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Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados Laura Haynes Owain Service Ben Goldacre David Torgerson Responsabilidade Social das Empresas como Instrumento para o Desenvolvimento: a função da política pública Anita Kon Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos? Ari Francisco de Araujo Junior Márcio Antônio Salvato Bernardo Lanza Queiroz Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público: avanços da política de RH na administração pública de uma prefeitura do Alto Vale do Itajaí-SC Cristian Caê Seemann Stassun Fanni Wippel O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira João Guilherme de Oliveira Carminati Elaine Aparecida Fernandes Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido? Gustavo Inácio de Moraes Joaquim Bento de Souza Ferreira Filho Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação mos Estados Brasileiros Luckas Sabioni Lopes Silvia Harumi Toyoshima Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional Larissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento Luiz Carlos Santana Ribeiro Rosa Livia Gonçalves Montenegro Roberto Maximiano Pereira jul. dez. 2013 41

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Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados Laura HaynesOwain ServiceBen GoldacreDavid Torgerson

Responsabilidade Social das Empresas como Instrumento para o Desenvolvimento: a função da política públicaAnita Kon

Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?Ari Francisco de Araujo JuniorMárcio Antônio SalvatoBernardo Lanza Queiroz

Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público: avanços da política de RH na administração pública de uma prefeitura do Alto Vale do Itajaí-SCCristian Caê Seemann StassunFanni Wippel

O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia BrasileiraJoão Guilherme de Oliveira CarminatiElaine Aparecida Fernandes

Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?Gustavo Inácio de MoraesJoaquim Bento de Souza Ferreira Filho

Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação mos Estados BrasileirosLuckas Sabioni LopesSilvia Harumi Toyoshima

Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso NacionalLarissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior

Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamentoLuiz Carlos Santana RibeiroRosa Livia Gonçalves MontenegroRoberto Maximiano Pereira

jul. dez.

2013 41

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Governo FederalSecretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República

Ministro interino Marcelo Côrtes Neri

Fundação pública vinculada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o Ipea fornece suporte técnico e institucional às ações governamentais – possibilitando a formulação de inúmeras políticas públicas e programas de desenvol-vimento brasileiro – e disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos realizados por seus técnicos.

PresidenteMarcelo Côrtes Neri

Diretor de Desenvolvimento InstitucionalLuiz Cezar Loureiro de Azeredo

Diretor de Estudos e Relações Econômicas e Políticas InternacionaisRenato Coelho Baumann das Neves

Diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da DemocraciaDaniel Ricardo de Castro Cerqueira

Diretor de Estudos e PolíticasMacroeconômicasCláudio Hamilton Matos dos Santos

Diretor de Estudos e Políticas Regionais,Urbanas e AmbientaisRogério Boueri Miranda

Diretora de Estudos e Políticas Setoriaisde Inovação, Regulação e InfraestruturaFernanda De Negri

Diretor de Estudos e Políticas SociaisRafael Guerreiro Osorio

Chefe de GabineteSergei Suarez Dillon Soares

Assessor-chefe de Imprensa e ComunicaçãoJoão Cláudio Garcia Rodrigues Lima

Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoriaURL: http://www.ipea.gov.br

PPP: PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICASPublicação semestral do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada cujo objetivo é promover o debate e a circulação de conhecimento em planejamento e políticas públicas, representando o esforço do instituto em disseminar pesquisas, avaliações e proposições neste campo.E-mail : [email protected]

Corpo Editorial

Membros

Alexandre Cunha (Ipea)Axel Gosseries (Chaire Hoover/UCLouvain)Benny Schvarsberg (UnB)Divonzir Gusso (Ipea)Gabriel Porcile (Cepal)Luis Felipe B. Oliveira (Ipea)Paulo Calmon (UnB)Ramon Garcia Fernandez (UFABC)Wilson Suzigan (UNICAMP)

EditorLeonardo Monasterio (Ipea)

CoeditorMaurício Mota Saboya Pinheiro (Ipea)

Secretária-ExecutivaEdineide Pedreira Ramos

Apoio TécnicoFrancisco de Souza Filho

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planejamento e políticas públicas ppp

número 41 | jul./dez. 2013

Brasília, 2013

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© Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – ipea 2013

As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e inteira responsabilidade dos autores, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.

É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para fins comerciais são proibidas.

Planejamento e políticas públicas / Instituto dePesquisa Econômica Aplicada. – n. 1 (jun.1989) - .Brasília : Ipea, 1989 -

Semestral.Editor anterior: de 1989 a março de 1990,

Instituto de Planejamento Econômico e Social.

ISSN 0103-4138

1. Economia. 2. Políticas Públicas. 3. Plane-jamento Econômico. 4. Brasil. 5. Periódicos. I.Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.

CDD 330.05

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NOTA DOS EDITORES

O número 41 da revista Planejamento e políticas públicas (PPP) dá seguimento ao cumprimento da missão da revista, que, desde 1989, procura difundir o conhecimento em planejamento e políticas públicas, bem como fomentar o debate neste campo.

Os artigos selecionados para este número são assinados por profissionais de reconhecida competência, provenientes de instituições de pesquisa renomadas no Brasil e no exterior. Qualidade e pluralidade, aliás, são marcas características da PPP ao longo de sua trajetória editorial, e neste número em particular. A me-lhora na qualidade da revista foi recentemente reconhecida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), que elevou seu conceito de avaliação qualis para B2. Quanto à pluralidade, esta se expressa inter alia, com variedade de autores, tópicos, temas, metodologias, pontos de vista e instituições às quais se vinculam os autores.

Este volume apresenta nove artigos voltados para diversas questões de políti-cas públicas, que vão desde métodos gerais de sua avaliação até a análise específica de casos em determinadas áreas. Os temas, relevantes e variados, incluem a res-ponsabilidade social das empresas, as mudanças climáticas, o investimento direto estrangeiro, os recursos humanos do governo, e o comportamento de deputados e senadores, entre outros.

O primeiro artigo, intitulado Testar, aprender, adaptar: desenvolvimento de política pública com experimentos aleatórios controlados (artigo especial), defende o método de avaliação de políticas públicas – os experimentos aleatórios controla-dos (EAC) – como a melhor forma de testar sua eficiência. A inovação do método consiste na escolha aleatória de um grupo de controle, o que possibilita aferir a eficiência de uma nova política, comparando seus efeitos com os de uma situação hipotética em que nenhuma iniciativa tivesse sido promovida para solucionar o problema em tela.

O artigo seguinte, Responsabilidade social das empresas como instrumento para o desenvolvimento: a função da política pública, argumenta em prol da importância da responsabilidade social das empresas, e desta responsabilidade como objeto de políticas públicas de desenvolvimento socioeconômico sustentável do país. O estudo conclui que as ações das empresas ainda não se encontram muito dis-seminadas em solo nacional, sendo necessária, portanto, a adoção de políticas públicas que tenham como função utilizar as empresas nacionais como instru-mentos para o desenvolvimento socioeconômico sustentável no Brasil.

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Em uma análise sobre as relações entre desenvolvimento econômico e fecun-didade, o artigo subsequente (Desenvolvimento e fertilidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?) elucida algumas condições sob as quais pode haver uma relação inversa entre estas duas grandezas nos municípios brasileiros. Após proceder a uma análise de regressão limiar, não se encontra qual-quer evidência empírica que corrobore, para o caso dos municípios brasileiros (Censo 2000), a existência de uma relação inversa em forma de J entre desenvol-vimento e fecundidade, como sugere certa literatura internacional.

O quarto artigo, intitulado Avaliação de desempenho e capacitação contínuos no serviço público: avanços da política de RH na administração pública de uma prefeitura do Alto Vale do Itajaí-SC, apresenta um estudo de caso, envolvendo uma política de recursos humanos em uma prefeitura do Alto Vale do Itajaí (SC). Avalia-se esta política em relação à capacitação e avaliação de desempe-nho dos servidores públicos. Utilizando-se como metodologia um delineamento descritivo-interpretativo (abordagem qualitativa, coleta de dados por investiga-ção documental, contatos pessoais e pesquisa bibliográfica), o trabalho apresenta como resultados orientações gerais para a política de recursos humanos no setor público brasileiro.

A edição segue com o artigo O impacto do investimento direto estrangeiro no crescimento da economia brasileira. Trata-se de um estudo sobre o impacto do in-vestimento direto estrangeiro no Brasil, no período 1986 a 2009, sobre o produto interno bruto (PIB) nacional. Por meio do modelo VAR estrutural, conclui-se que aquele impacto tenha sido pequeno, mas duradouro. O trabalho provê subsí-dios para orientar os formuladores de políticas econômicas voltadas para o inves-timento estrangeiro no Brasil.

O artigo seguinte (Brasil, mudanças climáticas e economia: o que há estabele-cido?) consiste numa sistematização da literatura sobre os impactos das mudanças climáticas sobre a economia brasileira. Discutem-se as várias opções metodológi-cas disponíveis, bem como seu papel na indefinição do mapeamento dos efeitos destas mudanças.

O sétimo artigo, Evidências do impacto da corrupção sobre a eficiência das políticas de saúde e educação nos estados brasileiros, analisa, utilizando a técnica DEA-BBC, os efeitos que a corrupção tem exercido sobre a eficiência técnica dos estados brasileiros na aplicação dos recursos com saúde e educação.

O penúltimo artigo da edição intitula-se Grupos de interesses, eleições e redes políticas no Congresso Nacional, e verifica como as relações entre deputados e senadores interagem com os setores de atividade econômica. Para tal, aplica-se o modelo agente-principal para o caso de muitos agentes e muitos principais, associado ao método de análise de redes sociais.

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Por fim, o nono artigo, Estrutura econômica e encadeamentos setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento procura construir uma matriz insumo-produto para Minas Gerais. Os resultados identificaram alguns setores enquanto importantes para o dinamismo da economia mineira. São eles: alimentos e bebidas, têxteis, produtos químicos diversos, artigos de borracha e plástico, e siderurgia e metalurgia.

Os editores agradecem ao público leitor, autores, avaliadores e a toda a equi-pe da revista Planejamento e políticas públicas. Afinal, a “comunidade PPP” é a grande responsável pelo sucesso da revista em seus 24 anos de existência.

Boa leitura!

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SUMÁRIO

TESTAR, APRENDER, ADAPTAR: DESENVOLVER AS POLÍTICAS PÚBLICAS MEDIANTE EXPERIMENTOS ALEATÓRIOS CONTROLADOS ........................................................................11Laura HaynesOwain ServiceBen GoldacreDavid Torgerson

RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS COMO INSTRUMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO: A FUNÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA ..........................................................45Anita Kon

DESENVOLVIMENTO E FECUNDIDADE NO BRASIL: REVERSÃO DA FECUNDIDADE PARA MUNICÍPIOS MAIS DESENVOLVIDOS? ..............................................89Ari Francisco de Araujo JuniorMárcio Antônio SalvatoBernardo Lanza Queiroz

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO E CAPACITAÇÃO CONTÍNUOS NO SERVIÇO PÚBLICO: AVANÇOS DA POLÍTICA DE RH NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE UMA PREFEITURA DO ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC ................................................................127Cristian Caê Seemann StassunFanni Wippel

O IMPACTO DO INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO NO CRESCIMENTO DA ECONOMIA BRASILEIRA ...................................................................................................151João Guilherme de Oliveira CarminatiElaine Aparecida Fernandes

BRASIL, MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ECONOMIA: O QUE HÁ ESTABELECIDO? ....................................................................................................183Gustavo Inácio de MoraesJoaquim Bento de Souza Ferreira Filho

EVIDÊNCIAS DO IMPACTO DA CORRUPÇÃO SOBRE A EFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E EDUCAÇÃO NOS ESTADOS BRASILEIROS ..................................209Luckas Sabioni LopesSilvia Harumi Toyoshima

GRUPOS DE INTERESSES, ELEIÇÕES E REDES POLÍTICAS NO CONGRESSO NACIONAL ..........239Larissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior

ESTRUTURA ECONÔMICA E ENCADEAMENTOS SETORIAIS DE MINAS GERAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA AS POLÍTICAS DE PLANEJAMENTO .............................................271Luiz Carlos Santana RibeiroRosa Livia Gonçalves MontenegroRoberto Maximiano Pereira

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CONTENTS

TEST, LEARN, ADAPT: DEVELOPING PUBLIC POLICY WITH RANDOMISED CONTROLLED TRIALS...............................................................................11Laura HaynesOwain ServiceBen GoldacreDavid Torgerson

CORPORATE SOCIAL RESPONSIBILITY AS A TOOL FOR DEVELOPMENT: THE ROLE OF PUBLIC POLICY ...................................................................................................45Anita Kon

DEVELOPMENT AND FERTILITY IN BRAZIL: FERTILITY REVERSION FOR MORE DEVELOPED MUNICIPALITIES? .............................................................................109Ari Francisco de Araujo JuniorMárcio Antônio SalvatoBernardo Lanza Queiroz

CONTINUOUS PERFORMANCE EVALUATION AND TRAINING IN PUBLIC SERVICE: ADVANCES IN HR POLICY IN THE PUBLIC ADMINISTRATION OF A MUNICIPALITY OF ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC ..................................................................127Cristian Caê Seemann StassunFanni Wippel

THE IMPACT OF FOREIGN DIRECT INVESTMENT IN THE BRAZILIAN ECONOMIC GROWTH ...............................................................................151João Guilherme de Oliveira CarminatiElaine Aparecida Fernandes

BRAZIL, CLIMATE CHANGE AND ECONOMY: WHAT IS ESTABLISHED? ....................................183Gustavo Inácio de MoraesJoaquim Bento de Souza Ferreira Filho

SOME EVIDENCE CONCERNING THE NEGATIVE EFFECT OF CORRUPTION ON THE EFFICIENCY OF HEALTH AND EDUCATION POLICIES IN THE BRAZILIAN STATES......................................................................................................209Luckas Sabioni LopesSilvia Harumi Toyoshima

INTEREST GROUPS, ELECTIONS, AND POLITICAL NETWORKS IN CONGRESS .........................239Larissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior

ECONOMIC STRUCTURE AND SECTOR THREADS OF MINAS GERAIS: A CONTRIBUTION TO PLANNING POLICIES ............................................................................271Luiz Carlos Santana RibeiroRosa Livia Gonçalves MontenegroRoberto Maximiano Pereira

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SUMARIO

ENSAYAR, APRENDER, ADAPTAR: DESARROLLO DE POLÍTICAS PÚBLICAS CON PRUEBAS CONTROLADAS ALEATORIAS ............................................................................11Laura HaynesOwain ServiceBen GoldacreDavid Torgerson

RESPONSABILIDAD SOCIAL CORPORATIVA COMO HERRAMIENTA PARA EL DESARROLLO: EL PAPEL DE LAS POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................45Anita Kon

DESARROLLO Y FECUNDIDAD EN BRASIL: REVERSIÓN DE LA FECUNDIDAD PARA MUNICIPIOS MÁS DESARROLLADOS? ............................................................................89Ari Francisco de Araujo JuniorMárcio Antônio SalvatoBernardo Lanza Queiroz

EVALUACIÓN DEL DESEMPEÑO Y FORMACIÓN CONTINUOS EN SERVICIO PÚBLICO: LOS AVANCES EN LA POLÍTICA DE RECURSOS HUMANOS EN LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA DE UN MUNICIPIO DEL ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC ....................................................127Cristian Caê Seemann StassunFanni Wippel

EL IMPACTO DE LA INVERSIÓN EXTRANJERA DIRECTA EN EL CRECIMIENTO DE LA ECONOMÍA BRASILEÑA ..............................................................151João Guilherme de Oliveira CarminatiElaine Aparecida Fernandes

BRASIL, EL CAMBIO CLIMÁTICO Y LA ECONOMÍA: LO QUE ESTÁ ESTABLECIDO? ..................183Gustavo Inácio de MoraesJoaquim Bento de Souza Ferreira Filho

EVIDENCIAS SOBRE EL IMPACTO NEGATIVO DE LA CORRUPCIÓN SOBRE LA EFICIENCIA DE LAS POLÍTICAS DE SALUD Y EDUCACIÓN EN LOS ESTADOS BRASILEÑOS ..............................................................................................209Luckas Sabioni LopesSilvia Harumi Toyoshima

GRUPOS DE INTERESES, ELECCIONES E REDES POLÍTICAS EN EL CONGRESO .......................239Larissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior

ESTRUCTURA ECONÓMICA Y ENCADENAMIENTO SECTORIAL DE MINAS GERAIS: UNA CONTRIBUCIÓN A LAS POLÍTICAS DE PLANIFICACIÓN ..................................................271Luiz Carlos Santana RibeiroRosa Livia Gonçalves MontenegroRoberto Maximiano Pereira

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SOMMAIRE

ESSAYER, APPRENDRE, ADAPTER: LE DÉVELOPPEMENT DES POLITIQUES PUBLIQUES AVEC DES ESSAIS RANDOMISÉS CONTRÔLÉS ..........................................................................11Laura HaynesOwain ServiceBen GoldacreDavid Torgerson

RESPONSABILITÉ SOCIALE D’ENTREPRISES COMME UN OUTIL POUR LE DÉVELOPPEMENT: LE RÔLE DES POLITIQUES PUBLIQUES ...................................................45Anita Kon

LE DÉVELOPPEMENT ET LA FÉCONDITÉ AU BRÉSIL: LA RÉVERSION DE LA FERTILITÉ POUR LES MUNICIPALITÉS PLUS DÉVELOPPÉES? ..........................................89Ari Francisco de Araujo JuniorMárcio Antônio SalvatoBernardo Lanza Queiroz

ÉVALUATION DE LA PERFORMANCE ET DE LA FORMATION CONTINU DANS LE SERVICE PUBLIQUE: LES PROGRÈS DE LA POLITIQUE DES RESSOURCES HUMAINES DANS L’ADMINISTRATION PUBLIQUE D’UNE MUNICIPALITÉ DE ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC ...............127Cristian Caê Seemann StassunFanni Wippel

L’IMPACT DE L’INVESTISSEMENT DIRECT ÉTRANGER DANS LA CROISSANCE DE L’ÉCONOMIE BRÉSILIENNE ...........................................................151João Guilherme de Oliveira CarminatiElaine Aparecida Fernandes

BRÉSIL, CHANGEMENT CLIMATIQUE ET ECONOMIE: QU’Y A-T-IL D’ETABLI? ..........................183Gustavo Inácio de MoraesJoaquim Bento de Souza Ferreira Filho

ÉVIDENCES CONCERNANT L’EFFET NEGATIF DE LA CORRUPTION SUR L’EFFICACITÉ DES POLITIQUES DE SANTÉ ET L’EDUCATION DANS LES ÉTATS DU BRÉSIL ............................209Luckas Sabioni LopesSilvia Harumi Toyoshima

GROUPES D’INTÉRÊTS, LES ÉLECTIONS ET RÉSEAUX POLITIQUES AU PARLEMENT ................239Larissa Barbosa Cardoso Geraldo Edmundo Silva Junior

STRUCTURE ÉCONOMIQUE ET ENCHAÎNEMENT DES SÉCTEURS D’ACTIVITÉ DES MINAS GERAIS: UNE CONTRIBUTION AUX POLITIQUES DE PLANIFICATION ..........................271Luiz Carlos Santana RibeiroRosa Livia Gonçalves MontenegroRoberto Maximiano Pereira

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TESTAR, APRENDER, ADAPTAR: DESENVOLVER AS POLÍTICAS PÚBLICAS MEDIANTE EXPERIMENTOS ALEATÓRIOS CONTROLADOS* Laura Haynes**Owain Service***Ben Goldacre****David Torgerson*****

1 INTRODUÇÃO

Os experimentos aleatórios controlados (EACs) são a melhor forma de deter-minar se uma política funciona. Têm sido usados por mais de sessenta anos para comparar a eficiência de novos medicamentos.1 Os EACs são cada vez mais usados nos programas de desenvolvimento internacional, para compa-rar a eficiência de custo de diferentes intervenções para reduzir a pobreza (Banerjee e Duflo, 2011; Karlan e Appel, 2011). São também empregados amplamente por companhias que desejam saber qual layout de website gera mais vendas. Entretanto, ainda não se tornaram prática comum na maioria das áreas de políticas públicas (gráfico 1).

Este trabalho argumenta que se deve e pode usar EACs muito mais extensa-mente em política pública interna para testar a eficiência das intervenções novas e existentes e suas variações; aprender o que funciona e o que não; e adaptar polí-ticas de tal forma que melhorem de forma constante e evoluam tanto em termos de qualidade como de eficiência.

* Os autores agradecem aos departamentos do governo por compartilharem sua recente pesquisa envolvendo expe-riências de campo. Agradecem também aos professores Peter John, Rachel Glennester, Don Green, David Halpern e outros membros do Behavioural Insights Team por seus comentários a este trabalho, e também a Michael Sanders, por editar este artigo.Nota dos editores: este texto foi publicado originalmente em inglês com o título Test, learn, adapt: developing public policy with randomised controlled trials, em 2012, e está disponível em: <http://goo.gl/y3Gy8E>. Os autores gentilmente autorizaram a publicação em língua portuguesa.** Chefe de Pesquisa de Políticas no Behavioural Insights Team e pesquisadora visitante no King’s College, em Londres.*** Vice-diretor do Behavioural Insights Team.**** Pesquisador sênior na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.***** Diretor da Unidade de Experimentos de York.1. O primeiro EAC publicado na medicina é atribuído a Sir Brandford Hill, um epidemiologista do Medical Research Council da Inglaterra. O experimento, publicado no British medical journal em 1948, testou se a estreptomicina era efetiva no tratamento da tuberculose.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201312

GRÁFICO 1EACs no século XX em saúde e em bem-estar social, educação, crime e justiça

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Década

Saúde – Biblioteca Cochrane Bem-estar social, educação, crime e justiça – colaboração de Campbell

Fonte: Shepherd (2007).

A seção 2 deste trabalho estabelece o que é um EAC e por que este é importante. O texto aborda muitos dos argumentos contrários ao uso de EACs em política pública e defende que os experimentos não são tão difíceis de serem feitos como frequentemente se presume, podendo ter ótimas relações custo-benefício para avaliação de resultados de políticas e para estimar o retorno dos dispêndios.

A seção 3 do trabalho destaca nove passos-chave que qualquer EAC precisa ter. Muitos destes passos são fundamentais para qualquer política, outros necessitarão de apoio de acadêmicos ou centros especializados no governo.

A filosofia de “testar, aprender, adaptar” definida neste trabalho está no âmago da forma na qual o Behavioural Insights Team trabalha.2 A abordagem “testar, aprender, adaptar” tem potencial para ser usada em quase todos os aspectos da política pública.

1) Testar uma intervenção significa assegurar-se de que foram implantadas medidas robustas que possibilitam avaliar sua eficiência.

2. Nota dos revisores técnicos: o Behavioural Insights Team é a equipe do Gabinete do Governo Britânico dedicada à aplicação dos instrumentos da economia comportamental e da psicologia às políticas e serviços públicos.

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13Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

2) Aprender consiste em analisar o resultado da intervenção, de forma a que se possa identificar o que funciona e se a dimensão do efeito é ou não suficientemente grande para estabelecer uma boa relação custo-benefício.

3) Adaptar significa usar essa aprendizagem para modificar a intervenção (se necessário) de tal maneira que se refine continuamente a forma na qual a política é projetada e implementada.

2 O QUE SÃO EACs E POR QUE SÃO IMPORTANTES?

2.1 O que é um experimento aleatório controlado?

Muitas vezes, é preciso saber qual de duas ou mais intervenções é a mais eficaz para atingir um resultado específico e mensurável. Por exemplo, quando se quer comparar uma nova intervenção com a prática corrente, ou comparar níveis di-ferentes de “dosagem” entre si (como consultas domiciliares a uma adolescente grávida uma vez por semana, ou duas vezes por semana).

Convencionalmente, para avaliar se uma intervenção tem um benefício, basta implementá-la e observar os resultados. Por exemplo, é possível estabelecer um programa intensivo de assistência “de volta ao trabalho” e monitorar se os par-ticipantes saíram do seguro-desemprego com mais rapidez que antes do programa ser introduzido.

Entretanto, essa abordagem tem diversas desvantagens que tornam difícil identifi-car se foi a intervenção que teve o efeito ou algum outro fator, principalmente os fatores não controlados, externos. Se houver crescimento econômico, por exemplo, podemos esperar que mais pessoas encontrem emprego independentemente de uma nova política.

Outro desafio analítico complicado trata do chamado “viés de seleção”; ou seja, as pessoas que querem participar do programa de volta ao trabalho são sistematicamente diferentes daquelas que não querem. Elas talvez sejam mais motivadas a encontrar trabalho, significando que os benefícios da nova inter-venção serão superestimados. Existem técnicas estatísticas para tentar controlar diferenças preexistentes entre os grupos que recebem intervenções diferentes, mas estas são sempre imperfeitas e podem introduzir mais vieses.

Os experimentos aleatórios controlados contornam esse problema, ao assegu-rar que os indivíduos, ou os grupos de pessoas, que recebem ambas as intervenções sejam o máximo possível parecidos. No exemplo aqui utilizado, de programa “de volta ao trabalho”, isto pode envolver a identificação de 2 mil pessoas que seriam elegíveis para o novo programa e a divisão aleatória delas em dois grupos de 1 mil, dos quais um receberia a intervenção corrente e o outro receberia a nova intervenção.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201314

Ao designar aleatoriamente as pessoas aos grupos, pode-se eliminar a possibi-lidade de fatores externos afetarem os resultados e demonstrar que quaisquer diferenças entre os dois grupos são exclusivamente resultado da diferença no tratamento que receberem.

FIGURA 1Ilustração de um EAC para testar um novo programa “de volta ao trabalho” (resultado positivo)

Elaboração dos autores.

A seção 3 deste artigo descreve mais detalhadamente como realizar um ex-perimento aleatório controlado, mas no âmago de qualquer EAC existem diver-sos elementos-chave. Os EACs operam ao dividir a população em dois ou mais grupos aleatoriamente, dando uma intervenção a um grupo, outra a um outro, e mensurando o resultado predeterminado para cada grupo. Este processo está resumido na figura 1.

Suponha-se que se tenha testado um novo programa “de volta ao trabalho” que visa ajudar os que buscam emprego. A população avaliada é dividida alea-toriamente em dois grupos, e apenas um destes grupos recebe a nova interven-ção (“o grupo de tratamento”) – neste caso, o programa “de volta ao trabalho”. O outro grupo ( “o grupo de controle”) recebe o apoio usual que uma pessoa que busca por emprego teria. Neste caso, o grupo de controle é equivalente ao grupo que recebe o placebo em um experimento de medicamento.

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15Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

FIGURA 2Ilustração de um EAC para testar um novo programa “de volta ao trabalho” (resul-tado neutro)

Elaboração dos autores.

No exemplo da figura 1, os candidatos que encontraram trabalho em tempo integral seis meses antes do início do experimento estão na cor verde. O experimento mostra que o número de indivíduos no novo programa “de volta ao trabalho” que estão agora trabalhando é muito maior que os do grupo de controle.

É importante observar que duas figuras no grupo de controle também encontraram trabalho, talvez tendo se beneficiado dos serviços usuais de apoio a quem está no seguro-desemprego e procura emprego.

Se o novo programa “de volta ao trabalho” não fosse melhor que o ser-viço corrente prestado aos que procuram emprego, seria possível observar um padrão similar tanto no grupo de tratamento como no grupo de controle. Isto está ilustrado na figura 2, que mostra um conjunto diferente de resultados para o programa.

No caso, os resultados do experimento demonstram que o novo e caro pro-grama “de volta ao trabalho” não é melhor que a prática corrente. Se não houvesse um grupo de controle, o resultado mostraria pessoas conseguindo empregos após participarem do novo programa “de volta ao trabalho” e concluído erroneamente que isto se devia ao programa. Fato que poderia ter levado a lançar o novo e dispen-dioso (e ineficaz) tratamento. Um erro como este foi evitado pelo Departamento de Trabalho e Pensões (DWP – em inglês, for Work and Pensions) em um EAC real sobre o custo-benefício de diferentes tipos de intervenções (box 1)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201316

BOX 1Usando EACs para saber o que realmente funciona para levar as pessoas de volta ao trabalho

Em 2003, o DWP1 realizou um EAC para examinar o impacto de três novos programas sobre pedido de benefícios de invalidez: apoio no trabalho, apoio focado nas necessi-dades individuais de saúde, ou ambos (DWP, 2006a).2 O apoio extra custou £1.400,00 em média, mas a experiência não encontrou nenhum benefício além do apoio padrão que já estava disponível. O EAC economizou para o contribuinte muitos milhões de libras, pois forneceu evidência inequívoca de que o dispendioso apoio adicional não teve o efeito pretendido.

Mais recentemente, o DWP desejava investigar se a frequência da entrevista de revisão exigida para os desempregados que recebem seguro-desemprego poderia ser reduzida sem piorar os resultados.

Em um experimento envolvendo mais de 60 mil pessoas, o processo de entrevista de revisão do benefício quinzenal tradicional foi comparado a diversos outros menos exigentes (por exemplo, entrevista pelo telefone, com menor frequência). Todas as alternativas ao status quo testadas em experimentos suficientemente grandes para mostrar efeitos confiáveis aumentaram o tempo que as pessoas gastam para encontrar emprego (DWP, 2006b). Como resultado, apesar de outras mudanças no sistema de benefícios, a política do DWP continua exigindo a realização de entrevistas frequentes.

Elaboração dos autores.Notas: 1 Nota dos revisores técnicos: O DWP britânico equivale aos ministérios do Trabalho e da Previdência brasileiros.

2 Esse é um projeto de interação que permite a determinação dos efeitos separados e combinados de duas intervenções. Estes projetos são especialmente úteis nas situações em que existem questões sobre o efeito adicional de uma/ou mais características de um programa complexo.

Sempre que houver potencial para fatores externos afetarem os resultados de uma política, vale a pena considerar usar EACs para testar a eficiência do tra-tamento antes de implementá-la em toda a população. Quando não se procede desta maneira, é fácil confundir mudanças que poderiam ter ocorrido de qualquer forma com o impacto de um determinado tratamento.

No exemplo fictício “de volta ao trabalho” aqui sugerido, assume-se o in-teresse principal de entender qual das duas intervenções de larga escala funciona com mais eficiência. Em muitos casos, um EAC pode se voltar a temas que vão além da política principal, podendo ser usado para comparar diversas formas de implementar aspectos menores da mesma política.

Como muitos outros exemplos que serão dados ao longo deste texto mos-tram (box 2), uma das vantagens dos experimentos aleatórios controlados é que eles também permitem que se teste a eficácia de determinados aspectos de um programa mais amplo. Testar pequenas partes de um programa possibilita que os formuladores de políticas refinem continuamente a política, aprimorando o aspecto particular do tratamento que tenha o maior impacto.

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17Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

BOX 2Demonstração do impacto de mensagens de texto nos reembolsos de multas

O Serviço de Tribunais e o Behavioural Insights Team queriam testar se enviar mensa-gens de texto para pessoas que deixaram de pagar suas multas de tribunal poderia incentivá-las ou não a pagar antes de enviar um oficial de justiça às suas residências. A forma como esta questão foi respondida é um exemplo claro da abordagem “testar, aprender, adaptar” e mostra que o teste simultâneo de diversas variações pode ajudar a descobrir o que funciona melhor.

Na experiência inicial, os indivíduos foram alocados aleatoriamente em cinco grupos dife-rentes. Alguns não receberam nenhuma mensagem (grupo de controle), enquanto outros (grupos de tratamento) receberam um texto-padrão de lembrança ou uma mensagem mais personalizada (incluindo o nome do recipiente, o valor devido, ou ambos).

A experiência mostrou que os lembretes por mensagem podem ser altamente eficazes (gráfico 2).

GRÁFICO 2Experiência inicial: índices de reembolso por indivíduos (N=1.054)1

(Em %)35

33

30

25

29

2325

20

15

10

55

0Sem texto Texto-padrão Texto-padrão

+ valorTexto-padrão

+ nomeTexto-padrãonome + valor

Fonte: Behavioural Insights Team.Nota: 1 Os números refletem os índices de resposta às mensagens de texto que foram enviadas (o Serviço de Tribunais

possuía números corretos dos celulares).

Um segundo experimento foi realizado usando uma amostra maior (N=3.633) para deter-minar que aspectos das mensagens personalizadas poderiam contribuir para aumentar os índices de pagamento. O padrão de resultados foi muito similar ao primeiro experimento. Entretanto, o segundo permitiu assegurar não apenas que as pessoas tinham mais proba-bilidade de pagar sua multa vencida se recebessem uma mensagem de texto contendo seu nome, mas também que o valor médio dos reembolsos de multa subiu mais de 30%.

(Continua)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201318

Os dois experimentos foram realizados com custo muito baixo: como os dados do resul-tado já estavam sendo coletados pelo Serviço de Tribunais, o único custo foi o tempo para membros da equipe montarem o experimento. Se tivesse sido lançada em nível nacional, os lembretes por mensagem de texto melhorariam a cobrança de multas não pagas – estima-se que simplesmente enviar um texto personalizado em vez de um padronizado produza mais de £ 3 milhões anualmente. A economia obtida com os textos personalizados é muitas vezes maior que não enviar nenhum lembrete por mensagem de texto. Além desta economia financeira, o Serviço de Tribunais estima que enviar lembretes em texto personaliza-do pode reduzir a necessidade de até 150 mil intervenções de oficiais de justiça anualmente.

Elaboração dos autores.

Independentemente de se comparar duas intervenções de grande escala ou detalhes de uma única política, os mesmos princípios básicos de um EAC são válidos; ao compararem-se dois grupos idênticos escolhidos aleatoriamente, pode-se controlar uma grande variedade de fatores que permitem entender o que funciona e o que não funciona.

BOX 3O elo entre teorias de crescimento, inovação e EACs

Os dois experimentos foram realizados com custo muito baixo: como os dados do resul-tado já estavam sendo coletados pelo Serviço de Tribunais, o único custo foi o tempo para membros da equipe montarem o experimento. Se tivesse sido lançada em nível nacional, os lembretes por mensagem de texto melhorariam a cobrança de multas não pagas – estima-se que simplesmente enviar um texto personalizado em vez de padronizado pro-duza mais de £ 3 milhões anualmente. A economia obtida com os textos personalizados é muitas vezes maior que não enviar nenhum lembrete por mensagem de texto. Além desta economia financeira, o Serviço de Tribunais estima que enviar lembretes em texto personalizado pode reduzir a necessidade de até 150 mil intervenções de oficiais de justiça anualmente.

O crescente interesse no uso de EACs como uma ferramenta importante de elaboração e implementação de políticas ressoa com correntes mais amplas de pensamento. Quando o dinheiro é escasso, é essencial se certificar de que ele está sendo gasto em abordagens que funcionam; e mesmo melhorias marginais em eficácia de custo são preciosas. Os EACs são uma ferramenta extremamente poderosa para identificar boas relações de custo-eficácia e evitar o gasto de baixo retorno.

(Continuação)

(Continua)

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19Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Esses métodos também ressoam fortemente com pontos de vista emergentes sobre progres-so social e econômico. Muitos pensadores de destaque concluíram que, em sistemas com-plexos, desde ecossistemas biológicos até economias modernas, boa parte do progresso – se não a maioria – ocorre através de um processo de tentativa e erro (Harford, 2011). Economias e ecossistemas que se tornam demasiadamente dominados por um estreito espectro de práticas, espécies ou empresas são mais vulneráveis que sistemas mais diver-sos (Taleb, 2007; Christensen, 2003). Similarmente, estes pensadores tendem a ser céticos sobre a capacidade de mesmo os especialistas e líderes mais sábios oferecerem estratégia abrangente ou plano que detalhe a “melhor” prática ou resposta real (certamente com abrangência universal). Em vez disso, encorajam o cultivo deliberado da diversidade em sistemas que eliminem as variações menos eficazes e compensem e reproduzam as varie-dades que tenham melhor desempenho.

A expressão prática desse pensamento inclui o impulso para maior descentralização de formulação de políticas e o uso de mercados para fornecimento de mercadorias e serviços. O incentivo à variação precisa ser combinado a mecanismos que identifi-quem e favoreçam inovações bem-sucedidas. Isto inclui aumentar a transparência e a retroalimentação nos mercados de bens e nos serviços públicos, observando que estes levam à expansão seletiva dos melhores ofertantes e, muitas vezes, ao crescimento de ofertantes menores e independentes (Luca, 2011). Nos serviços públicos, e quando os mercados e o pagamento por resultados podem ser inapropriados, os EACs e os expe-rimentos com muitos grupos podem desempenhar um papel poderoso, especialmente quando estes resultados são amplamente informados e aplicados.

Elaboração dos autores.

2.2 Uma defesa dos EACs: desmascarando alguns mitos

Existem muitas áreas nas quais os experimentos aleatórios são prática comum, e onde deixar de fazê-los seria considerado bizarro ou mesmo negligente. Os EACs são o meio universal de avaliar qual dos dois tratamentos médicos funciona melhor – se é um novo medicamento comparado ao melhor tratamento atual, duas formas diferentes de cirurgia de câncer, ou até mesmo duas meias de compressão diferentes. Nem sempre foi assim: quando os experimentos foram introduzidos na medicina, sofreram forte resistência de alguns médicos, muitos dos quais acreditavam que seu julgamento pessoal e especializado era suficiente para decidir se um determinado tratamento era eficiente.

Os EACs são cada vez mais usados para investigar a eficácia e o retorno de diversos programas de desenvolvimento (box 4).

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201320

BOX 4O uso de EACs para melhorar resultados eduacionais na Índia

Uma das áreas de rápido crescimento no uso de EACs em anos recentes deu-se na área de projetos de desenvolvimento internacional. Numerosos experimentos foram condu-zidos para determinar como reduzir a pobreza no mundo em desenvolvimento, como incentivar variedades agrícolas de baixo rendimento, encorajar o uso de mosquiteiros, garantir que os professores compareçam às aulas, promover o empreendedorismo e aumentar as taxas de vacinação.

Por exemplo, o esforço, nas décadas recentes, de universalizar a educação nos países em desenvolvimento levou ao aumento das matrículas e do comparecimento escolar. Contudo, a qualidade da educação das crianças de lares pobres ainda continua problemática: em 2005, uma pesquisa na Índia indicou que mais de 40% das crianças menores de 12 anos não conseguia ler um parágrafo simples e 50% não conseguia fazer uma subtração simples.

Em parceria com uma ONG de educação, os pesquisadores conduziram um RCT para determinar se um programa de apoio educacional de baixo custo melhoraria os resultados educacionais na Índia. Mais de duzentas escolas foram escolhidas aleatoriamente para receber um tutor para a terceira ou quarta série. O impacto do programa foi estimado pela comparação das notas da terceira série destas escolas com as demais.

Os tutores eram mulheres da comunidade local, que recebiam uma fração do salário do professor e trabalhavam por meio turno, com grupos de alunos com desempenho inferior em relação a seus colegas. Os resultados indicaram que o programa de apoio melhorou significativamente as notas dos alunos, especialmente em matemática. O programa foi con-siderado tão bem-sucedido (e eficiente em termos de custo quando comparado a outros programas para melhorar o desempenho escolar) que foi aplicado ao restante da Índia (Banerjee et al., 2007).

Elaboração dos autores.

Nos negócios, quando as companhias querem descobrir qual é o melhor design para uma página na internet, é comum mostrar as diversas opções para os visitantes e, então, rastrear seus cliques e seu comportamento de compra (box 5).

BOX 5O uso de EACs para melhorar o desempenho empresarial

Muitas companhias usam EACs para testar as reações do consumidor a diferentes apresen-tações de seus produtos on-line. Pouca informação é pública, mas é conhecido que com-panhias como Amazon e eBay usam o tráfego em seus sites para testar o que funciona melhor para impulsionar as compras. Por exemplo, alguns clientes veem uma determinada configuração de uma página, enquanto outros veem uma diferente. Ao rastrear os cliques e o comportamento de compra de clientes que veem as diferentes versões do site, as compa-nhias podem ajustar o desenho da página para maximizar os lucros. Alguns exemplos são fornecidos a seguir.

(Continua)

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21Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Durante a iniciativa recente de coletar fundos para a Wikipedia, uma fotografia do funda-dor, Jimmy Wales apareceu nas propagandas das doações na parte superior da página: isto foi o resultado de uma série de experimentos comparando formas diferentes de publi-cidade, transmitindo-as aleatoriamente para os visitantes do site e monitorando se estes doaram ou não.

Netflix é uma companhia que oferece filmes on-line e que executa diversos experimentos com o usuário. Quando experimentavam a “Sala de Projeção Netflix”, uma nova forma de ver antecipadamente filmes, produziram quatro versões diferentes do serviço. Estes foram mostrados para quatro grupos de 20 mil assinantes, e um grupo de controle recebeu o serviço normal do Netflix. Os usuários foram então monitorados para verificar se assistiram a mais filmes (Davenport e Harris, 2007).

A Delta Airlines também usou o experimento para melhorar seu website. Em 2006, apesar de números crescentes de pessoas estarem reservando suas passagens on-line, o tráfego para o website da Delta Airlines não gerava o número esperado de reservas. Quase 50% dos visitantes do site saíam antes de concluir o processo de reserva: após selecionarem seu voo, os prováveis clientes geralmente abandonavam a reserva quando chegavam à página que pedia a inserção de suas informações pessoais (nome, endereço e detalhes do cartão de crédito).

Em vez de mudar todo o site, a Delta se concentrou em fazer mudanças nas páginas específicas que deixavam de converter possíveis clientes em vendas. Diversas variações foram testadas on-line, direcionando aleatoriamente clientes para versões diferentes das páginas. A Delta des-cobriu que, ao remover as instruções detalhadas na parte superior da página que pede que o cliente insira suas informações pessoais, estes tiveram propensão maior a completar a compra. Como resultado da implementação desta e de outras mudanças sutis no site, identificadas durante o processo de testes, as taxas de conversão para vendas de passagens melhoraram em 5% (Delta Airlines, 2007), uma mudança pequena, mas altamente valiosa.

Elaboração dos autores.

Mas, apesar de haver alguns bons exemplos de formuladores de políticas usando EACs no Reino Unido, eles ainda não são amplamente usados. Isto pode ser parcialmente devido a uma falta de conscientização, mas existem também muitos mal-entendidos sobre EACs, o que os leva a serem inapropriadamente rejeitados.

A seguir, serão abordados cada um desses mitos, tratando das suposições incor-retas de que os EACs são sempre difíceis, dispendiosos, antiéticos ou desnecessários. Argumenta-se o perigo da confiança demasiada ao assumir que as intervenções são eficazes, e que os EACs desempenham um papel vital na demonstração não apenas da eficiência de um tratamento, como também do seu retorno.

2.2.1 Não sabemos necessariamente “o que funciona”

Os formuladores de políticas e profissionais geralmente acham que têm um bom entendimento de quais tratamentos podem funcionar e usam estas crenças para

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201322

planejar a política. Mesmo se houver bons motivos para acreditar que uma política será eficaz, vale a pena executar um EAC para quantificar o benefício da maneira mais precisa possível. Um experimento pode, ainda, ajudar a demonstrar quais aspectos de um programa estão tendo maior efeito, e como pode este ser melho-rado. Por exemplo, ao implementar um novo programa para o financiamento de empreendedores, seria útil saber se, dobrando o valor do dos recursos, haveria um efeito significativo sobre o sucesso, ou se não faz diferença.

Devemos também reconhecer que as previsões confiantes sobre política feitas por especialistas frequentemente se mostram incorretas. Os EACs têm demonstra-do que intervenções que foram projetadas para serem eficazes na realidade não o foram (box 1). Também mostraram que intervenções sobre as quais houve ceticis-mo inicial foram proveitosas. Por exemplo, quando o Behavioural Insights Team e o Serviço de Tribunais avaliaram se as mensagens de texto poderiam incentivar as pes-soas a pagarem suas multas de tribunal, poucos previram que um texto personaliza-do aumentaria tão significativamente os índices e os valores de reembolso (box 2).

Mas existem ainda incontáveis exemplos de EACs que subverteram as su-posições tradicionais sobre o que funciona e mostraram que as intervenções tidas como sendo eficazes eram, na realidade, prejudiciais. O caso da aplicação de esteroides (box 6) é um exemplo poderoso de como suposições aparentemente sólidas não são verdadeiras quando testadas. Da mesma forma, o programa Scared Straight, que expõe jovens às realidades de uma vida de crime, é um bom exem-plo de uma intervenção política bem intencionada, com uma base de evidência aparentemente sólida, mas que os EACs mostraram ter efeitos adversos (box 7). Os EACs são o melhor método para evitar estes erros, ao oferecer aos formulado-res de políticas e profissionais uma evidência robusta da eficácia de uma política, e assegurar que se sabe o que teria acontecido se não houvesse intervenção.

BOX 6Esteroides para lesões na cabeça: salvando vidas ou matando pessoas?

Durante diversas décadas, os adultos com lesões graves na cabeça eram tratados usando-se injeções de esteroide. Isto fazia sentido em princípio: esteroides reduzem o inchaço, e acreditava-se que o inchaço, ao pressionar o cérebro, dentro do crânio, matava pessoas com ferimentos na cabeça. Entretanto, estas hipóteses não tinham sido submetidas a testes apropriados.

Então, há uma década, essa suposição foi testada em um experimento aleatório (Edwards et al., 2005). O estudo foi controverso, e muitos se opuseram a ele, porque achavam que já sabiam que os esteroides eram eficazes. Na realidade, quando os resultados foram publicados, em 2005, revelaram que as pessoas que recebiam injeções de esteroide tinham mais probabilidade de morrer: este tratamento de rotina tinha matado pessoas, e em grandes quantidades, porque os ferimentos na cabeça são frequentes. Os resultados foram tão extremos que o experimento teve de ser suspenso, para evitar dano adicional.

(Continua)

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23Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Esse é um exemplo particularmente dramático de por que os testes sérios de intervenções novas são importantes: sem eles, podemos causar danos não intencionais, sem sequer conhecê-los; e quando novas intervenções se tornam uma prática comum sem boa evidência, então, pode haver resistência a testá-las no futuro.

Elaboração dos autores.

BOX 7O Programa Scared Straight: dissuadindo delinquentes juvenis ou incentivando-os?

Scared Straight é um programa desenvolvido nos Estados Unidos para deter os delinquen-tes juvenis e crianças em risco de um comportamento criminoso. O programa expôs crianças à realidade de uma vida de crime, fazendo-as interagir com criminosos encarcerados.

A teoria era de que essas crianças teriam menos probabilidade de se envolver em comporta-mentos criminosos se tivessem consciência das consequências. Diversos estudos anteriores, que analisaram comportamentos criminosos de participantes antes e após o programa, pareciam apoiar estas hipóteses (Finckenauer, 1982). Os índices de sucesso foram informados como sendo de 94%, e o programa foi adotado em diversos países, inclusive no Reino Unido.

Nenhuma dessas avaliações teve um grupo de controle mostrando o que teria acontecido a esses participantes se não tivessem participado do programa. Diversos EACs foram feitos para corrigir este problema. Uma meta-análise de sete experimentos nos Estados Unidos, que escolheram aleatoriamente metade da amostragem de crianças em risco para o programa, descobriram que o Scared Straight, na realidade, levou a índices mais elevados de compor-tamento delinquente: “não fazer nada teria sido melhor que expor os jovens ao programa” (Petrosino, Turpin-Petrosino e Buehler, 2003). Análise recente sugere que os custos associa-dos ao programa (amplamente relacionados ao aumento nos índices de reincidência) foram trinta vezes mais elevados que os benefícios, significando que o programa Scared Straight custa para o contribuinte um montante significativo de dinheiro e gera mais crimes (The Social Research Unit, 2012).

Elaboração dos autores.

2.2.2 EACs não precisam ser caros

Os custos de um EAC dependem de como ele é projetado: com planejamento, podem ser mais baratos que outras formas de avaliação. Isto é especialmente ver-dadeiro quando um serviço já é provido, e quando os dados do resultado são coletados pelos sistemas rotineiros de monitoramento, como em muitas partes do setor público. Em contraste com experimentos médicos, um experimento de política pública não exigirá necessariamente que se recrute participantes fora da prática normal ou que se implante novos sistemas para prover as inter-venções ou monitorar os resultados.

O Behavioural Insights Team tem trabalhado com diversos departamen-tos governamentais para realizar experiências com pouco dispêndio adicional

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201324

do tempo dos membros da equipe. Por exemplo, em experimentos em que a equipe tem de realizar com autoridades locais ‒ HMRC, DVLA e o Serviço de Tribunais (e está para realizar com o Job Centre Plus) ‒, os dados já são rotineiramente coletados e os processos já estão implantados para apresentar intervenções, quer seja uma carta, uma multa ou um serviço de consultoria para pessoas desempregadas.

Quando se consideram os recursos adicionais que podem ser necessários para realizar um EAC, é preciso lembrar de que eles são geralmente a melhor for-ma de estabelecer se um programa oferece um bom retorno. Em alguns casos, um experimento pode levar a concluir que um programa é demasiado dispendioso para ser realizado, se os benefícios extras do tratamento forem insignificantes. Em outros, uma experiência pode demonstrar que um programa oferece excelente aplicação de recursos e, por isso, deve ser expandido.

Ao demonstrar quanto mais ou menos eficaz o tratamento foi em relação ao status quo, os formuladores de políticas podem determinar se o custo da intervenção justifica os benefícios. Em vez de considerar quanto o EAC custa para ser realizado, pode ser mais apropriado perguntar: quais são os custos de não fazer um EAC?3

2.2.3 Existem vantagens éticas em usar EACs

Algumas pessoas têm objeção aos EACs nas políticas públicas por considera-rem antiético não oferecer um novo tratamento para pessoas que poderiam se beneficiar dele. Este é particularmente o caso quando os recursos adicionais são gastos em programas que poderiam melhorar a saúde, renda ou educação de um grupo.

É legítimo dizer que é questionável não oferecer um tratamento ou inter-venção para alguém que acreditamos que possa se beneficiar dele. Este artigo não argumenta que devemos fazer isto quando sabemos que um tratamento já é com-provadamente benéfico.

Entretanto, é preciso ter clareza acerca dos limites de nosso conhecimento e considerar que não se pode ter convicção da eficiência de um tratamento até que este seja exaustivamente testado.

Por vezes, as intervenções consideradas eficazes se mostraram inefica-zes ou até mesmo prejudiciais (boxes 6 e 7). Este pode ser o caso, inclusi-ve, de políticas que se supunha, intuitivamente, terem resultado garantido. Por exemplo, têm sido usados incentivos para encorajar alunos adultos a participar de aulas de alfabetização, mas, quando o EAC desta política foi

3. Isso pode ser formalmente estimado ao se comparar o custo de uma experiência, por exemplo, diante de uma estimativa do dinheiro que seria gasto se o tratamento fosse implementado, mas não tivesse benefício.

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25Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

realizado, constatou-se que os participantes que receberam incentivos parti-ciparam de aproximadamente duas aulas a menos por período que o grupo sem incentivo (Brooks et al., 2008).

Nessa experiência, o uso de pequenos incentivos monetários não apenas desperdiçou recursos, como também reduziu a frequência às aulas. Não oferecer o tratamento foi melhor que oferecê-lo, e se um experimento nunca tivesse sido realizado, prejuízos poderiam ter sido causados aos alunos adultos com a melhor das intenções, e sem jamais saber que se estava fazendo isso.

Vale também observar que políticas são geralmente introduzidas aos poucos, de forma gradativa, com algumas áreas começando antes, sem que estas introdu-ções por fases sejam consideradas como antiéticas. A introdução do programa Sure Start é um exemplo disto.

Aliás, uma introdução por fases no contexto de um EAC é mais ética, pelo fato de gerar novas informações de alta qualidade que podem ajudar a demonstrar que um tratamento é eficaz em termos de custo.

2.2.4 Os EACs não precisam ser complicados ou difíceis de realizar

Os EACs, em sua forma mais simples, são de realização bastante objetiva. Entretanto, existem armadilhas que indicam que algum apoio especializado é aconselhável desde o início.

Algumas dessas armadilhas são apresentadas na próxima seção, mas não são maiores que as enfrentadas em qualquer outra forma de avaliação de resultados e podem ser superadas com o apoio correto. Isto pode envolver, por exemplo, um contato com profissionais (a exemplo dos que integram o Behavioural Insights Team) que poderão orientar o desenho do experimento e a comunicação entre os formuladores de políticas e os acadêmicos experientes, realizar EACs e ajudar a orientar o projeto de um experimento. Muito frequentemente, os acadêmicos têm prazer em auxiliar um projeto que lhes proporcionará nova evidência em uma área de interesse para sua pesquisa, ou a possibilidade de um artigo acadê-mico publicado.

O esforço inicial para construir uma randomização e definir claramente os resultados antes de um piloto ser iniciado é, geralmente, tempo bem gasto. Se um EAC não é realizado, então qualquer tentativa de avaliar o impacto de um tratamento será difícil, dispendiosa e enviesada – será necessário usar modelos complexos para identificar os efeitos que podem ter causas externas múltiplas. Seria muito mais eficiente investir esforço no desenho de um EAC antes de a política ser implementada.

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BOX 8Family Nurse Partnership: construindo uma avaliação rigorosa para um programa mais amplo

A Family Nurse Partnership (FNP) é um programa preventivo para mães de primeira viagem em situação vulnerável. Desenvolvido nos Estados Unidos, envolve visitas domi-ciliares estruturadas e intensivas, feitas por enfermeiras especialmente treinadas, desde o início da gravidez e até que a criança atinja 2 anos de idade. Diversos EACs nos Estados Unidos1 têm mostrado benefícios significativos para jovens famílias necessi-tadas e economia substancial de recursos. Por exemplo, as crianças beneficiadas pela FNP têm melhor desenvolvimento socioemocional e desempenho educacional, além de menor probabilidade de se envolver no crime. Igualmente, as mães têm menos filhos, in-tervalos maiores entre os nascimentos, mais probabilidade de ser empregadas e menos probabilidade de se envolver no crime.

A FNP é oferecida no Reino Unido desde 2007, geralmente através dos centros Sure Start Children. E o Departamento de Saúde comprometeu-se a ampliar o número de mães jovens que recebem apoio por meio deste programa para até 13 mil (de cada vez) em 2015. Durante o período, o departamento financia uma avaliação de EACs do programa, para definir se a FNP beneficia famílias além dos serviços universais e se oferece benefícios que superam os custos. O experimento envolve dezoito lugares do Reino Unido e aproximadamente 1.650 mulheres, o maior experimento até hoje com a FNP. Conforme informado em 2013, as medidas dos resultados incluem: tabagismo durante a gravidez, amamentação, admissões em hospitais por ferimentos, ingestões acidentais, outras gravidezes e desenvolvimento da criança aos 2 anos.

Elaboração dos autores.Nota: 1 Para uma síntese das pesquisas das Nações Unidas sobre esse programa, ver MacMillan et al. (2009).

3 REALIZAÇÃO DE UM EAC: NOVE PASSOS-CHAVE

3.1 Como conduzir um experimento aleatório controlado?

A seção 2 deste trabalho trata do uso de EACs na política pública. A seção 3 versa sobre como conduzir um EAC; contudo, não pretende ser abrangente. Em vez disso, apresenta os passos necessários pelos quais qualquer EAC deve passar e aponta para as áreas nas quais um formulador de políticas pode desejar buscar orientação mais especializada.

Identificam-se nove passos que qualquer EAC precisará para ser executado. Muitos destes nove passos são bem conhecidos por qualquer um que implante uma avaliação de política bem definida – por exemplo, a necessidade de deixar claro, desde o início, o que a política procura alcançar.

Outros, entretanto, são menos conhecidos; em particular, a necessidade de alo-car aleatoriamente o tratamento sendo testado para diferentes grupos. Os passos es-tão resumidos a seguir e desenvolvidos mais detalhadamente nas subseções seguintes.

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27Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

• Testar

1) Identificar duas ou mais intervenções para comparar (por exemplo, política antiga versus nova; variações diferentes de uma política).

2) Determinar o resultado que a política pretende influenciar e como será mensurado no experimento.

3) Decidir sobre a unidade de randomização: se randomizar a intervenção e os grupos de controle no nível de indivíduos, instituições (por exem-plo, escolas) ou áreas geográficas (por exemplo, autoridades locais).

4) Determinar quantas unidades (pessoas, instituições ou áreas) são necessárias para obter resultados robustos.

5) Atribuir cada unidade a uma das intervenções, utilizando um método de randomização robusto.

6) Aplicar as intervenções nos grupos escolhidos.

• Aprender

7) Mensurar os resultados e determinar o impacto de intervenções.

• Adaptar

8) Adaptar a política de acordo com suas constatações.

9) Voltar ao passo 1 para melhorar continuamente seu entendimento das intervenções efetivas.

3.2 Testar

Passo 1: identificar duas ou mais intervenções para comparar

Os EACs são realizados quando há incerteza sobre qual é a melhor de duas ou mais intervenções e envolvem comparar estas intervenções entre si. Geralmente, os experi-mentos são realizados para comparar um novo tratamento diante da prática corrente. O novo tratamento pode ser uma pequena mudança, ou um conjunto de pequenas mudanças na política usual; ou pode ser uma abordagem nova que tenha sido bem- sucedida em um país ou contexto diferente, ou que tenha apoio teórico sólido.

Antes de desenhar um EAC, é importante considerar o que é atualmente conhecido sobre a eficiência do tratamento que se pretende testar. Pode ser, por exemplo, que os EACs já tenham sido realizados em contextos similares, e a intervenção tenha se mostrado eficaz ou ineficaz. A pesquisa existente pode também ajudar a desenvolver a própria intervenção. Um bom ponto

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de partida são os arquivos da Campbell Collaboration,4 que apoiam os for-muladores e que aplicam as políticas ao resumir a evidência existente sobre políticas sociais.

É também importante que os experimentos sejam realizados na forma que seria aplicada caso o experimento fosse bem-sucedido. Geralmente, existe uma tentação de realizar o EAC usando uma política ideal, perfeita, que é tão dispen-diosa que nunca poderia ser realizada em nível nacional. Mesmo que os recursos estivessem disponíveis, este EAC não seria informativo, porquanto os resultados não seriam aplicáveis ao mundo real.

É preciso se certificar de que os resultados do experimento refletirão o que pode ser alcançado caso a política seja considerada eficaz e, então, realizada mais amplamente. Para que os resultados sejam generalizáveis e relevantes para todo o país, o tratamento deve ser representativo, assim como o entusiasmo com o qual os profissionais a aplicam e a forma como os dados são coletados.

O Behavioural Insights Team, ao conduzir um EAC de política pública, gasta certo período de tempo junto às organizações na linha de frente, tanto para entender o que é provavelmente viável, como para aprender com a equipe, que pode ter desenvolvido novos métodos potencialmente eficazes, mas ainda não testados, para alcançar os resultados desejáveis da política pública.

BOX 9Comparação das diferentes opções políticas e teste de pequenas variações em uma política

Um EAC não é necessariamente um teste entre fazer algo e não fazer nada. Muitas inter-venções podem ser melhor que nada. Em vez disso, os experimentos podem ser usados para estabelecer quais opções entre algumas intervenções são as melhores.

Em alguns casos, pode-se ter interesse em responder a grandes perguntas sobre qual políti-ca é a mais apropriada. Por exemplo, suponha-se que houvesse os recursos para aprimorar os laboratórios de informática de todas as escolas secundárias, ou contratar mais professo-res, mas não ambos. Seria possível realizar uma experiência de três alternativas (figura 3), com um grupo de controle (algumas escolas continuando com os computadores atuais e o mesmo número de professores) e dois grupos de intervenção (escolas que receberam uma melhoria do laboratório ou mais professores). Isto nos possibilitaria determinar tanto se a nova política foi eficaz quanto se ofereceu a melhor aplicação dos recursos.

As oportunidades para a sintonia fina de políticas geralmente surgem quando se está prestes a introduzir mudanças – é uma hora ideal para testar variações menores para assegurar que as mudanças que finalmente introduziremos terão o melhor efeito.

4. Disponível em: <http://www.campbellcollaboration.org/library.php>.

(Continua)

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29Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

FIGURA 3O projeto de um EAC testa se a melhoria nos laboratórios de informática das escolas (intervenção 1) ou o emprego de mais professores (intervenção 2) melhora o desempenho acadêmico

Elaboração dos autores.

Passo 2: definir o resultado que a política pretende influenciar e como será mensurado no experimento

Em qualquer experimento, é essencial que se defina de antemão exatamente quais resultados se buscam e como mensurá-los. Por exemplo, no contexto de política educacional, a mensuração de resultado pode se basear em resultados de exames padronizados. Para políticas relacionadas à eficiência de energia doméstica, a mensuração de resultado pode ser o consumo de energia residencial.

É importante ser claro sobre como e quando os resultados serão mensurados ainda no estágio de desenho do experimento, além de manter estes critérios predeter-minados no estágio de análise. É também importante assegurar que a forma como os resultados serão mensurados para todos os grupos seja exatamente a mesma – tanto em termos do processo de mensuração como nos padrões seguidos.

A predefinição das medidas de resultado não tem apenas sentido prático. Existem também bons motivos científicos que a tornam crucial para o sucesso

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 201330

de um EAC. Com o transcorrer do tempo, sempre haverá flutuações aleatórias em dados coletados rotineiramente. Ao final do experimento, há muitos dados sobre várias coisas diferentes, e, quando há tantos dados, é inevitável que alguns números melhorem – ou piorem – simplesmente pela variação aleatória no transcorrer do tempo.

Sempre que essa variação aleatória ocorrer, pode ser tentador pegar alguns números que melhoraram, simplesmente ao acaso, e considerá-los como evidên-cia de sucesso. Entretanto, fazer isto viola os pressupostos dos testes estatísticos, porque aumenta as chances de encontrar um resultado positivo. A tentação de sobreinterpretar os dados e atribuir significado à variação aleatória é evitada ao predeterminar a medida de resultados. Os testes estatísticos podem ser, então, usados para analisar quanto da variação é simplesmente devido ao acaso.

BOX 10Tirando vantagem das oportunidades naturais para EACs

Por vezes, os limites na aplicação da política proporcionam o contexto ideal para um expe-rimento. Por exemplo, as restrições financeiras e/ou os aspectos práticos podem fazer com que uma implantação escalonada seja a opção preferida. Se houver facilidade de monitorar os resultados em todas as áreas que receberão a intervenção, e for possível aleatorizar qual será a primeira a recebê-la, uma implantação escalonada pode ser explorada para realizar um desenho de pesquisa escalonado.

Por exemplo, o serviço de liberdade condicional na área de Durham queria testar uma nova abordagem. As restrições de recursos impediram todos os seis centros de condicional de receber a nova orientação e treinamento ao mesmo tempo. A abordagem mais apropriada, e cientificamente a mais robusta, foi atribuir aleatoriamente aos seis centros uma posição em uma lista de espera. Todos os centros, finalmente, receberam o treinamento, mas como, em vez da conveniência administrativa, a alocação aleatória determinou quando cada centro recebeu o treinamento, pôde ser realizada uma avaliação robusta dos efeitos do novo serviço na taxa de reincidência.1

Elaboração dos autores.Nota: 1 Resultados finais ainda serão publicados. Para detalhes do desenho do estudo, ver Pearson et al. (2010).

Quando da decisão da medida de resultado, é também importante identifi-car um resultado que realmente seja esperado, ou o mais próximo que se consegue chegar, em vez de uma mensuração de processos intermediários. Por exemplo, em um experimento para verificar se oficiais dos serviços de liberdade condicional trabalhando em conjunto no atendimento para alcoólatras poderiam reduzir a reincidência, é possível mensurar itens como: encaminhamento para serviço de atendimento a alcoólatras, participações nos serviços de atendimento a alcoóla-tras, ingestão de álcool, ou reincidência.

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31Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Nesse caso, a reincidência é o resultado que consiste no centro da preocupação, mas os dados podem ser mais difíceis de serem coletados, e qualquer benefício pode levar anos para se tornar aparente. Por este motivo, pode-se considerar a mensuração da participação em serviços de atendimento a alcoólatras como uma proxy para o resultado de interesse. Alternativamente, pode-se mensurar ambos: a participação no serviço, como resultado provisório; e, então, resultados de acompanhamento de longo prazo para comportamento reincidente 24 meses após. O número de encami-nhamentos para o serviço de atendimento a alcoólatras pode ser a coisa mais fácil de mensurar, mas, apesar de imediato, não seria muito informativo se a reincidência for o que realmente importa (box 11).

A questão de qual medida de resultado usar geralmente se beneficia dos debates entre os acadêmicos (que sabem, tecnicamente, o que pode funcionar melhor em um experimento) e os formuladores de políticas (que sabem que tipos de dados estão disponíveis, e quanto pode custar para coletar).

BOX 11A favor (e contra) o uso de proxies

Uma proxy é aquela que substitui a medida de interesse verdadeira – por exemplo, os índices de recondenação são usados como substitutos para índices de reincidência –, porque são bem mais fáceis de mensurar (já que as pessoas podem nunca ser pegas pelos crimes que cometerem). O argumento para usar uma proxy é mais robusto quando houver boa evidência de que se trata de um forte indicador do resultado final de interesse. Infelizmente, usar as medidas autoinformadas de mudança comportamental, apesar de serem fáceis de ser men-suradas, pode ser um índice pobre da mudança real do comportamento. Devido ao viés de “desejabilidade social”, as pessoas podem ser motivadas a informar exageradamente, por exemplo, a quantidade de exercício que fazem, após terem participado de um programa de condicionamento físico.

Se as proxies forem necessárias porque os resultados finais são de longo prazo, sempre vale a pena acompanhar estes resultados de longo prazo para verificar os resultados inter-mediários. Existem diversos casos na medicina em que as experiências iniciais utilizando variáveis proxy foram enganosas. Por exemplo, oferecer aos pacientes com osteoporose tra-tamento com fluoreto foi considerado eficaz, pois aumentava a densidade óssea. Como um dos indicadores clínicos principais da osteoporose, a densidade óssea foi considerada uma proxy. Entretanto, tem sido demonstrado que o tratamento com fluoreto, na realidade, leva a um aumento em alguns tipos de fraturas; o resultado final que pacientes osteoporóticos buscam evitar (Riggs, Hodgson e O’Fallon, 1990; Rothwell, 2005).

Elaboração dos autores.

Passo 3: decidir sobre a unidade de randomização

Após decidir que resultado será mensurado (passo 2), é o momento de decidir quem ou o que o que será randomizado. Isto é conhecido como a unidade de randomização.

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A unidade de randomização é geralmente individual; por exemplo, quando os indivíduos são escolhidos aleatoriamente para receber um ou dois tratamentos médicos, ou um ou dois programas educacionais. Entretanto, a unidade de rando-mização pode ser também um grupo de pessoas em uma instituição, especialmente se o tratamento é algo que é mais bem aplicado a um grupo. Por exemplo, escolas inteiras podem ser escolhidas aleatoriamente para receber um novo método de ensino, ou o atual; job centres5 inteiros podem ser escolhidos aleatoriamente para oferecer um novo programa de treinamento, ou o atual. Por último, a unidade de randomização pode ser toda a área geográfica: por exemplo, as autoridades locais podem ser escolhidas aleatoriamente para realizar um ou mais programas novos de saúde ou métodos diferentes de reciclagem de lixo (box 12).

BOX 12Explorando variações locais da política

As autoridades locais estão bem posicionadas para testar novas políticas na área. Ao colaborarem com outras autoridades locais para experimentar políticas diferentes ou escolher aleatoriamente diferentes ruas ou regiões para diferentes intervenções, as autoridades locais podem usar a meto-dologia de EACs para determinar quais políticas são eficazes.

Um exemplo dessa abordagem é a experiência realizada pelo governo municipal de North Trafford para comparar métodos diferentes de promover a reciclagem de lixo. A unidade randomizada nesta experiência foi ruas inteiras. Metade das ruas foram escolhidas aleatoriamente para receber uma campanha de incentivo à reciclagem de lixo. Os índices de reciclagem foram mais elevados neste grupo, comparado às quase 3 mil residências que não receberam a campanha.

O aumento a curto prazo foi de 5%, e os parceiros acadêmicos julgaram que a campanha de coleta custou em torno de £ 24,00 por cada residência adicional que começou a reciclar (Cotterill, John e Liul, 2008; John et al., 2011). Com base nestas informações, o governo local torna-se, então, capaz de determinar se a redução de custos de aterro sanitário asso-ciados à campanha de coleta justificaria os custos de oferecê-la mais amplamente.

Elaboração dos autores.

Ao final do experimento, os resultados podem ser mensurados em indi-víduos ou para toda a unidade de randomização, dependendo do que for mais prático e mais preciso. Por exemplo, embora turmas inteiras possam ser aleato-riamente escolhidas para receber diferentes métodos de ensino, os resultados da aprendizagem dos alunos podem ser avaliados quando se calculam os resultados, para maior exatidão.

A questão da escolha da unidade de randomização dependerá de conside-rações práticas. Em experiências clínicas, por exemplo, é geralmente possível dar

5. Nota dos revisores técnicos: job centres combinam os serviços de uma agência de empregos pública com os de pagamento de seguro-desemprego e outros benefícios.

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33Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

a indivíduos diferentes o placebo ou o medicamento que estiver sendo testado. Mas em experiências de política pública, nem sempre pode ser possível fazer isso. A seguir, são analisados dois exemplos de formas diferentes nas quais o Behavioural Insights Team decidiu sobre qual unidade de randomização usar.

1) Individual: ao analisar mensagens diferentes nas cartas de cobrança de impostos, é obviamente possível enviar cartas diferentes para diferentes indivíduos, e, por isso, a unidade de randomização consistia em devedores individuais.

2) Instituição: em um experimento para apoiar as pessoas a conseguirem em-prego em job centres, não é possível escolher aleatoriamente intervenções diferentes para diferentes candidatos a emprego, e, por isso, a unidade de randomização será as equipes do centro de emprego (ou seja, as equipes dos consultores que ajudam os candidatos na busca de emprego).

Como nos outros passos, seria útil discutir a unidade de randomização com um pesquisador acadêmico. Seria também importante analisar como a decisão de escolher uma determinada unidade interage com outras considerações. Mais importante, esta decisão afetará quantas pessoas precisarão se envolver na experiência: ter instituições ou áreas como sua unidade de estudo quase sempre significará que é necessária uma amostra maior de indivíduos, e também são necessários métodos especiais de análise.

Há, ainda, outras considerações que podem ser feitas; por exemplo, em uma avaliação de incentivos à frequência em cursos voltados à educação de adul-tos, os pesquisadores escolhem randomizar todas as turmas, apesar de ser possível randomizar participantes individuais. Esta decisão foi tomada para evitar que aqueles no grupo sem incentivos se ressentissem por outros alunos na turma estarem recebendo um incentivo, e eles não. Obviamente, isto poderia afetar negativamente o índice de frequência nas classes, e poderia se observar um efeito em virtude deste problema, e não devido ao incentivo.

BOX 13Quando a unidade de randomização deve ser grupos em lugar de indivíduos

Vermes como a tênia infectam quase um quarto da população mundial, a maioria em países em desenvolvimento. É uma causa comum do afastamento escolar. E os pesquisadores dos Estados Unidos colaboraram com o Ministério da Saúde daquele país para determinar se oferecer tratamento para eliminar vermes nas crianças aumentaria a frequência escolar.

(Continua)

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Vermes como a tênia infectam quase um quarto da população mundial, a maioria em países em desenvolvimento. É uma causa comum do afastamento escolar. E os pes-quisadores dos Estados Unidos colaboraram com o Ministério da Saúde daquele país para determinar se oferecer tratamento para eliminar vermes nas crianças aumentaria a frequência escolar.

Foi realizado um EAC no qual todas as escolas receberam tratamento maciço de eliminação de vermes ou continuaram como estavam. Neste caso, a randomização individual teria sido inapropriada – se alguns alunos tivessem os vermes eliminados e outros não, a probabilidade de que os participantes do controle fossem contaminados pode ter sido artificialmente reduzida pelo fato de seus colegas estarem sem vermes.

Setenta e cinco escolas primárias na área rural do Quênia participaram do estudo, que demonstrou que o programa de eliminação de vermes reduziu o número de faltas em um quarto (Miguel e Kremer, 2004). Os aumentos na frequência escolar foram particularmente marcantes nas crianças mais jovens. Este estudo demonstrou que um ano adicional de frequ-ência escolar poderia ser alcançado graças à eliminação de vermes a um custo de US$3,50 por aluno, representando um método altamente eficaz em termos de custo para aumentar a frequência escolar, enquanto outros programas, como uniformes escolares gratuitos, custam mais de US$100,00 por aluno para gerar efeitos similares (Karlan e Appel, 2011).

Elaboração dos autores.

Além disso, é crucial que os indivíduos sejam recrutados para o estudo antes de ser feita a randomização, ou o experimento deixa de ser robusto.

Por exemplo, se as pessoas que realizam uma experiência souberem a qual grupo um possível participante seria alocado, antes deste participante ser recru-tado para o estudo, isto pode afetar a decisão de recrutá-los. Um pesquisador ou membro do pessoal de campo que acreditar veementemente no novo tratamento pode escolher – talvez inconscientemente –não recrutar participantes que ele acre-dita serem “sem esperança” no novo grupo de intervenção. Isto significaria que os participantes em cada grupo “aleatório” não são mais representativos. Este tipo de problema pode ser evitado garantindo-se, simplesmente, que os participantes sejam recrutados primeiramente para a experiência, e só então randomizados.

Passo 4: determinar quantas unidades são necessárias para obter resultados robustos

Para se tirar conclusões de um EAC, a experiência deve ser realizada com um tamanho de amostra suficiente. Se o tamanho da amostra for suficientemente grande, é improvável que o efeito do tratamento tenha sido resultado do acaso.

Caso se decida que a unidade de randomização será instituições ou áreas, é muito provável que se precise de um número maior de pessoas no experimento que na opção de se randomizar por indivíduo. Simples cálculos de potência estatística preliminares ajudarão a determinar quantas unidades (indivíduos, instituições etc.)

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devem ser incluídas no tratamento e nos grupos de controle. Recomendamos tra-balhar com acadêmicos que tenham experiência em EACs para garantir que este cálculo técnico seja feito corretamente.

Se a política produzir um grande benefício (um grande “efeito substantivo”), será possível detectar isto usando um experimento com tamanho de amostra rela-tivamente pequeno. Detectar diferenças mais sutis (efeitos substantivos pequenos) entre as intervenções exigirá números maiores de participantes; por isto, é importante, desde o início, não ser demasiado otimista sobre o provável sucesso do tratamento. Muitas intervenções – se não a maioria – têm efeitos relativamente pequenos.

Como exemplo de quantos participantes são necessários para uma experiência, suponha-se a alocação aleatória de oitocentas pessoas em dois grupos de quatrocentas pessoas em cada um, isto corresponde a cerca de oito entre dez chances de ver uma diferença de 10%, caso esta diferença existisse.

Por exemplo, imagine-se que o governo quer incentivar as pessoas a votar e quer testar a eficácia de enviar mensagens de texto para eleitores cadastrados, para lembrá-los na manhã de uma eleição. Eles escolhem oitocentos eleitores para observar: quatrocentos no grupo de controle, que não receberão nenhum lembrete extra, e quatrocentos no grupo de tratamento, que receberão mensagens de texto.

Se o comparecimento for de 50% no grupo de controle, com uma amostra desse tamanho, haveria uma chance de 80% de ver uma mudança de 50% a 60% (uma mudança de 10 pontos percentuais). Para detectar uma diferença menor, seria preciso dispor de tamanhos maiores de amostra.

Deve-se considerar quanto custa recrutar cada pessoa adicional e o impacto (tamanho do efeito e economia potencial de custo) do tratamento que está sendo mensurado. Por vezes, detectar mesmo uma diferença modesta é muito útil, particu-larmente se o próprio tratamento custar pouco ou nada. Por exemplo, ao mudar o estilo ou conteúdo de uma carta para incentivar o pagamento imediato de impostos, o custo adicional é muito pequeno, uma vez que os custos com postagem são os mesmos e já se está automaticamente coletando os dados do resultado (neste caso, as datas de pagamento). Em contrapartida, oferecer uma orientação individualizada para pessoas que estão recebendo seguro-desemprego com o objetivo de aumentar a proporção daquelas que conseguem um trabalho em tempo integral é relativamente dispendioso, e, além disto, espera-se um efeito imensamente maior para valer a pena realizar uma experiência. Entretanto, mesmo para intervenções dispendiosas, se os impactos hipotéticos são pequenos em termos de tamanho do efeito, mas potencial-mente grandes em termos de economia (por exemplo, reduções no número de pessoas requerendo benefícios), pode haver um motivo robusto para realizar um EAC.

