

33

Uma solução para o problema de garantia seria a opção de escolha da

modalidade uma atribuição da Administração Pública, e definida previamente no

edital de licitação, para que todos os licitantes computem o custo adicional em

suas planilhas. Inicialmente poderia parecer que as obras públicas passariam a

custar mais, mas o custo financeiro e social de contratos inacabados ou mal

executados justifica essa postura. Primeiramente, as empresas que entram em

licitações já com intenções ilícitas seriam inibidas pela necessidade do aval de

uma seguradora. O próprio mercado eliminaria as empreiteiras inidôneas ou

aventureiras, que se arriscam em obras acima de suas possibilidades, mas com

recursos públicos. Além disso, as empresas mais eficientes, além de

apresentarem menores preços, teriam seus percentuais de seguro reduzidos, por

oferecerem menores riscos às seguradoras, podendo compensar essa diferença

no preço da obra. Indo mais adiante, uma empresa que aplica em sua

organização um sistema de gestão da qualidade, além de obter uma maior

produtividade, permitirá uma melhor análise do risco do empreendimento,

reduzindo mais ainda os custos do seguro garantia, ou performance bond.

Um outro problema amenizado com a obrigatoriedade do seguro garantia é

uma prática comum em Órgãos Públicos, os aditivos contratuais. Como a

seguradora é uma das partes interessadas no contrato, a prática de acréscimos

de serviços e dilatação dos prazos de execução seria inibida. A Lei 8.666/93

permite acréscimos de serviço no valor de 25% para obras e 50% para reformas

de edifícios9. A presença da seguradora não permitiria acréscimos fictícios, pois

ela não se responsabilizaria por partes da obra que não seriam executadas.

Mais uma forma de garantir que o contrato será executado conforme

acordado é exigir que a empresa possua respaldo financeiro para execução da

obra. Porém, durante a fase de habilitação, a documentação relativa à

qualificação econômico-financeira é limitada pela Lei, onde a Administração só

pode exigir até 10% do valor orçado para o capital social ou valor de patrimônio

líquido das empresas licitantes. Por outro lado, o capital social não revela a

verdadeira situação econômica da empresa, pois retrata somente os bens

transferidos dos sócios para a sociedade, não comprovando se ela está saudável

ou não. A situação financeira da empresa deve ser analisada através de balanços 9 Art. 65, § 1º, da Lei 8.666/93.

Page 36: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

34

patrimoniais, onde o patrimônio líquido é um melhor indicador de sua situação.

Segundo Justen Filho (2000, p. 358), para obras sem grandes previsões de

recursos, a exigência de patrimônio líquido mínimo é desnecessária, podendo

inclusive caracterizar um vício que deve ser reprimido. Mas a realidade atual

indica que mesmo em pequenas obras, é importante que a empresa tenha uma

boa situação financeira, pois a tendência de uma construtora com desequilíbrio

econômico é buscar participar de um maior número possível de licitações.

De acordo com a Lei, poderia ser exigida também uma relação de

compromissos assumidos pela licitante, mas conforme Justen Filho (2000, p.

359), todos os compromissos assumidos constariam no balanço da empresa. Na

prática, uma empresa que assume várias obras teria um fluxo de caixa positivo,

pois teoricamente a diferença entre receita e despesa dos diversos

empreendimentos permitiria um aumento gradual do seu patrimônio líquido.

Como é comum o atraso de pagamento das parcelas do cronograma

financeiro por parte da Administração Pública, a falta de capital de giro pode

obrigar a empreiteira a buscar recursos nos bancos e financiadoras, onde as

taxas de juros podem gerar prejuízo, conforme analisado no Apêndice 8.1 - ANÁLISE DE CUSTO DE CAPITAL EM RELAÇÃO AO ATRASO DE PAGAMENTO DE ÓRGÃOS

PÚBLICOS. Desse modo, uma empresa responsável pela execução de várias obras

públicas simultaneamente pode se tornar um risco, e não uma vantagem para o

Contratante.

Page 37: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

3. MODELOS DE LICITAÇÕES E CONTRATOS NO BRASIL E NO EXTERIOR

3.1 A LICITAÇÃO NO BRASIL

3.1.1 Dificuldades Encontradas

Ao se licitar uma obra, imagina-se que a Administração Pública terá todo

apoio técnico e jurídico para iniciar e concluir um processo licitatório. Nos grandes

Órgãos Públicos isso é comum, mas deve-se lembrar das centenas de municípios

no interior do país, onde não existe à disposição da prefeitura sequer um

engenheiro. Mesmo assim a lei de licitações deverá ser cumprida de forma igual.

Outra dificuldade é o despreparo de alguns administradores, pois muitas

vezes seus cargos são ocupados por indicação política, e não por capacidade

técnica. Na questão da obra pública, a complexidade é retratada nas próprias

exigências técnicas legais, onde a falta de conhecimento técnico de engenharia

pode levar a prejuízos grandes para a Administração Pública.

Por outro lado, em relação aos licitantes existe uma grande dificuldade de

se elaborar uma proposta adequada, tanto aos seus interesses quanto aos da

Administração Pública. Algumas das justificativas utilizadas pelos empreiteiros

são: o pouco tempo para estudo dos projetos e elaboração do orçamento; falta de

projetos complementares; deficiência de informações e especificações

incompletas e orçamento do edital incompleto1.

1 Experiência observada ao participar, durante 04 anos, de licitações e contratos de obras públicas para o Exército Brasileiro.

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36

Quanto ao pouco tempo para elaboração da proposta técnica, a legislação

define o prazo mínimo para abertura das propostas2, mas não o máximo, sendo

legalmente possível estender esse prazo de acordo com a complexidade da obra.

Porém, na maioria das vezes, isso não ocorre. Os Órgãos Públicos têm

dificuldade em aumentar esse tempo devido a vários aspectos. As pressões

políticas destacam-se na mídia como o principal motivo, mas deve-se observar

também a necessidade do atendimento ao cronograma de desembolso e à

disponibilidade de recursos. Os recursos disponíveis para uma obra, depois de

garantidos em uma previsão orçamentária, devem ser aplicados somente naquele

ano, obrigando ao administrador público a sua liquidação até o último dia do

exercício financeiro em que se recebe o recurso, apesar da obra ser um objeto de

contrato que requer tempo para ser adquirido.

Essa escassez de tempo não é um problema somente dos licitantes. Os

engenheiros que preparam os projetos, especificações e orçamento também não

dispõem de grandes prazos para realizar seus trabalhos.

Outro problema, que pode ser também decorrente da falta de tempo ou

despreparo de quem elabora o edital, é o conteúdo dos projetos, às vezes mal

elaborados e incompletos, e sem definir corretamente o objeto a ser licitado,

gerando orçamentos falhos e incompletos. As falhas e omissões no projeto

acarretam um prejuízo muitas vezes não constante na previsão orçamentário: a

necessidade de termos aditivos ao contrato para acréscimo de serviços não

previstos.

A solução estaria na aplicação de normas para elaboração de projetos, que

permitissem uma homogeneização de conceitos e procedimentos, evitando assim

as brechas nos contratos de obras públicas. O Governo Federal já possui uma

norma, o Manual de Obras Públicas - Edificações, chamado de Práticas da SEAP3

(Secretaria de Estado da Administração e do Patrimônio) e dividido em três

partes: Prática Geral de Projeto, Prática Geral de Construção e Prática Geral de

Manutenção. A falta de divulgação dessas normas nos diversos Órgãos Públicos

tem prejudicado a sua efetiva aplicação.

2 Art. 21, § 2º, da Lei 8.666/93. 3 As Práticas da SEAP têm o objetivo de estabelecer as diretrizes gerais para a elaboração de projetos, execução de construção, complementação, reforma, ampliação e manutenção de uma edificação ou conjunto de edificações.

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37

Um exemplo da aplicação das Práticas da SEAP está nas definições de

projeto básico e projeto executivo, que são incompletas no texto da Lei 8.666/934.

Segundo a Prática Geral de Projeto da SEAP, as definições e objetivos são mais

abrangentes e elucidativas:

"3.4.2 Projeto Básico O Projeto Básico deverá demonstrar a viabilidade

técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental, possibilitar a avaliação do custo dos serviços e obras objeto da licitação, bem como permitir a definição dos métodos construtivos e prazos de execução do empreendimento . Serão solucionadas as interferências entre os sistemas e componentes da edificação.

Além dos desenhos que representem tecnicamente a solução aprovada através do Estudo Preliminar, o Projeto Básico será constituído por um relatório técnico, contendo o memorial descritivo dos sistemas e componentes e o memorial de cálculo onde serão apresentados os critérios, parâmetros, gráficos, fórmulas, ábacos e “softwares” utilizados na análise e dimensionamento dos sistemas e componentes.

O Projeto Básico conterá ainda os elementos descritos na Lei de Licitações e Contratos, com especial atenção para o fornecimento do orçamento detalhado da execução dos serviços e obras, fundamentado em especificações técnicas e quantitativos de materiais, equipamentos e serviços, bem como em métodos construtivos e prazos de execução corretamente definidos. 3.4.3 Projeto Executivo

O Projeto Executivo deverá apresentar todos os elementos necessários à realização do empreendimento, detalhando todas as interfaces dos sistemas e seus componentes.

Além dos desenhos que representem todos os detalhes construtivos elaborados com base no Projeto Básico aprovado, o Projeto Executivo será constituído por um relatório técnico, contendo a revisão e complementação do memorial descritivo e do memorial de cálculo apresentados naquela etapa de desenvolvimento do projeto.

O Projeto Executivo conterá ainda a revisão do orçamento detalhado da execução dos serviços e obras, elaborado na etapa anterior, fundamentada no detalhamento e nos eventuais ajustes realizados no Projeto Básico." (Prática Geral de Projeto - SEAP, 2002)

4 Art. 6º, inc. IX e X, da Lei 8.666/93.

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38

Ainda assim as definições de projeto constantes nas Práticas SEAP podem

ser consideradas insuficientes para definir o objeto. Caberia à ABNT melhorar

suas normas, com desenvolvimento de definições mais precisas e completas,

como o caso da NBR 6492 - Representação de Projetos de Arquitetura, cuja

definição de projetos5 é ainda mais simples e incompleta que as Práticas SEAP e

a Lei 8.666/93.

Pode-se observar que existem ferramentas disponíveis para solucionar

parte dos problemas encontrados nas licitações de obras públicas no Brasil. Em

alguns casos, a falta de informações e despreparo técnico dos responsáveis pelo

edital são fatores geradores de dificuldades, que devem ser combatidos com

divulgação e preparação.

3.1.2 Falhas e Vícios Comuns em Licitações Públicas

Muitas Unidades Administrativas recebem recursos para obras sem ter

uma assessoria técnica, tanto para elaboração do edital quanto para fiscalização

da execução do contrato. Os documentos técnicos do Edital devem ser assinados

por um profissional com registro no CREA (Conselho Regional de Engenharia,

Arquitetura e Agronomia), tais como projetos, especificações e orçamento.

Mesmo com uma Seção Técnica de Engenharia apoiando a licitação,

algumas falhas no edital são comuns, principalmente após a liberação dos

créditos para execução de obras no corrente ano, quando a autorização para

licitar as obras vem de uma única vez e o tempo disponível para preparação da

documentação torna-se reduzido. Nessa situação algumas falhas no edital se

tornam comuns6, como: erro nos quantitativos do orçamento; serviços previstos

nas especificações que não constam no orçamento; alterações no Edital sem

reinicio da contagem dos prazos; não apresentação de orçamento no edital e

prazos de execução muito longos ou curtos.

Em relação às falhas técnicas das propostas dos licitantes, elas costumam

ser poucas, pois o orçamento apresentado no Edital serve como base para

5 Definições citadas no Capítulo 1.2.2.1. Conceitos Básicos. 6 Experiência observada ao participar, durante 04 anos, de licitações e contratos de obras públicas para o Exército Brasileiro.

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39

elaboração das propostas e a diferença de quantitativos, maior motivo de

contestação na fase de julgamento, não pode ser considerada como erro. Sendo

assim, o licitante que compara sua proposta com a documentação que for

apresentada no edital dificilmente comete erros técnicos. As falhas mais comuns

são na parte formal, tais como: não assinatura de todas as folhas da proposta

pelo representante legal; não assinatura do orçamento pelo responsável técnico

da empresa; não cumprimento dos prazos legais de cadastramento e

apresentação das propostas e erros de digitação.

Segundo Mukai (1995, p. 29, et. seq.), os vícios nas licitações são divididos

em duas partes: vícios dos editais de licitação e vícios do procedimento licitatório.

Dentre os vícios citados por Mukai, serão destacados aqueles que se relacionam

diretamente com obras, para ilustrar a quantidade de situações passíveis de

dúvidas na elaboração do edital e desenvolvimento do processo licitatório:

"Exigências impertinentes e não autorizadas; Atestado de desempenho anterior

com numerus clausus7; Pontuações técnicas totalmente subjetivas; Transformar a

aferição técnica da fase de habilitação em julgamento técnico e Levar em

consideração vantagem "surpresa "."

Em relação às exigências impertinentes e não autorizadas, a Lei 8.666/93

enumera todos os documentos que podem ser exigidos na fase de habilitação8,

onde qualquer outra exigência documental não prevista na legislação ou prevista

em Lei especial caracteriza um vício na licitação.

Quanto à exigência de atestado de desempenho anterior com numerus

clausus, a documentação relativa à capacidade técnica deve exigir comprovação

de realização de serviços pertinentes e compatíveis com o objeto licitado, não

permitido a utilização de quantidade numérica como limitador de habilitação.

Apesar de ser um ponto de vista do Mukai (1995, p. 36), torna-se inviável um

julgamento objetivo, para a aceitação de um atestado de desempenho, sem uma

referência numérica de quantitativos executados.

Outro vício destacado é a pontuação técnica totalmente subjetiva no edital,

consistindo em uma dificuldade, por parte da Administração Pública, a definição

dos elementos a serem pontuados e a sua ponderação, de modo a não restringir

7 Numerus Clausus significa quantificação numérica 8 Artigos 28, 29, 30 e 31, da Lei 8.666/93.

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40

a licitação. Além disso, Mukai (1995, p. 38) considera uma violação do princípio

do julgamento objetivo um distanciamento grande entre pontos, por exemplo: de 0

a 100.

A transformação da aferição técnica da fase de habilitação em julgamento

técnico é outro vício apresentado: No processo licitatório, as empresas que foram

habilitadas para a fase de análise de propostas não podem ser julgadas por

documentos apresentados na fase de habilitação, pois eles perderam eficácia

jurídica. Segundo Meirelles (2002, p. 144), a desclassificação da proposta ocorre

no seu julgamento, enquanto que a desqualificação ou inabilitação ocorre na fase

de habilitação, antes da abertura das propostas técnicas. Sendo assim, a

Comissão não pode transformar a habilitação em julgamento técnico.

Por fim, levar em consideração vantagem "surpresa" é outro vício

destacado por Mukai (1995, p. 44). Pois a Comissão de Licitações não deve

considerar em seu julgamento nenhuma vantagem apresentada pelo licitante que

não conste no edital9, nem mesmo como critério de desempate.

As falhas e vícios na licitação e contratação de obras são danosos para a

Administração Pública. O processo licitatório estará sujeito a anulação, que ocorre

quando alguma ilegalidade é constatada, e acarretará a paralisação da obra, caso

já tenha começado. A revogação do processo licitatório só ocorre por Interesse

Público, devidamente justificado, e não é conseqüência de irregularidades no

processo10.

3.2 O CONTRATO ADMINISTRATIVO

Segundo Justen Filho (2000, p. 502), o contrato administrativo possui

características próprias, que o torna diferente do contrato privado, sendo que o

regime de direito público impõe que o interesse público está acima de outros

interesses. Desta forma, "o que tipifica o contrato administrativo e o distingue do

contrato privado é a participação da Administração na relação jurídica bilateral

com supremacia de poder para fixar as condições iniciais do ajuste" (Meirelles,

2002, p. 181). 9 Art. 44, § 2º, da Lei 8.666/93. 10 Art. 49, da Lei 8.666/93.

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41

Pode-se definir então contrato administrativo como:

"Contrato administrativo é o ajuste que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, firma como particular ou como outra entidade administrativa, para a consecução de objetivos de interesse público, nas condições desejadas pela própria Administração". (Meirelles, 2002, p. 180).

Porém, apesar da Administração possuir prerrogativas de Poder Público, o

contrato não fica desnaturado e nem perde a natureza contratual, apenas o

qualifica como um ajuste com normas próprias para atender às necessidades do

interesse público . Tanto que os princípios que regem os contratos comuns são os

mesmos submetidos aos contratos públicos, salvo algumas peculiaridades, como:

a Administração impõe condições iniciais do contrato; prévia licitação, quando não

houver dispensa ou inexigibilidade; via de regra formal, sendo excepcionalmente

oral ou informal; cláusulas necessárias, obrigatórias ou essenciais relativas ou

absolutas previstas em Lei; e cláusulas extravagantes ou exorbitantes, impondo

vantagens ou restrições, visando o interesse público (Szklarwsky, 2000, p. 170 et

seq.)

3.3 O CONTRATO PRIVADO

Os contratos privados levam uma vantagem fundamental em relação aos

contratos públicos: os critérios de seleção dos contratados não seguem uma

norma rígida, podendo se moldar com facilidade às necessidades de cada

empreendimento. Quem define a forma de contratação também é a necessidade,

podendo o empresário aplicar inclusive critérios subjetivos para sua escolha.

Como a Licitação Pública tem que atender aos procedimentos previamente

determinados em Lei, as regras não são flexíveis. Meirelles apresenta as

peculiaridades que distinguem o contrato privado do administrativo:

"No Direito Privado a liberdade de contratar é ampla e informal, salvo as restrições da lei e as exigências especiais de forma para certos ajustes, ao passo que no Direito Público a

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42

Administração está sujeita a limitações de conteúdo e a requisitos formais para a realização e execução de seus contratos, mas, em contrapartida, dispõe sempre dos privilégios administrativos para a fixação e alteração das cláusulas de interesse público, e até mesmo pôr fim ao ajuste em meio de sua execução".(Meirelles, 2002, p.180)

Com liberdade para definir cláusulas contratuais e processos de seleção,

as empresas privadas podem utilizar diversas formas de contratação.

3.3.1 Principais Formas de Contratação

A escolha da forma de contratação tem três objetivos fundamentais: custo,

prazo e qualidade. Dependendo do grau de participação que as partes terão

sobre a obra, pode-se optar por diversas formas de contrato.

Segundo a literatura, existem dois tipos principais de contratação: por

"preço fixo" e por "administração". As formas aplicadas mundialmente são

utilizando um desses tipos, variando o envolvimento das partes na execução do

contrato (Ferreira, 2001).

Na contratação por preço fixo, o valor da obra é determinado durante a

fase de negociação, exigindo que o contratante tenha um orçamento pré-

elaborado de sua obra, de forma que possa discutir valores com o futuro

contratado. O preço pode ser fixado de duas maneiras: preço global, quando é

possível quantificar todos os serviços de uma obra, ou preço unitário, quando

algum serviço não pode ser quantificado. Esse tipo de contrato atende bem ao

prazo e custo da obra, mas pode vir a afetar um objetivo muito importante: a

qualidade da obra. Se o preço é fixo, deve-se definir muito bem o escopo do

contrato, para evitar que a construtora reduza a qualidade da obra em busca de

um lucro maior. Em licitações públicas os quatro regimes de execução indireta

são por preço fixo: "empreitada por preço global", "empreitada por preço unitário",

"empreitada integral" e "tarefa"11.

Na contratação por administração, ou "cost plus", o valor a ser pago pela

execução da obra é uma taxa percentual ou fixa, sobre os custos da obra. É uma 11 Art. 10, da Lei 8.666/93.

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modalidade em que o contratado fica numa situação cômoda, onde ele não se

preocupará muito com a otimização dos custos da obra, pois receberá o seu

lucro, independente dos custos (Ferreira, 2001). O contrato por administração foi

vetado na atual Lei de Licitações, só podendo ser aplicado no setor privado.

Mesmo assim, o contratante terá que ter uma participação muito ativa na

execução do contrato, com risco de ter a execução de sua obra com o prazo

prejudicado e o custo descontrolado. A participação, em geral, se dá pela

contratação de uma gerenciadora, que exercerá uma fiscalização rígida, com

poderes para ingerência técnica. Mas para o sucesso da obra, são necessários

uma especificação técnica bem detalhada e um projeto completo.

O contrato "Turnkey" (do inglês "girar a chave") é um tipo de contrato por

preço fixo, onde a contratada realiza todas as etapas do empreendimento,

entregando a obra pronta para o funcionamento (Ferreira, 2001, p.17). Nesse

caso a participação da contratante é a menor possível, sendo necessário um

cuidado especial na seleção da empresa contratada.

De acordo com Ferreira (2001, p.18), dentre as vantagens do contrato

"Turnkey", pode-se citar a responsabilidade do contrato depositada sob uma única

fonte e a rapidez de colocação em operação; e desvantagens a falta de controle

do contratante, o custo maior que a forma tradicional e a limitação para incorporar

modificações .

Segundo a Lei de Licitações, esse tipo de contrato não é permitido para

obras públicas, pois legalmente a execução do contrato deverá ser fiscalizada por

um representante da Administração, os projetos e execução deverão ser

previamente aprovados por ele e o contrato poderá ser modificado

unilateralmente, nos limites da legalidade, para atender às necessidades da

Administração Pública, descaracterizando assim o "Turnkey".

O contrato EPC (iniciais do inglês: Engineering, Procurement and

Construction), que corresponde a dizer projeto, aquisição, construção e

montagem, é muito utilizado na indústria do petróleo (Ferreira, 2001, p.20). Nesse

contrato, a contratante fornece o projeto básico, enquanto a contratada é

responsável pela elaboração de todos os outros projetos complementares, sub-

contratações e execução de toda a obra. Segundo Ferreira (2001, p.22), As

vantagens e desvantagens se aproximam do contrato "Turnkey". Muito se

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44

aproxima do regime de execução indireta "Empreitada Integral"12, prevista na Lei

de Licitações, mas pouco utilizado em obras públicas.

Nos contratos privados o contratante deve analisar a sua disponibilidade

para atuar mais efetivamente na execução do contrato, pois quanto menor sua

participação, maior o risco para a qualidade da obra. Nos contratos públicos não

existe essa análise, pois a própria Lei define para cada caso, através do tipo de

licitação13, o que é mais vantajoso para a Administração. E, segundo Meirelles

(2002, p. 82), a regra é o tipo de licitação "menor preço", e os demais tipos

constituem exceção.

3.4 A LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO NO MUNDO

3.4.1 Licitações e Contratos nos Estados Unidos

O Design-Build é uma modalidade de contratação onde um único

contratado é responsável pelo projeto e execução da obra. E, de acordo com o

National Society of Professional Engineers (NSPE, 2002), o Design-Build não é

um modelo de contratação recente. As grandes obras da civilização antiga foram

construídas com um sistema semelhante. Inclusive no início do surgimento dos

EUA como nação, onde muito de sua infra-estrutura foi executada de acordo com

os princípios do Design-Build.

Posteriormente o Design-Bid-Build14 foi estabelecido nos EUA para

execução de construções que atendessem ao crescimento da população e, ao

mesmo tempo, permitissem um custo menor. Tal sistema funcionou baseado em

projetos e especificações elaborados por profissionais competentes, mas

executados por contratados não necessariamente bem capacitados, mas 12 De acordo com Art. 6º, inc. VIII, alínea e), da Lei 8.666/93: "empreitada integral - quando se contrata um empreendimento em sua integralidade, compreendendo todas as etapas das obras, serviços e instalações necessárias, sob inteira responsabilidade da contratada até a sua entrega ao contratante em condições de entrada em operação, atendidos os requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e operacional e com as características adequadas às finalidades para que foi contratada". . 13 Art. 45, § 1º, da Lei 8.666/93. 14 No Design-Bid-Build o projeto e execução são dois contratos distintos e independentes, separados pela fase de licitação, diferente do que ocorre no Design-Build.

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45

eficazmente fiscalizados, produzindo assim um produto dentro de um nível

esperado, mas com um custo baixo. Sistema semelhante ao Design-Bid-Build

ocorre em muitas licitações de obras públicas brasileiras, onde o projeto e a

execução são eventos totalmente distintos e independentes.

Os Órgãos Públicos norte-americanos algumas vezes ficam restritos em

utilizar o Design-Build somente nos contratos de empreendimentos especializados

e em situações limitadas, devido às exigências regulamentares. Mesmo com

essas barreiras legais, o Design-Build tem sido usado pelo pelos Órgãos Públicos

dos Estados Unidos, que vêm buscando mudanças nas normas e regulamentos

para superar as barreiras e permitir uma melhor aplicação dessa modalidade de

contrato. Modalidade essa que tem sido muito bem aceita e usada

freqüentemente em outros países no mundo.

Segundo o NSPE (2002), o setor privado dos Estados Unidos vem

utilizando com sucesso o Design-Build desde a década de quarenta, e foi

estimado que em 1997 setenta e sete por cento dos projetos norte-americanos

privados foram executados com esse modelo de contrato. Apesar da próspera

aplicação no setor privado, não significa que o mesmo possa ocorrer na

Administração Pública, pois há diferenças significativas para seleção dos

contratados. Apesar do Setor Público norte-americano utilizar predominantemente

o Design-Bid-Build para contratação de suas obras, o uso do Design-Build vem

crescendo, principalmente para projeto e construção de prisões, edificações

públicas e militares, armazéns e outras construções, onde o escopo da obra pode

ser facilmente desenvolvido ou reproduzido. Em outras palavras, o Design-Build é

aplicado onde uma especificação de desempenho define perfeitamente o escopo

do contrato

Em algumas situações as restrições legais têm sido um desestímulo à

aplicação dessa modalidade de contrato. Como o caso do Governo Federal dos

EUA, onde o Federal Acquisition Regulation (FAR) não permite que a empresa

que projetou uma obra possa ser contratada para sua execução, exceto com

autorização de autoridade superior. Restrição semelhante ocorre na Lei de

licitações brasileira15.

15 Art. 9º, inc. I, da Lei 8.666/93.

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46

Em contrapartida, muitas outras entidades públicas americanas têm tido

menos restrições para o uso do Design-Build. Como exemplo pode ser citado o

U.S. Department of Defense (DOD), Departamento de Defesa Norte-Americano,

que possui autorização do Congresso Nacional, através do Military Construction

Authorization Act of 1986, de utilizar até três contratos por ano para aplicação do

Turnkey em construções militares. Muitas outras agências federais também

utilizam o Design-Build em um grande número de contratos de obras, como o

General Services Administration (GSA), que é responsável pela construção dos

edifícios federais e dos Departamentos de Energia.

Em nível estadual, as leis e decisões legais de diversos Estados passaram

a autorizar a aplicação do Design-Build. É o caso da Florida, cujo Estatuto permite

a sua aplicação por Órgãos específicos, como o Departamento de Transportes e

a Rede de Ensino. Outros Estados também possuem leis que permitem o Design-

Build para certos empreendimentos.

Observa-se, ao analisar o texto acima, que há uma tendência em aumentar

a aplicação do Design-Build em contratos de obras públicas norte-americanos.

Mas sendo o Design-Bid-Build um modelo que apresenta um custo menor (NSPE,

2002), pode-se concluir que o motivo dessa tendência está na necessidade de

obras que realmente atendam aos reais interesses da Administração Pública, que

não é fundamentalmente o menor preço.

Traçando um paralelo com a forma de contratação de obras públicas

brasileiras, onde o menor preço ainda é utilizado pela Administração Pública

como critério de vantagem para escolha da melhor proposta, observa-se que o

preço baixo de uma obra também não garante totalmente a satisfação dos

contratantes, como ocorre nos Estados Unidos, pois há um risco de queda de

qualidade derivado da separação entre o projeto e a execução.

3.4.2 Licitações e Contratos no Japão

Segundo Ohmura (2002), o Japão é o maior mercado do mundo em

construção. Só no ano de 1998 foram investidos 578 bilhões de dólares, sendo

que desses valores foram aplicados 263 bilhões de dólares em obras públicas.

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47

Visando esse mercado bilionário, o Departamento de Comércio Americano e o

Governo do Japão assinaram o Major Projects Arrangements, para que as

construtoras norte-americanas pudessem se familiarizar com os procedimentos

de licitações e contratos de obras públicas do Japão. Para aumentar o acesso de

empresas construtoras estrangeiras no País, o Governo do Japão promulgou em

1994 o Action Plan on Reform of the Bidding and Contracting Procedures for

Public Works, sendo um plano de ação que permite uma maior transparência dos

procedimentos licitatórios perante o mundo. O Action Plan resultou em

significativas oportunidades de negócios para as construtoras americanas, que só

no período de 1995 a 1997, as empresas americanas de projetos obtiveram uma

média de 12 bilhões de dólares em contratos por ano.

Devido ao vulto das obras públicas no Japão e seus grandes

investimentos, é interessante o estudo dos seus procedimentos licitatórios. De

acordo com o Ministry Of Land, Infrastructure And Transport Government Of

Japan (MLIT, 2002), foi especificado no Action Plan que serão empregados

amplamente o sistema de licitação aberto e competitivo por parte de diversas

entidades governamentais. Observa-se que, nesse processo de licitação, é

divulgado o convite às empresas interessadas, analisada a qualificação e

publicado o resultado das empresas. Serão consideradas as características das

empresas, suas filiais e matrizes dentro e fora do Japão, para avaliação dessa

qualificação. Só posteriormente é iniciado o processo de seleção. Para as

empresas estrangeiras participarem da licitação , terão que passar por essa fase

em cada comissão de licitação de cada obra pública.

Semelhante ao que ocorre no Brasil, são exigidas garantias contratuais

para execução das obras. Mas no Japão elas são divididas em dois grupos:

"garantia monetária" e "garantia de obra". Quando é definido pela Comissão de

Licitação que será utilizada "garantia monetária" em uma obra, o contratado terá

liberdade de escolher qual modalidade de garantia usar (fiança bancária, caução

ou performance bond), mas quando é definida "garantia de obra", a modalidade

obrigatória é o performance bond.