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Passo 5: atribuir cada unidade a uma das intervenções políticas, usando um método robusto de randomização

A alocação aleatória das unidades de tratamento e controle é o passo-chave que torna o EAC superior a outros tipos de avaliação de política: oferece maior con-fiança de que o grupo de intervenção política seja equivalente, com respeito a todos os fatores-chave. No contexto de política educacional, por exemplo, isto pode incluir situação socioeconômica, gênero e experiência.

O viés pode surgir sob diversas formas durante o processo de randomização; assim, para evitar problemas posteriores, é importante certificar-se de que este passo seja feito corretamente desde o início.

Existem evidências de que as pessoas que possuem interesse em um estudo possam procurar alocar as pessoas de forma não aleatória, até inconscientemente. Por exemplo, suponha-se um experimento que esteja alocando pessoas a um trata-mento “de volta ao trabalho” com base nos seus números de seguridade nacional, e números ímpares forem obter o novo tratamento. Devido ao desejo de fazer o novo tratamento parecer bom, pode acontecer de a pessoa que recrutar o participante, consciente ou inconscientemente, excluir do experimento certas pessoas com um número ímpar, caso suspeite que estas não se sairão bem.

Isso introduziria um viés no experimento, e, assim, o método de randomização deve ser resistente a esta interferência. Existem muitas organizações independentes, como unidades clínicas de experimentos, que podem ajudar a estabelecer um método seguro de randomização para evitar este problema de “ocultação de alocação fraca”. Normalmente, isto envolverá um gerador de número aleatório, que determina em que grupo um participante será alocado, e somente após ter sido recrutado para a experiência (pelos motivos descritos).

Por ocasião da randomização, caso se julgue importante, os passos podem ser realizados para assegurar que os grupos sejam igualmente equilibrados com relação a diferentes características – por exemplo, para se certificar de que exista praticamente a mesma distribuição de idade e sexo em cada grupo. Isto é particularmente impor-tante em experimentos de pequena escala, já que eles têm menos poder estatístico.

BOX 14Elaborando variações para possibilitar os testes

Os testes envolvem a comparação do efeito de um tratamento (por exemplo, possível nova política) diante de outro (política atual). Um teste sólido, obviamente, exige que variações na política (novas e atuais) possam ser simultaneamente executadas. Em alguns casos, isto é bem simples – algumas escolas podem continuar servindo as atuais merendas escolares, enquanto outras aderem aos novos padrões nutricionais, e o efeito sobre o comportamento das turmas pode ser mensurado. Em outros casos, os sistemas instalados podem tornar difícil oferecer diferentes variações das políticas ao mesmo tempo.

(Continua)

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37Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Por exemplo, embora uma autoridade local possa querer testar a eficácia de simplificar um formulário, seus sistemas de impressão podem ser terceirizados e/ou incapazes de imprimir mais de um modelo. Por este motivo, sugere-se fortemente que, quando desenvolverem sistemas ou procurarem novos contratos de provedores de serviço, os formuladores de política se assegurem de que serão capazes de produzir variações de políticas no futuro. Embora isto possa chegar a um custo inicial desprezível, a capacidade de testar diferentes versões de políticas no futuro provavelmente é mais que justificada. Com isto em mente, a legislação de DWP permite que os sistemas de informática que controlam o Universal Credit (Christensen, 2003) incluam o recurso de fornecer variações, para garantir que o departamento seja capaz de testes para descobrir o que funciona e adaptar seus serviços para refletir isto.

Elaboração dos autores.

Passo 6: introduzir as intervenções políticas nos grupos escolhidos

Uma vez que os indivíduos, as instituições ou as áreas geográficas tenham sido alocados aleatoriamente a um grupo de tratamento ou a um controle, então, é o momento de introduzir o tratamento.

Isso pode envolver, por exemplo, a introdução de novo tipo de política de educação em um grupo de escolas, e não fazer as mudanças em outro lugar. Quando o Behavioural Insights Team testou se as mensagens de texto poderiam melhorar a propensão das pessoas de pagar suas multas de tribunal, por exemplo, os indivíduos nos grupos de intervenção receberam um dos diversos tipos diferentes de mensa-gem de texto, enquanto os do grupo de controle não receberam texto nenhum.

Uma consideração importante nesse estágio é ter um sistema implantado para monitorar o tratamento, para assegurar que esteja sendo introduzido na forma na qual foi originalmente planejado. No exemplo da mensagem de texto, por exemplo, assegurou-se que os textos corretos estavam indo para as pessoas certas. O uso de uma avaliação de processo para monitorar que o tratamento seja introduzido conforme pretendido garantirá que os resultados sejam o mais significativos possível e os con-tratempos, corrigidos.

Como nos outros passos, entretanto, é importante garantir que o experi-mento reproduza a política que será introduzida quando e se esta for ampliada. Por exemplo, na experiência da mensagem de texto, ocorreu que nem sempre se tem os números corretos do telefone celular de todos nos grupos.

Seria tentador gastar tempo e dinheiro adicionais para verificar e procurar esses números faltantes de telefone, mas não teria refletido como o tratamento seria aplicado caso o experimento fosse ampliado, e teria, por conseguinte, feito os resultados parecerem mais bem-sucedidos que seriam na “vida real”.

(Continuação)

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3.3 Aprender

Passo 7: mensurar os resultados e determinar o impacto das intervenções políticas

Uma vez que o tratamento tenha sido introduzido, é preciso mensurar os resultados. O momento e o método de avaliação do resultado devem ter sido decididos antes da randomização. Dependerá de com que rapidez se supõe que o tratamento funcionará, o que varia de acordo com cada tratamento.

Uma experiência de cartas diferentes para pessoas incentivando-as a pagar suas multas pode precisar apenas de acompanhamento de algumas semanas, en-quanto a intervenção no currículo pode necessitar de um período escolar ou até mesmo diversos anos.

Além do resultado principal, pode ser útil coletar indicadores de processo. Por exemplo, em um estudo de diferentes serviços de condicional, pode-se coletar dados sobre encaminhamentos para diferentes agências, para ajudar a explicar os re-sultados. Neste caso, uma redução na reincidência pode ser acompanhada por um aumento correspondente nos encaminhamentos para aulas de controle da agressivi-dade, que podem explicar os resultados. Estes resultados secundários não podem ser interpretados com a mesma certeza que os resultados principais da experiência, mas podem ser usados para desenvolver novas hipóteses para outras experiências (box 15).

Além disso, muitas experiências também envolvem a coleta de dados qua-litativos para ajudar a explicar os resultados, apoiar a implementação futura e atuar como guia para outra pesquisa ou melhorar o tratamento. Isto não é ne-cessário, mas se a pesquisa qualitativa for de qualquer forma planejada, é ideal fazê-lo com os mesmos participantes dessas experiências, uma vez haverá mais informações disponíveis.

BOX 15Uso mais inteligente dos dados

Normalmente, há interesse em verificar se uma política é amplamente eficaz para uma amostra representativa na população em geral. Em alguns casos, entretanto, o objetivo pode ser des-cobrir se alguns grupos (por exemplo, homens e mulheres, jovens e idosos) reagem de forma diferente de outros. É importante, no início, decidir se há interesse em segmentar a amostra desta forma – fazendo-se isto após os dados terem sido coletados, corre-se um alto risco de que a análise do subgrupo careça de poder estatístico ou validade. Entretanto, caso uma ten-dência de subgrupo surja inesperadamente (como parecer que os homens reagem mais que as mulheres a lembretes por mensagens de texto para participarem de consultas médicas), pode-se considerar a realização de uma experiência no futuro para descobrir se este é um resultado robusto. Geralmente, vale a pena coletar dados adicionais (por exemplo, idade e gênero), que ajudarão a segmentar a amostra e guiar a pesquisa futura.

(Continua)

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39Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

Por vezes, uma tendência antecipada pode surgir dos dados do experimento. Por exemplo, pode acontecer de notarem-se grandes flutuações no tempo na eficácia de um incentivo para melhorar o isolamento térmico das residências, e descobrir que isto está relacionado a variações de temperatura. Esta tendência pode indicar que as pessoas sejam mais receptivas a mensagens sobre isolamento residencial quando o tempo estiver frio. Como se trata de uma análise não pla-nejada, os resultados não podem ser considerados definitivos; entretanto, nenhuma informação deve ser desperdiçada, e este resultado pode ser valioso para a pesquisa futura.

Elaboração dos autores.

3.4 Adaptar

Passo 8: adaptar sua política para refletir suas descobertas

Implementar resultados positivos das intervenções é geralmente mais fácil que convencer as pessoas a suspender políticas que demonstraram ser ineficazes. Qualquer experiência realizada, concluída e analisada deve ser considerada bem-sucedida. Um EAC que não demonstre nenhum efeito ou mesmo de-monstre um efeito prejudicial da nova política é tão valioso como um que demonstre um benefício.

A experiência do DWP de apoiar as pessoas que estavam recebendo auxílio- doença foi um estudo “nulo”, já que não demonstrou eficácia (box 1). Entretanto, ao considerá-lo um teste apropriado para saber se o tratamento funciona (o que deve ser estabelecido antes da experiência começar), e entendendo-se que o tamanho da amostra foi suficientemente grande para detectar qualquer benefício de interesse (isto, novamente, deve ser estabelecido antes do início), informações úteis certamente são obtidas com este experimento.

Quando as intervenções forem ineficazes, então, o “desinvestimento racional” deve ser considerado e os recursos economizados podem ser gastos de outra forma, em intervenções eficazes. Ademais, esses resultados também funcionam como catalisadores para descobrir outras intervenções eficazes; por exemplo, outras intervenções para ajudar as pessoas com auxílio-doença.

Quando um EAC for concluído, é aconselhável publicar os resultados, com informações completas sobre os métodos do experimento, de forma que os outros possam avaliar se foi um “teste apropriado” do tratamento. É também importante in-cluir uma descrição completa do tratamento e dos participantes, de forma que outros possam implementar o programa com confiança em outras áreas, se assim desejarem.

Um documento útil que pode orientar a redação do relatório do EAC é o CONSORT Statement,6 que é usado em experiências médicas e também, de forma

6. Disponível no site do Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT), em: <http://www.consort-statement.org/ consort-statement>.

(Continuação)

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crescente, em experiências não médicas. Seguir a orientação do Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) assegurará que as partes-chave da experiência e as intervenções sejam descritas de forma suficientemente precisa, para permitir a reprodução do experimento ou a implementação do tratamento em outra área.

De forma ideal, o protocolo da experiência deve ser publicado antes de a experiência começar, para que as pessoas possam apresentar críticas ou aperfeiçoa-mentos. A publicação do protocolo também torna claro que o resultado principal informado foi o escolhido antes de a experiência começar.

Passo 9: retornar ao passo 1 para melhorar continuamente seu entendimento do que funciona

Em vez de ver o EAC como uma ferramenta para avaliar um único programa em um determinado ponto no tempo, é útil pensar nele como parte de um processo contínuo de inovação e aperfeiçoamento. A replicação dos resultados de um experimento é particularmente importante se o tratamento for ofere-cido a um segmento da população diferente daquele que estava envolvido no EAC original. É também útil se basear nos experimentos anteriores para iden-tificar novas formas de melhorar os resultados pertinentes, quando os EACs forem usados para identificar que aspectos de uma política têm maior impacto. Em trabalho recente com HMRC, por exemplo, o Behavioural Insights Team procurou entender que mensagens são mais eficazes para ajudar as pessoas a cumprir suas obrigações tributárias.

Diversas lições foram aprendidas sobre o que funciona melhor – por exemplo, formulários e cartas o mais simples possível e informar os devedores que a maioria dos outros em sua vizinhança já pagou seus impostos.

Entretanto, em vez de contar com essas lições e assumir que a perfeição foi alcançada, é mais útil pensar no potencial para maior aperfeiçoamento. Por exemplo, existem outras formas de simplificar os formulários e tornar mais fácil para os contri-buintes pagarem seus compromissos, ou existem outras mensagens mais eficazes com tipos diferentes de contribuintes?

O mesmo tipo de pensamento pode ser aplicado a todas as áreas políticas – desde melhorar o resultado de testes padronizados até ajudar as pessoas a encon-trarem (e se manterem nos) empregos.

Melhoria contínua, nesse sentido, é o aspecto final, e talvez o mais importante, da metodologia “testar, aprender e adaptar”, porque supõe que nunca se sabe tanto quanto seria possível na área das políticas públicas.

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41Testar, Aprender, Adaptar: desenvolver as políticas públicas mediante experimentos aleatórios controlados

BOX 16Reduzir a mortalidade de pacientes em asilos

As vacinas contra gripe são rotineiramente oferecidas a grupos de risco, inclusive os idosos, quando o inverno se aproxima. Nos asilos, entretanto, o vírus da gripe pode ser introduzido através dos funcionários. Em 2003, foi realizado um EAC para determinar se o custo de levar equipes para vacinar os funcionários: i) aumentaria os índices de vacinação destes; e ii) teria efeitos positivos na saúde dos idosos. Mais de quarenta asilos foram alocados aleatoriamente tanto para continuarem da forma usual (sem uma iniciativa de vacinação dos funcionários), como para implantar uma campanha para conscientizar os funcionários sobre as vacinas para gripe e oferecer consultas para inoculação. Após duas temporadas de gripe, a vacinação de funcionários foi significativamente maior em asilos que instituíram a campanha para vacinação de gripe, talvez sem surpresa. O mais importante é que a mortali-dade dos residentes resultou também mais baixa, com cinco mortes a menos para cada cem residentes (Hayward et al., 2006). Esta pesquisa contribuiu para uma recomendação nacional de vacinar os funcionários de asilos e é citada, internacionalmente, como parte da justificativa de recomendações contínuas para vacinar funcionários na área de assistência à saúde.

Elaboração dos autores.

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RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS COMO INSTRUMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO: A FUNÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICAAnita Kon*

Este artigo coloca em discussão a questão da responsabilidade social das empresas e aponta para a utilização das ações que tenham esse objetivo como instrumento de políticas públicas para o desenvolvimento socioeconômico sustentável. O tema da responsabilidade social das empresas vem ganhando mundialmente atenção nas discussões acadêmicas, governamentais e nas empresas, particularmente no âmbito dos reflexos sobre o desenvolvimento econômico e no atual contexto de crise financeira mundial. O texto apresenta inicialmente conceitos teóricos sobre a inclusão da responsabilidade social na cultura organizacional das empresas, o desenvolvimento econômico sustentável e a dinâmica das empresas privadas no caminho do desenvolvimento. A partir de pesquisas de instituições especializadas, investiga a prática da responsabilidade social das empresas no Brasil. Os resultados da análise indicam que as ações das empresas que envolvem a responsabilidade social ainda não se encontram fortemente disseminadas no país, e é necessária a priorização de políticas públicas que tenham como função utilizá-las como instrumento para o desenvolvimento socioeconômico sustentável.

Palavras-chave: responsabilidade social; empresas privadas; desenvolvimento; sustentabilidade; políticas públicas.

CORPORATE SOCIAL RESPONSIBILITY AS A TOOL FOR DEVELOPMENT: THE ROLE OF PUBLIC POLICY

This article calls into question the issue of corporate social responsibility and the use of these actions as an instrument of public policy aiming social and economic sustainable development, mainly in the current context of global financial crisis. First, it presents theoretical concepts on the inclusion of social responsibility in corporate organizational culture, on Sustainable Economic Development and the dynamics of private companies in the way of economic development. From specialized institution researches, it investigates the practice of corporate social responsibility in Brazil. The results of the analysis indicate that these companies actions are not yet strongly disseminated in the country and it is necessary to prioritize public policies with the function to use them as a tool for socio-economic development.

Keywords: social responsibility; firms; development; sustainability; public policies.

RESPONSABILIDAD SOCIAL CORPORATIVA COMO HERRAMIENTA PARA EL DESARROLLO: EL PAPEL DE LAS POLÍTICAS PÚBLICAS

En este artículo se pone en duda la cuestión de la responsabilidad social corporativa y el uso de estas acciones como un instrumento de política pública para el desarrollo sostenible. El tema de la responsabilidad social corporativa ha ganado la atención mundial en las discusiones

* Professora e pesquisadora do Departamento de Economia e do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PEPGEP/PUC-SP).

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académicas, gubernamentales y empresariales, particularmente en el contexto de las reflexiones sobre el desarrollo económico y el contexto actual de crisis financiera global. El texto comienza presentando los conceptos teóricos sobre la inclusión de la responsabilidad social corporativa en la cultura organizacional sobre el Desarrollo Económico Sostenible y la dinámica de las empresas privadas en el camino del desarrollo. De instituciones de investigación especializadas, investiga la práctica de la responsabilidad social corporativa en Brasil. Los resultados del análisis indican que estas acciones de las empresas aún no están muy difundidas en el país y la necesidad de priorizar las políticas públicas que tienen la función de utilizarlos como una herramienta para el desarrollo socio-económico.

Palabras clave: responsabilidad social; empresas privadas; desarrollo; sostenibilidad; políticas públicas.

RESPONSABILITÉ SOCIALE D’ENTREPRISES COMME UN OUTIL POUR LE DÉVELOPPEMENT: LE RÔLE DES POLITIQUES PUBLIQUES

Cet article remet en cause la question de la responsabilité sociale des entreprises et la utilisation de ces mesures comme un instrument de politique publique pour le développement économique. La question de la responsabilité sociale des entreprises a attiré l’attention dans le monde entier dans les discussions académiques, gouvernementaux et commerciaux, en particulier dans le cadre des réflexions sur le développement économique et le contexte actuel de crise financière mondiale. Le texte commence par présenter les concepts théoriques sur l’inclusion de la responsabilité sociale dans la culture organisationnelle des entreprises sur le développement économique durable et la dynamique des entreprises privées dans la voie du développement. Des institutions de recherche spécialisées, enquête sur la pratique de la responsabilité sociale des entreprises au Brésil. Les résultats de l’analyse indiquent que ces actions des entreprises ne sont pas encore fortement disséminés dans le pays et la nécessité de hiérarchiser les politiques publiques qui ont la fonction de les utiliser comme un outil de développement socio-économique.

Mots-clés: responsabilité sociale; entreprises privées; développement; planification; politiques publiques.

JEL: H11, L, L38, L53, M14, O2.

1 INTRODUÇÃO

O tema da responsabilidade social das empresas vem ganhando mundialmente atenção nas discussões acadêmicas e governamentais e nas empresas, particular-mente no âmbito dos reflexos sobre o desenvolvimento econômico. Além da sub-missão à ação da regulação ambiental, adicionalmente, as empresas vêm tomando consciência em relação à proteção ambiental, tendo em vista a responsabilidade moral e social de economizar e preservar recursos naturais, e a continuidade de utilização de insumos que estão se tornando menos abundantes e em processo de desgaste devido ao consumo descuidado, que assume forma predadora.

Paralelamente às questões que baseiam a tomada de decisão empresarial para a consecução da maximização do lucro ou da renda, surge a perspecti-va alternativa da escolha entre o sacrifício de parte dos lucros em favor do

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interesse social, dado que, na realidade, a responsabilidade social, para a em-presa, tem origem na necessidade de preservar a disponibilidade de insumos produtivos e a manutenção da demanda. A tomada de decisão na firma, por-tanto, extrapola suas responsabilidades fiduciárias com seus acionistas e toma a forma de responsabilidade pelos recursos sociais, ainda que assumindo maiores custos de transação. A introdução desta nova cultura organizacional requer o desenvol-vimento paralelo de novas formas de gestão compatíveis com a efetivação destes objetivos pela empresa, de modo a institucionalizar posturas e instrumentos de gestão, com relação aos seus stakeholders envolvidos, representados tanto por seu público interno quanto por fornecedores, comunidade, consumidores, meio ambiente, governo e sociedade. 

A adoção de uma cultura organizacional de responsabilidade social das empresas extrapola o simples compromisso com a regulamentação ambiental e adquire papel prioritário na elaboração de novas formas de consecução do de-senvolvimento socioeconômico sustentável. A integração entre as ações estraté-gicas de responsabilidade social das empresas e os requisitos de sustentabilidade socioeconômica acaba por se constituir em um instrumento de consecução do desenvolvimento socioeconômico sustentável.

No entanto, a ação social das empresas envolvidas na responsabilidade social, embora crescente, ainda é tímida no Brasil e, muitas vezes, tem se vol-tado para a elaboração de um marketing organizacional, que emprega assisten-cialismo de curto prazo, projetos de ajuda filantrópica e a política de doações; ou seja, ações não revestidas de objetivos outros que diminuir, a curto prazo e apenas momentaneamente, dificuldades sociais enfrentadas pela comunidade. Neste sentido, o marketing ambiental, ecológico ou verde das empresas é apenas uma modalidade que enfoca as necessidades de contribuição dos consumidores conscientes com a criação de uma sociedade sustentável (Rolson e Benedetto, 1994). Este pode ser concebido no mundo organizacional como um instru-mento estratégico; contudo, carece de um desenvolvimento cultural de comu-nicação que integre os conteúdos técnicos envolvidos com o meio ambiente e a qualidade de vida, no sentido de se formatar uma política ambiental empre-sarial, que auxilie na otimização do sistema de gestão ambiental (Kotler, 2004; Ribas e Smith, 2009).

É nesse contexto que as políticas públicas nacionais encontram um es-paço para ação efetiva de implementação do planejamento que tem por obje-to o desenvolvimento socioeconômico, por meio de medidas específicas que adotam instrumentos de indução, que visem estimular e propiciar condições de efetivação da inclusão da responsabilidade social na cultura organizacional das empresas.

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Dessa forma, este artigo visa contribuir com um conjunto de ferramentas con-ceituais e aspectos factuais que possam auxiliar na conscientização das vantagens de formulação e implementação mais eficaz de estratégias públicas direcionadas ao apoio da responsabilidade social das empresas no contexto brasileiro. Com a conscientização dos impactos positivos das ações que dividem com o governo e com a sociedade a responsabilidade de elaboração de instrumentos de apoio social para a diminuição das insistentes desigualdades sociais, a adoção de estratégias de responsabilidade social passa a ser vista pelas empresas como parte integrante de sua cultura organizacional atualizada, e não mais como mero discurso de marketing (Kotler, 2004; Ribas e Smith, 2009).

Primeiramente, são analisados os conceitos, as características e os reflexos da inclusão da responsabilidade social das empresas no contexto da cultura organi-zacional, como requisito que se torna crescentemente essencial para os processos de desenvolvimento sustentável e, como tal, influencia aspectos da tomada de decisão das empresas, suscitando debates sobre a necessidade de avanços teóricos complementares à visão atual sobre o comportamento da firma. O texto visa verificar como, através da integração entre os objetivos de responsabilidade social das empresas e desenvolvimento sustentável – que correspondem às premissas da nova ética econômica internacional –, se concretiza a possibilidade de inclusão de países menos desenvolvidos no contexto de concorrência mundial.

Nas seções seguintes, são examinadas as conceituações teóricas sobre o de-senvolvimento econômico sustentável e a dinâmica das empresas no caminho do desenvolvimento no contexto mundial. Finalmente, através do perfil das empre-sas que investem na gestão de responsabilidade social no Brasil, é visualizado o potencial de ampliação destas ações, por meio de políticas públicas, visando ao desenvolvimento sustentável.

Deve ser observado que o tema da sustentabilidade é discutido de forma multidisciplinar e, desta forma, tanto as abordagens teóricas específicas a cada área de estudo, quanto as premissas teóricas básicas diferenciadas em uma mesma área são tomadas como base para os conceitos e os métodos de pesquisa e de operacionalização, na esfera acadêmica ou na empresarial e governamental (Kon e Sugahara, 2012, p. 25). Portanto, dada a multiplicidade de enfoques pos-síveis de interpretação do tema, as definições e as discussões deste artigo foram desenvolvidas a partir de abordagem específica selecionada de forma deliberada pelo autor e das bibliografias relacionadas a esta escolha. Assim, não visam abranger outras vertentes possíveis de debate, como as relações entre o Estado e as empresas; entre os trabalhadores, as empresas e as entidades sindicais; os mecanismos exis-tentes de regulação, entre outras.

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2 A INCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL NA CULTURA ORGANIZACIONAL DAS EMPRESAS

No cenário mundial contemporâneo, é observada a ocorrência de múltiplas transformações de ordem econômica, política, social e cultural, que, por sua vez, estimulam o aparecimento de novos modelos de relações entre instituições e mercados, organizações e sociedade, que apresentam impactos consideráveis nas formas de gestão das empresas. A crescente e intensa globalização socioeco-nômica que impera na atualidade significa uma interação internacional de pro-dução, mercados e hábitos sociais e culturais. Porém, implica também exclusão e ampliação do atraso relativo para as nações que não apresentam condições de se inserir de modo participativo no processo de mundialização e, muito menos, no contexto de um desenvolvimento continuado, particularmente no contexto da crise financeira mundial contemporânea.

O conceito de crescimento econômico é tradicionalmente entendido como a consecução do aumento da produção para se adequar ao aumento do cresci-mento populacional. Complementarmente, durante muito tempo, foi entendido também como a elevação do bem-estar da população dos países por meio de re-formas estruturais ligadas ao aumento da produção e do consumo global.

Nesse sentido, a correlação entre aumento do consumo e maior avanço tem sido usualmente o indicador para a avaliação do desenvolvimento. Este mode-lo de crescimento econômico gerou enormes desequilíbrios, pois, de um lado, observa-se riqueza e melhora do bem-estar em sociedades específicas em relação a padrões de períodos anteriores da história mundial. Por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a poluição aumentam dia a dia. O aumento da com-petitividade internacional das empresas e do avanço tecnológico, que culminou na transnacionalização da produção e na globalização econômica, tem conduzido a um crescente desgaste ambiental e à polêmica sobre os limites ao crescimento mundial. A partir desta constatação, surgiu a ideia do desenvolvimento susten-tável, que buscava conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação ambiental e a diminuição da pobreza e da má distribuição de recursos no mundo (Sen, 2000; Sachs, 2005).

No âmbito das atuais tendências de relacionamento entre os participantes desse contexto de desenvolvimento sustentável, verifica-se, de modo crescente, a aproximação dos interesses das organizações produtivas privadas e da sociedade, o que resulta em esforços múltiplos para o atendimento de objetivos comparti-lhados. Novos modelos de organizações emergem como reflexo da convergência entre metas econômicas e sociais, envolvendo a preocupação com a elevação do padrão de qualidade de vida de suas comunidades. As empresas, como “organi-zações cidadãs”, com esta finalidade, recebem a incumbência ética da sociedade

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de desenvolverem um processo de responsabilidade social em suas tomadas de decisão, embora a consecução desta convergência não seja um caminho rápido, ou mesmo totalmente possível.

Na atualidade, a intensificação dos debates sobre novas formas de consecu-ção do desenvolvimento sustentável vem suscitando reflexões sobre a necessidade de uma nova ética empresarial, e a disseminação da ideia de que a responsabili-dade ética dos agentes envolvidos na gestão empresarial passa a ser um elemento primordial na busca deste desenvolvimento. Nesse sentido, o engajamento ético deve ser visualizado como componente endógeno da cultura organizacional.

Como salienta Foladori (2006, p. 17), a sustentabilidade ecológica tem pa-râmetros claros, assim como a sustentabilidade econômica, pois, no regime de produção capitalista, o mercado se encarrega de expurgar as empresas que não são competitivas. Uma questão polêmica envolvendo a sustentabilidade social, no se refere à pobreza e ao incremento populacional, diz respeito à dinâmica entre o crescimento populacional e a disponibilidade de recursos. O crescimento popula-cional implica maior consumo em termos absolutos, mas, num mundo em que os recursos naturais são finitos, o ambiente degrada-se e os recursos tornam-se indis-poníveis, acarretando constante conflito. Desta forma, paralelamente à realização econômica decorrente da produção e do consumo, vem surgindo paulatinamente a reflexão sobre a necessidade da criação de novos conceitos e tendências profis-sionais para a orientação das tomadas de decisão nas empresas.

A perspectiva de responsabilidade social é muito complexa e dinâmica, uma vez que surge com significados diferenciados em virtude de óticas teóricas específicas, que conduzem a mudanças nos paradigmas de gestão empresarial. A nova visão repercute tanto na área da gestão quanto na do processo produtivo em si, salientando-se um conjunto de obrigações que conduzam as instituições à corresponsabilidade pelo combate às desigualdades socioeconômicas incrementadas pela globalização.

Essa foi a gênese da ideia de responsabilidade social empresarial, compreen-dida como:

responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades so-ciais (Ethos, 2011, p. v).

Esse entendimento é relativamente novo e ainda não foi uniformizado em ní-vel mundial. Em geral, em cada país, a ideia é reconhecer que as empresas têm um papel essencial a cumprir, juntamente com os governos e a sociedade civil, na so-

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lução da diminuição das imensas desigualdades sociais e da degradação ambiental crescente vivida neste início de milênio. Essa visão engloba a ideia da urgência na participação das empresas na promoção do desenvolvimento sustentável, em nível global, bem como a necessidade de ampliar o âmbito dos grupos que são objeto dos impactos diretos ou indiretos de suas decisões nesse sentido, incluindo os grupos que influenciam suas ações.

Na nova perspectiva, está incorporada a busca pela inclusão social mais efe-tiva, bem como o amplo e universal respeito aos direitos humanos fundamentais, como o direito à alimentação adequada, à liberdade, à educação básica, à vida com dignidade, entre outros, conforme preconizado por Sen (1999), incluindo, ainda, a eliminação de formas de discriminação de gênero, racial, étnica e cultu-ral. Além do mais, a implantação destas medidas de desenvolvimento é pleiteada na gestão da empresa, pois, além de investimentos financeiros, a responsabilidade social empresarial depende, profundamente, de decisão política de efetivação de seus objetivos (Ipea, 2006a).

Uma definição muito mais condensada e abrangente é oferecida pelo pro-fessor americano Einer Elhauge (2005), o qual defende que “responsabilidade social é sacrificar os lucros por interesse social”. O debate acadêmico sobre aspectos legais relacionados à decisão de sacrifício dos lucros em benefício do interesse pú-blico iniciou-se nos Estados Unidos, em 1932, com artigos de Dodd Junior (1932) e Berle Junior (1932), publicados na Harvard law review.

Em 1970, o debate nos Estados Unidos teve um ressurgimento e uma mu-dança de enfoque, sob as ideias do liberalismo econômico, com as críticas ao tema publicadas em um artigo de Milton Friedman, que desenvolvia a ideia de que a legitimidade dos acionistas deveria ter prioridade:

Em um sistema de livre-empresa e propriedade privada, um executivo empresarial é um empregado dos proprietários das empresas. Ele tem responsabilidade direta por seus empregados. Esta responsabilidade significa conduzir os negócios de acordo com seus desejos, que em geral serão de conseguir o maior volume de dinheiro pos-sível, conforme as regras gerais da sociedade, tanto os envolvidos com a lei quanto os envolvidos com os valores éticos (Friedman, 1970, p. 1).

Do ponto de vista jurídico, no contexto norte-americano, Fleta (1995) define essa ideia como:

Entende-se por responsabilidade social o conjunto de obrigações inerentes a evolu-ção de um estado ou condição com força ainda não reconhecidas pelo ordenamento jurídico positivo ou desconhecidas parcialmente, mas cuja força que se vincula e sua prévia tipificação procedem da íntima convicção social de que não segui-la constitui uma transgressão da norma da cultura (Fleta, 1995, p. 18).

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Os estudos na área da tomada de decisão das empresas privadas vêm incor-porando várias outras novas teorias e correntes de pensamento, em que o am-biente social e suas variáveis determinantes exercem um papel fundamental no complexo sistema socioeconômico. Alguns destes estudos defendem a ideia de que muitas possibilidades e capacidades existentes dentro das organizações são decorrentes do que se desenvolve fora delas, nos seus ambientes. Desta forma, as organizações escolheriam quais são os fatores ou elementos externos influentes e passam a ser por eles condicionados, necessitando a eles se adaptar à definição de elementos internos à firma que as permitam sobreviver e crescer. Assim sendo, as constantes transformações econômicas, políticas e culturais tornam-se determi-nantes das novas posturas empresarias (Sachs, e Vieira, 2007; Aligleri, Aligleri e Kruglianskas, 2009).

Análises consistentes sobre o papel das empresas na construção de uma so-ciedade menos desigual e na busca do desenvolvimento sustentável, muitas vezes bloqueado pela situação do país no ambiente de globalização, têm sido realizadas pelo cientista político Jeffrey Sachs (2005). O autor afirma que as grandes em-presas possuem um papel relevante na construção do desenvolvimento susten-tável, particularmente a partir de multinacionais que operam no ambiente de globalização, que considera favorável para a disseminação das medidas sociais. As novas tecnologias que permitem combater a pobreza e melhorar as condições de saúde, alimentação e cultura dos indivíduos são desenvolvidas por estas empresas, que definem seus objetivos a partir de programas de responsabilidade social, não como marketing, mas pensando nos consumidores do futuro, os quais serão, dessa forma, incluídos no mercado de bens e serviços, a partir de sua inserção no mercado de trabalho.

Sachs (2005) desenvolve também a ideia de que as empresas têm um pa-pel social transformador na atitude dos indivíduos, tornando-os consumidores mais bem informados e exigentes quanto a produtos e serviços. Assim, eles se convertem em cidadãos mais conscientes das necessidades de suas comunidades, passando, consequentemente, a reivindicar o cumprimento das responsabilidades das empresas para seu desenvolvimento. Da mesma forma, a consciência sobre a degradação ambiental e os recursos disponíveis para o aumento do bem-estar também estão incluídos entre as questões a serem disseminadas nas empresas e pelas empresas à sociedade.

Mais recentemente, no período que se seguiu à recente crise financeira inter-nacional, a visão de Sachs (2005) sobre o papel social das empresas tem sido relem-brada com constatações que vão na contramão de suas ideias, originadas, particu-larmente, no âmbito da ONU, obtidas por meio de pesquisas do United Nations Research Institute of Social Development (UNRISD), instituto dirigido por

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53Responsabilidade Social das Empresas como Instrumento para o Desenvolvimento

Peter Utting que coordena projetos sobre a responsabilidade social das empresas, a regulação internacional e o papel de atores da sociedade civil, neste período de crise. Os estudos deste grupo, desenvolvidos de 2005 a 2010, chegaram à conclusão de que muitas empresas internacionais recentemente têm dificultado e mesmo comprometido a consecução de benefícios sociais em relação ao ambiente e aos direitos humanos, levando a uma “crise intelectual” do movimento de res-ponsabilidade social das organizações. Como contrapartida a estas observações, foi elaborado pela ONU o documento Norms on transnational corporations and other business enterprises, que recomenda e apresenta formas de regulação e nor-mas para a conduta das empresas transnacionais, visando impor diretamente ou por meio de leis internacionais o cumprimento e o respeito pela responsabilidade social. O documento sugere que os governos e outras instituições que acompa-nham as atividades econômicas multinacionais supervisionem a responsabilidade das empresas privadas e públicas perante o desenvolvimento sustentável (Utting e Marques, 2010).

Nesse sentido, a noção de desenvolvimento sustentável implica, então, con-siderar e assumir novos padrões de competitividade e equidade adequados ao momento histórico, significando uma nova racionalidade pragmática de gestão, incluindo a incorporação no processo de desenvolvimento daquilo que é público, e não somente estatal (Tavares, 2005, p. 125).

Recente pesquisa de Esty e Winston junto a grandes e médias empresas norte-americanas mostrou que as que usam “lentes ambientais” mostram indica-dores de maior capacidade inovadora e empreendedora que suas competidoras. Mostram a consciência de que as demandas dos consumidores apontam para empresas preocupadas com a preservação ambiental e outros fatores sociais. Estas demandas reformatam os mercados, criam novos riscos aos negócios e geram oportunidades para que as empresas que conseguirem responder mais rápida e positivamente a estes requisitos adquiram vantagens competitivas. Estas vantagens advêm da consecução de maiores retornos, menores custos operacionais e taxas ain-da menores em empréstimos bancários. Estas firmas auferem, ainda, benefícios, ao demonstrar uma cultura empresarial mais inovativa, que salienta valores intangíveis e suscita credibilidade e confiança na marca (Esty e Winston, 2006, p. 9).

Outra pesquisa, de Reinhart, Stavins e Vietor (2008), questiona alguns aspectos específicos sobre a responsabilidade social das empresas. Primeiramente, examina se deve perdurar a visão prevalecente no meio acadêmico de que os agen-tes das empresas têm o dever fiduciário de maximizar os lucros para seus acionis-tas. Os autores concluem que, de maneira surpreendente, a base legal para esta visão não é muito forte, pois, embora os arquivos judiciais contenham exemplos deste dever de maximização dos lucros dos acionistas, deixa lugar para a ideia

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de sacrifício dos lucros das firmas devido ao interesse público, desde que a firma permaneça compromissada também com os acionistas. No entanto, como conse-quência econômica, as firmas empenhadas na responsabilidade social têm custos adicionais e terão que elevar seus preços, reduzir salários e outros custos, aceitar margens de lucros menores ou pagar menos dividendos. Adicionalmente, a curto prazo, as consequências podem incluir a perda de parcela de mercado, crescentes custos de seguros e de empréstimos, além dos conflitos internos entre os demais agentes internos à empresa.

Os autores questionam se no processo de sobrevivência econômica, descrito pelos evolucionistas como sobrevivência dos mais fortes, as firmas escolheriam participar da responsabilidade social, com tais riscos. Destacam que as firmas que se engajam nessa participação são frequentemente ativas em mercados imper-feitos ou distorcidos pela regulamentação governamental, de modo que não se encaixam nas características imperativas descritas por Friedman (1970).

Portanto, essas evidências dos ônus potencialmente incorridos pela respon-sabilidade social podem explicar as causas da evidência na atualidade de que ainda falta efetivamente maior interesse pelo engajamento social por parte das empresas, visto que a maior parte ainda detém uma visão mais tradicional e se dedica mais limitadamente a atividades que beneficiam os interesses sociais que as que contribuem para suas metas financeiras. Neste contexto, as atividades de responsabilidade social deveriam ser vistas mais como um complemento da efetiva regulação governamental que um substituto para esta (Reinhart, Stavins e Vietor, 2008, p. 29).

A proposição é de que potencializando os elementos concretos e abstratos do capital social, é possível incrementar as participações dos agentes econômicos e sociais para a resolução de obstáculos que implicam bloqueios ou retardamento da dinâmica do desenvolvimento (Miranda e Monzó, 2003). Os efeitos deste capital constituem externalidades positivas que podem ser incluídas entre as eco-nomias externas auferidas entre agentes econômicos; da mesma forma que a maior disponibilidade pode trazer vantagens a regiões e países, a carência pode ampliar as assimetrias de conhecimento, informação ou outras que acarretam disparidades de desenvolvimento. Desta forma, o capital social pode ser utilizado pelo indiví-duo ou pelo grupo, de maneira estratégica para a acumulação de novos recursos produtivos ou outros tipos de capital (físico e financeiro), seja com reflexos posi-tivos na eliminação das disparidades, seja de modo negativo, marginalizando ou excluindo os menos dotados.

A relação direta entre o aumento do capital social e as ocupações e atividades empresariais é visualizada tendo em vista a materialização da ideia abstrata concei-tuada de cooperação, reciprocidade e confiança, através de serviços de assessoria de

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várias ordens. Os serviços a serem disponibilizados não só pela esfera pública, mas também pelas empresas privadas referem-se a uma rede de instituições de pes-quisa, planejamento, informação, educação, treinamento, comercialização, entre outros exemplos, que proporcione o manejo administrativo e de recursos, con-dições ambientais favoráveis, conhecimentos sobre aspectos legais, coordenação entre etapas de trabalho entre vários agentes, favorecimento de apoio à produção, bem como distribuição e consumo de forma associativa. Os serviços de apoio ao fortalecimento do capital social incluem o apoio técnico à produção; aos vínculos entre os agentes produtores e consumidores, entre dirigentes e funcionários e a organização e planejamento das redes de assessoria.

Particularmente, pequenas e microempresas, bem como trabalhadores au-tônomos, se beneficiam dos serviços destinados ao aumento do capital social, embora as externalidades positivas resultantes sejam apropriadas também pelas médias e grandes empresas, que já dispõem de uma rede organizada de apoio. A articulação socioeconômica eficiente entre agentes internos e externos de uma sociedade também constitui um reflexo da disponibilidade do capital social.

Segundo Miranda e Monzó (2003), as experiências, realizadas em alguns países, de fortalecimento do capital social por serviços públicos e privados reve-lam que os resultados mais eficazes acontecem através da atuação no entorno local e regional especificamente, diretamente aos que usufruem da construção e da gestão da infraestrutura social, quando é assegurado que os benefícios dos progra-mas cheguem efetivamente aos destinatários. Como salientam estas autoras, que mostram particularmente um exemplo bem-sucedido verificado no Chile, para a utilização do capital social como uma ferramenta para pensar e superar a pobreza, faz-se necessária a politização no âmbito do contexto do capital social, a partir de uma abordagem em que atuam tanto os agentes fornecedores dos serviços quanto os usuários destes serviços. A funcionalidade e a instrumentalização do capital social para os programas de desenvolvimento devem passar pela articulação com os elementos políticos da sociedade, no sentido de superação de conflitos e inte-resses individuais.

Essa politização implica o esforço do direcionamento das medidas de fo-mento ao capital social para que contribuam a uma maior integração social, e não à exclusão e ao alheamento do indivíduo das correntes econômicas atuan-tes que tendem a perpetuar os vínculos frágeis de alguns agentes com institui-ções normativas. As políticas públicas, neste sentido, atuam em interface ou área de intercâmbio, entre os agentes institucionais, organizacionais ou cívicos e a comunidade. Esta interface se dá entre quatro sistemas complexos, o da admi-nistração estatal, o do mercado, o dos partidos políticos e o das comunidades populacionais. Os intercâmbios de informação, serviços e bens ocorrem tanto nos ambientes mais favorecidos quanto nos mais desfavorecidos e excluídos.

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Esta forma de visão propõe uma abordagem inovadora sobre as possíveis sinergias entre a ação pública e privada, de modo a propiciar um espaço de negociação em que cada ator desenvolva um potencial para melhor se situar na interface através de redes de apoio, capacidades de autogestão, contatos institucionais, sistemas de cooperação e práticas pessoais e partidárias.

No entanto, o que se tem observado muitas vezes, em países menos desen-volvidos, é que a atuação das políticas públicas nesta interface não tem atentado para esta necessidade de sinergia e tem gerado uma dinâmica divergente entre os atores dos sistemas empresarial, comunitário e estatal, gerando implicações nega-tivas, como falta de sinergia, tecnocracia burocrática ineficiente, impossibilidade de competitividade no mercado, clientelismo partidário e exclusão.

Discussões recentes enfatizam a relevância do capital social nas economias para a consecução do desenvolvimento econômico. Neste sentido, a materializa-ção deste capital através de serviços públicos e privados representa um determi-nante básico para as condições de competitividade na atualidade. Contudo, estas condições são um pré-requisito para o desenvolvimento, e não apenas um resul-tado ou um produto final. Assim, sua provisão adequada torna-se um elemento crucial da dinâmica do processo de desenvolvimento sustentável.

A responsabilidade social das empresas, associada à busca do desenvolvi-mento sustentável de um país, assume múltiplas facetas, de acordo com o setor produtivo, o porte da empresa e as demais características que fazem parte da diversidade tecnológica e cultural do ambiente empresarial. Envolve primeiramente a preocupação com o meio ambiente, expressa pelo conhecimento dos danos po-tenciais de produtos e serviços oferecidos, de modo concomitante com práticas de reciclagem, destinação de resíduos e renovação da natureza diante do desgaste ambiental e dos recursos. Mas pode se estender além das paredes da empresa, pela difusão da educação ambiental e pelo estímulo ao consumo consciente.

Por sua vez, o engajamento ético-social atua na relação com os trabalhadores e com a comunidade, em territórios que acolhem as empresas, na preocupação com estratégias de desenvolvimento local sustentável, por meio de investimentos destas empresas em saúde, segurança, condições de trabalho, desenvolvimento profissional e empregabilidade de seus funcionários. Estes investimentos que se atêm ao âmbito dos funcionários da empresa e não possuem a conotação de privatização de serviços públicos, mas tão somente ações de responsabilidade social internamente à empresa. Paralelamente, as iniciativas de atuação na área social pelas empresas dirigem-se, ainda, aos cuidados com a relação com os sindicatos e com o respeito ao cumprimento dos direitos, bem como a parcerias com ou-tras organizações públicas e privadas para a diminuição de desigualdades sociais. Esta preocupação, enquanto cultura organizacional, tende a se difundir por toda

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a cadeia produtiva, de fornecedores a consumidores, em países mais avançados. No entanto, no Brasil, esta cultura de responsabilidade social ainda é pouco disse-minada, pois vigora com menos intensidade que os contínuos processos do Ministério Público do Trabalho contra o descumprimento de direitos dos trabalhadores.

3 SOBRE O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO SUSTENTÁVEL

A inclusão de estratégias de responsabilidade social das empresas extrapola o sim-ples compromisso com a regulamentação ambiental e adquire papel prioritário na elaboração de novas formas de consecução do desenvolvimento socioeconômico. Salienta-se aqui a necessidade da integração entre as ações estratégicas de respon-sabilidade social das empresas e os requisitos de sustentabilidade do desenvolvi-mento socioeconômico.

Como visto anteriormente, o conceito de desenvolvimento, que durante muito tempo foi entendido como a elevação do crescimento da produção para satisfazer as necessidades humanas, sofreu mudanças gradativas à medida que foi verificado que apenas o crescimento da produção não proporcionava necessa-riamente mudanças nos padrões de bem-estar global da população dos países. Uma modificação no entendimento do conceito salientava que a obtenção do desenvolvimento consistiria na aquisição de elevação do bem-estar da população das sociedades, com reformas estruturais que permitissem a consecução do au-mento do bem-estar populacional juntamente com o aumento da produção e do consumo global. Neste sentido, a correlação entre aumento do consumo e maior avanço ainda tem sido usualmente o indicador para a avaliação do desenvolvi-mento (Kon, 2000).

A evolução do progresso técnico no decorrer do desenvolvimento socio--econômico das nações configura-se como o elemento-chave que impulsiona as economias na busca da melhoria dos padrões de subsistência das sociedades, visto que acarreta o aumento do produto gerado por trabalhador ou o aumento na re-lação produto/insumos. Neste sentido, o desenvolvimento de novas tecnologias e novas formas de gestão organizacional tem sido, durante a evolução das sociedades, um agente relevante que conduz à expansão das oportunidades de combinações de recursos materiais e humanos disponíveis. A inovação da tecnologia e da gestão, portanto, decorre da necessidade de aumento da produtividade e da eficiência no uso dos recursos, e, como consequência, são observados reflexos consideráveis no caráter e na natureza do trabalho humano.

No entanto, a partir da elevação da velocidade e da intensificação da mudança tecnológica e organizacional, o aumento da competitividade internacional das empresas, que culminou na transnacionalização da produção e na globalização econômica, conduziu muitos países à degradação ambiental crescente, com o

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esgotamento de recursos naturais utilizados implicando desperdícios não planejados, bem como a falta de cuidado com as formas de despejo ou aproveitamento de resíduos. Como já salientado, este modelo de crescimento econômico gerou enor-mes desequilíbrios, ao se observar, de um lado, riqueza e fartura no mundo, em relação a padrões de períodos anteriores bem-sucedidos da história mundial, e, por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a poluição, que aumentam diária e continuadamente.

Essas constatações levaram à polêmica sobre os limites do crescimento mundial, como preconizavam os participantes da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, em 1972, particularmente sob a liderança das ideias do Clube de Roma, criado em 1968, congregando cientistas, economistas e altos funcionários governamentais de vários países. Esta reunião teve a finalidade de interpretar o que foi denominado, sob uma pers-pectiva ecológica, de “sistema global”. O arcabouço teórico do pensamento do Clube de Roma salientava que o planeta é um sistema finito de recursos, submetido às pressões do crescimento exponencial da população e da produção econômica. Como proposta para as conclusões que apontavam o horizonte do colapso do sis-tema, organizavam-se recomendações em torno da noção de um gerenciamento global da demografia e da economia, a fim de alcançar um estado de equilíbrio dinâmico. Preconizavam medidas efetivas de controle da natalidade e mudanças radicais nos modelos produtivos, com ênfase numa economia de serviços, criando a “ecodiplomacia”, novo campo da política internacional (Meadows, Randers e Meadows, 2004). A observação das limitações ecológicas do planeta levou à consciência da necessidade da continuidade do aumento da produção e do consumo sem a destruição do ambiente, para que as gerações futuras tenham a chance de existir e viver bem, através da melhoria da qualidade de vida e das condições de sobrevivência.

Nesse contexto, o conceito de desenvolvimento sustentável foi elaborado de modo a incorporar o atendimento das necessidades do presente sem comprome-ter a possibilidade de as futuras gerações atenderem às suas próprias necessidades. Esse conceito foi definido durante a elaboração do Relatório Brundtland pela Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento (UNCED) da ONU, em 1987, e tem como base o tripé atividade econômica, meio ambiente e bem--estar da sociedade.

As ideias de Amartya Sen tiveram grande influência na elaboração de con-ceitos, cálculos e classificações da nova visão de desenvolvimento, bem como nas análises comparativas entre países. Já em 1988, Sen (1999) chamava atenção para o distanciamento que tem havido entre a economia e a ética, retratando defici-ências não apenas na teoria econômica clássica e marginalista, mas também na

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contemporânea, que acabam por desvirtuar efetivamente a noção de desenvolvi-mento na atualidade. Salienta a centralização do autointeresse na racionalidade do comportamento humano na ação econômica, mas que, no entanto, não neces-sariamente conduz de modo efetivo à melhoria das condições de bem-estar eco-nômico. O autor considera como componente do conceito de desenvolvimento a justiça distributiva, que contribui para a eficiência da ação de indivíduos e das empresas e complementa os requisitos necessários para o desenvolvimento. Este, portanto, deve resultar de interação e interdependência entre as teorias da econo-mia e da ética (Sen, 1999; 2000).

A ideia mais clara de desenvolvimento de Sen é encontrada em sua obra Desenvolvimento como liberdade (2000). Suas novas concepções sobre desenvolvi-mento levaram órgãos como o Banco Mundial a repensar suas políticas de apoio ao desenvolvimento em todo o mundo, que passaram a enfocar a atenção mais efetiva nas estatísticas sociais além das de crescimento econômico e renda. A ideia básica de que crescimento sem desenvolvimento social não se reflete em desenvol-vimento real começou a ser discutida de acordo com a afirmação de Sen de que a desigualdade não surge apenas como resultado do processo de acumulação de capital, nem tampouco está relacionada a este contexto. A concepção de desigual-dade do autor ressalta a desigualdade de oportunidades pela privação de liberdades básicas, na desigualdade do indivíduo isolado, na ausência de condições iguais básicas de acesso a saúde, educação, saneamento básico, alimentos, entre outros exemplos. Apenas a consecução dessas liberdades é capaz de dar às pessoas sua condição de “agentes” no contexto do desenvolvimento capitalista (Sen, 2000, p. 333-334).

A obra de Sen traz a preocupação com a pobreza e a desigualdade como obstáculo ao desenvolvimento, atuando em várias direções. A possibilidade dos indivíduos possuírem as liberdades enfatizadas leva-os à noção de que produzem “capacidades”, que definem comportamentos alternativos ao autointeresse na teoria econômica. A possibilidade destes comportamentos alternativos, não apenas em termos pessoais, mas também empresariais, tem um caráter produtivo, segundo o autor, pois o “sistema global” da economia teria muito a ganhar se suplemen-tasse o comportamento autointeressado com outras motivações, como se incor-porasse uma noção de bem-estar mais abrangente que o consumo pessoal, o que significa um comportamento não estritamente orientado por objetivos guiados pelas regras convencionais vigentes. O comportamento autointeressado restritivo estaria afetando não apenas a relevância da teoria econômica positiva, como tam-bém a de seu afluente normativo, a economia do bem-estar.

Dessa forma, a nova ideia de Sen conclui que a promoção da igualdade de condições mínimas de existência, visando livrar os indivíduos da fome, dar-lhes melhores condições de saúde e educação, que são elementos básicos centrais para

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a transformação das pessoas em agentes com condição de participar e garantir o pleno funcionamento dos mercados e, assim, garantir o desenvolvimento: “O desenvolvimento consiste na eliminação de privações de liberdade que limi-tam as escolhas e as oportunidades das pessoas de exercer ponderadamente sua condição de agente” (Sen, 2000, p. 10).

Isso significa dizer que quem é responsável e tem o poder sobre a riqueza não é o indivíduo isolado, mas o capital produtor desta riqueza. O indivíduo isolado poderia, quando muito, tornar-se representante deste capital, se for aceito e contratado para tal. Porém, o capitalismo não é um modo de produção baseado no trabalho próprio, individual, mas na compra do trabalho alheio. E isso ganha força quanto mais se desenvolve o sistema capitalista no sentido de sua concentra-ção e centralização materializada nas grandes empresas globais, o que está muito longe do produtor individual isolado. É nesse contexto que o papel das empresas se torna relevante e imprescindível para a efetivação das liberdades em comple-mentação à função governamental.

Com a difusão das ideias de Sen sobre desenvolvimento, a denomina-da “ecodiplomacia” passou por uma segunda etapa, que culminou em debates e conclusões da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, e que vinculou meio ambiente e desenvolvimento. A partir destes debates, foi amadurecido e estrutu-rado o conceito de desenvolvimento sustentável, que passou a expressar a efetiva-ção das estratégias econômicas e sociais destinadas a promover o crescimento da riqueza e a melhoria das condições de vida através de modelos capazes de evitar a degradação ambiental e a exaustão dos recursos naturais, conciliando-os, ainda, com a diminuição da pobreza e da má distribuição de recursos no mundo.

O conceito de desenvolvimento sustentável foi consagrado no relatório Nosso futuro comum – publicado em 1987 pela World Commission on Environ-ment and Development, uma comissão das Nações Unidas, chefiada pela então primeira-ministra da Noruega, a sra Gro Harlem Brundtland – e se tornou a de-finição mais usada para o desenvolvimento sustentável.

O desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades, significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, ao mesmo tempo, um uso razoável dos recursos da terra e preser-vando as espécies e os habitats naturais (Costa, 2012, p. 2).

Além do mais, disseminou-se a consciência de que a avaliação e a atua-ção sobre os problemas ambientais necessitavam ser globais, uma vez que, como mencionado anteriormente, o modelo de desenvolvimento econômico até então

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adotado tem gerado enormes desequilíbrios. De um lado, observa-se riqueza e abundância no mundo em relação a padrões de períodos anteriores da história mundial. Por outro lado, a miséria, a degradação ambiental e a poluição aumen-tam dia a dia (Kon, 2006, p. 1).

De modo concomitante, desenvolveu-se a constatação de que o enfrenta-mento destas questões requer ações locais específicas. Com este objetivo, foi criada, no Brasil, a Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente (ANAMMA), nos finais dos anos 1980. Internacionalmente, em reunião na sede da ONU, em 1990, criou-se as instituições do International Council for Local Environmental Inniciatives (Iclei) (Sobral, 2003, p. 141).

Apesar da ampliação da conscientização sobre essas questões durante os anos 1980 e 1990, o contexto socioeconômico e ambiental do mundo é hoje alarman-te, particularmente após a crise financeira internacional de 2008, que diminuiu os recursos financeiros de países de todos os níveis de desenvolvimento, sejam di-rigidos para atividades empresariais ou para políticas públicas A isto se acrescenta o fato de que: i) de um lado, é notória e considerável a defasagem de condições socioeconômicas dos países, o que gera a iniquidade e a diferenciação entre classes sociais e grupos étnicos, de modo que os conflitos sociais permanecem intrans-poníveis em regiões com piores condições estruturais; e ii) de outro, porque a consciência sobre a degradação ambiental ainda não conseguiu se converter em ações políticas que tenham algum êxito mais efetivo em amplitude global.

As diferenças mundiais nessa forma de desenvolvimento observadas no âmbito econômico exclusivo advêm do fato de que a competitividade tecnológica implica custos elevados na área de pesquisa e desenvolvimento de produtos, na sofistica-ção no atendimento da demanda e na provisão de assistência técnica (Kon, 2006; Kon e Sugahara, 2012). As empresas se reestruturam geograficamente, no sentido da competição em nível mundial, procurando as vantagens comparativas de cada país. Por isso, a pesquisa tecnológica e científica em geral tem um papel primordial na bus-ca do desenvolvimento sustentável, incluindo a melhora da compreensão em áreas tais como mudança do clima, aumento da taxa de consumo de recursos, tendências demográficas e degradação do meio ambiente, bem como da interdependência dos ciclos hidrológicos, nutritivos e bioquímicos e das trocas de energia, que fazem parte do sistema terrestre. A aplicação dos conhecimentos científicos é imprescindível para articular e apoiar as metas de desenvolvimento sustentável, por meio da avaliação científica da situação atual e das perspectivas futuras do sistema; este conhecimento fundamenta a criação de inovações atuais e futuras nas ciências, que objetivam facili-tar os processos de tomada de decisões. Desta forma, para a consecução dos objetivos de implementação dos conhecimentos científicos, um dos caminhos se refere à cons-tante melhora de divulgação e compreensão sobre as características e a situação dos recursos naturais representados pela terra, pelos oceanos e pela atmosfera.

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Do ponto de vista do consumo, a mundialização acarretou o desenvolvimento de semelhanças nas estruturas de demanda e, portanto, certa homogeneidade da estrutura de oferta dos vários países, o que possibilitou ganhos de escala, unifor-mização de técnicas produtivas e administrativas e redução do ciclo do produto. Concomitantemente, a competição entre empresas se volta não apenas para o produto, mas, principalmente, para a tecnologia dos processos produtivos (Kon e Sugahara, 2012).

O consumo ocasiona impactos socioeconômicos e ambientais nas entreli-nhas do crescimento, que podem proporcionar situações conflitantes entre a deci-são de aumento do estímulo a este consumo ou a preservação ambiental. No entanto, o maior consumo, em determinadas condições, pode se constituir em um fato social positivo, que emite sinais de mudanças culturais e estruturais em direção à situação de melhoria do bem-estar das sociedades. Porém, grande parte destes impactos passa despercebida todos os dias, assumindo a característica de uma espécie de consumo invisível, necessário à profusão dos bens e serviços rotineiros, como o consumo de água, energia, lixo e combustíveis fósseis, embutido e rara-mente contabilizado na produção dos ícones da cultura de consumo. É possível, no entanto, observarem-se os impactos desta cultura na sua articulação invisível com a pobreza (Lucas, 2006a, p. 73; 2006b).

Dessa forma, o consumo pode ser observado do ponto de vista das famílias e das empresas. O foco nas famílias é observado em algumas pesquisas através de quatro categorias, que são as principais responsáveis pelos efeitos crescentes da degradação ambiental: consumo de alimentação, moradia, transportes e turismo. Por sua vez, o consumo das empresas na utilização de insumos para o processo produtivo diz respeito principalmente às possibilidades de esgotamento de recursos naturais e energéticos, adicionalmente à degradação ambiental por externalidades negativas, criadas pela eliminação indiscriminada e pela não reciclagem de resíduos.

A obtenção de padrões sustentáveis de consumo e produção é o desafio e a polêmica atual que envolve agentes socioeconômicos públicos e privados do mun-do como um todo, na tomada de decisão sobre a escolha dos estímulos à determi-nação destes padrões. Consumo sustentável significa o uso de bens e serviços que respondem às necessidades básicas de bem-estar das famílias e de insumos pro-dutivos, minimizando o uso de recursos naturais, materiais tóxicos e emissões de resíduos e poluentes, de modo a não ameaçar as necessidades de futuras gerações.

Uma discussão recente que envolve a busca dos estímulos ao desenvolvi-mento socioeconômico refere-se à importância do capital social como base para o ambiente favorável a este processo e, particularmente, para a consecução da sustentabilidade deste desenvolvimento. As análises mais recentes concluem que as condições descritas nos modelos econômicos neoclássicos de desenvolvimento

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(alocação eficiente dos recursos), keynesianos e kaleckianos (relevância da demanda efetiva) ou schumpeterianos (dinamismo da oferta, da introdução da inovação tecnológica, ou da organização interna das firmas para o aumento da competi-tividade e a geração de expansão comercial), não são suficientes para explicar a continuidade do processo e do ritmo de crescimento dos países (Sachs, 1993; Sachs e Vieira, 2007; Ipea, 2006b).

A abordagem do desenvolvimento sustentável na atualidade assume várias dimensões – sustentabilidade ecológica, econômica, social, espacial ou territorial, cultural e política –, que requerem a conjugação de envolvimento ético e de ações efetivas de atores públicos e privados. Ignacy Sachs (1993) propõe as definições a seguir.

• Sustentabilidade ecológica refere-se à base física do processo de cresci-mento e tem como objetivo a manutenção de estoques dos recursos naturais incorporados às atividades produtivas. Visa à preservação dos recursos naturais na produção, no uso de recursos renováveis e na limitação de uso dos recursos não renováveis; à limitação do consumo de combustíveis fósseis e de outros recursos esgotáveis ou ambiental-mente prejudiciais, substituindo-os por recursos renováveis e inofensivos; à redução do volume de resíduos e de poluição, por meio de conservação e reciclagem; à autolimitação do consumo material; à utilização de tecnologias limpas; e à definição de regras.

• Sustentabilidade econômica refere-se a uma gestão eficiente dos recursos em geral e caracteriza-se pela regularidade de fluxos do investimento público e privado. Compreende a avaliação da eficiência e da eficácia econômica em termos macrossociais, e não apenas na lucratividade empresarial; o desenvolvimento econômico intersetorial equilibrado; a capacidade de modernização contínua dos instrumentos de produção; o razoável nível de autonomia na pesquisa científica e tecnológica; e a inserção soberana na economia internacional.

• Sustentabilidade social refere-se ao desenvolvimento e tem por objetivo a melhoria da qualidade de vida da população. Para o caso de países com problemas de desigualdade e de inclusão social, implica a adoção de políticas distributivas e a universalização de atendimento a questões como saúde, educação, habitação e seguridade social. Abrange a necessidade de recursos materiais e não materiais, objetivando maior equidade na distri-buição da renda, de modo a melhorar substancialmente os direitos e as condições da população, reduzindo-se o índice de Gini e ampliando-se a homogeneidade social; e a possibilidade de um emprego que assegure qualidade de vida e igualdade no acesso aos recursos e aos serviços sociais.

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• Sustentabilidade espacial ou territorial é a busca de equilíbrio na configu-ração rural-urbana e na melhor distribuição territorial de assentamentos humanos e atividades econômicas; de melhorias no ambiente urbano; e de superação das disparidades inter-regionais e elaboração de estratégias ambientalmente seguras para áreas ecologicamente frágeis, a fim de garantir a conservação da biodiversidade e do ecodesenvolvimento.

• Sustentabilidade cultural diz respeito à cultura de cada local, garantindo continuidade e equilíbrio entre a tradição e a inovação.

• Sustentabilidade política refere-se ao processo de construção da cida-dania para garantir a incorporação plena dos indivíduos ao processo de desenvolvimento. No âmbito nacional, baseia-se na democracia, na apropriação universal dos direitos humanos e no desenvolvimento da capacidade do Estado para implementar o projeto nacional em parceria com empreendedores e em coesão social. No aspecto internacional, tem sua eficácia na prevenção de guerras, na garantia da paz e na promoção da cooperação internacional e na aplicação do princípio da precaução na gestão do meio ambiente e dos recursos naturais; na prevenção da biodiversidade e da diversidade cultural; na gestão do patrimônio global como herança da humanidade; e na cooperação científica e tecnológica internacional.

• Por fim, a dimensão psicológica é incorporada ao estudo devido a relacio-nar o ser humano às dimensões culturais, sociais, políticas e econômicas.

A nova visão sobre a relevância do capital social, introduzida nas análises socioeconômicas da atualidade, enfatiza a aplicabilidade desses conceitos não apenas por meio da intervenção estatal, mas também por intermédio da ativida-de privada e, particularmente, empresarial como subsídios ao desenvolvimento. Embora abarcando uma série de definições apropriadas, o capital social, em uma visão sintetizada, é entendido hoje como um conjunto de normas concretas e abs-tratas, que promovem confiança e reciprocidade nos relacionamentos econômicos (Kon, 2004, p. 239). Este conjunto de normas se constitui por redes de organi-zações civis e pela confiança compartilhada entre as pessoas, sendo resultado e resultando da interação social.

A partir da observação das condições de desenvolvimento de países mais avançados, constatou-se uma série de condicionantes inerentes aos ambientes socioeconômicos na atualidade, que dizem respeito à disponibilidade do deno-minado capital social para a concretização dos objetivos de crescimento, cuja relevância vem sendo discutida com a finalidade de fornecer subsídios às políti-cas públicas de desenvolvimento nos países menos avançados. As definições e

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65Responsabilidade Social das Empresas como Instrumento para o Desenvolvimento

as nuances do conceito e da aplicação do capital social passam por um amplo contexto de interpretações. Bourdieu (1985) define este capital como um con-junto de recursos reais ou potenciais de um país, à disposição dos integrantes de uma rede durável de inter-relações mais ou menos institucionalizadas. Coleman (1990) o interpreta como sendo parte dos recursos socioestruturais que consti-tuem um ativo de capital para o indivíduo e facilitam certas ações comuns dos que constituem esta estrutura. Por outro lado, Putnam (1993) salienta os aspectos das organizações sociais, entre as quais as normas coletivas, as redes e o espírito de confiança que contribuem para facilitar a cooperação no sentido de proporcionar ações de benefício mútuo. Para este autor, o capital social incrementa os resulta-dos do investimento em capital físico e humano.

As principais instituições internacionais de fomento têm considerado, em suas decisões de auxílio, os reflexos de investimentos no capital social dos países em desenvolvimento. Neste sentido, estudos de Woolcock (1998) e Dasgupta (1998) para o Banco Mundial ressaltam a importância de estimular o investimento em nível micro e macro, na capacidade organizativa através de instituições, relações, atitudes e valores que determinam a interação interpessoal e facilitam o desenvolvimento econômico e a equidade social. Em suas análises, o banco distingue entre capital natural do país (recursos naturais), capital construído gerado pelo ser humano (infra-estrutura, bens de capital, capital financeiro, comercial etc.), capital humano (graus de nutrição, saúde e educação da população) e capital social (instituições, relações e normas das inter-relações sociais da sociedade).

O Banco Interamericano de Desenvolvimento (Kligsberg, 2000) mostra a relevância do capital social, conceituando-o como normas e redes que facilitam a ação coletiva e contribuem para o benefício comum. Propõem o estímulo à análise e à discussão dos desafios do desenvolvimento de cada país, por meio da formação de redes de centros de pesquisa acadêmica, empresarial e outros, para gerar e difundir o conhecimento com o apoio dos meios de comunicação em massa, além de promover uma integração de programas sistemáticos de ensino que favoreça o capital social.

Por sua vez, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD – (Lechner, 2000) estimula a ampliação de programas que fomentem as relações informais de confiança e cooperação (entre famílias e colegas), a associa-tividade formal em organizações de diversos tipos e uma rede institucional nor-mativa que fomente estas relações. Desse modo, a dinâmica das empresas privadas no caminho do desenvolvimento sustentável envolve a participação na formação do capital social, de forma conjunta com a ação pública, como será mais bem explicitado na seção seguinte.

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4 A DINÂMICA DAS EMPRESAS NO CAMINHO DO DESENVOLVIMENTO

No caminho do desenvolvimento tecnológico e do processo de globalização econômica, intensificado na atualidade, novas formas de competição entre em-presas e sistemas econômicos se moldam e se fazem sentir em diversas áreas. Observa-se, inicialmente, uma integração financeira internacional, com au-mento do volume e da velocidade de circulação destes recursos disponíveis. Do ponto de vista comercial, a globalização acarreta o desenvolvimento de se-melhanças nas estruturas de demanda e homogeneidade da estrutura de oferta dos vários países, e a competição entre empresas se volta não apenas para o pro-duto, mas, principalmente, para a tecnologia dos processos produtivos, como salientado anteriormente. A competitividade tecnológica implica, então, custos elevados na área de pesquisa e desenvolvimento de produtos, na sofisticação no atendimento da demanda e na provisão de assistência técnica. As empresas se reestruturam geograficamente, no sentido da competição em nível mundial, procurando as vantagens comparativas de cada país.

Como observam vários autores, do ponto de vista da administração dessas relações globalizadas, as ações das empresas privadas também assumem caracterís-ticas globais de modo a se adequarem a esta dinâmica. Na prática, as oportunida-des e os problemas a serem gerenciados também requerem uma visão de tomadas de decisão e de soluções mundializadas, em conformidade com os aspectos polí-ticos e econômicos da globalização, de forma sistêmica. Este enfoque sistêmico exige uma nova forma de pensar pelos agentes produtivos, acompanhando a visão de mundo que trata com unicidade o próprio ambiente que cerca os indivíduos e os demais ambientes mundiais. As pressões geradas pela tomada de consciência dos consumidores sobre a questão ambiental, que de forma sistêmica se alia ao acirramento da concorrência econômica, levam à necessidade de uma gestão em-presarial mais ágil, mais flexível e eficiente, ao lado da redução de custos (Peliano, 2000; Sachs e Vieira, 2007; Aligleri, Aligleri e Kruglianskas, 2009).

Nesse contexto, as relações econômicas tendem a adquirir uma conotação mundial de relações virtuais, em que a troca de informações ocorre em tempo real, possibilitando respostas mais rápidas às oportunidades do mercado e ao seu compartilhamento. A gestão das empresas por meio destas novas relações virtuais soma capacidades e conhecimento, além do desenvolvimento de trabalho con-junto entre várias empresas, como uma aliança estratégica para a sobrevivência e o crescimento.

Contudo, os processos produtivos estimulam a concentração de capital e de mercados, e a consolidação de oligopólios. No entanto, muitas vezes, estas estruturas de mercado se revestem de rigidez excessiva ante os novos paradigmas baseados em flexibilidade produtiva e distributiva. Nestas condições, a oferta de

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produtos é interligada em âmbito mundial, através da crescente cooperação entre empresas, que entram em acordos quanto à divisão de mercado e à troca de conhecimentos tecnológicos, compartilhando, muitas vezes, riscos e custos financeiros. O aumento do número de fusões em nível mundial leva à evidência do cresci-mento da atuação das empresas transnacionais, que, no entanto, se concentram regionalmente, no sentido do atendimento dos grandes blocos econômicos que se desenvolveram (Kon, 2000).

O processo de multinacionalização das empresas se verificava, inicialmente, pela busca de investimentos diretos em regiões mundiais onde as vantagens de uma mão de obra mais barata, embora não consideravelmente qualificada, atra-íam empresas para nações menos desenvolvidas. A reestruturação da divisão in-ternacional do trabalho, nesse período, beneficiou grande parte de países menos desenvolvidos, visto que os investimentos diretos das multinacionais nestes es-paços trouxeram consigo oportunidades de emprego e de ampliação da renda pessoal. Paralelamente, ocorreu a difusão de conhecimento tecnológicos, que se disseminou tanto entre os níveis gerenciais das empresas multinacionais quanto entre os hierarquicamente inferiores de trabalhadores. Estes conhecimentos se expandiram para empresas nacionais destas economias, onde se refletiram em melhores alternativas de competitividade.

O novo paradigma de flexibilização produtiva visou integrar o trabalhador a todos os aspectos do processo de produção, incorporando a inteligência do ho-mem à automação e à robótica. A competitividade entre empresas dá-se não mais apenas pela busca de economias de escala e do crescimento do tamanho das insta-lações, mas também por meio da produção voltada para encomendas específicas, por empresas de menor tamanho, que, dessa forma, se mostram mais capacitadas para a agilização e a flexibilização da produção, porem com menor capacidade de absorção de trabalhadores. A organização do processo de trabalho e as relações in-dustriais ficam dependentes da capacidade de a mão de obra demonstrar padrões de flexibilidade que se ajustem a esta nova filosofia, no que se refere não apenas à capacidade para assumir tarefas variadas, como também à possibilidade de, em curto prazo, submeter-se a treinamento e reciclagem permanentes (Kon, 2000).

A intensificação dos investimentos produtivos privados acabou se con-centrando em territórios econômicos mundiais já avançados, que venceram a concorrência pela importação dos capitais transnacionais destinados a inversões mais rentáveis, aumentando, assim, a desvantagem econômica dos países emer-gentes. O crescente excedente de trabalhadores gerado pelo desenvolvimento tecnológico, particularmente pela informatização das atividades, acarretou taxas consideráveis de desemprego tanto em países avançados como em menos desen-volvidos; este excedente, portanto, resultou da forma pela qual a globalização se intensificou incessantemente. A internacionalização das atividades produtivas

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se amolda constantemente às vantagens comparativas dos diversos países, de ní-veis diferenciados de desenvolvimento, com relação à composição e à qualidade de sua força de trabalho e da infraestrutura ligada à economia de informação.

Nesse contexto, a sustentabilidade do desenvolvimento tem sido tema das reuniões dos conselhos administrativos das empresas que visualizam o importante papel do veto do consumidor e dos acionistas em relação ao descaso das empresas com as questões sociais (Esty e Winston, 2006). Bancos, financeiras e segurado-ras mundiais estão se empenhando em se tornar “sustentáveis”, adotando novas regras para assumir o financiamento da promoção de atividades que protejam o meio ambiente.

No que se refere aos países em desenvolvimento, as consequências do pro-cesso de globalização são objeto de polêmica entre os especialistas. Tendo em vista a possibilidade dos produtores de fragmentar a cadeia produtiva interna-cionalmente e, dessa forma, gerar partes do valor adicionado pela produção em vários espaços mundiais, introduziu-se um novo aspecto ao processo de interna-cionalização de capital, em que as regiões geograficamente dispersas que tiverem capacidade de participar do processo produtivo terão ganhos relativos.

Alguns estudiosos consideram o processo como uma possibilidade de es-ses países melhorarem suas perspectivas e se aproximarem, em termos de ní-veis de desenvolvimento econômico, dos países mais avançados. Argumentam que, dependendo das políticas econômicas relacionadas à abertura comercial e financeira, a globalização pode aumentar os fluxos de capital e de tecnologia. Isto, por um lado, pode gerar uma taxa mais elevada de crescimento da ren-da do que aconteceria em economias menos integradas mundialmente e, por outro lado, possibilita a inclusão destas economias no processo produtivo transnacionalizado (Louette, 2007; Sachs e Vieira, 2007; Aligleri, Aligleri e Kruglianskas, 2009).

No entanto, a observação da realidade dos países emergentes aponta para as dificuldades de acesso aos benefícios da mundialização. A condição necessária de sucesso advindo da globalização, para estas economias, reside na possibilidade de pertencer a esquemas de integração regional institucionalizada; ou seja, de ter acesso a blocos econômicos mais avançados, cujos países usufruem conjunta-mente os benefícios da internacionalização do capital. Aos países não integrados nestes esquemas, restaria uma situação de exclusão dos benefícios, num processo que seria definido por Gunnar Myrdal (1957) como de “acumulação circular negativa”, associada a crescentes problemas sociais. Além disto, a baixa possibi-lidade de cooperação tecnológica interfirmas, entre países desenvolvidos e emer-gentes, leva a uma situação de atraso tecnológico para estes últimos (Gundlach e Nunnenkamp, 1996).

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Com a aceleração da globalização, a política econômica de cada país passa a ser grandemente condicionada por fatores externos, visando atender aos objetivos da competitividade internacional e da participação ativa no processo de inter- -relação mundial. Em cada economia nacional, a velocidade da internacionalização das atividades, em grande parte, é influenciada pelas políticas públicas internas compatíveis com os requisitos do aumento dos fluxos entre países. A adoção de programas de estabilização e reformas estruturais liberalizantes baseadas em des-centralização fiscal, desregulação financeira, liberalização comercial, privatização e reformas tributárias contribuiu para a aceleração e a estruturação do processo de globalização econômica (Ipea, 2006b).

A necessidade de integração no processo de globalização não coloca aos pa-íses em desenvolvimento outras alternativas de políticas governamentais, a não ser perseguir a estabilidade macroeconômica, muitas vezes às custas de impactos sociais negativos. Sem poupança interna suficiente para investimentos satisfatórios em capital humano, físico e social e para desenvolver a infraestrutura compatível com as necessidades de competitividade internacional, estes países ficam sujeitos à vinda de investimentos externos – sejam financeiros, para equilibrar a balança de pagamentos, sejam produtivos diretos, para a composição do capital físico e social.

Segundo relatório da Associação Internacional para Esforços Voluntários (em inglês, International Association for Volunteer Effort – Iave),1 que congrega empresas empenhadas em responsabilidade social e tem como objetivo fortalecer a ação voluntária, existe um grande espectro de empresas globais que fazem esfor-ços sociais consistentes que permeiam seus sistemas empresariais e voltam-se para os consumidores, visando propiciar um produto e um ambiente sustentáveis, bem como empresas que prestam serviços a outras empresas com o mesmo objetivo. Este relatório constata, ainda, que, em quase todas as indústrias mundiais que atuam e todas as regiões do mundo, são empreendidas estas ações voluntárias, particular-mente nos setores financeiro, de seguros, de tecnologia, de hotéis, de manufatura, de mineração, de varejo, de farmacêuticos, de logística, de consultoria, de direito, entre outros. Verifica que há diferenças regionais e culturais consideráveis entre países, apesar do contexto globalizado. Se, em alguns países, um setor do empre-sariado fortemente voltado para a responsabilidade social é considerado elemento essencial da sociedade, por sua vez, em outras sociedades, existe a preferência pela provisão e garantia do bem-estar por meio do governo, o que diminui o espaço do empresariado. Esta divergência de opiniões e de ações efetivas, segundo a Iave (2011), se origina das diferentes ideologias e culturas que as nações trazem em cada contexto interno.

1. A Iave, fundada em 1970 por um grupo de voluntários internacionais, tem como objetivo promover o desenvolvimento mundial do voluntariado dedicado a aspectos sociais de forma estrategicamente planejada, mantendo forte relaciona-mento, como a parceira com alguns departamentos da ONU voltados para a ecologia social e o desenvolvimento de organizações não governamentais (ONGs).

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Em razão desse fenômeno, as empresas e os governos precisam entender essas diferenças, porque a forma pela qual as políticas e as ações públicas são realizadas em um contexto nacional pode não ser apropriada em outras regiões do mundo, muitas vezes por razão de valores culturais específicos arraigados. Existem diferentes valores com implicações delicadas no que se refere a imagens, elementos gráficos e uso de cores, bem como na forma como as pessoas se comu-nicam, falam, interagem e se apoiam; diferenças estas que requerem a adaptação das empresas e das políticas públicas para a adaptação a valores, costumes e expec-tativas locais (Iave, 2011).

A participação empresarial evoluiu a partir de suas relações com a comuni-dade através das solicitações da sociedade civil organizada, bem como pelas pres-sões das instituições legais do Estado, transformando-se em uma ferramenta de gestão da cultura corporativa, do engajamento de empregados, da gestão de mar-cas e nas relações externas, incluindo as parcerias com outras empresas, como uma forma de fortalecer as relações da empresa com a sua cadeia de fornecedores, os clientes e os parceiros empresariais estratégicos. Muitas destas empresas buscam parcerias de “transformação” com ONGs globais já estruturadas, que apresentam afinidades com as áreas focais da empresa, com a finalidade de nortear e apoiar o engajamento voluntário, e que tragam conhecimentos especializados sobre as necessidades, a cultura local, as novas oportunidades e mesmo o gerenciamento terceirizado de programas, bem como os papéis aceitáveis para o voluntariado, como são denominadas as empresas e os funcionários dedicados à ação social efetiva (Iave, 2011).

As diferenças entre as empresas se referem a filosofias e processos de enga-jamento em investimentos sociais. Os programas colocados em prática por estas empresas também seguem caminhos específicos. Alguns são mais orientados para atividades e impacto externos, e outros para seus universos internos, buscando melhorar o grau de qualidade da experiência dos voluntários (que são represen-tados pelo empresariado, bem como pela equipe gerencial) para o benefício para a empresa, como:

• ajuda comercial, visando agregar valor à empresa;

• assistência social, com apoio social de várias ordens (saúde, acesso a bens etc.) aos indivíduos;

• desenvolvimento social, preparando o esquema para a mudança de sis-temas de informações, operacionais e outros; e

• modelos de desenvolvimento humano, visando fortalecer a formação do capital humano (Iave, 2011).

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Por sua vez, o denominado voluntariado baseado em habilidades (em inglês, skill-based volunteerism – SBV) e o voluntariado internacional dirigido à ação em outros países utilizam as habilidades profissionais e pessoais, e, embora antigos, estes programas têm evoluído, nos últimos anos, como uma forma de fortalecer as capacidades inerentes às firmas, bem como o impacto destas empresas sobre as transformações que levam ao desenvolvimento socioeconômico. Os programas postos em prática mostram a tendência de combinar os interesses comerciais e a cultura corporativa das empresas com as habilidades específicas dos empregados, com uma ligação com as estratégias das empresas no que se refere ao desenvolvimento de liderança e talentos.

A parceria com as ONGs tem aumentado na medida em que estas possuem conhecimentos especializados capazes de ajudar o envolvimento empresarial e, além de incluir oportunidades para o exercício das habilidades pessoais e profissionais das empresas, transmitem modelos de mensuração do impacto do trabalho social, que, como visto, fornecem subsídios à formulação de políticas privadas e públicas.

A pesquisa da Iave (2011) relata exemplos da utilização da tecnologia inova-dora para apoiar a prática do voluntariado empresarial, que pode variar em uma gama de utilização rotineira e limitada da tecnologia, até relações de mentoring e tutoria a projetos de maior escala e projetos a distância baseados em habilidades específicas. Existem vários exemplos de empresas que estão desenvolvendo novas ferramentas on-line para apoiar a atuação de seus empregados nos projetos sociais de ação voluntária, disponibilizando materiais e redes sociais para troca de expe-riências e ideias, para atender às necessidades das empresas.

5 A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS COMO INSTRUMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO: SUBSÍDIOS ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS

A inclusão gradativa na sociedade e nas empresas brasileiras da ideia de responsabi-lidade social vem sendo ampliada no início deste século. Parcela do empresariado e de outras instituições privadas, como as de ensino, vem tomando consciência sobre a necessidade de uma postura que se contraponha à cultura de gestão or-ganizacional centrada apenas na maximização do lucro dos acionistas. Este novo enfoque social é retratado na busca, pelas empresas privadas, de informações e participação em fóruns de discussão, com o intuito de compreender e incorporar a abordagem de responsabilidade social para a implementação de políticas e prá-ticas que atendam a critérios éticos.

Com a intensificação, na década de 1980, do debate internacional sobre a relativa incapacidade do Estado de atender a todas as demandas sociais, bem como a necessidade de fortalecimento da sociedade civil, foram formados dois

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grupos informais de empresas brasileiras, o Grupo de Institutos Fundações e Empresas (Gife), em 1989, e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social (Ethos), em 1998, para a discussão deste tema. Iniciaram um movimento para o debate da questão do papel das empresas privadas em relação à responsa-bilidade pelo desenvolvimento social do país, bem como a forma de contribui-ção efetiva e empírica para este objetivo. Naquele período, crescia a consciência do empresariado sobre a necessidade de promover transformações sociais, muito além do assistencialismo. Apenas em 1995, o grupo iniciante organizou oficial-mente a instituição do Gife, composto por 25 organizações, que, nos anos seguin-tes, veio se desenvolvendo e tornou-se referência sobre investimento social priva-do no Brasil. Em 2010, a rede Gife reunia 134 associados, que, conjuntamente, investiam por volta de R$ 2 bilhões por ano na área social. A rede Gife assim formada, sem fins lucrativos, passou a reunir organizações de origem empresarial, familiar, independente e comunitária, que investem em projetos com finalidade pública, com a missão de

aperfeiçoar e difundir conceitos e práticas do uso de recursos privados para o desenvol-vimento do bem comum, contribuindo, assim, para a promoção do desenvolvimento sustentável do Brasil, por meio do fortalecimento político-institucional e do apoio à atuação estratégica dos investidores sociais privados. Além disso, o Gife também orga-niza cursos, publicações, pesquisas, congressos, grupos de afinidade, painéis temáticos, debates e outros eventos (Gife, 2011, p. 8).

Por sua vez, o Instituto Ethos formou-se como uma organização sem fins lucrativos, caracterizada como organização da sociedade civil de interesse públi-co, tendo como missão: “mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negócios de forma socialmente responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade justa e sustentável” (Ethos, 2011). Agrega um grupo de empre-sários e executivos oriundos da iniciativa privada, que trocam conhecimentos e experiência, desenvolvendo ferramentas para auxiliar as empresas a analisar suas práticas de gestão e aprofundar seu compromisso com a responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável.

A partir dessas iniciativas, a ação social das empresas no Brasil foi ob-jeto de estudo, tendo como investigação pesquisa inédita do Ipea, em 2001, enfocando empresas privadas de todos os portes, cujos resultados mostraram investimentos não desprezíveis por algumas grandes empresas. Estes resultados, que englobam 67% das empresas na região Sudeste, 46% das empresas no Sul e 55% do Nordeste, representavam respectivamente nestas regiões 30%, 7% e 4% do gasto social federal. Esta pesquisa teve o foco nas ações sociais das em-presas direcionadas a stakeholders, representados pela comunidade empresarial e empregados. Porém, mostrou que a grande maioria das empresas pesquisadas ainda não dispunha de um sistema de informações que avaliasse o impacto de

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suas ações sociais, e, nesse sentido, suas ações poderiam acarretar desperdício de recursos e consequente redução na eficiência e na eficácia (Peliano, 2000; Ipea, 2006b; Coutinho e Macedo-Soares, 2002).

Investigação recente da Ethos mostrou que, em 2006, entre as empresas in-teressadas em investimentos em responsabilidade social, em torno de 34,4% eram empresas de grande porte; 28%, pequenas; 19,1%, microempresas; e 18,5%, de médio porte. Deve ser observado que, embora a consciência sobre a questão social tenha apresentado lenta evolução, no ano pesquisado, um grupo representativo de empresas já considerava que a responsabilidade social não deve ser apenas do governo (em retorno ao pagamento de impostos), da comunidade social e das ONGs, mas cabe também às empresas, mesmo que esta ainda apresente critérios empresariais de retorno ao investimento (Ethos, 2006).

A partir de resultados da pesquisa, Stephen Kanitz (2006) salienta que, em 2006, as quinhentas maiores empresas brasileiras doaram aproximadamente US$ 300 milhões a entidades beneficentes. Acrescenta que, além de ser uma quantia irrisória para os padrões internacionais, a maioria delas o faz de forma to-talmente aleatória, como estratégia filantrópica e sem outros objetivos de adequa-ção a estratégias de desenvolvimento socioeconômicos definidos (Ethos, 2006).

Desde 2002, o Banco Mundial, através de sua instituição denominada International Finance Corporation (IFC), estabeleceu um conjunto de regras socio-ambientais para nortear os critérios de financiamentos, conhecidas como Princípios do Equador. Em 2006, foi lançada nova versão destes princípios, revista em 2010, que prevê critérios mais rigorosos, principalmente na análise da população atingida pelo projeto financiado. A partir disto, todo projeto deve ter classificação de acordo com seu nível de risco socioambiental, e, para os projetos de alto risco, devem ser exigidos planos de ação que minimizem os impactos oriundos destes riscos (Ipea, 2006b).

A aplicação dos critérios é baseada no estabelecimento de uma avaliação socioambiental realizada pelas instituições financeiras, que classifica os projetos como: A (alto risco), B (médio risco) ou C (baixo risco). A dotação de crédito aos projetos apresentados pelas empresas será decidida mediante a análise de informa-ções como: risco ambiental, proteção à biodiversidade e uso de energia renovável; proteção à saúde e à diversidade cultural e étnica; adoção de sistemas de saúde e segurança ocupacional, bem como prevenção contra incêndios; avaliação de impactos socioeconômicos; eficiência na produção, na distribuição e no consumo de recursos hídricos e energia; mecanismos de prevenção e controle de poluição; entre outras, para serem avaliadas pela instituição financeira.

Em 2011, a associação das empresas envolvidas com os Princípios do Equador iniciou a elaboração do processo de revisão estratégica, com o objetivo

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de desenvolver uma visão estratégica para os cinco anos seguintes, no sentido de assegurar que os princípios continuem a ser um padrão para a implementa-ção do gerenciamento do risco ambiental e social no setor financeiro. A revisão periódica é vista como necessária, devido ao aumento de empresas associadas, e à medida que a ideia dos princípios se expande mundialmente com a conscienti-zação de sua relevância e da necessidade de mudanças nos mercados financeiros mundiais para o atendimento da situação de crise mundial.

Nesse contexto, as economias de distintos níveis de desenvolvimento são levadas a se engajar nas regras da IFC, particularmente por estarem passando por processos diferenciados de mudanças qualitativas e quantitativas na sua estrutu-ração produtiva, segundo as condições específicas de sua força de trabalho, que permitam ou não o ajustamento mais dinâmico ao cenário da globalização. Entre as atividades financeiras mundiais, a consciência de que a gestão da responsabili-dade social deve ser incorporada não apenas no discurso, mas também na prática da cultura organizacional, veio se difundindo. Este movimento pode ser visuali-zado a partir de pesquisa do Ethos, que mostra que, já em 2006, 27 instituições financeiras mundiais – entre as quais quatro grupos brasileiros – aderiram aos Princípios do Equador, adotando a ideia da IFC de que aderir a esses princípios deixou de ser um custo para se tornar uma vantagem comparativa.

Outra pesquisa realizada pelo Ipea em 2006, a Pesquisa Ação Social das Empresas (Pase), coordenada por Anna Peliano, revelou que, das empresas priva-das brasileiras, cerca de 69% realizam ações sociais em benefício da comunidade social dos locais próximos à unidade produtiva ou à área de consumo, correspon-dendo a aproximadamente 600 mil empresas que, em 2004, haviam aplicado R$ 4,7 bilhões (0,27% do PIB) em ações sociais. Entre 2002 e 2006, foi observado um crescimento de 10% no número destas empresas. No entanto, o comporta-mento empresarial tradicional do país, no que se relaciona à responsabilidade so-cial, é mais voltado para a filantropia. As empresas ainda não visualizam de forma adequada a relação de seus investimentos sociais com os impactos sobre o desen-volvimento econômico. Mas a pesquisa registra também que, à medida que a par-ticipação social evolui, ela é incorporada aos valores da empresa e partilhada com os trabalhadores, passando a fazer parte da missão institucional. As empresas mais comprometidas adotam uma participação proativa, apoiam projetos mais bem es-truturados e buscam uma relação de parceria com seu público-alvo (Ipea, 2006b).

Por um lado, as empresas relatam como dificuldades para o investimento em ações sociais primeiramente questões financeiras; ou seja, 62% alegam que o maior empecilho para estas ações é a falta de recursos, visto que há ausência de incentivos governamentais (11%). Mas, por outro lado, a pesquisa mostra também que o investimento social privado é pouco influenciado pela política de

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benefícios tributários, uma vez que apenas 2% das empresas que atuaram na área social fizeram uso de incentivos fiscais, e 40% disseram que o valor do incentivo era muito pequeno e, portanto, não compensava seu uso. Para 16%, as isenções permitidas não se aplicavam às atividades desenvolvidas, e 15% nem mesmo sa-biam da existência dos benefícios.

As últimas informações sobre o perfil das empresas dedicadas à responsabi-lidade social no Brasil, divulgadas a partir do Censo Gife 2009-2010, mostram investimentos da ordem de R$ 1,9 bilhão em 2009 e uma projeção de R$ 2,02 bilhões em 2010, aplicados em diferentes áreas sociais, culturais e ambientais. Dos 134 associados, a taxa de respondentes foi de 76%, o que constitui uma amostra significativa para registrar o perfil do empresariado investidor em res-ponsabilidade social e as ações desenvolvidas, que afetam cerca de 24 milhões de beneficiários diretos.

O censo mostrou que a maior parte dos investidores sociais privados tem origem corporativa, 62% são fundações e associações empresariais e 24% são empresas privadas. Por um lado, suas estratégias de ação social tendem a se con-centrar prioritariamente em projetos próprios e menos em financiamento de projetos de terceiros. Por outro lado, os recursos são concentrados em áreas e temas específicos, como educação, população jovem e cultura, em detrimento de outros temas. O horizonte de tempo considerado na maior parte dos projetos sociais é mais curto, particularmente tendo em vista o panorama de incertezas da economia e da sociedade mundial. A área prioritária da educação é foco de 82% das empresas investidoras, enquanto 60% investem em temas de cultura, artes e formação do trabalhador. As questões ambientais, por sua vez, interessam a 58% dos investidores e tiveram uma elevação considerável de 26% de 2007 a 2009 (Gife, 2011).

Com relação ao período de crise financeira mundial de 2008, a pesquisa mostra que o investidor social privado – em grande parte, formado por empre-sas – não alterou de forma relevante o montante de recursos destinados a esta forma de inversão. Em relação ao orçamento planejado para este fim, 45% das pesquisadas não tiveram alterações, 29% reduziram ligeiramente, e apenas 18% mostraram redução drástica. Algumas áreas, no entanto, vêm mostrando queda nos investimentos, como defesa de direitos, apoio à gestão do terceiro setor e desenvolvimento comunitário (Gife, 2010).

A pesquisa anteriormente citada, de Iave (2011), registrou que a recessão mundial parece ter fortalecido o contingente de empresários voltados para estes investimentos. Em particular, as empresas globais relatam que a recessão renovou a disposição dos empregados para atuar como voluntários e, também, resultou em iniciativas mais criativas para responder a problemas comunitários emergentes,

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especialmente as necessidades humanas básicas de desempregados ou pessoas vulneráveis de alguma outra forma. Estimulou, ainda, o uso mais estratégico da ação voluntária para complementar e alavancar a doação financeira para estes fins.

Sobre a governança e a gestão do investimento em responsabilidade social, as estruturas decisórias são diferenciadas entre os tipos de instituições, sejam em-presas, institutos ou fundações, a partir do grau de vinculação que as une a suas empresas mantenedoras ou a fundações independentes, comunitárias ou familia-res, bem como em função do porte das instituições e de sua forma de atuação. No entanto, apenas um número reduzido de instituições conta com a presença de membros externos em sua gestão. A origem dos recursos utilizados para este inves-timento é diversa, pois as empresas indicam utilizar recursos próprios da empresa ou doados pela empresa mantenedora/grupo, recursos doados por indivíduos ou grupos familiares mantenedores, recursos próprios do associado, provenientes de fundo patrimonial, aplicações e outros rendimentos, ou, ainda, recursos gerados com produtos/serviços/marketing relacionados a uma causa.

Entre as mencionadas anteriormente, a principal dificuldade apontada pelos empresários para investir em ações sociais continua sendo a questão financeira: 62% disseram que a falta de dinheiro é o maior empecilho. Uma parcela menor reclamou da ausência de incentivos governamentais (11%). E uma pequena pro-porção de empresas afirmou que não atua porque nunca pensou nessa possibili-dade ou porque acredita que esse não seja o seu papel (5%). No entanto, mais da metade das empresas respondentes (54%) afirmou que não utiliza benefícios fiscais, apontando como causa poucos benefícios e desvantagens adicionais.

Outro estudo do Ipea, coordenado por Anna Peliano e divulgado em 2009, constatou que cerca de 800 mil empresas privadas realizavam ações sociais no Brasil no período. Para um universo de 4,8 milhões de empresas brasileiras, em 2009, este montante corresponde a 16,7% do total de empresas. Peliano (2009) ressalta que um dos fatores relevantes para a análise do investimento social no processo de tomada de decisão destas empresas diz respeito à avaliação social que possuem sobre os resul-tados destes investimentos, uma vez que apenas 16% (95 mil empresas) declararam realizar este tipo de ação, e 79% responderam não possuírem esta documentação. As empresas alegam altos custos de avaliação relacionados tanto ao tempo utilizado para esta ação, quanto aos recursos monetários e à capacitação de equipe interna para estes fins, aliados à definição de instrumentos para a realização. Neste âmbito, a ine-xistência de apoio governamental técnico e financeiro desestimula a realização desta avaliação, o que, por sua vez, onera a consecução das medidas de apoio público ao estímulo do investimento social privado. Como salienta Peliano, a avaliação tem de ser instrumento de gestão, desde que os resultados na área social são longos e difíceis e as ações tendem a sofrer maiores dificuldades, por falta de informações necessárias para o planejamento destas políticas públicas (Peliano, 2009; IBGE, 2009).

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Em muitos países mais avançados, a integração entre as medidas de responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável na prática cotidiana faz com que as organizações se voltem para os objetivos no longo prazo e passem, então, a perceber que qualidade, preço competitivo e bons serviços não representam mais os únicos diferenciais no mercado. No entanto, no Brasil, a ação social das empresas envolvidas na responsabilidade social ainda é tímida e tem se voltado para o assistencialismo de curto prazo, por meio de projetos de ajuda filantrópica e de uma política de doações, não revestida de objetivos outros que diminuir momentaneamente dificuldades sociais en-frentadas pela comunidade.

Apesar do cenário promissor, os números resultantes das avaliações sobre os investimentos em projetos sociais, por parte das organizações privadas, destacam o enorme espaço a ser preenchido por atitudes empresariais cidadãs no Brasil (Ethos, 2006). Esta forma de responsabilidade social não apresenta condições de eliminar a médio ou longo prazo os bloqueios dos indivíduos e do país, que impedem a consecução do desenvolvimento sustentável. As pesquisas citadas ain-da mostram que o tipo de ação praticada na atualidade no país não elimina a pobreza, mas, sim, contribui para sua perpetuação. Ainda não está devidamente compreendida a forte relação entre as práticas das ideias mais amplas de respon-sabilidade social das empresas e as possibilidades de concretizar a forma de desen-volvimento que se mantenha para as gerações futuras. Não se estruturou ainda no ambiente empresarial brasileiro a noção fundamental do que é conceituado como o novo capitalismo social, em que são delineadas novas formas de relação entre empresas, funcionários, comunidades e clientes, que passam a compartilhar objetivos e resultados que favoreçam a otimização e a manutenção dos recursos (Sennett, 2006).

No entanto, já se observa o crescimento da proporção de empresas brasilei-ras que têm incorporado atitudes de responsabilidade social – ainda que através da prática da filantropia estratégica, com fins estratégicos de marketing –, o que consiste em uma forma diferenciada de administração, mais próxima da integra-ção com a necessidade do desenvolvimento sustentável. Esta atitude compreende a análise, a escolha e a determinação de uma causa social que tenha, preferencial-mente, relação com o negócio da empresa, em vez da prática aleatória de uma política de doações. Neste sentido, a empresa procura investir em projetos sociais específicos que agregarão valor a sua marca, despertando a associação positiva por parte de consumidores, fornecedores, clientes e potenciais, entre seu nome e a ação socialmente responsável (Ethos, 2006). Esta ação responsável em relação ao meio ambiente interno e externo e às condições individuais do trabalho é que permitirá os impactos positivos sobre a sustentabilidade do desenvolvimento glo-bal da região e do país.

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A prática filantrópica em si, ainda que associada a uma estratégia específica da administração da empresa, não esgota a capacidade empresarial de selecionar outras medidas estratégicas para a construção do capital social da comunidade, pois, como visto anteriormente, a rede de inter-relacionamentos de apoio que constitui esta infraestrutura social tem reflexos positivos e de desenvolvimento em todos os grupos de agentes que dela participam. A pauta de atuação das empresas visando contribuir ao capital social e ao desenvolvimento sustentável através da responsabilidade social deve buscar um comprometimento com a ética e a qua-lidade de vida dos empregados, de suas famílias, da comunidade e da sociedade como um todo. A preocupação de investir no desenvolvimento de produtos deve ser associada à seleção dos produtos que causem menor impacto ambiental, à garantia de qualidade junto aos consumidores e aos projetos sociais e culturais, como parte do planejamento estratégico da empresa com uma visão de longo prazo. Portanto, a prática da filantropia estratégica, que tem objetivos prioritaria-mente de curto e médio alcances, é um dos caminhos possíveis para a dissemina-ção da mentalidade que potencialmente pode levar à busca do desenvolvimento sustentável de longo alcance.

Conforme Sachs (2005), destravar o progresso econômico no Brasil re-quer mais investimentos em educação e em capacitação tecnológica e científica. Neste sentido, além dos aspectos apresentados, outra constatação relevante para a consecução do desenvolvimento sustentável, como visto anteriormente, é o en-tendimento do papel do conhecimento, na tomada de decisão sobre os padrões de consumo e produção sustentável, por todas as categorias de agentes envolvidos.

No caso específico do Brasil, a capacidade de recursos materiais e admi-nistrativos do Estado brasileiro tem se mostrado insuficiente para a formação da infraestrutura que permita o acesso livre dos indivíduos a este tipo de formação, representada por investimentos em educação, bibliotecas públicas, programas de apoio à aquisição de livros, equipamentos e outros materiais de informática, tanto por órgãos públicos de ensino quanto por indivíduos em formação (Veloso Filho e Nogueira, 2006; Brasil, 2000; 2004). Desta forma, entre as ações estratégicas dos planos de inovação tecnológica de muitas em-presas nacionais, cada vez mais é registrada a intenção de assumir, conjunta-mente com os órgãos governamentais, a responsabilidade pela formação da infraestrutura necessária para a disseminação do conhecimento pela sociedade toda, o que reverterá em reflexos positivos para a própria continuidade de crescimento empresarial (Ethos e Akatu, 2010).

Portanto, além de se constituir em uma postura ética, uma filosofia mo-ral e um conjunto de preceitos filosóficos que administradores acreditam e tentam seguir, a administração socialmente responsável requer também um conjunto de técnicas e práticas administrativas para gerir estes novos objetivos

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e suas mudanças estruturais requeridas. A necessidade de se desenvolverem instrumentos que auxiliem as empresas a exercer sua responsabilidade social de maneira mais efetiva vem causando transformações que implicam mudanças profundas em várias dimensões da organização, visto que uma empresa pas-sa a ser socialmente responsável de forma gradativa. Para trazerem resultados positivos, estas mudanças devem ser contempladas como parte integrante da cultura organizacional e da estratégia de negócios da empresa. Do ponto de vista da gestão da empresa, observa-se que, para que a empresa se torne so-cialmente responsável, é necessário a institucionalização de posturas, instru-mentos de gestão e atenção a novos stockholders (agentes) como parceiros dos processos que envolvam público interno, meio ambiente, fornecedores, comu-nidade, consumidores, governo e sociedade. As mudanças organizacionais nes-se sentido trazem implicações estratégicas profundas e requerem instrumentos específicos de gestão, como consultoria, auditoria e treinamento em sistema de gestão e pesquisa do clima organizacional, voltados para normas específicas de prática social (SA 8000, ISO26000 e NBR 26000), treinamento e desenvolvi-mento dos recursos humanos, desenvolvimento de ferramentas informatizadas para o atendimento de produtos sociais, análise do perfil comportamental dos stockholders associados à gestão de fornecedores e gestão por competências, bem como introdução de estratégias e produtos para o engajamento de partes interessadas e prováveis parceiros.

A qualificação de profissionais para a gestão da responsabilidade social re-quer a formação não apenas de um senso ético, mas também de espírito crítico/reflexivo e competências teóricas e metodológicas específicas para os objetivos sociais. E, ainda, a consciência de que, na atualidade, o movimento da responsabilidade so-cial se associa fortemente ao estudo das suas determinações econômicas, políticas, sociais, culturais e ambientais. Inclui a capacidade de reflexão sobre as possibilida-des e os limites das práticas de gestão da responsabilidade social tanto no contexto interno da empresa quanto no da sociedade regional, nacional e mundial. Para isso, é necessário também efetuar a capacitação dos agentes envolvidos, para que sejam utilizados os princípios, os conceitos e as metodologias constantes nas pre-missas da denominada “gestão social responsável” (Ethos e Akatu, 2010).

Em suma, a eficiência das políticas públicas no Brasil, voltada para o apoio à formação de capital social, é altamente questionada nas análises avaliativas. As di-ficuldades de gestão pública não se referem apenas à falta de recursos financeiros, mas, particularmente, prendem-se ao gerenciamento dos recursos humanos (capital humano), à carência de experiência acumulada da administração e, principalmente, à falta de uma infraestrutura institucional para a coordenação e a concatenação das políticas públicas e da formação de capital social (Rocha e Merege, 2001). Neste sen-tido, a empresa privada brasileira dispõe de experiência superior e acumulada nas áreas

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de gestão, tecnológica e organizacional como um todo, de modo a gerar expressivos ganhos de eficiência e qualidade na implementação de medidas sociais necessárias, através de parcerias com o governo de ação própria independente.

Como salientam Rocha e Merege (2001) em sua pesquisa, no Brasil, o deno-minado terceiro setor (organizações não governamentais) surge com mais intensi-dade nos anos 1990, com a finalidade de complementar as iniciativas do governo e do setor privado no atendimento de diversas necessidades da população – ofere-cendo-lhe o mínimo de bem-estar – e na formação de uma sociedade com menos desigualdades sociais e econômicas. Os autores estabelecem a hipótese de que o desafio da sustentabilidade e da formação de capital social não se limita à captação dos recursos de que uma organização necessita. Implica também seu emprego de maneira eficiente, de modo a maximizar os resultados alcançados investindo no desenvolvimento das pessoas que fazem parte da organização, melhorando a qua-lidade dos serviços, adequando-os às necessidades das comunidades e assegurando que a entidade continuará a contar com o apoio do público. Rocha e Merege (op. cit.) identificam as fontes de recursos existentes do também chamado de capital social e, através da análise de casos, buscam ilustrar as formas de utilização das fontes de recursos existentes, mostrando casos reais e bem-sucedidos. As compa-rações feitas pela pesquisa dos diferentes tipos de fontes de recursos identificam suas consideráveis diferenças e semelhanças, vantagens e desvantagens.

Por sua vez, a responsabilidade social corporativa no Brasil apresenta potencial considerável de ampliação, seja através da conscientização de seus impactos positivos sobre o desenvolvimento econômico sustentável, seja por meio dos movimentos bem-sucedidos de organizações privadas e públicas, dirigidos à qualidade, à saúde e à segurança no trabalho, bem como pela preservação do meio ambiente. Movimentos estes que recorrem à divulgação de tópicos como valores organizacionais de respeito ao meio ambiente, à comunidade, ao governo, aos consumidores, entre outros, estão hoje cada vez mais integrados às boas práticas da excelência em gestão.

Dessa forma, os resultados detectados nas pesquisas junto às empresas mos-tram, de um lado, a relevância do apoio governamental no sentido de facilitar o acesso a recursos para estes investimentos privados (via instrumentos creditícios ou legais). Por outro lado, as políticas vigentes de incentivos governamentais não têm sido implementadas de maneira a trazer resultados vantajosos. Além disso, a falta de recursos e de benefícios fiscais adequados não são as únicas carências nestes programas de apoio, pois, para a efetivação de resultados bem-sucedidos, é relevante a existência de uma infraestrutura de apoio institucional para a as-sessoria às empresas, com um sistema de informações adequado à distribuição destes benefícios, de formação de recursos humanos voltados para os objetivos do investimento social, entre outros acima mencionados. No entanto, a percepção de

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que a responsabilidade social das empresas pode ser usada como instrumento de desenvolvimento socioeconômico requer a priorização de um planejamento e a implementação de políticas públicas voltadas para a criação de uma rede de insti-tuições e dispositivos legais de fomento à criação do capital social ainda insuficiente no país, particularmente no atual período de crise socioeconômica internacional. É necessário salientar que, embora os investimentos sociais das empresas não de-vam ser considerados como a solução dos problemas sociais do país, consistem em um instrumento relevante e que pode trazer resultados significativos para o caminho do desenvolvimento sustentável.

6 CONCLUSÕES: REPENSANDO A REALIDADE BRASILEIRA

O aumento da competitividade internacional das empresas e do avanço tecnológico, que culminou na transnacionalização da produção e na globalização econômica, vem conduzindo ao crescente desgaste socioambiental, cujo contexto no mundo e, particularmente, no Brasil vem se tornando alarmante. Apesar dos benefícios que a globalização pode trazer, a preocupação mundial com os prejuízos sociais e ambientais da mundialização tem sido foco de mecanismos novos de discussão e operacionalização do fenômeno, em que o ser humano se coloque como agente central do sistema e receba o usufruto do desenvolvimento. Como contrapartida, observa-se no mundo a ampliação de medidas governamentais para a renovação do desenvolvimento das sociedades através de medidas de sustentabilidade em longo prazo. Paralelamente, dissemina-se a consciência de que as empresas que não in-corporarem em suas estratégias o engajamento com a efetiva ação para a solução das dificuldades socioambientais arriscam-se a perder oportunidades em mercados competitivos, que estão sendo crescentemente moldados por estes fatores.

Na realidade do Brasil, a consciência sobre a crise ambiental – que começou a se elevar nos anos 1990, juntamente com a percepção da continuidade do amplo grau de desigualdade social – ainda não alcançou sua difusão de forma efetiva através de ações políticas privadas que tivessem amplo êxito. Questões relacionadas à preocupação com o desequilíbrio macroeconômico foram prioritárias na agenda empresarial desde os anos 1980. A economia vem enfrentando a necessidade de conviver com políticas rígidas que buscam a estabilidade macroeconômica, mas que, no entanto, retardam e oneram o desenvolvimento social e econômico, particularmente nos períodos recen-tes de crise socioeconômica internacional.

De forma concomitante com a preservação do equilíbrio macroeconômico que já vem se delineando no país desde a segunda metade da década de 1990, a inclusão do país no mercado competitivo mundial e na busca de melhores con-dições de vida para a população passa pela integração com os demais países nas ações para a humanização do processo de globalização através do desenvolvimen-to sustentável. O papel do Estado é primordial nesse novo processo humanizante.

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Se o modo de produção capitalista ainda pode criar as condições favoráveis de melhoria do bem-estar da sociedade através da mundialização, as atribuições do governo, neste sentido, são transferir as responsabilidades de construção de capi-tal social também para o setor privado e manter-se como coordenador das políti-cas públicas de estímulo do processo produtivo empresarial.

No entanto, manter, paralelamente ao objetivo do equilíbrio macroeconômico, o objetivo da melhoria do bem-estar do homem-cidadão implica, entre outras ações, a necessidade de acentuar esta transferência ao setor privado, seja da produção e/ou da provisão de parte dos serviços sociais básicos, que elevam o capital humano, seja da criação de mecanismos e instituições que participem da formação da infraestru-tura de capital social do país. Em outras palavras, trata-se de criar condições legais e financeiras para a integração das ações de responsabilidade social das empresas privadas, com o processo de sustentabilidade do desenvolvimento do país. Os re-quisitos para esta integração são baseados, primeiramente, no entendimento de que o desenvolvimento sustentável deve ser interpretado de forma mais ampla do que apenas como a redução de impactos no meio ambiente, mas pressupõe também um compromisso com a redução da desigualdade social, a partir de uma política de justi-ça redistributiva, tanto da parte do Estado quanto de organização privadas.

Da parte das empresas, a responsabilidade pelo consumo de insumos e pro-dução sustentáveis implica um modelo de produção que busque minimizar dese-quilíbrios socioambientais, disseminando estas ações em toda a cadeia produtiva e em todo o ciclo de vida de um produto, inclusive no que se refere à geração e ao descarte de dejetos, que agravam as consequências da pobreza em certas localidades. Além do mais, o consumo sustentável de insumos investe na reciclagem e na reutilização dos resíduos da produção, no uso de embalagens e produtos biode-gradáveis e no emprego de tecnologias limpas, que utilizam de forma inteligente os recursos renováveis.

O Brasil dispõe de vantagens comparativas significativas em relação a outros países, referentes à biodiversidade e a outras condições naturais encontradas em seu território. Tais condições criam oportunidades de liderança no ambiente competitivo mundial, se as empresas procurarem formas sustentáveis de exploração destas vanta-gens, em atendimento às demandas originadas pela busca do desenvolvimento susten-tável. Contudo, como salientado, a preocupação não apenas se resume à sustentabili-dade ambiental, mas também se estende também à sustentabilidade socioeconômica de regiões empobrecidas, ao estimular a produção local e o uso de matérias-primas nativas, evocando as competências das pequenas comunidades (Lucas, 2006a).

A consciência sobre a utilização das ações de responsabilidade social das empresas como instrumento de desenvolvimento socioeconômico ainda não se difundiu no país. Paralelamente, esta percepção sobre a contribuição das empresas

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no desenvolvimento sustentável requer a priorização de um planejamento público e de implementação efetiva de políticas públicas de apoio dirigidas para a criação de uma rede de instituições e dispositivos legais de fomento à ampliação do capital social ainda insuficiente no país, particularmente no período atual de crise socioe-conômica internacional. Apesar da percepção de que a gestão da responsabilidade social não tem a possibilidade de resolver definitivamente as questões sociais arraigadas, este instrumento de apoio no Brasil pode desempenhar um papel con-siderável na ação de complementação da formação humana e organizacional em diversas áreas da sociedade e da economia.

A inclusão gradativa, na sociedade e nas empresas brasileiras, da ideia de res-ponsabilidade social já vem sendo ampliada no início deste século. Parcela do em-presariado e de outras instituições privadas, como as do ensino, vem tomando cons-ciência sobre a necessidade de uma postura que se contraponha à cultura de gestão organizacional centrada apenas na maximização do lucro dos acionistas. Assim, a ação dos agentes privados e governamentais, neste sentido, deve ser incorporada não ape-nas no discurso, mas também na prática da cultura organizacional destas instituições.

Em muitos países mais avançados, já se observa a integração entre as medi-das de responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável na prática econô-mica cotidiana. No entanto, no Brasil, a ação social das empresas envolvidas na responsabilidade social ainda é tímida e tem se voltado para o assistencialismo de curto prazo, através de projetos de ajuda filantrópica, de uma política de doações, não revestida de objetivos outros que diminuir momentaneamente dificuldades sociais enfrentadas pela comunidade social que vive no entorno das empresas.

No que se refere às condições do país de compartilhar os benefícios e ultra-passar os custos do processo de globalização, torna-se necessário uma ampliação da capacidade de resposta para adaptação às novas condições exigidas pelo ambiente de crise internacional. Alguns fatores determinantes desta capacidade estão fora da alçada governamental, e, desta maneira, é patente o novo papel das empresas produtoras de bens e serviços e das instituições financeiras para que a tomada de decisão a este respeito apresente uma faceta ética acentuada de comprometimento com a superação das dificuldades de elevação do bem-estar social. A inibição da competição predatória e da exclusão social requer não apenas a atuação eficiente de órgãos reguladores do Estado que atuem como direcionadores ao desenvolvi-mento social, mas também a formação de uma nova cultura organizacional, em que se efetive a atuação social estratégica das empresas privadas no processo de busca de formação do capital social e do desenvolvimento sustentável.

Sumarizando, as conclusões apontam que a busca pelo desenvolvimento sus-tentável não é apenas representada pela preocupação com a política ambiental, mas também inclui a melhora do bem-estar e da inclusão social da população.

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A responsabilidade social das empresas extrapola a mera filantropia aleatória e deve incorporar como complemento a criação e a ampliação do capital social da nação. Finalmente, a consciência da necessidade de integração das práticas de responsa-bilidade social com a busca do desenvolvimento sustentável deve ser disseminada como instrumento imprescindível para a maior inclusão de empresas no processo de mudanças socioeconômicas prementes do país, para a consecução destes objeti-vos de sustentabilidade.

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DESENVOLVIMENTO E FECUNDIDADE NO BRASIL: REVERSÃO DA FECUNDIDADE PARA MUNICÍPIOS MAIS DESENVOLVIDOS?*Ari Francisco de Araujo Junior**Márcio Antônio Salvato**Bernardo Lanza Queiroz***

Durante o último século, vários países observaram um aumento rápido no desenvolvimento econômico com declínio simultâneo nas taxas de crescimento da fecundidade e da população. Utilizando uma análise de regressão limiar, como proposto por Hansen (2000), este artigo investiga a associação negativa entre o desenvolvimento econômico e a fecundidade para os municípios brasileiros, utilizando dados do Censo de 2000 e do ínidice de desenvolvimento humano. Os resultados não demonstram nenhuma evidência para apoiar a existência de uma relação em forma de J invertido entre desenvolvimento e fecundidade como encontrado por Furuoka (2010) para os Estados Unidos, ao contrário dos resultados sugeridos por Myrskylä et al. (2009). Além disso, observaram-se quatro regimes diferentes, todos estatisticamente significativos, e há evidências de que a intensidade da relação no terceiro regime é mais fraca que os outros como é encontrada por Furuoka (2009).

Palavras-chave: fecundidade; divisão endógena da amostra; Brasil.

DEVELOPMENT AND FERTILITY IN BRAZIL: FERTILITY REVERSION FOR MORE DEVELOPED MUNICIPALITIES?

During the last century, several countries observed a rapid increase in economic development with simultaneous decline in fertility and population growth rates. Using a threshold regression analysis as proposed by Hansen (2000), this article investigates the negative association between economic development and fertility for Brazilian Municipalities using 2000 census and human development data. Results show no evidence to support the existence of an inverse J-shaped development-fertility as found by Furuoka (2010) to the United States, in opposite to the results suggested by Myrskylä et al. (2009). Moreover, we found four different regimes, all statistically significant, and there is evidence that the intensity of the relation in the third regime is weaker than others as is found by Furuoka (2009).

Keywords: fertility; endogenous sample split; Brazil.

* Os autores agradecem as inúmeras sugestões construtivas de dois revisores anônimos, voltadas à melhoria deste trabalho. Bernardo L. Queiroz agradece o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) por meio do Programa Pesquisador Mineiro. As opiniões, os comentários e as análises expressas neste documento são de inteira responsabilidade dos autores. ** Professor assistente do Departamento de Economia do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) de Minas Gerais.*** Professor associado do Departamento de Demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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DESARROLLO Y FECUNDIDAD EN BRASIL: REVERSIÓN DE LA FECUNDIDAD PARA MUNICIPIOS MÁS DESARROLLADOS?

Durante el siglo pasado, varios países se observó un aumento rápido en el desarrollo económico con la disminución simultánea de las tasas de fecundidad y el crecimiento de la población. Utilizando un análisis de regresión del umbral propuesto por Hansen (2000), este artículo investiga la asociación negativa entre el desarrollo económico y la fecundidad de los municipios brasileños con los datos del censo de 2000 y los datos de desarrollo humano. Los resultados muestran ninguna evidencia que apoye la existencia de una relación inversa entre el desarrollo en forma de J de la fecundidad que se encuentran por Furuoka (2010) a los Estados Unidos, de manera opuesta a los resultados sugeridos por Myrskylä et al. (2009). Además, se encontraron cuatro regímenes diferentes, todos estadísticamente significativos, y no hay evidencia de que la intensidad de la relación en el tercer régimen es más débil que los demás como se han encontrado los Furuoka (2009).

Palavras clave: fecundidad; division endogeno de la amuestra; Brasil.

LE DÉVELOPPEMENT ET LA FÉCONDITÉ AU BRÉSIL: LA RÉVERSION DE LA FERTILITÉ POUR LES MUNICIPALITÉS PLUS DÉVELOPPÉES?

Au cours du siècle dernier, plusieurs pays ont observé une vite augmentation dans le développement économique avec une baisse simultanée des taux de fécondité et la croissance de la population. En utilisant une analyse de régression proposé par Hansen (2000), cet article explore l’association négative entre le développement économique et de la fertilité pour les municipalités brésiliennes utilisant le recensement de 2000 et des données de développement humain. Les résultats ne montrent aucune preuve pour étayer l’existence d’une relation inverse en forme de J-développement de fécondité trouvée par Furuoka (2010) aux États-Unis, en face des résultats suggérés par Myrskylä et al. (2009). En plus, nous avons trouvé quatre régimes différents, tous statistiquement significatifs, et il est prouvé que l’intensité de la relation dans le troisième régime est plus faible que les autres comme on trouve par Furuoka (2009).

Mots-clés: fertilité; division endogène de l’échantillonnage; Brésil.

JEL: J10, J13, O10.

1 INTRODUÇÃO

Ao longo do último século, vários países observaram um rápido desenvolvimento econômico, com declínio simultâneo nas taxas de fecundidade e no crescimento populacional. Isto implica a existência de uma associação negativa entre desen-volvimento econômico e taxas de fecundidade.1 Ainda, Doepke (2004) considera o declínio de fecundidade como uma tendência universal, fato que se relaciona à transição demográfica e ao desenvolvimento econômico.

Todavia, em um artigo recente e provocador, Myrskylä et al. (2009) sugerem que a associação desenvolvimento-fecundidade negativa anterior tem de fato se tornado uma inversão em forma de J. Isto é, o índice de desenvolvimento humano (IDH) sendo positivamente associado à fecundidade em economias mais desenvolvidas.

1. Ver, por exemplo, Bryant (2007), Lee (2003), Balter (2006) e Bongaarts e Watkins (1996).

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91Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

A análise proposta por Myrskylä et al. (2009) foi dividida em duas partes. A primeira foca em estimativas transversais da relação entre desenvolvimento e fecundidade quanto a países de todos os níveis de desenvolvimentos – 107 países, em 1975; e 140, em 2005. Este primeiro olhar indica a relação em forma de J. Na segunda parte, foram analisadas 25 economias mais desenvolvidas que alcan-çaram o IDH de 0,90 em 2005. Uma análise longitudinal – dimensão maior – de países mais desenvolvidos que apresentavam IDH acima de 0,86 sugere que aumentos no nível de desenvolvimento elevam a fecundidade. Os autores argu-mentam que esta reversão no declínio da fecundidade é resultado do contínuo desenvolvimento econômico e social.

Os resultados apresentados no trabalho de Myrskylä et al. (2009) foram criticados, porque a divisão da amostragem em países de baixo e alto desenvol-vimento humano é realizada de forma ad hoc. Furuoka (2009), ao utilizar uma metodologia de amostragem com divisão endógena proposta por Hansen (2000), obtém resultados que não apoiam as conclusões de Myrskylä et al. (2009). Furuoka (2009) argumenta que a relação permanece estatisticamente negativa – porém mais fraca – nos países mais desenvolvidos.

Furuoka (2010) encontra evidências empíricas que sugerem uma relação negativa significante entre o produto interno bruto (PIB) per capita e a taxa de fecundidade total (TFT) quando o nível de renda no país estiver abaixo do valor limiar. O autor argumenta que esta associação negativa entre as duas variáveis reverteram para um relacionamento positivo quando o nível de renda exceder o valor limiar. Os resultados confirmam a existência de uma relação de fecundidade-desenvolvimento em forma de J invertido nos Estados Unidos.

Neste estudo, seguiu-se a mesma metodologia a fim de investigar se há regimes – padrões regulares – diferentes quanto à relação entre desenvolvimento e fecundidade no caso dos municípios brasileiros. O Brasil é um caso interessante de estudo da relação entre desenvolvimento econômico e o declínio da fecundi-dade em função das amplas diferenças sociais e econômicas entre os municípios. Pesquisas recentes demonstram como variações em variáveis econômicas afetam a mudança de fecundidade e seu ritmo de declínio. Contudo, estes trabalhos não investigam se regiões mais desenvolvidas possuem regimes – padrões regulares – desta relação durante a transição de rápida fecundidade observada no Brasil (Potter, Schmertmann e Cavenaghi, 2002; Potter et al., 2010; Muniz, 2010).

Este estudo está organizado da seguinte forma. A seção 2 define as principais características de uma discussão sobre a evolução e os determinantes da fecundi-dade brasileira. A seção 3 apresenta brevemente aspectos de análise de regressão limiar. A seção 4 define as principais características de uma análise preliminar da relação fecundidade-desenvolvimento de municípios brasileiros. A seção 5 relata testes e estimativas de efeitos limiares. Por fim, apresenta-se a conclusão.

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2 A FECUNDIDADE NO BRASIL: EVOLUÇÃO E DETERMINANTES

2.1 O rápido declínio da fecundidade

No decorrer dos últimos quarenta anos, o Brasil tem vivenciado um rápido declínio de suas taxas de fecundidade (Martine, 1996; Carvalho, 1998). A TFT sofreu declínio de 6,2% para 1,86%, em 2010, o que implica uma taxa de decresci-mento de 2,4% ao ano (a.a). O declínio da fecundidade reflete em uma queda significante das taxas de crescimento da população, de 2,8%, nos anos 1960, para 1,5% por ano na década de 1990.

TABELA 1 Taxa de fecundidade total – Brasil e regiões (1940-2010)(Em %)

Regiões 1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010

Brasil 6,2 6,2 6,3 5,8 4,4 2,9 2,3 1,86

Norte 7,2 8,0 8,6 8,2 6,4 4,2 3,2 2,42

Nordeste 7,2 7,5 7,4 7,5 6,2 3,7 2,6 2,01

Sudeste 5,7 5,5 6,3 4,6 3,5 2,4 2,1 1,66

Sul 5,7 5,7 5,9 5,4 3,6 2,5 2,2 1,75

Centro-Oeste 6,4 6,9 6,7 6,4 4,5 2,7 2,2 1,88

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE,1940; 1950; 1960; 1970; 1980; 1991; 2000; 2010).

A tabela 1 apresenta as TFTs para o Brasil e regiões, desde 1940 a 2010. Todas as regiões do país apresentaram rápido declínio em suas taxas de fecundi-dade ao longo deste período. Os dados mostram que um declínio mais rápido foi observado em partes mais desenvolvidas do país – regiões ao Sul. O Nordeste, a região mais pobre e menos desenvolvida, observou uma queda mais lenta nas dé-cadas iniciais, no entanto, desde 1980, suas taxas de declínio aceleraram e as TFTs demonstram alguns sinais de convergência com as menores taxas observadas no país (Potter et al., 2010).

O processo de declínio da fecundidade no Brasil é um dos mais impres-sionantes no mundo, e torna-se mais interessante quando se considera que não houve um programa de planejamento familiar agressivo como em outros países (Alves, 2006; Caetano, 2006; Martine, 1996). Em comparação com países que tiveram padrões similares de declínio da fecundidade ao longo de décadas recentes, o Brasil é mais lento que China, Hong Kong, Iran e Tailândia, Costa Rica e Coreia do Sul, entretanto, mais rápido que México, Índia e Bangladesh – apesar do fato de que todos estes países tiveram um programa de planejamento familiar, exceto o Brasil.

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93Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

Carvalho (1997-1998) sugeriu que a diminuição na fecundidade no Brasil não segue qualquer modelo teórico. Esta queda começou durante a explosão econômica – década de 1970 – e continuou durante os períodos agravantes de recessão econômica – 1980. Houve uma leve elevação nos níveis educacionais – a média dos anos escolares foi de 3,2, em 1976, para 5,3, em 1996 –, porém a qualidade e a distribuição regional desta expansão não podem ser vinculadas ao declínio da fecundidade.

Ainda, Carvalho e Brito (2005) mostraram que diversos fatores estão relacio-nados com as mudanças observadas no padrão da fecundidade no Brasil, e incluíram o uso de métodos contraceptivos, o aumento nos níveis educacionais, as mudanças institucionais e culturais, entre outros.

2.2 O que explica o declínio da fecundidade no Brasil?

Há uma vasta literatura que discute os determinantes do declínio da fecundidade no Brasil (Merrick e Berquó, 1983; Martine, 1996; Carvalho, 1997-1998; Carvalho e Brito, 2005). Um dos fatores importantes desta diminuição, conforme vários estudos, é o aumento e amplo uso de métodos contraceptivos no país. Dados provenientes das pesquisas de saúde e demográficas (DHS) mostram que mais de 66% das mulheres estavam utilizando algum método em 1986, e mais de 80%, em 2006. Uma parte considerável das mulheres utilizou esterilização feminina como método irreversível, gerando enormes impactos nos níveis de fecundidade.

TABELA 2Mulheres casadas (formais e informais) utilizando métodos contraceptivos – Brasil (1986-2006)(Em %)

Métodos 1986 1996 2006

Qualquer método 66,2 76,7 80,6

Métodos modernos 56,5 70,3 77,1

Esterilização 26,8 40,1 29,1

Vasectomia 0,8 2,6 5,1

Contraceptivo oral 25,7 22,0 28,7

DIU 1,0 1,1 1,9

Preservativo masculino 1,7 4,4 12,2

Tradicionais 9,0 6,1 3,2

Outros 1,2 0,4 0,4

Fonte: Berquó, Garcia e Lago (2008) e Amorim e Bonifácio (2010).

A tabela 2 mostra o uso de contracepção entre as mulheres casadas, formal-mente ou informalmente, no Brasil, entre 1986 e 2006. O aumento no uso de métodos ao longo do período é observado tanto em áreas desenvolvidas, quanto

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em áreas menos desenvolvidas do país. O fator mais marcante, como indicado, é que o governo não teve uma política de ação direta voltada ao uso de contracepção no país. Carvalho (1997-1998) e Martine (1996) mostraram que o governo federal manteve uma política de ação neutra referente ao planejamento familiar, quando a única posição clara era a de apoiar a decisão tomada pelos casais. Em 2006, 80,6% das mulheres no Brasil utilizaram algum tipo de método contraceptivo, destas, 29% utilizaram a pílula e 29% foram esterilizadas (Berquó, Garcia e Lago, 2008).

Em um estudo instigante, Vilmar Faria apresentou uma explanação original por trás do rápido declínio da fecundidade, e isto tem sido influente no debate atual sobre este tópico desde sua publicação. Faria (1997-1998) argumenta que o declínio rápido e persistente da fecundidade no Brasil é um efeito direto e indireto das mudanças institucionais exercidas pelo governo federal durante as últimas décadas. O autor sugere que apesar de o governo não ter determinado um planejamento familiar explícito, as transformações nas esferas institucionais, educacionais e estruturais têm impactos indiretos significantes nas decisões de fecundidade das famílias em todo o país.

Faria (1997-1998) sugeriu que quatro mudanças principais na estrutura so-cial brasileira conduziram ao declínio da fecundidade. A primeira consiste nas políticas de crédito que permitem a participação de uma grande parcela da popu-lação na economia de mercado, o que teve como efeito o aumento de consumo de bens duráveis – bens de consumo – e alterou os custos e as preferências na visão das famílias. Além disso, a universalização da comunicação em massa auxiliou a difundir o comportamento das decisões de fecundidade, a partir das áreas mais desenvolvidas do país, até às áreas menos desenvolvidas. Ainda, as melhorias no sistema de saúde e a universalização do programa de seguridade social reduzem a importância de a família cuidar dos mais velhos, elevando a importância do Estado como uma rede de segurança relevante. Além disso, Martine (1996) sugeriu que o rápido processo de urbanização e sua relação com a modernização, atuaram juntos com as crescentes matrículas escolares e a ascensão das mulheres, conduzindo a um rápido declínio da fecundidade.

Pesquisas recentes têm mostrado a importância de se considerar variáveis regionais na explanação do declínio da fecundidade no Brasil. Muniz (2010) discutiu a importância do comportamento de fecundidade em municípios vizinhos ao explicar as tendências de fecundidade no Brasil. O autor argumentou que a distribuição espacial de níveis de fecundidade tem uma forte relação com as taxas de fecundidade locais e também um efeito multiplicador. Potter, Schmertmann e Cavenaghi (2002) e Potter et al. (2010) entendem que há uma forte relação entre declínio de fecundidade e mudanças nas condições sociais e econômicas em

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95Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

todas as regiões do Brasil. Potter, Schmertmann e Cavenaghi (2002) argumen-taram que a fecundidade tem mudado pela difusão de novas ideias e interações sociais, o que está intimamente relacionado ao processo de desenvolvimento. Os autores ainda mostraram que, nas áreas urbanas, mudanças na fecundidade estão relacionadas ao amplo espectro de variáveis socioeconômicas, enquanto, em áreas rurais, melhorias na educação feminina exerceram um papel muito importante.

Potter et al. (2010) mostraram que o ritmo de declínio da fecundidade está diretamente relacionado às melhorias em medidas econômicas e sociais, contrário à ideia de que, tendo a fecundidade declinado, suas mudanças são independentes de alterações sociais e econômicas. Mais especificamente, os autores afirmam que as mudanças se iniciaram em algumas partes das regiões Sul e Sudeste, antes de 1960, e no Nordeste apenas na década de 1970. Um resultado importante aponta que regiões de transição antecipadas observaram um declínio muito mais lento que as de transição mais tardia. Por fim, estudos recentes têm mostrado, ainda, di-ferenças importantes em todos os grupos educacionais e de rendas, como um nú-mero maior de mulheres com melhor formação educacional apresentando menor fecundidade que as de menor formação educacional (Rios-Neto, 2005; Berquó e Cavenaghi, 2006; Alves e Cavenaghi, 2009).

3 ANÁLISE DE REGRESSÃO LIMIAR

Hansen (2000) apresenta uma metodologia econométrica – intervalos assintóticos de certeza ao parâmetro limiar – que separa, de uma forma endógena, uma amos-tragem em dois – ou mais – regimes-padrões regulares. Hansen (2000) mostra que uma variável exógena, denominada variável limiar, pode ser utilizada para dividir uma amostra, por exemplo, em dois padrões regulares – regimes – como sugere Furuoka (2009). Duas estimativas de efeito limiar de regimes endógenos podem ser representadas por uma equação, conforme se segue:

(1)

(2)

em que γ consiste no valor limiar, γ é uma variável dependente, x é uma variável independente, q é uma variável limiar, θ é o coeficiente angular de x, e e é o termo estocástico e/ou aleatório. O valor limiar é desconhecido, a priori, o que implica ser estimado como os outros parâmetros. Caso a variável limiar seja mais baixa que o valor limiar, a equação 1 representa o modelo mais adequado. Caso a variável limiar seja maior que o valor limiar, a equação 2 torna-se a especificação correta.

Furuoka (2009) emprega a seguinte especificação para regressão OLS sem efeito limiar:

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(3)

em que β0 é o intercepto , β1 o coeficiente angular, εi o termo de erro; FERi a taxa total de fecundidade do município i – número médio de crianças que uma mulher geraria se sobrevivesse até o final do período da idade reprodutiva e tivesse a experiência em cada estágio, de um conjunto particular de taxas de fecundidade específicas de idades, no caso, 2 mil municípios – taxas específicas de idades i. A variável HDIi (IDH) representa o índice de desenvolvimento humano do município i. Os dados foram obtidos no estudo Indicadores de desenvolvimento humano (ONU, 2003).

A regressão limiar pode ser especificada como:

(4)d{.} é uma função de indicador; quando é igual a 1 e é igual a0, se HDI é igual ou menor que o valor limiar. Esta situação indica regressão de primeiro regime. A regressão de segundo regime seria utilizada para os casos em que é igual a 0 e é igual a 1, se o IDH for maior que o valor limiar.

Nesse caso, torna-se necessário analisar estatisticamente a existência do efeito limiar – um ou mais – conforme sugerido pela equação (4). Utilizando Hansen (1997) como referência, o efeito limiar capta diferenças entre o primeiro e segundo coeficientes de regimes e/ou padrões regulares. Um teste de multiplicador de La-grange (LM), heterocedasticidade-consistente, pode ser utilizado para testar a hipó-tese nula, a fim de verificar se os coeficientes são os mesmos e se não há efeito limiar (Hansen, 1996). Hansen (1996; 2000) sugere o emprego de uma estatística Sup F (Andrews e Ploberger, 1994). Utilizou-se um procedimento denominado bootstrap (1.000 replicações) para obter os valores críticos, visto que o teste não apresenta distribuição assintótica padrão. Aqui, este teste é realizado até que nenhuma outra partição de amostragem esteja estatisticamente significante ao nível de 10%.

Em sequência, o valor limiar é estimado conforme Hansen (1997). Reali-zou-se sua estimativa usando um avaliador OLS visto que γ é o valor que mini-miza a variação residual:

(5)

Em que n é o número de observações, e ê, o termo de erro previsto.

Finalmente, é necessário definir os níveis de segurança e/ou certeza para γ. Hansen (2000) sugere que se use a estatística Likelihood Ratio (LR) – taxa de probabilidade (LR). Os dados utilizados no documento científico são coletados do Atlas do desenvolvimento humano no Brasil, para os 5.507 municípios brasileiros (ONU, 2003).

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97Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

4 FECUNDIDADE E DESENVOLVIMENTO: UMA ANÁLISE PRELIMINAR

O gráfico 1 demonstra a forte relação negativa entre a TFT e o IDH de municípios brasileiros em 1991. Esta relação parece ser negativa, porém menos intensa em 2000. De qualquer modo, isto significa que, para ambos os anos, os municípios com o maior desenvolvimento humano têm baixa fecundidade, e as mais altas taxas de fecundidade são observadas em municípios com menor desenvolvimento humano, em média. Há certa crítica ao uso de TFT de períodos a fim de analisar as mudanças em fecundidade. Em um estudo importante, Bongaarts e Feeney (1998) desenvolveram uma estimativa de fecundidade ajustada pelo tempo e/ou ritmo e efeitos quantum. Seus argumentos são de que taxas de períodos são afetadas por periodicidade de tempo e/ou variação de tempo e comportamento de fecundidade. Isto é, estimativas de fecundidade por período poderiam ser me-nores que realmente são, porque as mulheres estão adiando suas fertilidades. No caso do Brasil, não se espera que isto tenha muito efeito, haja vista que o perfil de idade de fecundidade no Brasil, tanto em 1991 quanto em 2000, não mostraram sinais de adiamentos de partos e/ou gestações. Além disso, não há informações suficientes para aplicar os métodos de Bongaarts e Feeney neste estudo. Myrskylä et al. (2009) testaram seus resultados em 41 países ajustando em função de efeitos tempo e/ou quantum, e obtiveram resultados similares.

GRÁFICO 1 Municípios brasileiros: fecundidade versus IDH (1991 e 2000)

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1

Linear (2000) Linear (1991)2000 1991

IDH

TFT

Fonte: ONU (2003).

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GRÁFICO 2 Municípios brasileiros: fecundidade versus IDH (2000)

1,5

2

2,5

3

3,5

4

0,78 0,8 0,82 0,84 0,86 0,88 0,9 0,92 0,94

Linear (IDH>=0,8) Linear (IDH>=0,85)IDH>=0,8 IDH>=0,85

IDH

TFT

Fonte: ONU (2003).

O gráfico 2 mostra que a relação negativa entre a TFT e o IDH em 2000 pode também ser observada nos municípios com o mais alto desenvolvimento humano – IDH acima de 0,80 e 0,85. Isto é, esta visão inicial – a partir de um critério exógeno para dividir a amostragem – sugere que a relação não reverte aos municípios de maior desenvolvimento humano no Brasil, con-trário ao que fora observado em relação a países por Myrskylä et al. (2009). Os resultados apresentados por estes autores são criticados porque a divisão da amostragem em países de baixo e alto desenvolvimento humano é feita de forma ad hoc.

Furuoka (2009), utilizando a metodologia proposta por Hansen (2000), encontra resultados que não corroboram as conclusões de Myrskylä et al. (2009). Furuoka (2009) argumenta que a relação permanece estatisti-camente negativa – porém mais fraca – nos países desenvolvidos. Entretanto, Furuoka (2010) encontra evidências que apoiam a existência de uma relação entre desenvolvimento-fecundidade em forma de J invertido nos Estados Unidos. A mesma metodologia é utilizada neste documento a fim de testar se há regimes – padrões regulares – estatisticamente diferentes quanto à relação entre desenvol-vimento e fecundidade no caso dos municípios brasileiros.

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99Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

5 RESULTADOS: TESTES E REGRESSÕES DE EFEITO LIMIAR

A tabela 3 apresenta resultados limiares de padrões regulares (regimes) obtidos pela metodologia de Hansen (2000). A primeira etapa da seleção de modelo li-miar, após 1.000 replicações, atinge o valor-p igual a zero para o teste LM. Isto sugere a existência de uma primeira divisão da amostragem total com base em IDH – rejeição de hipótese nula de nenhuma existência limiar.

TABELA 3 Quatro estimativas de efeito limiar de padrões regulares

Municípios

Regime 1 IDH £ 0,507 30

Regime 2 0,507 < HDI £ 0,641 1.575

Regime 3 0,641 < HDI £ 0,702 957

Regime 4 IDH > 0,702 2.945

Fonte: ONU (2003) e estimativas.

O valor limiar estimado por mínimos quadrados ordinários (MQO) que minimiza a variação e/ou divergência residual e estatísticas LR é de 0,507 (gráfico 3) com certeza assintótica de 95% entre [0,507;0,591]. Este valor divide a amos-tragem em dois grupos: um com trinta municípios de mais baixo desenvolvimen-to humano; e um grupo maior de todos os 5.477 municípios.

GRÁFICO 3Intervalo de certezas variáveis limiares

0,45 0,5 0,55 0,6 0,65 0,7 0,75 0,8 0,85 0,9 0,95

0

5

10

15

20

25

30

35

Valor do limiar Intervalo de confiança: 95%

Intervalo de confiança para construção do limiar

Seq

uên

cia

do

lim

iar

em g

ama

Variável definidora do limiar (IDH)

Fonte: ONU (2003) e estimativas.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013100

A seleção de segunda etapa2 é baseada em 5.477 municípios com IDH acima de 0,507. O valor-p é igual a zero para o teste LM, o que sugere a existência de uma segunda divisão desta amostragem baseada em IDH. O valor limiar estimado por MQO que minimiza a variação e/ou divergência residual e a estatística LR é de 0,702 (gráfico 4) com certeza assintótica de 95% entre [0,536;0,729]. Este valor divide a amostragem em dois grupos: um com 2.532 (0,507 < HDI £ 0,702) municípios e outro com 2.945 municípios (IDF > 0,702).

A seleção de terceira etapa é baseada em 2.532 municípios. O valor-p é igual a zero para o teste LM, o que sugere a existência de uma nova divisão nesta amos-tragem, com base no IDH. O valor limiar estimado por MQO que minimiza a variação e/ou divergência residual e estatística LR é de 0,641 (gráfico 5) com certeza assintótica de 95% entre [0,533;0,662]. Este valor divide a amostragem em dois grupos: um com 1.575 municípios (0,507 < HDI £ 0,641 e outro com 957 municípios (0,641 < HDI £ 0,702).

GRÁFICO 4Intervalo de certeza variável limiar

0,5 0,55 0,6 0,65 0,7 0,75 0,8 0,85 0,9 0,95

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

LRN(Gema) 95% Crítico

Fonte: ONU (2003) e estimativas.

2. Furuoka (2009) não reproduziu a segunda – ou seguintes rodadas na seleção de modelos limiar. Isto significa que uma confirmação estatística mais apropriada não foi feita, o que implica a persistência da dúvida sobre os resultados de Myrskylä et al. (2009).

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101Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

GRÁFICO 5Intervalo de certeza variável limiar

LRN(Gema) 95% Crítico

0,5 0,55 0,6 0,65 0,7 0,75

0

5

10

15

20

25

Fonte: ONU (2003) e estimativas.

Divisões adicionais de subamostras de 30, 1.575, 957 e 2.945 municípios foram testadas (HDI £ 0,507; 0,507 < HDI £ 0,641; 0,641 < HDI £ 0,702; HDI > 0,702), porém não rejeitaram a hipótese nula de nenhuma existência de limiar em cada caso.

A tabela 4 apresenta coeficientes estimados e seus erros-padrões – em parênteses – para a relação entre fecundidade e IDH para todos os municípios brasileiros e diferentes subamostras – regimes e/ou padrões regulares – definidos previamente.

TABELA 4 Estimativas MQO com e sem efeito limiar

Sem estimativa de efeito limiar

Estimativas de efeito limiar

Regime 1Municípios HDI £DI cíp

Regime 2Municípios

0,507 < HDI £,507 <

Regime 3Municípios

0,641 < HDI £,641 <

Regime 4Municípios

HDI > 0,702

Constante6,995 1

(0,074)-12,856 3

(6,669)7,458 1

(0,364)8,223 1

(0,821)6,107 1

(0,141)

IDH-5,907 1

(0,099)35,467 2

(13,662)-6,738 1

(0,609)-7,630 1

(1,214)-4,763 1

(0,181)

R2 0,438 0,137 0,079 0,037 0,191

Número de observações

5.507 30 1.575 957 2.945

Fonte: ONU (2003) e estimativas.Notas: 1 Significância em nível de 1%.

2 Significância em nível de 5%.3 Significância em nível de 10%.

Obs.: os valores entre parênteses indicam estatística-t .

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013102

A regressão de mínimos quadrados ordinários (MQO) para a amostra total de municípios brasileiros revela a bem conhecida relação entre fecundidade e desenvolvimento humano. Em outras palavras, taxas baixas de fecundidade estão estatisticamente relacionadas ao alto desenvolvimento humano. Apesar disso, a intensidade de associação é mais fraca que a observada por Furuoka (2009).

GRÁFICO 6 Municípios brasileiros: fecundidade versus IDH (2000)

1,5

2,5

3,5

4,5

5,5

6,5

7,5

8,5

0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1

IDH<=0,507 0,507<IDH<=0,641 0,641<IDH<=0,702 IDH>0,702

Linear (IDH<=0,507) Linear (0,507<IDH<=0,641) Linear (0,641<IDH<=0,702) Linear (IDH>0,702)

Fonte: ONU (2003) e estimativas.

Questões interessantes foram reveladas pelas estimativas de limiar MQO (gráfico 6). Para o primeiro regime identificado – trinta municípios –, a associação fecundidade-desenvolvimento é positiva e significante ao nível de 5%. Isto é, observa-se que, para municípios na parte inferior de desenvolvimento econô-mico, níveis mais altos de desenvolvimento econômico tendem a ser associados com taxas mais altas de fecundidade. Este resultado pode ser relacionado às características destes municípios: pequenas populações, predominantemente rurais e localizadas na região Norte. Contudo, para municípios com alto IDH, estes níveis estão associados a menores taxas de fecundidade, apesar de a relação ser mais fraca. Nos outros três casos de regimes e/ou padrões regulares, a relação tradicional é observada – com alta significância estatística em todos os casos. Vale ressaltar que a intensidade do terceiro regime é mais fraca que a dos outros três, como observado por Furuoka (2009). Além disso, Furuoka (2010) concluiu, em relação aos Estados Unidos, que não há evidências para apoiar a existência de uma relação desenvolvimento-fecundidade em forma de J invertido quanto aos municípios brasileiros.

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103Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

6 CONCLUSÕES

Durante o ultimo século, diversos países observaram um rápido aumento no desenvolvimento econômico com declínio simultâneo nas taxas de fecundidade e crescimento populacional. Em um artigo recente, Myrskylä et al. (2009) suge-rem que a anterior associação desenvolvimento-fecundidade negativa tem de fato tornado-se uma associação em forma de J invertido, isto é, o IDH sendo positiva-mente associado à fecundidade entre os países mais desenvolvidos. Os resultados deste estudo indicam uma clara correlação negativa entre fecundidade e desen-volvimento. Não se pode determinar, todavia, se o desenvolvimento econômico causa declínio na fecundidade.

Utilizando-se uma análise de regressão limiar, como proposta por Hansen (2000), este artigo investiga esta associação negativa entre o desenvolvimento eco-nômico e a taxa de fecundidade nos municípios brasileiros usando dados do censo demográfico brasileiro e do IDH municipal. Este estudo mostra que a influência do desenvolvimento econômico na fecundidade, no Brasil, tem a mesma direção conforme prevista por literatura pertinente. Os resultados empíricos deste estudo fundamentam a hipótese de que um maior desenvolvimento humano – e desen-volvimento econômico – está relacionado aos níveis mais baixos de fecundidade. Os resultados obtidos aqui não mostram nenhuma evidência que apoie a existên-cia de uma relação desenvolvimento-fecundidade em forma de J invertido, como observado por Furuoka (2010) para os Estados Unidos, de modo contrário aos resultados sugeridos por Myrskylä et al. (2009). Ainda, foram encontrados quatro regimes estatisticamente significantes e há evidências de que a intensidade do ter-ceiro regime é menor que de outros, conforme encontrado por Furuoka (2009).

As evidências deste estudo também contribuem para o debate sobre as ten-dências futuras da fecundidade no Brasil. Os resultados indicam que, na medida em que os municípios desenvolvem-se, é possível encontrar maiores declínios nas taxas de fecundidade total. Os resultados também sugerem questionamentos sobre como políticas públicas poderiam afetar o futuro comportamento de fecun-didade no Brasil.

De modo geral, as taxas mais baixas de fecundidade estão associadas a maio-res taxas de participação das mulheres no mercado de trabalho, assim, conforme a força de trabalho feminina aumenta, pode-se esperar maior declínio de fecundi-dade no Brasil. A reversão das baixas taxas de fecundidade exigirá políticas de ação apropriadas, especialmente dirigidas aos cuidados com crianças – creches – e rela-ções de trabalho mais flexíveis. Por um lado, taxas de fecundidade baixas poderiam ser vinculadas a maiores investimentos em capital humano de crianças, o que pode conduzir a impactos positivos às sociedades e à economia (Lee e Mason, 2010). Por outro lado, como o Brasil enfrenta um rápido envelhecimento da população,

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013104

à medida que a fecundidade continuar a declinar, o processo poderia tomar um ritmo mais veloz, impactando ainda mais as futuras tendências de tamanho e estrutura etária da população no Brasil. Os possíveis impactos de envelhecimento da população são bem conhecidos e discutidos em outros estudos (Wong e Car-valho, 2006; Rios-Neto, 2005).

Esta pesquisa, no entanto, tem limitações, visto que se concentrou nos da-dos de 2000. Outros estudos são necessários a fim de testar a hipótese de uma relação em forma de J invertido entre a fecundidade e o desenvolvimento. É im-portante testar a hipótese com os dados do Censo de 2010. Estudos mais amplos devem utilizar outras medidas de desenvolvimento econômico (Luci e Thvenon, 2010), tais como a participação das mulheres no mercado de trabalho, ascensão feminina e outras medidas específicas de gênero, com vistas a testar os vínculos entre variação de fecundidade e normas institucionais e sociais no Brasil. Atenção especial deve ser conferida às mudanças na participação das mulheres no mercado de trabalho e no status feminino na sociedade (Brewster e Rindfuss, 2000), visto que diversas pesquisas têm concluido, para alguns países europeus, uma relação positiva entre níveis de fecundidade e a participação da força de trabalho femini-na (Billari e Kohler, 2004).

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105Desenvolvimento e Fecundidade no Brasil: reversão da fecundidade para municípios mais desenvolvidos?

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Originais submetidos em outubro de 2011. Última versão recebida em julho de 2012. Aprovado em julho de 2012.

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DEVELOPMENT AND FERTILITY IN BRAZIL: FERTILITY REVERSION FOR MORE DEVELOPED MUNICIPALITIES?Ari Francisco de Araujo Junior*1

Márcio Antônio Salvato**Bernardo Lanza Queiroz***

During the last century, several countries observed a rapid increase in economic development with simultaneous decline in fertility and population growth rates. Using a threshold regression analysis as proposed by Hansen (2000), this article investigates the negative association between economic development and fertility for Brazilian municipalities using 2000 census and human development data. Results show no evidence to support the existence of an inverse J-shaped development-fertility as found by Furuoka (2010) to the United States, in opposite to the results suggested by Myrskylä et al (2009). Moreover, we found four different regimes, all statistically significant, and there is evidence that the intensity of the relation in the third regime is weaker than others as is found by Furuoka (2009).

Keywords: fertility; endogenous sample split; Brazil.

DESENVOLVIMENTO E FECUNDIDADE NO BRASIL: REVERSÃO DA FECUNDIDADE PARA MUNICÍPIOS MAIS DESENVOLVIDOS?

Durante o último século, vários países observaram um aumento rápido no desenvolvimento econômico com declínio simultâneo das taxas de crescimento da fertilidade e da população. Usando uma análise de regressão limiar como proposto por Hansen (2000), este artigo investiga a associação negativa entre o desenvolvimento econômico e fertilidade para os municípios brasileiros, utilizando dados do Censo de 2000 e de desenvolvimento humano. Os resultados não mostram nenhuma evidência para apoiar a existência de uma relação inversa em forma de J desenvolvimento fertilidade como encontrado por Furuoka (2010) para os Estados Unidos, ao contrário dos resultados sugeridos pelo Myrskylä et al. (2009). Além disso, foram observados quatro regimes diferentes, todos estatisticamente significativos, e há evidências de que a intensidade da relação no terceiro regime é mais fraca do que os outros como é encontrada por Furuoka (2009).

Palavras-chave: fecundidade; divisão endógena da amostra; Brasil.

* Assistant Professor. Website: <http://sites.google.com/site/arifaj/>. Department of Economics, IBMEC Minas, available at: <http://www.ibmec.br/sub/mg/>. R. Rio Grande do Norte, 300, Funcionários 30130-130 – Belo Horizonte, MG – Brasil. ** Assistant Professor. Website: <http://www.marciosalvato.com/site/>. Department of Economics, IBMEC Minas, available at: <http://www.ibmec.br/sub/mg/>. R. Rio Grande do Norte, 300 – Funcionários 30130-130 – Belo Horizonte, MG – Brasil. *** Associate Professor. Website: <http://sites.google.com/site/blanza/>. Department of Demography Universidade Federal de Minas Gerais, available at: <www.cedeplar.ufmg.br> Av. Antônio Carlos, 6627 – Pampulha – Belo Horizonte, MG – Brasil.

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DESARROLLO Y FECUNDIDAD EN BRASIL: REVERSIÓN DE LA FECUNDIDAD EN LOS MUNICIPIOS MÁS DESARROLLADOS?