Outros sistemas de licitação continuam sendo aplicados no Japão. Pode

ser citado o Designated Competitive Bidding, ou Licitação Competitiva Designada,

que se divide em três tipos: "Convite Público", onde a Comissão definirá o

Page 50: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

48

universo de empresas que participará da qualificação, baseado no tipo de

empreendimento a ser licitado; "Inscrição por Interesse de Projetos", quando as

construtoras informam que tipo de obra ou projeto pretendem participar na hora

da qualificação técnica; e "diferente dos outros tipos citados", quando uma

comissão seleciona as empresas baseando-se nos registros de contratos em

outras obras públicas. Os tipos variam de acordo com o valor e porte das obras.

(MLIT, 2002).

Um sistema usado com restrições é o "Sistema de Contrato Discricionário",

onde a construtora é contratada sem licitação. É aplicado em duas situações:

quando o projeto requer da construtora uma tecnologia incomum ou quando há

restrições de prazo para realização de uma licitação competitiva. (MLIT, 2002).

Diversos Órgãos do Governo do Japão têm introduzido parcialmente os

seguintes sistemas de contrato em suas licitações: Design-Build System: apesar

das empresas estarem aptas a aplicarem esse sistema, um número pequeno de

órgão públicos têm começado a exigir os contratos Design-Build em suas

licitações públicas; Value Engineering (VE) System: é introduzido como um meio

de melhorar qualidade e reduzir custo de um projeto, onde metade do valor

economizado nesse sistema é devolvido ao contratante; e Technical Proposal

Integrated Evaluation System: é um sistema onde a comissão avalia não somente

o preço, mas também as propostas técnicas para seleção da proposta mais

vantajosa (MLIT, 2002), semelhante ao tipo de licitação "técnica e preço" previsto

na Lei 8.666/93 do Brasil16.

Observa-se algumas semelhanças entre o processo licitatório de obras no

Japão e no Brasil, porém algumas idéias poderiam ser aproveitadas, como o caso

de escolha da modalidade de garantia contratual, que em alguns casos no Japão

fica a cargo da Administração.

3.4.3 Licitações e Contratos na Europa

De acordo com o Organisation For Economic Co-Operation And

Development (OECD, 2002), a aquisição de bens e serviços públicos no setor

16 Art. 46, § 2º, da Lei 8.666/93.

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49

privado tem crescido muito em muitos países membros da União Européia. Para

acompanhar esse crescimento e permitir a grande participação de empresas

estrangeiras em determinado país, as leis de licitações acompanharam essa

tendência. Países da Europa Central e Oriental também buscam estabelecer

sistemas modernos de licitações públicas, permitindo transparência nas suas

aquisições e contratos. Para garantir a honestidade e combater a corrupção nos

processos licitatórios e contratos públicos, além das leis de procedimentos

administrativos, muitos países desenvolveram códigos de ética para atender tais

necessidades. É o caso da Polônia, que criou um código de ética exclusivo para

funcionários públicos que trabalham com licitações.

A União Européia e a Organização Mundial do Comércio exigem dos

países o estabelecimento de um procedimento profissional e imparcial para

atendimento a reclamações e supervisão do processo licitatório público. A

Hungria criou um Comitê de Arbitragem com grande autoridade para atender

denúncias contra processos licitatórios e com poder de anulação de contratos e

aplicação de multas por irregularidades. Na Eslováquia, o Ministério da

Construção e das Obras Públicas age como arbitro nas pendências dos

processos licitatórios. Na Polônia, em contrapartida, foi estabelecido um sistema

de arbitragem menos formal, onde o Escritório de Licitações Públicas atua nas

questões não solucionadas pelos demais Órgãos licitadores. (OECD, 2002)

A European International Contractors (EIC, 2002) é uma é uma associação

registrada e sediada na Alemanha, que representa o interesse das federações de

construtoras de 15 países europeus e tem por objetivo, dentre outros, representar

e promover os interesses internacionais da construção européia em todas as

questões relativas à atividade de construção em outros continentes. Como uma

representante internacionalmente ativa dos interesses das construtoras

européias, ela é fortemente contra a European Commission’s Proposal for a

Directive on the Co-ordination of Procedures for the Award of Public Supply

Contracts, Public Service Contracts and Public Works Contracts (chamado

somente de "Legislative Package") no que tange a não aplicação do Design-Build

nos contratos de obras públicas. Em outras palavras, o Legislative Package

propôs introduzir a separação obrigatória das duas fases do empreendimento: o

"projeto" e a "execução". De acordo com o EIC (2002), o contrato Design-Build é

Page 52: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

50

muito usado na Europa para construção de complexos industriais e infraestrutura

para escolas, hospitais e outras obras públicas, e sua proibição traria sérias

conseqüências para a competitividade entre as empresas construtoras. Há uma

tendência mundial na aplicação de contratos Design-Build e Turnkey em

empreendimentos na área de construção (EIC, 2002). A grande vantagem

apresentada é o alívio nos mecanismos de fiscalização e controle das obras,

permitindo a execução mais rápida e eficiente, e a facilidade em detectar

possíveis falhas no projeto em tempo hábil, pois todo o processo estaria nas

mãos de um único contratante. (EIC, 2002)

Como contribuição para o processo licitatório no Brasil, a criação de

códigos de ética exclusivos para funcionários públicos que trabalhos com

licitações e a criação de comitês de arbitragem para análise de pendências em

processos licitatórios poderiam trazer mais lisura e rapidez na execução dos

contratos.

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4. ANÁLISE DOS PROBLEMAS INERENTES A CONTRATAÇÃO DE OBRAS

PÚBLICAS

4.1 O MENOR PREÇO PARA OBRAS PÚBLICAS

Uma das principais causas de discussão entre os empreiteiros que

participam de licitações são os baixos preços apresentados pelas vencedoras,

opinião também defendida por Dias1 em cursos e palestras. Os valores das

propostas são influenciados pela própria legislação, que define em suas linhas o

que é mais vantajoso para a Administração Pública. No caso de obras, a Lei

determina que o menor preço é o critério que deve ser utilizado para análise das

propostas. Aliado a essa imposição, os Órgãos Públicos tem poder de definir o

teto dos orçamentos, como acontece com o Estado do Rio de Janeiro, que define

o catálogo de referências da EMOP2 como o valor máximo a ser pago pelos

serviços de uma obra, situação agravada pelo fato desses valores representarem

apenas os custos, pois essa tabela é isenta de BDI3 (Bonificações e Despesas

Indiretas).

O conceito de preço na engenharia civil, segundo Dias (2001, p.12), é a

soma dos custos diretos, dos custos indiretos e do lucro estimado. Mas, com a

competitividade nos dias atuais, o empresário deve minimizar os custos para

1 Dias, Paulo Roberto Vilela. Presidente do Instituto Brasileiro de Engenharia de Custos (IBEC), em comentário feito durante sua palestra no Seminário de Engenharia do Valor, realizado no Instituto Militar de Engenharia no período de 30 de outubro a 01 de novembro de 2001. 2 EMOP: Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro, cujo catálogo de preços é a referência para licitações públicas no Estado do Rio de Janeiro. 3 Segundo Dias (2001, p. 120): "BDI ou Bonificação é a parcela do custo do serviço independente, do que se denomina custo direto, ou seja, o que efetivamente fica incorporado ao produto".

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maximizar o lucro. Essa competitividade atinge a construção civil, pois é um setor

que tem muito que se fazer para reduzir custos. Segundo estudos realizados pelo

Instituto Mckinsey (1999, p.102) no setor privado, parte do motivo da baixa

produtividade da indústria da construção se dá por erros de projetos e

gerenciamento. Teoricamente, ao se analisar o estudo feito pelo Instituto

Mckinsey, um crescimento significativo de produtividade por parte dos

empreiteiros tornaria viável a execução de contratos públicos ao aplicar como

base os valores máximos apresentados nos orçamentos de licitações de obras

públicas, pois um aumento da eficiência na gerência das obras permitiria que eles

obtivessem o lucro almejado.

Com a experiência vivida como engenheiro da Comissão Regional de

Obras da 3º Região Militar do Exército Brasileiro4 (CRO/3), foi observado que

muitos empreiteiros não tem cuidado em estudar os editais e elaborar propostas

consistentes, que permitam concluir a obra de forma satisfatória e permitir o lucro

ao contratado. A maior preocupação está em vencer a licitação, independente do

preço apresentado. Como a Licitação Pública depende de previsão orçamentária,

muitas vezes a aprovação desse orçamento acarreta um fluxo muito grande de

licitações em um curto período e os empreiteiros têm uma grande oferta de obras.

As grandes empresas selecionam as obras mais rentáveis e têm estrutura para

participar de várias licitações simultaneamente, mas os médios e pequenos

empreiteiros muitas vezes só têm um orçamentista, que acaba preparando suas

propostas de forma descuidada, para poder participar de um maior número

possível de licitações.

Para proteger a Administração de preços muito baixos, apresentados em

licitações de obras e que possam comprometer a execução do contrato, a

legislação atual criou um mecanismo para desclassificação das propostas com

preços inexeqüíveis. A regra legal não é eficiente, como é observado no Apêndice

8.3 - ANÁLISE DO PREÇO INEXEQÜÍVEL PARA OBRAS PÚBLICAS, pois define como

preço inexeqüível um valor muito reduzido, onde o cálculo é baseado em um

percentual da média dos valores das propostas ou do orçamento do edital. Sendo

assim ela permite que propostas com valores muito pequenos sejam aceitas. 4 CRO/3: Comissão responsável pelo apoio técnico de engenharia para unidades militares sediadas no Estado do Rio Grande do Sul, inclusive licitando e contratando grande parte das obras.

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53

Pode-se perguntar qual o motivo de uma empresa querer ganhar a

execução de uma obra pública, mesmo com o preço muito baixo. Ainda que o

contratado de um Órgão Público saiba que não deixará de receber pelo serviço

executado, o que justificaria um preço menor pela isenção deste risco, a resposta

aparentemente está nas manobras que podem ser utilizadas para aumentar o

valor a ser recebido.

Diversas causas podem se apontadas como motivos para existência de

erros e omissões no edital e seus anexos, permitindo assim que os contratados,

contando com essas possíveis falhas e a possibilidade de se acrescer serviços

(até 25% para obras, podendo chegar a 50% do valor no caso de reformas)

possam convencer a fiscalização da necessidade de acréscimos ao contrato. Tais

falhas podem estar relacionadas à baixa capacitação técnica dos membros da

comissão de licitações; ausência de normas e procedimentos para elaboração

dos projetos e seus anexos; e falta de referências sólidas para aplicação de

composições de custos no orçamento do edital.

Ainda em relação ao interesse de se ganhar a licitação com um preço

muito baixo, há outra possibilidade que também lesa os cofres públicos: a

manipulação do orçamento para obter vantagens financeiras. Ao se analisar o

exemplo apresentado no Apêndice 8.2 - ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DO

CRONOGRAMA FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA, verifica-se essa possibilidade.

Mas enquanto o objetivo do contratado está apenas em receber os pagamentos

antecipadamente, o prejuízo não é tão grande. A situação se agrava quando há

má fé do empreiteiro, que executa apenas parte da obra, abandonando o

restante.

Porém, ao agir dessa forma com o Órgão Público, nada o impede de atuar

assim também com seus empregados e fornecedores, não cumprindo seus

compromissos financeiros. Nesse caso, a imagem da Administração Pública

também fica abalada, mesmo que a Lei a isente de qualquer responsabilidade por

encargos assumidos pela contratada5.

Entretanto, a perda financeira e o abalo da imagem da Administração não

são os únicos prejuízos, o dano social causado por uma obra atrasada ou

5 De acordo com o Art. 71, da Lei 8.666/93, "o contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato".

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54

inacabada muitas vezes supera o prejuízo material. Nos jornais e revistas, a

repercussão de obras não concluídas abalam a confiança dos contribuintes, que

vêem seus impostos serem gastos de forma inadequada.

Ao se analisar o que foi exposto, pode-se afirmar que nem sempre o menor

preço pode ser considerado o mais vantajoso. Porém, em teoria, pagar por um

objeto o menor valor possível é indiscutivelmente o critério mais vantajoso, mas

em se tratando de obras, não se está comparando objetos iguais. O mesmo

projeto, executado por empresas diferentes, resulta em prédios diferentes.

Entretanto, deve-se ressaltar também que a Legislação permite à comissão de

licitação julgar apenas a proposta, e não a empresa, que deverá atender apenas

as condições mínimas de capacitação. Logo, ao se aceitar uma proposta de um

empreiteiro que atende apenas a exigências mínimas de habilitação, há um risco

possível de se contratar uma empresa que propositalmente não pretenda cumprir

o contrato de forma satisfatória, bastando ela apresentar o menor preço.

Devido às estas e demais falhas da Legislação, é possível que licitantes

burlem o edital e o contrato de uma obra em seu favor próprio. O apêndice 8.2 -ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DO CRONOGRAMA FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA ilustra uma situação bem possível de ocorrer. A empresa altera os custos dos

serviços, superfaturando os iniciais, como fundações e estrutura, e subfaturando

os finais, como pintura e acabamentos. Ao manter o preço global inalterado, ele

poderá vencer a licitação e receber inicialmente valores superiores aos seus

custos. Caso a obra seja concluída, o prejuízo da Administração Pública será

mínimo, pois se restringirá ao custo do capital antecipado. O prejuízo será maior

se a empresa contratada abandonar a obra no meio, não permitindo sequer que

os outros licitantes a concluam, pois não aceitarão contratar por um preço abaixo

dos custos6. Outra situação de prejuízo para a Administração é quando os

recursos não forem suficientes para concluir a obra, pois a empresa receberá

muito além do preço de mercado pela parte executada.

Uma questão a ser analisada, como foi citado no capítulo 3.1.1 -

Dificuldades Encontradas, é o caso dos engenheiros dos Órgãos Públicos, que

também estão sujeitos ao problema da falta de tempo para elaboração dos 6 A Administração Pública pode convocar os licitantes remanescentes, na ordem de classificação, para concluir a obra inacabada, desde que aceitem as condições propostas pelo primeiro colocado.(Art. 64, § 2º, da Lei 8.666/93).

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55

projetos, especificações e orçamentos das obras a serem licitadas. Aliado a

outros fatores, este fator leva a descuidos e erros na elaboração dos documentos

técnicos, que servirão de base para que os licitantes preparem suas propostas.

Independente da causa, o erro técnico do edital dificilmente será observado por

alguma auditoria interna ou pela assessoria jurídica, por normalmente não

possuírem nos seus quadros pessoal com conhecimentos de engenharia. Caso

um erro no projeto básico passe desapercebido pela Comissão de Licitações e os

licitantes não se manifestarem, ele poderá ser uma ferramenta para que o

vencedor da licitação ganhe mais do que o valor apresentado na sua proposta

comercial.

Pode-se citar como exemplo o caso de uma obra pública, que prevê em

seu orçamento um serviço apresentando quantidades menores do que a

necessária para a execução da obra. Como o orçamento constante no projeto

básico deve representar quantitativamente a realidade a ser executada, o

empreiteiro terá direito a um aditivo contratual, onde serão acrescentados os

valores relativos à diferença de quantitativos, mesmo que a obra seja pelo regime

de execução de "empreitada por preço global". O construtor que age de forma

premeditada, superfatura o custo unitário do serviço que está com as quantidades

minoradas e subfatura outros serviços para manter o preço global. Ao ser feito o

pleito solicitando o pagamento da diferença, ele receberá um valor maior do que o

justo. A situação inversa também pode ser útil para o empreiteiro, pois se as

quantidades de um serviço estão majoradas, o licitante subfatura esse serviço

para ganhar a licitação, pois saberá que não será necessário executar toda a

quantidade prevista no orçamento do edital.

O exemplo acima reflete a importância de um projeto básico bem

elaborado. Qualquer erro de projeto poderá ser usado pelo vencedor da licitação

para obtenção de vantagem financeira. O objetivo do empresário é maximizar os

seus lucros, e não estará cometendo nenhuma ilegalidade em se aproveitar das

falhas da Administração Pública, pois cabe a ela evitar possíveis erros e tomar

providências para que não se repitam.

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56

4.2 AVALIAÇÃO DA EMPRESA VERSUS AVALIAÇÃO DA PROPOSTA

De acordo com o que foi apresentado no Capítulo 3.1.2 - Falhas Comuns

em Licitações Públicas, pode-se observar que a avaliação no processo licitatório é

baseada principalmente na proposta técnica, onde a avaliação da empresa se

restringe a uma qualificação mínima. Muitas vezes, para não ferir os princípios da

igualdade, da legalidade e do julgamento objetivo, o Administrador Público se

limita a exigências pouco eficazes, dando margem à participação da licitação de

construtoras sem condições reais para execução do contrato.

Nas licitações privadas, por não haver necessidade de se obedecer a

normas rígidas, como na Licitação Pública, o empresário pode exigir uma

avaliação da empresa a ser contratada, independente da proposta técnica. Em

alguns casos as situações econômico-financeira, jurídica e experiência técnica

serão critérios predominantes no julgamento da vencedora.

Na prática, em execução de contratos públicos de obras, a falta de uma

avaliação prévia da empresa muitas vezes implica numa obra mal executada, ou

em alguns casos, no abandono da obra antes de sua conclusão. Essa ineficácia

na inabilitação das licitantes é percebida no grande número de obras inacabadas,

ou com sua qualidade afetada7.

Quando se obriga, em cláusulas contratuais de execução de obras, a

certificação da empresa em um sistema de gestão de qualidade, a avaliação

extrapola a proposta e passa a estar relacionada com a empresa. Segundo

Justen Filho (2000, p. 348), essa exigência para obras públicas esbarra na

legislação vigente, por representar uma restrição ao direito de se participar na

licitação e ferir o princípio da isonomia, apesar de potencialmente trazer

benefícios para a Administração Pública. Entretanto, através de um acordo

setorial, há uma solução legal para atender o princípio da isonomia ao se exigir

uma certificação de qualidade.

7 Experiência observada ao participar durante 04 anos de licitações e contratos de obras públicas para o Exército Brasileiro.

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57

4.3 DIFICULDADE PARA SE EXIGIR QUALIDADE NO PROCESSO LICITATÓRIO DA OBRA

PÚBLICA A licitação de uma obra pública é muito mais complexa do que se pode

deduzir ao estudar a Lei de Licitações. Deve haver uma diferenciação entre os

diversos tipos de obras, levando em consideração não somente o seu valor total

para uma possível contratação. Uma série de fatores deve ser observada para a

escolha da melhor linha de ação a seguir na contratação de uma empresa, tais

como vulto da obra; complexidade de execução; dificuldade de obtenção de

matéria prima de qualidade e mão-de-obra qualificada no local; dificuldades de

mobilização e instalação; preparo dos funcionários públicos responsáveis pela

licitação; interesse dos participantes e outros.

Como foi observado no capítulo 1.2.3 Classificações: regimes de execução,

modalidades e tipos de licitação, para valores diferentes a Lei define modalidades

de licitação diferentes, isto é, a forma de licitar torna-se menos simples, mas o

critério de escolha da proposta mais vantajosa, o tipo "menor preço", não se

modifica. Entretanto, obras distintas, mas de valores muito diferentes, podem

necessitar do mesmo tempo para elaboração de suas propostas. Sendo assim, o

critério preço não deve ser o principal e único indicador de necessidade de tempo

de elaboração de propostas, pois se pode ter uma obra de construção de um

prédio de trezentos mil reais que exija muito mais tempo de orçamentação do que

a execução de uma terraplanagem no mesmo valor.

Deste modo, a "complexidade" da obra poderia ser um dos indicadores de

necessidade de tempo para elaboração dos editais e das propostas, apesar da

dificuldade de se mensurar a complexidade de uma obra utilizando critérios

objetivos.

Outro indicador de necessidade de tempo, além da complexidade, seria a

"urgência" da execução de uma obra. Porém, a urgência para sua execução pode

ter diferentes motivações: "social", quando a demora de sua execução afeta o

bem estar da sociedade; "política", por pressões de esferas administrativas

superiores; ou "administrativa", para atender aos prazos legais de efetuação de

pagamentos e conclusão do contrato.

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58

De forma inquestionável há necessidade de prazos compatíveis, tanto para

que os membros dos órgãos públicos possam elaborar de forma mais precisa e

correta os anexos do edital, quanto para que as empresas possam estudar e

analisar os projetos e especificações. Tal necessidade deve ser definida por

critérios técnicos, que levam em conta, além da "complexidade" e "urgência",

também o "vulto" e "preço" da obra.

Ao se analisar a dificuldade de obtenção de uma fórmula para licitação e

contratação de obras públicas, o fator tempo não é o único a ser considerado.

Para a elaboração de projetos, especificações e orçamentos que atendam às

necessidades do objeto a ser licitado, o Órgão Público deve ter em seus quadros

engenheiros e arquitetos competentes e bem preparados, ou a possibilidade,

meios e tempo para contratá-los. No Brasil há mais de cinco mil municípios, e

todos tem autonomia administrativa para licitar e contratar suas obras. A maioria

dos pequenos municípios não tem estrutura para preparar projetos básicos e

fiscalizar a execução de obras relativamente complexas, sofrendo assim

dificuldades para análise de propostas e deficiências na sua qualidade de

execução. De acordo com o disposto, o processo licitatório deve considerar não

somente o objeto e os licitantes, mas também quem vai licitar, se o órgão possui

competência para montar um edital de acordo com as normas atuais e gerir todo

o processo licitatório, além de ter capacidade de fiscalização durante a execução

do contrato.

Outro aspecto é a dificuldade de mobilização e instalação em determinadas

regiões inóspitas, que deveriam ser consideradas ao se analisar as propostas. Em

licitações com o tipo "menor preço", as empresas que atenderem os critérios

mínimos na fase de habilitação estarão aptas a vencer a licitação baseada

apenas na proposta comercial, independente de sua melhor ou pior capacidade

de trabalhar em locais inóspitos ou afastados de grandes centros. O Brasil possui

regiões com características muito diferentes, que podem influenciar

consideravelmente na qualidade de execução de obras por construtoras que não

tenham capacidade técnica para atuar com as dificuldades relacionadas. Quando

uma empresa se aventura em construir com o dinheiro público em uma região que

possui dificuldades de mobilização e instalação, o risco de insucesso é

considerável, e o custo recairá também sobre a Administração Pública.

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59

Certamente a participação de empresas sem experiência local não deve ser um

impedimento para sua participação na licitação, pois deve ser mantido o princípio

constitucional da isonomia, mas a sua capacidade técnica para realizar obras em

localidades de difícil acesso é um fator que deveria ser levado em consideração,

em conjunto com outros fatores, na escolha da vencedora. Pois, como foi

analisado nos capítulos 3.2.1 - Falhas Comuns em Licitações Públicas e 4.2 -

AVALIAÇÃO DA EMPRESA VERSUS AVALIAÇÃO DA PROPOSTA, o processo licitatório

não classifica a empresa pela capacitação técnica, apenas a habilita ou não.

Em relação à habilitação de uma empresa, ela é analisada pela Comissão

de Licitação por quatro aspectos principais8: Habilitação Jurídica, Qualificação

Técnica, Qualificação Econômico-financeira e Regularidade Fiscal. Nesta fase, as

exigências documentais não podem ser excessivas, de modo a restringir o

número de participantes. Inclusive a Lei 8.666/93 limita essas exigências,

relacionando os documentos que devem ser apresentados.

Dos quatro aspectos apresentados acima, o que se relaciona mais com o

estudo em questão é a Qualificação Técnica. Os documentos apresentados dessa

qualificação devem ser suficientes para comprovarem a capacidade da

construtora em atender a execução do contrato de acordo com as exigências do

edital e seus anexos. Dentre as exigências, está o fornecimento de atestados,

fornecidos por pessoas jurídicas, que comprovam sua capacidade. Conforme foi

citado anteriormente, não pode ser exigido comprovação de atividades ou aptidão

com limitação de tempo, época ou local específico. Além disso, segundo Mukai

(1995, p.36), a exigência de atestados com limitação de quantidades, em

números certos e determinados, também não é permitida. Mas tecnicamente

torna-se difícil para a Comissão julgar uma habilitação técnica sem um parâmetro

objetivo, que é a referência numérica. A falta de uma referência pode dar margem

a recursos administrativos por parte dos desclassificados e atraso no processo,

gerando assim uma tendência da Comissão em julgar favoravelmente às

empresas que apresentarem atestados com quantidades inferiores às

quantidades de serviço previstas para execução do objeto licitado.

8 Art. 27, da Lei 8.666/93.

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60

Deve-se ressaltar também que, de acordo com Motta (2000, p.126), o

acervo técnico já foi considerado no passado como bem pessoal intransferível9 do

profissional, mas que hoje perdeu sua validade. Com a Resolução n. 317, de 31

de outubro de 1986 do CONFEA, ficou revogada a retirada do acervo técnico da

construtora, caso o profissional seja desligado (Motta, 2000, p.127), conforme

citação do artigo 4º da referida resolução:

"Art. 4º. O Acervo Técnico de uma pessoa jurídica é representado pelo Acervo Técnico dos Profissionais de seu quadro técnico e de seus consultores técnicos devidamente contratados".

Parágrafo único. O Acervo Técnico de uma pessoa jurídica variará em função da alteração do Acervo Técnico de seu quadro de profissionais e consultores."10

Outra questão é a empresa, que ao passar pela fase de habilitação, não

poderá mais ser desclassificada na abertura das propostas por aspectos na fase

anterior. Como o critério de análise é o menor preço, muitas vezes é possível que

a diferença de valores entre a primeira e segunda colocada seja pequena em

relação à diferença de capacidade entre elas. Por exemplo: uma empresa "A"

com dois anos de existência, que realizou apenas uma obra do vulto da licitada e

teve como proposta o valor de R$ 999.000,00: e a empresa "B", com vinte anos

de experiência e dez obras do vulto da licitada, mas com uma proposta de R$

1.000.000,00. Provavelmente, em uma licitação privada, a empresa "B" seria a

contratada, pois a diferença de valores é irrelevante em relação à diferença de

experiência, mas em se tratando de Licitação Pública, o critério menor preço

indiscutivelmente obrigaria a Administração a contratar a empresa "A". Esse

exemplo, apesar de se restringir hipoteticamente a um único parâmetro, ilustra o

problema de se contratar pelo menor preço, pois quando a diferença entre os

valores se torna insignificante, o critério avaliação da capacidade técnica pode

passar a ser o mais vantajoso.

Daí as dificuldades para se chegar a uma equação que determine o que é

mais vantajosa, a proposta de menor preço ou a de melhor capacidade técnica.

9 Segundo a revogada Resolução n. 230/75 do CONFEA. 10 Resolução n. 317, de 31 de outubro de 1986 do CONFEA

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61

Obras simples, de pouco valor, não justificam que uma empresa tenha

obrigatoriamente uma grande experiência profissional ou que aplique processos

modernos e mais eficientes para executá-las, sendo o critério preço, em conjunto

com outros, aceitável. Mas obras mais sofisticadas, com instalações mais

modernas, necessitam de empresas que tenham uma maior capacidade técnica

para sua execução. A dificuldade está, utilizando parâmetros objetivos, em definir

qual critério usar em cada caso.

A Lei define mais dois critérios para julgamento de propostas: o tipo

"melhor técnica" e o tipo "técnica e preço". Esses dois tipos não podem ser

usados em licitação de execução de obras, podendo ser utilizados

exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual11, como

projetos, fiscalização, gerenciamento e outros. Excepcionalmente pode-se utilizar

esses dois tipos de licitação para execução de obras, desde que sejam de grande

vulto e majoritariamente de tecnologia nitidamente sofisticada e de domínio

restrito12. Segundo a Lei, mais uma vez são utilizados valores para definir a

característica de uma obra. É o caso de obra de grande vulto, que nos dias atuais

equivale a R$ 37.500.000,00. Para Órgãos Públicos que lidam com grandes

quantias de dinheiro, esse valor poderia ser razoável, mas para outros, como

secretarias de pequenos municípios, com recursos orçamentários muito

reduzidos, o próprio limite da modalidade convite (R$ 150.000,00) poderia ser

considerado um valor de obra de grande vulto, apesar de não necessariamente

ser uma obra complexa, pois a perda dessa quantia poderia comprometer muito

as finanças públicas desse Órgão.

O tipo de licitação "melhor técnica"13 consiste em avaliar e classificar as

propostas dos licitantes de acordo com critérios técnicos, previamente definidos

no edital. Tais critérios devem considerar a capacitação e a experiência do

proponente; a qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia,

organização, tecnologias e recursos a serem utilizados no objeto; e a qualificação

das equipes técnicas envolvidas no trabalho. Após a classificação, os envelopes

contendo os valores são abertos e, como todos os classificados possuem

capacidade mínima para execução do contrato, é oferecido ao primeiro colocado 11 Art. 46, da Lei 8.666/93. 12 Art. 46, § 3º, da Lei 8.666/93 13 Art. 46, § 1º, da Lei 8.666/93

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da avaliação técnica a aceitar a execução pelo menor valor apresentado. Caso

nenhum dos participantes com pontuação superior não aceite o menor valor, a

empresa responsável pelo menor preço deve obrigatoriamente ser contratada. À

primeira vista, o tipo "melhor técnica" garantiria uma obra de qualidade, mas caso

os outros participantes não aceitem o menor valor apresentado, isso poderia ser

um indicativo de que o preço da vencedora estaria muito baixo, mesmo que essa

empresa atendesse à pontuação mínima, a não ser que a construtora possuísse

um equipamento ou tecnologia única, que permitisse uma redução de custos

muito representativa em relação aos outros. Outra dificuldade está em criar

critérios técnicos de pontuação que garantissem o princípio da isonomia e não

direcionassem a licitação para poucos participantes, lembrando que a licitação

pública não busca contratar com a melhor empresa, mas sim com a que

apresentar a melhor proposta.