Durante el siglo pasado, varios países se observó un aumento rápido en el desarrollo económico con la disminución simultánea de las tasas de fecundidad y el crecimiento de la población. Utilizando un análisis de regresión del umbral propuesto por Hansen (2000), este artículo investiga la asociación negativa entre el desarrollo económico y la fertilidad de los municipios brasileños con censos de 2000 y los datos de desarrollo humano. Los resultados muestran ninguna evidencia que apoye la existencia de una relación inversa entre el desarrollo en forma de J de la fertilidad que se encuentran por Furuoka (2010) a los Estados Unidos, de manera opuesta a los resultados sugeridos por Myrskylä et al (2009). Además, se encontraron cuatro regímenes diferentes, todos estadísticamente significativos, y no hay evidencia de que la intensidad de la relación en el tercer régimen es más débil que los demás como se han encontrado los Furuoka (2009).

Palavras clave: fecundidade; division endogeno de la amuestra; Brasil.

LE DÉVELOPPEMENT ET LA FÉCONDITÉ AU BRÉSIL: LA FERTILITÉ RÉVERSION POUR LES MUNICIPALITÉS PLUS DÉVELOPPÉS?

Au cours  du siècle dernier,  plusieurs pays  ont observé une vite  augmentation  dans le développement économique avec une baisse simultanée des taux de fécondité et la croissance de la population.  En utilisant  une analyse de régression proposé par Hansen  (2000),  cet article explore  l’association négative  entre le développement économique  et de la fertilité  pour les municipalités brésiliennes utilisant  le recensement de 2000 et des données de développement humain. Les résultats ne montrent aucune preuve pour étayer l’existence d’une relation inverse en forme de J-développement de fécondité trouvée par Furuoka (2010) aux États-Unis, en face des résultats suggérés par Myrskylä et al (2009). En plus, nous avons trouvé quatre régimes différents, tous statistiquement significatifs, et il est prouvé que l’intensité de la relation dans le troisième régime est plus faible que les autres comme on trouve par Furuoka (2009).

Mots-clés: fertilité; division endogène de l’échantillonnage; Brésil.

JEL: J10, J13, O10.

1 INTRODUCTION

During the last century, several countries observed a rapid economic development with simultaneous decline in fertility and population growth rates. This implies that there exists a negative association between economic development and fertility rate.1 In addition, Doepke (2004) considers fertility decline a universal trend, fact related to the demographic transition and economic development.

However, in a recent and provoking paper, Myrskylä et al. (2009), suggest that the previously negative development–fertility association has actually become an inverse J-shaped. That is, Human Development Index (HDI) being positively associated with fertility in more developed economies. The analysis proposed by Myrskylä et al (2009) was divided in two parts. The first part focuses on cross-

1. See, for example, Bryant (2007), Lee (2003), Balter (2006) and Bongaarts (1996).

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111Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

sectional estimates of the relation between development and fertility for countries of all levels of development (107 countries in 1975 and 140 in 2005). This first look indicates the J-shaped relation. In the second part, they analyzed 25 more de-veloped economies that have reached HDI of .90 in 2005. Longitudinal analysis for more developed countries, as they entered HDI above 0.86, suggests that increases in development level increases fertility. They argued that this reversal in fertility decline is a result of continued economic and social development.

The results presented in Myrskylä et al. (2009) were criticized because the split of the sample in low and high human development countries is done on an ad hoc basis. Furuoka (2009), using endogenous split sample methodology proposed by Hansen (2000), finds results that do not support Myrskylä et al (2009) conclusions. Furuoka (2009) argues that the relationship remains statistically negative (but weaker) for developed countries. Furuoka (2010) finds empirical evidence suggesting a significant negative relationship between per capita GDP and the Total Fertility Rate (TFR) when income level in the country was below the threshold value. The author argues that this negative association between the two variables reversed to a positive relationship when income level had exceeded the threshold value. The results confirm the existence of an inverse J-shaped fertility-development relationship in the United States.

In this paper, we follow the same methodology to investigate whether there are different regimes for the relationship between development and fertility in the case of Brazilian municipalities. Brazil is an interesting case to study the relationship between economic development and fertility decline because of large differences among the municipalities. Recent research (Potter et al, 2002; Potter et al, 2010: Muniz, 2010) showed how variations in economic measures affect fertility change and its pace of decline. However, these papers do not investigate whether more developed regions have different regimes of the relationship during the rapid fertility transition observed in Brazil.

The paper is organized as follows. Section 2 outlines a discussion about the evolution and the determinants of Brazilian fertility. Section 3 briefly presents as-pects of threshold regression analysis. Section 4 outlines a preliminary analysis of fertility-development relationship for Brazilian municipalities. Section 5 reports tests and threshold effects estimations. Section 6 concludes.

2 FERTILITY IN BRAZIL: EVOLUTION AND DETERMINANTS

2.1 The rapid fertility decline

Over the last 40 years, Brazil has experienced a rapid decline of its fertility rates (Martine,1996; Carvalho, 1997/1998). The Total Fertility Rate (TFR) declined from 6.2 in 1940 to 1.86 in 2010, which implies a rate of decline of 2.47% per year.

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The decline of fertility reflects in impressive decline in the population growth rates, from 2.8% in the 1960’s to 1.5% per year in the 1990’s.

TABLE 1 Total fertility rates – Brazil and Regions (1940-2010)

RegionsTotal Fertility Rates

1940 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010

Brazil 6.2 6.2 6.3 5.8 4.4 2.9 2.3 1.86

North 7.2 8.0 8.6 8.2 6.4 4.2 3.2 2.42

Northeast 7.2 7.5 7.4 7.5 6.2 3.7 2.6 2.01

Southeast 5.7 5.5 6.3 4.6 3.5 2.4 2.1 1.66

South 5.7 5.7 5.9 5.4 3.6 2.5 2.2 1.75

Mid-West 6.4 6.9 6.7 6.4 4.5 2.7 2.2 1.88

Source: IBGE, Brazilian Censuses, 1940-2010.

Table 1 presents the TFR’s for Brazil and regions from 1940 to 2010. All the regions in the country observed rapid decline in their fertility rates over this period. The data show that a faster decline was observed in the more developed parts of the country (southern regions). The Northeast, the poorest and less developed region, observed a slower decline in the early decades, but since 1980 its rates of decline are accelerating and the observed TFR shows some signs of convergence with the lowest ones observed in the country (Potter et al, 2010).

The process of fertility decline in Brazil is one of the most impressive in the world, and it becomes more interesting when one considers that there was not an aggressive family planning program as observed in other countries (Alves, 2006; Caetano, 2004; Martine, 1996). In comparison with countries that had similar patterns of fertility decline over recent decades, Brazil is slower than China, Hong Kong, Iran and Thailand, Costa Rica and South Korea, but much faster than Mexico, India and Bangladesh – despite the fact that all these countries had a family planning program, but Brazil.

Carvalho (1997/1998) suggested that the decline in fertility does not follow any theoretical model. Its decline started during the economic boom (1970’s) and continued during the times of severe economic recession (1980); there was a slightly increase in the educational levels (the average years of schooling went from 3.2 in 1976 to 5.3 in 1996) but the quality and the regional distribution of this spread cannot easily be linked to the decline of fertility.

Also, Carvalho and Brito (2005) showed that several factors are related to the observed changes in the pattern of fertility in Brazil and included contra-ceptive use, increase in educational levels, institutional and cultural changes, among others.

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113Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

2.2 What explains fertility decline in Brazil?

There is a wide body of literature discussing the determinants of fertility decline in Brazil (for example see Merrick & Berquo, 1983; Martine, 1996; Carvalho, 1997/1998 and Carvalho & Brito, 2005). One of the important factor to the decline of fertility in Brazil according to several studies is the increasing and widespread use of contraceptive methods in the country. Data from the Demographic and Health Surveys showed that over 66% of women were using any method in 1986 and over 80% in 2006. A large part of women were using female sterilization which is an irreversible method therefore having major impacts on the fertility levels.

TABLE 2 Percentage of married (formal and informal) women using contraceptive methods – Brazil (1986-2006)

Methods 1986 1996 2006

Any Method 66.2 76.7 80.6

Modern Methods 56.5 70.3 77.1

Sterelization 26.8 40.1 29.1

Vasectomy 0.8 2.6 5.1

Oral Contraceptive 25.7 22 28.7

DIU 1.0 1.1 1.9

Male condom 1.7 4.4 12.2

Tradicional 9 6.1 3.2

Other 1.2 0.4 0.4

Source: Demographic and Health Survey, 1986-1996; PNDS, 2006 and Amorim and Bonifácio (2010).

Table 2 shows the use of contraception among married women, formal and informal, in Brazil between 1986 and 2006. The increase in the use of methods over the period is observed in both developed and less developed areas of the country. The most striking factor, as already indicated, is that the government did not have a direct policy towards the use of contraception in the country. Carvalho (1997/1998) and Martine (1996) showed that the federal government maintained a neutral policy regarding family planning, when the only clear position was to support the decision made by the couples. In 2006, 80.6% of women in Brazil used some sort of contraceptive method, of those 29% use the pill and 29% were sterilized (Berquó et. al, 2008).

In a provoking paper, Vilmar Faria presented an original explanation behind Brazil’s rapid fertility decline, and this has been influential in the ongoing debate on this topic since its publication. Faria (1997/1998) argues that the rapid and persistent decline of fertility in Brazil is a direct and indirect effect of the institutional

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013114

changes carried out by the federal government over the last decades. The author suggests that although the government did not an explicit family planning program, the transformations in the institutional, educational and structural spheres have significant indirect impacts on the fertility decisions of families all over the country.

Faria (1997/1998) suggested that four (4) major changes in the Brazilian social structure lead to the decline in fertility. The first one is the credit policies which allow the participation of a major part of the population in the market economy, had effect of increasing the consumption of durable goods (consu-mer goods) and changed the costs and preferences faced by the families. In addition to that, universalization of mass communication helped to spread fertility decision behavior from the more developed areas of the country to the less developed. Also, improvements in the health care system and universali-zation of the social security program reduce the importance of the family to take care of the elderly increasing the importance of the state as an important safety net In addition to that, Martine (1996) suggested that the rapid process of urbanization, and its relation to modernization, acted together with the increasing school enrollment and the empowerment of women leading to a fast fertility decline.

Recent research has shown the importance of considering regional varia-bles in explaining fertility decline in Brazil. Muniz (2010) discussed the impor-tance of fertility behavior in neighboring municipalities in explaining fertility trends in Brazil. The author argued that spatial distribution of fertility levels has a strong relation to local fertility rates and, also, a multiplier effect. Potter et al (2002) and Potter et al. (2010) find strong relationship between fertility decline and changes in social and economic conditions across regions in Brazil. Potter et al (2002) argued that fertility has changed through the spread of new ideas and social interaction, which is closely related to the process of development. The authors also show that in the urban areas changes in fertility are related to a wide spectrum of socioeconomic variables, whereas in rural areas improvements in female education played a very important role. Potter et al (2010) showed that the pace of fertility decline is directly related to improvements in economic and social measures contrary to the idea that once fertility has started to decline its changes are independent from social and economic changes. More specifically, they find that changes started in some parts of the south and southeast regions before the 1960 and in the northeast only in the 1970s. An important finding is that early transition regions observed a much slower decline than later ones. Finally, recent studies have shown still important differences across educational and income groups, with more educated women presenting much lower fertility than less educated ones (Rios-Neto, 2005; Berquo & Cavenaghi, 2006; Alves & Cavenaghi, 2009).

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115Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

3 THRESHOLD REGRESSION ANALYSIS

Hansen (2000) presents an econometric methodology – asymptotic confidence intervals to the threshold parameter – that separates, in an endogenous way, one sample in two (or more) regimes. Hansen, in a paper published in Econometrica, shows that one exogenous variable, called threshold variable, can be used to split a sample, for example, in two different regimes as suggests by Furuoka (2009).2 Two regimes endogenous threshold effect estimation can be represented by the equations as follows:

(1)

(2)

where γ is the threshold value, y a dependent variable, x an independent variable, q a threshold variable, θ is the angular coefficient of x, and e is the stochastic term. The threshold value is a priori unknown, what implies that it must be estimat-ed as the other parameters. If the threshold variable is lower than the threshold value, equation 1 represents the more adequate model. If the threshold variable is greater than the threshold value, equation 2 became the correct specification.

Furuoka (2009) employs the following specification for OLS regression without threshold effect:

(3)

where β0 is the intercept term, β1 the angular coefficient, εi the error term; FERi the total fertility rate of municipality i (average number of children a woman would bear if she survived through the end of the reproductive age span and experienced at each age a particular set of age-specific fertility rates, in the case, 2000 municipality i age-specific rates); HDIi the human development index of municipality i. The dataset used by the author were obtained from the Human Development Indicators (PNUD, 2003).

The threshold regression can be specified as:

(4)

d{.} is an indicator function; when equals to 1 and equals to 0, if HDI is equal to or less than the threshold value. This situation indicates “first regime” regression. The “second regime” regression would be used for the cases when equals to 0 and equals to 1, if HDI is greater than the threshold value.

2. In this paper we test the existence of more than two regimes.

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In this case, it is necessary to analyze statistically the existence of the threshold effect (one or more) as suggested by equation (4). Following Hansen (1997), the threshold effect captures differences among the first and second regimes coefficients. A heteroskedascity-consistent Lagrange Multiplier (LM) test can be used to test the null hypothesis whether the coefficients are the same and there’s no threshold effect (Hansen, 1996). Hansen (1996; 2000) suggests employing a Sup F statistic (Andrews e Ploeberger, 1994). We use a bootstrap proceeding (1000 replications) to obtain the critical values since the test do not presents standard asymptotic distribution. Here, this test is performed until no other sample partition is statistically significant at 10% level.

In sequence, the threshold value is estimated as Hansen (1997). We estimated it using an OLS estimator as γ is the value that minimizes the residual variance:

(5)

where n is the number of observations and ê the estimated error term.

Finally, it is necessary to define confidence levels to γ. Hansen (2000) suggests to use the Likelihood Ratio (LR) statistic. Data used in the paper are collected from Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil (PNUD, 2003) to the 5507 Brazilian municipalities.

4 FERTILITY AND DEVELOPMENT: A PRELIMINARY ANALYSIS

Graph 1 shows the strong negative relationship between the Total Fertility Rate (TFR) and the HDI of Brazilian municipalities in 1991. This relationship appears to be negative but less intense in 2000. Anyway, this means that for both years, municipalities with the highest human development have low fertility and the highest fertility rates are observed in municipalities with lower human development, on average. There are some criticisms to the use of period TFR to analyze the changes in fertility. In an important paper, Bogaarts and Feeney (1998) developed an estimate of fertility adjusted by tempo and quantum effects. Their argument is that period rates are affected by the timing of fertility behavior. That is, period fertility estimates might be lower than they actually are, because women are postponing their fertility. In the case of Brazil, we do not expect this to have much effect, because the age profile of fertility in Brazil, both in 1991 and 2000, did not show signs of childbearing postponement. Moreover, we do not have enough information to apply Bongaarts and Feeney method to our data. Myrskylä et al (2009) tested their results, for 41 countries, adjusting for tempo-quantum effects and obtained similar results.

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117Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

GRAPH 1 Brazilian municipalities: fertility X HDI (1991 and 2000)

0

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1

Linear (2000) Linear (1991)2000 1991

HDI

Fert

ility

Source: Atlas do Desenvolvimento Humano (PNUD, 2003).

GRAPH 2 Brazilian municipalities: fertility X HDI (2000)

1.5

2

2.5

3

3.5

4

0.78 0.8 0.82 0.84 0.86 0.88 0.9 0.92 0.94

Linear (IDH>=0.8) Linear (IDH>=0.85)IDH>=0.8 IDH>=0.85

HDI

Fert

ility

Source: Atlas do Desenvolvimento Humano (PNUD, 2003).

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013118

Graph 2 shows that the negative relationship between Total Fertility Rate (TFR) and HDI for the year 2000 can also be observed for the municipalities with the highest human development (HDI above 0.80 and 0.85). That is, this initial view (from an exogenous criterion for split the sample) suggests that the relationship does not revert to the municipalities of greater human develop-ment in Brazil, contrary to what was observed for countries by Myrskylä et al. (2009). The results presented in Myrskylä et al. (2009) are criticized because the split of the sample in low and high human development countries is done on an ad hoc basis.

Furuoka (2009), using the methodology proposed by Hansen (2000) finds results that do not support Myrskylä et al. (2009) conclusions. Furuoka (2009) argues that the relationship remains statistically negative (but weaker) for developed countries. However, Furuoka (2010) finds evidence to support the existence of an inverse J-shaped development-fertility to the United States. The same methodology is used in this paper to test if there are statistically diffe-rent regimes for the relationship between development and fertility in the case of Brazilian municipalities.

5 RESULTS: TESTS AND THRESHOLD EFFECT REGRESSIONS

Table 3 presents regimes threshold results obtained from Hansen (2000) method-ology. First round of threshold model selection, after 1,000 replications, achieve p-value equal zero to LM test. This suggests a first split existence of the total sample based on HDI (null hypothesis rejection of no threshold existence).

TABLE 3 Four regimes threshold effect estimation

Regime 1 HDI £ 0.507 30 municipalities

Regime 2 0.507 < HDI £ 0.641 1,575 municipalities

Regime 3 0.641 < HDI £ 0.702 957 municipalities

Regime 4 HDI > 0.702 2,945 municipalities

See the text.

Threshold value estimated by OLS that minimizes residual variance and LR statistics is 0.507 (Figure 1) with asymptotic confidence of 95% between [0.507000;0.591000]. This value splits the sample in two groups: one with 30 municipalities with the lowest human developed municipalities and a larger group of all 5,477 municipalities.

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119Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

FIGURE 1Threshold variable confidence interval

0.45 0.5 0.55 0.6 0.65 0.7 0.75 0.8 0.85 0.9 0.95

0

5

10

15

20

25

30

35

LRN (Gema) 95% Critical

Confidence interval construction for threshdd

Like

liho

od

rat

ion

seq

uen

ce in

gem

a

Threshold variable (IDH)

Second round selection,3 is based on 5,477 municipalities with HDI value above 0.507. P-value equals zero to LM test what suggests a second split existence of this sample based on HDI. Threshold value estimated by OLS that minimizes residual variance and LR statistics is 0.702 (Figure 2) with asymptotic confidence of 95% between [0.536000;0.729000]. This value splits the sample in two groups: one with 2532 (0.507 < HDI £ 0.702) municipalities and another with 2,945 municipalities (HDI > 0.702).

Third round selection is based on 2,532 municipalities. P-value equals zero to LM test what suggests a new split existence in this sample based on HDI. Threshold value estimated by OLS that minimizes residual variance and LR statistics is 0.641 (Figure 3) with asymptotic confidence of 95% between [0.533000;0.662000]. This value splits the sample in two groups: one with 1,575 municipalities (0.507 < HDI £ 0.641) and another with 957 municipalities (0.641 < HDI £ 0.702).

3. Furuoka (2009) do not report second (or more) rounds selection of threshold models. This means that a more ad-equate statistical confirmation is not done what implies that the doubt about Myrskylä et al. (2009) results still remain.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013120

FIGURE 2 Threshold variable confidence interval

0.5 0.55 0.6 0.65 0.7 0.75 0.8 0.85 0.9 0.95

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

20

LRN(Gema) 95% Critical

Confidence interval construction for threshdd

Like

liho

od

rat

ion

seq

uen

ce in

gem

a

Threshold variable (IDH)

FIGURE 3 Threshold variable confidence interval

0.5 0.55 0.6 0.65 0.7 0.75

0

5

10

15

20

25

Confidence interval construction for threshdd

Like

liho

od

rat

ion

seq

uen

ce in

gem

a

LRN(Gema) 95% Critical

Threshold variable (IDH)

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121Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

Additional splits of subsamples of 30; 1,575; 957 and 2,945 municipalities were tested (HDI £ 0.507; 0.507 < HDI £ 0.641; 0.641 < HDI £ 0.702; HDI > 0.702) but LM test did not reject the null hypothesis of no threshold existence in each case.

Table 4 presents estimated coefficients and their standard errors (in paren-theses) to the relation between fertility and HDI to all Brazilian municipalities and to different subsamples (regimes) previously defined.

TABLE 4 OLS Estimations with and without threshold effect

Without Threshold Effect

Estimation

Threshold Effect Estimations

Regime 1MunicipalitiesHDI ≤ 0.507

Regime 2Municipalities

0.507 < HDI ≤ 0.641

Regime 3Municipalities

0.641 < HDI ≤ 0.702

Regime 4MunicipalitiesHDI > 0.702

Constant6.995*(0.074)

-12.856***(6.669)

7.458*(0.364)

8.223*(0.821)

6.107*(0.141)

HDI-5.907*(0.099)

35.467**(13.662)

-6.738*(0.609)

-7.630*(1.214)

-4.763*(0.181)

R2 0.438 0.137 0.079 0.037 0.191

N.obs. 5507 30 1575 957 2945

Figures in the parentheses indicate t-statistics.* indicates significance at 1% level.** indicates significance at 5% level.*** indicates significance at 10% level.

Ordinary Least Squares regression to the full sample of Brazilian munici-palities reveals the well known negative relationship between fertility and hu-man development (at 1% confidence level). In other words, low fertility rates are statistically related to high human development. Notwithstanding, association intensity is weaker than what was observed by Furuoka (2009).

Interesting issues as revealed by OLS threshold estimations (Graph 3). To the first identified regime (30 municipalities), the fertility-development associa-tion is positive and significant at 5% level. That is, we observed that for munici-palities in the lower bottom of economic development, higher levels of economic development tend to be associated with highest fertility rates. This result may be related to the characteristics of these municipalities: small populations, predo-minantly rural and located in the northern region. However, for municipalities with a high human development index, higher levels of HDI are associated with lower fertility rates, although the relationship is weaker. The other three regimes cases, traditional negative relationship is observed (at 1% confidence level in all cases). Worth noting that third regime intensity is weaker than the other three, as it was observed by Furuoka (2009). Moreover, as Furuoka (2010) concluded for the USA, there is no evidence to support the existence of an inverse J-shaped development-fertility to the Brazilian municipalities.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013122

GRAPH 3Brazilian municipalities: fertility X HDI (2000)

1.5

2.5

3.5

4.5

5.5

6.5

7.5

8.5

Fert

ility

0.4

HDI

0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1

IDH<=0.507 0.507<IDH<=0.641 0.641<IDH<=0.702 IDH>0.702

Linear (IDH<=0.507) Linear (0.507<IDH<=0.641) Linear (0.641<IDH<=0.702) Linear (IDH>0.702)

Source: Atlas do Desenvolvimento Humano (PNUD, 2003) and estimations.

6 CONCLUSIONS

During the last century, several countries observed a rapid increase in economic development with simultaneous decline in fertility and population growth rates. In a recent paper, Myrskylä et al. (2009), suggest that the previously negative development–fertility association has actually become an inverse J-shaped, that is, Human Development Index (HDI) being positively associated with fertility among highly developed countries. Our results indicate a clearly negative correla-tion between fertility and development. We are not able to determine whether economic development causes fertility decline.

Using a threshold regression analysis as proposed by Hansen (2000), this article investigates this negative association between economic development and fertility rate in the Brazilian Municipalities with recent database. This study shows that the influence o economic development on fertility, in Brazil, has the same direction as predicted by the literature. Our empirical findings support the hypo-thesis that higher human development (and economic development) is related to lower fertility levels. Out results show no evidence to support the existence of an inverse J-shaped development-fertility as found by Furuoka (2010) to the United States, in opposite to the results suggested by Myrskylä et all. (2009). Moreo-ver, we found four regimes statistically significant and there is evidence that the intensity of the third regime is lesser than others as is found by Furuoka (2009).

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123Development and Fertility in Brazil: fertility reversion for more developed municipalities?

Our results also contribute to the debate about the future trends of fertility in Brazil. Our findings indicate that as municipalities develop one should find further decline in total fertility rates. The results also raise some questions about how public policies might affect future behavior of fertility in Brazil. In general, lower fertility rates are associated to higher female labor force participation rates, thus as female labor force increases one can expected further declines in fertility in Brazil. The reversion of low fertility rates will demand proper policies especially direct to childcare and more flexible work relations. On one side, lower fertility rates might be associated with higher investments in human capital of children what can lead to positive impacts to societies and economy (Lee & Mason, 2010). On the other side, Brazil is facing a rapid process of population aging, as fertility continues to decline (and declines for all regions) the process could gain a faster pace impacting even more the future trends of population size and population age structure in Brazil. The possible impacts of population aging are well-known and discussed elsewhere (Wong and Carvalho, 2006; Rios-Neto, 2005).

Our study, however, is limited since we concentrate on 2000 data. Further studies are necessary to test the hypothesis of an inverse J-shaped relation between fertility and development. It is important to test the hypothesis with the 2010 census once the data are available to compare to our results. Further studies, should use other measures of economic development (Luci and Thvenon, 2010) such as female labor force participation, female empowerment and other gender specific measures, to test the linkages between fertility variation and institutional and social norms in Brazil. Special attention should be given to changes in fema-le labor force participation and female status in society (Brewster and Rindfuss, 2000), since a large body of research has found for some European countries a positive relation between fertility levels and female labor force participation (Billari and Kohler, 2004).

6.1 Acknowledgments  

We are grateful to two anonymous reviewers for many constructive suggestions for improving the manuscript. Bernardo L Queiroz acknowledges financial sup-port from FAPEMIG (Programa Pesquisador Mineiro). The opinions, comments and analysis expressed in this document are those of the authors.

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AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO E CAPACITAÇÃO CONTÍNUOS NO SERVIÇO PÚBLICO: AVANÇOS DA POLÍTICA DE RH NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE UMA PREFEITURA DO ALTO VALE DO ITAJAÍ-SCCristian Caê Seemann Stassun*Fanni Wippel**

Este artigo apresenta o modelo de gestão de servidores proposto por uma prefeitura do Alto Vale do Itajaí-SC e analisa quais as contribuições oferecidas pela capacitação e avaliação de desempenho de forma permanente no serviço público. Utilizou-se como metodologia o delineamento descritivo-interpretativo, com abordagem qualitativa; e a coleta de dados se deu por meio de investigação documental, contato pessoal com o departamento de recursos humanos (DRH) e de pesquisa bibliográfica. O investimento em capacitação dos servidores pelos municípios está previsto na Constituição Federal de 1988, mas não de forma que garanta efetivamente sua execução. O serviço público tem sido vítima de inúmeras críticas por sua falta de eficiência. Algumas ações buscaram modernizar o Estado e torná-lo mais ágil. Contudo, para que consiga realmente melhorar a qualidade de seus serviços, é preciso dar atenção especial ao servidor, com ações que contribuam para sua motivação, seu comprometimento, sua atuação mais eficiente e, inclusive, para sua saúde.

Palavras-chave: capacitação contínua; avaliação de desempenho permanente; serviço público.

CONTINUOUS PERFORMANCE EVALUATION AND TRAINING IN PUBLIC SERVICE: ADVANCES IN HR POLICY IN THE PUBLIC ADMINISTRATION OF A MUNICIPALITY OF ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC

This paper presents the model of server management proposed by a municipality of Alto Vale do Itajaí-SC and which examines the contributions offered by training and performance evaluation permanently in public service. Was used as the design methodology descriptive-interpretive, qualitative approach, and data collection was done through desk research, personal contact with the HR Department and literature. Investment in training of servers is provided by municipalities in the Federal Constitution, but not in ways that ensure their effective implementation. The public service has been the victim of numerous criticisms for its lack of efficiency. Some actions sought to modernize the state and make it more agile. However, that can really improve the quality of their services, you need to give special attention to the server, with actions that contribute to their motivation, commitment, work more efficiently and even to your health.

Keywords: continuous training; performance evaluation of permanent; public service.

* Doutorando em ciências humanas na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). E-mail: [email protected].** Psicóloga e técnica universitária da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). E-mail: [email protected].

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EVALUACIÓN DEL DESEMPEÑO Y FORMACIÓN CONTINUOS EN SERVICIO PÚBLICO: LOS AVANCES EN LA POLÍTICA DE RECURSOS HUMANOS EN LA ADMINISTRACIÓN PÚBLICA DE UN MUNICIPIO DEL ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC

En este trabajo se presenta el modelo de gestión propuesto por un servidor municipio de Alto Vale do Itajaí-SC y analiza que las contribuciones ofrecidas por la capacitación y evaluación de desempeño de forma permanente en servicio público. Se utilizó como la metodología de diseño descriptivo-interpretativo colección enfoque cualitativo, y los datos se realizó a través de la investigación documental, el contacto personal con el Departamento de Recursos Humanos y la literatura. La inversión en la capacitación de los servidores es proporcionada por los municipios de la Constitución Federal, pero no en la forma que se garantice su aplicación efectiva. El servicio público ha sido víctima de numerosas críticas por su falta de eficiencia. Algunas acciones tenían por objetivo modernizar el Estado y hacerlo más ágil. Sin embargo, lo que realmente puede mejorar la calidad de sus servicios, es necesario prestar una atención especial al servidor, con acciones que contribuyan a la motivación, el compromiso, el trabajo de manera más eficiente e incluso para su salud.

Palabras clave: formación continua; evaluación de desempeño permanente; servicio público.

ÉVALUATION DE LA PERFORMANCE ET DE LA FORMATION CONTINU DANS LE SERVICE PUBLIQUE: LES PROGRÈS DE LA POLITIQUE DES RESSOURCES HUMAINES DANS L’ADMINISTRATION PUBLIQUE D’UNE MUNICIPALITÉ DE ALTO VALE DO ITAJAÍ-SC

Cet article présente le modèle de gestion de serveur proposé par une municipalité d’Alto Vale do Itajaí-SC et analyse dont les cotisations offertes par la formation et l’évaluation du rendement de façon permanente dans la fonction publique. A été utilisée comme méthode de conception descriptive et interprétative, approche qualitative, et la collecte des données a été effectuée par le biais de recherches documentaires, un contact personnel avec le département des ressources humaines et de la littérature. Investissement dans la formation des serveurs est assurée par les municipalités de la Constitution fédérale, mais pas de manière à assurer leur mise en œuvre effective. La fonction publique a été victime de nombreuses critiques pour son manque d’efficacité. Certaines actions ont cherché à moderniser l’Etat et rendre plus agile. Toutefois, cela peut vraiment améliorer la qualité de leurs services, vous devez accorder une attention particulière au serveur, avec des actions qui contribuent à leur motivation, l’engagement de travailler plus efficacement et même pour votre santé.

Mots-clés: formation continue, évaluation du rendement permanents; fonction publique.

JEL: H, H11, J8, J81, O15.

1 INTRODUÇÃO

As várias transformações ocorridas nas últimas décadas, que envolvem globali-zação, desenvolvimento científico e tecnológico, além de aspectos econômicos e sociais, têm contribuído para uma nova visão no cenário organizacional e, con-sequentemente, para novas formas de gerir pessoas em ambientes de trabalho. A competitividade tornou-se mais acentuada, e o capital humano é agora o gran-de diferencial das empresas para alcançarem lucros e sobreviverem no mercado.

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129Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

Desta forma, mais que se preocupar com questões básicas – como remuneração e segurança no trabalho –, as organizações passam pelo grande desafio de satis-fazerem as necessidades de desenvolvimento, autorrealização e conhecimento de seus colaboradores, para assim alcançarem maior qualidade em seus produtos e serviços (Dutra, 2006).

O serviço público, embora não tenha como objetivo auferir vantagens fi-nanceiras, deve igualmente se preocupar com a qualidade e a eficiência de seus serviços, de modo a satisfazer seus usuários, os quais são a razão da existência de toda atividade pública, e, cada vez mais, adquirem consciência de seus direitos e exigem que sejam cumpridos.

Com o intuito de buscar maior qualidade no serviço público, desde a década de 1930, vêm sendo criados projetos de lei e propostos novos modelos de organi-zação da administração pública no Brasil, propagando a chamada reforma admi-nistrativa (Pereira, 1998). Para Pereira (1998), uma reforma efetiva deve passar, necessariamente, pela valorização dos servidores, ao investir em seu aperfeiçoa-mento e treinamento, ao dar-lhes a oportunidade de progredir profissionalmente, por meio de planos de carreira, e ao adotar procedimentos rígidos de controle sobre sua estabilidade no cargo. Afinal, são os servidores os agentes responsáveis por colocar em prática as ações e serviços previstos em leis.

De acordo com Valdez (2003), rigorosas críticas permeiam as várias esferas (federal, estadual e municipal) da administração pública no Brasil e referem-se à ineficiência dos serviços prestados por estes órgãos. Apesar de tamanho des-contentamento com a função pública, faltam ações capazes de tornar as repar-tições mais ágeis e modernas. “Uma administração pública moderna ao serviço das pessoas exige novas formas de gestão e de mobilização dos funcionários, mais objetividade, mais igualdade, melhor serviço, menos burocracia, mais inovação e criatividade” (Valdez, 2003, p. 35).

Na visão de Guimarães Filho (2004), cabe ao ente estatal não apenas cobrar do servidor inexperiente mas também investir em seu aprimoramento para suprir as limitações decorrentes da falta de conhecimento para o desempenho de suas tarefas. Afirma, ainda, que o aprimoramento do servidor deveria ser algo constante e proativo, mas, infelizmente, tem assumido um caráter mais abstrato e repressivo. Iniciativas como a do Superior Tribunal de Justiça (STJ) merecem destaque, com o programa Prêmio Servidor – Para as Melhores Ideias, que “tem servido de modelo para vários órgãos federais, haja vista a sua grande repercussão e os resul-tados positivos no seio da categoria” (Guimarães Filho, 2004, p. 35).

Em relação às avaliações de desempenho, Santos (2008) afirma que, apesar de este dispositivo existir na administração pública, nunca foi utilizado como instrumento de crescimento e melhoria no serviço público, possuindo um caráter

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teórico, pois, na prática, as promoções acontecem de modo automático, pelo tempo de exercício, e não por merecimento. Ou seja, as instituições públicas têm feito da avaliação de desempenho uma simples burocracia necessária, não conferindo a ela o seu caráter fundamental de controlar a qualidade e eficiência do trabalho prestado pelo servidor. Este quadro torna-se ainda mais complexo ao se conside-rar o fato de que, após a aquisição da estabilidade, nem todos os órgãos públicos continuam a realizar avaliações de desempenho profissional.

Diferentemente da iniciativa privada, em que as decisões são tomadas de acordo com a vontade do administrador e dos acionistas da empresa, na adminis-tração pública, o gestor deve buscar na lei a justificativa para todos os seus atos. A partir dos preceitos legais contidos nas constituições Federal e Estadual, com-pete aos municípios organizar e disciplinar os seus serviços e servidores públicos, podendo instituir o seu próprio estatuto dos servidores, em que estão previstos direitos e deveres de seus funcionários e outros aspectos que compõem seu regime jurídico (Almeida, 1999). O investimento em capacitação e aperfeiçoamento per-manentes, porém, não é garantido por lei pela maioria das prefeituras municipais. Cenário do qual emerge a acomodação do servidor público, que, pela falta de incentivos e desafios, vive inerte na busca de aprimoramento profissional; e, como resultado disto, o desenvolvimento de suas funções fica comprometido e se torna alvo de inúmeras críticas dos usuários.

Este artigo objetiva expor alguns preceitos constitucionais relacionados à prestação de serviços públicos e capacitação de servidores; apresentar e analisar a estrutura de gestão de funcionários de uma prefeitura municipal do Alto Vale do Itajaí, estado de Santa Catarina que se organizou para investir de modo contínuo em capacitação e avaliação de desempenho; e demonstrar os benefícios que tal estratégia pode trazer para a saúde1 e motivação dos servidores, melhorando a qualidade dos serviços prestados.

O estudo constitui-se em uma pesquisa aplicada com delineamento des-critivo-interpretativo. O programa implantado pela prefeitura foi analisado por meio de abordagem qualitativa, que se justifica pela complexidade e multiplici-dade de fatores que envolvem a temática pesquisada (Chizzotti, 1991). Os dados foram coletados mediante investigação documental de relatórios, levantamentos de dados realizados com servidores, formulários e leis municipais, bem como por contato pessoal com o departamento de recursos humanos (DRH). Utilizaram-se também pesquisa bibliográfica sobre gestão de pessoas – tanto de organizações públicas como privadas – e abordagens da psicologia que tratam de motivação e saúde dos trabalhadores, para fundamentar as análises realizadas.

1. Com base em Kahhale (2003), saúde é entendida não mais como o oposto de doença, mas como bem-estar, que envolve questões sociais, econômicas, culturais e subjetivas, não se restringindo somente à dimensão biológica.

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131Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

2 ASPECTOS PREVISTOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA SOBRE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS E CAPACITAÇÃO DE SERVIDORES

A Constituição Federal de 1988 (CF/1988) é considerada a Carta Magna sobre os princípios que devem gerir qualquer lei criada pelas demais esferas de governo (federal, estadual, distrital ou municipal). Assim, nenhuma lei poderá contrariar o que está previsto na CF/1988, podendo ser revogada por motivo de inconstitucionalidade.

A reforma administrativa de 1998 foi um marco importante para a reor-ganização do serviço público. Entre as mudanças proferidas, está o acréscimo da eficiência como um dos princípios da administração pública, ou seja, não basta que os serviços sejam oferecidos com legalidade, é preciso que alcancem os resul-tados para os quais foram criados. Meirelles (1998, p. 125) define o princípio da eficiência como “o que se impõe a todo agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento profissional”.

A inserção do princípio da eficiência na CF/1988 conferiu à população o direito de questionar a qualidade das atividades desenvolvidas pelo Estado. O seu parágrafo 3o regulamentou as formas de participação do usuário na esfera pública e lhe deu poderes para proferir reclamações sobre a prestação dos serviços em geral e sobre sua qualidade; permitiu seu acesso a determinados registros admi-nistrativos; e concedeu o direito de representação contra o exercício abusivo ou negligente na administração pública. Com isto, a Carta deixou o servidor mais exposto às avaliações externas e com um compromisso ainda maior de bem servir à comunidade.

Não apenas o usuário se beneficiou com a Emenda Constitucional no 20, de 1998. A alteração do Artigo 39, por meio de seu parágrafo 2o, garantiu que

a União, os Estados e o Distrito Federal manterão escolas de governo para a formação e o aperfeiçoamento dos servidores públicos, constituindo-se a participação nos cursos um dos requisitos para a promoção na carreira, facultada, para isso, a celebração de convênios ou contratos entre os entes federados (Brasil, 1988).

Nota-se que os municípios não são mencionados nesse trecho da norma, ficando a responsabilidade pela manutenção de tais escolas de governo para as esferas federal, estadual e distrital. Ainda no que se refere ao aperfeiçoamento dos servidores, o parágrafo 7o do Artigo 39 da CF/1988 define que

lei da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios disciplinará a aplicação de recursos orçamentários provenientes da economia com despesas correntes em cada órgão, autarquia e fundação, para aplicação no desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de adicional ou prêmio de produtividade (Brasil, 1988).

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O parágrafo 7o prevê, portanto, o envolvimento também dos municípios em programas que visem ao treinamento e desenvolvimento dos agentes públicos. No entanto, torna o investimento em tais programas dependente da economia com outras despesas, ou seja, investe-se no treinamento do servidor quando o orçamento permitir, em vez de se estabelecer que os custos com este tipo de ação sejam previstos no planejamento financeiro de cada esfera de governo.

No que tange à avaliação de desempenho, a Constituição Federal, em seu Artigo 41, parágrafo 4o, apenas obriga que seja realizada durante o estágio proba-tório, como requisito para o servidor se tornar efetivo, devendo apresentar bom desempenho para conquistar a estabilidade no cargo. A avaliação compete a uma comissão instituída unicamente para este objetivo.

Em síntese, não há, na Carta Magna brasileira, uma promulgação sobre a obri-gatoriedade de criar programas de capacitação do servidor em âmbito municipal ou de realizar periodicamente, em qualquer uma das esferas de governo, avaliação de desempenho após a conquista da estabilidade. Subentende-se, assim, que a concretização destas ações fica a critério dos poderes Legislativo e Executivo locais e da disponibilidade orçamentária, o que fragiliza as iniciativas de capacitação permanente do servidor público municipal.

3 A ESTRUTURA DE GESTÃO DOS SERVIDORES PROPOSTA POR UMA PREFEITURA MUNICIPAL DO ALTO VALE DO ITAJAÍ

As informações relatadas nos tópicos a seguir foram extraídas das leis complementares e dos decretos municipais que deram origem à política contínua de capacitação e aperfeiçoamento profissional e à avaliação de desempenho permanente dos servi-dores de uma prefeitura municipal do Alto Vale do Itajaí-SC. Mediante contato com o DRH, obteve-se o Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional por Secretaria, que será exposto adiante de forma simplificada, dada sua extensão, junto com as demais informações relacionadas ao programa.

3.1 A política de capacitação e aperfeiçoamento profissional dos servidores municipais

A Lei Complementar (LC) no 206, de 31 de agosto de 2010, foi a responsável pela criação da política de capacitação e aperfeiçoamento profissional dos servidores da administração direta e indireta do Poder Executivo municipal. Conforme a referida lei, em seu Artigo 2o, verifica-se que a capacitação concentra-se em ações mais voltadas ao desenvolvimento integral do servidor, enquanto as ações de aperfeiçoamento estão relacionadas de modo mais íntimo às atividades específicas de seu cargo. O conjunto de ações da primeira, no entanto, envolve também a segunda. Assim, no decorrer do texto, quando utilizada a expressão eventos (ou ações) de capacitação, extraída da lei, estará incluído o aperfeiçoamento.

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133Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

O termo treinamento, empregado nos documentos municipais consultados, refere-se às ações que capacitam.

A política de capacitação e aperfeiçoamento profissional tem como objetivo: i) a melhoria dos serviços prestados aos cidadãos; ii) a valorização do servidor, por meio de sua capacitação permanente; iii) a adequação do quadro de servidores aos novos perfis profissionais; iv) a divulgação e o controle de resultados de ações de capacitação; e v) a racionalização e efetividade dos gastos com capacitação (Santa Catarina, Artigo 3o, 2010a). Para cumprir com o objetivo de racionalizar os gastos com capacitação, a prefeitura realizou previamente um levantamento dos custos que girariam em torno da implantação e execução do programa e verificou que não comprometeria mais que 1% do orçamento municipal, tornando viável sua realização anual. Além disso, o programa possibilitaria distribuir melhor as ações, de acordo com as reais necessidades de cada setor, e, assim, tornaria tais gastos mais efetivos.

Os eventos de capacitação propostos pela lei devem ser elaborados no último trimestre de cada ano, por meio de um programa anual, que dependerá da aprovação do chefe do Poder Executivo municipal para ser executado no exer-cício seguinte. A elaboração final deste programa é de responsabilidade do DRH, que, para decidir quais ações de capacitação serão realizadas, levará em conta: i) o levantamento das necessidades de treinamento pelas chefias de cada secretaria/unidade, com a participação dos servidores; ii) os resultados das avalia-ções do estágio probatório e de desempenho profissional; e iii) as metas previstas no Plano Plurianual (PPA) e na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do mu-nicípio.

O primeiro passo a ser realizado para que se cumpra objetivamente uma capacitação é a variável do diagnóstico das reais necessidades dos servidores (Chiavenato, 1999). O formulário de “levantamento de necessidades de treina-mento” utilizado pelo DRH desta prefeitura é aplicado anualmente às chefias e aos servidores. O modelo aplicado às chefias contém um conjunto de frases que avaliam os seguintes fatores: i) qualidade do trabalho; ii) pontualidade/assiduidade; iii) relacionamento interpessoal; e iv) treinamento, em que são apontadas as temáticas consideradas relevantes para aprendizagem, bem como os tipos de ca-pacitação que podem ser mais bem aceitos pela equipe (palestras, cursos on-line/presenciais, oficinas etc.). Os formulários aplicados aos servidores consideram uma maior quantidade de fatores: i) qualidade do trabalho; ii) pontualidade/assiduidade; iii) quantidade e resistência; iv) interesse e disciplina em relação ao trabalho; v) iniciativa e apresentação de ideias e sugestões; vi) cooperação e interesse pelo trabalho; e vii) espaço para as sugestões de temáticas e formas de treinamento. O fator relacionamento interpessoal não é considerado no levanta-

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mento realizado com os servidores. Apenas a observação da chefia, porém, não é suficiente para detectar se há ou não esta necessidade de capacitação. Isto pode ser considerado um ponto crítico, pois Mailhiot (1976, p. 66), ao estudar as teorias do psicólogo Kurt Lewin, afirma que o autor chegou à conclusão de que “a produtividade de um grupo e sua eficiência estão estreitamente relacionadas não somente com a competência de seus membros mas sobretudo com a solidariedade de suas relações interpessoais”. Monaco e Guimarães (2000), ao estudarem a percepção de qualidade de vida no trabalho (QVT) de funcionários da gerência de administração dos Correios, concluíram que a maior parte deles considera o relacionamento interpessoal como um dos principais indicadores de QVT, fato que reforça a importância de a prefeitura analisar este aspecto no levantamento das necessidades de treinamento de seus servidores.

As formas de capacitação são distribuídas em seis linhas de desenvolvimento, conforme descrito a seguir.

1) Inicial: para todos os servidores recentemente nomeados no cargo. Ob-jetiva desenvolver seu raciocínio crítico sobre o papel dos serviços pú-blicos e do município e sobre sua atuação como profissional, bem como promover a integração no ambiente de trabalho.

2) Geral: envolve todos os servidores e busca a conscientização sobre ques-tões profissionais relacionadas às metas da administração municipal.

3) Educação formal: pretende investir no desenvolvimento integral dos ser-vidores, com incentivo a ações que vão desde a alfabetização até os cursos de pós-graduação, em níveis de especialização, mestrado ou doutorado.

4) Gestão: pré-requisito para os servidores nomeados em cargos comissio-nados, visa prepará-los para o desempenho de funções de chefia, asses-soramento ou direção.

5) Interambientes: envolve funcionários com o mesmo cargo e almeja tor-nar viáveis atividades relacionadas e desenvolvidas em mais de um am-biente de trabalho ou órgão.

6) Específica: o aprendizado está diretamente relacionado ao desempenho de tarefas próprias de cada cargo ou setor.

O Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional abrange cada uma dessas linhas de desenvolvimento, com exceção da educação formal, a qual é incentivada por meio da concessão de horário especial para estudo – prevista no Estatuto dos Servidores Municipais (Santa Catarina, 2010b) – e da progressão funcional, prevista no plano de carreira. Ressalte-se que a lei confere a liberação especial para estudar desde que haja incompatibilidade de horários, que

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a linha de pesquisa esteja de acordo com a atuação do servidor e que sua ausência não prejudique o funcionamento do serviço público, exigindo-se a compensação das horas concedidas.

O programa de capacitação descrito no quadro 1 foi elaborado com base no levantamento das necessidades de treinamento apontadas por chefias e ser-vidores de todas as secretarias, em 2010, para ser executado em 2011. As linhas inicial, geral e de gestão abrangem os mesmos cursos e cargas horárias para todas as secretarias, havendo apenas o acréscimo, na linha de gestão, de dois temas para a área da educação. As ações da linha interambientes concentram-se nos temas apresentados no quadro 1, porém estão estruturadas de formas distintas entre as secretarias. E os cursos específicos variam em cada secretaria.

QUADRO 1Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional do Município (2010)

Linha Curso Carga horária

Inicial

Conhecendo a estrutura administrativa da prefeitura municipal 1h

Noções básicas de direito administrativo e administração pública 2h

Ética no serviço público 2h

Ética no serviço público 10h

Ética no serviço público com tutoria 10h

Geral

Obrigatórios:

Planejamento e gestão do tempo 8h

Gestão de mudanças 16h

Desenvolvimento interpessoal 16h

Recursos humanos na prefeitura municipal 8h

Atendimento ao cidadão 20h

Legislação aplicada à logística de suprimentos (Lei no 8.666/1993, pregão e registro de preços)

30h

Redação Oficial e Confecção de Atos de Pessoal 8h

Avaliação de Desempenho 3h

Opcionais:

Cursos de informática (básico) 40h

Gestão de materiais e serviços 8h

Oratória 16h

O eneagrama 24h

Orçamento familiar 16h

Palestra geração Y 2h

Curso básico de português e reforma ortográfica 24h

(Continua)

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Linha Curso Carga horária

Gestão

Gestão de mudanças 16h

Lei da Improbidade Administrativa 4h

Gestão estratégica de pessoas e planos de carreira 20h

Ciclo de estudos do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE-SC) 8h

Gestão orçamentária e financeira 8h

Estatuto e plano de carreira do magistério (Secretaria de Educação) 12h

Gestão escolar: pessoal, administrativa, técnica e pedagógica (Secretaria de Educação) 24h

Interambientes

Atendimento ao cliente 24h

Direção defensiva 16h

Logística 16h

Especificação de lubrificantes 8h

Gestão do patrimônio da prefeitura municipal 8h

Gestão de licitações e compras na prefeitura municipal 12h

Contabilidade na Prefeitura Municipal 4h

Geoprocessamento 16h

EspecíficaOs cursos são oferecidos de acordo com as atividades desenvolvidas em cada secretaria e segundo as necessidades levantadas pelas chefias e os servidores de cada setor.

24h

Fonte: Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional do Município – Ano-base 2010.Elaboração dos autores.

O participante dos cursos somente receberá certificado se tiver frequência mínima de 75% ou média mínima de 7,0 de aproveitamento, nos casos em que for exigida nota. A escolha dos servidores que participarão dos eventos deverá acon-tecer em cada local de trabalho, de forma coletiva, e dependerá de autorização da chefia de sua área, de sua inserção no público-alvo para o qual a capacitação foi proposta e da disponibilidade de vaga. Além disso, é preciso considerar os re-sultados das avaliações do estágio probatório e de desempenho profissional. Para garantir que todos os candidatos que preenchem os pré-requisitos possam partici-par da capacitação, a lei municipal prevê o desdobramento de turmas em casos de insuficiência de vagas. As horas somadas com a frequência nestes eventos poderão ser utilizadas para progressão na carreira.

O servidor poderá se afastar total ou parcialmente de suas funções para participar de eventos de capacitação, inclusive os que não sejam promovidos pelo município, desde que estes contribuam com sua atualização e o seu desen-volvimento profissional e estejam de acordo com seu ambiente organizacional. É competência dos chefes das unidades administrativas avaliar se a capacitação trouxe resultados positivos ao desempenho cotidiano das atribuições do ser-vidor. Algumas aprendizagens, entretanto, são menos observáveis, podendo dificultar a percepção do chefe sobre os resultados trazidos pela capacitação. Por isso, é importante que o servidor também possa avaliar as consequências do treinamento/capacitação sobre o seu trabalho. Afinal, com base em Spector (2002),

(Continuação)

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137Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

é preciso avaliar e interpretar os resultados de um treinamento para que este possa ser considerado completo.

Ao final de cada curso oferecido pela prefeitura, o servidor participante avalia o desempenho do ministrante, a qualidade do ambiente físico, algumas caracte-rísticas do curso e sua própria participação por meio de um formulário. No que diz respeito à avaliação do curso, dois critérios do formulário são relevantes para se perceber a eficácia desta modalidade de capacitação sobre o cotidiano de trabalho do servidor: o nível de obtenção de novos conhecimentos e a aplicação do conteúdo à realidade profissional. O resultado da avaliação destes dois critérios sobre os cursos realizados em 2011 será apresentado na seção 3.3.

Os instrutores ou monitores dos cursos previstos no programa anual poderão ser profissionais contratados pela prefeitura ou servidores municipais em exercício, desde que possuam experiência em sua área de atuação e/ou cursos de aperfeiçoamento relacionados ao tema da capacitação. O servidor que ministrar cursos receberá uma gratificação correspondente a 1% de seu vencimento-base por hora de trabalho. Também poderá ser liberado até o limite de 20% de sua carga horária mensal, desde que isto não prejudique o desempenho das atividades de seu cargo.

A avaliação de desempenho do servidor instrutor será realizada pelos alunos ao final de cada curso, por meio do preenchimento do formulário-padrão. Se a média obtida for inferior a 7,0, ele não poderá ministrar aulas por um período de seis me-ses e deverá apresentar curso de formador para ser aceito novamente como instrutor dos eventos de capacitação promovidos pelo município. Nota-se, por um lado, que tal exigência permite manter um padrão de qualidade das ações e o interesse dos servidores em participar. Ressalta-se, por outro lado, que ser instrutor exige mais que experiência na área de atuação e conhecimento sobre o tema. Ao selecionar os servidores ministrantes, seria relevante que o DRH levasse em conta outras compe-tências, por exemplo, habilidade de comunicação, didática, domínio de grupo etc., como forma de diminuir as chances de fracasso da capacitação e de amenizar os impactos negativos sobre a imagem e a autoestima do servidor instrutor.

3.2 O plano de carreira e a avaliação de desempenho profissional

O plano de carreira e vencimentos dos servidores da prefeitura foi analisado com base na LC no 208, de 28 de setembro de 2010, que organizou os cargos de provimento efetivo e em comissão, enquanto os servidores pertencentes ao magistério da rede pública municipal possuem sua carreira regida por lei específica.

Com o objetivo de colher subsídios e formular sugestões que orientem as políticas municipais de pessoal e de remuneração, além de participar de todos os estudos e reformas eventualmente produzidas nesta área, foi criada a Comissão de

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Política e Remuneração de Pessoal, composta por: secretário municipal de Admi-nistração; um servidor advogado indicado pelo procurador jurídico; dois servido-res indicados pelo prefeito municipal, devendo um deles estar lotado no DRH; presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais; e dois servidores in-dicados pelo sindicato. A referida comissão possui papel relevante, pois confere representatividade ao servidor, com a possibilidade de requerer mudanças e propor sugestões, oferecendo um caráter mais flexível à gestão de sua carreira. Esta pos-sível flexibilidade contribui, indiretamente, para reduzir os índices de insatisfação do servidor, para o qual cita-se Dejours (1992, p. 52), que afirma que, quando há expressiva rigidez na organização de trabalho, dificulta-se o alívio do sofrimento do trabalhador diante da “certeza de que o nível atingido de insatisfação não pode mais diminuir”. Schikmann (2010) complementa, ao afirmar que uma das carac-terísticas das instituições públicas que interfere na forma de gestão dos recursos humanos é a rigidez imposta pela legislação, que acaba impedindo a implementação de novas ideias, as quais poderiam contribuir para a solução de problemas.

A progressão na carreira, que é o crescimento profissional do servidor estável com respectivo incremento de sua remuneração, poderá se concretizar mediante contagem do tempo de serviço, formação profissional, capacitação e avaliação de desempenho.

O adicional por tempo de serviço, previsto no Estatuto dos Servidores do Município, corresponde ao aumento de 1% sobre o vencimento-base para cada ano de efetivo serviço. Em vez de triênio, ou seja, progressão por tempo de serviço público a cada três anos, como é adotado em muitas prefeituras e órgãos estadu-ais, os servidores deste município receberão anuênio.

Ao servidor estável que investir em sua educação formal, além da exigida como requisito mínimo para assumir o cargo, será concedido um adicional de 6% por nível de formação concluída, desde que esteja relacionada a sua área de atuação. O quadro 2 ilustra de forma mais clara como ocorre esta progressão.

QUADRO 2Adicionais por formação profissional

Habilitação inicial exigida para o cargo

Primeiro adicional Segundo adicional Terceiro adicional

Ensino fundamental completo ou incompleto ou ensino médio incompleto

Conclusão de ensino médioConclusão de curso de graduação

Conclusão de curso de especialização

Ensino médio completo ou curso de nível técnico

Conclusão de curso de graduação

Conclusão de curso de especialização

Conclusão de pós-graduação/mestrado

Graduação ou graduação com especialização

Conclusão de curso de espe-cialização (além do exigido inicialmente)

Conclusão de pós-graduação/mestrado

Conclusão de pós-graduação/doutorado

Fonte: Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional do Município – Ano-base 2010.Elaboração dos autores.

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Para valorizar e aperfeiçoar o desempenho do servidor no cargo que ocupa, o plano também oferece o adicional por capacitação profissional, que representa 2% a mais sobre o vencimento-base e é conquistado a cada três anos, por meio da participação em cursos relacionados à área de atuação. Para ter direito a este benefício, o servidor deverá concluir seu estágio probatório. O cômputo de ho-ras a ser apresentado para garanti-lo dependerá do grupo ocupacional ao qual o funcionário estiver enquadrado, que pode ser superior, técnico, administrativo ou operacional, de acordo com a complexidade e o nível de escolaridade exigido para cada cargo, conforme descrito no quadro 3.

QUADRO 3Horas de capacitação por grupo ocupacional

Grupo ocupacional DescriçãoHoras de capacitação

por triênio

Superior Cargos com tarefas de grau elevado de intelectualidade, para os quais se exige curso superior e registro no órgão competente.

80h

TécnicoCargos com tarefas de certa complexidade e pouco esforço físico, para osquais se exige conclusão do ensino médio com grade curricular de área técnica.

60h

Administrativo Cargos com tarefas de média e baixa complexidades, burocráticas e organiza-cionais, para as quais se exige ensino fundamental completo ou ensino médio completo ou incompleto.

60h

Operacional Cargos com tarefas de conhecimento prático, com predominância de esforço físico, para as quais se exige formação em ensino fundamental ou médio, completo ou incompleto.

40h

Fonte: Programa Anual de Capacitação e Aperfeiçoamento Profissional do Município – Ano-base 2010. Elaboração dos autores.

Exigir um número mínimo de horas de capacitação não garante a efetivida-de do aprendizado do servidor ou de sua aplicabilidade no exercício da função. Entretanto, diante da complexidade de avaliar estes fatores, pois envolvem ques-tões subjetivas, as horas exigidas para a conquista do adicional são uma forma de estimular a busca contínua por capacitação.

Somente terão validade as capacitações concluídas no período a que se refere a aquisição do adicional, como forma de incentivar a participação em novos treinamen-tos. Além das horas de curso, para fazer jus ao adicional por capacitação, o servidor deverá obter a pontuação mínima exigida na avaliação de desempenho profissional.

3.2.1 A avaliação de desempenho profissional

Para conquistar a progressão por desempenho profissional, o servidor passará por avaliações anuais após ter concluído seu estágio probatório. A cada três anos, dependendo da apresentação das horas de capacitação, o servidor poderá ser re-compensado com um acréscimo de 3% sobre o vencimento do cargo se a média

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das avaliações realizadas no triênio for de pelo menos setenta pontos, podendo alcançar 30% de aumento em seu vencimento no decorrer de sua carreira. Para conquistar o benefício, não poderá sofrer punição disciplinar ou possuir mais de três faltas injustificadas durante o período; estas exigências incentivam a discipli-na e a assiduidade no trabalho.

A forma de avaliação de desempenho realizada pela prefeitura é a 360 graus, que engloba a participação de mais indivíduos, o que aumenta o comprometi-mento da equipe. Para Spector (2002), este tipo de avaliação fornece uma visão completa do desempenho da pessoa e diminui a probabilidade de afetos e erros influenciarem o resultado final. No entanto, Bohlander, Snell e Sherman (2005) consideram que esta avaliação pode causar no avaliado o sentimento de que cons-piraram contra ele, o que requer um treinamento capaz de preparar os envolvi-dos para dar e receber o feedback. O processo realizado pela prefeitura estudada compreende autoavaliação (com peso um na média final); avaliação pela chefia imediata (com peso cinco na média final); e avaliação por dois servidores efetivos estáveis, escolhidos mediante prévio sorteio e lotados no mesmo departamento ou divisão do avaliado (com peso dois, cada uma delas, na média final). Os formu-lários a serem preenchidos contêm os mesmos critérios analisados nas avaliações do estágio probatório: i) domínio sobre as atribuições do cargo; ii) pontualidade; iii) assiduidade; iv) iniciativa; v) flexibilidade; vi) produtividade e qualidade do trabalho; vii) disciplina; viii) ética pública; ix) cuidados com materiais, equipa-mentos e ambiente; e x) relacionamento interpessoal. Alguns destes indicadores são contemplados nos cursos oferecidos pelo Programa Anual de Capacitação, conforme mostra o quadro 2.

As fichas de avaliação retornam ao DRH para tabulação das notas e gera-ção do relatório final, o qual é encaminhado à chefia do servidor avaliado; esta, então, realiza o feedback sobre seu desempenho, destacando os pontos positivos e propondo melhorias. Esta troca direta entre chefia e subordinado favorece a percepção dos aspectos a serem melhorados. De acordo com Sachs (1995), o resultado mais importante da avaliação de desempenho consiste na possibilidade de avaliado e avaliador dialogarem juntos sobre seu desenvolvimento, o que con-tribui para fortalecer seu relacionamento.

Observa-se que o alcance de metas ou resultados não é considerado no pro-cesso de avaliação da prefeitura. Retomando Sachs (1995), mesmo os melhores funcionários devem ter novas metas pelas quais se empenharem. Propô-las pos-sibilita que, nas próximas avaliações, sejam comparados os padrões esperado e conquistado, além da expressiva influência que exercem sobre o cumprimento de objetivos organizacionais. Em organizações públicas, porém, a implantação de um modelo baseado em resultados é mais complexa, pois requer a revisão de alguns padrões, como faz refletir Schikmann (2010, p. 22).

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Há um desafio à utilização dessa lógica nas organizações públicas, uma vez que para alocar as pessoas pelas áreas da organização, são considerados apenas os tipos de cargos e a descrição geralmente sumária de suas atribuições, em lugar de serem consideradas as competências para a realização das atividades. Assim, ocupantes de um mesmo cargo podem ser alocados em áreas com perfis e necessidades muito diferentes, que ao fim e ao cabo não poderão ser atendidas de forma adequada, uma vez que não foram consideradas as competências específicas para cada caso, correndo o risco de não alcançar os resultados e o desempenho pretendidos.

Outro ponto frágil é o fato de a avaliação centrar-se apenas no indivíduo, não considerando o desempenho da equipe. Como afirma Valdez (2003, p. 26), na busca da eficiência, “fica nítida a necessidade de conferir à administração pú-blica o que há de bom e funcional no setor privado”, e o trabalho em equipe tem sido cada vez mais enfatizado pelas empresas deste setor. Afinal, quando as pessoas trabalham em equipe, os seus talentos são catalisados em prol de um objetivo comum, e juntas conseguem resultados que talvez jamais conseguiriam individu-almente (Goleman, 1999).

Quando o resultado obtido na avaliação de desempenho enquadrar-se em regular (50 a 69 pontos) ou insuficiente (1 a 49 pontos), a chefia imediata do avaliado deverá elaborar um relatório sobre as ocorrências que determinaram o resultado, sugerindo as medidas necessárias para amenizar as dificuldades perce-bidas, e encaminhá-las ao DRH. Ao servidor, é assegurado o direito de impetrar recurso, caso se sinta prejudicado quanto ao resultado, requerendo reavaliação do processo no Comitê Permanente de Progressão na Carreira; em último grau de recurso administrativo, poderá solicitar ao prefeito municipal reavaliação do resultado apresentado pelo comitê.

Caso persista o resultado inferior ao mínimo exigido para progressão por desempenho (70 pontos), o DRH deverá adotar as seguintes providências: i) encaminhar o servidor para capacitação; ii) promover uma análise sobre sua adaptação ao local de trabalho; iii) identificar se há problemas pessoais do servidor; iv) remanejá-lo, respeitadas as atribuições e o vencimento do cargo; ou v) outras ações pertinentes. Merece destaque a preocupação deste departamento em averiguar se o mau desempenho do servidor provém de problemas pessoais, reconhecendo a relação dialética entre o trabalho e os demais contextos de sua vida.

Ao mesmo tempo que a prefeitura valoriza o servidor e colabora com sua qualificação, também exige retorno de seus investimentos. Neste sentido, não basta participar dos cursos, é preciso completar a frequência ou o aproveitamento mínimos e apresentar bom desempenho profissional. Concede-se ao servidor a oportunidade de ministrar cursos, mas ele deve obter avaliações positivas dos

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participantes para não perder este benefício. Atingir a pontuação mínima na avaliação de desempenho não garante a progressão na carreira se o servidor não for assíduo e disciplinado. São mecanismos que agem por dois vieses: um de incentivo e outro de cobrança, incluindo um conjunto de ações que oferecem ao servidor a chance de aperfeiçoar sua atuação em casos de avaliações insatisfatórias.

3.3 Alguns números e resultados alcançados

Os eventos de capacitação da prefeitura estudada chegaram a 33, em 2011, com palestras, cursos, ações de integração, entre outros, totalizando 425 horas e cerca de 1 mil vagas preenchidas, o que representa mais de 50% do quadro de servidores municipais capacitados em nove meses. Destes eventos, 24 foram destinados à linha específica; seis, à linha de gestão; e três, à linha geral. Estas ações geraram um custo aproximado de R$ 37.049,18. Constata-se que, em 2011, a política de capa-citação e aperfeiçoamento priorizou o aprendizado relacionado às atividades pró-prias de cada cargo (linha específica), em detrimento da linha inicial, voltada aos novos servidores – isso porque não houve posse de servidores durante este período.

Um item a ser considerado como ponto de evolução na política de RH da prefeitura é a obtenção de números capazes de avaliar a eficácia das ações de capacitação e da avaliação de desempenho permanente, para comparar o antes e o depois e analisar quais os avanços trazidos com a implantação deste modelo de gestão de servidores. Somente a partir de 2013, o município pretende reali-zar pesquisas e levantar dados mais consistentes para investigar, por exemplo, se estas ações reduziram o número de rotatividade, de faltas, de atrasos, de erros na execução de tarefas e de reclamações dos usuários. Com base na observação dos processos de trabalho, o DRH percebeu algumas melhorias, como: i) diminuição do retrabalho em alguns processos; ii) aumento de acessos ao portal do servidor do município, pelo qual os funcionários tomam conhecimento dos eventos de capacitação e das demais informações sobre sua vida funcional; iii) maior procura pela capacitação e pelo aperfeiçoamento profissional; iv) aproximação entre os servidores das diversas secretarias; e v) redução do número de ligações ao departa-mento para esclarecimento de dúvidas.

Com base na avaliação dos participantes, os cursos oferecidos em 2011 obtiveram média geral de 8,6 quanto ao nível de obtenção de novos conheci-mentos, e de 8,4 quanto à aplicação de seu conteúdo à realidade profissional. Isto demonstra que o conteúdo ministrado supriu as necessidades dos servidores para melhorarem seu desempenho nas atividades inerentes ao seu cargo, além de justificar a diminuição do retrabalho, conforme afirmado pelo DRH.

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143Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

4 OS BENEFÍCIOS DE INVESTIR DE FORMA CONTÍNUA EM CAPACITAÇÃO E AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO NO SERVIÇO PÚBLICO

Uma análise da estrutura implantada no município permite elencar alguns be-nefícios, tanto para o servidor, em termos de motivação e saúde, quanto para a administração pública e os usuários de seus serviços.

Conforme anteriormente relatado, as ações da administração pública devem ser norteadas pela lei vigente. Tal prerrogativa condiciona a remuneração dos servidores e a possibilidade de “ganhar melhor” às leis e aos decretos aprovados, que devem considerar a arrecadação mensal dos cofres públicos para não extrapolar o orçamento. Assim, embora não haja como o poder público oferecer a seus funcionários os mesmos aumentos de salário que, muitas vezes, são conquistados no setor privado, algumas vantagens podem ser concedidas. Com base no plano de carreira municipal apresentado, é possível que o servidor estável conquiste, além do reajuste anual, até 8% de acréscimo em seu vencimento-base a cada três anos de serviço público, mas é preciso que realize os cursos de capacitação e tenha bom desempenho profissional. Para incrementar ainda mais sua remuneração, este pode investir em formação profissional e conquistar mais 6% de aumento, bem como estar apto a assumir novos desafios e receber gratificações, caso deseje atuar como instrutor de cursos do Programa Anual de Capacitação. Esta possibilidade de expandir os rendimentos financeiros por meio do trabalho merece ser destacada, pois pode contribuir para que o trabalhador perceba-o de forma mais positiva, conforme relata Dejours (1992, p. 51).

Resta, enfim, o salário, que contém numerosas significações: primeiramente concretas (sustentar a família, ganhar as férias, pagar as melhorias da casa, pagar as dívidas), mas também mais abstratas na medida em que o salário contém sonhos, fantasias e projetos de realizações possíveis. No caso inverso, o salário pode veicular todas as significações negativas que implicam as limitações materiais que ele impõe.

De acordo com Motta (1995, p. 192), “em seu sentido mais comum, a mo-tivação é vista como o grau de vontade e dedicação de uma pessoa na sua tentativa de desempenhar bem uma tarefa”, e por este motivo tem sido objeto de estudo do comportamento humano nas organizações. Ao tomar como base os estudos de Herzberg (1975), uma boa remuneração é capaz de evitar insatisfações no trabalho, mas não consegue garantir a satisfação de forma essencial e duradoura. A verdadeira motivação depende do quanto o conteúdo do cargo é estimulante e desafiador, capaz de gerar sentimentos de realização e crescimento profissional. Ao propi-ciar a seus funcionários a possibilidade de atuar como instrutores dos cursos de capacitação e ao incentivar a formação profissional, por meio da continuidade dos estudos, a prefeitura municipal parece oferecer o arcabouço necessário para

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motivar seus servidores, permitindo que se lancem a novos desafios e que sejam recompensados ao superarem-nos.

Para que os sentimentos de realização profissional possam acontecer, a capaci-tação e o aperfeiçoamento contínuos são imprescindíveis. Por mais comprometido que seja o servidor e por mais aberto que esteja a novos desafios, os sentimentos de inutilidade podem emergir se não estiver suficientemente qualificado (Dejours, 1992). As novas formas de organização do serviço público, as mudanças na legisla-ção, a convivência com novas chefias e novos colegas de repartição, além de inúme-ras outras situações que acarretam transformações no ambiente de trabalho, exigem do funcionário novas posturas e conhecimentos atualizados. É por este motivo que a capacitação deve ser algo permanente e elaborada com a participação dos servido-res, para que atenda às suas reais necessidades.

Para estender a análise dos benefícios trazidos pelo investimento em capaci-tação e aperfeiçoamento do servidor público, vale mencionar novamente Dejours (1992). Para o autor, a qualificação interfere na formação da autoimagem e na saúde do trabalhador. O conhecimento de um indivíduo pode estar além ou aquém das exigências da tarefa. As duas dimensões carecem de atenção. No entanto, quando o sujeito se depara com uma situação de emprego muito complexa para sua capacida-de real, o impacto tende a ser diferente, pois aumentam as chances de um fracasso. Pitta (2003), ao descrever os resultados de seu estudo sobre o sofrimento psíquico dos servidores de um hospital, evidencia que quanto menos qualificados para de-sempenhar sua atividade, maiores as chances de apresentarem algum sofrimento de ordem psicológica. Assim, investir continuamente na capacitação dos servidores é também uma forma de zelar por sua saúde.

O Programa Anual de Capacitação proposto pelo município pesquisado colabora para evitar sentimentos de desqualificação e inutilidade ao prever a oferta de cursos que visam à aprendizagem de procedimentos e ao estudo de legislações específicas, que devem orientar as ações dos funcionários de acordo com sua área de atuação. Merece destaque a exigência de, como pré-requisito para assumir cargos comissionados de chefia, assessoramento ou direção, parti-cipação nos cursos de gestão, que vão fornecer a preparação para lidar de modo eficiente com os desafios das novas atribuições.

A avaliação de desempenho, por sua vez, mostra-se uma importante fer-ramenta para a elaboração de novos programas de capacitação. Como elucida Goldstein (apud Araújo 2005), a avaliação de desempenho individual permite verificar a distância entre o desempenho real e o esperado do colaborador e, a partir disto, identificar quem precisa de treinamento e qual o programa mais indicado para sanar as deficiências encontradas. Se a prefeitura investe em capaci-tação e aperfeiçoamento continuamente, é justo e necessário que sejam avaliadas

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também, de forma contínua, quais as contribuições trazidas para o cotidiano de trabalho do servidor, a fim de testar a eficácia das ações. Destaca-se, ainda, que, ao estender a avaliação de desempenho para além dos três anos de estágio proba-tório, realizando-a anualmente e utilizando-a como requisito para progressão na carreira, o município contribui para que o funcionário público não se acomode e continue comprometido com suas atribuições.

Com servidores mais motivados, comprometidos, conscientes de seu dever e mais bem preparados para desenvolver suas funções, o que contribui para um ín-dice menor de absenteísmo e licenças por doenças ocupacionais, é possível chegar mais próximo daquele que, muitas vezes, parece inalcançável no serviço público: o princípio da eficiência, previsto na CF/88. Com serviços mais eficientes, a fina-lidade normativa da atividade pública se concretiza, que é a satisfação do usuário (Pereira, 2006).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A reforma administrativa vem buscando, há anos, formas de modernizar o Estado, reorganizando estruturas, extinguindo órgãos, criando outros, na tentativa de tornar mais eficiente a prestação de serviços públicos. Mas não se pode deixar de lado aquele que é o agente de todo este processo: o servidor. Uma administração pública ágil e eficiente vai além de novos aparelhos e estruturas menos burocrá-ticas. É fundamental que o servidor esteja mais bem preparado para exercer suas funções e que se exija comprometimento e qualidade em sua atuação, pois é por meio da interação com ele que o usuário constrói sua percepção acerca dos serviços públicos.

Ao analisar a política de gestão de pessoas elaborada por esta prefeitura do Alto Vale do Itajaí, constata-se que a iniciativa promove a valorização do servidor, por meio de sua capacitação permanente, e contribui nitidamente para satisfazer os usuários dos serviços, pois os coloca diante de funcionários mais capacitados e mais conscientes de como atender bem, por meio do curso de atendimento ao cidadão.

Além disso, o Programa Anual de Capacitação, elaborado com a participa-ção do servidor, mostra-se uma ferramenta eficaz para motivá-lo e qualificá-lo, mas infelizmente não é realizado em todos os municípios. O fato de a CF per-mitir que o investimento em tais programas seja proveniente da economia com outras despesas gera a justificativa perfeita para os gestores que não conferem a devida importância à qualificação do funcionário público.

O concurso público, porta de entrada do servidor, mesmo quando contém provas de conhecimentos específicos, não é capaz de mensurar a habilidade prá-tica dos concorrentes, ou seja, sua capacidade de lidar com desafios, de assumir

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responsabilidades, de atender bem ao cidadão, de ser assíduo e comprometido com o trabalho etc. Ele apenas seleciona os indivíduos que passarão a compor o quadro de funcionários dos órgãos públicos, e é de responsabilidade destes, ou ao menos deveria ser, criar mecanismos para a adaptação do servidor e capacitá-lo para o desempenho das atribuições de seu cargo.

A avaliação anual de desempenho profissional é outro instrumento valioso para evitar que o trabalhador do setor público se acomode após a estabilidade no cargo e para incentivar sua busca por aprimoramento e crescimento profissional. Para que possa efetivamente cumprir com seu objetivo, entretanto, deve ser realiza-da com seriedade, e não se transformar em arma de coerção capaz de impedir que as irregularidades cometidas na administração pública sejam denunciadas pelos servidores, os quais têm o dever de zelar pela ética e eficiência do serviço público.

Apesar dos benefícios já mencionados da política de capacitação e ava-liação de desempenho contínuos, implantada por essa prefeitura, sabe-se que é merecedora de algumas críticas e possíveis revisões. Entre elas, o fato de a avaliação de desempenho basear-se apenas nos critérios genéricos da ava-liação pessoal do estágio probatório, e não nas especificidades de cada car-go. Isto acontece por não existir ainda a descrição específica dos cargos. As atribuições existentes na LC no 100/2003, que dispõe sobre a estrutura ad-ministrativa do Poder Executivo, referem-se somente aos cargos de direção, as-sessoramento e chefia, mas não delineiam cada função de cargo estatutário ou comissionado, o que dificulta uma avaliação de desempenho por mérito, capaz de avaliar a eficácia das atividades desempenhadas pelo servidor, e, por conseguinte, sua relação direta com a gestão do programa de governo, os serviços públicos e as políticas públicas (Suzuki e Gabbi, 2009). A avaliação 360 graus, que pode gerar um feedback de desempenho, por exemplo, traz uma inovação, ao envolver os servidores pares, e não apenas avaliação de chefias. Mas ainda pode ser prejudi-cada com os chamados vícios de julgamento ou vícios da avaliação – como falta de memória; medo de prejudicar alguém; concentração em fatos pessoais ou apenas dos últimos dias; desvalorização da avaliação ou unilateralidade etc. (Bergamini e Beraldo, 1988).

É necessário advertir sobre as peculiaridades da avaliação de desempenho, porque a restrição dos seus indicadores e a não observação das atribuições de cargos e metas de governo podem acabar afastando a avaliação de desempenho de seu propósito, a melhoria da gestão pública. Além disso, uma avaliação de desempenho baseada em critérios genéricos pode prejudicar o fornecimento de dados para a construção do plano anual de capacitação, principalmente no que tange aos eventos da linha específica, que visa capacitar os servidores para as tarefas próprias de seu cargo. O sucesso da política de capacitação dependerá do

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147Avaliação de Desempenho e Capacitação Contínuos no Serviço Público

quanto está atrelada às reais necessidades dos servidores. É relevante, portanto, que a prefeitura avance neste sentido.