Quanto ao tipo de licitação "técnica e preço"14, a diferença está em criar

pontuação para requisitos técnicos e para o preço, sendo que nesse caso o

Órgão Público contrata com a empresa que oferecer a maior pontuação, e não o

menor preço. Teoricamente a média ponderada de preço e técnica ofereceria a

melhor proposta para Administração, mas esse critério necessita de um Edital

muito bem elaborado, que tenha condições de ponderar de forma precisa, de

acordo com as necessidades de cada obra, os pesos de cada requisito. Como foi

visto anteriormente, muitos Órgãos Públicos não possuem uma equipe técnica

disponível para elaboração desses critérios, inviabilizando a utilização desse tipo

de licitação para um grande número de obras. Além disso, deveria ser criada uma

forma de classificação das obras, avaliando vultuosidade e complexidade, que

não levasse em conta apenas o valor do contrato, e essa classificação poderia

definir o critério para contratação de obra.

14 Art. 46, § 2º, da Lei 8.666/93

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5 SUGESTÕES PARA GARANTIR QUALIDADE NA OBRA PÚBLICA

5.1 SISTEMA DE QUALIDADE NA OBRA PÚBLICA

O Direito Administrativo difere dos outros direitos, pois na Administração

Pública só pode ser feito aquilo que está explícito na Lei, o Administrador não

pode tomar iniciativas fora do que está previsto nela. Em relação à Lei de

Licitações, não constam exigências de certificação de qualidade na fase de

habilitação. Segundo Justen Filho (2000, p. 348), a exigência de certificado ISO

9000 pode representar um grande risco de vício, pois gera uma indevida restrição

ao direito de participar da licitação. Porém ele não condena a previsão de

certificado ISO 9000 como evidência de habilitação, desde que não se restrinja a

participação dos não certificados que comprovem o atendimento aos requisitos

necessários à satisfação dos interesses públicos.

Justen Filho (ibid.) relaciona certificação de qualidade com idoneidade para

execução do objeto licitado. Tal afirmação não representa o objetivo da

implantação de um sistema de qualidade. Como foi visto no capítulo 1.2.1 - ISO

9000, o certificado de qualidade não é considerado um atestado de idoneidade,

mas sim uma certificação de que a empresa garante que sua organização estará

estruturada para atender aos requisitos pré-determinados e ao que foi

inicialmente acordado entre as partes.

Com a globalização e o crescimento do número de construtoras

certificadas, a tendência é aumentar a quantidade de contratos privados com

cláusulas exigindo certificação de qualidade. O próprio PBQP-H influenciará as

construtoras, através de limitação de financiamento da Caixa Econômica Federal,

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a aderirem ao Programa. Nos Estados Unidos e países da Europa, essas

exigências são comuns e não representam uma restrição discriminatória, e sim

mais uma garantia de que o produto final, a obra, atenderá aos requisitos

contratuais. Observando a tendência mundial, é questão de tempo a exigência de

certificação de qualidade nos contratos públicos, como se pode notar na evolução

crescente dos programas de qualidade, como o QUALIPAV-RJ - Programa da

Qualidade na Pavimentação, Obras de Arte Especiais e Drenagem Urbana da

Cidade do Rio de Janeiro; QUALIOP-BA - Programa de Qualidade das Obras

Públicas do Governo do Estado da Bahia, considerado o mais abrangente da área

em todo o Brasil; e o QUALIHAB-SP - iniciativa pioneira na área da qualidade.

5.2 SUGESTÕES PARA OS REGULAMENTOS LICITATÓRIOS

5.2.1 Sugestões sem Alteração da Legislação

Na busca de sugestões que visam melhorar o processo de seleção e

contratação de obras públicas, pode-se tomar providências administrativas sem

necessariamente precisar modificar a legislação vigente. A própria Lei 8.666/93

permite a elaboração de normas internas de cada Órgão Público, que têm por

objetivo definir procedimentos para cada etapa do processo licitatório, desde que

os seus artigos e princípios não sejam burlados.

Um procedimento que independe da Lei de Licitações e surte um efeito

imediato na melhoria da licitação e contratação da Obra Pública é a definição de

um plano de obras1 antecipado para cada Órgão. O objetivo do plano de obras é

permitir que a Unidade Administrativa organize o seu calendário de licitações e

que tanto a Comissão de Licitações prepare de forma ordenada e cuidadosa o

edital e seus anexos, como o licitante tenha um tempo maior para elaborar sua

proposta. Como foi citado no capítulo 4.3 - DIFICULDADE PARA SE EXIGIR

QUALIDADE NO PROCESSO LICITATÓRIO DA OBRA PÚBLICA, só é justificável a falta de

um planejamento antecipado apenas para obras emergenciais ou que sejam fruto

1 Plano de Obras é um calendário com a previsão de todas as obras, e seus respectivos créditos, para um determinada Unidade Administrativa durante o ano.

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de acontecimentos recentes, como o caso de manutenção predial, onde o

vazamento de um esgoto ou a queima de um transformador não poderiam

esperar entrar no plano de obras do ano seguinte, caracterizando-se assim uma

situação de urgência. As demais obras, principalmente de construções novas, não

podem surpreender uma Unidade Administrativa, devendo ser previstas com

antecedência.

A elaboração antecipada de um plano de obras também está ligada à outra

necessidade: a distribuição de recursos. Com uma previsão de recursos realista,

que apresente um cronograma de desembolso confiável e esteja ajustado com o

cronograma físico-financeiro das diversas obras, o empreiteiro reduzirá o

percentual de riscos e eventuais nas despesas indiretas de suas propostas. Essa

redução implicará na diminuição do preço final da obra e, principalmente, na

garantia de sua conclusão, pois o atraso do pagamento reduz o lucro do

contratado, podendo inclusive causar prejuízo e paralisação da obra, como foi

demonstrado no Apêndice 8.1 - ANÁLISE DE CUSTO DE CAPITAL EM RELAÇÃO AO

ATRASO DE PAGAMENTO DE ÓRGÃOS PÚBLICOS.

Com um planejamento antecipado de obras previstas para um determinado

período, uma providência pode ser tomada facilmente: o aumento do tempo para

entrega das propostas. A Lei define prazos mínimos, mas devido a imposições

administrativas já citadas anteriormente, esses prazos dificilmente são

estendidos. Cabe ao Órgão Público, de acordo com a complexidade de cada

contrato, definir prazos compatíveis com as dificuldades encontradas para

elaboração dos respectivos orçamentos, não baseando essa definição apenas no

valor orçado para cada obra.

Deve-se também dar uma atenção especial ao Projeto Básico, pois como o

próprio nome diz, servirá de base para elaboração das propostas técnicas. É

importante que ele seja bem confeccionado e isento de falhas, mas para isso são

necessários tempo, meios e pessoal habilitado. O Órgão que trabalha com

licitações de obras deve ter essa estrutura disponível para elaboração dos editais

e anexos, pois será um fator decisivo para execução de uma obra sem surpresas

e percalços, pois é o Projeto Básico que fornece todas as informações

necessárias para que o orçamentista da construtora prepare o seu orçamento de

acordo com a realidade da execução. Outra medida que facilita a preparação do

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orçamento, tanto do edital como dos licitantes, é a existência não do Projeto

Executivo completo, mas pelo menos dos projetos complementares (fundações,

estrutural, instalações e outros), pois permite o levantamento de quantitativos

mais próximos da realidade.

Outra questão importante é que, devido às limitações de exigências

previstas em Lei na fase de habilitação, um número ilimitado de empresas pode

se habilitar para participar de licitações de obras públicas. Em muitas empreiteiras

mal estruturadas, é comum ter um engenheiro responsável por diversas

atividades concomitantemente, como orçamentação, planejamento, projeto

executivo, responsável técnico pela execução da obra, administração da empresa

e outros, pois há poucas exigências técnicas para o funcionamento de uma

empresa. Além disso, o Órgão Público não pode determinar que uma empresa

tenha conhecimentos profundos sobre a Legislação vigente e outros assuntos

relativos a licitações e contratos, apesar de que, legalmente, o desconhecimento

da Lei não pode ser aceito como justificativa por seu não cumprimento. Sendo

assim, a Administração Pública poderia criar uma instituição específica para

prestar um serviço de divulgação de informativos e preparação de palestras e

cursos sobre os temas: Licitações e Contratos Públicos; Planejamento e Controle

de Obras; Engenharia de Custos; Sistemas de Qualidade e outros assuntos que

podem trazer uma melhoria na qualidade da elaboração das propostas, como

também na execução dos contratos. A desinformação é um mal que pode ser

combatido com medidas de custos relativamente baixos e boa vontade das

pessoas envolvidas.

Por fim, a questão da exigência contratual de certificados de qualidade em

licitações públicas, que não é permitida, pois fere os princípios da igualdade e

legalidade. Apesar da proibição, o incentivo à aplicação dos sistemas de

qualidade em obras é uma iniciativa saudável para as empreiteiras, pois os

requisitos exigidos propiciam melhorias nos diversos setores da empresa e,

conseqüentemente, bom para a Administração Pública, que se tornará um cliente

com produtos e serviços com uma garantia maior de que os requisitos pré-

estabelecidos serão pretendidos pelo contratado. Porém, deve-se ressaltar mais

uma vez o respaldo legal dos acordos setoriais, pois são mecanismos que

permitem uma exigência de certificação sem ferir o princípio da isonomia.

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Através dos acordos setoriais, criou-se uma possibilidade legal de

aplicação do PBQP-H pelos órgãos públicos que licitam obras. Para servir de

roteiro para padronização de procedimentos a serem adotados, a Secretaria

Especial de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República criou o Manual

para Sensibilização Estadual do PBQP-H, com o objetivo de:

"...oferecer aos Representantes Estaduais do PBQP-H e aqueles interessados em promover a Adesão de seu Estado ao Programa um conjunto padronizado de documentos que permitam registrar as etapas básicas da sensibilização estadual, bem como oferecer aos agentes dos setores público e privado a documentação básica para a formalização da adesão." (PBQP-H. Manual, 2003)

Os passos apresentados no manual descrevem a seqüência de

procedimentos que se deve seguir para implantação do Programa, que começa

com primeira reunião de sensibilização, realizada por técnico enviado pela

Coordenação Geral do PBQP-H. A Coordenação já tem pronta uma apresentação

padrão atualizada, que é utilizada em todas as reuniões de sensibilização. Os

passos seguintes são: a escolha de um coordenador estadual ; a adesão, através

de um termo de adesão, que implica em uma expectativa de que seja formalizado

o compromisso entre o setor público e o privado, e de que os requisitos

consensados no âmbito do PBQP-H passarão a ser gradualmente exigidos

quando das contratações e licitações; e a implantação do PBQP-H, através de um

Programa Setorial , elaborado de acordo com o roteiro abaixo:

"1. Listar as entidades representativas do setor. 2. Listar as empresas associadas e sem campo de atuação. 3. Diagnóstico da qualidade do setor: resumir o diagnóstico da atual situação do setor, indicando os programas de gestão da qualidade existentes ou em desenvolvimento; 4. Estimativa do número total de empresas, produção anual total do setor, geração de empregos do setor, indicador global de HH/m2 de construção etc. 5. Normalização técnica: listar as normas técnicas existentes com resumo do assunto (título), listar as normas que devem ser atualizadas e elaboradas, listar as normas técnicas de empresas e/ou associações que poderão constituir-se em

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textos-base, listar os manuais técnicos específicos com o mesmo objetivo do acima referido; 6. Definir metas e prazos para implantação das diferentes atividades do PBQP-H. " (PBQP-H. Manual, 2003)

Contudo, para melhorar o desempenho de suas atividades e servir de

exemplo para as construtoras, é interessante que o Órgão Público também

aplique um sistema de qualidade em sua administração, contribuindo assim para

sua melhoria contínua e atendendo às necessidades das partes interessadas de

forma satisfatória. Pois não tem sentido o contratante exigir aplicação de sistemas

de gestão de qualidade em suas obras por parte dos contratados, sem que as

aplique em sua própria organização.

5.2.2 Sugestões com Alteração da Legislação

A Lei de Licitações tem por finalidade preservar a Administração Pública de

possíveis prejuízos decorrentes de má administração, fraudes, desvios de

dinheiro, suborno e outros atos ilícitos possíveis de ocorrer ao se contratar com

pessoas físicas ou jurídicas. Quando o legislador, que não necessita ter profundo

conhecimento sobre obras, elabora uma Lei muito rígida, o processo de licitação e

contratação fica limitado a procedimentos genéricos, que muitas vezes

desconsidera as peculiaridades de cada obra. Como foi citado anteriormente, o

contrato deve se adaptar ao empreendimento, mas na contratação de obras

públicas ocorre o contrário, o objeto do contrato deve se adaptar aos

procedimentos pré-determinados pela Lei. O objetivo a seguir não é criticar a Lei

8.666/93, mas sugerir alguns procedimentos que contribuiriam para a qualidade

na contratação de obras públicas, mas não podem ser aplicados por ferir a

legislação vigente.

Como foi visto no capítulo 4.3 - DIFICULDADE PARA SE EXIGIR QUALIDADE NO

PROCESSO LICITATÓRIO DA OBRA PÚBLICA, o critério usado para classificar uma

obra é o preço orçado pela Administração. Outros fatores poderiam ser

considerados para classificação das obras, devendo ser criado um critério

baseado na complexidade vinculado ao preço. O objetivo dessa classificação é

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proporcionar a escolha da melhor modalidade e do melhor modelo de contrato.

Dessa forma uma obra complexa, mesmo com um preço relativamente baixo,

teria um tratamento diferenciado por parte da Administração e dos licitantes. Um

desses tratamentos seria a ampliação dos prazos para entrega das propostas,

que pela legislação atual dependeria da modalidade de licitação e

conseqüentemente do valor orçado pela Administração.

Uma sugestão para este problema seria dividir as obras por categorias, de

acordo com suas complexidades, como por exemplo: construção pesada;

construções residenciais unifamiliares (casas isoladas); construções residenciais

multifamiliares (condomínios e prédios); construções de prédios públicos de uso

coletivo (escolas, ginásios, creches, pavilhões); construções de prédios públicos

de utilização especializada (hospitais, laboratórios, quartéis); e outras mais. As

reformas e restaurações também seguiriam uma classificação semelhante, sendo

que a definição da modalidade e regime de execução atenderia, dentro de cada

categoria, a uma faixa de preço orçado pela Administração. Contrário ao que

ocorre atualmente, onde a análise considera apenas o preço global e não a

complexidade. Desta forma um condomínio popular e um laboratório de análises

clínicas podem ter processos licitatórios diferenciados, mesmo que o orçamento

global das duas obras seja o mesmo. Acima foi citado um exemplo simplificado

para retratar a idéia, mas para se definir as categorias e suas faixas de preço

seria necessário um estudo muito mais aprofundado e específico.

Segundo a Lei vigente, a empresa não é classificada em uma licitação de

obras, e sim a sua proposta. O que ocorre é uma fase inicial de habilitação, onde

a construtora está em duas situações: habilitada ou inabilitada. Na fase de análise

das propostas a capacidade técnica não é considerada para fins de classificação.

Isso ocorre na maioria das licitações de obras, onde o tipo "menor preço" é

obrigatoriamente utilizado, salvo exceções previstas em Lei.

A sugestão nesse caso é a possibilidade de utilizar outros tipos de licitação

para obras além do "menor preço", considerando, por exemplo, as categorias de

obras que foram citadas anteriormente, e não só o preço. Além disso, a empresa

deveria também ser avaliada e classificada de acordo com a sua capacidade para

execução do contrato, sendo indicado neste caso a exigência de um sistema de

gestão de qualidade para poder participar da licitação de uma obra. Na seleção

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70

de propostas para um contrato privado, a contratante considera os aspectos

técnicos, financeiros e jurídicos da futura contratada para decidir, e não somente

as condições apresentadas na proposta. A Administração Pública também deveria

considerar esses aspectos para escolher a proposta mais vantajosa. Legalmente

sendo permitido a aplicação de outro tipo de licitação, a Administração deve criar

critérios objetivos para análise e classificação, não só das propostas técnicas,

mas também das empresas participantes, ponderando esses aspectos com o

preço apresentado. Outra questão que necessita de um estudo aprofundado para

ser solucionado, pois para cada caso as ponderações variam.

Apesar de algumas atitudes por parte da Administração poderem ser

tomadas sem necessidade de alteração da Lei, a sua obrigatoriedade garantiria

sua aplicação. É o caso da apresentação dos projetos complementares junto com

o Projeto Básico. Tecnicamente não é muito vantajosa a apresentação do Projeto

Executivo completo na licitação, pois poderia impedir a aplicação de soluções

mais viáveis e baratas para execução da obra, mas os projetos complementares

(estrutural, fundações, instalações,...) facilitam a elaboração do orçamento,

evitando estimativas fora da realidade para serviços, que não são quantificados

de forma mais precisa por falta de dados de projeto.

Outro aspecto que pode ser evitado com alterações na legislação é o caso

da empresa que utiliza todas as ferramentas legais para maximizar seus ganhos,

inclusive aplicando artifícios apresentados no Apêndice 8.2- ANÁLISE DA

IMPORTÂNCIA DO CRONOGRAMA FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA. Para resolver

esse problema, a Lei deveria permitir a criação de dispositivos para impedir que o

empreiteiro manipule o orçamento de sua proposta. Uma sugestão é analisar o

preço inexeqüível não pelo preço global apresentado na proposta, mas item a

item do orçamento, obrigando o orçamentista da empresa a não redistribuir

valores de sua proposta.

Uma atitude que também é tomada pelo empreiteiro que deseja vencer a

licitação é a não escolha do seguro garantia como garantia contratual, pois é a

modalidade que representa o maior custo, apesar de ser a melhor para a

Administração. A solução para este problema estaria em passar para a

Administração Pública a opção de escolha da modalidade de garantia. Como

todos teriam que embutir em seus custos indiretos o valor do seguro-garantia, ou

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71

a modalidade previamente definida em edital, essa decisão não influenciaria na

vencedora, a não ser que o custo do seguro mudasse de empresa para empresa,

devido à variação de risco de cada uma. Seria uma vantagem para o Órgão

Público, pois a própria classificação de risco das seguradoras contribuiria para a

seleção da melhor construtora. Quanto aos custos do seguro aumentarem o preço

da obra, as vantagens superam a diferença, além dessa mudança contribuir

também para a queda dos valores do seguro, pois a demanda aumentaria com o

passar do tempo.

Por fim, existe a questão da dificuldade que muitas unidades

administrativas sofrem para elaborar o edital e fiscalizar o contrato de uma obra

pública. Como não são todas as unidades que possuem pessoal habilitado, os

riscos de falhas e vícios nas licitações são acentuados. Para solucionar tal

problema, seria viável a criação de instituições, compostas por engenheiros,

técnicos e advogados, com destinação exclusiva de licitar e fiscalizar a execução

de obras públicas, facilitando inclusive auditorias e aliviando as responsabilidades

de órgãos despreparados para este tipo de atividade.

Sistema semelhante já existe no Exército Brasileiro, onde as Comissões

Regionais de Obras são responsáveis pelo processo licitatório de obras em

diversas unidades militares, entregando a construção pronta para o uso. Estas

instituições a serem criadas, especializadas em licitações e contratos, poderiam

ter outras atribuições, como a de divulgação de informativos e apresentação de

palestras e seminários sobre assuntos relacionados ao tema, como: Licitações e

Contratos Públicos, Planejamento e Controle de Obras, Engenharia de Custos e

Sistemas de Qualidade. Tais atividades poderiam atender tanto ao público

interno, como às empresas e profissionais que participam de licitações.

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6 CONCLUSÃO

Ao concluir o presente trabalho, os objetivos iniciais foram atingidos. O

processo licitatório e contratação de obras públicas no Brasil foram apresentados.

Demonstrando suas anuências, falhas e omissões, ficou clara a necessidade de

seu estudo por parte dos licitantes, e também dos funcionários públicos

envolvidos no processo, além de imperativo a divulgação da importância da

qualidade na licitação e contratação de obras públicas.

Observando-se o crescimento da qualidade na indústria da construção,

notou-se que as empresas construtoras têm passado por uma evolução

significativa ao aplicarem sistemas de gestão de qualidade, como a ISO 9000 e,

mais especificamente, o PBQP-H. Tal evolução se reflete no crescente número de

construtoras certificadas.

Ficou evidente também a busca de um objetivo comum na licitação e

contratação, seja no Brasil ou no exterior, seja no setor público ou privado: a

procura de uma proposta vantajosa, onde a contratante tenha sua obra de acordo

com o especificado, e o contratado receba um preço justo pelo seu trabalho. Para

o Poder Público brasileiro atingir tal objetivo, deve reformular o seu processo

licitatório, a começar pelo critério de seleção pelo "menor preço", que

indiscutivelmente é falho e ineficaz, pois sua aplicação parte do pressuposto que

o objeto está bem descrito e definido no contrato, o que não ocorre na

contratação de obras. Além disso, buscar a utilização de modalidades de garantia

contratual eficientes, que cumpram o seu objetivo final, que é a garantia da

conclusão da obra. Observa-se que a garantia mais apropriada é realmente o

seguro-garantia, ou mais conhecido mundialmente como performance bond.

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73

Outros aspectos foram apontados como importantes para a melhoria do

processo licitatório, principalmente o desenvolvimento de sistemas de definição

de obras e análise de qualificação de empresas.

As sugestões apresentadas na dissertação não se restringem apenas à

alteração da legislação. Mudanças de procedimentos permitiriam a obtenção de

obras de qualidade e de acordo com as necessidades das diversas instituições

públicas, como melhoria dos projetos e especificações; divulgação e preparação

de palestras sobre temas inerentes ao assunto (Legislação, Engenharia de

Custos, Sistemas de Qualidade e outros) e estímulo à aplicação de sistemas de

gestão de qualidade, tanto nas empresas contratadas, como também nos próprios

órgãos públicos. Como exemplo pode-se citar a adesão maciça dos estados ao

PBQP-H, como Bahia, Pará, São Paulo, Rio de Janeiro e outros, demonstrando a

viabilidade do caminho apresentado. Porém, devido ao pouco tempo de

divulgação e implantação do Programa, ainda não há condições para uma melhor

avaliação adequada do desempenho geral dessas obras, se houve realmente

melhoria da qualidade, menos problemas e como se comportaram os preços

relativos.

Dentre todas as sugestões, a exigência contratual de certificação de

qualidade é uma realidade no setor privado, sendo também uma tendência para

contratos públicos. Com o crescente número de construtoras certificadas, aliado

aos acordos setoriais, a cobrança de certificação passará a ser juridicamente

viável, pois não irá ferir um dos princípios fundamentais da licitação pública, que é

a isonomia entre os participantes.

Apesar de todas as dificuldades apresentadas, dos obstáculos legais e da

falta de informação, é possível conseguir qualidade em obras públicas.

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7. OBRAS CITADAS

A. NACCARATI CONSULTORES. Construção Civil - PBQP-H. Disponível na Internet: http://www.anaccarati.com/pbqp-h/pbqp-h.htm. Acesso em 17 out. 2002. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 9000. Sistemas de Gestão de Qualidade - Fundamentos e Vocabulário. Rio de Janeiro, 2000. ______. NBR ISO 9001. Sistemas de Gestão de Qualidade - Requisitos. Rio de Janeiro, 2000. ______. NBR ISO 9004. Sistemas de Gestão de Qualidade - Diretrizes para melhorias de desempenho. Rio de Janeiro, 2000. ______. NBR 6492. Representação de Projetos de Arquitetura. Rio de Janeiro, 1994. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União nº 191-A, de 05 de outubro de 1988. BRASIL. Lei 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União nº 127, de 06 de julho de 1994. DIAS, Paulo Roberto Vilela, Engenharia de Custos: Metodologia de Orçamentação para Obras Civis. 3.ed. Rio de Janeiro: ed. Hoffman, 2001. EUROPEAN INTERNATIONAL CONTRACTORS. European International Contractors (EIC) - Objectives. Disponível na Internet: http://www. eicontractors.de/old-site/objectives.htm#9. Acesso em 21 set. 2002. ______. "EIC Contractor's Guide" to the FIDIC Conditions of Contracts for EPC Turnkey Projects ("Silver Book"), March 2000. Disponível na Internet: http://www.eicontractors.de/old-site/Comm5.htm. Acesso em 21 set. 2002.

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______. EIC Position Paper on Contract Bonds. Disponível na Internet: http://www.eicontractors.de/old-site/Comm2.htm. Acesso em 21 set. 2002. ______. EIC Position Paper on the Definition of Public Works Contracts. Disponível na Internet: http://www.eicontractors.de/old-site/Comm4.htm. Acesso em 21 set. 2002. EMPRESAS qualificadas - PBQP-H. Disponível na Internet: http://www. pbqp-h.gov.br/projetos/SIQ/construtoras/qualificadas.htm. Acesso em 18 nov. 2002. EXISTE Qualidade na Construção, sim. Revista Banas Qualidade nº 71. Abril 1998. p 34. Disponível na Internet: http://www.banasqualidade.com.br /buscamateria.asp?PUBL_CODIGO=BQ&EDIC_ANO=08&EDIC_NUMERO=071&MATE_CODIGO=0715&CONT_CODIGO=1. Acesso em 26 ago. 2002. FERREIRA, Miguel Luiz Ribeiro. Gestão de Contratos. Apostila do Mestrado em Engenharia Civil da UFF, 2001. FLORIANO, Pagel Eduardo. Histórico da Qualidade. Disponível na Internet: http://wwwsr.unijui.tche.br/ambienteinteiro/histqual.html. Acesso em 17 out. 2002. INMETRO. Distribuição dos Certificados ISO 9000 por Ramo de Atividade - Área de Atuação: Construção. Disponível na Internet: http://www.inmetro.gov.br/cb25/ ramoatividade.asp?Chamador=INMETRO&CodNace=F&CodUF=. Acesso em 18 nov. 2002. INSTITUTO MCKINSEY. Produtividade no Brasil: A Chave do Desenvolvimento Acelerado, produção e organização, adaptação de Mírian Leitão - Rio de Janeiro: campus, 1999. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 8. ed. ver. aum. São Paulo: Ed. Dialética, 2000. KANHOLM, ISO 9000:2000 New Requirements, 28 New Requerements checklist and Compliance Guide. 3 ed. Los Angeles : AQA Co., 2001. KETOLA, Jeanne, ROBERTS Kathy, ISO 9000:2000 in a Nutshell: a Concive Guide to the Revisions. 3 ed. California: Paton Press, 2001. LEON, Gustavo Ponce de. Normas ISO melhoram desempenho de construtoras. Canal Executivo. Disponível na Internet :http://www.uol.com.br/canalexecutivo /notas/270620001.htm. Acesso em 25 mar. 2002. LIMMER, Carl Vicente. Planejamento, Orçamentação e Controle de Projetos e Obras. 1 ed. Rio de Janeiro: ed. Livros Técnicos e Científicos, 1997. LOMAR, Paulo José Villela. Perfil Constitucional da Licitação. In: MUKAI, Toshio et al. Curso Avançado de Licitações e Contratos Públicos. 1 ed. São Paulo: ed. Juarez de Oliveira, 2000. p. 11 a 33.

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MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. Atualizada por Eurico de Andrade Azevedo e Maria Lúcia Mazzei de Alencar. 13 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. MINISTRY OF LAND, INFRASTRUCTURE AND TRANSPORT GOVERNMENT OF JAPAN (MLIT). Japanese Procurement Procedure of Construction Works. Disponível na Internet em: http://www.mlit.go.jp/sogoseisaku/const/kengyo/kokyo-e.htm. Acesso em 21 set. 2002. ______. Summary of the Act for Promoting Proper Tendering and Contracting for Public Works of Japan. Disponível na Internet: http://www.mlit.go.jp/sogoseisaku /const/tekiseikahou/tentative-translation.htm. Acesso em 21 set. 2002 ______. The Construction License System in Japan. Disponível na Internet: http://www.mlit.go.jp/sogoseisaku/const/kengyo/kyoka-e.htm. Acesso em 21 set. 2002 MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Legitimidade da Exigência de Comprovação de Experiência do Licitante. In: MUKAI, Toshio et al. Curso Avançado de Licitações e Contratos Públicos. 1 ed. São Paulo: ed. Juarez de Oliveira, 2000. p. 117 a 132. MUKAI, Toshio. Licitações: As Prerrogativas da Administração e os Direitos das Empresas Concorrentes (segundo as leis 8.666/93 e 8.883/94). 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. NATIONAL SOCIETY OF PROFESSIONAL ENGINEERS. Design-Build in the Public Sector. Disponível na Internet: http://www.nspe.org/govrel/gr2-ps1726.asp. Acesso em 21 set. 2002. OHMURA, Taizo. Japan - Public Procurement of Construction SVCS. Disponível na Internet: http://www.tradeport.org/ts/countries/japan/isa/ isar0036.html. Acesso em 21 set. 2002 ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT - OECD. Organisation for Economic Cooperation and Development - about OECD. Disponível na Internet: http://www.oecd.org/EN/about/0,,EN-about-0-nodirectorate-no-no-no-0,00.html. Acesso em 21 set. 2002. ______. Public Procurement. Disponível na Internet: http://www.oecd.org/htm/ M00025000/M00025348.htm. Acessado em 21 set. 2002 PBQP-H. O Estado de São Paulo. Disponível na Internet: http://www.pbqp-h.gov. br/estados/saopaulo.htm. Acesso em 18 nov. 2002. ______. Acordo Setorial Da Qualidade que entre si celebram, a Caixa Econômica Federal, O Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado do Rio de Janeiro - SINDUSCON-RIO e a Associação de Dirigentes de Empresas do Mercado

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77

Imobiliário do Rio de Janeiro – ADEMI-RJ. Disponível na Internet: http://www.sindusnet.com.br/livre/pbqp-h.cfm. Acesso em 25 mar. 2002 ______. Acordos com a CAIXA. Disponível na Internet: http://www. pbqp-h.gov.br/estados/acordoscaixa.htm. Acesso em 19 nov. 2002. ______. Carta de Salvador, novembro de 2000. Disponível na Internet: http://www.pbqp-h.gov.br/destaques/documentos/carta_de_salvador.htm. Acesso em 17 out. 2002. ______. Manual para Sensibilização Estadual do PBQP-H. Disponível na Internet: http://www.pbqp-h.gov.br/estados/manual.zip. Acesso em 21 jan. 2003. PRÁTICA Geral de Projeto - SEAP, 2002. Disponível na Internet: http: //www. comprasnet.gov.br/publicacoes/manuais/_projetos.pdf. Acessado em 25 mar. 2002. PORTARIA No 134, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1998 do Ministério do Planejamento e Desenvolvimento - Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat. ROCHA LIMA Jr, João da. Qualidade do empreendimento na construção civil: inovação e competitividade. 1995. 44 f. Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP - Departamento de Engenharia de Construção Civil da Universidade de São Paulo, São Paulo. 1995. SZKLARWSKY, Leon Fredja. Duração dos Contratos Administrativos. In: MUKAI, Toshio et al. Curso Avançado de Licitações e Contratos Públicos. 1 ed. São Paulo: ed. Juarez de Oliveira, 2000. p. 163 a 198.