Outro ponto frágil é o fato de ainda não ocorrer uma mensuração de forma mais consistente dos resultados quantitativos e qualitativos da política de capacita-ção e avaliação de desempenho implantada, o que está previsto para 2013. Apesar de não haver consenso no cenário acadêmico sobre as variáveis do impacto das capaci-tações nos servidores, é essencial criar subsídios suficientes para o planejamento das ações, seja analisando a expectativa, reação e utilidade do treinamento, as possíveis mudanças de comportamento e melhoria no desempenho do cargo, a multiplicação do conhecimento aprendido e efetivamente os resultados imediatos ou a longo prazo no cumprimento das atribuições do servidor (Gonçalves e Mourão, 2011). Partindo-se do pressuposto de que a satisfação dos usuários deve ser a finalidade maior do serviço público, seria relevante que, na estruturação destes critérios de avaliação de resultados, a prefeitura considerasse também a opinião do usuário, averiguando sua satisfação e se houve melhoria no atendimento prestado pelo órgão. Não obstante, seria fundamental inserir a participação do cidadão na cons-trução das ações de capacitação, por meio de ouvidorias ou espaços para críticas e sugestões, conferindo-lhe a oportunidade de apontar falhas que podem ser menos perceptíveis às chefias e aos servidores de determinados departamentos. Desta forma será possível indicar soluções para que os atendimentos sejam cada vez mais eficientes e humanizados e para que os servidores estejam motivados e capacitados para realizá-los.

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Originais submetidos em janeiro de 2012. Última versão recebida em novembro de 2012. Aprovado em dezembro de 2012.

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O IMPACTO DO INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO NO CRESCIMENTO DA ECONOMIA BRASILEIRAJoão Guilherme de Oliveira Carminati*Elaine Aparecida Fernandes**

Após meados da década de 1990, os fluxos de investimento direto estrangeiro (IDE) com destino ao Brasil aumentaram expressivamente. O setor de serviços liderou o ranking daqueles que mais receberam este tipo de investimento. Neste contexto, o presente estudo analisou, por meio do modelo autoregressivo vetorial estrutural (VAR Estrutural), as relações existentes entre o produto interno bruto (PIB) e o IDE para a economia brasileira no período 1986-2009. Os resultados sugerem que o IDE exerce efeito pequeno, mas positivo sobre o PIB. Este efeito pode ser intensificado à medida que ocorram melhorias nas condições internas – infraestrutura, desenvolvimento do sistema financeiro etc. Adicionalmente, a resposta do PIB, dado um choque no IDE, não se dissipa rapidamente, indicando que tal choque possui repercussão ao longo de muitos períodos após o evento. Este fato sugere a importância deste tipo de investimento para a economia brasileira, principalmente se, na sua atração, for observada a qualidade e não só a quantidade de IDE.

Palavras-chave: investimento direto estrangeiro; crescimento econômico; Brasil.

THE IMPACT OF FOREIGN DIRECT INVESTMENT IN THE BRAZILIAN ECONOMIC GROWTH

After the middle of the 90’s, the flows of foreign direct investment (FDI) increased a lot. Nevertheless, this flow was mainly directed to the service sector which is typically untradeable. This finding has motivated this study which through the Structural VAR model tried to analyze the relations between the gross domestic product GDP and the FDI for the Brazilian economy in the period of 1986 to 2009. The results suggest that the FDI has a small effect, but positive, on the GDP. In spite of being small, this effect is an important external stimulus and it can be intensified as the improvement on the internal conditions happens – infrastructure, development of the financial system, etc. In addition, the feedback of GDP, as it’s given a shock in the direct investment, it doesn’t disappear quickly, it indicates that such shock have a repercussion during long periods after the investment. This fact suggests the importance of this kind of investment for the Brazilian economy, mainly, if in the attraction, it is observed the quality and not only the quantity of FDI.

Keywords: foreign direct investment; economic growth; Brazil.

EL IMPACTO DE LA INVERSIÓN EXTRANJERA DIRECTA EN EL CRECIMIENTO DE LA ECONOMÍA BRASILEÑA

Después de la mitad de la década de 1990, los flujos de inversión extranjera directa (IED) en Brasil aumentaron de manera significativa. El sector servicios lideró el ranking de los que recibieron más

* Economista da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). E-mail: [email protected]. ** Professora do Departamento de Economia da Universidade Federal de Viçosa (UFV). E-mail: [email protected].

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inversión. En este contexto, el presente estudio examinó, a través del modelo VAR estructural, la relación entre el Producto Interno Bruto (PIB) y la inversión extranjera directa para la economía brasileña entre 1986 y 2009. Los resultados sugieren que la IED ejerce un pequeño pero positivo efecto sobre el PIB. Este efecto puede ser intensificado a medida que se producen mejoras en las condiciones internas – infraestructura, desarrollo del sistema financiero, etc. Además, la respuesta del PIB, dado una variación en IED, no se disipa rápidamente, lo que indica que este choque tiene repercusión durante muchos períodos después del evento. Esto sugiere la importancia de este tipo de inversión para la economía brasileña, sobre todo si, en la su atracción, se observa no sólo la cantidad pero la calidad de IED.

Palabras clave: inversión extranjera directa; crecimiento económico; Brasil.

L’IMPACT DE L’INVESTISSEMENT DIRECT ÉTRANGER DANS LA CROISSANCE DE L’ÉCONOMIE BRÉSILIENNE

À partir de la moitié des années 1990, les flux d’investissements directs étrangers déstinés au Brésil ont augmenté expressivement. Le secteur de services etait leader de ceux qui ont reçu le plus d’investissements. Dans ce contexte, cet étude-ci a analisé, avec le modèle VAR structurel, les relations entre le produit intérieur brut et l’IDE pour l’économie brésilienne à la période de 1986 à 2009. Les résultats suggèrent que l’IDE exerce peu d’éffets, pourtant des effets positifs, sur le PIB. Cet effet peut être intensifié lorsque des amélioratins dans les conditions internes – infrastructure, développement du système financier etc. En plus, les effets du PIB, après le choc dans le IDE, ne cessent pas rapidement, ce qu’indique que tel choc a des effets au long de plusieurs périodes après l’évènement. Ce fait sugère l’importance de ce type d’investissement pour l’économie brésilienne, surtout si, dans son atraction, on observe la qualité et non seulement le montant de IDE.

Mots-clés: investissement direct étranger (ou investissement direct à l’étranger); la croissance économique; Brésil.

JEL: F23.

1 INTRODUÇÃO

Sabe-se que o processo de globalização tem aumentado o volume de investimento estrangeiro direto (IDE) em todo o mundo, principalmente em países em de-senvolvimento como o Brasil (UNCTAD, 2010). Em um mundo cada vez mais globalizado e dinâmico, torna-se necessária a análise do impacto do IDE sobre as economias receptoras, sobretudo os efeitos relacionados ao crescimento eco-nômico. Neste sentido, a questão que se coloca é, se depois de adotadas todas as medidas1 que favoreceram a entrada de capital estrangeiro e depois de cessado o processo de privatizações – considerado um dos grandes responsáveis pela entrada expressiva de IDE na década de 1990 e início de 2000 –, os investimentos dire-tos continuam direcionados para a economia brasileira. Além disso, questiona-se

1. As medidas de apoio ao capital estrangeiro se intensificaram a partir de meados dos anos de 1990. Em 1995, ainda no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, permitiu-se à eliminação da separação constitucional entre as empresas nacionais e estrangeiras; a eliminação ou a redução de restrições aos investimentos externos nos setores de petróleo, extrativo mineral, bancos e seguradoras, navegação de cabotagem e telecomunicações e a nova lei de propriedade industrial (Gonçalves, 1999; Moreira, 1999).

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também se este investimento está resultando em maiores níveis de produto inter-no bruto (PIB). O exame destas questões é fundamental para a adoção de polí-ticas públicas que visem à atração do investimento direto. Se este não apresentar contribuição positiva para o crescimento, sua relação custo-benefício se torna desfavorável, inibindo o seu efeito positivo sobre o PIB.

O aumento nos ingressos de IDE aconteceu em um ambiente de quase completa liberdade, sem nenhuma preocupação com a sua qualidade e sem ne-nhuma política que direcionasse estes fluxos para áreas prioritárias da economia. Desde que o capital estrangeiro atenda às questões formais de registro e de natu-reza tributária, não existe nenhum tipo de restrição cambial para a efetivação de transferências – capital, lucros, dividendos, despesas vinculadas ao investimento etc. – para o exterior.2 A ausência da intervenção governamental na priorização de investimentos setoriais configura a crença dos formuladores de política econômi-ca brasileira no poder alocativo do mercado. Mesmo compartilhando, em parte, desta crença, não se pode esquecer as deficiências do mercado como promotor do bem-estar social, o que constitui o objetivo da atividade econômica.

Nesse contexto, o presente artigo busca, de forma geral, analisar as rela-ções existentes entre crescimento econômico e investimento direto estrangeiro para a economia brasileira no período 1986-2009. Especificamente, pretende-se: i) analisar o comportamento do IDE para a economia brasileira, com enfoque nas décadas de 1990 e 2000; ii) identificar o papel determinante de algumas variáveis selecionadas – taxa de câmbio, infraestrutura, inflação, carga tributária e o desen-volvimento do setor financeiro – no processo de entrada de investimento direto estrangeiro; e iii) analisar o efeito do ingresso de IDE no crescimento econômico.

Existem na literatura nacional alguns trabalhos que tratam da relação entre o investimento direto estrangeiro e seus determinantes no Brasil, assim como há outros que analisam os impactos que o IDE exerce na economia brasileira. Laplane e Sarti (1999); Nonnenberg e Mendonça (2005); Lima Junior e Jayme Junior (2006; 2008); Mattos, Cassuce e Campos (2007); Fernandes e Campos (2008); e De Negri e Laplane (2009) podem ser citados como exemplos. Na literatura internacional, existem inúmeros estudos sobre o tema, mas são muito poucos os que tratam exclusivamente do Brasil, normalmente, eles trabalham com os países em desenvolvimento de maneira geral. Assim, podem-se destacar as pesquisas de Borensztein, De Gregorio e Lee (1998) e Busse e Hefeker (2007) para países em desenvolvimento, entre eles o Brasil; Asiedu (2002) para os países da África Subsaariana; Mottaleb (2007) e Demirhan e Masca (2008) para países em

2. Informações disponíveis em: <http://www.bcb.gov.br>.

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desenvolvimento; Amal e Seabra (2007)3 para a América Latina; Ang (2008) para a Malásia; entre outros.4

Entre as contribuições nacionais, Laplane e Sarti (1999) analisaram o efei-to do investimento direto estrangeiro no crescimento econômico na década de 1990. Os autores concluíram que, apesar de o IDE ser uma importante fonte de divisas para o Brasil, ele não resolve uma das principais restrições ao crescimento, que é a restrição externa na balança comercial, pois não altera significativamente a pauta de exportações. Portanto, apesar do expressivo aumento dos fluxos de investimento, as características do IDE limitaram sua contribuição para a economia brasileira. Segundo estes autores, durante a década de 1990, ocorreu perda de atratividade da indústria frente ao setor de serviços na atração de IDE devido, entre outros fatores, ao processo de privatização nas áreas de serviços públicos, principalmente no setor de energia elétrica e telecomunicações. Por fim, os volumes de investimentos na indústria, relativamente pequenos e concentrados em poucos setores, demonstraram a baixa capacidade de reação à expansão da renda, além de baixo poder de indução. Assim, sua capacidade de estimular o crescimento no período foi limitada.

Nonnenberg e Mendonça (2005) realizaram uma análise dos principais determinantes do IDE no período 1975-2000. Os resultados mostraram que o IDE não tem efeito positivo sobre o PIB. Pelo contrário, o PIB do país receptor é que tem efeito sobre a entrada de IDE. Lima Junior e Jayme Junior (2006) também examinaram os principais determinantes dos fluxos de IDE para a economia brasileira. O foco de análise compreende 49 setores pertencentes à indústria e ao setor de serviços, no período 1996-2003. Os resultados evidenciaram que as variáveis que afetam positivamente os ingressos de IDE são: o tamanho e o ritmo de crescimento do produto (PIB); e o coeficiente de abertura econômica, proxy para a disposição do país em aceitar investimento externo.

Apesar de existirem trabalhos que analisam o assunto, não se tem uma posição definida de qual seria a verdadeira influência dos IDEs na economia brasileira. Isto se deve às próprias características das entradas deste investimento na década de 1990. Concentração no setor de serviços – tradicionalmente não exportador –, forma de fusões e aquisições, falta de condições adequadas de infraestrutura, elevada carga tributária, altas taxas de juros, burocracia e remessa da maior parte dos lucros das transnacionais para o país de origem são algumas das características que podem ser citadas como exemplo. Neste contexto, busca-se contribuir, procurando estabelecer uma relação direta entre crescimento econômico e investimento direto a fim de

3. Os autores examinam os determinantes do investimento direto estrangeiro (IDE) na América Latina, com ênfase no impacto de variáveis institucionais, como o risco político, o grau de liberdade econômica e o nível de corrupção do país receptor.4. Para mais detalhes a respeito dos trabalhos citados, ver Carminati (2010).

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colaborar para a formulação de políticas públicas, com vista a aumentar a capacidade de captação de investimentos internacionais de longo prazo.

O presente trabalho diferencia-se dos outros estudos realizados para o Brasil ao empregar um conjunto distinto de variáveis determinantes do IDE. Variáveis como infraestrutura, desenvolvimento do sistema financeiro e carga tributária são cruciais para o entendimento das motivações deste tipo de investimento.

O artigo contém, além desta introdução, cinco seções. A segunda e a terceira embasam teoricamente a relação IDE e PIB. A quarta mostra o método de análise utilizado. A quinta expõe e analisa os resultados encontrados, e compara-os com outros trabalhos. Por fim, a sexta faz as considerações finais do estudo.

2 AS MOTIVAÇÕES PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO VIA IDE: TEORIA ECLÉTICA

A teoria eclética foi utilizada neste trabalho para dar embasamento teórico às variáveis utilizadas como determinantes da entrada de IDE para a econo-mia brasileira. O principal expoente desta corrente teórica é Dunning (1981; 1993; 1999).5 A abordagem de Dunning entende que determinadas falhas de mercado – a existência de custos de informação e transação, oportunismo dos agentes e especificidades de ativos – levariam uma empresa a optar pelo investi-mento direto em vez de licenciamentos a outras empresas, ou exportação direta como modo de entrada em um mercado externo. Para entender esta decisão de produção internacional, deve-se adicionar o condicionamento criado por algumas variáveis estruturais e conjunturais, como características do país e da indústria, variáveis operacionais e estratégias específicas da empresa.

Nesse sentido, determinada empresa pode contar com vantagens dife-renciais classificadas em três tipos: vantagens de propriedade, de localização e de internalização. A vantagem de propriedade depende da existência de ativos específicos, como tecnologias produtivas ou de gestão, e dotações nacionais de fatores passíveis de serem internalizados por empresas/setores. Estas vantagens podem ser de natureza estrutural, derivada da posse de ativos intangíveis – patentes, marcas, capacidades tecnológicas e de gerência, habilidades para diferenciação de produtos etc. – e de natureza transacional, que resultam da própria característica transnacional da empresa.

É importante ressaltar que a decisão de produzir no exterior, ao invés de licen-ciar ou exportar, está fortemente influenciada pela natureza dos ativos intangíveis. O conhecimento é um importante exemplo. Ele pode ser usado diretamente pela firma, mas pode também ser vendido ou licenciado. O licenciamento deste

5. Além de Dunning, existem outros autores que ajudaram a desenvolver a teoria eclética da internalização da firma, como Buckley e Casson (1976) e Rugman (1981).

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tipo de ativo está sujeito a diferentes falhas de mercado, o que dificulta a captação de sua rentabilidade e facilita o comportamento oportunista dos licenciados ou compradores. Sendo assim, a existência de ativos intangíveis estimula o investi-mento na produção internacional da firma.

As vantagens de localização são aquelas oferecidas por um determinado país ou região que possuam características que os distingam dos demais. A abundân-cia de recursos naturais e humanos, know-how tecnológico, infraestrutura, carga tributária, desenvolvimento do sistema financeiro, taxa de câmbio, tamanho do mercado e estabilidade política e econômica podem ser citados como exemplos. Nesse sentido, quanto maior a existência de recursos naturais e humanos e mais vantagens advindas da tecnologia, da infraestrutura, do tamanho do mercado, da estabilidade econômica e política, e do desenvolvimento do sistema financeiro, maiores serão as quantidades entrantes de IDE. De forma contrária, quanto mais oneroso o sistema tributário, menores serão as quantidades recebidas de IDE por determinado país.

A relação entre vantagens de propriedade e vantagens de localização é im-portante na determinação dos padrões de comércio das empresas transnacionais. A existência de vantagens de propriedade – na ótica do paradigma eclético – determina qual firma irá abastecer um mercado externo particular, enquanto as vantagens de localização explicam se a firma irá abastecer este mercado via expor-tação ou via produção local.

Por fim, tem-se a vantagem de internalização que é derivada das vantagens desfrutadas pelas firmas ao optar por internalizar determinado ativo ao invés de transacioná-lo no mercado. Quando os mercados são perfeitamente competitivos, a coordenação de atividades interdependentes não pode ser melhorada e não existem incentivos para internalizar. Estes incentivos para internalizar certas atividades são derivados de imperfeições de mercado. Tais imperfeições podem ser estruturais – barreiras à competição e altos custos de transação ou cognitivos – e são conse-quências de problemas de informação. Dunning (1981) considera as vantagens de internalização como o principal fator a impulsionar a integração vertical e horizontal das firmas em nível internacional, pois, se não houvesse este incentivo, as transa-ções se dariam via mercado, por meio das firmas independentes.

Dunning (1988) classifica o investimento estrangeiro em quatro tipos, a fim de ordenar as alternativas que podem surgir das diferentes combinações das três vantagens supracitadas.6 O primeiro tipo é denominado resource seeking. O IDE realizado com este objetivo visa à aquisição de recursos específicos, a baixos

6. Esta divisão representa as motivações principais do IDE, mas estas não são, necessariamente, exclusivas. A partir dos anos de 1990, principalmente, muitas das grandes empresas transnacionais passaram a adotar amplos objetivos, que combinam algumas destas categorias básicas.

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custos, para a produção de bens. Este tipo ou estratégia de investimento tende a gerar baixos vínculos com as economias receptoras, sendo a geração de fluxos de exportações sua principal contribuição.

O segundo tipo, denominado de market seeking, é para o mercado interno do país receptor e, eventualmente, para países vizinhos. Mesmo orientados para o mercado interno, estes investimentos deram lugar a importantes fluxos de ex-portação em alguns países em desenvolvimento, como o Brasil (Fritsch e Franco, 1991). Entretanto, existe evidência de baixa atualização das filiais em engenharia de produtos e processos, impactos negativos sobre o balanço de pagamentos e formação de estruturas oligopolitas em economias fechadas (Chudnovsky, 1993).

A principal característica do terceiro tipo de investimento, asset seeking, é o fato de concentrar-se na compra de empresas existentes. Isto foi o que ocorreu na década de 1990, quando a entrada de IDE se concentrou principalmente na forma de fusões, aquisições e joint-ventures ocorridas entre as grandes empresas globais.

Por fim, a estratégia efficiency seeking tem como objetivo central o aprovei-tamento do mercado doméstico, buscando a obtenção de economias de escala e especialização intracorporação. As plantas locais se reconvertem por meio da pro-dução e exportação de partes, componentes e certos veículos, no caso da indústria automotiva, a outras filiais da corporação.

3 INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO E CRESCIMENTO ECONÔMICO

3.1 Contribuições teóricas sobre IDE e crescimento econômico

A internacionalização da economia mundial, principalmente de países em de-senvolvimento como o Brasil, ganha destaque na atualidade. Esta internaciona-lização reflete um maior incremento nas transações financeiras e, em particular, nos fluxos de investimento direto. Os IDEs podem se constituir em importante fonte de inovação tecnológica, expansão da capacidade produtiva, novas técnicas empresariais e administrativas, além de inúmeras outras externalidades que, se concretizadas, impulsionariam o crescimento econômico do país receptor.

Na tentativa de relacionar crescimento e investimento, este artigo resume algumas ideias importantes a respeito do tema. Entre elas, as mais populares são as de Solow (1956) e Swan (1956). Os modelos destes autores foram pioneiros em esclarecer como a acumulação de capital físico e o progresso tecnológico são as forças motoras do crescimento econômico. Entretanto, por considerar o pro-gresso tecnológico exógeno, surgem várias críticas e desenvolvimentos posteriores destes modelos. Os trabalhos de Romer (1986) e Lucas (1988) dão origem à teoria do crescimento endógeno, em que o progresso tecnológico deixa de ser exógeno e tratam, principalmente, de responder algumas questões tradicionais

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básicas, como quais seriam os seus determinantes, por que existem diferenças entre os níveis de produção per capita de diferentes países e por que políticas são eficazes para levar ao crescimento econômico sustentável.

Quanto à influência do IDE no crescimento econômico, se forem utiliza-das pressuposições teóricas baseadas em modelos neoclássicos como o de Solow (1956), o efeito de IDE sobre o crescimento do produto será limitado pela exis-tência de rendimentos decrescentes do capital físico. Assim, o IDE afeta o nível da renda per capita, mas não afeta sua taxa de crescimento de longo prazo. De forma contrária, se for estudado sob o âmbito da teoria do crescimento endógeno, o IDE poderá afetar a taxa de crescimento do país de forma endógena. Isto ocorre devido à possibilidade de se ter rendimentos crescentes na produção por meio dos efeitos de difusão (spillovers) e externalidades – uso e aproveitamento de matérias--primas locais; modernas formas de gestão e direção; acesso a novas tecnologias; ajudam a financiar déficit em conta corrente; não geram dívida, além disso, con-tribuem no incremento do estoque de capital humano mediante os processos de treinamento e aprendizagem que realizam as empresas; as empresas locais podem aprender observando e, por último, as externalidades e os spillovers possibilitam maiores investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Assim, o IDE consegue gerar crescimento de longo prazo e, segundo alguns autores,7 pode ser o principal motor de transmissão de tecnologia para os países em desenvolvimento. Nesta ótica, a influência do IDE na taxa de crescimento do PIB per capita dá-se, basica-mente, de duas formas. A primeira ocorre por meio do processo de acumulação de capital originária do ingresso dos fluxos de investimentos estrangeiros. Sendo assim, o IDE impulsiona o crescimento incorporando novos insumos, novas tec-nologias na função de produção do país anfitrião.

De outra forma, o IDE influi no crescimento por meio da transferência de conhecimento, introduzindo novas técnicas de organização empresarial, progra-mas de aprendizagem, técnicas de marketing e uma infinidade de outros ativos intangíveis. Entretanto, deve-se observar que, segundo De Mello (1999), a con-vivência de tecnologias inovadoras e obsoletas em países em desenvolvimento sugere uma menor eficiência da utilização da tecnologia avançada e/ou que a tecnologia moderna é menos produtiva que a existente. Neste sentido, a dotação de fatores de uma economia atuará como determinante do processo de investi-mento estrangeiro, diminuindo e/ou aumentando o efeito da difusão tecnológica internacional do IDE.

É importante ressaltar que o presente trabalho partilha as ideias da teoria do crescimento endógeno, ressaltando que o IDE pode ser uma fonte importante de

7. Ver Borensztein, De Gregorio e Lee (1998).

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crescimento,8 entretanto, sem a existência de um clima propício de estabilidade econômica e sem uma maior qualificação do capital humano, os efeitos positivos deste investimento podem perder parte de sua eficácia. Assim, em vez de esti-mular o crescimento, pode causar maior repatriamento do capital por parte das empresas transnacionais.

3.2 Estrutura teórica

A estrutura teórica, baseada em Barro e Sala-I-Martin (1995) e em Borensztein, De Gregorio e Lee (1998), foi feita considerando que a economia nacional pro-duz um único bem de consumo com a tecnologia expressa pela fórmula 1,

(1)

em que A representa as condições exógenas referentes ao ambiente analisado – são variáveis políticas e de controle que afetam o nível de produtividade da economia; H representa o capital humano – este insumo é considerado fixo para fins de análise; K ilustra o capital físico – consiste na agregação das variedades de bens de capital. O progresso técnico é representado pelo aumento do número de variedades de bens de capital disponíveis (Romer, 1990; Barro e Sala-I-Martin, 1995).

A partir do exposto, o estoque de capital doméstico pode ser definido de acordo com a expressão 2,

(2)

em que N é o número total de variedades de capital e x(j) é a demanda para cada bem de capital.

Suponha-se que existam dois tipos de firmas que produzam bens de capital. Estes dois tipos vão ser denominados de firma doméstica e firma estrangeira. A firma doméstica produz n e a estrangeira produz n* variedades de bens de capital de um total de N.

Assume-se que a firma que produz bens de capital aluga-os para a firma que produz bens finais a uma taxa de aluguel igual a m(j). A condição de escolha óti-ma que deve vigorar nesta situação é aquela descrita pela expressão 3.

(3)

A expressão 3 mostra que o preço do bem de capital deve ser igual à sua produtividade marginal.

8. Nesse sentido, o IDE se revela um dos canais possíveis de progresso tecnológico, utilizado pelos países em desen-volvimento, que levará ao crescimento econômico (Borensztein, De Gregorio, Lee, 1998; Blomström e Kokko, 1996).

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Ressalta-se que o aumento da variedade do número de bens de capital está atre-lado à adaptação da tecnologia disponível em países mais avançados. Supõe-se que esta adaptação da tecnologia é um processo dispendioso, implicando um custo fixo de instalação que ocorre antes da produção do novo tipo de capital no país anfitrião. Este custo fixo depende da razão entre n* e N (n*/N). Neste contexto, as firmas estran-geiras trazem para as economias em desenvolvimento vantagens na produção de bens de capital – “conhecimento” – já disponíveis em outros países. Consequentemente, as firmas estrangeiras são consideradas o principal canal de progresso tecnológico. Assume-se também a existência de um efeito catch-up do progresso tecnológico, pois é mais barato a imitação de um processo de produção existente que a criação de novos produtos. Isto pode ser feito considerando que o custo de instalação depende positiva-mente do número de variedades de capital produzidas pelo país anfitrião comparado com aquelas produzidas em países mais avançados (N*). Sendo assim, países com menor N/N* possuem grandes possibilidades de imitação e os custos de se adotar novas tecnologias são menores. A partir daí, tem-se a seguinte forma funcional para o custo de instalação:

em que e (4)

A expressão 4 diz que o aumento do número de variedades pode resultar em uma melhoria da qualidade dos bens existentes (níveis de qualidade). Se a pre-sença de firmas estrangeiras reduzir o custo de melhoria da qualidade dos bens de capital existentes, ocorre uma relação negativa entre investimento direto e custo de instalação. Além disso, o catch-up pode ser reinterpretado, ou seja, se o custo de melhoria da qualidade de bens de capital é menor, menor também será sua qualidade.

Assumindo-se que o custo marginal de produção de x(j) é igual a 1, que os bens de capital se depreciam totalmente, e que a taxa de juros (r) é constante, os lucros para o produtor de novas variedades de capital j são:

(5)

Ao se maximizar a expressão 5 sujeito à 3, tem-se o nível de equilíbrio para a produção de cada bem de capital x(j):

(6)

É importante salientar que x(j) independe do tempo, além disso, o nível de produção de diferentes variedades é o mesmo devido à simetria entre produtores. Ao se substituir a expressão 6 na 3, encontra-se a taxa de aluguel conforme a fórmula 7.

(7)

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161O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

Por fim, assume-se livre entrada, sendo assim, a taxa de retorno r deve ser aquela em que os lucros são zero. Após resolução para r tem-se expressão 8.

em que (8)

Para fechar o modelo, é descrito o processo de acumulação de capital que é norteado pelo comportamento poupador. Assume-se que o indivíduo maximiza sua utilidade intertemporal por meio da função de utilidade a seguir,

(9)

em que C denota unidades consumidas do bem final Y. Ao se considerar a taxa de retorno igual a r, o consumo ótimo obedece a condição ilustrada pela expressão 10.

(10)

Assim, em equilíbrio, a taxa de crescimento do consumo deve ser igual a taxa de crescimento do produto. Substituindo a expressão 8 na 10, tem-se a taxa de crescimento da economia g.

(11)

A expressão 11 mostra que o investimento direto n*/N reduz os custos de in-trodução de novas variedades de bens de capital, assim aumenta a taxa a qual estes bens são introduzidos. O custo de introdução de novos bens de capital é menor para países mais atrasados – isto ocorre devido ao fato desses países possuírem me-nores custos de adoção de tecnologia tendendo a crescer mais rapidamente. Neste contexto, o efeito do IDE na taxa de crescimento da economia é positivamente associado com o nível de capital humano.

4 METODOLOGIA

Esta seção tem por objetivo introduzir os fundamentos metodológicos que sustentam os testes e procedimentos econométricos que foram empregados na verificação das relações entre IDE e crescimento econômico, e entre IDE e seus determinantes. Esta verificação foi feita com base no modelo autorregressivo vetorial estrutural (VAR estrutural).

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Para tanto, são realizados os procedimentos econométricos usuais de séries temporais, como a análise da estacionariedade das séries, por meio de testes de raiz unitária;9 o critério de seleção de defasagens; e o teste de exogeneidade para verificar a relação entre as variáveis. Após a utilização de todos estes instrumentos econométricos, foi estimado o VAR estrutural, de onde partem a análise dos coe-ficientes das relações entre as variáveis, a análise das funções impulso-resposta e a análise da decomposição histórica da variância dos erros de previsão.

4.1 Especificação do modelo

O presente trabalho busca identificar a relação entre o investimento direto estrangeiro e o PIB para a economia brasileira nos últimos anos. Para tanto, é apresentada a expressão 11. Esta expressão mostra que, sob características adequadas do país anfitrião, o IDE afeta positivamente o seu PIB via transbor-damentos de tecnologia.10

(11)

Além da relação entre investimento e PIB, este estudo também procurou analisar a importância de um conjunto de determinantes – selecionados de acordo com a teoria eclética para a entrada de investimento direto estrangeiro na economia brasileira (por meio da expressão 12).

(12)

em que, IDE é o ingresso de investimento direto estrangeiro no Brasil; CAM é a taxa real de câmbio comercial – venda – (R$/US$); EST é a soma do consumo comercial e industrial de energia elétrica (GWh), proxy para infraestrutura; TAX é o imposto sobre a importação, proxy para carga tributária; INF é a inflação acumulada (%), medida pelo índice de preços ao consumidor amplo (IPCA), proxy para instabilidade econômica; e DES são as operações de crédito ao setor privado, proxy para desenvolvimento do sistema financeiro.

Assim, com base no exposto, a matriz de relações contemporâneas, cons-truída a partir do procedimento de Bernanke (1986), pode ser representada de acordo com a tabela 1.

9. Feita, inicialmente, por meio da análise gráfica das séries e, posteriormente, pelos testes de Dickey-Fuller aumentado (ADF) e Dickey-Fuller generalized least squares (DF-GLS). Posteriormente, verificou-se a existência de outliers por meio do teste de Chow (1960).10. Para mais detalhes, consultar a seção 3.2.

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163O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

TABELA 1Matriz de relações contemporâneas do modelo VAR estrutural

Efeito de Sobre

CAM EST INF TAX DES IDE PIB

CAM 1 - - - - - -

EST - 1 - - - - -

INF - - 1 - - - -

TAX - - - 1 - - -

DES - - - - 1 - -

IDE a61 a62 a63 a64 a65 1 -

PIB - - - - - a76 1

Fonte: resultados da pesquisa.Elaboração dos autores.Obs.: CAM = taxa de câmbio; EST = proxy para infraestrutura; INF = proxy para instabilidade econômica; TAX = proxy para carga tributária; DES = proxy para desenvolvimento do sistema financeiro; e IDE = investimento direto estrangeiro.

O efeito das relações entre as variáveis é observado de acordo com os coefi-cientes a61; a62; a63; a64; a65; e a76. O efeito da taxa de câmbio (CAM) sobre o IDE é especificado pelo coeficiente a61. Espera-se que este coeficiente tenha valor po-sitivo, pois o aumento da taxa de câmbio – a desvalorização da moeda doméstica em relação à moeda estrangeira (US$) – aumenta a riqueza relativa e diminui os custos relativos das empresas estrangeiras, o que causa efeito benéfico na atração de novos investimentos.

O coeficiente a62 representa o efeito da infraestrutura (EST), medida pelo somatório do consumo comercial e industrial de energia elétrica, sobre o inves-timento direto estrangeiro (IDE). Espera-se que EST exerça um efeito positivo sobre os fluxos de investimento direto que ingressam na economia doméstica, portanto, o sinal esperado para o coeficiente a62 é positivo.

O coeficiente a63 representa o efeito da instabilidade econômica (INF), me-dida pela inflação, sobre o investimento direto estrangeiro. Espera-se que INF exerça um efeito negativo sobre os fluxos de IDE, portanto, o coeficiente a63 deve ser negativo.

O efeito de TAX sobre o IDE é representado pelo coeficiente a64. Se se con-siderar que a carga tributária aumenta os custos de produção e outros custos relacionados aos negócios, podendo diminuir a lucratividade do investimento, espera-se um efeito negativo (relação inversa) entre as duas variáveis.

O impacto do desenvolvimento do sistema financeiro (DES) sobre o inves-timento direto estrangeiro é capturado pelo coeficiente a65. Um maior desenvolvi-mento do sistema financeiro implica maiores fluxos de IDE, sendo assim, espera-se que tal coeficiente tenha um sinal positivo, indicando uma relação direta entre as duas variáveis.

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Por fim, espera-se que o coeficiente estimado a76, representativo da relação entre investimento direto estrangeiro e PIB, assuma um valor positivo, o que im-plica que quanto maior o ingresso de IDE, maior será o PIB do país.

4.2 Fonte de dados

Este artigo utilizou-se das seguintes variáveis para analisar a relação entre IDE e crescimento econômico: PIB do Brasil, expresso em dólares americanos (US$); fluxo de entrada de investimento direto estrangeiro que ingressa em território nacional, também expresso em dólares americanos (US$); imposto sobre impor-tação11 (US$), proxy para carga tributária; somatório do consumo comercial e industrial de energia elétrica (GWh), proxy para infraestrutura; taxa real de câm-bio comercial – venda – (R$/US$); taxa de inflação acumulada (%), medida pelo IPCA, proxy para instabilidade econômica; e empréstimos ao setor privado (US$), proxy para desenvolvimento do sistema financeiro.

É importante mencionar que o fato de se utilizar dados em periodicidade trimestral impossibilitou o uso de outras possíveis variáveis determinantes do IDE no Brasil. Outro fator de limitação pode estar relacionado ao uso de variáveis proxies.

Pelo fato de algumas das séries de dados estudadas não estarem disponíveis para coleta – seja pela sua própria natureza, seja pela falta de observações suficien-tes para estimação do modelo ou pela periodicidade requerida –, torna-se necessá-rio a sua observação por meio de outra variável. Todavia, a utilização de variáveis proxies observadas é um recurso comumente visto nos trabalhos envolvendo os determinantes do investimento direto estrangeiro.

Todas as séries mencionadas foram obtidas no endereço eletrônico do Ipea.12 As variáveis utilizadas na análise são trimestrais e cobrem do primeiro trimestre de 1986 ao terceiro trimestre de 2009, abrangendo 95 observações. Foram uti-lizados os logaritmos naturais de todas as séries usadas na pesquisa, com exceção da variável inflação, que apresentou valores negativos. Por fim, todas as variáveis monetárias utilizadas no modelo estão mensuradas a preços correntes e, portanto, foram deflacionadas utilizando-se o IPCA.

11. O imposto de importação reflete aspectos relacionados ao desenvolvimento de um país e de sua política cambial. Países menos desenvolvidos importam mais bens, pois necessitam suprir sua demanda. Um exemplo importante é a maior importação de bens de capital que pode significar um aumento na atividade econômica do país. Em adição, este imposto pode ser utilizado para promover a produção de produtos estrangeiros no país com o objetivo de melhorá-lo tecnologicamente. Neste sentido, pode-se aplicar a suspensão do recolhimento dos tributos na importação, sob condição de posterior exportação.12. Ver Ipeadata: série histórica. Disponível em: <http://www.ipeadata.gov.br>.

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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 Os efeitos do IDE e as variáveis selecionadas no PIB brasileiro

Neste estudo foram utilizados os testes Dickey-Fuller aumentado (ADF) e Dickey-Fuller generalized least squares (DF-GLS), com base no procedimento desenvolvido por Dolado, Jenkinson e Sosvilla-Rivero (1990), no intuito de definir os termos determinísticos a serem incluídos: intercepto, tendência ou ambos. Os níveis de significância considerados foram de 1% e 5%. Os resul-tados dos testes indicam para a não rejeição da hipótese nula de presença de raiz unitária para as séries taxa de câmbio (CAM), infraestrutura (EST), carga tributária (TAX), desenvolvimento do sistema financeiro (DES), IDE e PIB, o que as determina como não estacionárias em nível. No entanto, tornam-se es-tacionárias após a primeira diferença, caracterizando-as como I(1). A série ins-tabilidade econômica (INF) apresentou-se estacionário em nível I(0). Quanto ao critério de escolha do número de defasagens para o teste ADF, foi seguido o critério de informação de Schwarz.

Entretanto, os procedimentos pré-realizados para testar a presença de raiz unitária podem não ser válidos, pois o período 1986-2009 foi marcado por diversas mudanças políticas e econômicas – diversos planos econômicos, mudanças na estrutura cambial, crises energéticas, crises internacionais, entre outras. Sendo assim, testou-se a presença de quebra estrutural por meio do procedimento sugerido por Chow (1960) e Andrews (1993). As quebras foram significativas nos seguintes trimestres: terceiro trimestre de 1994 (Plano Real); primeiro trimestre de 1999 (mudança cambial); e terceiro trimestre de 2001 (programa de racionamento de energia elétrica).

Diante da existência de quebras estruturais no modelo, foi necessário realizar o teste de raiz unitária sobre a presença de mudança estrutural. A hipótese nula do teste é que a série possui raiz unitária, portanto, é não esta-cionária. Os valores críticos seguem os preconizados por Lanne, Lütkepohl e Saikkonen (2002).

Os resultados desse procedimento mostraram que as variáveis CAM, EST, TAX, DES, IDE e PIB são não estacionárias, enquanto a variável INF é estacio-nária em nível. Após a primeira diferenciação das séries, observou-se que todas se tornaram estacionárias em primeira diferença, ou seja, I(1).

Para controlar o problema da mudança estrutural, foram incluídas três dummies: i) uma dummy do tipo step para o terceiro trimestre de 1994, repre-sentando as mudanças ocorridas devido à implantação do Plano Real em julho de 1994; ii) uma segunda dummy, também do tipo step, para o primeiro trimestre

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de 1999, representando as alterações ocorridas em função da mudança da taxa de câmbio vigente, que passou de fixa para flutuante, em janeiro de 1999; e iii) uma dummy do tipo impulse para o terceiro trimestre de 2001, simbolizando a mudança ocorrida em decorrência do racionamento de energia elétrica que teve início, para alguns estados da Federação, em junho de 2001.

Quanto ao número de defasagens do modelo autorregressivo vetorial (VAR), o critério escolhido foi aquele baseado na análise dos valores que minimizaram o critério de Informação de Schwarz (SC) que, segundo Enders (1995), é mais parcimonioso, em função de sua forma funcional mais punitiva. O resultado obtido pelo modelo indicou uma defasagem e um modelo VAR 1 foi estimado.13 Entretanto, na estimação deste modelo, ocorreu um problema de autocorrelação, que foi corrigido estimando-se um VAR 9.

Por se tratar de um modelo que envolve as relações determinantes do inves-timento direto estrangeiro e também do PIB, a escolha de uma única defasagem poderia não ser razoável para captar as relações existentes entre as variáveis. Portanto, o problema da autocorrelação presente no intervalo entre uma e oito defasagens pode ter relações com esta constatação. Assim, a utilização de nove defasagens – correspon-dendo a 27 meses – apresenta-se mais coerente com as relações teóricas envolvendo as variáveis utilizadas.

Vale ressaltar que o VAR estrutural, ao contrário do VAR – todas as vari-áveis são consideradas endógenas –, incorpora diretamente a teoria ao modelo. Assim, a ordenação utilizada para a construção do modelo estrutural foi baseada nas seções 3 e 4 deste trabalho. Nesta seção, é especificada a relação teórica entre as variáveis analisadas, adotando-se a seguinte ordem: CAM, EST, INF, TAX, DES, IDE e PIB. Este ordenamento sugere que o IDE é influenciado por todos os seus determinantes e, ao mesmo tempo, influencia o PIB.14

Definido o ordenamento das variáveis que compõem o modelo VAR estrutural, foi construída a matriz de relações contemporâneas (tabela 2). A fim de facilitar a interpretação e a análise dos resultados, os sinais dos coeficientes já foram modificados.

13. Efetuou-se o teste do multiplicador de Lagrange (LM) para verificação da possibilidade da presença de autocorrela-ção nos resíduos do modelo. O resultado do teste LM detectou a presença de resíduos autocorrelacionados. O procedi-mento padrão para remover a autocorrelação serial consiste em aumentar o número de defasagens até que a hipótese nula não seja mais rejeitada. Neste sentido, a inclusão de nove defasagens foi suficiente para eliminar o problema.14. É importante salientar que também foi feito o teste de causalidade de Granger (block exogeneity Wald test) – utili-zado para determinar estatisticamente o ordenamento das variáveis do modelo. De acordo com este critério, a ordena-ção das variáveis proveniente da mais exógena para a mais endógena é a seguinte: CAM, IDE, EST, PIB, INF, TAX e DES.

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167O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

TABELA 2Matriz de relações contemporâneas do modelo VAR estrutural

Efeito de Sobre

CAM EST INF TAX DES IDE PIB

CAM 1 - - - - - -

EST - 1 - - - - -

INF - - 1 - - - -

TAX - - - 1 - - -

DES - - - - 1 - -

IDE 2,248*** 7,355*** 0,001 -0,086 2,210* 1 -

PIB - - - - - 0,028** 1

Fonte: resultados da pesquisa.Notas: * significativo a 10%.

** significativo a 5%. *** significativo a 1%.

Obs.: CAM = taxa de câmbio; EST = proxy para infraestrutura; INF = proxy para instabilidade econômica; TAX = proxy para carga tributária; DES = proxy para desenvolvimento do sistema financeiro; IDE = investimento direto estrangeiro; e PIB = produto interno bruto.

Por meio da matriz de relações contemporâneas, pode-se inferir sobre algu-mas relações entre as variáveis de interesse no presente estudo. Observa-se que o efeito da variação da taxa de câmbio (CAM) sobre a entrada de investimento dire-to estrangeiro apresentou relação positiva e estatisticamente significativa, ao nível de 1% de probabilidade. Em média, para um aumento de 1% na taxa de câmbio, espera-se um crescimento de 2,24% no ingresso de capital estrangeiro na forma de IDE. Trevisan (2006) atribui demasiada importância à questão cambial (risco cambial) como responsável pela estratégia de internacionalização das empresas e, como exemplo, cita a empresa Marcopolo.15

O resultado encontrado para a taxa de câmbio – coeficiente positivo de 2,24 – é semelhante ao encontrado em outros trabalhos. Por exemplo, Mattos, Cassuce e Campos (2007) também chegaram a uma relação direta entre IDE e taxa de câmbio para o Brasil, porém com uma intensidade menor (0,62).

A relação direta entre as duas variáveis é válida, uma vez que o aumento da taxa de câmbio significa depreciação das relações de troca entre países, desfavorá-vel às importações e favorável às exportações brasileiras. Sabe-se que um câmbio desvalorizado implica vantagem competitiva para as exportações e encarece as importações. Desta forma, pode-se sugerir duas implicações acerca do resultado obtido – ambos auxiliando para a atração dos investimentos diretos estrangeiros. Primeiro, o câmbio depreciado contribui para as exportações das empresas trans-nacionais instaladas no país. Segundo, o câmbio desvalorizado constituiria uma

15. Para mais detalhes, ver Trevisan (2006).

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vantagem às empresas estabelecidas no Brasil, no sentido de encarecer os produtos importados. Isto distorceria negativamente o preço de empresas concorrentes que não estivessem instaladas no território nacional.

A variação do indicador de infraestrutura (EST) apresentou efeito positivo e estatisticamente significativo, em nível de 1% de probabilidade, sobre o ingres-so de investimento direto estrangeiro. Em média, para um aumento de 1% na dotação de infraestrutura espera-se um aumento de 7,35% na entrada de investi-mentos estrangeiros na economia brasileira. Este resultado corrobora a discussão atual, em que a infraestrutura é um fator preponderante para a atração e o estí-mulo de novos investimentos. Deve-se ressaltar que infraestrutura é um tipo de custo interno que desfavorece as atividades das empresas exportadoras. Como as condições nacionais são desfavoráveis, estas empresas podem fazer uso da desva-lorização cambial para compensar este custo.

O resultado para a variável infraestrutura segue os encontrados em outros trabalhos como Wheeler e Mody (1992) e Asiedu (2002). Este último, em traba-lho comparativo sobre os determinantes do investimento direto estrangeiro nos países em desenvolvimento e nos países da África Subsaariana, verificou que uma melhor infraestrutura tem impacto positivo sobre o IDE para os países do primei-ro grupo, mas não exerce impacto nos países do segundo grupo.

Quando se compara o coeficiente estimado para a variável EST (7,35) com os demais coeficientes estimados apresentados na matriz de relações contemporâ-neas, pode-se observar que os fluxos de IDE dirigidos ao Brasil são relativamente bastante sensíveis a mudanças nesta variável. A dotação de infraestrutura adequa-da e bem desenvolvida aumenta o potencial de produtividade dos investimen-tos em um país e, por conseguinte, estimula os fluxos de investimento direto estrangeiro em sua direção. De forma contrária, a deterioração da infraestrutura existente – como aeroportos, estradas, ferrovias, portos, sistemas de comunica-ções, fornecimento de energia, dentre diversas outras – prejudica sobremaneira o ingresso de IDE em qualquer economia receptora.

O coeficiente para a instabilidade econômica (INF) apresentou valor pró-ximo de zero e não é estatisticamente significativo. Este resultado é contrário ao esperado, dado que a estabilidade econômica é um importante fator de atração de IDE. Entretanto, Busse e Hefeker (2007) encontraram resultado semelhan-te envolvendo inúmeros países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil. Borensztein, De Gregorio e Lee (1998) também encontraram resultados não significativos para esta relação. Observa-se, de maneira geral, que a entrada de investimentos diretos para o caso brasileiro pode estar menos relacionada com a estabilidade econômica do país. Note-se que o maior fluxo de IDE esteve relacio-nado no período com as privatizações, fusões e aquisições. Entretanto, o fato de o

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169O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

Brasil ter apresentado16 uma economia indexada17 durante muitos anos pode ter distorcido o resultado encontrado.

Nonnenberg e Mendonça (2005), em trabalho sobre os determinantes do IDE para 33 países em desenvolvimento, também utilizaram a taxa de inflação como proxy para o grau de estabilidade econômica. Por meio de três modelos estimados, os autores encontraram para a variável inflação: i) valores não signifi-cativos para o modelo de dados agrupados; e ii) valores significativos nos modelos estimados a partir da metodologia de dados em painel.

Por sua vez, Mattos, Cassuce e Campos (2007), ao estimarem um modelo de Correção de Erros Vetorial (VECM) para o período 1980-2004, encontraram um coeficiente negativo para a variável inflação (-2,53), caracterizando uma rela-ção inversa entre investimento direto estrangeiro e taxa de inflação – medida pelo índice geral de preços disponibilidade interna, (IGP-DI).

Nesse contexto, avaliar outros fundamentos macroeconômicos, como a dívi-da interna e externa, e a conta corrente do balanço de pagamentos, que também podem ser considerados indicadores de estabilidade econômica, pode agregar con-tribuição a análise. Nos últimos anos, alguns destes fundamentos vêm apresentan-do melhora significativa, como é o caso das reduções da dívida pública externa, da dívida total sobre o PIB, da dívida total líquida sobre as importações; da redução do risco país; do aumento das reservas internacionais, entre outros indicativos que podem sinalizar uma redução do risco para os investidores (BCB, 2008).

Dessa forma, sugere-se que esses indicadores, não somente a inflação, tam-bém sinalizem indicação favorável às firmas estrangeiras que estão dispostas a internalizar seus capitais no país.

O efeito da variação da proxy de carga tributária (TAX) sobre a entrada de investimento direto é negativo e estatisticamente não significativo. Este resulta-do é o mesmo encontrado por diversos autores, por exemplo, Wheeler e Mody (1992), Jackson e Markowski (1995) e Lipsey (1999), e significa dizer que uma maior ou menor carga tributária no país não influenciou a tomada de decisão dos investidores estrangeiros no período analisado.

Existem evidências de que as firmas não consideram os incentivos fiscais para as fases iniciais de suas decisões de investimento estrangeiro. A principal razão para a divergência entre as metas e os resultados dos sistemas de incentivos

16. No entanto, a inflação atual ainda sofre a indexação da economia, como nos casos dos contratos de aluguel, das contas de telefone e luz, que são reajustados anualmente pelos índices de inflação (Justus, 2009).17. Uma economia está indexada quando a variação de um índice de preços, como o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ou o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), por exemplo, são usados para corrigir as principais grandezas econômicas, que são os salários, aluguéis, ativos financeiros em geral, taxa de câmbio e contratos diversos (Nunes Júnior, 1984).

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fiscais é que os incentivos concedidos pelos países em desenvolvimento são geralmente acompanhados por uma série de desincentivos, tais como os maiores custos de transação. O resultado é que os prováveis efeitos positivos dos incentivos fiscais são anulados pelos efeitos negativos destes desincentivos.

Assim como no presente estudo, Lipsey (1999) também não esperava coefi-cientes não significativos. Uma possível explicação é que os impostos não estejam atuando como proxy para as vantagens de localização do país receptor, ou seja, não é um fator determinante para a atração de IDE. Além disso, os investimentos que ingressam no Brasil na forma de investimento direto podem estar recebendo outros benefícios que distorcem o efeito isolado da carga tributária.

O efeito do aumento do crédito concedido ao setor privado, proxy para desenvolvimento do setor financeiro (DES), sobre o ingresso de investimento direto estrangeiro é positivo, e mostrou-se estatisticamente significativo em nível de 10% de probabilidade. Portanto, em média, para um aumento não esperado de 1% em DES, espera-se um incremento de 2,21% no montante de investimento estrangeiro entrante na economia brasileira. Quanto maior a quantidade e melhor a qualidade do crédito disponível pelo país receptor, maiores serão os incentivos ao investimento. Este resultado é corroborado por trabalhos que demonstram a importância de um sistema financeiro desenvolvido na atração de investimentos externos de longo prazo (Hermes e Lensink, 2003; Khan, 2007; Ang, 2008; Lee e Chang, 2009; Azman-Saini, Law e Ahmad, 2010).

Hermes e Lensink (2003) estimaram a relação entre IDE e crescimento eco-nômico para um conjunto de 67 países economicamente menos desenvolvidos, para o período 1970-1995. Os autores separaram os países em dois grupos distin-tos: i) países com um sistema financeiro doméstico que alcançaram um nível sufi-ciente de desenvolvimento; e ii) países com nível insuficiente de desenvolvimento do sistema financeiro. Os resultados mostram que o IDE contribui positivamente para o crescimento econômico para aqueles países pertencentes ao primeiro gru-po; e não apresenta um impacto positivo no crescimento econômico dos países alocados no segundo. Portanto, o desenvolvimento do sistema financeiro dos pa-íses receptores de investimentos externos é uma importante precondição para o IDE desempenhar efeito positivo sobre o crescimento.

Em um trabalho sobre as relações existentes entre crescimento econômico, IDE e setor financeiro no Paquistão, no período 1972-2005, Khan (2007) encontrou resultados que sugerem que os fluxos de IDE exercem efeito positivo no crescimento econômico, tanto no curto quanto no longo prazo, se o sistema financeiro doméstico atingir um certo nível de desenvolvimento. Os resultados sugerem ainda que as me-lhores condições financeiras domésticas não só atraem empresas estrangeiras para investir no Paquistão mas também permitem maximizar os benefícios do IDE.

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171O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

Em Ang (2008), o desenvolvimento financeiro é medido pela proporção do crédito privado em relação ao PIB. Os resultados mostraram que o alto desempenho do sistema financeiro está associado com o elevado nível de IDE. O desenvolvimento do sistema financeiro atua como um mecanismo facilitador da adoção de novas tecnologias na economia doméstica. Assim, a provisão de crédito e serviços financeiros eficientes por meio do sistema financeiro pode facilitar a transferência tecnológica e induzir a eficiência dos spillovers.

Na mesma linha, Lee e Chang (2009) reconhecem que o benefício pro-veniente do investimento direto estrangeiro para os países receptores somente pode ser efetivado quando aqueles têm alcançado certo nível de desenvolvimento do sistema financeiro. Além disso, seus indicadores têm um grande efeito sobre o crescimento econômico, que, por sua vez, também afeta o IDE. Conclusão semelhante é verificada em Azman-Saini, Law e Ahmad (2010), ao utilizarem um modelo de regressão com efeito threshold para 91 países no período 1975-2005. Os resultados encontrados sugerem que certo nível de desenvolvimento do sistema financeiro é requerido antes que o país receptor possa se beneficiar das externalidades geradas pelo IDE. O efeito positivo do IDE sobre o crescimento econômico entra em vigor somente depois que o desenvolvimento dos mercados financeiros supera um determinado limiar (efeito threshold).

Por fim, tem-se a relação entre IDE e PIB. A variação do investimento direto sobre o crescimento da economia brasileira apresentou efeito positivo e estatisti-camente significativo, em nível de 5% de probabilidade. Em média, um aumento de 1% no IDE ocasionaria um crescimento de 0,03% no PIB brasileiro. Apesar de ser um efeito pequeno, os valores encontrados mostram que o IDE está cola-borando para o aumento do PIB.

Esse resultado é corroborado pelas análises realizadas em estudos como De Gregorio (1992), Blomström, Lipsey e Zejan (1992), Borensztein, De Gregorio e Lee (1998), Bende-Nabende e Ford (1998) e Baliamoune e Mina (2004). Além destes, diversos outros trabalhos – por exemplo, Bengoa e Sanchez-Robles, 2003 e Alfaro et al. (2004) – enfatizam os benefícios do IDE, desde que condicionados ao adequado desenvolvimento de fatores locacionais, tais como o desenvolvimen-to do sistema financeiro, a adequada infraestrutura, as políticas cambiais, entre outros aspectos positivos da economia receptora.

Entretanto, existem trabalhos, como o de Nonnemberg e Mendonça (2005), que concluem que o IDE não tem efeito positivo sobre o PIB. Pelo contrário, para estes autores o PIB do país é que tem efeito sobre a entrada de IDE.

Além da relação positiva entre PIB e IDE, as variáveis câmbio, infraestru-tura e desenvolvimento do sistema financeiro foram significativas e apresenta-ram os resultados esperados a priori. Assim, com base nos resultados obtidos, são

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esperados os seguintes comportamentos dos fluxos de IDE: i) uma melhora na infraestrutura nacional ocasionaria o aumento do fluxo de investimento direto estrangeiro ao país; ii) uma desvalorização cambial contribuiria para o aumento do ingresso de IDE; e iii) um aumento no nível de desenvolvimento do sistema financeiro nacional também levaria ao aumento do investimento estrangeiro en-trante na economia brasileira.

Portanto, o acompanhamento do comportamento dessas variáveis pode ser utilizado como ferramenta na formulação de políticas públicas voltadas ao cresci-mento econômico, pois modificações em seus níveis podem refletir em variações na quantidade de IDE que ingressa na economia nacional. Desta forma, o sucesso das políticas destinadas a atrair o investimento direto estrangeiro está diretamente relacionado ao ambiente favorável da economia nacional.

Nesse sentido, os resultados sugerem que políticas que buscam melhorar as condições econômicas locais geram um efeito positivo sobre a entrada de inves-timento direto na economia. Além disso, contribuem para melhorar a qualidade deste tipo de investimento, o que potencializa seus efeitos sobre a atividade eco-nômica. Entretanto, diante de um cenário tal como o observado para a economia brasileira – infraestrutura inadequada, falta de qualificação do capital humano nacional, ausência de uma política nacional que redirecione estes investimentos para áreas prioritárias da economia, principalmente as ligadas à indústria de bens de capital e de alta tecnologia –, o repatriamento do capital pode ser maior que o esperado, e a sua contribuição para o aumento do PIB pode ficar prejudicada.

5.2 Efeitos de choques sobre variáveis selecionadas

Nesta subseção, são apresentadas as elasticidades de impulso do modelo VAR estrutural para um horizonte de cinquenta trimestres. Estas elasticidades captam os efeitos de um choque (inovação) exógeno sobre determinada variável do mo-delo. Por meio deste procedimento, também é possível determinar o tempo em que os efeitos de um choque sobre determinada variável são dissipados, além da intensidade das respostas em consequência dos choques.

No presente estudo, a análise da função impulso-resposta é realizada observando-se os efeitos dos choques na taxa de câmbio, na infraestrutura e no desenvolvimento do sistema financeiro sobre o investimento direto estrangeiro18 e, deste último, sobre o PIB brasileiro.

18. Por serem as únicas significativas, apenas estas variáveis foram selecionadas para a análise.

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173O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

O efeito de um choque na taxa de câmbio (CAM) sobre o ingresso de investimento direto estrangeiro é apresentado no gráfico 1. Observa-se que o maior efeito positivo ocorre já no primeiro período. As implicações deste choque indicam que uma variação na taxa de câmbio da ordem de 1% implicaria variação positiva de, aproximadamente, 0,13% no ingresso de investimento estrangeiro. Os choques da taxa de câmbio sobre o IDE tornam-se menos evidentes a partir do quadragésimo trimestre.

GRÁFICO 1Elasticidade de impulso da taxa de câmbio (CAM) sobre o IDE

-0,15

-0,10

-0,05

0,00

0,05

0,10

0,15

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 35 37 39 41 43 45 47 49

Câmbio (CAM) - IDE

Fonte: resultados da pesquisa.

O efeito de um choque na proxy de infraestrutura (EST) sobre o ingresso de investimentos estrangeiros pode ser visualizado no gráfico 2. Observa-se que os resultados oscilam mais nos períodos iniciais após o choque, indicando que o IDE reage rapidamente a variações ocasionadas na infraestrutura. Já no tri-mestre inicial, uma variação de 1% na dotação de infraestrutura ocasionaria um efeito positivo na entrada de investimentos estrangeiros da ordem de 0,18%. A resposta do IDE a um choque na EST torna-se menos evidente a partir do décimo quinto trimestre.

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GRÁFICO 2Elasticidade de impulso da proxy de infraestrutura (EST) em relação ao IDE

-0,15

-0,10

-0,05

0,00

0,05

0,10

0,15

0,20

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 35 37 39 41 43 45 47 49

Infraestrutura (EST) - IDE

Fonte: resultados da pesquisa.

As respostas da variável desenvolvimento do sistema financeiro (DES) sobre a entrada de investimento direto estrangeiro podem ser observadas no gráfico 3. Ob-serva-se que o máximo positivo é verificado no terceiro trimestre, quando um cho-que de 1% na variável DES implicaria um aumento de aproximadamente 0,11% sobre a entrada de IDE, demonstrando a rapidez com que o IDE reage a variações em DES. Os choques nesta variável se dissipam a partir de vinte trimestres.

GRÁFICO 3Elasticidade de impulso da proxy de desenvolvimento do sistema financeiro (DES) sobre o IDE

-0,20

-0,15

-0,10

-0,05

0,00

0,05

0,10

0,15

Desenvolvimento do sistema financeiro (DES) - IDE

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 35 37 39 41 43 45 47 49

Fonte: resultados da pesquisa.

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175O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

Por sua vez, a resposta do PIB a choques no investimento direto estrangeiro atinge a máxima variação positiva durante o décimo primeiro trimestre, como observado no gráfico 4.

GRÁFICO 4Elasticidade de impulso do IDE sobre o PIB

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 33 35 37 39 41 43 45 47 49

-0,03

-0,02

-0,01

0,00

0,01

0,02

IDE - PIB

Fonte: resultados da pesquisa.

As implicações desse choque indicam que o efeito de uma variação na en-trada de investimento direto estrangeiro de 1% implicaria, em um prazo de cinco trimestres, variação positiva de aproximadamente 0,01% no crescimento do PIB nacional. Verifica-se também que um choque no investimento direto estrangei-ro não é totalmente dissipado ao longo do período analisado, sugerindo que o aumento dos fluxos de IDE no Brasil teria um impacto prolongado, e de longo prazo, sobre o crescimento econômico brasileiro.

5.3 Decomposição histórica da variância dos erros de previsão

A decomposição da variância é um método que, embora não diferencie o sinal do efeito, permite uma maior compreensão da magnitude destes.

A tabela 3 contém a decomposição histórica da variância do erro de previsão do IDE para dez trimestres após o choque (inovação). Observa-se que, em todo o período analisado, o IDE responde pela maior parcela de explicação dos seus pró-prios erros de previsão. Entretanto, esta parcela decresce de 55,94%, no primeiro trimestre, para 25,39%, no décimo trimestre analisado. Esta diminuição se dá paralelamente ao aumento relativo das explicações das variáveis taxa de câmbio, desenvolvimento do sistema financeiro e PIB.

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Nota-se que, no primeiro trimestre, a infraestrutura (EST) explica 27,52% das variações na entrada de IDE, seguido pela taxa de câmbio (CAM), com 15,27%, o que demonstra a dependência no curto prazo do IDE em relação a estas duas variáveis. Ao final de um ano, a proxy de infraestrutura ganha destaque ao explicar 27,73% dos erros de previsão do IDE. Ao mesmo tempo, a taxa de câmbio diminui, apesar de ainda representar valor expressivo, e passa a explicar 12,10% dos seus erros de previsão. No final do período analisado, nota-se uma importância relativamente bem distribuída entre todas as variáveis analisadas. O ordenamento no ranking das variáveis que mais explicam variações no IDE foi: IDE, proxy de infraestrutura (EST), taxa de câmbio (CAM), PIB e desenvolvi-mento do sistema financeiro (DES).

TABELA 3Decomposição histórica da variância do erro de previsão para o IDE no modelo VAR estrutural

Trimestres CAM EST DES IDE PIB

1 15,2706 27,5290 1,1416 55,9439 0,0000

2 12,8344 25,3494 0,9306 50,5249 1,5039

3 12,6578 26,4468 6,6177 41,9848 1,6770

4 12,1052 27,7305 6,7642 39,6728 1,6255

5 11,5757 24,8958 10,1855 35,7667 1,4922

6 12,6079 23,3051 10,5136 37,0607 1,4890

7 13,0754 20,0601 9,4957 31,7700 7,7830

8 11,6293 18,5657 8,4380 28,7670 13,0469

9 14,3355 15,7479 7,1918 25,3034 11,3269

10 14,1465 15,4329 8,3472 25,3961 10,5064

Fonte: resultados da pesquisa.

A tabela 4 apresenta a decomposição histórica da variância do erro de pre-visão para a variável PIB. O investimento direto estrangeiro explica, no primeiro trimestre, apenas 4,40% das variações no PIB. No segundo trimestre, a contri-buição do IDE atinge seu valor máximo (17%) e, a partir daí, torna-se estável ao longo do tempo.

Observa-se que grande parte das variações no PIB é explicada pela própria variável, principalmente no período inicial, quando esta atinge 74,13% da vari-ância do erro de previsão. No entanto, este valor vai sendo gradualmente redu-zido, passando a explicar 34,9% desta variância no final do período analisado.

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177O Impacto do Investimento Direto Estrangeiro no Crescimento da Economia Brasileira

TABELA 4Decomposição histórica da variância do erro de previsão do PIB do modelo VAR estrutural

Trimestres CAM EST DES IDE PIB

1 10,9036 8,6299 0,0009 4,4003 74,1345

2 6,6029 8,4768 0,0026 17,3889 64,4854

3 7,6193 6,8568 1,0298 13,8752 51,1277

4 8,9089 5,8002 4,8883 10,8986 43,3383

5 9,4794 5,1778 4,9218 10,9152 41,5997

6 8,9457 4,9578 4,5822 10,1521 39,1835

7 9,1914 5,4722 4,4995 9,8988 39,6634

8 9,3021 7,4927 4,7412 10,5384 38,0415

9 9,3579 7,1741 5,8078 11,4437 36,3912

10 9,1544 7,9316 6,6953 11,2512 34,9917

Fonte: resultados da pesquisa.

De modo geral, verifica-se que a relação entre o IDE e o PIB foi significa-tiva, apesar de esta não ter sido tão forte quanto se esperava. Quanto ao IDE, a infraestrutura, a taxa de câmbio e o PIB são fatores importantes na explicação do seu comportamento. Este resultado sugere que qualquer política que privilegie estas três variáveis, contribui também para atrair quantidade e, possivelmente, qualidade destes investimentos.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os fluxos mundiais de IDE aumentaram significativamente ao longo das últimas duas décadas, sobretudo nos países em desenvolvimento. O Brasil não ficou au-sente neste processo, apresentando um crescimento substancial destes fluxos, que se tornaram uma importante fonte de financiamento externo para a economia nacional nos anos recentes.

Apesar de algumas variáveis analisadas – proxy para instabilidade econômica e proxy para carga tributária – apresentarem coeficiente imprevisto em relação ao esperado, de forma geral, os resultados encontrados foram significativos. Verifi-cou-se que os fluxos de IDE que ingressam na economia brasileira são sensíveis às variações na infraestrutura, sugerindo que uma política governamental voltada para este setor poderia contribuir para uma melhora na quantidade e/ou qualida-de do ingresso do investimento direto.

Deve-se ressaltar que a infraestrutura é um dos principais gargalos da economia; apontada por diversos estudos como principal fator do denominado Custo Brasil. Ela carece de atenção, planejamento e iniciativa por parte dos agen-tes públicos e privados, pois investimentos neste setor no país estão, por décadas,

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muito aquém do necessário. A ausência de planejamento se faz sentir em diversos âmbitos, por exemplo, por meio da insuficiência e da deterioração de estradas, ferrovias, portos, aeroportos, e também pela capacidade de geração e de oferta de energia em um patamar seguro e sustentável. Este último pôde ser assistido durante o programa de racionamento de energia elétrica imposto pelo governo federal em 2001, que representou um exemplo da insuficiência da capacidade da infraestrutura energética instalada no país e prejudicou demasiadamente o cresci-mento econômico do Brasil.

Outra variável extremamente importante na determinação do IDE, de acor-do com os dados analisados, foi a taxa de câmbio. Diante da importância desta variável, tem-se a necessidade de maior cuidado e rigor, por parte das autoridades governamentais, na condução das políticas cambiais. Estar atento a ações que fazem variar a taxa de câmbio pode significar efeitos positivos nos fluxos apreen-didos de IDE.

No que diz respeito à relação entre o fluxo de IDE e o PIB, os resultados sugerem que a primeira variável exerce efeito positivo sobre a segunda. Apesar de este impacto ser pequeno, é um importante estímulo externo e pode ser intensi-ficado à medida que ocorram progressos nos principais determinantes do IDE. Em adição, a resposta do PIB, dado um choque no investimento direto, não se dissipa rapidamente, sugerindo que tal choque possui repercussão ao longo de muitos períodos após o evento. Este fato mostra a importância deste tipo de in-vestimento para a economia brasileira, principalmente se, na sua atração, levar-se em consideração também a qualidade e não só a quantidade.

Assim, políticas públicas que redirecionem e estimulem a entrada de IDE em setores prioritários da economia – principalmente os relacionados à indústria e a setores de alta tecnologia – podem desencadear melhores resultados e agregar maior valor ao PIB. Além disso, se este investimento for direcionado para setores voltados para a exportação, a contribuição do investimento direto estrangeiro pode ser bem mais significativa. Para que ocorra o estímulo à entrada de novos in-vestimentos, torna-se necessário que fatores como o incremento da infraestrutura, o desenvolvimento do sistema financeiro, a política cambial parcimoniosa, entre outros, sejam estimulados. Logo, políticas públicas voltadas para o crescimento devem andar de mãos dadas com as políticas que incentivem a qualidade dos fluxos de investimento estrangeiro na economia nacional.

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Originais submetidos em janeiro de 2012. Última versão recebida em novembro de 2012. Aprovado em dezembro de 2012.

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BRASIL, MUDANÇAS CLIMÁTICAS E ECONOMIA: O QUE HÁ ESTABELECIDO?Gustavo Inácio de Moraes*Joaquim Bento de Souza Ferreira Filho**

Este artigo tem por objetivo realizar um levantamento sobre os principais trabalhos que apontam os impactos econômicos das mudanças climáticas no território brasileiro. Dessa forma, discutem-se as opções metodológicas utilizadas na pesquisa sobre o tema, bem como as principais abordagens relacionadas. É possível perceber que, apesar de uma considerável literatura sobre o tema, ainda há importantes indefinições no mapeamento dos efeitos econômicos das mudanças climáticas, não apenas pela incerteza associada, mas também pelos resultados distintos apresentados quando se opta por metodologias alternativas. Ainda assim, é possível concluir que, para o Brasil, políticas de mitigação são superiores, em termos econômicos, às perspectivas de vulnerabilidade e/ou adaptação. Informações mais consistentes, contudo, ainda são necessárias para que a sociedade possa planejar suas linhas de ação.

Palavras-chave: mudança climática; impactos econômicos; Brasil.

BRAZIL, CLIMATE CHANGE AND ECONOMY: WHAT IS ESTABLISHED?

This paper aims to conduct a survey review that shows the economic impacts of climate change on the Brazilian Territory. The paper, therefore, discusses the methodological options and the main approaches related to the issue of economic impacts of climate change. A perception that emerges is that despite a significant literature on the theme, there are still important uncertainties on the effects of climate change impacts on Brazil, both due to the natural aspects of the issue and also regarding different methodological approaches. Still, one can conclude that, for Brazil, mitigation policies are superior in economic terms than the prospects of vulnerability and/or adaptation. More information, however, is still necessary for society to plan their lines of actions in response to the problem.

Keywords: climate change; economic impacts; Brazil.

BRASIL, EL CAMBIO CLIMÁTICO Y LA ECONOMÍA: LO QUE ESTÁ ESTABLECIDO?

Este trabajo pretende realizar un estudio de la literatura que demuestran los impactos económicos del cambio climático en el territorio brasileño. Su contenido, por lo tanto, es para discutir las opciones metodológicas empegadas en el tema de la investigación y los principales enfoques relacionados con el tema. Se puede ver que, a pesar de una considerable literatura sobre el tema, todavía hay grandes incertidumbres en los esbozos de los efectos económicos del cambio climático, no sólo por la inseguridad, sino también para los diferentes resultados presentados al optar por metodologías alternativas. Sin embargo, se puede concluir que, para Brasil, las políticas

* Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia (PPGE/PUC-RS) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. E-mail: [email protected].** Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (PPGEA/ESALQ/USP). E-mail: [email protected].

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de mitigación son superiores en términos económicos ante las perspectivas de vulnerabilidad y/o adaptación. Un conjunto de datos consistentes, sin embargo, es necesario para que la sociedad planificar sus cursos de acción.

Palavras clave: cambio climatico; impacto economico; Brasil.

BRÉSIL, CHANGEMENT CLIMATIQUE ET ECONOMIE: QU’Y A-T-IL D’ETABLI?

Ce document vise à procéder à un examen qui montre les impacts économiques du changement climatique sur le territoire brésilien. Le papier, donc, examine les options méthodologiques et les principales approches relatives à la question des impacts économiques du changement climatique. Une perception qui se dégage est que, malgré une littérature importante sur le thème, des incertitudes importantes persistent sur les effets des impacts du changement climatique sur le Brésil, à la fois en raison des aspects naturels de la question et aussi sur des approches méthodologiques différentes. Pourtant, on peut conclure que, pour le Brésil, les politiques d’atténuation sont supérieurs en termes économiques que les perspectives de la vulnérabilité et / ou d’adaptation. Plus d’informations, cependant, est encore nécessaire pour la société de planifier leurs lignes d’action en réponse au problème.

Mots-clés: changement climatique; impact économique; Brésil.

JEL: O13; O44; Q54.

1 INTRODUÇÃO

A aceleração do crescimento econômico, desde a revolução industrial, conduziu a humanidade e seu sistema social a um novo patamar de relações. Sob o ponto de vista dos processos produtivos, havia necessidade de uma produção rápida e ma-ciça, o que acarretava o uso de maquinarias como novas ferramentas produtivas. A força do homem ou a do animal não era mais suficiente; necessitava-se, além destas, da força de uma matriz mais poderosa. A capacidade necessária à produ-ção foi encontrada em novas e mais densas fontes energéticas, como o carvão e o petróleo, que foram adotadas em larga escala.

A competição por mercados, entre indústrias e países, não cessou o avanço tecnológico. Assim, paulatinamente, novas técnicas e processos foram adotados: fontes de energia há muito conhecidas, mas cujas propriedades ainda não estavam sendo aplicadas. O sistema capitalista prosperou, em grande medida, em decor-rência da competição e do avanço tecnológico.

Contudo, a adoção de novas fontes energéticas e novos processos de pro-dução, ao longo da história, consistiu, regra geral, em usufruir dos benefícios. Externalidades negativas, em reverso, não se faziam claras, ou, ainda que o fossem, havia benefícios tão evidentes e acessíveis que o princípio da precaução foi ignorado. Mais que considerar uma avaliação de custo-benefício, os efeitos ampliaram-se em função da adoção maciça das técnicas propostas.

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185Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

O World Economic Forum (2007), painel formado por líderes políticos e empresariais, esclarece que a mudança climática é um dos grandes desafios do século XXI, destacando que suas consequências tornariam o comércio e a paz mundiais instáveis e que seu caráter de problema de longo prazo clama pela coo-peração entre os diferentes países imediatamente.

Embora ainda haja contestações sobre a causa do aumento das temperaturas no planeta, se natural ou provocada pela ação humana, há uma nítida percepção de que as temperaturas estão se elevando. Nesse sentido, as evidências advindas da paleoclimatologia, por intermédio, por exemplo, de testemunhos de gelo, são as mais fortes, comprovando uma tendência de séculos. Pesquisando a concentração de gases nocivos na atmosfera, pelo depósito destes em geleiras, durante nevascas, ao longo das eras, a paleoclimatologia constata que, desde a revolução industrial, as concentrações destes gases, com interações químicas conhecidas na atmosfera, cresceram abruptamente, configurando-se em uma evidência favorável à ação hu-mana como decisiva (Oldfield, Alverson e Bradley, 2000).

Em face dos diversos estudos e metodologias propostos para o estudo das mudanças climáticas, torna-se necessário organizar e delimitar as correntes meto-dológicas nas quais estes estudos se baseiam. Ademais, há diversas dimensões de análise, dificultando a análise geral do problema. Em especial, um recorte inicial decompõe as avaliações em efeitos de mitigação, vulnerabilidade e adaptação, o que em última análise permite uma comparação importante para os formuladores de políticas.

Como lembram Dowlatabadi e Morgan (1993), há somente quatro possibi-lidades de ação frente ao aquecimento global: reduzir a emissão de gases de efeito estufa (GEEs) seria a primeira delas. Outra possibilidade é ser pró-ativo e adaptar-se o quanto antes às mudanças climáticas. Uma terceira linha de ação, menos provável, é experimentar ações para o controle do clima e, finalmente, continuar a pesquisa e aumentar a compreensão a respeito do comportamento do clima e de suas influências. Note-se que não são ações excludentes, mas alocar recursos para uma, significa protelar as demais.

Este artigo, portanto, tem como objetivo realizar uma revisão dos trabalhos sobre impactos econômicos da mudança climática presentes na literatura brasi-leira sob essas três dimensões: mitigação, vulnerabilidade e adaptação. Para tanto, ele foi dividido em cinco seções. Na segunda seção, os trabalhos que se utilizam de modelos econométricos são discutidos em confronto com os que aplicam mo-delos de equilíbrio geral, objeto da terceira seção. A quarta seção trata de estudos referentes à mitigação. A última seção apresenta as considerações finais.

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2 OPÇÕES METODOLÓGICAS E PRINCIPAIS ESTUDOS NO BRASIL

2.1 Opções metodológicas

Tal como em outras áreas do conhecimento, as opções metodológicas para a avaliação dos impactos ambientais também são originadas de polêmicas na economia. Essencialmente, o problema não se encerra com a escolha do método, também depende, em última instância, dos dados com os quais se escolhe trabalhar.