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8 APÊNDICES

8.1 ANÁLISE DE CUSTO DE CAPITAL EM RELAÇÃO AO ATRASO DE PAGAMENTO DE

ÓRGÃOS PÚBLICOS

A Lei 8666/93 prevê, em seu art. 40, inc. XI, a necessidade de critério de

reajuste para os contratos públicos, que retratam a variação efetiva do custo da

produção. Isso quer dizer que o contratado terá direito a reajuste baseado na

variação de um índice, previamente acordado, entre o custo da etapa da obra na

data da apresentação da proposta e o pagamento de cada parcela relativa a essa

etapa. Porém, só terá direito a reajuste os contratos superiores a um ano, período

que engloba grande parte das obras públicas.

A mesma Lei, porém, em seu art. 78, inc. XV, só permite a rescisão

contratual após noventa dias de atraso de pagamento. Como o contrato não pode

ser rescindido antes da conclusão desse prazo, o contratado tem a obrigação de

cumprir todas as suas cláusulas. Na prática, uma obra terá o seu cronograma

físico mantido num período de três meses, não tendo o contratado nenhum

ressarcimento, através de procedimentos administrativos, pelo custo de capital

investido nesse período. Para conseguir tal ressarcimento, somente por vias

judiciais.

Pode-se considerar que, como essa situação está prevista na legislação,

os participantes de uma licitação podem incluir esse risco em seus custos

indiretos. Muitos não o fazem, pois o tipo de licitação aplicada a obras públicas é

o de "menor preço" e esse procedimento acarretaria a vitória da empresa que

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aplicasse um maior percentual de risco na composição de seu preço. Uma

informação privilegiada por parte do órgão pagador, como a certeza de que o

pagamento não atrasaria, poderia determinar o vencedor.

Essa análise do custo de capital nas propostas de licitações de obras

públicas necessita de um conhecimento de matemática financeira básica, mas em

nenhum momento é abordada na legislação vigente. Não se pode confundir

reajuste com custo de capital, pois a data do pagamento é considerada no dia em

que o fiscal da obra, representante da Administração Pública na execução do

contrato, ateste que o serviço foi executado e a nota fiscal é liquidada1. O tempo

entre a liquidação da nota fiscal e o recebimento do numerário correspondente

pode, segunda a Lei, ser de até noventa dias, mas um possível reajuste só

ocorrerá em relação ao período entre a apresentação da proposta e a liquidação

da nota fiscal.

Ao se analisar uma simulação do caso hipotético abaixo, o problema fica

mais claro:

Considera-se que uma empresa "A" tenha vencido uma licitação de uma

obra pública, que deverá ser realizada num prazo de noventa dias de acordo com

as condições abaixo. Sendo assim, não terá direito a reajuste de parcelas.

Tabela 01 - Cronograma Físico-Financeiro

EMPRESA "A" MÊS 01 MÊS 02 MÊS 03

PERCENTUAL 30,00% 35,00% 35,00%

VALORES R$ 43.500,00 R$ 50.750,00 R$ 50.750,00

PERCENTUAIS ACUMULADOS 30,00% 65,00% 100%

VALORES ACUMULADOS R$ 43.500,00 R$ 94.250,00 R$ 145.000,00

Valor da obra: R$ 145.000,00

Mão-de-obra (50%): R$ 72.500,00

Material (50%): R$ 72.500,00

1 Na Administração Pública, as fases do pagamento são: crédito, empenho e liquidação, sendo a liquidação a fase onde a nota fiscal é processada e solicitado o numerário para seu pagamento.

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Encargos Sociais: 155 %

Impostos Diretos: 8,95 %

Lucro: 8,00 %

Considerou-se um regime tributário sobre o lucro presumido, que para a

Cidade do Rio de Janeiro é representado na tabela abaixo:

Tabela 02 - Imposto Sobre Lucro Presumido - Cidade do Rio De Janeiro

Imposto Sobre Serviço ISS 3,00% COntrib.p/ FINanc.Seg.Social COFINS 3,00%

Programa de Integr. Social PIS 0,65%

Contr.Prov. S/ Mov. Financ. CPMF 0,38%

Imposto de Renda I.R. 1,20% I.R.=15% x L.P.(E) = 15% x 8%

Contribuição Social C.S. 0,72% C.S.= 9% x L.P.(E) = 9% x 8%

IMPOSTO: 8,95%

Observa-se que o lucro apresentado pela empresa "A" é absoluto, pois

quando ele é obtido, despreza-se a análise do fluxo de caixa, onde aparecem as

diferenças entre receitas e despesas que o gerou. Observando três situações de

fluxo de caixa, com pagamentos a trinta, sessenta e noventa dias após a

execução da etapa, o lucro absoluto sempre será o mesmo, mas ao se calcular o

valor presente líquido dos fluxos, verifica-se um lucro relativo abaixo do esperado.

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Tabela 03 - Fluxo De Caixa - Recebimento Após 30 dias da Execução da Etapa

SERVIÇOS % totais MÊS 01 MÊS 02 MÊS 03 MÊS 04 MÊS 05 DESEMBOLSO 30% 35% 35%

PESSOAL (50%) R$ 72.500,00

Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94 Salários R$ 23.612,25 R$ 7.083,68 R$ 8.264,29 R$ 8.264,29

Encargos (155%) 155,00% R$ 36.599,00 R$ 10.979,70 R$ 12.809,65 R$ 12.809,65

MATERIAL (50%) R$ 72.500,00 Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94

À vista (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97 30 dias (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97

IMPOSTOS

Imediatos (8,95%) 8,95% R$ 3.893,25 R$ 4.542,13 R$ 4.542,13 30 dias

Desembolso Mensal -R$ 16.115,36 -R$ 42.705,89 -R$ 46.690,00 -R$ 27.888,74

Recebimento R$ 145.000,00 R$ 43.500,00 R$ 50.750,00 R$ 50.750,00 Saldo/ Deficit Mensal -R$ 16.115,36 R$ 794,11 R$ 4.060,00 R$ 22.861,26 Saldo/ Deficit Acum. -R$ 16.115,36 -R$ 15.321,26 -R$ 11.261,26 R$ 11.600,00

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Tabela 04 - Fluxo De Caixa - Recebimento Após 60 dias da Execução da Etapa

SERVIÇOS % totais MÊS 01 MÊS 02 MÊS 03 MÊS 04 MÊS 05 DESEMBOLSO 30% 35% 35%

PESSOAL (50%) R$ 72.500,00

Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94 Salários R$ 23.612,25 R$ 7.083,68 R$ 8.264,29 R$ 8.264,29

Encargos (155%) 155,00% R$ 36.599,00 R$ 10.979,70 R$ 12.809,65 R$ 12.809,65

MATERIAL (50%) R$ 72.500,00 Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94

À vista (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97 30 dias (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97

IMPOSTOS

Imediatos (8,95%) 8,95% R$ 3.893,25 R$ 4.542,13 R$ 4.542,13 30 dias

Desembolso Mensal -R$ 16.115,36 -R$ 38.812,64 -R$ 46.041,13 -R$ 27.888,74 -R$ 4.542,13

Recebimento R$ 145.000,00 R$ 43.500,00 R$ 50.750,00 R$ 50.750,00 Saldo/ Deficit Mensal -R$ 16.115,36 -R$ 38.812,64 -R$ 2.541,13 R$ 22.861,26 R$ 46.207,88 Saldo/ Deficit Acum. -R$ 16.115,36 -R$ 54.928,01 -R$ 57.469,13 -R$ 34.607,88 R$ 11.600,00

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Tabela 05 - Fluxo De Caixa - Recebimento Após 90 dias da Execução da Etapa

SERVIÇOS % totais MÊS 01 MÊS 02 MÊS 03 MÊS 04 MÊS 05 MÊS 06 DESEMBOLSO 30% 35% 35%

PESSOAL (50%) R$ 72.500,00

Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94 Salários R$ 23.612,25 R$ 7.083,68 R$ 8.264,29 R$ 8.264,29

Encargos (155%) 155 % R$ 36.599,00 R$ 10.979,70 R$ 12.809,65 R$ 12.809,65

MATERIAL (50%) R$ 72.500,00 Total - (lucro+imposto) -16,95% R$ 60.211,25 R$ 18.063,38 R$ 21.073,94 R$ 21.073,94

À vista (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97 30 dias (50%) 50,00% R$ 30.105,63 R$ 9.031,69 R$ 10.536,97 R$ 10.536,97

IMPOSTOS

Imediatos (8,95%) 8,95% R$ 3.893,25 R$ 4.542,13 R$ 4.542,13 30 dias

Desembolso Mensal -R$ 16.115,36 -R$ 38.812,64 -R$ 42.147,88 -R$ 27.239,87 -R$ 4.542,13 -R$ 4.542,13

Recebimento R$ 145.000,00 R$ 43.500,00 R$ 50.750,00 R$ 50.750,00 Saldo/ Deficit Mensal -R$ 16.115,36 -R$ 38.812,64 -R$ 42.147,88 R$ 16.260,13 R$ 46.207,88 R$ 46.207,88 Saldo/ Deficit Acum. -R$ 16.115,36 -R$ 54.928,01 -R$ 97.075,88 -R$ 80.815,75 -R$ 34.607,88 R$ 11.600,00

Page 86: 41 - Qualidade e Licitação de Obras Públicas -Dissert UFF - Andre Kuhn

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Nas tabelas que contêm os fluxos de caixa das três condições de

pagamento, foram feitas as seguintes considerações: os salários entraram como

despesa no mês referente à execução da etapa, mas os encargos sociais no mês

seguinte; os materiais foram comprados com pagamento de 50 % à vista e 50 %

para trinta dias.

Observa-se que o lucro, que é o resultado final da diferença entre receitas

e despesas acumulada, será o mesmo nas três situações: R$ 11.600,00, que

representa exatamente 8 % do valor da obra: R$ 145.000,00.

Se o custo de capital não for levado em conta, qualquer que seja o fluxo de

caixa, o lucro sempre será o mesmo. O que acontece em licitações de obras é

exatamente isso, não se considera que o atraso de pagamento é um fator que

influencia no preço final da obra. Se todas as empresas, baseado no histórico do

Órgão Público que licita, consideram nos seus custos indiretos o atraso de

pagamento, a Administração pagará mais caro pela obra, mesmo que o

pagamento seja feito em dia, pois o custo já foi computado pela vencedora em

seu BDI (Bônus e Despesas Indiretas). Caso alguma empresa se arrisque mais, o

atraso no pagamento poderá causar prejuízo à Contratada, podendo causar

atrasos, paralisação e queda de qualidade no produto final, trazendo, da mesma

forma, um prejuízo aos cofres públicos.

Para ilustrar o problema considera-se uma TMA (Taxa Mínima de

Atratividade) de 5 % ao mês. Percentual médio razoável, pois obras desse porte

permitem que pequenas empresas participem da licitação e que, muitas vezes,

não têm acesso a boas taxas de juros. Para um contrato de R$ 145.000,00, uma

empresa deverá ter um Capital Social ou Patrimônio Líquido de pelo menos R$

7.250,00 (5% do valor estimado para contratação) para atender a qualificação

econômico-financeira prevista no edital, de acordo com o Art. 31, Parágrafo 2º da

Lei 8.666/93.

Ao se aplicar uma TMA de 5 % nos três fluxos de caixa, será obtido os VPL

(Valor Presente Líquido) para cada situação, conforme planilhas a seguir:

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Tabela 07 - Cálculo dos VPL para cada caso

MÊS FLUXO P/30 DIAS

MÊS FLUXO P/60 DIAS

MÊS FLUXO P/90 DIAS

1 R$ (16.115,36)

1 R$ (16.115,36)

1 R$ (16.115,36)

2 R$ 794,11

2 R$ (38.812,64)

2 R$ (38.812,64)

3 R$ 4.060,00

3 R$ (2.541,13)

3 R$ (42.147,88)

4 R$ 22.861,26

4 R$ 22.861,26

4 R$ 16.260,13

5 R$ -

5 R$ 46.207,88

5 R$ 46.207,88

6 R$ -

6 R$ -

6 R$ 46.207,88

TMA = 5,00%

TMA = 5,00%

TMA = 5,00%

VPL = R$ 8.071,88

VPL = R$ 2.379,09

VPL = R$ (3.042,63)

LUCRO = 5,57%

LUCRO = 1,64%

LUCRO = -2,10%

No fluxo de caixa para trinta dias, situação comum em Órgãos Públicos, o

resultado real do investimento da empresa "A" é de apenas R$ 8.071,88, que

representa 5,57 % do valor contratado. Para pagamentos a sessenta dias, o lucro

real cai ainda mais: R$ 2379,09, apenas 1,64 % do valor de contrato. Quando a

situação chega a atrasos de noventa dias, a o prejuízo será de R$ 3.042,63,

apesar do resultado absoluto final do fluxo de caixa continuar em R$ 11.600,00.

Baseado no estudo desta simulação, pode-se obter a seguinte conclusão: o

planejamento dos gastos Públicos, aliado a confiança dos licitantes nos

cronogramas de desembolso apresentados na fase de divulgação do edital,

poderiam reduzir os custos das obras públicas. O prejuízo aos cofres públicos não

se dá apenas financeiramente, o custo social de uma obra inacabada é difícil de

ser mensurado, podendo se refletir em diversos campos da sociedade: crianças

sem escola, doentes sem hospital e operários sem emprego.

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8.2 ANÁLISE DA IMPORTÂNCIA DO CRONOGRAMA FINANCEIRO PARA A OBRA PÚBLICA

De acordo com a lei 8.666/93, o critério para análise de propostas varia

conforme o tipo de licitação. Para obras e serviços de engenharia que não sejam

de grande vulto e dependentes de tecnologia nitidamente sofisticada, o tipo

obrigatório de licitação é o de "menor preço" (Art. 46, parágrafo 3º).

Talvez por faltar uma estrutura de fiscalização mais eficiente, o regime de

execução mais utilizado é a "empreitada por preço global", pois a "empreitada por

preço unitário" exige uma presença maior do fiscal na obra, com uma melhor

qualificação, para o fiel apontamento dos serviços realizados.

Quando o Órgão Público define no edital que a licitação será do tipo

"menor preço" com o regime de execução "empreitada por preço global", parece o

mais viável para atender às necessidades da Administração Pública. Mas esta

forma de licitação, muito empregada nas obras públicas, permite manobras por

parte da contratada para obtenção de vantagens.

Considerando uma situação hipotética: o licitante da empresa "B" observa,

ao analisar o Orçamento Público, que os recursos disponíveis para uma

determinada obra não serão totalmente atendidos. Isto é, há o crédito disponível

integralmente para atender toda a obra, mas os recursos serão cortados em parte

durante a sua execução.