Os estudos pioneiros em termos mundiais são predominantemente condu-zidos por Jorgenson e Wilcoxen (1990) e Nordhaus (1992; 1993; 1994), em que opções de políticas frente ao problema da acumulação de GEEs são estudadas. As opções começam com a completa ausência de medidas, passam por atraso na adoção de medidas inibidoras de emissões e culminam na estabilização das emissões de GEEs, entre outras. É possível, contudo, notar os significativos custos econômicos das opções que visam algum grau de restrição das emissões, sinalizando a necessidade de soluções sociais mais complexas, como a revisão das tecnologias então utilizadas. De um ponto de vista metodológico, há uma preferência pela utilização de modelos de equilíbrio geral para a avaliação dos impactos nos diferentes cenários.

Em trabalho posterior, Darwin et al. (1995) optam pelo uso, também, de modelos de equilíbrio geral computável (CGE) para abordar os impactos prováveis na agricultura americana. Especialmente se considerando a hetero-geneidade de climas nos Estados Unidos, a conclusão não aponta um resultado geral significativo, embora fique evidente a assimetria de efeitos conforme o clima e o produto estudado.

Um relatório que se pretendia mais completo para abordar impactos econô-micos da mudança climática em nível mundial, o Stern Review on the Economics of Climate Change (Stern, 2006), demonstra a questão. Sua elaboração, financiada pelo governo britânico, focou em resultados econômicos, sobretudo nos países desenvolvidos, para os diferentes cenários do Painel Intergovernamental para a Mudança Climática (IPCC). A alegação é de que dados referentes aos países em desenvolvimento seriam escassos e de difícil estimação, embora o relatório reconheça que grande parte dos efeitos das mudanças climáticas ocorra justamente nestes países. De outra forma, o relatório adota taxas de desconto que potencializam os efeitos sem que sejam consideradas coerentes para grande parte dos analistas. Finalmente, o estudo desconsidera métodos alternativos, privilegiando métodos econométricos. Seus resultados, sem dúvida, contribuíram para motivar estudos alternativos e, talvez, o que seria mais importante, estudos que pudessem particularizar efeitos regionais e nacionais, com o intuito de aperfeiçoar resultados globais.

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187Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

A tabela 1 resume os efeitos econômicos estimados no relatório para o pla-neta. Observe-se que, em primeiro lugar, o relatório cita resultados associados a riscos e impactos denominados “não mercado”, dois itens que, por não serem totalmente mensuráveis em valores monetários, trazem uma grande incerteza. Tal incerteza está refletida na grande variância contida entre o quinto e o 95o per-centil em cada um dos casos, mesmo quando apenas são considerados “impactos de mercado”. Ademais, o horizonte de tempo escolhido, o ano 2200, não é muito útil, pois descola dos principais cenários do IPCC que consideram alterações no século XXI e, em paralelo, traz indefinição sobre os usos tecnológicos que serão objetos de evolução ou involução até este horizonte de tempo.

Os resultados do relatório apontam, por fim, para que se priorize a miti-gação, mais que se invista em adaptação. Segundo Stern (2006), os custos da primeira estratégia, essencialmente restrições às emissões de GEEs, são me-nores comparados aos custos de adaptação e convivência com os efeitos das mudanças climáticas.

Desse modo, surgem as críticas. Trainer (2008), por exemplo, aponta uma série de pressupostos heroicos adotados no Stern Review, sobretudo na extrapo-lação das tendências energéticas mundiais. Para o autor, o ponto principal é que, ao contrário do que argumentam o IPCC e o Stern Review, o custo para evitar a mudança climática não é desprezível, principalmente nas sociedades com alto padrão de vida. Weyant (2008) concorda com as ideias apresentadas no Stern Review, sobretudo aponta a relevância da temática e ressalta a disponibilidade de opções tecnológicas de baixo custo para reduzir as emissões globais. Em paralelo, reconhece o mérito que o documento teve em captar a discussão sobre aqueci-mento global, mas alerta que, como documento analítico, é falho, uma vez que aponta para uma estratégia de mitigação ampla e imediata, quando há, segundo interpreta, alternativas disponíveis.

Os relatórios técnicos que acompanham o Stern Review são ilustrativos da complexidade da escolha dos analistas. A limitação do alcance dos resul-tados é evidenciada quando, no pós-escrito do relatório técnico, a função de danos é definida como uma razão entre desvios da temperatura normal e um desconto de 2,5. A razão ainda é elevada a um parâmetro que informa se o dano é linear ou crescente. O valor assumido por este parâmetro é funda-mental para definir a extensão dos danos e se há uma convexidade fraca ou forte no formato da função exponencial proposta. A medida que irá ponderar a função é a elasticidade da utilidade marginal de consumo, e sua escolha assume um papel central, sendo que as pequenas alterações entre 1 e 1,5 assumiram papel importante.

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TABELA 1 Perdas no consumo per capita atual a partir de seis cenários de mudança climática e seus impactos econômicos

Cenário/impactoPerdas no consumo per capita presentes para o ano de 2200

(%)

Climático Econômico Média 5o percentil 95o percentil

Básico

Impactos de mercado 2,1 0,3 5,9

Impactos de mercado + riscos 5,0 0,6 12,3

Impactos de mercado + riscos + impactos não mercado 10,9 2,2 27,4

Alto

Impactos de mercado 2,5 0,3 7,5

Impactos de mercado + riscos 6,9 0,9 16,5

Impactos de mercado + riscos + impactos não mercado 14,4 2,7 32,6

Fonte: Stern (2006, p. 163).

Outro problema reside no fato de que a taxa de desconto intertemporal a ser escolhida pode alterar substancialmente o resultado. Uma taxa de 0,1 difere, por exemplo, de uma de 0,5; logo após cem anos, a chance de a raça humana sobreviver é de 91%, ao passo que na segunda taxa é de 61%. Portanto, as diferentes combina-ções que os distintos parâmetros permitem acabam por gerar inúmeros resultados sem, contudo, produzir uma intuição adequada. O Stern Review, deste modo, apre-senta uma estratégia de modelagem baseada na extrapolação de cenários, segundo a adoção de alguns pressupostos, parâmetros e modelos de crescimento econômico.

Ressalte-se que a modelagem econômica em qualquer campo de análise se defronta, a todo tempo, com dificuldades metodológicas que devem ser superadas. Além de apresentar alguns números, o Stern Review convida a todos a repensar a estratégia de modelagem econômica e confrontá-la com as dificuldades de obtenção de informações adicionais que enriqueçam os cenários a serem estudados.

Consideradas tais dificuldades, além da extrapolação do cenário predomi-nantemente utilizado no Stern Review, há outras três possibilidades principais, de acordo com Barker, Qureshi e Köhler (2006). A primeira linha refere-se à avalia-ção de trajetórias ótimas em modelos de crescimento neoclássicos, em que uma função de produção das firmas é confrontada com uma função de utilidade inter-temporal dos agentes e/ou de famílias. O problema de maximização, portanto, é sujeito a limites estabelecidos pela restrição orçamentária e pela disponibilidade de recursos. A resolução da equação é considerada à luz de uma trajetória que maximiza o produto intertemporal. Note-se que neste caso a taxa de desconto intertemporal será fundamental, uma vez que estará presente nas funções de pro-dução e utilidade.1

1. Romer (2006) em seus capítulos 1 e 2 realiza uma discussão dos principais modelos.

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189Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Uma segunda linha de trabalhos de avaliação de impactos das mudanças climáticas dedica-se à utilização de modelos econométricos. Estes utilizam séries de informações e obtêm relações estáveis pelo uso de técnicas estatísticas. Estas informações podem ser tratadas por meio de séries de tempo, cortes tem-porais, painel de dados combinado às duas últimas e até pelo empilhamento de dados de diferentes períodos de tempo. Sua aplicação depende, em última análise, da disponibilidade de dados e, para que os resultados sejam extrapolados, há de se pressupor que os padrões do passado se repetirão.

Uma terceira linha de estudos contempla os modelos CGE. Tais modelos se baseiam na teoria do equilíbrio geral dos mercados, e sua vertente aplicada desenvolve-se a partir dos anos 1950. Em geral, o modelo é construído sobre pres-supostos neoclássicos adaptáveis em maior ou menor medida, conforme o caso em estudo. Estabelecendo-se o comportamento dos agentes,2 considerando-se uma estrutura de relações observada, construída em equações diversas que pretendem descrever a economia, e aplicando-se o choque proposto, o equilíbrio surge na medida em que o sistema possui restrições – técnicas e institucionais – obedecidas pelo comportamento agregado.

Os modelos CGE calculam, com base em uma situação inicial e após um choque, o vetor de preços que aloca eficientemente os recursos da economia, garantindo equilíbrio em todos os mercados da economia, pelo sistema de equações que descreve o comportamento dos agentes no sistema econômico. Finalmente, ainda é possível variar o horizonte temporal com que se trabalha nesses modelos, em curto e/ou em longo prazo, adotando os pressupostos teóricos correspondentes. Outro desenvolvimento também possível é construir modelos dinâmicos, que permitem perceber como se dá a trajetória das variáveis, entre o início e o fim do período de ajuste, podendo ser de características recursivas3 ou não (Ferreira Filho, 2006).

A tipologia proposta por Barker, Qureshi e Köhler (2006), no entanto, considera outros dois tipos de aplicações: uma em que são utilizados modelos híbridos – ou seja, diferentes combinações das técnicas anteriores – e outra na qual os sistemas energéticos são avaliados. Neste último caso, algumas téc-nicas de pesquisa operacional ou matemáticas são utilizadas para se avaliar o uso eficiente energético. Portanto, com finalidade econômica, mas utilizando ferramentas matemáticas. De modo que, para avaliar o impacto das mudanças climáticas, as metodologias essencialmente econômicas disponibilizadas são de pelo menos quatro.

2. A partir de um agente econômico típico, conforme a esfera econômica que se avalie – consumo, produção, admi-nistração pública etc. 3. O resultado de um período operando com os valores iniciais do período subsequente.

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Barker, Qureshi e Köhler (2006) ainda destacam que a opção metodológica pode determinar a intensidade e a tendência dos resultados. Na sua percepção, por exemplo, modelos de equilíbrio geral resultam em variações inferiores às dos modelos macroeconômicos e econométricos.

Um último aspecto referente à metodologia relaciona-se à abrangência dos estudos. Como as mudanças climáticas afetam inúmeras áreas de atuação da humanidade, há que se contemplar as suas dimensões. Usualmente, tem se reconhecido o impacto das mudanças climáticas sobre a agricultura, a saúde – além de doenças, especialmente a mortalidade –, a biodiversidade, os eventos climáticos extremos e os prejuízos materiais e humanos, além da perda de áreas litorâneas, o impacto sobre estoques de peixes e a necessidade de gastos públi-cos. Os estudos podem abordar um, vários e todos os eixos listados, conforme o grau de interesse e complexidade.

Espera-se, no entanto, de uma boa metodologia que ela seja clara em seus resultados, que se consiga reproduzi-la, se possível, facilmente, e que seus pressu-postos e suas limitações sejam colocados de forma transparente. Possivelmente, o Stern Review tenha falhado em alguns destes aspectos, especialmente no que se refere a destacar as limitações.

2.2 Estudos no Brasil

Após a publicação do Stern Review, a comunidade acadêmica em economia do Brasil ganhou novo ânimo para tentar avaliar os impactos da mudança climática no país. Ressalte-se, no entanto, que, tanto em nível global quanto nacional, se possuíam alguns resultados em face das previsões do IPCC. Em nível mundial, Nordhaus (1992) e Darwin et al. (1995) são dois trabalhos pioneiros. O primeiro utiliza-se de um modelo de equilíbrio geral computável em união a um modelo de crescimento neoclássico. O segundo utiliza um modelo de equilíbrio geral computável aplicado à agricultura americana. Em nível nacional, algumas esti-mativas são anteriores. O quadro 1A informa e resume as características gerais de cada um dos estudos que assumem a mudança climática.

QUADRO 1AEstudos econômicos sobre mudança climática para o Brasil: efeitos de adaptação e/ou vulnerabilidade

Referência Dimensões contempladas Metodologia Características

Sanghi et al. (1997) Agricultura EconométricaAvalia alterações no valor da terra e da lucratividade

Sanghi (1998) Agricultura EconométricaAvalia alterações no valor da terra

Mendhelson e Dinar (1999) Agricultura Pesquisa de campoAvalia a adoção de tecnolo-gias no campo

(Continua)

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191Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Referência Dimensões contempladas Metodologia Características

Chimeli e Souza Filho (2004) Agricultura EconométricaRestritos ao estado do Ceará e à cultura do milho

Confalonieri (2007) Regional e saúde IndicadoresDestaque para resultados em vulnerabilidade

Moraes (2007) Agricultura Equilíbrio geral computávelModelo simples e extrema-mente agregado

Pinto e Assad (2008) Agricultura ContábilAvalia choque de oferta agrícola

Confalonieri (2008) Regional e saúde IndicadoresDestaque para resultados em vulnerabilidade

Domingues, Magalhães e Ruiz (2008)

Agricultura Equilíbrio geral computávelRestritos aos estados do Nordeste

Confalonieri, Marinho e Rodriguez (2009)

Regional e saúde IndicadoresDestaque para resultados em vulnerabilidade

Elaboração dos autores.

QUADRO 1B Estudos econômicos sobre mudança climática para o brasil: efeitos de adaptação e/ou vulnerabilidade

Referência Dimensões contempladas Metodologia Características

Dubeux e Margulis (2010)

Agricultura Saúde Eventos extremos Perda de áreas litorâneas

Cenários econométrico, contábil e de equilíbrio geral computável

Avaliação integrada dos efeitos e de diversas metodologias e resultados apresentados por dimen-sões e no agregado

Mota, Gazoni e Góis (2008) Todas Discussão teórica Avaliação geral

Feres, Reis e Speranza (2008) Agricultura EconométricaModelo sobre a lucrati-vidade

Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais (Cedeplar) e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) (2008)

Vulnerabilidade de populações Criação de indicadoresResultados sobre dimensão da saúde

Queiroz e Barbieri (2009) Vulnerabilidade de populações Criação de indicadoresResultados sobre dimensão da saúde e da migração

Moraes e Ferreira Filho (2010) Agricultura Equilíbrio geral computávelModelo regionalizado e estático

Barbieri et al. (2010) Vulnerabilidade de populaçõesResultados sobre dimensão da migração, a partir do Nordeste

Domingues et al. (2010) Agricultura Equilíbrio geral computávelModelo regionalizado e dinâmico

Ferreira Filho e Horridge (2010) Setorial e regional Equilíbrio geral computável Efeitos das migrações internas

Motta et al. (2011) TodasDiscussões sobre econometria e análise custo-benefício

Livro de discussões. Ênfase na regulação e nas possibilidades de medidas prudenciais

Elaboração dos autores.

(Continuação)

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No quadro 1B, notam-se algumas particularidades: a primeira, os estudos se concentram nos impactos sobre a agricultura; a segunda, dividem-se entre as metodologias de equilíbrio geral computável e econométricas; a terceira, os estudos que se utilizam dos modelos de crescimento estão ausentes na literatura nacional. Mais adiante, os resultados serão comparados segundo as metodologias utilizadas.

Para explicar a predominância da agricultura sobre as demais dimensões de impacto, a hipótese é que se trata de uma área na qual os efeitos estão sendo bem compreendidos no Brasil em comparação com as demais, além de sua representatividade nas economias nacional e regionais. Isto se deve, sobretudo, ao esforço de pesquisa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e é consolidado, principalmente, em Pinto e Assad (2008). A pesquisa fornece um panorama claro sobre a compreensão, no presente momento, dos impactos na agricultura em benefício de um esforço de modelagem econômica. Este aspecto demonstra o quanto a pesquisa dos impactos econômicos é multidisciplinar. Somente a partir de cenários consolidados em meteorologia, saúde, agricultura etc., é possível levantar impactos socioeconômicos.

Desse modo, áreas como saúde, mortalidade, eventos extremos, pesca e perda de áreas litorâneas serão cada vez mais incorporadas conforme os cenários se estabeleçam. O esforço de pesquisa nesta direção ocorre, e, mesmo com grande incerteza, alguma estimativa pode ser produzida.

O quadro 2, contudo, apresenta outra linha de trabalhos; nela, as estimativas de impactos econômicos concentram-se não na ocorrência da mudança climática, mas nas políticas que tentam mitigá-la, como a redução das emissões de GEEs. Um exemplo desta linha de trabalhos é o de Lopes (2003). Como se pode perceber, nestes estudos, predominam os trabalhos com equilíbrio geral computável, exceto o trabalho de Rocha (2003), em que se objetiva estimar o tamanho do mercado de carbono no Brasil, sob certos cenários de crescimento. Constitui-se uma importante estratégia de trabalho, pois, com a provável não renovação do Protocolo de Kyoto, a partir de 2012, é incerto o rumo que o mercado de trabalho terá. Assim, reexaminar as condições de captação de projetos e financiamento, sob um panorama em que o agente regulador deixará de existir, é um desafio.

Os trabalhos de Daubermann et al. (2011) e Nardy e Gurgel (2011) também se destacam, pois são os únicos a avaliarem como o uso da terra se modifica segundo as políticas de mitigação adotadas. É necessário lembrar, a esta altura, que o uso da terra pode intensificar ou desacelerar a emissão de GEEs. Por sua vez, Hilgemberg (2004) recorre à matriz insumo-produto para mapear os setores da economia brasileira que seriam sensíveis a políticas de restrição de emissões, ao mesmo tempo em que foi possível reconhecer a transmissão para regiões deste impacto. Ainda explorando o uso de matrizes insumo-produto, Carvalho e Perobelli (2009)

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193Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

avaliam o impacto de emissões para os consumos intermediário e final em quinze setores de atividade econômica, demonstrando, sobretudo, a relação da carga de poluição em setores exportadores. Assim, setores como agricultura, siderurgia, alimentos e bebidas e transportes destacam-se entre os mais afetados na presença de políticas de restrição às emissões.

Desse modo, reconhece-se a hipótese de que certas políticas restritivas a emissões podem, em verdade, estimular um uso inadequado da terra e, assim, gerar um resultado inesperado. Daqui para frente, a integração do uso da terra e as alterações climáticas poderão ser avaliadas em um efeito de retroalimentação, pois a alteração no uso da terra pode reforçar o efeito das mudanças climáticas, sendo que as condições climáticas mais severas podem forçar os agentes a modificar o uso da terra, e/ou isto poderá se dar de forma natural. Este, porém, é ainda um fenômeno em avaliação, e sua incorporação aos modelos econômicos será breve.

O estudo de Guilhoto, Lopes e Mota (2002) simula impactos ambientais decor-rentes da trajetória de crescimento econômico da economia brasileira, especialmente em duas dimensões: relação com a emissão de GEEs e impactos sobre os recursos naturais da região Norte. Por sua vez, a intensidade de energia e água por produto e a carga poluidora decrescem em termos relativos, concomitantemente a uma descon-centração industrial em favor das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Em comum, as duas estratégias apresentadas nos quadros 1A, 1B e 2 têm uma expressiva presença de modelos regionalizados. Esta é uma característica im-portante a ser preservada, pois os perfis econômicos das regiões brasileiras são heterogêneos, bem como, mais ainda, a própria climatologia e a extensão das mudanças climáticas, como conhecidas.

QUADRO 2 Estudos econômicos sobre mudança climática para o Brasil: efeitos de mitigação

Referência Dimensões contempladas Metodologia Características

Guilhoto, Lopes, Mota (2002) Desenvolvimento regional Equilíbrio geral computávelImpactos ambientais regionais

Rocha (2003)Economia em todos os setoresProtocolo de Kyoto

Modelo de crescimentoEstimação de oferta e/ou demanda do mercado de carbono

Lopes (2003)Economia em todos os setores

Equilíbrio geral computávelExercícios de redução na emissão de CO2

Tourinho, da Motta e Alves (2003)

Economia em todos os setores

Equilíbrio geral computávelExercício de incorporação de impostos às emissões

Hilgemberg (2004)Quantificação de emissões de CO2 por setores

Matrizes de insumo-produto Modelo regionalizado

Ferreira Filho e Rocha (2007) Economia em todos os setores Equilíbrio geral computável Modelo regionalizado e estático

(Continua)

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Referência Dimensões contempladas Metodologia Características

Feijó e Porto Júnior (2009)Economia em todos os setores Commodities energéticas

Equilíbrio geral computávelAvaliação de metas do Protocolo de Kyoto

Carvalho e Perobelli (2009) Setorial e exportações Matriz insumo-produtoMatriz energética e emissões de GEEs

Nardy e Gurgel (2011) Foco na agricultura Equilíbrio geral computávelUso da terra a partir do comércio internacional

Daubermann et al. (2011) Foco na agricultura Equilíbrio geral computávelUso da terra e emissões de CO2 a partir de políticas internacionais

Lima e Gurgel (2011) Foco na agricultura Equilíbrio geral computávelPolíticas climáticas interna-cionais afetando a economia brasileira

França e Gurgel (2011)Economia em todos os setores

Equilíbrio geral computávelPolíticas climáticas internacio-nais (Europa e Estados Unidos) afetando a economia brasileira

Silva e Gurgel (2012)Economia em todos os setores

Equilíbrio geral computávelExercício de incorporação de impostos às emissões

Elaboração dos autores.

3 AVALIAÇÕES ECONOMÉTRICAS E/OU EQUILÍBRIO PARCIAL

As avaliações econométricas, em oposição aos modelos computáveis, são con-sideradas avaliações de equilíbrio parcial. Nesse sentido, captariam apenas uma porção do problema, e não a complexidade das interações e suas possibilidades de compensação. Esta seria a principal limitação dos modelos econométricos para o caso em análise, em que a complexidade das inter-relações exerce um papel importante e possivelmente decisivo. Porém, a limitação da metodologia não é suficiente para invalidar as tendências apontadas pelos seus resultados.

O primeiro estudo aplicado à realidade brasileira foi construído em Sanghi et al. (1997). Nele, utiliza-se um modelo ricardiano para avaliar os impactos da mudança climática na agricultura brasileira. A partir de uma função lucro, as condições climáticas e edáficas se manifestariam via alteração do valor da terra. A opção por dividir o território em oito principais tipos de solos também se destaca na construção do modelo. A partir de amostras obtidas por recorte municipal, dos censos realizados entre 1970 e 1985, e considerando um cenário de aumento da temperatura de 2,5º C e aumento das precipitações pluviométricas em 7%, é possível constatar efeitos no valor da terra entre -2,16% – amostra de 1980 – e -7,4% – amostra de 1975. Ademais, os efeitos regionais são significativamente heterogêneos, mas é possível visualizar que os estados do Centro-Oeste e do Sudeste e ainda os do Tocantins e de Rondônia, observariam as maiores quedas no valor da terra. Ressalte-se que a mesma estratégia de modelagem foi aplicada à agricultura chilena por González e Velasco (2008).

(Continuação)

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195Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Considerando-se a predominância do setor agropecuário na estrutura eco-nômica de muitos países e a grande alocação de força de trabalho no setor, Mendelsohn e Dinar (1999) examinam a possibilidade de os produtores adaptarem-se. Utilizando dados de pesquisas, na Índia e no Brasil, os autores percebem que, regra geral, os produtores estão aptos a enfrentar as transformações e são reativos a variações no clima, adotando rapidamente medidas paliativas, desde que regras institucionais facilitem o acesso a estas soluções. Entretanto, este não é um cenário crível para a maior parte dos países que dependem da renda agrícola. Na ausência destas medidas, Sanghi (1998) (apud Mendelsohn e Dinar, 1999) percebe uma redução na renda de 5% a 11%, no caso de uma elevação da temperatura para o Brasil elevar-se em média 2º C. Se o aumento for de 3,5º C, a renda declinaria de 7% a 14%. A metodologia empregada para obter estes resultados é, também, por meio de um modelo ricardiano.

Várias limitações, todavia, têm sido apontadas para o uso desse tipo de mo-delagem para avaliação do impacto de efeitos da mudança climática. A principal crítica deriva da razão de que tal modelo se utiliza de informação incompleta relativa à qualidade do solo da propriedade; ou seja, suas características particulares. Outra limitação apontada seria o fato de os modelos ricardianos não considera-rem variações de preços; logo, ignoram alterações no excedente do consumidor e, consequentemente, tendem a superestimar resultados benéficos e sobre-estimar efeitos danosos (FAO, 2000).

Em paralelo, Chimeli e Souza Filho (2004) destacam a importância de in-tegrar análises climáticas e econômicas para o planejamento de políticas públicas. Em especial, na região do semiárido brasileiro e para as culturas de subsistência, como o milho e a mandioca. Ademais, os autores percebem uma sensibilidade en-tre a pequena produção e a transferência de recursos a partir da União, destinados a políticas anticíclicas. Por fim, a administração destes recursos tem sido exposta a toda sorte de ineficiências, ampliando o problema para a gestão local dos recursos.

Na dimensão saúde e migração, estudos contribuíram para avançar o conhe-cimento e aperfeiçoar o cálculo de indicadores de vulnerabilidade das popula-ções no território brasileiro, contemplando também a dimensão econômica, como os estudos do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional de Minas Gerais (Cedeplar) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) (2008), de Confalonieri, Marinho e Rodriguez (2009) e de Barbieri et al. (2010), sendo, porém, um estudo que se concentra em abordagens relacionadas à saúde. Mais detidamente, estes estudos se dedicam a avaliar a vulnerabilidade de populações da região Nordeste e os impactos sobre indicadores de saúde e migração populacional. Pode-se, inclusive, perceber correlação alta entre os piores indicadores sociais da região Nordeste, no que se re-fere ao acesso à infraestrutura básica, e de municípios que possivelmente serão mais afetados pela mudança climática, como apontado em Queiroz e Barbieri (2009).

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Em paralelo, são municípios em que a dependência de transferências de recursos a partir do governo central é maior e a capacidade de ações rápidas é mínima. Tais estudos não se utilizam propriamente de uma metodologia econométrica. Contudo, serão classificados como análises de equilíbrio parcial por explorarem a construção dos indicadores pelos índices voltados para as condições socioeconômicas.

Timmins (2006), inspirado em Sanghi et al. (1997), com o objetivo de ana-lisar futuros impactos da mudança climática sobre os solos brasileiros, optou por dividir o território brasileiro em oito solos distintos para seis regiões brasileiras: Norte, Nordeste, Sul, Centro-Oeste, Minas Gerais e, finalmente, outros estados do Sudeste. Novamente, usando a técnica ricardiana, endogenizou o uso do solo e con-cluiu que a mudança climática pode aumentar ainda mais o ritmo de desfloresta-mento e alimentar, por consequência, ainda mais, o processo de mudanças climáticas.

Os resultados da mudança climática obtidos por Timmins (2006) mostram que elevações das temperaturas no verão tenderiam a diminuir a área de florestas e as lavouras permanentes, beneficiando as lavouras temporárias e principalmente as pastagens.4 No movimento oposto, o aumento de temperaturas no inverno provocaria a redução das áreas de pastagens5 e o aumento de áreas de florestas naturais. Para as lavouras, a elevação de temperaturas no período de inverno pro-vocaria a redução das áreas de lavouras temporárias em Minas Gerais e nas regi-ões Sudeste e Sul e, inversamente, o aumento para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Outra análise, utilizando-se da mesma abordagem, é encontrada em Feres Reis e Speranza (2008) e se detém no caso da agricultura brasileira, avaliando impactos sobre a lucratividade e o preço da terra. Os produtores são supostos maximizadores de rentabilidade e, portanto, recorrem às culturas mais lucrativas. As informações são colhidas a partir de dados dos censos agropecuários brasileiros, entre 1970 e 1995, e, em paralelo, considerando os cenários B2 e A2 do IPCC. Como resultado, considera--se que o modelo construído para o preço da terra é pouco robusto, ao passo que o modelo para a lucratividade apresenta resultados consistentes. Neste indicador, o mo-delo prevê que a lucratividade poderia cair, no contexto geral do Brasil, apenas 0,8%, entre 2040 e 2069, para o cenário mais brando (B2), ou 3,7% para o cenário mais pessimista (A2). Se for considerado o intervalo de anos entre 2070 e 2099, os im-pactos seriam de -9,4% (B2) ou -26% (A2). Contudo, como esperado, os resultados são heterogêneos para o nível regional. Avaliando as cinco grandes regiões brasileiras, percebe-se que o resultado confirma o comportamento conhecido: Norte, Nordeste e Centro-Oeste observam prejuízos, enquanto Sul e Sudeste – exceto para o horizonte 2070-2099 no cenário A2 – apresentam ganhos classificados como notáveis.

4. Nesse caso, a região Sul também assistiria a um decréscimo nas áreas de pastagens. 5. Dessa vez, ocorreu efeito contrário na região Sul.

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197Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Finalmente, em Pinto e Assad (2008), os autores partem de um modelo climático denominado Precis e, em consequência, consideram os efeitos de dois cenários do IPCC, o A2 e o B2,6 e seus impactos sobre nove culturas principais da agropecuária brasileira.7 Faz-se mister destacar que, como lembram os autores, o zoneamento climático das culturas é uma combinação de temperatura e potencial hídrico das áreas analisadas. De posse da metodologia, definiu-se que os horizon-tes temporais de análise seriam os anos de 2010, 2020, 2050 e 2070.

Ressalte-se que uma limitação para a aplicação de cenários e valores contá-beis contidos em Pinto e Assad (2008) reside no fato de que tais autores traba-lham com projeções para áreas aptas ao desenvolvimento das culturas. A partir das simulações climáticas realizadas, Pinto e Assad (2008) calculam os impactos econômicos decorrentes dos efeitos previstos para a agricultura brasileira. Todavia, tais cálculos são realizados considerando-se somente a perda decorrente de produtividade das culturas, e sua avaliação é meramente contábil. Contudo, ao mapear as áreas aptas e inaptas, o trabalho disponibiliza uma informação essencial para a aplicação e a fundamentação dos modelos de equilíbrio geral computável.

4 MODELOS DE EQUILÍBRIO GERAL COMPUTÁVEL

Os modelos de equilíbrio geral computável são largamente empregados para ava-liar as consequências em análises de políticas e os choques de naturezas diversas. Como Wigle (2001, p. 5) afirma, o experimento típico em equilíbrio geral com-putável é perguntar-se: qual o impacto de uma determinada política ou evento?. Nesse sentido, e políticas de contenção da emissão de gases, derivadas ou não de acordos internacionais, e políticas de impostos sobre emissões e avaliações dos efeitos do aquecimento global, na ausência de contramedidas, são alguns exem-plos de choques e simulações propostos, utilizando a metodologia. A abordagem integrada das variáveis permite capturar efeitos de escala e escopo nos fenômenos econômicos, em comparação com as abordagens de equilíbrio parcial.

Um artigo com objetivo centrado no Brasil, que encontra resultados pró-ximos aos registrados na literatura internacional, a partir de uma metodologia CGE, é o de Moraes (2007), mas, mesmo neste caso, algumas limitações existem. Além do modelo CGE utilizado, trata-se de um modelo simplificado (minimal), a calibração deu-se com dados da matriz insumo-produto de 1996 e os dados também se encontram agregados em nível nacional. De qualquer forma, as variações, para o produto interno bruto (PIB), decorrentes dos efeitos da mudança climática, situam-se entre quedas de 0,18% a 0,92%, dependendo do cenário.

6. Recorde-se que no cenário B2 há uma estimativa de aumento da temperatura de 2,4º C, enquanto no cenário A2 a temperatura eleva-se 3,4º C – tendências centrais.7. Quais sejam: algodão, arroz, feijão, café, cana-de-açúcar, girassol, mandioca, milho e soja.

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Neste caso, porém, foram simulados choques sobre a produtividade dos insumos utilizados na agricultura, com base em cenários internacionais.

Em Domingues, Magalhães e Ruiz (2008), consideram-se apenas os cenários de mudança climática no Nordeste, e o cenário-base é obtido dos estudos pro-duzidos por Pinto e Assad (2008). Desse modo, a variável que sofre o choque é a disponibilidade de terras para a agricultura, considerada a probabilidade de sucesso de 80%, correspondente ao seguro agrícola. Entretanto, os efeitos não são dife-renciados por cultura, sendo que a opção é um choque sobre o setor agropecuário agregado. Os resultados demonstram que o PIB agrícola da região pode cair até 13%, enquanto o emprego teria queda de 6% em 2050. Os resultados estaduais demonstram que Pernambuco seria o estado mais afetado – queda de até 18,6% – e Sergipe seria o estado menos afetado, podendo inclusive se nota aumento do PIB no cenário B2. O modelo de equilíbrio geral computável utilizado foi o TERM.

O trabalho de Domingues et al. (2010) prossegue nessa linha, agora com resultados por microrregião brasileira e um modelo regionalizado dinâmico; ou seja, com variações em períodos sucessivos. Neste artigo, os dados de Pinto e Assad (2008) são as fontes primárias das informações e são disponibilizados para oito culturas agrícolas, além da pecuária. Note-se, entretanto, que, diferentemente de Domingues, Magalhães e Ruiz (2008), este novo estudo trabalha com outro modelo de equilíbrio geral computável, o B-MARIA.

O artigo de Moraes e Ferreira Filho (2010) recorre, também, ao modelo TERM para estimar impactos econômicos a partir de perspectivas para oito culturas agrícolas. O artigo traz alguns pontos ao exame, notadamente: i) considera os possí-veis efeitos benéficos de uma mudança climática branda – cenário de 2020 – sobre a cana-de-açúcar e a mandioca; ii) realiza uma ligação entre os efeitos esperados e a estrutura do mercado de trabalho,8 apontando tendências de transferências de região e atividades; e iii) realiza, também, uma ligação entre os efeitos esperados e os impac-tos no orçamento das famílias,9 demonstrando a intensidade dos impactos sobre o orçamento das famílias mais carentes. Os resultados também apontam que produtos industriais e de serviços seriam produzidos com um custo menor, resultando em redução do preço da cesta das famílias mais abastadas. O resultado sugere, portanto, uma concentração maior da renda como resultado das mudanças climáticas.

Ainda Ferreira Filho e Horridge (2010) avaliam impactos da mudança climá-tica sobre migrações internas, especialmente a partir dos impactos sobre a agricultura. A motivação do estudo é entender como o mercado de trabalho pode ser afetado, bem como, em paralelo, a distribuição da população entre as zonas rural e urbana.

8. Utilizando-se das informações da Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílios (PNAD).9. Utilizando-se das informações da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF).

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199Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Em comum, os resultados de todos esses estudos demonstram que a região Nordeste, por seu clima,10 e os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, pela concentração da produção agrícola em soja, seriam afetados em intensidades relevantes em suas economias. As quedas previstas seriam superiores a 5% do PIB para a maior parte dos estados mencionados. Este resultado, sendo seguro, sugere que políticas contracíclicas deveriam ter sido pensadas para as regiões como alter-nativas de renda. Tais políticas passam pela disponibilidade de tecnologia agrícola ou pela diversificação das atividades econômicas, o que exigiria a adaptação da mão de obra local e da logística regional.

Os resultados contidos em Dubeux e Margulis (2010) demonstram que a incorporação de áreas como a da saúde, os eventos climáticos extremos e a perda de áreas litorâneas tornam maiores os prejuízos associados, em compara-ção àqueles que somente consideram a agricultura. Ressalte-se que estes autores também consideram os resultados relativos à biodiversidade em todas as áreas cujos cenários ainda não estão consolidados, uma vez que a biodiversidade é sujeita a correções e avaliações; portanto, os resultados geram grande incerteza, assim como aquela verificada no Stern Review. Uma área importante incluída no estudo foi a de efeitos sobre a geração de energia, pois ainda que se preveja maior quantidade de chuvas, estas seriam mais concentradas; portanto, resul-tando em períodos de seca maiores. Para um país com energia hidráulica, esta antecipação é fundamental.

De toda forma, o estudo mostra um impacto importante sobre a econo-mia nacional. Diversas metodologias, porém, foram utilizadas de forma com-binada para a avaliação dos impactos totais, indicando não apenas uma mul-tidisciplinaridade, mas também metodologias múltiplas como um caminho a ser trilhado.

Motta et al. (2011) reforçam, todavia, que a questão central para a tomada de decisão em políticas de mudanças climáticas reside em entender os benefícios e os custos da mitigação comparados aos benefícios e aos custos da adaptação, incluindo-se a variável de mais dificuldade de projeção, a tecnologia. Os autores reforçam a incerteza associada aos diversos estudos econômicos, destacando o permanente diálogo que deve ser mantido com as demais ciências; notadamente, as naturais. Assim, como concluem os autores, o princípio da precaução é impor-tante, mas tomá-lo em exagero pode ser um importante constrangimento ao desenvolvimento socioeconômico.

10. Exceção feita ao estado de Sergipe, por seu clima particular.

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5 ESTUDOS DE MITIGAÇÃO

Os estudos sobre mitigação dos efeitos da mudança climática no Brasil têm origem nos estudos americanos, sobretudo o de Nordhaus (1992). Portanto, os trabalhos brasileiros se concentram na utilização de modelos de equilíbrio geral ou de matriz insumo-produto.

Em geral, os estudos simulam a introdução de taxas sobre emissões de GEEs nos setores da economia, ou simulam a adoção de metas do Protocolo de Kyoto. Outras variantes dizem respeito a uma análise sobre o comércio internacional ou a efeitos sobre economias regionais. Exceção é o trabalho de Daubermann et al. (2011), que se dedicam a avaliar o efeito de políticas de mitigação no uso da terra, reconhecendo, sobretudo, um efeito de feedback sobre as emissões totais de GEEs.

Rocha (2003) simula a trajetória de emissões pari passu a trajetórias de cres-cimento econômico e distribuição do perfil econômico dos setores no produto total. O modelo carbon emission reduction trade (CERT), construído pelo autor, permite tentar inferir a evolução do mercado de carbono, especialmente o meca-nismo de desenvolvimento limpo (MDL) e as repercussões no Brasil. Em razão das dificuldades para a renovação do Protocolo de Kyoto e dos consequentes efei-tos sobre o MDL, os lucros previstos apenas para o Brasil poderiam resultar em até US$ 328 milhões.

Em Tourinho, da Mota e Alves (2003), há uma aplicação de um modelo de equilíbrio geral, simulando a adoção de tributação sobre emissões de carbono na economia brasileira. Três cenários foram simulados, um deles no mesmo nível que posteriormente será testado por Silva e Gurgel (2012). Os resultados também apontam para uma queda no PIB; em especial, no consumo das famílias. Porém, ao contrário do que dizem Silva e Gurgel (2012), as quedas na atividade econômica são de fato desprezíveis.

A apuração do total de gases emitidos pelos setores econômicos no Brasil e as implicações de restrições sobre as emissões são avaliadas por Hilgemberg (2004). Várias simulações são realizadas, demonstrando resultados nacionais e regionais, além de setoriais. As restrições sobre emissões tendem a afetar especialmente o setor de comércio e serviços, além dos de agricultura, alimentos e bebidas, de acordo com esta avaliação. O resultado em comércio e serviços se explica, sobretudo, devido à presença do setor energético. Regionalmente, porém, a importância dos setores se altera conforme o perfil produtivo da região.

Outro exercício a respeito da introdução de impostos sobre emissões de GEEs, tendo em vista as metas de Kyoto e Copenhague, é realizado por Silva e Gurgel (2010). Os autores se utilizam de um modelo de equilíbrio geral computável, dinâmico e multirregional para avaliação de efeitos. Eles consideram pequena a redução à qual a economia brasileira estaria submetida, bem como as alterações

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201Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

necessárias na matriz energética brasileira. Entretanto, a queda de 6% do PIB em 2050 pode ser considerada expressiva, especialmente se considerados os resultados desiguais por regiões. Ademais, há um reconhecimento de que as ações sobre o setor agropecuário necessitam de medidas adicionais; não apenas a introdução do imposto simulado, de US$ 20,00, sobre a tonelada de carbono emitida.

Para Ferreira Filho e Rocha (2007), excluindo-se as emissões oriundas da alteração no uso da terra e classificando-se as fontes de emissão em uso de com-bustíveis fósseis e emissões ligadas à produção, simulam-se adoções de impostos sobre estes dois blocos de emissões. Especificamente, as taxas que são adotadas no setor de emissões ligadas à produção demonstram-se mais importantes que aquelas que venham a ser estabelecidas no setor energético. Porém, o principal impacto é elevar os preços, especialmente os dos produtos alimentares.

Os impactos que a adoção de metas de emissão de GEEs têm sobre a eco-nomia foram analisados, também, pelo modelo CGE, por Feijó e Porto Júnior (2009). A vantagem oriunda do fato de expressiva parcela da matriz energética brasileira provir de energia renovável favorece a posição relativa da economia bra-sileira no caso de adoção de metas. Tanto melhor se o Brasil optasse por participar das emissões certificadas, mas, como resultado geral, as opções de cenários estuda-dos mostram uma variação geral da economia pequena.

Em outro sentido, a adoção, pelos países desenvolvidos, de uma matriz energética limpa, baseada em biocombustíveis, no setor de transportes, teria um importante impacto sobre a atividade econômica no Brasil, segundo Lima e Gur-gel (2011). Sobretudo, a adoção destas políticas de mitigação teria como resultado uma concentração dos fatores de produção na produção de biocombustíveis, em prejuízo das demais atividades. Ademais, os autores alertam para a possibilidade de deterioração dos termos de troca para o Brasil. Como última percepção, os autores condicionam este resultado ao perfil de substituição dos combustíveis fósseis.

Na mesma linha, Nardy e Gurgel (2011) simulam como uma redução das tarifas de importação de etanol nos Estados Unidos impactaria o perfil produti-vo brasileiro. Se, de um lado, pode-se perceber a redução das emissões de GEEs no setor de transportes, por outro, a dinâmica do uso da terra se alteraria e há indicações de que a área de pastagens e florestas se reduziria em favor das áreas de culturas de cana-de-açúcar, aumentado as emissões. Entretanto, ainda que para o resultado líquido seja possível esperar uma redução líquida das emissões, aparentemente, haveria uma transferência das emissões, considerados os limites internacionais e, adicionalmente, os impactos ambientais, outros derivados do aproveitamento econômico na agricultura de terras que hoje são recursos flores-tais. Esta discussão, porém, para ser realizada, assumiria os resultados do trabalho recém-publicado.

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Daubermann et al. (2011), porém, simulam que as políticas de adoção de biocombustíveis previstas pela Califórnia podem indiretamente estimular uma redução ainda maior que o previsto, se considerados os padrões de produtividade e rendimento na produção de biocombustíveis no Brasil. Em especial, a ampliação da produção, nas áreas de florestas do Brasil, sugere uma situação na qual a incor-poração de novas áreas ainda permite rendimentos crescentes de escala.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por intermédio das diversas linhas de estudo sobre o problema das mudanças climáticas, podem-se perceber, em especial, dois desafios importantes: i) o aper-feiçoamento dos cenários para que a comparação das diversas estratégias seja pos-sível de um ponto de vista econômico; e, além disso, ii) os aperfeiçoamentos metodológicos, tanto para as análises de equilíbrio parcial quanto para as análises de equilíbrio geral.

A primeira linha de desafios, especialmente, possibilitaria ao Brasil desenhar uma estratégia de desenvolvimento econômico que contemplasse as características setoriais da economia e a sua matriz energética. Assim, impactos setoriais agudos poderiam ser antecipados e minimizados, da mesma forma que as eventuais be-nesses de fontes energéticas renováveis pudessem ser direcionadas para setores que têm maior potencial de redução de emissões. Até o momento, por sua peculiar oferta de energia, parece mais vantajoso ao Brasil realizar um esforço de redução das emissões, tendo em vista que o impacto econômico é limitado, comparado às potenciais perdas. Em outras palavras, políticas de mitigação são superiores, em termos econômicos, a perspectivas de vulnerabilidade e/ou adaptação.

De qualquer forma, nota-se na literatura uma ausência de modelos econô-micos de crescimento teóricos que contribuam com políticas ótimas de desenvol-vimento sustentável, contemplando equilíbrio econômico e adequação ambiental.

Na segunda linha, pede-se um esforço dos pesquisadores no sentido de vali-dar e testar suas metodologias para os problemas apresentados. Mais que isto, se-ria importante identificar pontos de complementaridade entre metodologias e gerar efeitos feedback nos resultados. A inclusão de uma ou mais dimensões que contemplassem as relações biofísicas, por exemplo, pode ser abordada nos modelos de insumo-produto, bem como em modelos de equilíbrio geral. Ademais, elasticidades específicas podem ser pesquisadas, causando o aprimora-mento dos resultados. A contribuição do estudo de algumas séries de tempo – em especial, as relacionadas às demais dimensões, não econômicas, dos problemas da mudança climática – pode também recuperar parcelas de conhecimento. Finalmente, a manutenção de uma estratégia de modelagem regionalizada deve ser mantida; em especial, no caso brasileiro.

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203Brasil, Mudanças Climáticas e Economia: o que há estabelecido?

Essa revisão demonstra que são consideráveis os pontos de conhecimento sobre o problema da mudança climática no Brasil, pelo menos no seu aspecto econômico. E também que, a partir destes pontos de entendimento, é possível pensar em estratégias, sendo esta a principal contribuição dos trabalhos na área.

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Originais submetidos em março de 2012. Última versão recebida em junho de 2012. Aprovado em novembro de 2012.

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EVIDÊNCIAS DO IMPACTO DA CORRUPÇÃO SOBRE A EFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS DE SAÚDE E EDUCAÇÃO NOS ESTADOS BRASILEIROSLuckas Sabioni Lopes*Silvia Harumi Toyoshima**

A consciência sobre a necessidade de se manter maior equilíbrio das finanças públicas e fornecer serviços de qualidade tornou a gestão eficiente dos recursos públicos matéria fundamental de estudos. Neste contexto, este trabalho objetivou analisar: i) a eficiência técnica dos estados brasileiros na aplicação dos recursos com saúde e educação; e ii) os efeitos que a corrupção tem exercido sobre esta eficiência. Para o cálculo das eficiências, utilizou-se a técnica DEA-BBC, orientação produto. Duas bases de dados distintas sobre corrupção foram utilizadas, uma no âmbito macrorregional e outra no estadual. Os principais resultados obtidos foram que a ineficiência é elevada em vários estados, e a verificação empírica de que a qualidade da gestão está negativamente correlacionada com a corrupção nas regiões brasileiras. São primeiros indícios estatísticos de um problema que a população brasileira parece conhecer há algum tempo.

Palavras-chave: eficiência técnica; corrupção; saúde e educação.

SOME EVIDENCE CONCERNING THE NEGATIVE EFFECT OF CORRUPTION ON THE EFFICIENCY OF HEALTH AND EDUCATION POLICIES IN THE BRAZILIAN STATES

The consciousness about the necessity to maintain public financial equilibrium and to supply high quality public services turns the efficient management of public resources into a fundamental research topic. In this context, this study aims to analyze the technical efficiency of Brazilian states in the allocation of resources to health and education services and the relationship between this efficiency and corruption. We use the DEA technique to calculate efficiency. Furthermore, two separate databases on corruption are considered, one at macro-regional and one at State level. Our main findings show that inefficiency is high in several states, particularly in the North and Northeast regions, and that corruption is negatively correlated with efficiency in the Brazilian States.

Keywords: technical efficiency; corruption; health and education.

EVIDENCIAS SOBRE EL IMPACTO NEGATIVO DE LA CORRUPCIÓN SOBRE LA EFICIENCIA DE LAS POLÍTICAS DE SALUD Y EDUCACIÓN EN LOS ESTADOS BRASILEÑOS

El presente estudio tiene como objetivo analizar la eficiencia técnica de los estados brasileños en la asignación de recursos a los servicios de salud y educación, y la relación entre esta eficiencia y la corrupción. Utilizamos la técnica DEA para calcular la eficiencia. Además, se consideran dos bases de datos independientes sobre corrupción, uno a macro-regional y uno a nivel estatal. Nuestros

* Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).** Professora do Departamento de Economia da Universidade Federal de Viçosa (UFV).

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principales resultados muestran que la ineficiencia es alta en varios estados, especialmente en las regiones Norte y Nordeste, y que la corrupción está negativamente correlacionada con la eficiencia en los estados brasileños.

Palabras clave: eficiencia técnica; corrupción; salud y educación.

ÉVIDENCES CONCERNANT L’EFFET NEGATIF DE LA CORRUPTION SUR L’EFFICACITÉ DES POLITIQUES DE SANTÉ ET L’EDUCATION DANS LES ÉTATS DU BRÉSIL

La nécessité de maintenir l’équilibre financier du secteur public et de fournir des services publics de qualité tourne la gestion efficace des ressources publiques dans une thème de recherche fondamentale. Dans ce contexte, cette étude vise à analyser l’efficacité technique des états brésiliens dans l’utilisation des ressources pour la santé et pour l’éducation et la relation entre cette efficacité et la corruption. Nous employons la technique DEA pour le calcul de l’efficacité. Par ailleurs, deux bases de données differentes sur la corruption sont considérées, l’une au niveau macro-régional et l’autre au niveau d’état. Nos principaux résultats montrent que l’inefficacité est élevée dans plusieurs états, en particulier dans les régions du Nord et du Nord-Est, et que la corruption est corrélée négativement avec l’efficacité dans les états brésiliens.

Mots-clés: efficacité technique; corruption; santé et éducation.

JEL: D73, H11, H4.

1 INTRODUÇÃO

A eficiência no uso dos recursos públicos é uma demanda crescente das socie-dades atuais. Espera-se uma prestação de serviços governamentais de qualidade, consubstanciada à utilização racional do montante arrecadado com os impostos. Neste sentido, diversos estudos têm surgido para verificar empiricamente a quali-dade das administrações públicas, seja no Brasil, seja internacionalmente.

Por exemplo, Marinho, Cardoso e Almeida (2009) comparam a eficiência na provisão de serviços de saúde entre o Brasil e uma amostra de países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) no ano de 2004. Eles concluíram que este país, considerando-se suas dificuldades de estabilização orça-mentárias, tem um sistema de saúde público relativamente eficiente.

Por sua vez, Ribeiro (2008) avaliou o desempenho dos gastos públicos para uma amostra de países da América Latina no período de 1998 a 2002. Suas evi-dências mostraram o Brasil com um resultado em torno da média na avaliação dos serviços públicos, mas abaixo da média quanto à eficiência do gasto. Costa Rica, Uruguai e Chile obtiveram os melhores resultados tanto no desempenho dos serviços como na eficiência do gasto governamental.

Em um contexto mais específico, Faria, Jannuzzi e Silva (2008) avaliaram a eficiência municipal dos setores de saúde e educação para o estado do Rio de Janeiro. O artigo destacou os municípios de São Gonçalo, Japeri, Queimados, Cantagalo,

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211Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

São João de Meriti e Resende como mantendo “boas práticas” no que se refere à eficiência pública com estes serviços.

Percebe-se um ponto em comum nas pesquisas citadas anteriormente – a focalização da análise sobre os recursos públicos destinados às áreas de saúde e/ou educação. Isto se justifica, principalmente, porque a provisão destes ser-viços é vista como um potencial catalisador do crescimento econômico dos países.1 Em outras palavras, argumenta-se que a acumulação do capital humano, que está positivamente correlacionada com o nível de saúde e educação, eleva a produtividade dos fatores e contribui para a expansão da atividade econô-mica. Assim, os modelos de crescimento, tanto os clássicos como os endóge-nos, por exemplo, aqueles de Bose, Haque e Osborn (2003) e Romer (1989), apontam que as regiões que investem apropriadamente nestes serviços ten-dem a apresentar um crescimento econômico mais acelerado do que aquelas regiões que não o fazem.

Outra semelhança entre os trabalhos citados é a metodologia utilizada para o cômputo da eficiência, isto é, a Análise Envoltória de Dados (DEA). Tal técnica calcula a eficiência baseada na própria amostra de dados, destacando, entre as unidades produtivas observadas, aquelas que melhor utilizam/produzem certos tipos de insumos/produtos. Segundo Marinho (2001), a técnica DEA produz resultados eficientes no sentido de Pareto, fato que justifica o grande número de trabalhos que a vem aplicando no contexto das finanças governamentais.

Atualmente, entretanto, grande parte da literatura especializada tem se preocupado em criar rankings de melhores práticas, em ressaltar os insumos gastos excessivamente e os produtos que poderiam ter sua oferta expandida (Marinho, Cardoso e Almeida, 2009; Ribeiro, 2008; Faria, Jannuzzi e Silva, 2008). Apesar de serem tarefas importantes, há ainda uma lacuna pouco explo-rada acerca dos fatores que distinguem as boas das más administrações públicas em seus diversos níveis.

Esta pesquisa focalizou um possível determinante da eficiência, ou seja, os efeitos da corrupção sobre a qualidade da gestão dos recursos destinados à saúde e à educação pública nos estados brasileiros.

Para tal, objetivou-se, especificamente, computar a eficiência técnica esta-dual na gestão dos recursos públicos destinados às áreas de saúde e educação, utilizando a metodologia DEA-BBC múltiplos estágios, orientação produto, e verificar a associação entre esta eficiência e indicadores de corrupção.

1. Ver, por exemplo, os trabalhos de Romer (1989) e Barro (1991), entre outros, em que a formação de capital humano seja apontada como um importante insumo gerador de crescimento.

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As principais contribuições deste artigo são listadas a seguir. No contexto da literatura nacional, avançam os estudos que têm avaliado as administrações pú-blicas no país, fornecendo evidências empíricas inéditas acerca do relacionamento entre eficiência e corrupção. Tratando-se de uma análise regional, destacam-se as regiões críticas, tarefa que subsidia a adoção de políticas públicas mais específicas. Além disso, são fornecidas estimativas iniciais do impacto da corrupção sobre a prestação de serviços públicos nas áreas de educação e saúde no país, numa ten-tativa de mensurar os efeitos reais deste fenômeno sobre a população brasileira. Em termos da literatura internacional, tal pesquisa constitui mais um esforço de exploração quantitativa de dados relativamente escassos sobre uma variável extre-mamente difícil de ser resumida em uma medida numérica, a corrupção.

Teoricamente, a eficiência do setor público poderia ser reduzida pela corrupção, como: i) havendo fraudes em licitações, a empresa ganhadora po-deria não ser aquela com melhores condições de ofertar determinado bem ou serviço, reduzindo o retorno de cada unidade monetária paga pelo governo; ii) diminuindo a efetividade do gasto social por meio de desvios de frações do orçamento para práticas ilícitas, como o enriquecimento individual; e iii) reduzindo a produtividade do investimento público, pois a possibilidade de superfaturamento diminui a relação produto ofertado/insumo utilizado das obras (Svensson, 2005; Tanzi, 1998; Mauro, 1995).

Entretanto, alguns autores defendem que a corrupção poderia elevar a efici-ência dos governos, porque ela possibilitaria reduzir os entraves burocráticos que incidem sobre a implementação de projetos de investimentos, agindo como um óleo que lubrifica as engrenagens do setor público; e, adicionalmente, porque a corrupção poderia sustentar menores salários públicos e carga tributária (Leff, 1964; Tullock, 1996). Neste sentido, a verificação empírica do relacionamento entre corrupção e eficiência governamental é de elevada relevância, seja no Brasil, seja em outros países.

Adianta-se aqui que os resultados indicaram que a corrupção tende a dimi-nuir o nível da eficiência governamental. Deste modo, as ações de combate a essas práticas possibilitariam uma maior taxa de retorno dos recursos destinados às áreas de saúde e de educação no país, o que poderia gerar maior bem-estar social e crescimento econômico.

2 CORRUPÇÃO, SUAS CAUSAS E EFEITOS SOBRE A EFICIÊNCIA DAS POLÍTICAS GOVERNAMENTAIS

Brooks (1909), em um artigo seminal, argumenta que a corrupção, em geral, está associada a atividades como fraude, suborno, propina, saques e, ou, desvios de verbas. Porém, a corrupção é um conceito mais amplo do que todos os demais já citados.

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213Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

Ela não requer mais de um agente participando, por exemplo, como acontece com os subornos e as propinas. Sempre que um agente público vota a favor de uma medida prevendo como os resultados desta ação favorecerão sua própria riqueza no futuro, independentemente dos efeitos sociais de sua escolha, isto também pode ser entendido como corrupção. Neste sentido, tendo em mente várias características de uma atividade corrupta, Brooks (1909) define corrupção como: “o mau desem-penho intencional ou a negligência de uma obrigação reconhecida, ou o exercício indevido do poder, com o objetivo de se obter alguma vantagem mais ou menos pessoal” (Brooks, 1909, p. 4, tradução nossa).2

Ao longo dos anos, esta definição vem sendo refinada e simplificada. Por exemplo, para Nye (1967, p. 419, tradução nossa), corrupção é: “o compor-tamento que se desvia das tarefas formais de um cargo público, em função de interesses particulares, (...) ou ganhos de status; ou viola leis contra o exercício de certos tipos de influência de interesses privados”.3

Já Nas, Price e Weber (1986) assumem corrupção como qualquer uso ilegí-timo do poder público ou de autoridade para benefício próprio, definição padrão bastante aceita atualmente (Svensson, 2005; Méon e Weill, 2010). Nestes termos, corrupção é normalmente entendida como o uso de bens, serviços e do poder público para o benefício privado, podendo assumir uma vasta gama de formas, como pagamento de propinas, fraudes em licitações, desvios de verbas e compra de votos (Klitgaard, 1998). Como explicam vários autores, contudo, apesar de ser difícil defini-la corretamente, a corrupção, quando observada, é facilmente identificável.

Tendo definido corrupção, é necessário responder outras duas importantes questões: i) Por que existe corrupção?; e ii) Quais são seus efeitos? As respostas a estas duas questões conduzem a políticas econômicas ótimas, sejam elas de com-bate ou de estímulo à corrupção.

Com respeito ao primeiro ponto, Nas, Price e Weber (1986) argumentam que a resposta depende de características pessoais e estruturais. As características pessoais se associam fortemente a desvios de caráter como a cobiça ou a fraqueza frente às tentações, ou seja, a ausência de ética.

Tal suposição está intimamente relacionada ao aparecimento de modelos teó-ricos do cunho agente-principal, entre os quais se citam Acemoglu e Verdier (1998; 2000) e Mookherje e Png (1995). A ideia básica destes modelos é a existência de um principal benevolente, normalmente assumido como o governo central. Em seu dia a dia, o principal delega uma série de ações tais como coleta de impostos,

2. No original: ”the intentional misperformance or neglect of a recognized duty, or the unwarranted exercise of power, with the motive of gaining some advantage more or less directly personal”.3. No original: ”the behavior which deviates from the formal duties of a public role because of private-regarding (...) or status gains; or violates rules against the exercise of certain types of private-regarding influence”.

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implementação de políticas específicas e controle e execução de regulações aos agentes, nomeados de burocratas. Ao delegar estas atividades aos burocratas, o principal os encarrega com um poder que pode ser utilizado para atividades corruptas (Aidt, 2003).

Para melhor entendimento, recorre-se a um exemplo padrão de intervenção governamental na atividade econômica – a tributação da poluição ou de qualquer outra externalidade negativa. Um governo ideal taxaria a poluição e garantiria que todas as empresas poluíssem menos. Entretanto, muitas vezes, é custoso observar quanto de poluição cada empresa em particular produz, ou se as precauções legais foram tomadas. Assim, o governo emprega burocratas (agentes públicos) para coletar informações e pôr em prática as políticas. O fato de que o governo pre-cisa empregar agentes para a fiscalização introduz uma relação agente-principal na qual os burocratas podem auferir rendas ilegais, com suborno ou propinas, com base em informações que eles têm e que o governo (o principal) não tem. Os agentes podem exigir dinheiro para não relatar ao principal que determinada firma polui, por exemplo.

Modelos teóricos com estrutura agente-principal chegam a resultados em que os governos centrais procuram desenhar mecanismos para controlar a corrup-ção existente por parte dos burocratas e manter o sistema operando no ponto de ótimo econômico. Um procedimento bastante comum a estas estruturas é propor salários eficiência. O governo poderia oferecer altos salários aos burocratas, maiores que os observados no mercado privado, ou mesmo atrelar o salário à arrecadação de impostos, atraindo pessoas capacitadas4 para os cargos públicos e aumentando o custo de ser pego sendo corrupto, o que reduziria o incentivo a tais atividades. Porém, existe um trade-off, pois à medida que o salário público aumenta, talentos antes direcionados para a atividade produtiva, o setor privado, podem ser realocados para o setor público, improdutivo nestes modelos, levando a produção à níveis inferiores ao ótimo.

Na solução desse problema, os governos podem verificar que o salário ótimo seja condizente com algum nível de corrupção, permitindo aos agentes com os mais baixos custos morais5 aceitar propinas ou subornos. Claramente, a presença de baixa corrupção é um ótimo inferior à inexistência de corrupção, mas, conforme argumentam os autores, tal solução ainda é melhor do que a de per-mitir ao mercado privado agir por si próprio, sem regulação, em que todos os produtores teriam um incentivo para poluir (ou explorar o bem com externali-dade negativa), bem como de eliminar toda a corrupção, o que pode ser custoso (Acemoglu e Verdier, 2000; Van Rijckeghem e Weder, 2001).

4. Chamadas de talentos pela literatura.5. Baixo custo moral diz respeito a aceitar os níveis mais baixos de subornos.

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Apesar desse resultado, as evidências empíricas de que maiores salários na esfera pública reduzem a corrupção são incertas. Em estudos de seção cru-zada internacionais, Rauch e Evans (2000) e Treisman (2000) não encontraram relação estatisticamente significativa entre salários e corrupção, enquanto Van Rijckeghem e Weder (2001) sim. De fato, como argumenta Aidt (2003), uma política anticorrupção baseada no aumento de salários obtém sucesso se houver uma terceira entidade monitorando o comportamento dos agentes, como uma auditoria, que seja honesta e efetiva. Além disso, requer-se que a renda com a corrupção não seja uma função do salário do agente e que o custo desta polí-tica seja condizente com a realidade orçamentária dos governos, condições que, segundo Aidt (2003), são pouco prováveis de serem verificadas em países com corrupção institucionalizada.

Ao continuar descrevendo os determinantes da corrupção, porém agora se voltando aos estruturais, Nas, Price e Weber (1986) caracterizam três principais fatores: i) o ambiente burocrático ou organizacional; ii) a qualidade da participação social; e iii) a congruência entre o sistema legal e as demandas sociais.

O primeiro determinante, bastante discutido na literatura, diz respeito à maior dificuldade (ou facilidade) que certas estruturas burocráticas podem exer-cer sobre os agentes econômicos, aumentando (ou diminuindo) a possibilidade de corrupção para contornar os empecilhos impostos pelo excesso de legislação.6

O segundo ponto diz respeito ao envolvimento da população em geral na vida pública. Por exemplo, se um político sabidamente corrupto se reelege, levan-tam-se questões acerca da qualidade da participação democrática e, com isso, a classe política pode se sentir menos restringida pela população e se envolverá em mais atividades corruptas. Neste sentido, Shleifer e Vishny (1993) apresentam evidências de que a participação ativa do público na política desestimula a prática de corrupção, pois introduz altos custos ao político pego executando tais práticas.

Por fim, corrupção pode acontecer sempre que há divergência entre as demandas sociais, ou de um grupo da sociedade, e o sistema legal. Um caso bastante visível deste determinante da corrupção se dá no caso de drogas ilícitas. A alta demanda para estas substâncias, vis-à-vis sua proibição por lei, aumenta a probabilidade de corrupção, ao passo que agentes públicos podem ser subornados para facilitar seu consumo.

Os determinantes estruturais da corrupção estão mais relacionados com teorias conhecidas como grabbing hands.7 Esta corrente de pensamento parte da

6. Detalha-se esse determinante a seguir.7. Algo como aperto de mão em português. Faz-se alusão ao fato de que acordos corruptos devem se basear na confiança entre as partes envolvidas.

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premissa de que todos os oficiais do governo são corruptíveis, sejam eles buro-cratas ou políticos. Com principal implicação, tais modelos, baseados na tradição da escola da escolha pública (Buchanan e Tullock, 1962), dizem que qualquer conjunto de instituições políticas pode ser altamente disfuncional e ineficiente, pois não há qualquer principal benevolente traçando mecanismos de incentivo ótimos (Aidt, 2003). A única restrição ao comportamento corrupto neste caso seriam instituições econômicas e políticas fortes.

Para ilustrar a ideia básica dos modelos grabbing hands, imagina-se um oficial do governo que regule a entrada de empresas em um setor pela emissão de licenças – baseado em De Sotto (1990) e descrito em Aidt (2003). Supõe-se uma economia de livre concorrência, de tal forma que, inicialmente, não haja qualquer necessi-dade de controle estatal da entrada de firmas no mercado. Seja b = b(λ) uma fun-ção de valor das licenças em que λ é o número de licenças emitidas. Tem-se, por suposição, que b’ = ∂b/∂λ < 0 e que b(λH) = 0, em que λH corresponde ao número de firmas que entrariam no mercado em livre concorrência.

Como o político tem poder de monopólio na emissão de licenças, ele se en-contra em uma situação tal que a extração de propinas, por exemplo, é facilitada. O político rent seeking8 pode agir maximizando a receita das propinas, denotada por B(λ) = λb(λ), emitindo tantas licenças quanto λ* =b(λ)/b’(λ), sendo tal solução obtida facilmente observando a condição de primeira ordem da maximização da receita. No equilíbrio, tem-se λ*< λH sempre que o oficial for corrupto.

Deste modo, as restrições à entrada de firmas no mercado são introduzidas com o fim de gerar propinas. A regulação é ineficiente e, ademais, ela insere ineficiência econômica ao mercado ao passo que há menos firmas do que na solução de concorrência perfeita, portanto, menor produção do que a de pleno emprego. Nesta linha de raciocínio, Ades e Di Tella (1999) encontraram evidências de que a corrupção é maior em países onde as firmas obtêm maior renda, em função de políticas de proteção da concorrência estrangeira, ou políticas anti-trustes ineficazes. Onde houvesse maior proteção, as empresas teriam lucros capazes de sustentar a propina paga aos oficiais públicos, que, por sua vez, agiriam limitando o número de licenças.

Dessa forma, medidas para reduzir a corrupção seriam aumentar a força da lei, isto é, dos mecanismos regulatórios que restringem o comportamento rent seeking ou reduzir o poder de monopólio dos governos, por exemplo, com a

8. Um agente “rent seeking” é aquele que extrai uma renda extraordinariamente alta da sociedade, em função de algum tipo poder de monopólio (seja produtivo, legislativo, ou deliberativo).

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descentralização da tomada de decisão.9 Acerca deste ponto, De Mello e Barenstein (2002), analisando uma amostra de 78 países durante os anos de 1980-1998, fornecem evidências de que a descentralização fiscal está associada a níveis mais baixos de percepção de corrupção. Porém, quando o nível de democratização política já é suficientemente descentralizado, outras medidas devem ser tomadas, todas baseadas no fortalecimento do aparato legal e institucional.

Quanto aos efeitos da corrupção, os modelos teóricos aqui discutidos condu-zem a dois entendimentos distintos. Por exemplo, para Acemoglu e Verdier (2000), é custoso banir todas as formas de corrupção. As leis são desenhadas de modo a maximizar o bem-estar social, e um equilíbrio com regulação e com certo nível de corrupção pode ser o melhor a se fazer na escolha entre falhas de mercado (explo-ração das externalidades negativas) versus falhas do governo (corrupção). Este não é único caso em que a corrupção é benéfica, outros autores vêm argumentando que em algumas situações ela pode, inclusive, favorecer o crescimento econômico.

A provocativa hipótese de que corrupção pode aumentar o crescimento foi levantada inicialmente por Leff (1964) e Leys (1965), e ficou conhecida como grease the wheels.10 Tal hipótese diz que a corrupção pode ser benéfica em um mundo em que a solução ótima de Pareto não é uma opção factível. Se as insti-tuições em um país são fracas, desencorajadoras do investimento privado, com regulamentação excessiva, por exemplo, a corrupção pode agir facilitando a circu-lação dos recursos pela economia, driblando a burocracia e aumentando, assim, o número de projetos de investimentos realizados e o crescimento econômico.

Mais tarde, Lui (1985) ofereceu uma ilustração formal deste argumento. Imagina-se um modelo em que as firmas têm que entrar em filas de espera para obter licenças de compra de certo equipamento. Ao aceitar suborno, o burocrata permite às firmas que têm maior valor de reserva, ou que imputam maior valor à licença, passarem à frente. Estas firmas podem ser ainda as que irão auferir maior lucro no futuro.

Outro estudo bastante recente, similar ao aqui realizado, deve-se a Méon e Weill (2010). Tais autores procuraram testar a hipótese de corrupção benéfica (grease the wheels) contra a maléfica para um conjunto de 54 países durante os anos de 1994-1997. Méon e Weill (2010) calcularam um índice de ineficiência técnica produtiva para os países analisados utilizando a metodologia de fronteira estocástica, para então utilizá-los como variáveis dependentes em modelos de da-dos em painel, contra a corrupção, variáveis que medem a qualidade institucional

9. O modelo apresentado, apesar de ilustrar a base do raciocínio, peca pela simplicidade. Estritamente falando, a con-clusão geral do modelo apresentado seria extinguir a emissão de licenças, ou, em outras palavras, remover o governo da economia.10. Termo que sugere algo como lubrificar as engrenagens do sistema econômico, melhorando sua operação.

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e indicadores de controle, como o grau de abertura ao comércio internacional, um índice de diversidade linguística e a latitude. Seus resultados mostram que, em geral, a corrupção se associa negativamente à eficiência produtiva dos países, o que está de acordo com o resultado clássico de Mauro (1995). Mas, ao ponde-rar para a qualidade institucional dos países, a corrupção passa a ser benéfica em 29 deles, ou seja, segundo Méon e Weill (2010), países com piores instituições podem realmente se beneficiar de um maior nível de corrupção.

Estes estudos levam a uma conclusão que vai de encontro ao senso comum, qual seja: em determinados países, onde as instituições políticas são fracas, o flo-rescimento da corrupção aumenta o crescimento econômico. Esta é a conclusão de política destas pesquisas. Contudo, conforme Aidt (2003) argumenta, mesmo que tal fenômeno encontre base na teoria e algum suporte nos dados, estudos que defendem a hipótese grease the wheels baseiam-se em uma premissa forte, eles assumem o meio institucional como dado, assim, em um contexto de fraqueza das leis e de elevada burocracia, a corrupção pode contornar tais problemas. Po-rém, o que se deve ter em mente é que a política de permissão à corrupção é uma segunda melhor opção. A política ótima, ou a primeira opção, seria remover as distorções institucionais que conduzem a tal resultado.11

Além disso, uma série de estudos vêm apontando que a corrupção deve ser sempre combatida, em função de seus efeitos danosos sobre a produção, o investimento privado e a eficiência das políticas governamentais, esta última de relevante interesse nesta pesquisa. Tal corrente de pensamento, em contraposição à anterior, é conhecida atualmente por defender a hipótese de sand the wheels,12 em alusão às dificuldades impostas pela corrupção ao crescimento de longo prazo.

Mauro (1995) talvez seja o autor com resultados mais confiáveis do ponto de vista estatístico, ainda atualmente, acerca das consequências macroeconômicas da corrupção, conforme se vê na detalhada pesquisa de Svensson (2005), que ampliou as estimativas do primeiro autor para anos mais recentes. Mauro (1995) apresenta evidências de que o aumento da corrupção em um desvio-padrão tende a reduzir o investimento privado como parcela do produto interno bruto (PIB) em 5%, e a taxa de crescimento da economia em meio ponto percentual. Isso porque, onde a corrupção é elevada, os investidores temem que uma parte de seus lucros futuros seja apropriada como subornos ou propinas, como forma de conse-guir permissões para realizar a atividade produtiva. Neste sentido, os empresários enxergam a corrupção como um imposto adicional que pode reduzir, ou mesmo desestimular, a implementação de projetos de investimento.

11. Conforme Tanzi e Davoodi (2000), a hipótese grease the wheels da corrupção é uma visão “romântica” deste fenômeno.12. A expressão significa algo como jogar terra nas engrenagens do sistema econômico, emperrando-o.

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De acordo com esse autor, a corrupção pode diminuir a eficiência das despesas governamentais, pois parte dos recursos destinados aos serviços e investimentos públicos podem ser desviados por oficiais e políticos antes de atingir seu alvo. Reinikka e Svensson (2004), por exemplo, analisando dados de Uganda em 250 escolas durante os anos de 1991-1995, encontraram evidências de que em um programa de cobertura de gastos escolares somente 13% do orçamento total che-gou ao seu destino final. Além disso, Olken (2005, 2006), analisando dados da Indonésia, verificou que 29% dos fundos para a construção de uma estrada e 18% dos recursos de um programa de subsídio para compra de arroz em regiões pobres foram roubados. Já di Tella e Schargrodsky (2003), estudando dados hospitalares da Argentina nos anos de 1990, mostraram que o preço de um conjunto básico de insumos hospitalares apresentou um preço 15% menor durante o período de repressão à corrupção, entre 1996-1997.

Em todos os casos descritos no parágrafo anterior, modelos estatísticos ou matemáticos que visassem capturar o efeito da corrupção sobre a eficiência dos gastos governamentais em termos de retornos para a população indicariam que a ineficiência do setor público iria crescer onde a corrupção fosse maior. Isto porque as cifras descritas seriam refletidas em menos serviços à população, como no caso da Uganda e da Indonésia, ou mais dinheiro seria “gasto” para comprar a mesma quantidade de insumos, como no caso argentino.13

Outra forma como a corrupção pode afetar a eficiência dos dispêndios públicos, segundo Mauro (1996), porém mais difícil de capturar em modelos econométricos, é por meio de licitações em que burocratas corruptos podem per-mitir às firmas vencedoras o uso de materiais de pior qualidade, levando a uma situação em que a qualidade do produto fique aquém da prevista no projeto. Por fim, a corrupção também tende a afetar a composição dos gastos públicos. Conforme argumenta Mauro (1996), os governos corruptos podem optar por destinar maior parcela do orçamento a funções em que a cobrança de propina e de subornos é mais fácil, como o investimento em infraestrutura, ou mesmo na aquisição de material para as forças armadas, em detrimento dos gastos com educação e saúde.

Tanzi e Davoodi (2000) chegam a conclusões similares, constatando que a corrupção tende a aumentar o investimento público, mas deteriora sua qualidade e seus retornos sociais, proporcionando, assim, maior ineficiência ao setor público.

13. Em termos da linguagem metodológica descrita na próxima seção, o cálculo do indicador de eficiência pode assumir duas orientações, produto e insumo. No primeiro caso, uma unidade ineficiente poderia aumentar a quantidade de serviço ofertado mantendo-se constante o nível de insumo; assim, como descrito acima, Uganda e Indonésia seriam ineficientes nesse sentido. Na segunda forma de computar os indicadores, uma unidade é considerada ineficiente sempre que, para um dado nível produzido, a quantidade de insumo utilizada puder ser menor, o qual é justamente o caso da Argentina.

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Além disso, gastos de custeio, como os direcionados para educação e saúde, tendem a ser negligenciados em favor de outras despesas que proporcionam maiores retornos à corrupção.

Os resultados obtidos, apesar de apresentarem evidências a favor de que corrupção reduz a parcela de gastos em educação e saúde e a eficiência dos gastos governamentais, estão longe de ser definitivos. Neste sentido, a presente pesquisa tem como justificativas o fato de adicionar subsídios à discussão existente na literatura acerca das hipóteses grease e sand the wheels, além de apresentar evidên-cias inéditas acerca do relacionamento entre a corrupção e a eficiência dos gastos governamentais com saúde e educação no Brasil.

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E MODELO DE EFICIÊNCIA

A metodologia adotada para o cálculo da eficiência comparada dos estados foi a Análise Envoltória de Dados (DEA), técnica não paramétrica, baseada na pro-gramação matemática. Para tanto, as variáveis necessárias são divididas em inputs (insumos/entradas do sistema) e outputs (produtos/saídas do sistema). A eficiência é, assim, definida como a razão da soma ponderada dos produtos pela soma pon-derada dos insumos necessários para gerá-los.

Uma fragilidade clássica do método DEA reside no fato de que, quanto maior o número de variáveis utilizadas em relação ao número de unidades produtivas, me-nor fica a capacidade de ordenação pelas eficiências, já que há tendência de muitas unidades se situarem sobre a fronteira, ou seja, obterem a máxima eficiência.

Esse problema não assumiu importância na seleção das variáveis insumos, previamente definidas como os gastos municipais per capita com educação e cultura e saúde e saneamento. Estes dispêndios são uma média deflacionada compreendendo os anos de 1997 a 2000, disponibilizados pela Secretaria do Tesouro Nacional.14 Retirou-se a média para evitar flutuações sazonais ou políticas e suavizar observa-ções discrepantes. Ademais, a escolha do período visou a padronizar a análise de acordo com a disponibilidade de dados das pesquisas censitárias brasileiras.

Entretanto, quando da seleção das variáveis que constituiriam os produ-tos do modelo, percebeu-se que esta limitação se tornou séria em razão dos inúmeros indicadores socioeconômicos e de oferta de serviços públicos existentes. Dever-se-ia, assim, esclarecer duas questões essenciais: i) quantos indicadores utilizar; e ii) quais indicadores.

Para a primeira questão, procedeu-se de acordo com as recomendações de González-Araya (2003), que sugerem um número de insumos-produtos quatro

14. Disponível em: <http://goo.gl/CISIB7>.

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a cinco vezes menor que o de unidades analisadas. Ou seja, escolheu-se trabalhar com quatro produtos que somariam seis indicadores ao total (com os dois insumos já citados), dado que são 26 os estados brasileiros.

Para a segunda questão, a Análise Fatorial (AF) orientou a escolha dos indicadores. Conforme Mingote (2005), a AF é uma técnica estatística multiva-riada que tem como objetivo explicar a estrutura de variância e covariância de um vetor de p-variáveis aleatórias por meio da construção de um número reduzido k de combinações lineares destas variáveis. Estas combinações lineares são conhecidas como fatores e são não correlacionadas entre si. Elas são construídas de modo que o primeiro fator seja aquele que tem variância máxima, o segundo, aquele com a segunda maior variância e assim sucessivamente.

A análise utilizada neste estudo foi via matriz de correlação, pela grande heterogeneidade de indicadores candidatos a constar na análise. Além disto, foram considerados apenas os autovalores maiores que um e o método rotacional Varimax com a normalização de Kaiser para a construção dos fatores.15

Empregou-se a AF da seguinte maneira: inicialmente, foram selecionados 16 indicadores de educação e de saúde, constantes na tabela A.1 do anexo. Aplicou-se a AF e, então, foram selecionados os quatro indicadores de maior peso pertencentes ao primeiro fator. Em termos práticos, estes indicadores têm o maior poder de explicação da estrutura total de variância dos dados.

A Análise Fatorial foi significativa a 1% e obteve uma adequacidade de 74%, reportando-se a um total de três fatores, sendo que o primeiro repre-sentou 62% da variância. Como pode ser visto no anexo (tabela A.3), este fator poderia ser interpretado como um índice geral de condições de saúde e educação nos estados. Os quatro indicadores a seguir foram considerados os outputs do modelo DEA calculado:

a) porcentagem de adolescentes de 15 a 17 anos que estão frequentando o ensino médio;

b) porcentagem de crianças de 7 a 14 anos alfabetizadas;

c) porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com energia elétrica e geladeira; e

d) porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com banheiro e água encanada.

Os dois indicadores de educação anteriores podem ser entendidos como medidas de qualidade do ensino nos estados. O primeiro (a), por exemplo, apesar

15. Mais detalhes em Mingoti (2005).

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de ser um indicador de frequência escolar, aproxima também a evasão na faixa etária considerada e a adequabilidade entre a idade e o nível escolar correto. Já o segundo indicador se refere à alfabetização infantil. Estas duas variáveis envolvem, assim, a educação das crianças e jovens de sete aos 17 anos de vida.

As variáveis selecionadas como indicadoras de saúde, à primeira vista, estariam mais bem classificadas como indicadoras de boas condições sanitárias. Entretanto, veja-se como ilustração o caso da posse de geladeira e energia elétrica. Estes bens proporcionam um melhor nível de saúde indiretamente aos seus proprietários, pois aumentam a vida útil dos alimentos e mantêm sua qualidade por mais tempo.16

O indicador d, por sua vez, mede condições de saúde relacionadas aos efeitos advindos da água encanada tratada e da existência de banheiro sobre o bem-estar de indivíduos. A provisão destes dois serviços pode reduzir o risco de doenças associadas a viroses e zoonoses, como a dengue e a leishmaniose visceral, e a ver-minoses, como a esquistossomose e a ascaridíase, entre outras.

O modelo de eficiência considerou, ainda, a possibilidade da ocorrência de retornos variáveis à escala, conforme sugerido por Souza Jr. e Gasparini (2006), exatamente para contemplar a diversidade de porte existente entre os estados bra-sileiros. Além disso, a suposição de retornos constantes à escala é mais adequada às análises de longo prazo, o que não é o caso deste artigo.

Em resumo, de posse dos indicadores de insumo, denotados pela matriz X2x26, e dos indicadores de produto, denotados por Y4x26, em que cada linha da matriz X representa um insumo e cada coluna uma observação similar à matriz Y, sendo que, nela, cada linha representa um produto, os escores de eficiência poderiam ser prontamente obtidos por meio da resolução do problema a seguir,

,, φλφMÁX

(1)

s.a.:0≥+− λφ Yiy

0≥− λXix1'

1 =λN0≥λ

em que N1’λ = 1 é uma restrição de convexidade e N1 é um vetor de algarismos unitários de ordem (26 x 1). Adicionalmente, para a i-ésima observação: yi é um

16. A variável percentual de pessoas que vivem em domicílios com eletricidade e geladeira pode exercer outra função benéfica no modelo de eficiência, qual seja: agir como uma proxy para o poder aquisitivo nos estados, controlando seus efeitos sobre a educação e saúde da população em cada unidade federativa.

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vetor (4 x 1) de quantidades de produto; xi é um vetor (2 x 1) de quantidades de insumo; λ é um vetor (26 x 1) de pesos que fornece os benchmarks desta unidade; e 1/φ representa a eficiência técnica variando de zero a um.

Essa abordagem forma uma superfície convexa de planos em interseção que envolve os dados de forma mais compacta do que a superfície formada pelo mo-delo com retornos constantes. Com isto, os valores obtidos para eficiência técni-ca, com a pressuposição de retornos variáveis, são maiores do que aqueles obtidos com retornos constantes (Coelli, Rao e Battese, 1988). Com a adição de restrições adicionais à equação (1), é possível verificar o tipo de retorno em que se encontra cada unidade: se constante, crescente ou decrescente à escala.17

Entretanto, o modelo da equação (1) não fornece, necessariamente, uma solução eficientemente forte no sentido de Pareto, pois ela não considera os slacks, ou seja, os excessos de gastos nos inputs e as folgas nos outputs, decorrentes do programa de programação linear (PPL) exposto.

Nem sempre é possível, para uma unidade produtiva, atingir a fronteira ape-nas com movimentos radiais e, caso isso não ocorra, pode acontecer que alguma unidade seja considerada eficiente, mesmo se estiver em um trecho vertical de al-guma isoquanta. Neste caso, é possível que a quantidade de algum input pudesse ser reduzida, sem prejuízos da produção, o que traria resultados indesejados em termos teóricos.

Para contornar tal problema, utilizou-se o modelo DEA multiestágios, que faz sucessivos movimentos radiais até que as unidades consideradas efi-cientes não possuam folga alguma em seus insumos ou produtos, apresentando resultados fortes de eficiência de Pareto. O software utilizado para esses cálculos foi o DEAP 2.1.

Cabe ponderar ainda que a metodologia adotada, DEA, pode fornecer re-sultados próximos aos do trabalho clássico de Samuelson (1954), que trata especi-ficamente de uma solução teórica para o nível eficiente de gastos governamentais, pois são consideradas eficientes as unidades de decisão (estados) que, dado o nível de recursos aplicados, conseguem maximizar os benefícios em termos de bem--estar social advindo da oferta de serviços públicos à população.

Em outras palavras, o resultado obtido por Samuelson (1954) é eficiente no sentido de Pareto, isto é, não há possibilidade de melhorar o bem-estar de uma família sem que se piore o bem-estar de outra, ou sem que se altere o nível de

17. Contudo, ressalta-se que nesta pesquisa o interesse recai sobre os escores de eficiência técnica com retornos vari-áveis. A questão da escala de operação num contexto federativo envolve aspectos mais complexos do que a utilização de recursos para a geração de produtos. Ela engloba conceitos das ciências políticas, sociológicas e até mesmo jurídicas e legislativas, não sendo de interesse, portanto, aprofundar neste tópico de pesquisa no presente artigo.

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insumos empregados (recursos públicos). Isto é similar ao resultado calculado pela metodologia DEA, em que as unidades eficientes não conseguem elevar a oferta de serviços públicos e, com isso, o benefício advindo destes serviços, a me-nos que sua dotação orçamentária seja expandida.

Todavia, a solução fornecida pelo modelo DEA pode se distanciar de duas formas daquela derivada em Samuelson (1954): primeiramente, porque ela é uma medida de eficiência relativa e não absoluta, ou seja, as unidades consideradas eficientes podem não estar efetivamente obedecendo à condição de Samuelson; e, em segundo lugar, porque seus resultados se baseiam em indicadores gerais de bem-estar social, e não no somatório das disposições individuais a pagar pelo bem público, como é requerido teoricamente. Assim, o uso da metodologia DEA no contexto das finanças públicas fornece resultados interessantes que subsidiam a formulação de políticas, mas eles podem não refletir uma solução ótima segundo a condição de Samuelson.

Por fim, são descritas as proxies para o nível de corrupção estadual, que serão associadas com a eficiência calculada previamente. Foram consideradas duas bases de dados, ambas disponibilizadas digitalmente pela organização Transparência Brasil,18 em sua seção de estatísticas. Uma delas trata de uma pesquisa de opinião realizada com cerca de duas mil pessoas em todos os esta-dos brasileiros. As respostas foram, em seguida, agregadas às regiões Norte/Centro-Oeste, Nordeste, Sudeste e Sul, tendo os entrevistados respondido às questões a seguir.

1) Nos últimos dois anos, o grau de corrupção na esfera federal aumentou, diminuiu ou continuou igual?

2) Nos últimos dois anos, o grau de corrupção na esfera estadual aumen-tou, diminuiu ou continuou igual?

3) Nos últimos dois anos, o grau de corrupção na esfera municipal aumen-tou, diminuiu ou continuou igual?

4) Nos últimos doze meses, algum funcionário público lhe pediu direta-mente uma propina para fazer algum trabalho que seria uma função normal dele?

5) Durante o ano de 2000, algum funcionário público ou intermediário ajudou-o a resolver problemas na administração municipal, estipulando como condição que você votasse em algum candidato?

18. A Transparência Brasil (TB) foi fundada em abril de 2000 e era filiada à organização Transparência Internacional. Atualmente, a TB é uma organização autônoma engajada na produção de informações e políticas úteis no combate à corrupção no país.

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225Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

6) Durante a campanha para as eleições municipais de 2000, algum candidato, diretamente ou por meio de algum cabo eleitoral, ofereceu dinheiro pelo seu voto?

7) Na sua opinião, o sistema escolar discute a questão da corrupção como deveria, ou menos do que deveria?

Selecionou-se a porcentagem de pessoas que responderam que a corrupção aumentou nos itens 1, 2, e 3; que responderam “sim” nos itens 4, 5 e 6; e que acham que a escola não trata do tema corrupção adequadamente no item 7, para criar um índice de corrupção com auxílio da análise fatorial.

Porém, apesar de o índice anterior ser interessante, ele fornece apenas quatro observações em razão das agregações. Assim, outro indicador de corrupção utilizado, desta vez em nível estadual, foi o número de matérias sobre corrupção publicadas nos principais jornais e revistas em cada Unidade Federativa do país, entre o dia 1o de setembro de 2004 e 11 de março de 2005. Com intuito de me-lhorar a qualidade desta proxy, filtraram-se as matérias publicadas nos jornais de um estado sobre a corrupção ocorrida em outros. Estes dados estão disponibilizados em Abramo (2004).

Como se observa, as variáveis utilizadas como aproximações para a corrup-ção não são isentas de imperfeições. Algumas vezes depara-se com um reduzido número de observações e, em outras, mede-se apenas aproximadamente o nível real das irregularidades cometidas no uso indevido do poder público, uma vez que se pode supor que apenas uma fração de todos os casos de corrupção chegue ao conhecimento das pessoas.

Contudo, os resultados obtidos foram satisfatórios mesmo em face dessas dificuldades, pois o interesse recaiu, primordialmente, sobre o sinal e a significân-cia dos coeficientes estimados, embora tenham sido feitas inferências acerca de impactos marginais e elasticidades ao longo da próxima seção.

4 RESULTADOS

A eficiência média estadual dos gastos com saúde e educação foi de 0,92, um nível razoavelmente bom, com 0,08 de desvio-padrão. Dos 26 estados, dez obtiveram escore máximo, isto é, 38% deles. Neste grupo, há representantes de todas as regi-ões do país, exceto do Nordeste. Em ordem alfabética, os estados com escore um foram Amapá, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e São Paulo. A porcentagem da população anexada por estes estados é de 42%, menos da metade da população total. Porém, considerando eficientes os estados com escore maior ou igual a 0,90, algo comum na literatura, esta porcentagem se eleva para 72% e passa a incluir estados da região

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Nordeste, um fato positivo. Destaca-se, contudo, que, durante o período analisado, Minas Gerais foi o único do grupo dos estados mais desenvolvidos a não conseguir o escore máximo. Os resultados encontram-se resumidos na tabela 1.

TABELA 1Resumo dos cálculos da eficiência das políticas estaduais com saúde e educação

Nome População (mil habitantes) Porcentagem da populaçãoEficiência técnica – ET

(retornos variáveis)

Acre 636 0,4 0,819

Alagoas 2.971 1,7 0,757

Amapá 535 0,3 1

Amazonas 3.016 1,7 0,844

Bahia 12.957 7,3 0,887

Ceará 8.134 4,6 0,85

Espírito Santo 3.312 1,9 1

Goiás 5.472 3,1 1

Maranhão 5.705 3,2 0,81

Mato Grosso 2.831 1,6 0,958

Mato Grosso do Sul 2.244 1,3 1

Minas Gerais 19.046 10,8 0,969

Pará 5.924 3,4 0,816

Paraíba 3.535 2,0 0,844

Paraná 10.182 5,8 1

Pernambuco 8.390 4,8 0,934

Piauí 2.970 1,7 0,788

Rio de Janeiro 14.658 8,3 1

Rio Grande do Norte 2.962 1,7 0,858

Rio Grande do Sul 10.572 6,0 0,994

Rondônia 1.454 0,8 1

Roraima 382 0,2 1

Santa Catarina 5.800 3,3 1

São Paulo 39.734 22,5 1

Sergipe 1.929 1,1 0,942

Tocantins 1.227 0,7 0,873

Média - - 0,921

Elaboração dos autores.

O lado negativo apresentado pelos resultados é que as piores administrações, definidas pelos estados que obtiveram escore inferior a 0,90, estão concentradas nas regiões Norte e, principalmente, Nordeste do país, compreendendo os estados

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227Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

de Alagoas (0,76), Piauí (0,79), Maranhão (0,81), Pará (0,82), Acre (0,82), Amazonas (0,84), Paraíba (0,84), Ceará (0,85), Rio Grande do Norte (0,86), Tocantins (0,87) e Bahia (0,89). Estes estados concentram uma parcela consi-derável da população, 28%, porcentagem que não pode ser desconsiderada na formulação de políticas.

Parece claro, com a exposição destes resultados preliminares, que há alguma relação entre a pobreza e a eficiência na provisão de serviços públicos nos estados brasileiros. A figura 1 traz a distribuição espacial dos escores de eficiência técnica no sentido de facilitar a análise. De maneira interessante, a proximidade geo-gráfica pode estar intimamente relacionada com a qualidade da administração. Visualmente, as boas práticas se concentram principalmente na metade inferior do território nacional, salvo poucas exceções, como Amapá, Rondônia e Roraima, na região Norte, e Sergipe e Pernambuco, na região Nordeste.19

FIGURA 1Distribuição espacial da eficiência técnica governamental nos setores saúde e educação no Brasil

Elaboração dos autores.

19. Mesmo que haja, ainda hoje, uma grande defasagem de renda desses estados em relação a São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, a metodologia DEA considera eficientes aqueles estados que produzem bons resultados dado o nível de recursos existentes. Assim, Amapá, Rondônia, Roraima e Pernambuco, mesmo com menor dotação orçamen-tária, têm fornecido bons serviços em comparação com seus pares.

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Passa-se, neste momento, para a análise dos indicadores de corrupção. Os primeiros dados analisados são os referentes ao questionário descrito ante-riormente, em que são analisadas sete perguntas resumidas na tabela 2. Nesta tabela, cada entrada corresponde à porcentagem de pessoas que responderam que a corrupção aumentou nas esferas federal, estadual e municipal, itens 1, 2 e 3; que recebeu pedido de propina (item 4) ou ofertas de compra de votos (itens 5 e 6); e que acham que a escola não trata do tema corrupção adequadamente, no item 7.

As três primeiras questões, 1, 2, e 3, relacionam-se com a percepção do aumento de corrupção em nível federal, estadual e municipal, respectivamente. A corrupção federal parece ter se elevado mais no nordeste do Brasil (NE), em seguida nas regiões Sul (SU), Sudeste (SE) e Norte/Centro-Oeste (N/CO). Também foi percebido um maior aumento da corrupção estadual no NE, porém, o segundo maior aumento foi, agora, no sul do país. Padrão parecido ocorreu com a corrupção ao nível municipal.

Percebe-se, assim, que a corrupção das três esferas do governo aumentou mais no Nordeste, em seguida no Sul, com o Sudeste e o Norte/Centro-Oeste intercalando a terceira e a quarta posição.

TABELA 2Médias regionais do questionário sobre corrupção(Em %)

Região Questão 1 Questão 2 Questão 3 Questão 4 Questão 5 Questão 6 Questão 7 Média(1-6)

Norte e Centro-Oeste

45 41 36 7 8 12 70 25

Nordeste 54 45 46 3 11 7 61 28

Sudeste 51 38 39 5 8 4 72 24

Sul 52 44 37 3 9 7 67 25

Média 51 42 40 5 9 8 68 -

Fonte: Portal da Transparência.Elaboração dos autores.

A cobrança direta de propina, questão 4, foge do padrão do parágrafo anterior. Ela foi maior nas regiões Norte e Centro-Oeste e Sudeste; as regiões Sul e Nordeste obtiveram a menor porcentagem neste caso. As questões 5 e 6 dizem respeito à compra de votos, mas de uma maneira diversa. A quinta pergunta mede a porcentagem de pessoas que tiveram a prestação de serviço público condicionada ao voto em algum candidato. Ela foi maior nas regiões Nordeste e Sul, porém as porcentagens também foram elevadas nas outras duas grandes regiões.

Por sua vez, a sexta questão refere-se à porcentagem de pessoas que receberam ofertas monetárias em troca de votos e, neste caso, os maiores percentuais foram observados nas regiões Norte e Centro-Oeste , Nordeste e Sul.

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229Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

Os dados indicam que um problema grave na região Sudeste vem sendo a cobrança de propina para a prestação de serviços que seriam responsabilidades nor-mais dos servidores públicos. Em geral, este problema poderia ser resolvido com o aumento de salários, pois o fato de esta região ser a mais rica pode deixar o salário relativo público/privado depreciado em comparação com as demais regiões. No Sul e no Nordeste, a principal forma de corrupção tem sido a compra de votos; e, no Norte e Centro-Oeste, a cobrança de propina e a compra direta de votos, não con-dicionadas à prestação de serviços, obtiveram as maiores porcentagens.

A figura 2 fornece um primeiro indicativo de que a corrupção tem reduzido a eficiência dos gastos nas regiões do país. Nela se relaciona o primeiro índice de corrupção gerado por uma análise fatorial que envolveu as questões 1 a 7 ante-riores. Quanto maior este indicador, representado no eixo horizontal da figura 2, tanto maior é a corrupção em uma região específica. No eixo vertical, encontra-se a eficiência média dos estados de cada grande região.

Os coeficientes estimados por mínimos quadrados ordinários entre essas duas va-riáveis são ilustrados na figura 2, com o valor da probabilidade, calculada robustamente, entre parênteses. Apesar do reduzido nível de observações, o relacionamento negativo é bastante claro, com o coeficiente angular atingindo o valor de -0,056, significativo a 10%.

A figura 2 mostra que o Sudeste apresentou o menor nível de corrupção e os melhores escores de eficiência. Situação exatamente inversa ocorre com o Nordeste, onde, em média, foram obtidos os piores valores para a corrupção. A região Norte/Centro-Oeste apresentou valores intermediários destes indica-dores; a região Sul, por sua vez, obteve resultados peculiares.

FIGURA 2Eficiência versus corrupção nas grandes regiões brasileiras

et = -0,056*corr + 0,947 (0,077) (0,001)

0,84

0,86

0,88

0,90

0,92

0,94

0,96

0,98

1,00

Nordeste

Norte/Centro-Oeste

Corrupção

SulSudeste

Efici

ênci

a

-1,5 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0 1,5

Elaboração dos autores.Obs.: et = eficiência técnica; e corr = corrupção mensurada pelo indicador gerado na análise fatorial.

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Esta última, apesar de ter escores médios de eficiência relativamente altos, foi objeto de também elevada corrupção. Poder-se-ia cogitar, com isso, que a corrupção no Sul tem servido para diminuir a morosidade da implementação de serviços ou de investimentos públicos. Entretanto, esta hipótese pode ser fa-cilmente contestada, dado que as informações indicam a compra de votos, con-juntamente com uma percepção de aumento da corrupção tanto na esfera federal como estadual como os principais problemas da região Sul. Ademais, os dados da região Sul podem estar refletindo um descontentamento da população quanto ao crescimento da corrupção em geral, já que a média de todos os indicadores de corrupção presentes na tabela 2 para essa região foi a segunda maior, atrás apenas da média da região Nordeste – a média da região Sul foi de 25,3 contra 24,8 da região Norte/Centro-Oeste.

No intuito de conseguir evidências adicionais que confirmem a análise an-terior, como mencionado, utilizou-se uma base de dados que mede o número de matérias em jornais e revistas sobre corrupção, em cada Estado, no período de setembro de 2004 a março de 2005 (tabela 3).

Como pode ser visto da tabela 3, este indicador tem algumas fraquezas. Por exemplo, Sergipe não apresentou matéria alguma sobre corrupção dentro de sua jurisdição, o que não quer dizer, porém, que este estado estivesse isento desta prática no período. Além disso, em alguns estados podem existir várias matérias cobrindo um mesmo caso. Embora isto possa ser um problema, ele pode ser con-tornado ao considerar que o elevado número de matérias representa a gravidade dos casos de corrupção em cada localidade. O principal ponto positivo deste indicador reside no fato de ele ser medido para todos os estados.

TABELA 3Segundo indicador de corrupção, número de matérias em jornais e revistas

Estado Matérias Estado Matérias

Acre 8 Paraíba 64

Alagoas 38 Paraná 7

Amapá 11 Pernambuco 6

Amazonas 18 Piauí 26

Bahia 8 Rio de Janeiro 25

Ceará 11 Rio Grande do Norte 27

Espírito Santo 7 Rio Grande do Sul 15

Goiás 6 Rondônia 14

Maranhão 17 Roraima 9

(Continua)

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231Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

Estado Matérias Estado Matérias

Mato Grosso 45 Santa Catarina 16

Mato Grosso do Sul 20 São Paulo 15

Minas Gerais 7 Sergipe 0

Pará 24 Tocantins 4

Fonte: Abramo (2004).Elaboração dos autores.

A tabela 4 fornece novas evidências entre o relacionamento negativo da efici-ência governamental na prestação de serviços de saúde e educação, com o nível de corrupção nos estados. O modelo estimado Tobit é uma variação do método de regressão linear que fornece estimativas consistentes quando existem variáveis depen-dentes limitadas. No caso da eficiência, este limite ocorre no valor “1”.20 Ademais, foram inclusas na regressão estimada duas variáveis controle, relacionadas à educação das pessoas com mais de 25 anos de idade (logaritmo da média estadual de anos de estudo das pessoas nessa faixa etária), e o logaritmo natural da renda domiciliar per capita. Procedeu-se assim para conferir maior robustez às análises estatísticas, uma vez que a presença destas variáveis expurga os efeitos que um maior nível de instrução e de renda poderia ter sobre a percepção do nível de corrupção individual.

TABELA 4Saídas do modelo Tobit para a relação entre eficiência e corrupção

Tobit regression Number of obs = 25 F( 3, 22) = 25.49 Prob > F = 0.0000Log pseudolikelihood = 15.333214 Pseudo R2 = 59.2697

------------------------------------------------------------------------------ | Robust let | Coef. Std. Err. t P>|t| [95% Conf. Interval]-------------+---------------------------------------------------------------- lcorr | -.0313713 .0174313 -1.80 0.086 -.0675216 .004779 lrpc | .2205151 .1207027 1.83 0.081 -.0298068 .4708371 ledu | .2114042 .2377897 0.89 0.384 -.2817415 .7045499 _cons | -1.705437 .3648566 -4.67 0.000 -2.462103 -.9487706-------------+---------------------------------------------------------------- /sigma | .0612249 .0119649 .0364111 .0860387------------------------------------------------------------------------------ Obs. summary: 0 left-censored observations 15 uncensored observations 10 right-censored observations at let>=0

Elaboração dos autores.Obs.: let, lcorr, ledu e lrpc representam, respectivamente, o logaritmo da eficiência técnica com retornos variáveis, do nível de

corrupção, da média de anos de estudo das pessoas com mais de 25 anos de idade e o logaritmo da renda domiciliar per capita.

20. Como a regressão foi transformada para valores em logaritmo natural, de fato, o limite superior de “1” se altera para “0”, pois ln1 = 0.

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013232

A regressão foi significativa a 1% com o pseudo-R2 alcançando o valor de 59%. O sinal da variável corrupção foi o esperado, isto é, negativo e significativo a 10%. Ressalta-se que seu valor não deve ser interpretado diretamente como o impacto marginal da corrupção sobre a eficiência, pois se trata do modelo Tobit. Desta maneira, a elasticidade eficiência/corrupção computada para o valor espe-rado incondicional da variável dependente (ln(ET)), derivada dos resultados da tabela 4, foi de -0,026 (com p-valor de 6,7%). Ou seja, um aumento de 10% na proxy de corrupção conduz a uma queda de, aproximadamente, 0,3% no escore de eficiência estadual. Assim, é possível estimar que se um estado era eficiente e observa um aumento de 10% na corrupção, ceteris paribus, isto estaria associado a uma queda de 12% na taxa de jovens entre 15 e 17 anos de idade frequentando o segundo grau e a reduções de 1% na taxa de alfabetização das crianças de 7 a 14 anos de idade, na porcentagem de pessoas vivendo em domicílios com água encanada e banheiro e com energia elétrica e geladeira.

Por sua vez, se a corrupção dobrar em um estado com escore 1, este proces-so resultaria em quedas de 37%, 4%, 17% e 15% nos mesmos indicadores, de acordo com a ordem citada no parágrafo anterior. É um custo significativo para a corrupção, que pode surgir em outros indicadores além dos utilizados nessa pesquisa, inclusive diminuindo o crescimento de longo prazo, haja vista o efeito negativo sobre o nível educacional. Apesar de serem resultados baseados em vari-áveis proxies, tais valores fornecem uma primeira estimativa do custo da corrupção no Brasil em termos de perda de bem-estar social, justificando qualquer medida que venha a inibir tais práticas ilícitas.

5 CONCLUSÕES

O presente artigo dispôs-se a avaliar a qualidade da gestão dos recursos destinados aos serviços de saúde e educação nos estados brasileiros por meio da análise envol-tória de dados, relacionando-a com o nível de corrupção.

De maneira geral, utilizando duas bases de dados diferentes, pode-se per-ceber que a corrupção estadual tem influenciado negativamente a eficiência na prestação de serviços de educação e saúde nas regiões do país, mesmo quando se olha para o nível de instrução e de renda locais. De acordo com que os dados permitiram estimar, uma elevação na proxy utilizada para a corrupção gera uma redução no escore de eficiência técnica e, em termos do impacto da corrupção sobre os indicadores sociais analisados, se a corrupção dobrasse em um estado tecnicamente eficiente, isto resultaria em considerável redução do bem-estar geral da população.

Contudo, algumas conclusões adicionais interessantes podem ser delineadas. Primeiro, existe uma grande parcela da população brasileira que vive em estados

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233Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

nos quais a qualidade da gestão destes gastos públicos pode ser consideravelmente ampliada (entre 60% e 30% da população, dependendo, respectivamente, da de-finição de eficiência utilizada, quais sejam, escore igual a um ou escore maior que 0,9). Além disto, a situação é bastante crítica nos estados situados na metade superior do território nacional, envolvendo partes das regiões Norte e, principal-mente, Nordeste, as mais pobres do país.

Em segundo lugar, medido de uma forma geral, o grau de percepção da cor-rupção aumenta conforme a seguinte ordem: Sudeste, Norte/Centro-Oeste, Sul e Nordeste (figura 2). Isto mostra que ela não é um fenômeno exclusivo das regiões mais pobres, pois a região Sul apresentou níveis de corrupção superiores aos das regiões Norte e Centro-Oeste.

Apesar do nível elevado de agregação dos dados, as evidências mostraram que a forma mais comum de corrupção no Sudeste é a cobrança de propina; no Nordeste e no Sul, a compra de votos; e, no Norte e no Centro-Oeste, a cobrança de propina e a compra direta de votos, com o oferecimento de valores monetários em troca do sufrágio.

Particularmente, no Sul, os dados indicam que o principal problema tem sido a compra de votos. Porém, a percepção do aumento da corrupção nas três esferas do governo é alta, o que indica que podem existir outras formas de desvios não cobertas pelos dados.

Por fim, cabe ressaltar que, apesar de cada região apresentar maiores inci-dências de diferentes tipos de problemas, todas as formas de corrupção estão pre-sentes nelas, com algum peso. Neste sentido, o combate generalizado à corrupção é uma forma em potencial de melhorar a gestão dos recursos públicos destinados à saúde e educação no país.

Para pesquisas futuras, sugere-se uma melhor construção de bases de dados sobre a corrupção nos estados brasileiros, isto em função da grande relevância desse assunto atualmente. Por exemplo, se as Pesquisas por Amostragem Domiciliar no Brasil (PNADs) incluíssem em seu questionário as perguntas 1 a 7 descritas anteriormente, as possibilidades de estudos aumentariam bastante.

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Originais submetidos em abril de 2012. Última versão recebida em novembro de 2012. Aprovado em novembro de 2012.

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237Evidências do Impacto da Corrupção sobre a Eficiência das Políticas de Saúde e Educação...

ANEXO

ANEXO A

TABELA A.1Indicadores utilizados na análise fatorial

Indicador Ano

Porcentagem de crianças entre 4 e 5 anos na escola 2000

Porcentagem de crianças de 5 a 6 anos na escola 2000

Porcentagem de crianças de 7 a 14 anos analfabetas 2000

Porcentagem de crianças de 7 a 14 anos que estão frequentando o curso fundamental 2000

Porcentagem de adolescentes de 15 a 17 anos analfabetas 2000

Porcentagem de adolescentes de 15 a 17 anos que estão frequentando o ensino médio 2000

Porcentagem de pessoas de 18 a 24 anos analfabetas 2000

Porcentagem de pessoas de 18 a 24 com acesso ao curso superior 2000

Porcentagem de professores do fundamental residentes com curso superior 2000

Esperança de vida ao nascer 2000

Probabilidade de sobrevivência até 60 anos 2000

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com banheiro e água encanada 2000

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com energia elétrica e geladeira 2000

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios urbanos com serviço de coleta de lixo 2000

Número de médicos residentes por mil habitantes 2000

Porcentagem de enfermeiros residentes com curso superior 2000

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

TABELA A.2Saídas da análise fatorial

ComponenteAutovalor

Porcentagem de explicação (fatores significativos rotacionados)

Total Variância (%) Cumulativo Total Variância (%) Cumulativo

1 9,99 62,45 62,45 9,94 62,12 62,12

2 2,54 15,90 78,35 2,54 15,87 78,00

3 1,14 7,14 85,49 1,20 7,49 85,49

4 0,77 4,81 90,30

5 0,48 3,01 93,31

6 0,39 2,44 95,75

7 0,30 1,85 97,60

8 0,13 0,80 98,40

9 0,09 0,55 98,95

(Continua)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013238

ComponenteAutovalor

Porcentagem de explicação (fatores significativos rotacionados)

Total Variância (%) Cumulativo Total Variância (%) Cumulativo

10 0,06 0,37 99,32

11 0,05 0,32 99,64

12 0,03 0,20 99,84

13 0,02 0,10 99,94

14 0,01 0,04 99,99

15 0,00 0,01 99,99

16 0,00 0,01 100,00

Bartlett’s Teste de Esfericidade Chi-Quadrado aproximado 683,39 Significância 0,0000

Kaiser-Meyer-Olkin medida de adequacidade amostral.

0,74

Elaboração dos autores.

TABELA A.3Cargas fatoriais das variáveis utilizadas como produtos da análise DEA

Indicador1Cargas fatoriais

1 2 3

Porcentagem de crianças entre 4 e 5 anos na escola -0,190 0,933 -0,033

Porcentagem de crianças de 5 a 6 anos na escola 0,080 0,960 -0,061

Porcentagem de crianças de 7 a 14 anos analfabetas -0,943 0,162 0,073

Porcentagem de crianças de 7 a 14 anos que estão frequentando o curso fundamental 0,770 0,431 -0,127

Porcentagem de adolescentes de 15 a 17 anos analfabetas -0,873 0,228 0,221

Porcentagem de adolescentes de 15 a 17 anos que estão frequentando o ensino médio 0,953 -0,006 -0,033

Porcentagem de pessoas de 18 a 24 anos analfabetas -0,874 0,303 0,183

Porcentagem de pessoas de 18 a 24 com acesso ao curso superior 0,910 0,147 0,202

Porcentagem de professores do fundamental residentes com curso superior 0,868 0,173 0,304

Esperança de vida ao nascer 0,896 -0,166 0,113

Probabilidade de sobrevivência até 60 anos 0,880 -0,194 0,063

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com banheiro e água encanada 0,913 0,238 0,112

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios com energia elétrica e geladeira 0,953 -0,016 0,029

Porcentagem de pessoas que vivem em domicílios urbanos com serviço de coleta de lixo 0,777 0,236 0,267

Número de médicos residentes por mil habitantes 0,690 0,389 0,305

Porcentagem de enfermeiros residentes com curso superior 0,034 -0,103 0,873

Elaboração dos autores.Nota: 1 Os indicadores destacados foram utilizados como outputs no modelo de eficiência. Método de extração: Componentes

principais. Método de rotação: Varimax com normalização de Kaiser.

(Continuação)

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GRUPOS DE INTERESSES, ELEIÇÕES E REDES POLÍTICAS NO CONGRESSO NACIONAL*Larissa Barbosa Cardoso**Geraldo Edmundo Silva Junior***

Este trabalho verifica como as relações entre deputados e senadores, considerados como agentes, interagem com os setores de atividade econômica, considerados como principais. Para tal, utilizou-se o modelo agente-principal para o caso de muitos agentes e muitos principais, associado ao método de análise de redes sociais, mais especificamente a técnica de blockmodels. Os resultados mostraram que, nos anos de 2002 e 2006, respectivamente, um padrão de similaridade foi identificado, com alterações basicamente no número de agentes. Evidenciou-se um aumento da quantidade de agentes entre os anos eleitorais em análise, o que contribuiu para a ampliação do valor das contribuições recebidas no ano de 2006. Observou-se que tal aumento tem implicações sobre a conectividade dos atores considerados, de maneira que a baixa conectividade verificada entre os setores no ano de 2006, por exemplo, respalda um maior gasto e um maior controle dos congressistas com vistas ao desenho de um mecanismo ótimo.

Palavras-chave: análise de tomada de decisões coletivas; modelos econômicos de processos políticos; eleições; legislaturas; comportamento em votações.

INTEREST GROUPS, ELECTIONS, AND POLITICAL NETWORKS IN CONGRESS

This paper examines how the relationships between deputies and senators, considered as agents, interacting with the sectors of economic activity, considered as principals. For this purpose, we used the principal-agent model for the case of many agents and many principals associated with the method of analysis of social networks, and more specifically to blockmodels techniques. The results showed that in the years 2002 and 2006, respectively, a pattern of similarity was identified, primarily with changes in the number of agents. Presented an increase of the number of agents between elections years under review, which contributed to the increase in the value of contributions received in 2006. It was observed that this increase has implications on the connectivity of the actors considered so that the low connectivity verified between sectors in 2006, for example, supports a higher spending and greater control of Congress with a view to designing an optimal mechanism.

Keywords: analysis of collective decision-making; economic models of political processes; rent-seeking; elections; legislatures; voting behavior.

* Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo suporte financeiro, e aos comentários de Evaldo Silva, Jader Cirino, Luciano Carvalho e Mércio Botelho Faria, da Universidade Federal de Viçosa (UFV). Agradecem, ainda, ao professor Nelson da Silva, da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), por comentários e sugestões à versão preliminar.** Doutoranda em Economia pelo Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGE/UFRGS). Endereço eletrônico: [email protected].*** Professor do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) – Campus de Sorocaba-SP. Endereço eletrônico: [email protected].

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GRUPOS DE INTERESES, ELECCIONES E REDES POLÍTICAS EN EL CONGRESO

Este artículo examina cómo las relaciones entre los diputados y senadores, considerados como agentes que interactúan con los sectores de la actividad económica, considerados como los principales. Para este propósito, se utilizó el modelo de agente principal para el caso de muchos agentes y principales que se asocian con el método de análisis de redes sociales, y más específicamente a las técnicas de blockmodels. Los resultados mostraron que en los años 2002 y 2006, respectivamente, un estándard de similitud fue identificado, principalmente con cambios en el número de agentes. Se presenta un aumento del número de agentes entre los años electorales que se examina, lo que contribuyó al incremento en el valor de las contribuciones recibidas en 2006. Se observó que este aumento tiene implicaciones en la conectividad de los actores considerados para que la conectividad entre los sectores bajo verificada en 2006, por ejemplo, apoya un mayor gasto y un mayor control del Congreso con el fin de diseñar un mecanismo óptimo.

Palabra clave: análisis de la toma de decisión colectiva; modelos económicos de procesos políticos; el alquiler-buscar; elecciones; legislaturas; comportamiento de votación.

GROUPES D’INTÉRÊTS, LES ÉLECTIONS ET RÉSEAUX POLITIQUES AU PARLEMENT

Cet article examine comment les relations entre les députés et les sénateurs, considérés comme des agents, en interaction avec les secteurs de l’activité économique, considérés comme majeurs. Pour ce faire, nous avons utilisé le modèle principal-agent pour le cas de nombreux agents et bon nombre des meilleure associée à la méthode d’analyse des réseaux sociaux, et plus particulièrement à  techniques. Les résultats ont montré que, dans les années 2002 et 2006, respectivement, un modèle de similitude a été identifié, principalement à des changements dans le nombre d’agents. Ont montré une augmentation du nombre d’agents entre les années d’élection à l’examen, ce qui a contribué à l’augmentation de la valeur des contributions reçues en 2006. Il a été observé que cette augmentation a des répercussions sur la connectivité des acteurs considérés afin que la faible connectivité entre les secteurs vérifiés en 2006, par exemple, ennent en charge une augmentation des dépenses et un meilleur contrôle du Congrès en vue de l’élaboration d’un mécanisme bien.

Mots-clés: analyse de la prise de décision collective; modèles économiques des processus politiques; recherche de rentes; elections; legislatures; comportement électoral.

JEL: D7, D71, D79.

1 INTRODUÇÃO

A política econômica não pode estar dissociada de decisões políticas. Deve-se, portanto, compreender o funcionamento dos fóruns políticos e, em especial, o funcionamento do Congresso Nacional, para que se possa compreender como as decisões econômicas influenciam e são influenciadas por decisões políticas.

As decisões políticas relevantes são marcadas pela integração e competi-ção das ações direta e indireta de grupos de interesses nas decisões legislativas e executivas. Tal fato tem despertado o interesse de estudiosos em diversas áreas do conhecimento, com o objetivo de compreensão da dinâmica destes grupos, de seu processo de formação, de sua atuação e da evidência de seus principais interesses.

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241Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Diversos apontamentos foram realizados por cientistas políticos, cujos prin-cipais resultados podem ser sintetizados nas revisões de Mitchel e Munger (1991), Smith (1995), Potters e Sloof (1996), Stratman (2005) e Scarow (2007).

À luz das contribuições teóricas dos economistas sobre o tema, pode-se es-tabelecer três perspectivas analíticas, a saber: a da demanda, a da oferta e a do equilíbrio geral para interesses políticos.

A primeira perspectiva, a ótica da demanda, é baseada em Olson (1965), que destacou os principais fatores que influenciam a formação de grupos. O autor identi-ficou as circunstâncias nas quais a interação entre indivíduos com interesses comuns não geraria resultados coletivamente eficientes. Tais grupos, uma vez formados, ten-deriam a empenhar-se na busca por benefícios governamentais ou rent-seeking.1

A segunda perspectiva, a ótica da oferta, por sua vez, baseia-se na possibilidade de o Estado ofertar o serviço de regulação de mercados. Com efeito, seria possível que grupos de interesse demandassem serviços por ele ofertados. Nesta perspectiva, destacam-se as contribuições do modelo de Chicago para a teoria da regulação. Outra vertente teórica que compartilha esta ideia é conhecida como a dos virginia-nos, a qual concebe que a configuração do sistema político permitiria a existência de transferências de riqueza de grupos menos organizados em favor de grupos mais organizados, gerando uma perda de bem-estar social. As políticas adotadas pelo Estado, então, promoveriam o desperdício de recursos escassos e gerariam um custo social superior aos ganhos obtidos pelos rent-seekers.

A terceira, e última, perspectiva trata do equilíbrio geral para interesses po-líticos, no qual os grupos competem entre si por benefícios. Neste contexto, os grupos de interesses buscam influenciar os formuladores de políticas oferecendo incentivos que possam influenciar o comportamento votante dos parlamenta-res. Entre estes, estão as contribuições eleitorais, que são frequentemente asso-ciadas com os resultados políticos na tentativa de tornar notória a influência dos grupos de interesse sobre os congressistas (Chappell, Junior, 1982; Grossman e Helpman, 2001; Stratmann, 2002; Hoffman, 2007).

As contribuições de campanha seriam vistas, então, como um investimento explícito para a obtenção de políticas favoráveis, uma vez que, para os políticos, tais recursos são importantes para atrair mais votos. Neste contexto, as contri-buições funcionam como uma proxy da mobilização para a ação dos grupos, de forma que, quanto maiores as doações advindas de um setor econômico, maiores as chances de o setor ser beneficiado em suas demandas. A ideia desta agenda de

1. Conforme Rowley, Tollison e Tullock (1988), as ações rent-seeking podem ser definidas como aquelas implementadas por indivíduos ou grupos de interesse e pressão, no sentido de obter, direta ou indiretamente, alguma transferência de renda de uma política pública. Este mesmo conceito é definido por Mitchell e Munger (1991) como “as atividades políticas de indivíduos e grupos que empregam recursos escassos em busca de direitos de monopólio garantidos pelo governo”.

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pesquisa, portanto, é evidenciar que a existência de relações entre grupos de inte-resses e o Estado, estimulada pelas contribuições, pode afetar de várias maneiras o sistema e os agentes econômicos. Os trabalhos de Langbein (1986) e Clawson (1990) atestam tal proposição.

No Brasil, contudo, a literatura – bem como a evidência empírica acerca do tema – são escassas. A maioria dos trabalhos existente utiliza os dados de contribuições de campanha sem relacioná-los com a formação ou a atuação de grupos de interesses. Entre estes trabalhos, destacam-se os estudos de Samuels (2001a; 2001b; 2006).

Alguns autores, como Luiz Alberto dos Santos (2008) e Figueiredo Filho (2009), se preocuparam com a existência de tais grupos, considerando o impacto da regulação sobre o seu comportamento. Mancuso (2004) destaca a atuação do setor industrial brasileiro em processos de produção legislativa e mostra que este grupo geralmente é bem-sucedido em suas demandas no campo político. No entanto, não se verificaram trabalhos que tratassem da relação entre grupos de interesses, doações de campanha e candidatos financia-dos. Sendo assim, o desenvolvimento de trabalhos que busquem tratar desta relação, que tem impactos sobre a determinação de políticas, é relevante e contribui para a compreensão do modo de atuação destes grupos no processo decisório, direta e indiretamente.

Visando à satisfação de seus interesses, esses grupos utilizam as contribuições de campanha como meio de influência sobre o comportamento dos políticos, tornando-se uma importante fonte de recursos para financiamento de campanhas eleitorais.2 A tabela 1 mostra os principais financiadores das campanhas eleitorais no Brasil em diferentes anos, com destaque para a predominância de doações de empresas para todos os cargos.

TABELA 1Fontes de contribuições para campanha por cargo pleiteado (Em %)

Ano Tipo de doador Presidente Governador Senador Deputado

1994

Empresa 96,9 85,3 51,7 61,5

Indivíduo 3,1 13,4 16,5 37,5

Partido 0,0 0,7 0,2 0,2

Desconhecido 0,0 0,6 1,7 0,5

2. A Lei no 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei Geral das Eleições), define as normas gerais da arrecadação e apli-cação de recursos nas campanhas eleitorais, tornando imprescindível a apresentação de uma prestação de contas de-talhada sobre as contribuições de campanha por cada candidato. No caso específico do financiamento de campanhas eleitorais, é importante ressaltar as resoluções do Tribunal Superior Eleitorial (TSE) no 22.205/2006, que regulamenta a Lei da Minirreforma, e no 22.250/2006, que dispõe sobre a arrecadação e a aplicação de recursos.

(Continua)

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243Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Ano Tipo de doador Presidente Governador Senador Deputado

1998

Empresa 93,7 68,7 42,6 56,8

Indivíduo 3,0 14,5 26,5 40,9

Partido 3,1 0,3 19,2 0,5

Desconhecido 0,2 16,5 11,7 1,5

2002

Empresa 78,6 45,9 64,0 57,2

Indivíduo 4,6 35,6 20,4 38,7

Partido 16,7 16,7 12,4 2,5

Outros 0,1 1,5 3,2 1,5

Desconhecido 0,0 0,3 0,0 0,1

2006

Empresa 3,4 45,4 51,0 45,9

Indivíduo 0,6 25,1 7,5 40,2

Partido 95,3 28,6 40,3 12,4

Outros 0,7 0,5 1,2 1,4

Desconhecido 0,0 0,4 0,0 0,0

Fonte: Samuels (2006).

Observa-se que as empresas são responsáveis por grande parte das doações recebidas pelos candidatos em todos os cargos, com exceção para a Presidência, no ano de 2006, em que as doações dos partidos representaram mais de 95% das doações. Este aumento significativo das contribuições dos partidos nas eleições de 2006, em parte, se justifica pelo fato de o partido de situação ter candidato à Presidência com elevada probabilidade de reeleição e tendência de manutenção da política econômica implementada nos anos de 1994-1998. Como havia a ma-nutenção de alguns interesses já contratados entre agentes e principais, a saída foi buscar recursos junto aos próprios partidos.

Para o Brasil, por exemplo, Manoel Leonardo Santos (2011) destacou que a mudança ocorrida no sistema de representação brasileiro, que, de um sistema corpo-rativista, assumiu a forma de um sistema híbrido, com um popularismo crescente. A tese confirmou a força da atuação do lobby do setor industrial, cujo destaque se atribui ao Conselho Nacional da Indústria (CNI). Para tal, o autor utilizou análise fatorial e modelo de regressão logística binária, objetivando mensurar o sucesso das proposições de interesse constantes da agenda do CNI. Em seus resultados, sugeriu que a influência individual e destacada sobre agentes do mesmo partido seria supe-rior ao resultado agregado sobre agentes de diferentes orientações.

Diante do exposto, faz-se necessário uma melhor compreensão dessa relação entre os políticos, de um lado, e os grupos de interesses, do outro. Para tanto, consideraram-se as eleições para os cargos de deputado federal e senador, uma vez

(Continuação)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013244

que seus detentores possuem poder regulatório e legislativo, e cujas decisões têm impacto em nível nacional. A partir disto, os seguintes questionamentos orienta-ram o desenvolvimento deste trabalho: como os deputados federais e os senadores podem responder às ações de grupos de interesses, representados pelos setores de atividade econômica? Qual a estruturação de blocos de agentes (deputados fede-rais e senadores) e de principais (setores)?

No âmbito das redes sociais, o objetivo geral do trabalho é, então, simu-lar os blocos formados pelos grupos identificados na Câmara e no Senado, deputados e senadores, eleitos nos pleitos de 2002 e 2006, respectivamente. Especificamente, pretende-se evidenciar a estrutura de uma rede de influ-ências entre os grupos de interesses e os agentes do Congresso Nacional. Da mesma forma, entre os senadores e os deputados eleitos, verificar os possíveis blocos que poderiam atuar como agentes dos grupos de interesses, identi-ficados a partir dos atributos – partidos políticos e regiões, cujas conexões iniciais se referem ao recebimento de contribuições de campanha. Para tal, este trabalho está dividido nas seções seguintes, além desta introdução: a seção 2 apresenta um referencial teórico sobre o grupo de interesse especial e a modelagem agente-principal e os incentivos em grupos com coalizões; a seção 3 apresenta a metodologia e a estratégia empírica adotadas; os resultados são discutidos na seção 4; e, finalmente, as considerações finais são apresentadas na última seção.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Grupos de interesse especial: economistas e cientistas políticos

As contribuições teóricas de economistas e cientistas políticos podem ser associa-das nas três perspectivas consideradas.

A ótica da demanda, baseada em Olson (1965), destacou que o processo de formação de grupos decorrente da interação entre indivíduos não geraria eficiência econômica.

Segundo Mitchell e Munger (1991), o problema de Olson (1995) era explicar como os indivíduos, ao perseguirem seus próprios interesses em um grupo, estrangulariam o sistema, restringindo o menu de possibilidades de escolha de todos.

Na literatura, o procedimento analítico usual é baseado nos conceitos de maximização da utilidade, em que o sistema político representa a base para a inte-ração entre os grupos e os agentes governamentais, e as funções de pressão política substituem as funções clássicas de demanda e oferta.

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245Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

A grande dificuldade de Olson (1965) foi, então, tratar o fenômeno do rent-seeking3 como um fenômeno puramente de demanda, deixando para o go-verno o papel decisório. Esta falha na estrutura teórica de Olson fez com que muitos teóricos analisassem o problema a partir da oferta, o que caracterizou uma segunda vertente conhecida como modelo de Chicago para a teoria de regulação.

O Estado cria, enquanto regulador, a segunda perspectiva, em que as em-presas buscam formar grupos de interesses e influenciar a regulação e seus meca-nismos. Nesta perspectiva, destacam-se as contribuições de Stigler (1971), Barro (1973), Posner (1974) e Peltzman (1976).

Stigler (1971) identificou em sua teoria que o poder regulatório do governo se destacaria como um mercado. Neste, os serviços regulatórios seriam demandados por duas forças concorrentes, e as leis gerais de oferta e demanda governariam tal mercado.

De um ponto de vista da estrutura, o autor sugeriu que o agente regulador seria capturado pelos interesses de grupos especiais, e tais grupos se oporiam aos objetivos de eficiência e equidade perseguidos pela regulação.

Com base na abordagem de Stigler (1971), Posner (1974) atribuiu como um fundamento básico para a teoria da regulação o fato de possibilitar ao governo o uso do poder coercitivo para conceder ou retirar vantagens individuais de pessoas ou grupos. Com base nesta perspectiva de alterações no padrão de preferências, Barro (1973) sugeriu que os problemas decorrentes das interações entre os agen-tes e os principais seriam solucionados pelos processos eleitorais.

Finalmente, Peltzman (1976) sugere que o mercado apresenta falhas e, portanto, o governo procuraria tanto os seus interesses quanto os interesses de seus eleitores. Com vistas à sua manutenção no poder, então, se disporia a barga-nhar contribuições de campanha por alterações no bem-estar dos seus eleitores. Logo, tal procedimento seria observado na regulação de algumas estruturas de mercado, principalmente naquelas mais concentradas.

Os virginianos, outra vertente teórica que compartilha essa ideia, configura um sistema que transfere a riqueza de grupos menos organizados em favor de grupos mais organizados, (Krueger, 1974; Buchanan, Tollison e Tullock, 1980; Tullock, 1993 e Tollison, 1997). Como argumentado por Tullock (1993), o pro-cesso de competição por renda levaria a uma dissipação desta, não tendo como contrapartida um aumento de bem-estar.

3. Define-se rent-seeking a partir das seminais contribuições de Krueger (1974), Posner (1974) e Buchanan, Tollison e Tullock (1980). Segundo Buchanan, Tollison e Tullock (1980) e Tullock (1993), o rent-seeking pode ser definido como o uso de recursos para se obter, através de um processo político, privilégios especiais, nos quais o prejuízo para os outros indivíduos é maior que o ganho para os agentes que obtêm renda. Drazen (2000) afirma que a atividade de rent-seeking é ligeiramente conectada com a atividade de lobbying, mas a ênfase não é no processo de lobbying, mas nas implicações para ampliação ou dissipação de recursos.

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Apesar de atrativa, a teoria não solucionou alguns problemas, como o de predizer quais indústrias deveriam ser reguladas, assim como não foi capaz de explicar a desregulação existente em alguns mercados.

Finalmente, a especificação de um modelo de equilíbrio geral em que in-teragem os formuladores de políticas e os grupos de interesses. Ofertas de con-tribuições de campanha, por parte dos grupos de interesses, seriam trocadas por vantagens regulatórias.

No início dos anos 1980, Becker (1983), economista da escola de Chicago, apre-sentou um modelo de competição entre grupos de interesse por influência política.

Em seu modelo, o autor estabeleceu uma aproximação entre o teorema de Coase4 e o pensamento de Stigler/Peltzman sobre a regulação dos mercados, atri-buindo um papel limitado para a ação do governo. O autor, utilizando-se do instrumental de equilíbrio geral, derivou proposições acerca do tamanho ótimo dos grupos, sobre o ganho esperado para os grupos vencedores em relação aos possíveis ganhos de um cartel perfeito. Obteve, ainda, resultados satisfatórios para o rent-seeking. Formalmente, seu modelo seria um jogo cournot-nash, tornando-se mais restrito ao se supor que o rent-seeking é conduzido como um jogo de soma 0. Tais hipóteses foram baseadas na transferência de renda entre os agentes e na si-metria de informações e similaridade da função de utilidade dos agentes.

O trabalho de Becker (1983) afirma, ainda, que o equilíbrio político depen-deria da eficiência de cada grupo em produzir pressão política. O modelo divide dois grupos: o primeiro é o de subsidiados, e o segundo é o de contribuintes.5 A generalidade do trabalho pode ser estendida para a análise de temas como a estrutura de equilíbrio de tarifas, subsídios, quotas e diversos outros favores polí-ticos, que são a preocupação da literatura de política comercial endógena.

A preocupação do autor era a de estabelecer uma função de influência po-lítica que servisse de restrição à atuação de grupos de interesse. Portanto, em seu primeiro trabalho, o autor não se preocupava com a determinação do tamanho ótimo dos grupos de pressão. Em sua versão menos formalizada, e com resultados mais amplos, Becker apresentou uma abordagem em que a capacidade dos grupos de interesse de influenciar os resultados políticos, quando eles competem pela obtenção do poder, é evidenciada pela homogeneidade dos agentes.

Hoyt e Toma (1989) aplicaram o modelo de Becker e verificaram que uma de suas implicações é que o político, em nível local, ocorreria devido a seus efeitos indiretos no resultado da distribuição dos recursos estaduais. A mesma estrutura

4. Segundo Mas-Colell, Whinston e Green (1995, p. 357, tradução nossa), “se o comércio da externalidade puder ocorrer, então, a negociação poderá levar a um resultado eficiente, não importa como os direitos de propriedade sejam alocados”. 5. A ideia baseia-se na determinação da deadweight costs, que representa as distorções no uso dos recursos públicos criadas pelas taxas e pelos subsídios, e apresenta maior efeito na competição por influência.

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foi ampliada por Kristov, Lindert e McLelland (1992), quando os autores apre-sentam uma estrutura em que os agentes são heterogêneos e se agrupam com o intuito de elevar sua influência política.

O que corrobora as hipóteses de similaridade das funções de pressão política atribuídas às abordagens de Becker (1983; 1985) foram os resultados empíricos obtidos por Kau e Rubin (1979). Os autores observaram que, durante os períodos de votação do orçamento pelos congressistas, o número de membros de um Estado no lobby daquela agremiação seria elevado. Ainda, para Nownes e Freeman (1998), as técnicas de atuação não diferem muito entre os grupos de interesse, deixando uma margem para que as funções de pressão sejam análogas.

No trabalho de Hoyt e Toma (1993), foi analisada a influência do governo esta-dual na alocação municipal dos recursos destinados à educação primária e secundária. No processo, a forma de atuação do governo estadual, em uma esfera mais elevada, acabaria influenciando as decisões municipais sobre a alocação dos recursos públicos.

A proposta de Coughlin, Muller e Murrel (1990) seria análoga à de Becker. Os autores especificaram e analisaram a competição eleitoral com grupos de in-teresse. Em seu modelo, eles examinam a correlação de forças entre os grupos de interesse e a natureza das políticas governamentais, concluindo que cada equilí-brio é Pareto ótimo.

Diante de tais estruturas, decorre dos processos políticos a base para o es-tudo da formação de grupos de interesses, destacando-se os pleitos como a fonte primária de informações sobre o tema.

Para Potters e Sloof (1996), o processo político norte-americano tem-se constituído em importante fonte de atuação de grupos de interesse. Segundo os referidos autores, desde as contribuições de Bentley e Schattshneider, a preocu-pação com o tema tem sido a da análise do impacto negativo da atuação de tais grupos no cenário político e nos indicadores econômicos e sociais.

Sendo essa a principal fonte de variáveis empíricas para a produção científi-ca, além das atividades de lobbying no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, a estrutura de atuação dos grupos fez com que Kollman (1998) caracterizasse a expansão do conflito entre os grupos como uma forma de sinalização para os po-líticos. Assim, portanto, a atuação dos grupos deveria ser dividida em duas partes distintas, o inside lobbying, que é a abordagem padrão, e o outside lobbying, que ocorre através da atuação de agentes externos ao grupo, seja ela via pressão dos sindicatos ou das organizações não governamentais.

No caso norte-americano, a simples identificação das contribuições, bem como a legislação política daquele país, faz com que o mapeamento dos grupos e a identificação dos valores contribuídos forneçam uma base estatística para trabalhos

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empíricos, em muitas áreas como a educação, a saúde, a política de comércio ex-terior e outras políticas públicas. Dixit e Londegran (1996) utilizaram um modelo bipartidário de votação da maioria para a determinação do sucesso de grupos em políticas de redistribuição, e os resultados corroboraram a premissa de que as con-tribuições acabam orientando os resultados.

Resultados empíricos favoráveis sobre o tema dependeriam do estabeleci-mento ou da identificação de relações causais entre as contribuições e os resulta-dos obtidos por grupos de interesses. Para Stratmann (2005), a justificativa para a pesquisa acadêmica depara-se com a dificuldade de se vislumbrar a relação entre causa e efeito entre as atividades financeiras, representadas pelas contribuições, e os resultados políticos, benefícios auferidos por tais grupos. Entretanto, nota-se que os grupos possuem estratégias para influenciar a derrota ou o referendo de medidas, candidatos, propaganda política, entre outros aspectos da esfera política. Os resultados obtidos pelo autor mostraram que a propaganda opositora não apresentaria vantagens sobre a propaganda propositiva.

Smith (1995) discute a regulação do financiamento de campanha, o que afeta a influência dos grupos de interesse especial. Para o autor, tanto o financia-mento público quanto a limitação das contribuições trariam distorções no debate e a exposição de incumbentes e opositores às críticas.

Finalmente, Stratmann (2010) deparou-se com a possibilidade de se limitar às contribuições dos incumbentes, inferindo que os mesmos estariam em vantagens institucionais para a elevação da arrecadação. Todavia, observou empiricamente que a limitação favoreceria os candidatos da oposição em detrimento dos incumbentes.

2.2 Uma modelagem agente-principal e incentivos em grupos com coalizões

Para se entender como os grupos de interesses formam coalizões para influenciar o processo de decisão coletiva, Laffont (2000) apresenta um modelo no qual é possível correlacionar as informações privadas de dois grupos de interesses e a formação de coalizões entre os agentes.

Inicialmente, considera-se o caso em que existe um principal e dois políticos que oferecem os insumos necessários para a realização do processo legislativo. O principal quer produzir uma quantidade do bem final, cujo insumo (bem 1) é produzido pelo agente 1. As unidades do bem 1 são, então, utilizadas pelo agente 2 para produzir uma quantidade de um bem final (bem 2).6 No con-texto deste trabalho, imagine-se, então, que o principal queira um determinado benefício advindo de uma lei, que deve ser proposta por um deputado ou senador e, em seguida, aprovada por seus demais colegas.

6. A produção de tecnologias seria de Leontief e um para um, denotadas por .

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249Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Cada agente tem informação privada sobre seu custo marginal , que pode assumir dois valores , com as respectivas probabilidades:

(1)

(2)

(3)

(4)

A variável seria a medida de correlação não negativa definida por .7 A utilidade do agente é denotada por ,

com , em que é a transferência monetária recebida do principal.

A expressão representa o bem-estar social, e denota o impacto da tributação indi-reta, cuja solução ótima, sob informação completa, é dada por:8

(5)

(6)

(7)

com .

Com informação assimétrica sobre as características da produção, o principal pode explorar a correlação de tipos para formalizar um mecanis-mo que extrai toda a renda de informação do agente e alcança o ótimo sob informação completa.

As restrições de incentivo, nesse caso, consideram que o agente prefere dizer a verdade em vez de mentir, quando antecipa que outros agentes estão dizendo a verdade. Desta forma, tais restrições para os agentes e seriam, respectivamente,

(8)

(9)

As restrições de racionalidade são dadas por

7. A análise se restringe ao caso em que .8. Conforme a notação utilizada, o índice 1 refere-se a um tipo eficiente e o índice 2, a um tipo ineficiente. Então, é o nível de produção com um agente tipo , e um agente tipo ; é a transferência recebida por um agente tipo quando o outro agente é do tipo .

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(10)

para o tipo ; e para por

(11)O problema do principal, nesse caso, é maximizar o bem-estar social esperado

sujeito às restrições de participação e de racionalidade de ambos os tipos. Ou seja,

sujeito à (8), (9), (10) e (11).

Nesse caso, o mecanismo ótimo com informação incompleta poderia ser caracterizado como:

(12)

(13)

(14)

Considerando , no formato das probabilidades obtidas quando os agentes são independentes. O que significa que os agentes obtêm uma renda de informação, que é diminuída pela redução da produção do tipo , tal que e .

Até então, apenas a existência de correlação das informações dos agen-tes foi modelada. Além dessa correlação, a possibilidade de coalizão entre os agentes também seria considerada pelo principal, que oferece um mecanismo

. Esse mecanismo mapeia as mensagens em relação às quantidades e às transferências . Se um dos agentes rejeita , todos obtêm um payoff igual a 0. Porém, se ambos aceitam, os agentes podem compartilhar ou não sua informação privada. Entretanto, aqui somente será con-siderado o caso em que eles não compartilham. Neste caso, surgiria um terceiro participante, que ofereceria um contrato de coalizão , que garantiria uma mani-pulação da informação e do tipo de transferência , que maximizaria a soma das utilidades esperadas dos agentes.9

As restrições de incentivo dos agentes seriam escritas como:

9. Para simplificar, foram utilizadas a seguintes notações: ; .

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251Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

(15)

(16)

As restrições de racionalidade individual dos agentes e seriam dadas por:

(17)

(18)

(19)

(20)

Isto é, a utilidade obtida pelo agente com o contrato deve ser maior que a utilidade esperada , que ele obteria sem cooperar.

Então, para qualquer mecanismo oferecido pelo princi-pal, o contrato resolveria o seguinte problema de maximização:

(21)

As soluções desse problema dependeriam do nível de correlação existente entre as informações privadas dos agentes. Para uma correlação baixa, o mecanis-mo ótimo oferecido pelo principal seria caracterizado por:

(22)

(23)

(24)

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E, para correlação alta, ter-se-ia o seguinte mecanismo ótimo:

(25)

(26)

(27)

Com a estrutura teórica da relação entre grupos de agentes e grupos de prin-cipais, é possível estabelecer uma metodologia empírica útil para a estimação dos resultados das contribuições e a formação de grupos.

3 METODOLOGIA: O MODELO EMPÍRICO E O TRATAMENTO DOS DADOS

O procedimento metodológico deste estudo constitui-se, basicamente, de uma análise do tipo principal-agente sobre a interação dos grupos de interesse e dos partidos políticos. São utilizadas técnicas de redes sociais, a partir da quais são obtidas as estimativas necessárias para a implementação deste modelo.

3.1 Estratégia empírica

A literatura empírica sobre o tema, em geral, apresenta resultados baseados em modelo ad hoc idealizado para a explicação de fenômenos isolados, como a vota-ção e os seus paradoxos. O procedimento de análise de redes sociais (social network analysis), contudo, permite estudar as relações entre os agentes visando entender como se comportam e como estas conexões influenciam esse comportamento.

Nesse sentido, a essência da análise de rede social encontra-se nas relações mantidas entre os elementos da rede, no padrão e na implicação das mesmas. Sendo assim, um conjunto de métodos específicos, baseados nos conceitos de teoria de grafos, probabilidade e modelos algébricos, foi desenvolvido de maneira a possibilitar a implementação desta ideia (Wasserman e Faust, 1994).

Uma rede social, então, consiste de elementos ou atores que estabelecem uma relação qualquer entre si, que, segundo Bollobás (1998), pode ser representada por um grafo, no qual os atores são denotados por pontos (vértices ou nodos) e os laços sociais, por linhas (arcos ou edges), podendo ser orientadas ou não. Por um lado, um grafo orientado representa uma rede cujas relações possuem uma direção específica que indica o sentido do relacionamento entre os atores. Por outro lado, redes em que existe simetria na relação entre os atores são representadas por um grafo não orientado.

Segundo Carrington, Scott e Wasserman (2005), um dos principais obje-tivos da análise de redes sociais é identificar estruturas fundamentais da rede, de modo que seja possível conhecer sua estrutura e facilitar a compreensão dos

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253Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

fenômenos da rede. A fim de identificar o número de agentes e de principais no modelo, bem como a definição das relações mantidas entre eles, foi utilizado o modelo de blocos. Este modelo representa uma coleção de métodos de divisão das redes de acordo com critérios bem definidos.

Os modelos de blocos, de acordo com Snijders e Nowicki (2007), repre-sentam estruturas de relacionamento entre grupos de atores, cujas interações são representadas por conexões em uma rede. Este trabalho apresenta três conjuntos de blocos de atores, a saber:

• bloco dos deputados federais eleitos nos anos de 2002 e 2006;

• bloco dos senadores eleitos nos pleitos de 2002 e 2006; e

• setores de atividade econômica que fizeram contribuições de campanha para os candidatos eleitos, com as suas relações interindustriais baseadas nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE )para as ma-trizes de relações interindustriais dos anos de 2001 e 2005, respectivamente.

Cada ator, em seu respectivo grupo, pode ser chamado de vértice. A equiva-lência estrutural dos atores é aqui tratada como aqueles que pertencem ao mesmo bloco; no caso em estudo, o bloco dos deputados, o bloco dos senadores e, ainda, o bloco dos setores de atividade econômica.

Dentro de cada bloco, tem-se, ainda, os atributos. Para o bloco dos deputados, os atributos referem-se ao partido a que estão filiados e à região que representam. Da mesma sorte, os senadores possuem os mesmos atributos dos deputados. Para o caso dos setores de atividade econômica, os dados da matriz de insumo-produto, coeficientes da matriz de Leontief, representam a estrutura inicial para que os atributos sejam identificados.

No caso dos setores, então, a equivalência de subgrupos, internos ao grupo, deverá ser identificada a partir de relações diretas e indiretas observadas nas matrizes de insumo-produto. A dificuldade de identificar os grupos de interesse é baseada na ausência de uma clara relação a priori que não sejam as relações interindustriais. Por isso, tal procedimento, segundo Nowicki e Snijders (2001), é denominado a posteriori blockmodeling. A equivalência entre os setores será obtida a partir de simulação estocástica, e o procedimento inferirá sobre a probabilidade de cada setor pertencer a um mesmo bloco.

O modelo de blocos, então, possibilitará a identificação de relações entre os vários grupos, bem como sua identificação enquanto bloco. Atributos não observá-veis serão identificados com cores diferenciadas. Os resultados básicos da simulação indicarão se dois ou mais agentes pertencem ao mesmo grupo e, ainda, sua proba-bilidade, possibilitando, assim, a identificação dos principais grupos de interesse no processo de financiamento das campanhas eleitorais dos anos de 2002 e 2006.

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As simulações são obtidas pelo processo de amostragem de Gibbs, que é uma abordagem de simulação de Monte Carlo de Cadeias de Markov. Para cada classe, três amostras independentes de Gibbs com 10 mil iterações foram executadas, sen-do que as sequências obtidas para determinada classe são replicações uma da outra; se os resultados para as diferentes são similares, isto significa que a convergência foi alcançada e, portanto, os resultados são confiáveis (Snijders e Nowick, 2007).

No procedimento utilizado neste trabalho, para cada uma das duas redes, 2002 e 2006, são estruturados três grupos (deputados, senadores e setores), seguin-do a ordem alfabética dos candidatos. O grupo de deputados foi subdividido em quatro blocos de 128 componentes, no ano de 2002, e três blocos de 128 compo-nentes e um bloco com 129 componentes, no ano de 2006, devido à limitação dos softwares de rede quanto à dimensão do número de colunas.10 Objetivou-se maxi-mizar o número de classes factíveis, visando à determinação do número máximo de agentes (deputados e senadores) e do número máximo de principais (setores).

O de classes latentes é escolhido com base em alguns indicadores, bem como a determinação das probabilidades de conexões entre tais classes. Duas estatísticas são referenciadas na literatura (Nowicki e Snijders, 2001), a saber: i) estatística de informação; e ii) estatística de concentração.

A estatística de informação é definida por:

(28)

em que: é o conjunto de pares para as quais a relação é observada; e é a probabilidade de que a relação entre os atores i e j seja de determinado tipo, dadas as classes. Esta estatística é 0 se a relação entre qualquer par de vértices é totalmente determinada pelas duas classes a que pertencem. Assim, quanto menor a estatística de informação, mais as cores informam sobre as relações entre os vértices.

Já a estatística de concentração é definida por:

(29)

em que é o número de vértices considerados; e é a matriz de probabilidades de dois vértices terem a mesma cor.

10. A adoção de tal procedimento tem implicações diretas sobre os resultados mostrados na seção 4, de modo que as relações mantidas pelos deputados são verificadas apenas para aqueles pertencentes a cada bloco. Portanto, não são capturadas as relações existentes entre todos os deputados, já que não é possível verificar as relações entre deputados pertencentes aos diferentes blocos.

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255Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

A estatística mensura a extensão a qual a distribuição representa uma partição de um conjunto de vértices em classes. Por um lado, a fórmula mostra que, quando a probabilidade é próxima de 0,9, o que sugere que o par de vértices tem a mesma cor, a estatística é próxima de 0. Por outro lado, se cada par de vértices tem uma probabilidade de 0,5 para ter a mesma cor, tende a 1, o que significa que não há realmente nenhuma estrutura de blocos, podendo cada um dos vértices pertencer a classes diferentes. Assim, quanto mais a estatística estiver próxima de 0, maior a tendência de que os vértices pertençam à mesma classe.

Nas estatísticas verificadas, são indicados os vértices excluídos e os números de relações diádicas,11 determinados conforme a estrutura a seguir: i) para uma relação simétrica, tem-se: (0,0) e (1,1); e ii) para uma relação assimétrica, (0,1) e (1,0).

Com base nas probabilidades estimadas das relações entre os blocos, defi-nem-se as possibilidades de iterações entre os blocos.

3.2 Fonte e tratamento de dados

Os dados utilizados neste trabalho foram obtidos através das prestações de contas realizadas pelos partidos para as eleições de 2002 e 2006, disponibilizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No entanto, deve-se ressaltar que a amostra estudada é composta somente das doações declaradas pelos candidatos a senador e deputado federal eleitos. Nas eleições de 2002, o montante de recursos declarados foi de mais de R$ 670 milhões; em 2006, este total ultrapassou R$ 1,5 bilhão, um crescimento de 131,7%.12

Desses, consideraram-se apenas os candidatos eleitos seguindo em confor-midade com o modelo agente-principal proposto por Laffont, descrito anterior-mente. De acordo com este modelo, os agentes eficientes – no caso em estudo, os candidatos eleitos – recebem incentivos para revelar seu verdadeiro tipo; e os agentes ineficientes, por já terem seu tipo conhecido, não necessitam de qual-quer tipo de incentivos.

Assim, com o objetivo de identificar os grupos de interesse, os doadores fo-ram classificados de acordo com sua atividade econômica e, posteriormente, agre-gados respeitando a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE),13 estabelecida pelo IBGE. Foram criados, ainda, outros dois agrupamentos, deno-minados doadores pessoais e partidos políticos/comitê. No primeiro, estão inseridas as doações recebidas de pessoas físicas e recursos próprios; no outro grupo, estão

11. As díades são a unidade básica de análise em redes sociais, e elas representam as relações entre dois indivíduos em pares.12. Uma explicação para esse incremento pode estar na resolução implementada em 2006, que contribuiu para evitar os desvios na captação e na aplicação dos recursos financeiros e, ao mesmo tempo, aumentar a confiabilidade dos dados desse ano eleitoral. 13. Para os doadores descritos como pessoa jurídica, foi utilizado o código da CNAE registrado na Receita Federal no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), como subsídio para a classificação.

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contidas as doações feitas pelos próprios partidos e aquelas recebidas de outros candidatos políticos e seus respectivos comitês financeiros.

As doações obtidas de aplicações financeiras, comercialização de bens e de origens não identificadas foram desconsideradas no estudo por não estarem asso-ciadas a nenhum grupo específico capaz de influenciar as decisões políticas.

Posteriormente, foi realizado o seguinte procedimento, com base na social network analysis: inicialmente, construiu-se uma matriz de adjacência no software Matlab, que identifica a relação entre os atores que receberam contribuições do mesmo setor. Assim, foi inserido 1 para aqueles casos em que os candidatos re-ceberam contribuição de determinado setor, e 0 para os casos em que as contri-buição não foram efetuadas. Tal estruturação permite identificar uma possível relação entre os receptores de contribuições de determinado setor, no sentido de defenderem os interesses do mesmo.

Para os senadores e os deputados, foram construídas ainda duas outras matrizes (vetor coluna), denominadas matrizes de atributos. Uma considera os partidos a que os candidatos pertencem, construída a partir de uma ordenação aleatória dos partidos asso-ciados a número. Assim, se um candidato pertence a um determinado partido, insere-se na célula da matriz o número correspondente ao seu partido. A outra matriz (vetor coluna) se refere às regiões em que os candidatos concorreram às eleições: Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste, Sul e Norte, às quais foi associado um número. Cada um destes números foi inserido na matriz quando o candidato pertencesse à região correspondente.

No caso dos setores, a matriz de atributos foi construída a partir da matriz de insumo-produto, que permitiu extrair as conexões existentes entre os setores. Considerou-se um intervalo de amplitude 0,1 para os coeficientes de cada setor, associado a um número, e cujas linhas do vetor coluna foram preenchidas pelo algarismo correspondente ao valor do coeficiente do setor identificado.

Considerando isso, estimou-se o modelo em blocos com o auxílio do software Stocknet, o que permitiu identificar o número de agentes e principais a serem con-siderados no modelo analítico exposto anteriormente.

4 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Nesta seção, são apresentados os resultados obtidos com o modelo em blocos, no qual são consideradas as frequências diádicas dos setores de atividade econômica e dos deputados e senadores eleitos, bem como as estatísticas de informação e de concentração obtidas pelo procedimento de simulação estocástica de cadeias de Markov para cada uma das classes identificadas. Com base nas informações de probabilidade de conexões obtidas, foi possível fazer inferências sobre a estrutura de redes geradas nos pleitos de 2002 e 2006.

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Os principais resultados referem-se a classes ou blocos obtidos em cada grupo, com base nos atributos considerados. Têm-se, ainda, as conexões entre as classes ou blocos gerados, que darão informações relevantes para inferências sobre a es-trutura relacional do modelo agente-principal.

A estrutura relacional dá as possíveis relações de um vértice com outro, a saber: (0,0) ausência de relações; (1,1) relações recíprocas, na qual os atores correspondem entre si; (0,1) e (1,0) relações não recíprocas, que implicam relações não retribuídas.