O cronograma da obra não é previsto legalmente como exigência de

propostas, mas deverá fazer parte do contrato a ser firmado entre as partes. A

desenvolvimento de um cronograma físico-financeiro tem um comportamento de

uma curva normal, ou uma curva beta. O custo da obra cresce no início, atinge o

seu máximo próximo do meio e decresce no final do prazo de execução. Nas

obras as atividades têm suas relações de dependência bem definidas, as

fundações e estrutura são executadas no início e o acabamento e limpeza no

final, não podendo se inverter essa seqüência.

Segundo Limmer (1997, p. 56), os recursos de uma obra podem ser

distribuídos segundo uma curva de distribuição beta, sendo apresentado a seguir

um exemplo simulado com uma configuração semelhante à tabela a seguir:

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Tabela 01 - Cronograma Esperado

MÊS PARCELAS (%) 1 3,00% 2 4,00% 3 7,00% 4 14,00% 5 22,00% 6 20,00% 7 11,00% 8 9,00% 9 7,00%

10 3,00% TOTAL 100,00%

O Licitante que da empresa "B", com sua informação de possibilidade de

cortes no crédito da obra, resolve, para o mesmo preço global, alterar a

distribuição dos valores das parcelas de seu orçamento, aumentando o preço das

parcelas iniciais (fundações e estruturas) e reduzindo o preço das parcelas finais

(acabamento e limpeza). De acordo com a planilha abaixo:

Tabela 02 - Cronograma Alterado

MÊS PARCELAS (%) 1 22,00% 2 20,00% 3 14,00% 4 11,00% 5 9,00% 6 8,00% 7 6,00% 8 4,00% 9 3,00%

10 3,00% TOTAL 100,00%

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88

O preço global, que servirá de base para escolha da proposta com o menor

preço, não será alterado, mas a empresa "B" receberá no início da obra valores

superiores aos seus custos reais. Caso o crédito venha a ser suspenso, o

contratado terá um lucro muito maior e o Órgão Público pagará um preço mais

caro pelas etapas realizadas. Mesmo que o crédito não seja anulado, a empresa

receberá antecipadamente por serviços executados, e no pior das hipóteses, caso

desista da obra, nenhum dos outros participantes aceitaria concluir a obra pelos

valores remanescentes do orçamento da vencedora, por motivos visíveis no

gráfico abaixo, onde o orçamento normal é representado pela curva beta e o

alterado por uma curva "S":

Gráfico 01 - Comparação entre os dois cronogramas

CRONOGRAMA

0,00%

5,00%

10,00%

15,00%

20,00%

25,00%

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10MESES

% P

AG

O

Esperado Alterado

O exemplo acima retrata a importância que o Administrador deve dar ao

Cronograma da Obra, criando dispositivos que evitem esse tipo de procedimento.

Tal artifício não deve ser considerado imoral, mas pode prejudicar a perfeita

execução do contrato.

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89

8.3 ANÁLISE DO PREÇO INEXEQÜÍVEL PARA OBRAS PÚBLICAS

A Lei Nº 8666/93 não permite a contratação de obras por preços

inexeqüíveis, isto é, considera-se que um valor de proposta menor que o custo da

própria obra não é vantajoso para a Administração.

Contratar uma obra por um valor muito baixo poderá resultar num prejuízo

difícil de ser mensurado. Quanto custa para os pais dos alunos que não tiveram

sua escola pública concluída dentro do prazo? Qual a conseqüência para a

Sociedade de um hospital inacabado por falência da construtora? Tais

questionamentos podem não ser respondidos com números absolutos, mas o

prejuízo existe de fato.

Apesar do tipo de licitação para obras públicas ser o de menor preço, salvo

exceções previstas na legislação, a Lei determina que propostas com preços

inexeqüíveis devem ser desclassificadas. Tal procedimento evitaria o prejuízo pro

falta de conclusão.

Antes da alteração da Lei de Licitações através da Lei 9.648/98, a grande

dificuldade da Comissão de Licitações era desclassificar uma empresa por preço

inexeqüível, pois a falta de parâmetros para julgamento inibia os membros da

Comissão decidir contra a empresa vencedora. Uma ação judicial da empresa

desclassificada poderia atrasar o início da obra. A modificação da Lei passa a

definir um critério matemático para definir o que é preço inexeqüível, como pode

ser observado no Artigo 48, da lei 8.666/93:

"Art. 48. Serão desclassificadas": I - as propostas que não atendam às exigências do ato convocatório da licitação; II - propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüíveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrado sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentes com os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação. . § 1° Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo,

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consideram-se manifestamente inexeqüíveis, no caso de licitações de menor preço para obras e serviços de engenharia, as propostas cujos valores sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores: a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela Administração, ou b) valor orçado pela Administração. § 2° Dos licitantes classificados na forma do parágrafo anterior cujo valor global da proposta for inferior a 80% (oitenta por cento) do menor valor a que se referem às alíneas "a" e "b", será exigida, para assinatura do contrato, prestação de garantia adicional, dentre as modalidades previstas no § 1° do art. 56, igual à diferença entre o valor resultante do parágrafo anterior e o valor da correspondente proposta." .

Para explicar o funcionamento da regra, será usado um exemplo numérico

hipotético:

Em uma licitação, após análise dos envelopes de habilitação, foram

abertos os envelopes das propostas técnicas e observados os seguintes valores:

Tabela 01 - Relação de Empresas e Valores das Propostas

Ordem Empresa Propostas

1º A R$ 140.000,00 2º B R$ 170.000,00 3º C R$ 195.000,00 4º D R$ 250.000,00 5º E R$ 255.000,00 6º F R$ 290.000,00 7º G R$ 310.000,00

Considerando que o orçamento do edital tem um valor global de R$

300.000,00, pode-se determinar quais as empresas que serão desclassificadas

por preço inexeqüível:

- 70% do valor orçado pela Administração: 0,70 x 300.000,00 = 210.000,00.

- Média das propostas superiores a 50% do valor orçado pela

Administração: 50% = 0,5 x 300.000,00 = 150.000,00 => Média = (170.000,00 +

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195.000,00 + 250.000,00 + 255.000,00 + 290.000,00 + 310.000,00) /6 =

245.000,00.

- 70 % da média = 0,70 x 245.000,00 = 171.500,00

Como o menor valor entre os dois é de R$ 171.500,00, ele passa a ser o

limite mínimo para essa licitação. Logo as propostas das empresas "A" e "B"

devem ser desclassificadas e a vencedora é a empresa "C", com uma proposta

de R$ 195.000,00.

A Lei determina também que deve ser fornecida, pelo vencedor, uma

garantia adicional quando o valor da proposta, apesar de exeqüível, ainda

apresente algum risco para a Administração Pública. Essa faixa de risco está

entre os 70% e 80% do menor dos valores do Artigo 48, inciso II, § 1°, alíneas a)

e b).

Dentro do exemplo numérico, essa faixa seria entre R$ 171.500,00 (70%) e

R$ 196.000,00 (80%). Como a vencedora se inclui nessa faixa, ela deve pagar a

garantia adicional, no valor da diferença entre 196.000,00 e 195.000,00, isto é R$

1.000,00.

Apesar da Lei resolver um problema da Comissão de Licitações, por aliviá-

la da responsabilidade de decidir sobre a desclassificação de empresas com

valores muito baixos, ela não garantiu um valor justo pelo pagamento de uma

obra. Caso, hipoteticamente, um grupo de empreiteiros decida acertar preços bem

baixos em uma licitação, acerto esse ilegal, a média das propostas das empresas

baixaria o limite do valor inexeqüível e a regra não teria eficácia.

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8.4 SUGESTÃO DE ROTEIRO PARA ELABORAÇÃO DE PROPOSTAS EM LICITAÇÕES DE

OBRAS PÚBLICAS Existe uma grande dificuldade, principalmente por parte das pequenas

construtoras, de se elaborar uma proposta adequada tanto aos seus interesses

quanto ao da Administração Pública. Pode-se citar algumas justificativas, tais

como: pouco tempo para estudo dos projetos e elaboração do orçamento; falta de

projetos complementares; deficiência de informações e especificações

incompletas e orçamento do edital incompleto

Quanto ao pouco tempo, a Lei 8666 define o prazo mínimo para abertura

das propostas, e não o máximo, sendo legalmente possível aumentar o tempo

para elaboração das propostas. A dificuldade dos Órgãos Públicos em estender

esse prazo está na necessidade de início e conclusão da obra dentro do mesmo

ano; no cronograma de desembolso e na disponibilidade de recursos, pois uma

obra não é uma mercadoria que se compra em uma prateleira, ela requer tempo

para se obter.

A falta de projetos complementares realmente dificulta a preparação de um

orçamento bem detalhado, que evitaria surpresas no decorrer da obra, como a

solicitação de aditivos. Mas não é uma exigência legal, considerando-se que o

projeto básico contém dados suficientes para se orçar.

A escassez de tempo não é um problema somente dos licitantes. Os

engenheiros da Administração Pública que preparam os projetos, especificações

e orçamento também não dispõem de grandes prazos para realizarem seus

trabalhos. Cabe aos participantes de licitações públicas comunicarem oficialmente

à Comissão de Licitação qualquer erro do Edital, para que as devidas

providências sejam tomadas. Muitos empreiteiros ficam melindrados em levantar

problemas na fase de licitação, com medo de sofrerem algum tipo de retaliação,

mas esta atitude prejudica a Comissão de Licitação, que não é comunicada dos

fatos e não faz as devidas correções.

A preparação correta de uma proposta é vantajosa para ambas as partes,

pois o Órgão Público terá a sua obra concluída a contento e o empreiteiro

receberá um pagamento justo pelo seu trabalho. Abaixo será apresentada a

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sugestão de um procedimento para elaboração da proposta de uma obra, que

muitas vezes não é seguido pelo Licitante:

8.4.1 Procedimentos Iniciais

A empresa que deseja participar de uma licitação pública deve adquirir, o

mais breve possível, o edital de licitação, que estará disponível na unidade

administrativa a partir do primeiro dia de divulgação.

Ao adquirir o edital, deve se informar sobre a origem do recurso e se o

numerário será rapidamente liberado após a liquidação. Procurar descobrir se as

medições serão mensais ou poderão ser em períodos menores; se sua empresa

terá liberdade para preparar o cronograma da obra. Conseguir o telefone de

contato do engenheiro responsável pelo projeto básico, pelas especificações e

orçamento, na hora de tirar dúvidas, não perderá tempo fazendo contato com a

seção de licitações, pedindo informações técnicas que provavelmente não

saberão sanar.

Chegando em seu escritório, ler atentamente todo o edital. Verificar os

projetos e as especificações e perguntar a si mesmo se sua empresa tem

condições técnicas e financeiras para executar bem a obra.

Um fato que deve ser levado em consideração: a proximidade da

conclusão da obra com o fim do exercício fiscal. Se houver qualquer imprevisto e

a obra atrasar, o pagamento das últimas parcelas será colocado em restos a

pagar. Em outras palavras, o pagamento será feito com recursos do ano seguinte,

ocasionando um período de dois a quatro meses sem recebimento. A empresa

deverá ter condições financeiras que superar esse período sem interferir na

qualidade da obra.

8.4.2 Elaboração da Proposta:

Tomada a decisão de participar da Licitação, o licitante deve reunir sua

equipe técnica e orientá-la da seguinte forma:

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Primeiro: Todos as especificações e projetos anexos deverão ser

estudados. Todas as dúvidas técnicas deverão ser retiradas diretamente com o

autor ou engenheiro responsável pelo projeto básico. Caso seja observado algum

erro no projeto ou especificação, a Comissão de Licitações deverá ser

comunicada oficialmente por escrito, para que corrija o edital e comunique a todos

os participantes.

O licitante deve marcar uma visita ao local da obra, de preferência

acompanhado de um engenheiro da Administração que tenha participado da

elaboração do Projeto Básico. Muitos empreiteiros irresponsáveis só vão ao local

da obra após a assinatura do contrato, ficando sujeitos a surpresas desagradáveis

no decorrer da obra.

Segundo: Paralelamente, caso a empresa tenha uma assessoria jurídica,

o empreiteiro solicitará a confecção da parte formal da proposta: declarações em

papel timbrado, número de cópias autenticadas, certidões negativas, atualização

cadastral e outros. Esta fase é a maior causa de desclassificação das empresas

participantes.

Será verificado se o Órgão Público exige um cadastramento antecipado

para participação de obras públicas. Os Órgãos Federais processam seus

cadastros através do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores

(SICAF), observando-se as Normas estabelecidas pelo Ministério da

Administração Federal e Reforma do Estado (MARE).Para se cadastrar, a

empresa deverá procurar uma Unidade Cadastradora e manter seus dados

atualizados.

Terceiro: Após a equipe técnica estudar todos os anexos, o orçamentista

levantará todos os quantitativos e fará o seu próprio orçamento, sem se basear no

orçamento do edital. Este procedimento evitará a indução ao erro. Muitas

propostas são verdadeiras cópias de orçamento, com uma redução proporcional

de preços em todos os itens. As empresas que ganham licitação desta forma

freqüentemente têm prejuízo no final da obra, isto quando conseguem chegar ao

final.

Quarto: Com o seu orçamento finalizado, ajustá-lo com o orçamento do

Edital, não se preocupando com pequenas distorções. Caso as diferenças sejam

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grandes, informar por escrito à Comissão de Licitação. O orçamento do edital é

informativo, sendo aceitável pequenas diferenças de quantitativos. Além do mais,

o que define o serviço a ser contratado não é o orçamento, mas sim as

especificações e projetos. (A Comissão pode alegar que um serviço não previsto

no orçamento, mas que conste nas especificações e projetos, está embutido em

alguma composição de custos).

Algumas Unidades Administrativas não apresentam o Orçamento da Obra

em seu Edital de Licitação, contrariando o que determina a Lei n.º 8.666 em seu

Artigo 7º, parágrafo Segundo, inciso II, e parágrafo Quarto.

Quinto: Com o seu preço já definido, finalizar a parte formal e entregar a

documentação dentro do prazo previsto, muitas unidades administrativas não

aceitam propostas fora do horário. Uma revisão em toda a documentação é

importante, para evitar a desclassificação por possíveis erros.

Tecnicamente as falhas são poucas, pois o orçamento apresentado no

Edital serve como base para elaboração das propostas e a diferença de

quantitativos não pode ser considerada como erro. As falhas mais comuns são

na parte formal da proposta, tais como: Não assinatura de todas as folhas da

proposta pelo representante legal; não assinatura do orçamento pelo responsável

técnico da empresa; não cumprimento dos prazos legais de cadastramento e

apresentação das propostas; erros de digitação e falta de documentos na

proposta, como Ficha Técnica, Declarações e outros.

8.4.3 Conseqüências De Uma Proposta Mal Elaborada

Uma proposta mal elaborada prejudica não só o interesse público, como

também o licitante. Se o vencedor apresentou um preço muito baixo e se recusar

a assinar o contrato ou não honrá-lo, ele fica impedido de participar de licitação

pública por dois anos, além de prejudicar a imagem da empresa.

Podemos resumir as conseqüências em três situações distintas: orçamento

muito alto e perda da licitação; desclassificação por falhas na proposta ou preço

muito baixo e prejuízo para a empresa.