O número total de relações obtidas para os setores doadores foi de para ambos os anos, cuja maioria é simétrica e sem relação aparente,

como evidencia a tabela 2. Um ponto que merece ser ressaltado é a redução de 99,7% no número de relações recíprocas de 2002 para 2006. A maior parte des-tas relações entre os setores deixou de existir, o que pode indicar uma mudança de estratégia de relação entre os diversos setores e, talvez, uma preferência por agir individualmente.

TABELA 2Frequência das relações diádicas dos setores financiadores nas eleições (2002 e 2006)

0 1 0 1

0 1.628 42 1.970 45

1 42 346 45 1

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

No caso dos senadores, a tabela 3 mostra que o total de díades verificados para os 53 vértices foi de , em 2002, entre as quais a maior parte é simétrica. Destas, 776 díades possuem relação recíproca, e 522 não possuem rela-ção correspondente. Em 2006, embora o número de relações tenha se reduzido, em decorrência da diminuição do número de vértice, observa-se que a maior parte das ligações ainda é recíproca, o que sugere uma tendência dos senadores formarem coalizões entre si.

TABELA 3Frequência das relações diádicas dos senadores nas eleições (2002 e 2006)

0 1 0 1

0 522 80 106 0

1 80 776 0 245

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

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Para os deputados, a frequência das relações diádicas para os quatro blocos subdivididos inicialmente é apresentada na tabela 4. Cada bloco, composto por 128 vértices, mantém um total de 8.128 díades. Em 2002, a maior parte das relações é desprovida de correspondência em todos os blocos. Entretanto, as dí-ades bidirecionais observadas nos quatro blocos sugerem a disposição de alguns deputados de manter relações recíprocas entre si e formar alianças. Esta tendên-cia é mantida e intensificada em 2006, quando se observa que a maior parte das relações entre os deputados passa a ser recíproca em todos os blocos. Disto verifica-se, principalmente em 2006, uma tendência de reciprocidade entre os agentes (senadores e deputados). Conforme Laffont (2000), este comportamen-to é justificado pela possibilidade de obtenção de maiores benefícios diante da assimetria de informação existente.

TABELA 4Frequência das relações diádicas dos deputados federais nas eleições (2002 e 2006)

(2002)

Bloco A Bloco B Bloco C Bloco D

0 1 0 1 0 1 0 1

0 5.510 113 5.304 0 4.371 0 4.371 0

1 113 2.505 0 2.824 0 3.757 0 3.757

(2006)

Bloco A Bloco B Bloco C Bloco D

0 1 0 1 0 1 0 1

0 3.007 - 3.484 0 3.015 0 2.548 0

1 - 5.121 0 4.644 0 5.113 0 5.708

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

Dados os tipos de relações, o número de classes (grupos) foi determina-do a partir dos critérios de informação e concentração apresentados nas tabe-las 5 e 6. Pode-se observar um ganho de informação à medida que o número de grupos aumenta em ambos os anos. Para os setores, em 2002, este critério apresenta seu menor valor em seis classes, o que é confirmado pelo critério de concentração, que é mínimo nesse caso. Para 2006, os resultados são menos óbvios, com seis classes, sendo as que melhor se ajustam ponderando pelo critério de concentração. Portanto, é considerada uma estrutura com seis grupos para os setores; para os senadores, sete e oito grupos nos anos de 2002 e 2006, respectivamente.

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259Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

TABELA 5Parâmetros da estrutura de classes dos setores financiadores (2002 e 2006)

C

2002 2006

2 0,2858 0,0000 0,0991 0,3775

3 0,2307 0,0000 0,0985 0,4336

4 0,1044 0,0000 0,0982 0,4583

5 0,1044 0,0000 0,0979 0,5003

6 0,1042 0,0000 0,0980 0,4970

7 0,1044 0,0000 0,0975 0,5091

8 0,1043 0,0000 0,0974 0,5524

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

TABELA 6Parâmetros da estrutura de classes dos senadores (2002 e 2006)

C

2002 2006

2 0,5115 0,0693 0,3839 0,0092

3 0,4379 0,0571 0,3124 0,3270

4 0,4060 0,3162 0,3409 0,3866

5 0,3829 0,2637 0,2762 0,4110

6 0,3697 0,2737 0,2745 0,4295

7 0,3695 0,2718 0,2709 0,4154

8 0,3622 0,2851 0,2674 0,4031

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

Para os deputados, em cada bloco, foram identificadas oito classes de agentes bem definidas, conforme as especificações seguintes: bloco A – índice de informação de 0,5 e de concentração igual a 0,18; bloco B – índice de informa-ção de 0,75 e de concentração de 0,12; bloco C – índice de informação de 0,4 e de concentração de 0,24, aproximadamente; e, bloco D – índice de informação de 0,31 e de concentração de 0,2.

Em todos os casos, alguns vértices apresentaram probabilidade de perten-cer a dois grupos simultaneamente, o que dificulta a sua classificação; nestes ca-sos, o procedimento adotado foi desconsiderá-los a fim de se obter um melhor ajuste do modelo.14 Disto, obtiveram-se os grupos de principais e agentes com

14. Para mais detalhes, ver Snijders e Nowicki (2007).

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base nas contribuições de campanha. Em ambos os anos, os grupos formados pelos setores financiadores aparentemente não têm similitudes em suas caracte-rísticas e seus interesses. E, no caso de senadores e deputados, verificou-se que as contribuições de campanha permitem coalizões que vão além da ideologia partidária, uma vez que os vários grupos obtidos são compostos por atores com ideologias incongruentes.

A partir dos grupos formados, foram determinadas as probabilidades de relação entre os vértices do mesmo grupo e de diferentes grupos. Tais proba-bilidades são obtidas a partir da média posterior de probabilidades entre os vértices contidos nessas classes, que são apresentadas nas tabelas 7, 8, 9 e 10 para os setores, os senadores e os deputados. Para os setores, verifica-se que as probabilidades são maiores para a inexistência de relações dentro dos grupos 1 e 4. Por seu turno, os grupos 2 e 3 apresentam uma tendência de manter relações recíprocas entre si, o que sugere que as ações dos setores pertencentes a estes grupos seguem na direção de um objetivo comum, como sugerido por Olson (1965).

TABELA 7Probabilidades estimadas das relações dos setores doadores (2002 e 2006)

2002 2006

A h

(0,0)

1 0,85 0,99 0,99 0,95 0,88 1,00

2 0,99 0,01 0,99 0,02 1,00 1,00

3 0,99 0,99 0,01 0,91

4 0,95 0,02 0,91 0,51

(1,1)

1 0,14 0,00 0,00 0,02 0,01 0,00

2 0,00 0,99 0,00 0,11 0,00 0,00

3 0,00 0,00 0,98 0,03

4 0,02 0,11 0,03 0,25

(0,1)

1 0,01 0,00 0,00 0,02 0,05 0,00

2 0,00 0,00 0,00 0,02 0,00 0,00

3 0,01 0,00 0,00 0,03

4 0,02 0,84 0,03 0,12

(1,0)

1 0,01 0,00 0,01 0,02 0,05 0,00

2 0,00 0,00 0,00 0,84 0,00 0,00

3 0,00 0,00 0,00 0,03

4 0,02 0,02 0,03 0,12

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

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261Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Contudo, em 2006, essa configuração muda consideravelmente. Além da redução no número de grupos analisados, verifica-se que, em todos os agrupa-mentos, predomina a ausência de relação intragrupos, que, por consequência, implica uma menor coesão entre eles. Uma característica comum dos dois perío-dos analisados é que os grupos não mantêm relações entre si, o que pode indicar que os setores quando agrupados não se correspondem, e cada um deles traça suas estratégias de atuação sem formar coalizões.

No que se refere aos senadores, não se verifica predominância de qualquer tipo de relação intragrupo.15 Em ambos os anos, alguns agrupamentos formados apresentam uma tendência de reciprocidade entre seus integrantes, apontando para uma coesão destes grupos. Isto, por sua vez, indica que os incentivos obtidos sob a forma de contribuições de campanha são suficientes para induzir tais grupos a agirem de forma organizada. De modo oposto, os demais grupos que não se mostram coesos podem necessitar de maiores incentivos (pode-se dizer maiores volumes de contribuições) para que suas ações se tornem organizadas e articuladas.

Como ressaltado por Olson (1965), grupos coesos apresentam uma tendên-cia a ser mais influentes, pois, normalmente, são mais ativos. Neste caso, espera--se que estes grupos articulem conexões com os demais, de modo a atingirem seus objetivos. Contudo, não é o que se observa no caso dos senadores no ano de 2002, no qual predominam relações sem correspondência entre as classes. Já em 2006, tal afirmação se confirma, com alguns grupos (os grupos 1, 3 e 5) se relacionando e formando coalizões com os demais. Em suma, os senadores, re-presentantes de parcela dos agentes, são estruturados em seis classes com alguma probabilidade de reciprocidade entre si.

Finalmente, no que concerne aos deputados, as relações mantidas en-tre os vértices no interior das classes do bloco A apresentam probabilidades significativas de existir reciprocidade. Nas classes do bloco B, grande parte das relações intraclasse também é do tipo (1,1), o que garante a existência de conexão entre vértices no interior das classes. Nos blocos C e D, esta ten-dência se mantém, com os deputados das classes mantendo relações mútuas. Ou seja, na maior parte dos blocos, verifica-se a tendência de coalizão dentro das diferentes classes formadas.

Apesar disso, em 2002, verifica-se que a maioria das relações entre as classes obtidas em todos os blocos não são correspondentes, o que sugere que a intera-ção entre elas não se verifica na maioria dos casos. A exceção é o bloco A, que apresenta probabilidades significativas para as relações recíprocas. Em 2006, a predominância das relações não recíprocas se mantém, inclusive para o bloco A,

15. Algumas classes são compostas por um único vértice cada uma, o que justifica a probabilidade posterior igual a 0 para as relações intragrupo.

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demonstrando uma tendência de ação particular para cada um dos grupos. Com base nas informações geradas, análogo ao ocorrido no ano de 2002, é, então, possível esperar ausência de correlação entre a parcela de agentes identifi-cada no grupo dos deputados.

TABELA 8Probabilidades estimadas das relações dos senadores (2002 e 2006)

2002 2006

A h k=1 k=2 k=3 k=4 k=5 k=6 k=1 k=2 k=3 k=4 k=5 k=6 k=7 k=8

(0,0)

1 0,11 0,02 0,97 0,39 0,63 0,55 0,00 0,36 0,03 0,00 0,00 1,00 0,00 0,00

2 0,02 0,01 0,96 0,30 0,44 0,44 0,36 0,00 1,00 1,00 0,00 1,00 1,00 1,00

3 0,97 0,96 0,92 0,73 0,92 0,73 0,03 1,00 0,33 0,67 0,33 1,00 0,00 0,33

4 0,39 0,30 0,73 0,00 0,67 0,41 0,00 1,00 0,67 0,00 0,00 1,00 1,00 0,00

5 0,63 0,44 0,92 0,67 0,78 0,67 0,00 0,00 0,33 0,00 0,00 1,00 0,00 0,00

6 0,55 0,44 0,73 0,41 0,67 0,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00 1,00

7 0,00 1,00 0,00 1,00 0,00 1,00 0,00 0,00

8 0,00 1,00 0,33 0,00 0,00 1,00 0,00 0,00

(1,1)

1 0,78 0,94 0,01 0,19 0,28 0,05 1,00 0,64 0,97 1,00 1,00 0,00 1,00 1,00

2 0,94 0,98 0,02 0,24 0,49 0,04 0,64 0,00 0,00 0,00 1,00 0,00 0,00 0,00

3 0,01 0,02 0,04 0,09 0,03 0,09 0,97 0,00 0,67 0,33 0,67 0,00 1,00 0,67

4 0,19 0,24 0,09 0,00 0,11 0,20 1,00 0,00 0,33 0,00 1,00 0,00 0,00 1,00

5 0,28 0,49 0,03 0,11 0,15 0,11 1,00 1,00 0,67 1,00 0,00 0,00 1,00 1,00

6 0,05 0,04 0,09 0,20 0,11 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

7 1,00 0,00 1,00 0,00 1,00 0,00 0,00 1,00

8 1,00 0,00 0,67 1,00 1,00 0,00 1,00 0,00

(0,1)

1 0,06 0,02 0,01 0,05 0,05 0,36

2 0,02 0,00 0,01 0,08 0,05 0,48

3 0,01 0,01 0,02 0,09 0,03 0,09

4 0,37 0,39 0,09 0,0 0,11 0,20

5 0,04 0,02 0,03 0,11 0,04 0,11

6 0,05 0,04 0,09 0,19 0,11 0,00

(1,0)

1 0,06 0,02 0,01 0,37 0,04 0,05

2 0,02 0,00 0,01 0,39 0,02 0,04

3 0,01 0,01 0,02 0,09 0,03 0,09

4 0,05 0,08 0,09 0,0 0,11 0,19

5 0,05 0,05 0,03 0,11 0,04 0,11

6 0,36 0,48 0,09 0,20 0,11 0,00

Elaboração dos autores, com o uso do software Stochastic Network.

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263Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Em síntese, os resultados indicam o número de principais e agentes a ser considerado no modelo. Em 2002, para os principais, são seis blocos cujas proba-bilidades apontam para a existência de relações internas entre seus vértices e ten-dência de não formar coalizões entre os blocos de principais. Do mesmo modo, foram especificados sete blocos de agentes para os senadores, que apresentam as características de reciprocidade nas relações mantidas com os outros blocos iden-tificados. E, para os deputados, em cada agrupamento subdividido inicialmente, foram considerados oito blocos de agentes, cada um com características específi-cas nas relações que mantêm, totalizando 39 agentes.

TABELA 9Probabilidades estimadas das relações dos deputados: bloco A (2002)

A h

(0,0)

1 0,00 0,81 0,46 0,46 0,46 0,45 0,40 0,45

2 0,81 0,93 0,81 0,81 0,81 0,80 0,79 0,80

3 0,46 0,81 0,00 0,47 0,46 0,46 0,41 0,47

4 0,46 0,81 0,47 0,00 0,46 0,46 0,40 0,46

5 0,46 0,81 0,46 0,46 0,00 0,46 0,41 0,46

6 0,45 0,80 0,46 0,46 0,46 0,00 0,40 0,45

7 0,40 0,79 0,41 0,40 0,41 0,40 0,00 0,40

8 0,45 0,80 0,47 0,46 0,46 0,45 0,40 0,00

(1,1)

1 0,00 0,18 0,50 0,51 0,50 0,51 0,56 0,51

2 0,18 0,07 0,18 0,18 0,18 0,19 0,20 0,19

3 0,50 0,18 0,00 0,50 0,50 0,50 0,55 0,50

4 0,51 0,18 0,50 0,00 0,50 0,51 0,56 0,51

5 0,50 0,18 0,50 0,50 0,00 0,51 0,56 0,51

6 0,51 0,19 0,50 0,51 0,51 0,00 0,56 0,51

7 0,56 0,20 0,55 0,56 0,56 0,56 0,00 0,56

8 0,51 0,19 0,50 0,51 0,51 0,51 0,56 0,00

(0,1)

1 0,00 0,01 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02

2 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

3 0,02 0,01 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02

4 0,02 0,01 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02

5 0,02 0,01 0,02 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02

6 0,02 0,01 0,02 0,02 0,02 0,00 0,02 0,02

7 0,02 0,01 0,02 0,02 0,02 0,02 0,00 0,02

8 0,02 0,01 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,00

(Continua)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013264

A h

(1,0)

1 0,00 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02

2 0,01 0,00 0,01 0,01 0,01 0,01 0,01 0,01

3 0,02 0,00 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02

4 0,02 0,00 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02

5 0,02 0,00 0,02 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02

6 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02 0,00 0,02 0,02

7 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02 0,00 0,02

8 0,02 0,00 0,02 0,02 0,02 0,02 0,02 0,00

Fonte: dados da pesquisa.Elaboração dos autores.

TABELA 10Probabilidades estimadas das relações dos deputados: bloco A (2006)

A h

(0,0)

1 0,02 0,90 0,07 0,04 0,17 0,24 0,22 0,27

2 0,90 0,99 0,94 0,94 0,96 0,95 0,95 0,96

3 0,07 0,94 0,25 0,30 0,77 0,48 0,48 0,53

4 0,04 0,94 0,30 0,06 0,16 0,39 0,42 0,50

5 0,17 0,96 0,77 0,16 0,35 0,60 0,65 0,74

6 0,24 0,95 0,48 0,39 0,60 0,00 0,59 0,64

7 0,22 0,95 0,48 0,42 0,65 0,59 0,00 0,66

8 0,27 0,96 0,53 0,50 0,74 0,64 0,66 0,00

(1,1)

1 0,98 0,10 0,93 0,96 0,83 0,76 0,78 0,73

2 0,10 0,01 0,06 0,06 0,04 0,05 0,05 0,04

3 0,93 0,06 0,75 0,70 0,23 0,52 0,52 0,47

4 0,96 0,06 0,70 0,94 0,84 0,61 0,58 0,50

5 0,83 0,04 0,23 0,84 0,65 0,40 0,35 0,26

6 0,76 0,05 0,52 0,61 0,40 0,00 0,41 0,36

7 0,78 0,05 0,52 0,58 0,35 0,41 0,00 0,34

8 0,73 0,04 0,47 0,50 0,26 0,36 0,34 0,34

Fonte: dados da pesquisa.Elaboração dos autores.

Nas eleições de 2006, foram identificados quarenta agrupamentos de agen-tes e seis de principais, sendo que, neste último, as relações existentes apresentam uma tendência de não interação. Tal característica corrobora a independência entre os principais, análoga ao ocorrido no ano de 2002. Os senadores, por sua vez, apresentam um grau elevado de interação entre as classes de agentes iden-tificadas, quando aproximadamente 70% das relações diádicas são recíprocas.

(Continuação)

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265Grupos de Interesses, Eleições e Redes Políticas no Congresso Nacional

Para os deputados eleitos, os resultados básicos foram de ausência de conexão entre as classes, muito embora os resultados apontem para a formação de relações intragrupos recíprocas.

As características das estruturas de rede obtidas para os anos de 2002 e 2006 estão fortemente ligadas aos interesses comuns existentes entre um grupo de deputados e um grupo de setores, que, por isso, se encontram conectados entre si. Ademais, o processo de rent-seeking, em função do tamanho dos recur-sos disponibilizados, cria um mercado com um custo temporário (contribuição dos setores) e uma receita contínua durante o tempo de governo (mandato do deputado ou senador).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A influência de grupos de interesse no cenário político é um tema que desperta o in-teresse de diversas áreas do conhecimento, dada a possibilidade de intervenção desses grupos nas decisões políticas e suas consequências para a sociedade. Sabe-se que, no cenário político, as relações são importantes e facilitam o alcance de diversos objetivos. Neste sentido, a proposta deste trabalho foi examinar como os grupos de interesses, bem como os formuladores de política, alinham-se no espaço político tendo como base as contribuições de campanha eleitoral.

Inicialmente, o conjunto de evidências mostrou um aumento significativo das contribuições de campanha nas eleições brasileiras entre os anos eleitorais analisados. Observou-se que os doadores são principalmente pessoas jurídicas, com destaque para os setores regulados, e uma elevação das doações dos par-tidos políticos, cujos impactos são verificados sobre a conectividade entre os agentes ou principais.

Os achados empíricos mostraram que a formação de blocos de agentes e principais segue um modelo com múltiplos agentes e principais. A estrutura final obtida aponta para os principais desagregados em seis blocos em 2002, que se mantiveram na eleição seguinte; os agentes, por sua vez, somaram 39 e quarenta blocos em 2002 e 2006, respectivamente. Tais resultados corroboram aqueles su-geridos por Grossman e Helpman (2001). É importante ressaltar que o aumento identificado no número de agentes explica a grande elevação nos gastos com as contribuições de campanha, dado que cada principal proverá incentivos para o agente adicional, a fim de induzir a sua participação.

Também constatou-se que, entre os principais, as relações foram predomi-nantemente não recíprocas, o que implica a formação de grupos pouco coesos e com baixa reciprocidade entre si. Tais evidências sugerem, por um lado, um aumento da pressão por interesses exercidos sobre os agentes através da estraté-gia individual, num esquema não cooperativo. Conclui-se, portanto, que a baixa

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013266

conectividade entre os setores respalda um maior gasto e um maior controle dos congressistas, com vistas ao desenho de um mecanismo ótimo.

Por outro lado, para os agentes, verificou-se uma maior reciprocidade intra-blocos, apontando para a formação de grupos coesos e, consequentemente, mais ativos. No caso dos agentes, em que o poder seria mais diluído e a aprovação de matérias dependeria de um esforço coalizacional entre os grupos, as evidências mostraram que os senadores tendem a formar coalizões e articulações políticas entre as diversas classes, em contraposto ao que foi observado para os deputados. Assim, as redes de relações para os senadores são mais expandidas, enquanto para os deputados se concentram entre os participantes de cada classe sem quaisquer extrapolações. A despeito disso, foi observado um aumento da conexão entre os grupos, para senadores e deputados, que pode ser resultado de um dispêndio maior de recursos, a fim de obter o mecanismo ótimo em que o controle dos agentes seja factível a partir da identificação das probabilidades elevadas.

Além disso, as conexões e a correlação entre os grupos de agentes ou de principais, representadas pela probabilidade posterior identificada, mostram que, quanto maior a probabilidade, maior o domínio do principal sobre os agentes. Com probabilidades baixas, a correlação também seria baixa, e um mecanismo ótimo seria oferecido pelo principal. No caso dos senadores, um alto grau de correlação seria esperado. Para os deputados, alguma correlação pode ser obtida, pelas probabilidades posteriores dos blocos A, B, C e D, indicando, portanto, uma correlação alta entre os grupos dentro de cada bloco e, assim, uma provável correlação alta.

Ainda que de forma modesta, este trabalho buscou fornecer elementos adi-cionais na discussão sobre grupos de interesse e influência política. Embora os resultados possibilitem a estruturação de um modelo de interação estratégica com múltiplos agentes e múltiplos principais, a dinâmica da relação entre eles dependeria da atuação dos agentes na Câmara Federal e no Senado Federal. Assim, estudos adicionais que considerem o trâmite dos processos legislativos e a identificação dos benefícios deles exauridos devem ser realizados, a fim de complementar e aprofundar as questões aqui investigadas.

REFERÊNCIAS

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ESTRUTURA ECONÔMICA E ENCADEAMENTOS SETORIAIS DE MINAS GERAIS: UMA CONTRIBUIÇÃO PARA AS POLÍTICAS DE PLANEJAMENTO Luiz Carlos Santana Ribeiro*Rosa Livia Gonçalves Montenegro**Roberto Maximiano Pereira***

O objetivo deste artigo é construir a matriz de insumo-produto de Minas Gerais (MIP), ano base 2009, a partir de um método biproporcional (RAS) modificado, de forma que possam ser oferecidas informações e indicações analíticas para subsidiar as políticas de planejamento do Estado. Todas as ferramentas utilizadas neste trabalho permitirão auxiliar e contribuir para o fortalecimento dos setores produtivos em Minas Gerais. Em suma, os resultados identificaram alguns setores importantes para o dinamismo da economia mineira, são eles: alimentos e bebidas; têxteis; produtos químicos diversos; artigos de borracha e plástico; e siderurgia e metalurgia. Além disso, observou-se que tais setores estão relacionados às indústrias tradicionalmente relevantes na economia mineira e, portanto, implicam a integração e na complementaridade de políticas públicas em prol do desenvolvimento de Minas Gerais.

Palavras-chave: matriz de insumo-produto; estrutura produtiva; Minas Gerais.

ECONOMIC STRUCTURE AND SECTOR THREADS OF MINAS GERAIS: A CONTRIBUTION TO PLANNING POLICIES

The aim of this paper is to construct the Input-Output Matrix of Minas Gerais, base year 2009, from a modified bi-proportional method (RAS), so that may be offered information to support planning policies of the state. All tools used in this study will assist and even contribute to the strengthening of the productive industries of the State of Minas Gerais. In summary, the results identified some areas as being important for the dynamism of the State economy, such as: Food and Beverages, Textiles, Chemicals miscellaneous, Rubber and Plastic and Steel and Metallurgy. Furthermore, we observed that these sectors are related to traditional industries in the relevant state economy and therefore implies the integration and complementarity of public policies for development of Minas Gerais.

Keywords: input-output matrix; production structure; Minas Gerais.

ESTRUCTURA ECONÓMICA Y ENCADENAMIENTO SECTORIAL DE MINAS GERAIS: UNA CONTRIBUCIÓN A LAS POLÍTICAS DE PLANIFICACIÓN

El objetivo de este trabajo es la construcción de la Matriz Insumo-Producto de Minas Gerais, el año base 2009, a partir de un método bi-proporcional (RAS) modificada, por lo que se puede ofrecer

* Doutorando em Economia no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar/UFMG). E-mail: [email protected].** Doutoranda em Economia no Cedeplar/UFMG. E-mail: [email protected].*** Mestre em Economia pelo Curso de Mestrado em Economia da Universidade Federal da Bahia (CME/UFBA). E-mail: [email protected].

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información y asesoramiento para apoyar las políticas de análisis de planificación del Estado. Todas las herramientas que se utilizan en este documento va a ayudar y contribuir al fortalecimiento de los sectores productivos de la minera estatal. En resumen, los resultados identificaron algunos sectores como importantes para el dinamismo de la economía del Estado, que son: alimentos y bebidas, textiles, productos químicos de caucho y diversos artículos de plástico y de acero y Metalurgia. Por otra parte, se observó que esos sectores relacionados con las industrias tradicionalmente importantes en la economía de la minería y por lo tanto implica la integración y complementariedad de las políticas para el desarrollo de Minas Gerais.

Palabras clave: matriz insumo-producto; estructura productiva; Minas Gerais.

STRUCTURE ÉCONOMIQUE ET ENCHAÎNEMENT DES SÉCTEURS D’ACTIVITÉ DES MINAS GERAIS: UNE CONTRIBUTION AUX POLITIQUES DE PLANIFICATION

Le but de cet article est de construire la matrice entrées-sorties de Minas Gerais (MIP), 2009 année de base, à partir d’une méthode bi-proportionnelle (RAS) modifié de sorte qu’ils puissent être offerts information et de conseil pour soutenir les politiques d’analyse planification de l’État. Tous les outils utilisés dans le présent document aidera et même contribuer au renforcement des secteurs productifs de l’état de mineur. En bref, les résultats identifiés dans certains secteurs comme importants pour le dynamisme de l’économie de l’État, ils sont les suivants: aliments et boissons, textiles, produits chimiques divers articles en caoutchouc et en plastique et de l’acier et de la métallurgie. En outre, il a été observé que ces secteurs sont liés à des secteurs traditionnellement concernés dans l’économie minière et implique donc l’intégration et la complémentarité des politiques pour le développement de Minas Gerais.

Mots-clés: matrice d’entrées-sorties; structure productive; Minas Gerais.

JEL: C67; R58.

1 INTRODUÇÃO

A literatura internacional apresenta diversos argumentos para relacionar as políti-cas de planejamento urbano com a estrutura econômica e o desenvolvimento de determinada região. Para Harvey (1975), a estrutura urbana, uma vez criada, afeta o desenvolvimento futuro nas relações sociais e na organização da produção. De acordo com Magalhães (2008), a história econômica de uma região é intrínseca à produção do espaço urbano, de maneira que sua análise torna-se necessária. Outros autores, sob um ponto de vista diferente da estrutura urbana, também oferecem destaque à diversidade e aos condicionantes do processo de desenvolvimento regional.

A diversificação na estrutura produtiva mineira iniciou-se nos anos 1970, influenciada pelos efeitos de transbordamento da indústria paulista, pela infraes-trutura preexistente e pela presença das indústrias de base sólida, de instituições, de centros de pesquisa, de um mercado de trabalho em crescimento com mão de obra relativamente qualificada, entre outros fatores. A diversificação industrial foi formada em conjunto com o setor siderúrgico e de máquinas e equipamentos, sendo liderada pela indústria automobilística. Desta forma, é possível observar que

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

o complexo mínero-metal-mecânico constituído em Minas Gerais foi resultado de um dinamismo industrial preexistente com a participação de setores estratégicos (Simões et al., 2010).

Nesse sentido, avaliar as características produtivas da economia mineira e suas relações intersetoriais para o ano de 2009 permitirá observar como as estruturas de produção se comportam dentro de um setor específico e também identificará setores--chave relevantes na composição econômica do Estado. Esta análise configura-se como ponto de partida na implementação de recomendações de políticas públicas relevantes ao planejamento e fortalecimento da economia mineira.

O objetivo deste artigo é construir a matriz de insumo-produto (MIP) de Minas Gerais, ano base 2009, a partir de um método biproporcional (RAS) mo-dificado, de forma que possam ser oferecidas informações e indicações analíticas que sirvam de subsídios para as políticas de planejamento do Estado. Apesar da existência da MIP de Minas Gerais, elaborada pela Fundação João Pinheiro para o ano de 2005, optou-se por estimar uma MIP mais recente, referente ao ano de 2009. Sabe-se, contudo, que a crise financeira internacional 2008/2009 pode gerar questionamentos sobre a construção desta matriz para o referido ano. Entretanto, a ideia do artigo é construir uma MIP mais atual, cujo conjunto de dados mais recentes para a estimação, no período de elaboração deste trabalho, refere-se ao ano de 2009.

A vantagem desta MIP em relação à já existente é que esta retrata uma estru-tura de produção (coeficientes técnicos) referente ao ano base mais recente, 2009. Por conseguinte, a desvantagem é que a MIP de 2005 apresenta uma estrutura completa de insumo-produto – estrutura de produção, valor adicionado e demanda final –, ao passo que a estimada no presente artigo remete apenas às relações inter-setoriais. Apesar disto, a metodologia apresentada é suficiente para a construção dos índices, das análises e das proposições de políticas sugeridas ao final do trabalho. Vale salientar que a MIP estimada não tem a pretensão de estudar as desigualdades internas do estado, assim como, não busca uma ferramenta para diminuir estas desigualdades, mas, sim, revela sua interdependência setorial.

O trabalho estrutura-se em cinco seções, além desta introdução. Na segunda seção são destacados alguns dados conjunturais importantes sobre a economia mineira e justificativa para sua análise regional. Na terceira seção é detalhada a metodologia que tornou possível a construção da MIP de Minas Gerais. A quarta seção apresenta e explica os indicadores estruturais utilizados no presente traba-lho, seguida pela quinta seção, reservada aos resultados e discussões. Por fim, são tecidas as considerações finais e as recomendações de políticas públicas para o estado de Minas Gerais.

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2 CONJUNTURA ECONÔMICA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

A justificativa para o recorte territorial de Minas Gerais fundamenta-se tanto pela relevância do estado no cenário brasileiro como na sua importância econômica intraestadual. Em termos de indicadores vinculados à atividade industrial, Minas Gerais, em 2009, reuniu 10,02% do valor agregado da indústria brasileira e 10,16% do pessoal ocupado total (IBGE, 2009c). Ademais, o estado possui a capacidade de atrair novos investimentos, além da presença de grandes grupos nacionais, de setores modernos e de instituições financeiras, que explicam sua atividade setorial bastante diversificada.

Nesse caso, observa-se grande heterogeneidade em diversos estágios de seu desenvolvimento. A expansão industrial que ocorreu nos últimos anos não atin-giu completamente o estado, e identificou-se uma tendência da concentração da produção em áreas mais desenvolvidas espacialmente. Esta observação ratificou a aglomeração preexistente e acentuou a disparidade econômica observada em algumas regiões mineiras (Silva, 1997; Figueiredo e Diniz, 2000).

A Região Metropolitana do Vale do Aço (Ipatinga, Coronel Fabriciano, Timóteo e Santana do Paraíso), por exemplo, apresentou elevado crescimento entre as décadas de 1970 e 1980. Tal resultado pode ser decorrente das expansões de duas grandes usinas siderúrgicas presentes na região, a Usiminas (Ipatinga) e Acesita (Timóteo), o que produziu efeitos diretos e indiretos nas demais atividades da região. É importante destacar que, no referido período, a atividade siderúrgica foi bastante incentivada, não somente no âmbito nacional, como também, no es-tadual, particularmente em decorrência do II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND). O crescimento acelerado das duas siderúrgicas atraiu outras empresas para a região, principalmente as que tinham por finalidade a produção de bens intermediários ou insumos que eram produzidos no local, com vantagens sobre a infraestrutura preexistente (Costa, 1996).

A região da Zona da Mata, por sua vez, importante polo de crescimento mineiro, com destaque para o município de Juiz de Fora, obteve êxito em virtude da especia-lização em bens intermediários vinculados às reservas minerais da região central do estado. Como consequência, houve uma estreita relação entre as duas regiões, devido à vinculação indústria e matéria-prima, provocando uma dispersão locacional nos setores de metalurgia e minerais não metálicos (Figueiredo e Diniz, 2000).

Nas atividades das indústrias de transformação, de acordo com o estudo rea-lizado pelo IBGE (2011), no ano de 2008, os estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Bahia e Amazonas concentraram 87% do valor adicionado bruto destas atividades e, em 2009, obtive-ram acréscimo de apenas 0,3%. Tal resultado foi influenciado principalmente pela crise mundial ocorrida na época e também pelo baixo desempenho dos estados, em termos reais.

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

No âmbito do setor de serviços, que obteve a maior participação entre os setores produtivos no produto interno bruto (PIB) mineiro no ano de 2009 (tabela 1), segundo a Pesquisa Anual de Serviços (IBGE, 2009d), o referido setor detinha 20,40% das empresas em relação ao Sudeste e gerou uma receita bruta de aproximadamente R$ 65 bilhões. Estes resultados comprovaram que o setor de serviços, principalmente os não financeiros, contribuiu para o bom desempenho da economia mineira.

É importante ressaltar que, conforme Bastos, Perobelli e Souza (2008), existe uma relação entre os setores industriais e de serviços na região Sudeste, o que evidencia a interdependência no crescimento de ambos setores. O estado de Minas Gerais pode ser caracterizado como possuidor de uma estrutura setorial mais diversificada, principalmente pela intensa atividade econômica tanto do setor de serviços quanto da indústria (Bastos, Perobelli e Souza, 2008).

Nesse sentido, em 2009, a composição da riqueza gerada em Minas Gerais foi distribuída da seguinte forma: agropecuária (7,93%), indústria (26,41%) e serviços (53,57%). O PIB do mesmo período foi de aproximadamente R$ 287 bilhões, o valor bruto da produção (VBP) estava na ordem de R$ 494,8 bilhões, o que significa que o PIB correspondia a 58% do VBP. O consumo intermediário (CI) girava na ordem de R$ 242,5 bilhões e os impostos, líquidos de subsídios, sobre produtos respondiam por, aproximadamente, R$ 34,7 bilhões.

A tabela 1 indica a partição do PIB mineiro entre os setores de atividades econômicas. O PIB é formado pelo valor adicionado (VA) mais os impostos, líquidos e subsídios, sobre produtos. Em Minas Gerais, o setor que tem o maior percentual dentro do PIB é a indústria de transformação, com 17,76%. O setor de administração, saúde e educação públicas e seguridade social fica em segundo lugar com 14,19%, seguido pelo de comércio e serviços de manutenção e reparação, que correspondeu a 8,63% do PIB.

TABELA 1 Participação dos setores produtivos no PIB de Minas Gerais (2009)

Setores de atividades Valor (%)

Agropecuária 25.840,89 9,00

Agricultura, silvicultura e exploração florestal 17.084,65 5,95

Pecuária e pesca 8.756,25 3,05

Indústria 86.257,75 30,05

Indústria extrativa 8.171,40 2,85

Indústria de transformação 50.967,86 17,76

Construção civil 16.880,72 5,88

Produção e distribuição de eletricidade, gás, água, esgoto e limpeza urbana 10.237,77 3,57

(Continua)

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013276

Setores de atividades Valor (%)

Serviços 174.956,35 60,95

Comércio e serviços de manutenção e reparação 35.243,51 12,28

Serviços de alojamento e alimentação 5.331,23 1,86

Transportes, armazenagem e correio 14.594,17 5,08

Serviços de informação 7.162,09 2,50

Intermediação financeira, seguros e prev. complementar e serviços relacionados 15.190,77 5,29

Serviços prestados às famílias e associativas 6.405,86 2,23

Serviços prestados às empresas 11.848,90 4,13

Atividades imobiliárias e aluguéis 26.437,44 9,21

Administração, saúde e educação públicas e seguridade social 40.727,30 14,19

Saúde e educação mercantis 7.416,81 2,58

Serviços domésticos 4.598,28 1,60

Total 287.055,00 100,00

Fonte: Sistema de Contas Regionais para o ano de 2009 (IBGE, 2011).Elaboração dos autores.

Em 2009, o estado de Minas Gerais obteve uma participação de 8,9% em relação ao PIB brasileiro, sendo o terceiro estado no ranking nacional, seguido por São Paulo e Rio de Janeiro, respectivamente. Entretanto, no período entre os anos de 2008 e 2009, observou-se uma variação negativa de 4% em seu PIB. Este resultado pode ser decorrente, em particular, da inserção de outras regiões brasileiras e aumento da competitividade mundial, que possuem maior sensibili-dade justamente com a demanda por commodities minerais. No mesmo período, o setor agropecuário exibiu resultados negativos (-1,1%). O efeito negativo foi influenciado, em particular, pelo desempenho do cultivo do café, cuja queda na produção foi de 15,6%. O valor exportado do produto (em dólares) também diminuiu (-3,2%). Todavia, apesar da queda da participação nas exportações, o café em Minas Gerais representou 14,8% do volume de bens totais exportados, no ano de 2009 (IBGE, 2011).

A atividade industrial, diferentemente dos resultados observados em 2010, foi o setor mais afetado pela contração econômica experimentada pelo país no ano de 2009. Entre as atividades industriais mais abaladas, estão aquelas relacionadas à indústria extrativa (-23,6%) e à indústria de transformação (-16,1%), com intensa diminuição da produção e, por consequência, foi registrado um declínio do volume do valor adicionado bruto. A extração de minério, por exemplo, apresentou uma queda significativa de 25% no volume de produção no ano de 2009 em relação a 2008. No segmento da indústria de transformação, a fabricação de aço e derivados obteve uma redução de 30,9% em sua produção, além da queda de 32,9% na fa-bricação de produtos de metal. Os efeitos negativos para ambas as atividades, que foram as mais impactadas no setor, podem ser explicados pela queda na demanda de insumos industriais e de bens de capital (IBGE, 2011).

(Continuação)

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

Já no setor de serviços, observou-se uma variação positiva de 1% em 2009 e houve um aumento de participação de 2,6 pontos percentuais (p.p.) na economia mineira. Vale destacar que, entre os serviços mais utilizados como insumos da produção de bens, houve retração em todo o valor adicionado bruto nos seguintes setores: transporte, armazenagem e correio (-5,9%); serviços de informação (-7,2%); e serviços prestados às empresas (-2,3%). No entanto, os serviços ligados às atividades de intermediação financeira, seguros e previdência privada complementar e serviços relacionados, apresentaram um crescimento de 2,6% em relação ao ano de 2008.

A seguir, será apresentada a metodologia de construção da MIP para Minas Gerais, a qual representa uma tentativa de modelagem para avaliar a estrutura de interdependência setorial mineira. A ideia da utilização da MIP é simular uma contabilidade das relações setoriais e, além disso, captar quais os principais setores que fomentam o crescimento econômico e regional do estado.

3 A MATRIZ DE INSUMO-PRODUTO DA ECONOMIA MINEIRA

O modelo econômico proposto por Leontief (1966) possibilita a construção de MIPs pelas quais é possível retratar as mais diversas relações entre setores de uma determinada economia, o que contribui para o planejamento econômico dos governos em suas diversas esferas (Miller e Blair, 2009). Em resumo, a técnica de insumo-produto é um modelo linear de produção em que o sistema econômico é representado de maneira simplificada por meio de quadros de fluxos intersetoriais de bens e serviços, permitindo a demonstração de diferentes inter-relações indus-triais (Prado, 1981). Esta estrutura visa atender ao consumo intermediário entre indústrias e à demanda final da economia (Stone, 1962).

De certa forma, a técnica que é aqui apresentada possui limitações e hipóteses. Os modelos de insumo-produto são versões mais simples de modelos de equilíbrio geral computável (Hilgemberg e Guilhoto, 2006) que adotam retornos constantes de escala, assumem implicitamente oferta perfeitamente elástica e admitem que os coeficientes técnicos são invariáveis ao longo do tempo. Isto significa dizer que não são considerados quaisquer efeitos em termos de mudanças de preços ou avanços tecnológicos, ao passo que mudanças projetadas derivam de alterações exógenas na demanda (Miller e Blair, 2009). Entretanto, mesmo com estas limitações apresen-tadas, a técnica de insumo-produto é de suma importância para o planejamento de políticas setoriais e, principalmente, para o desenvolvimento regional, pois oferece mecanismos de análise para alocação eficiente de recursos econômicos em áreas pouco desenvolvidas. Neste sentido, coloca-se em evidência a importância das relações estruturais da economia, as quais devem receber a atenção devida dos policy makers (Prado, 1981).

Diante disso, com o passar do tempo, os economistas foram aprimorando a técnica de insumo-produto, com objetivo de tornar os modelos mais próximos

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da realidade, de forma que pudessem oferecer respostas coerentes sobre as diversas estruturas econômicas nacionais e regionais. No que tange à metodologia de cons-trução de matrizes regionais, recomenda-se, pela literatura internacional, a adoção de métodos não censitários (non-survey). Entre estes métodos indiretos, um dos mais indicados é o método biproporcional, conhecido como RAS, descrito por Stone (1962) e Bacharach (1970) para estimação de matrizes regionais. Isto porque metodologias que exigem dados censitários (survey) são de difícil aplicação, além de a obtenção dos dados ser de elevado custo.

Além do método biproporcional, outras técnicas merecem ser revisadas. A hipótese de coeficientes fixos é a mais simples e direta e considera que os coeficientes técnicos da matriz tecnológica (A) permanecem constantes em um curto espaço de tempo, em média de 2 a 5 anos. A ideia por trás desta hipótese é a de retornos constantes de escala em todos os setores, e como se tratam de valores monetários, as eventuais mudanças em preços relativos não alteram a demanda por bens intermediários, o que deixa visível a fragilidade de adequação dessa metodologia à realidade econômica (Silveira, 1993).

Abandonando a hipótese de coeficientes fixos, os primeiros estudos empíricos para obtenção de matrizes regionais referem-se aos trabalhos de Isard e Kuenne (1953) e Miller (1957), em que se procura estimar características de economias regionais por meio de um processo de ajustamento da matriz nacional de coefi-cientes técnicos, utilizando estimativas de porcentagens de oferta para cada setor da região estudada. Arrow e Hoffenberg (1959) utilizaram técnicas econométricas sofisticadas de estimações a partir de um conjunto de variáveis explicativas para construir matrizes regionais.

Atualmente, no Brasil, entre as técnicas desenvolvidas para regionalização de matrizes de coeficientes técnicos, destacam-se o método do quociente locacional (QL) e o método RAS. O primeiro método, geralmente utilizado em conjunto com outro método para ajuste, foi utilizado inicialmente por Haddad e Hewings (1998). A metodologia consiste basicamente em estimar quocientes locacionais que medem a concentração de cada setor na região analisada em relação à concen-tração na economia nacional (Crocomo e Guilhoto, 1998). O principal problema deste método é que considera a hipótese de que as tecnologias setoriais regionais e nacionais são as mesmas, ou seja, utilizam as mesmas receitas de produção, o que na realidade não ocorre.

Visto que não existem dados disponíveis em escala sobre o comércio entre as Unidades Federativas (UFs), qualquer tentativa de se construir um modelo inter-regional terá apenas um desfecho teórico, pois este método exige um nível detalhado e concreto das transações comerciais de quem compra e de quem vende (Isard, 1951). Após alguns ensaios com os vários métodos, optou-se pela adoção

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do método RAS1 de extrapolação de matrizes biproporcionais, escolhido pela sua aderência à realidade empírica, e que apresentou vantagens de aferição e precisão sobre os demais. Vale ressaltar que o RAS2 apresentado aqui tem uma modificação metodológica apresentada por Silveira (1993) para projeção de MIPs na ausência de dados sobre a produção intermediária.

Esse método não considera que as matrizes regionais mantenham suas mesmas estruturas temporalmente, nem que possuam a mesma tecnologia das matrizes nacionais – além de ter apresentado resultados bastante satisfatórios nos testes empíricos aplicados. Os passos dispostos a seguir explicitam o processo de confecção das MIPs para Minas Gerais a partir das MIPs-Brasil.

O processo de extrapolação inicia-se com a matriz de alocação dos insumos aos setores (Qqs), da qual são obtidos os vetores-soma das linhas e das colunas, de forma que:

(1)

(2)

Para a utilização do método RAS é necessária a obtenção de vetores de consumo intermediário e produção intermediária para as regiões consideradas nas mesmas agregações da matriz de coeficientes técnicos para o Brasil. Diante da ausência de recentes tabelas de recursos e usos (TRUs) estaduais, com os dados coletados para Minas Gerais, foram construídos os dois vetores contendo os valores da produção total setorial (qMG) e do consumo intermediário setorial (cMG).

O vetor correspondente aos valores da produção intermediária (mMG) não são coletados pelos órgãos estatísticos oficiais a esse nível de desagregação. Deste modo, para a construção deste vetor, adotou-se como pressuposto inicial uma hipótese temporária. Apesar da estrutura tecnológica de Minas Gerais diferir da estrutura brasileira, produziu-se uma matriz de alocação dos insumos dos setores provisória para o estado (Qqs

MG*) a partir do seguinte processo multiplicativo de matrizes:

(3)

Da matriz QqsMG* é obtido um vetor provisório de produção intermediária

setorial, tal que:

1. O presente artigo não desenvolverá a metodologia do RAS tradicional, a qual pode ser encontrada formalmente em Bacharach (1970). 2. A principal diferença é que a variante metodológica adotada neste estuda utiliza a matriz (Qq) em vez da Matriz Tecnológica (A), isto é, a matriz A expressa em valores monetários.

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(4)

Uma vez que se conhece o total das transações intermediárias realizadas em Minas Gerais em 2009, um novo vetor de produção intermediária setorial é obtido, sendo este considerado a melhor aproximação da realidade da economia estadual em 2009 (mMG). Cada componente do vetor mMG é alcançado por meio do seguinte cálculo:

(5)

(6)

Objetivando-se alcançar a matriz de alocação dos insumos aos setores para Minas Gerais em 2009 (Qqs

MG), inicia-se o processo multiplicativo seguindo os passos descritos abaixo:

1o passo: ; sendo cada (7)

2o passo: ; sendo cada (8)

3o passo: ; sendo cada (9)

4o passo: ; sendo cada (10)

O processo de multiplicação prossegue até Qn não diferir significativamente de Qn-1, considerando Qn como a melhor aproximação de Qqs

MG. Finalmente, a matriz tecnológica, ou de coeficientes técnicos de Minas Gerais (AMG) é obtida multiplicando-se Qqs

MG pelo vetor qMG diagonalizado invertido:

(11)

Sendo que , para e , exibem o valor do conjunto de produtos do setor nacional i diretamente adquiridos para a produção

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de uma unidade monetária de produtos do setor estadual j. Após a confecção da matriz tecnológica regional por meio da variante do RAS, é possível realizar análises estruturais e elaborar o “diagrama de autossuficiência”, índices de encadeamentos e multiplicadores de impacto. Para tanto, é necessário construir a matriz inversa de Leontief, a qual mostra os efeitos intersetoriais diretos e indiretos no sistema econômico, como segue:

(12)

Sendo, , em que e .

em que bij = valor dos produtos adquiridos, direta ou indiretamente, do setor i, para a produção de uma unidade monetária do setor j.

A matriz de insumo-produto construída para o estado de Minas Gerais é uma matriz híbrida em que nas colunas encontram-se os insumos nacionalmente distribuídos e nas linhas a produção estadual por setor de atividade econômica.

4 INDICADORES ESTRUTURAIS3

As matrizes de insumo-produto possuem diversas informações que são utilizadas como parâmetros para a tomada de decisões mediante análise da estrutura produ-tiva, dos encadeamentos produtivos entre as atividades e dos seus setores-chave, além dos multiplicadores de produção, de emprego e de renda.

4.1 Diagrama de autossuficiência

A matriz Q “quadrada” permite organizar um quadro em que seja contabilizada a “autossuficiência” produtiva dos setores da região de acordo com a demanda inter-mediária dos demais setores no espaço econômico estudado. Este arcabouço permite que se visualizem as condições de oferta de insumos e as estratégias de incentivos intersetoriais (Ribeiro e Leite, 2012). Sua formulação se dá pela diferença entre o VBP e a demanda intermediária (DI) local, uma espécie de consumo aparente, como é demonstrada pela seguinte expressão:

. Em que, com (13)

O saldo será deficitário (negativo), caso a demanda dos setores j por insumos do setor i seja maior que a produção do setor i. Neste caso, há um estímulo para

3. Maior aprofundamento das análises estruturais encontra-se em: Kurz, Dietzenbacher e Lager.(1998); Lahr e Dietzenbacher (2001) e Hewings, Sonis e Boyce (2002).

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que esse setor seja incentivado (estratégia de localização). Caso contrário, sendo o saldo superavitário (positivo), revela o que o setor produz internamente mais o que é necessário para os demais setores e, portanto, supre o resto da nação e/ou resto do mundo. Tal caracterização não significa, caso o setor seja deficitário ou superavitário, que os negócios sejam realizados apenas entre os setores da região estudada. Assim, o quadro só estabelece uma visão sintética da atual situação produtiva e extrai indicativos de futuros investimentos para atender o mercado local.

Segundo Ribeiro e Leite (2012), este quadro procura indicar a capacidade produtiva da região para atender a demanda por insumos necessários à produção dos diversos setores produtivos na própria região. Superficialmente, isto represen-taria o grau de dependência externa (resto do país e resto do mundo) da UF em desenvolver suas atividades produtivas internamente. Portanto, essas informações são úteis para orientar as políticas públicas de planejamento e as decisões estraté-gicas do setor privado.

4.2 Indicadores de encadeamento e setores-chave da economia

A identificação dos setores-chave de uma determinada estrutura produtiva é de suma importância para a adoção e implementação de estratégias de planejamento. Para tanto, é necessária a definição dos índices de ligação interindustriais, com objetivo de estabelecer quais setores têm forte poder de encadeamento. A seguir, são apresentadas três técnicas a serem utilizadas neste trabalho, no intuito de mensurar e comparar a importância dos setores de atividade econômica, a saber: índices de ligação de Hirschman-Rasmussen (HR), índices puros de ligações e campo de influência.

4.2.1 Índices de ligação de HR

Os coeficientes inspirados por Rasmussen (1956) e aplicados por Hirschman (1958), medem o poder de dispersão dos encadeamentos a montante, ou para trás, e o índice de sensibilidade de dispersão dos encadeamentos a jusante, ou para frente. O coeficiente de ligação de Hirschman-Rasmussen (HR) mostra a relação da média dos impactos do setor com a média total da economia e, matematicamente, pode ser escrito da seguinte forma:

(14)

Em que Uoj é o coeficiente de ligação de HR para trás, ou a montante; Boj é

um vetor linha, , o qual soma os valores das linhas da matriz inversa

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de Leontief (B) ao longo de suas colunas, mostrando quanto é demandado por cada setor em seus encadeamentos para trás.

(15)

sendo que Uio é o coeficiente de ligação de HR para frente, ou a jusante; Bio é um vetor coluna, , que soma os valores das colunas da matriz inversa

de Leontief (B) ao longo de suas linhas, mostrando o quanto é ofertado por cada setor em seus encadeamentos para a frente. Como é uma relação entre as médias, os coeficientes de ligação de HR podem ser classificados como aqueles que estão acima da média e os que estão abaixo da média total; portanto, podem ser analisados por meio de um valor limite que, usualmente, é estipulado em 1 (Prado, 1981).

De acordo com Miller e Blair (2009), os setores podem ser classificados em quatro tipos, a depender dos resultados dos índices: i) independentes de (ou pouco relacionados a) outros setores, caso ambos os índices de ligação sejam inferiores a 1; ii) dependentes de (ou fortemente relacionados a) outros setores, caso ambos os índices de ligação sejam superiores a 1, o que também denota setores-chave para o crescimento da economia; iii) dependentes da oferta interindustrial, se apenas o índice de ligação para trás for maior do que 1; e iv) dependentes da demanda interindustrial, se apenas o índice de ligação para frente for superior a 1. Existem na literatura duas formas para a identificação de setores-chave: a restri-ta e a irrestrita. Contudo, aqui se adota o conceito restrito, isto é, se ambos os valores forem maiores que 1, então é considerado setor-chave, visto que provoca um efeito de encadeamento de compra e venda acima da média na economia (McGilvray, 1977).

Embora os índices de HR sejam amplamente utilizados para a identificação de setores-chave, eles têm recebido críticas na literatura, por não considerarem a influência dos diferentes níveis de produção em cada setor da economia. No intuito de suprir essa deficiência metodológica, são apresentados os índices puros de ligações, também denominado GHS, desenvolvido por Guilhoto, Sonis e Hewings (1996; 2005).

4.2.2 Índices puros de ligação

Esta técnica resulta de uma série de decomposições da matriz inversa de Leontief. Tais índices são denominados PBL (pure backward linkage) e PFL (pure forward

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linkage) que, de forma resumida, são expressos pelas equações 16 e 17.4

(16)

(17)

O PBL indica o impacto do valor da produção total do setor j sobre o resto da economia, livre da demanda de insumos que o setor j produz para ele mesmo e dos retornos do resto da economia para o setor j e vice-versa. O PFL, por sua vez, aponta para o impacto do valor da produção total do resto da economia sobre o setor j. Pode-se, ainda, obter o índice puro total das ligações (PTL) por meio da soma do PBL e do PFL, uma vez que são expressos em valores correntes:

(18)

Os índices de ligação puros normalizados consideram o peso de cada setor como demandante ou ofertante na economia e o seu respectivo tamanho relati-vo, permitindo, assim, analisar a importância do setor. Nestes índices, é possível observar o impacto puro de um setor sobre o resto da economia e, devido à norma-lização, pode-se fazer uma análise comparativa com os índices de HR apresentados. O PBLN considera o setor como demandante, ou seja, avalia o setor na economia. O PFLN analisa o setor como ofertante, logo, analisa como a economia depende desse referido setor.

4.2.3 Campo de influência

No intuito de complementar a análise dos índices de ligação e na tentativa de iden-tificar os principais elos que podem provocar maiores impactos sobre a economia mineira, é apresentada também a abordagem do campo de influência desenvolvida por Sonis e Hewings (1989; 1994), pela qual é possível visualizar os setores que mais influenciam, a partir de suas relações intersetoriais, o restante da economia.

Para se calcular o campo de influência, é necessária a utilização da matriz de coeficientes técnicos (A), de uma matriz de variações incrementais nos coeficientes diretos de insumos (E) e da matriz inversa de Leontief - .

Para avaliar o impacto dessas variações em cada um dos elementos da matriz A, deverá ocorrer uma pequena variação5 , em cada isoladamente, ou seja, é uma matriz , tal que:

4. Para um tratamento mais formal, ver Guilhoto, Sonis e Hewings (2005).5. Adotou-se um

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

(19)

Neste caso, uma variação de magnitude nos Coeficientes da matriz resulta em uma nova matriz de coeficientes técnicos: . Assim, a matriz inversa de Leontief pode ser reescrita como: .

O campo de influência de cada coeficiente é aproximadamente igual a:

(20)

Desta forma, a influência total de cada coeficiente técnico, ou de cada elo da matriz insumo-produto, é dada por:

(21)

Portanto, quando maior for , maior é o campo de influência do coeficiente sobre a cadeia produtiva.

4.3 Multiplicadores de impacto

A possibilidade de se fazerem análises estruturais e de se medirem os impactos das variações na demanda final sobre algumas variáveis do sistema econômico torna estes indicadores complementares e indispensáveis à elaboração de estratégias de crescimento e desenvolvimento.

Por intermédio da matriz inversa de Leontief (B), é possível projetar os im-pactos setoriais diretos, indiretos e totais com base em variações nos componentes de demanda final. Assim, podem ser obtidos alguns multiplicadores importantes como de produto, emprego e renda, além de outros indicadores que não serão abordados no presente artigo. Sendo assim, o multiplicador de produto, , principal indutor ao crescimento econômico, indica quanto determinado setor j pode gerar de produção em todos os setores da economia, de acordo com a alte-ração de uma unidade monetária da demanda final total, em relação à produção do setor j. Sua definição é dada como:

(22)

em que bij são os elementos da matriz inversa de Leontief.

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O multiplicador de emprego, , indica a variação ocorrida no nível de emprego no setor j devido a uma variação unitária na demanda final. É definido pela seguinte expressão:

(23)

sendo que é o coeficiente de emprego por unidade monetária produ-

zida, isto é, representa a razão entre o total de empregados, , e o valor bruto da

produção no setor i, .

De maneira análoga, o multiplicador de renda, , é obtido mediante a razão do valor adicionado, VAi, e do valor bruto da produção no setor i, , isto é:

(24)

tendo, .

Portanto, enquanto o critério do multiplicador de produto é de caráter quan-titativo, ou seja, tido como principal indicador de crescimento, os multiplicadores de emprego e de renda são os principais indutores ao desenvolvimento econômico, configurando-se, assim, em termos qualitativos para a economia (Ribeiro e Leite, 2012). Os multiplicadores utilizados no presente trabalho se restringem à demanda de insumos intermediários, isto é, a renda e o consumo das famílias são exógenos ao sistema, por isso, os multiplicadores apresentados aqui são chamados do tipo I (Guilhoto et al., 2010).

4.4 Dados

Os dados que tornaram possível a construção das MIPs para a economia mineira em 2009 referem-se às TRUs do Brasil (IBGE, 2009a), contas regionais de Minas Gerais (IBGE, 2009b) e à Pesquisa Industrial Anual (IBGE, 2009c), que possi-bilitaram abrir as proporções industriais (tanto na indústria extrativa, quanto na indústria de transformação), permitindo estimar a matriz estadual com 38 setores de atividade econômica.

Para a análise dos multiplicadores de impacto foram utilizados também o Sistema de Contas Regionais e a Pesquisa Industrial Anual (PIA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além do Relatório Anual de Informações

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Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego – Rais/MTE (Brasil, 2009). Como se trata de bases de dados de órgãos diferentes, foi feita a compatibilização do Setor CNAE 2.0 da Rais para o código do Sistema de Contas Nacionais do IBGE por meio de tradutores com correspondências de setores disponíveis na Comissão Nacional de Classificação (Concla/IBGE).6

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

O indicador de autossuficiência, que busca medir a questão do abastecimento se-torial, revela que a economia mineira ainda apresenta deficiência em alguns setores importantes do seu sistema produtivo, conforme mostra a tabela 2. Do total dos 38 setores analisados, doze apresentaram resultados deficitários, em sua maioria, na indústria de transformação. O maior índice negativo foi do setor 14 (refino de petróleo, coque e álcool), seguido pelo setor 15 (produtos químicos diversos), o que significa que tais setores, aparentemente, não apresentam produção suficiente para atender a todos os setores da economia mineira.

TABELA 2 A “autossuficiência” de Minas Gerais (2009) (Em R$ milhões)

Setores de atividade econômica Produção total Demanda intermediária Superávit/déficit

1 Agricultura, silvicultura e exploração florestal 21.515,66 12.179,58 9.336,08

2 Pecuária e pesca 13.005,89 7.502,75 5.503,15

3 Petróleo e gás natural 57,03 4.269,30 -4.212,27

4 Extração de minerais metálicos 16.490,19 3.274,52 13.215,67

5 Outros da indústria extrativa 1.295,52 5.484,93 -4.189,41

6 Alimentos e bebidas 36.150,73 16.645,05 19.505,68

7 Produtos do fumo 1.587,20 94,46 1.492,74

8 Têxteis 3.019,44 2.549,24 470,20

9 Artigos do vestuário e acessórios 1.926,73 388,46 1.538,27

10 Artefatos de couro e calçados 1.304,75 366,10 938,65

11 Produtos de madeira – exclusive móveis 866,84 1.614,49 -747,65

12 Celulose e produtos de papel 2.338,50 2.526,70 -188,20

13 Jornais, revistas, discos 820,10 2.761,13 -1.941,03

14 Refino de petróleo, coque e álcool 8.852,55 15.456,27 -6.603,73

15 Produtos químicos diversos 9.378,98 15.620,03 -6.241,05

16 Produtos farmacêuticos 1.704,36 1.688,41 15,95

17 Artigos de borracha e plástico 3.655,53 7.535,49 -3.879,95

18 Cimento e outros produtos de minerais não metálicos 7.579,63 7.472,46 107,17

19 Siderurgia e metalurgia 32.520,12 12.749,87 19.770,25

20 Produtos de metal – exclusive máquinas e equipamentos 6.195,61 6.466,10 -270,50

21 Máquinas e equipamentos, inclusive manutenção e reparos 2.566,50 4.140,09 -1.573,59

6. Disponível em: <http://www.cnae.ibge.gov.br/estrutura.asp?TabelaBusca=CNAE_201@CNAE-SUBCLASSES%202.1>. Acesso em: 20 abr. 2012.

(Continua)

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Setores de atividade econômica Produção total Demanda intermediária Superávit/déficit

22 Eletrodomésticos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos 3.290,68 4.266,72 -976,04

23 Eletrônico, de comunicação e aparelhos médico-hospitalares 6.360,31 3.412,18 2.948,13

24 Indústria automotiva 32.743,09 13.431,87 19.311,22

25 Outros equipamentos de transporte 397,06 452,05 -54,99

26 Móveis e produtos das indústrias diversas 3.447,13 1.448,82 1.998,31

27 Serviços industriais de utilidade pública (SIUP) 15.875,10 13.239,96 2.635,14

28 Construção civil 29.351,26 3.485,62 25.865,64

29 Comércio e serviços de manutenção e reparação 43.480,39 3.334,98 40.145,40

30 Transportes, armazenagem e correio 24.623,11 13.333,65 11.289,47

31 Serviços de informação 14.461,25 13.377,06 1.084,19

32 Financeiro 20.658,32 16.924,83 3.733,49

33 Imobiliário 24.952,26 3.687,81 21.264,45

34 Alojamento e alimentação 10.148,76 2.203,80 7.944,96

35 Serviços às empresas 15.739,04 16.151,39 -412,34

36 Saúde e educação mercantis 11.048,27 471,04 10.577,23

37 Serviços às famílias e doméstico 14.755,17 1.442,08 13.313,09

38 Administração pública, saúde e educação públicas 50.712,25 1.085,80 49.626,45

Fonte: matriz de insumo-produto. Elaboração dos autores.

Os demais setores deficitários (petróleo e gás natural; outros da indústria extrativa; produtos de madeira – exclusive móveis; celulose e produtos de papel; jornais, revistas e discos; artigos de borracha e plástico; produtos de metal – exclusive máquinas e equipamentos; máquinas e equipamentos; eletrodomésticos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos; outros equipamentos de transporte; e serviços às empresas) também merecem atenção, revelando a não maturação de atividades importantes do sistema produtivo de Minas Gerais, o que impede avanços maiores nos estágios de desenvolvimento econômico do estado. Esta análise aponta setores que podem ser alvo das políticas de incentivos, no intuito de promover um crescimento econômico equilibrado. Além disto, ainda permite a alocação de investimentos de forma mais eficiente por parte do setor privado, não só espacialmente, mas também setorialmente.

Não obstante, outra interpretação que a análise de insumo-produto propor-ciona ao pesquisador é a identificação dos setores-chave de um determinado sistema produtivo. A tabela 3 apresenta os resultados dos índices de ligação de HR e dos índices puros. Os indicadores de ligação de HR mostram o quanto os setores são capazes de alavancar a produção, seja demandando ou ofertando insumo. Neste sentido, a partir da análise dos índices de ligação de HR, seis atividades econômi-cas foram classificadas como setores-chave da economia mineira em 2009, isto é, apresentaram ambos os índices acima de 1, são elas: alimentos e bebidas; têxteis; produtos químicos diversos; artigos de borracha e plástico; siderurgia e metalurgia; e produtos de metal – exclusive máquinas e equipamentos.

(Continuação)

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

TABELA 3 Índices de ligação (2009)

Setores de atividade econômicaFrente

Índices de HR Índices puros

Frente Trás PFL PBL PTL

1 Agricultura, silvicultura e exploração florestal 1,555 0,743 1,996 1,071 1,53

2 Pecuária e pesca 0,746 0,825 1,177 0,773 0,973

3 Petróleo e gás natural 1,353 0,934 0,819 -0,796 0,007

4 Extração de minerais metálicos 0,570 0,975 0,364 2,806 1,592

5 Outros da indústria extrativa 0,873 1,067 1,046 -1,030 0,002

6 Alimentos e bebidas 1,315 1,086 1,738 4,016 2,884

7 Produtos do fumo 0,451 0,774 0 0,201 0,101

8 Têxteis 1,040 1,139 0,426 0,111 0,268

9 Artigos do vestuário e acessórios 0,452 1,153 0,065 0,463 0,265

10 Artefatos de couro e calçados 0,559 1,191 0,015 0,249 0,133

11 Produtos de madeira – exclusive móveis 0,716 1,012 0,33 -0,142 0,092

12 Celulose e produtos de papel 0,987 1,125 0,456 -0,046 0,204

13 Jornais, revistas, discos 0,691 1,114 0,512 -0,524 -0,009

14 Refino de petróleo, coque e álcool 1,999 0,943 2,856 -1,208 0,811

15 Produtos químicos diversos 2,982 1,269 3,269 -1,498 0,871

16 Produtos farmacêuticos 0,509 0,980 0,302 0,004 0,152

17 Artigos de borracha e plástico 1,083 1,245 1,378 -1,233 0,064

18 Cimento e outros produtos de minerais não metálicos 0,766 1,109 1,328 0,027 0,673

19 Siderurgia e metalurgia 1,578 1,218 1,325 5,386 3,368

20 Produtos de metal – exclusive máquinas e equipamentos 1,026 1,158 1,123 -0,074 0,521

21 Máquinas e equipamentos, inclusive manutenção e reparos 0,868 1,280 0,747 -0,521 0,109

22 Eletrodomésticos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos 0,853 1,266 0,778 -0,310 0,231

23 Eletrônico, de comunicação e aparelhos médico-hospitalares 0,809 1,163 0,361 0,658 0,511

24 Indústria automotiva 0,891 1,377 0,597 5,825 3,227

25 Outros equipamentos de transporte 0,682 1,266 0,086 -0,014 0,036

26 Móveis e produtos das indústrias diversas 0,516 1,213 0,243 0,638 0,442

27 Siup 1,635 0,803 2,215 0,285 1,244

28 Construção civil 0,567 0,965 0,484 5,667 3,092

29 Comércio e serviços de manutenção e reparação 0,690 0,674 0,424 3,98 2,213

30 Transportes, armazenagem e correio 1,536 0,872 2,107 1,833 1,969

31 Serviços de informação 1,472 0,919 2,26 0,160 1,204

32 Financeiro 1,779 0,710 2,874 0,323 1,591

33 Imobiliário 0,767 0,485 0,643 0,515 0,578

34 Alojamento e alimentação 0,529 0,981 0,390 1,836 1,118

35 Serviços às empresas 1,644 0,741 2,792 -0,047 1,364

36 Saúde e educação mercantis 0,461 0,803 0,080 1,665 0,877

37 Serviços às famílias e doméstico 0,536 0,746 0,237 1,760 1,003

38 Administração pública, saúde e educação públicas 0,515 0,678 0,158 5,189 2,689

Média     1,000 1,000 1,000

Desvio-padrão     0,917 1,970 0,988

Média + (2 x desvio-padrão)     2,834 1,939 2,977

Fonte: matriz de insumo-produto. Elaboração dos autores

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Por conseguinte, onze setores da economia mineira são pouco relacionados ou independentes dos demais, ou seja, apresentaram ambos os índices de HR abaixo de 1, são eles: pecuária e pesca; minério de ferro; produtos do fumo; produtos farmacêuticos; construção civil; comércio e serviços de manutenção e reparação; imobiliário; alojamento e alimentação; saúde e educação mercantis; e serviços às famílias e doméstico; e administração, saúde e educação públicas.

Os índices de HR, contudo, são criticados na literatura por não considerarem a importância de determinado setor em relação ao seu nível de produção (Guilhoto et al., 1994) e, no intuito de suprir esta deficiência, são apresentados também os resultados dos índices puros de ligação. Como o presente trabalho pretende fazer uma análise comparativa destes índices com os de HR, utilizou-se o procedimento de normalização dos índices puros (Guilhoto et al., 2010). A tabela 3 apresenta os índices puros normalizados para trás (PBL), para frente (PFL) e total (PTL). Para a análise, adota-se neste trabalho a interpretação apresentada por Haddad (1995), classificando como índices puros fortes aqueles que os resultados foram maiores do que a média somada mais duas vezes o desvio-padrão da amostra.

Seguindo esta lógica, os índices puros normalizados para frente que se desta-cam são dos setores: refino de petróleo, coque e álcool, produtos químicos diversos, financeiro e serviços às empresas. Estes setores são os que mais geram produção para os demais setores da economia mineira. Do ponto de vista tecnológico, muito setores dependem do refino do petróleo, atribuindo a este setor uma das primeiras posições no ranking de ligações para frente (Guilhoto et al., 2010).

Entre os índices puros normalizados para trás, destacam-se os setores de: siderurgia e metalurgia, indústria automotiva, construção civil e administração, saúde e educação públicas. Tais setores apresentam elevado impacto puro do valor de sua produção, demandando de forma expressiva dos demais setores da econo-mia mineira. Geralmente, os maiores impactos para trás são de setores com alta complexidade industrial (Guilhoto et al., 2010), como é o caso aqui de siderurgia e metalurgia e indústria automotiva.

A partir dos índices puros normalizados totais, pode-se analisar o impacto conjunto na economia de cada setor como demandante e ofertante. A partir desse índice, é possível definir os setores-chave como aqueles que apresentaram os maiores índices, de acordo com critério adotado por Haddad (1995). Destarte, entre os setores da economia mineira que possuem tal característica, tem-se: siderurgia e metalurgia, indústria automotiva e construção civil.

No intuito de complementar a análise dos índices de ligação, bem como identificar os elos mais importantes da economia, são apresentados os resultados do campo de influência. Dos 1.444 coeficientes da MIP de Minas Gerais, a figura 1 revela os cem coeficientes técnicos com maior campo de influência das respectivas atividades setoriais da economia mineira.

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

O setor 15 (produtos químicos diversos) se destaca tanto pela ótica da compra quanto da venda. As compras (coluna) deste setor exercem influência em quase todos os setores da economia mineira. Pelo lado das vendas (linhas), os setores 24 e 25 influenciam um grande número de setores. O setor 6 (alimentos e bebidas) influencia a compra e a venda dele mesmo e dos setores: 8 (têxteis), 10 (artigo de vestuário e acessórios), 15 (produtos químicos diversos), 23 (eletrônico), 24 (indústria automotiva) e 25 (outros equipamentos de transporte). As demandas e ofertas do setor 8 influenciam os mesmos setores do setor 6, com o acréscimo do setor 11, no que tange à influência sobre a compra.

FIGURA 1Campo de influência de Minas Gerais (2009)

Setores compradores

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38

Seto

res

vend

edor

es

1  2  3  4  5  6  7    

      

8  9    

      

10  11    

      

12   

     

13  14  15  16              

              

17  18  19  20  

 

21  22  23  24    

                

25           

                 

26               

                 

27  28  29  

Elaboração dos autores.

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A fim de comparar os diferentes métodos, o quadro 1 apresenta os setores--chave da economia mineira a partir das três abordagens supracitadas: índices de ligação de HR, índices puros de ligação e campo de influência. Vale salientar, no entanto, que por mais que os resultados sejam diferentes, não se deve escolher um método em detrimento de outro. Pelo contrário, estes métodos citados devem ser utilizados de maneira complementar e não excludente (Guilhoto et al., 1994; 2010).

QUADRO 1Setores-chaves de Minas Gerais a partir de diferentes abordagens (2009)

Índices de Hirschman-Rasmussen

6 Alimentos e bebidas

8 Têxteis

15 Produtos químicos diversos

17 Artigos de borracha e plástico

19 Siderurgia e metalurgia

20 Produtos de metal – exclusive máquinas e equipamentos

Índices puros de ligações

19 Siderurgia e metalurgia

24 Indústria automotiva

28 Construção civil

Campo de influência

6 Alimentos e bebidas

8 Têxteis

15 Produtos químicos diversos

23 Eletrônico, de comunicação e aparelhos médico-hospitalar

24 Indústria automotiva

25 Outros equipamentos de transporte

Fonte: matriz de insumo-produto.Elaboração dos autores.

O único setor que é classificado como setor-chave da economia mineira em 2009 nas três abordagens é alimentos e bebidas, ao passo que os setores têxteis e produtos químicos diversos são identificados como chave por meio dos índices de HR e campo de influência. Já o setor de siderurgia e metalurgia é chave nas abordagens de HR e índices puros. Os demais setores, artigos de borracha e plás-tico, produtos de metal, agricultura, silvicultura e exploração florestal, transporte, armazenagem e correio, eletrônico, de comunicação e aparelhos médico-hospitalares, indústria automotiva e outros equipamentos de transporte aparecem em pelo menos um dos métodos.

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

Dessa forma, os índices de ligação utilizados neste trabalho identificaram quinze setores que podem ser considerados estratégicos, com destaque para alimen-tos e bebidas, têxteis, produtos químicos diversos e siderurgia e metalurgia, pois apareceram em mais de um método. Os setores-chave apresentam forte poder de encadeamento tanto a jusante quanto a montante da cadeia produtiva e, por isso, devem ser considerados estratégicos do ponto de vista de políticas setoriais que induzam ao crescimento econômico mineiro (Prado, 1981; Guilhoto et al., 1994).

Em relação aos resultados dos multiplicadores de impacto, a tabela 4 sintetiza os multiplicadores de produto, emprego e renda dos 38 setores de atividade econô-mica de Minas Gerais em 2009. A indústria automotiva foi o setor que apresentou o maior multiplicador de produto da economia mineira. Cada aumento de 1 mil unidades monetárias na demanda final deste setor vai exigir 3.240 unidades mo-netárias do produto de todos os setores da economia mineira. Os multiplicadores de produto da economia revelam os efeitos globais, diretos e indiretos, de todos os setores sobre a produção total da economia. Tais efeitos se dão a partir de cho-ques advindos do consumo das famílias, dos gastos do governo, dos investimentos empresariais ou das exportações relativos a um determinado setor.

Outros setores que se destacam em termos quantitativos e que, portanto, geram forte impacto no sistema produtivo de Minas Gerais são: máquinas e equipamentos (inclusive manutenção e reparos); produtos químicos diversos; e eletrodomésticos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos. Do ponto de vista qualitativo, visando o desenvolvimento da economia mineira, os setores que mais geram emprego a partir da variação exógena na demanda final diferem dos setores que mais geram produto. O setor que mais gera emprego em Minas Gerais é o de artigos de vestuário e acessórios, ao passo que, para cada R$ 1 milhão de variação na demanda final deste setor, são gerados aproximadamente 156 empregos diretos e indiretos. Outros setores de destaque são: artefatos de couros e calçados; jornais, revistas e discos; e outros da indústria extrativa, com, aproximadamente, a geração de 120, 80 e 70 empregos, respectivamente.

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TABELA 4Multiplicadores de impacto da economia mineira (2009)1

Setores de atividade econômica

Produto Emprego Renda

Variação unitária (R$)

Cada R$ 1 milhão na demanda final

Variação unitária (R$)

MPj Rank MEj Rank Mj Rank

1 Agricultura, silvicultura e exploração florestal 1,75 33O 34 15O 1,22 1O

2 Pecuária e pesca 1,94 28O 23 22O 1,15 4O

3 Petróleo e gás natural 2,20 25O 10 29O 0,91 21O

4 Extração de minerais metálicos 2,30 22O 3 37O 0,93 20O

5 Outros da indústria extrativa 2,51 18O 70 4O 0,94 19O

6 Alimentos e bebidas 2,56 17O 15 25O 0,67 37O

7 Produtos do fumo 1,82 31O 2 38O 1,03 14O

8 Têxteis 2,68 13O 50 10O 0,76 32O

9 Artigos do vestuário e acessórios 2,72 12O 156 1O 0,88 23O

10 Artefatos de couro e calçados 2,80 9O 120 2O 0,88 24O

11 Produtos de madeira - exclusive móveis 2,38 19O 51 9O 0,87 25O

12 Celulose e produtos de papel 2,65 14O 15 26O 0,76 31O

13 Jornais, revistas, discos 2,62 15O 80 3O 0,85 26O

14 Refino de petróleo, coque e álcool 2,22 24O 5 36O 0,98 16O

15 Produtos químicos diversos 2,99 3O 10 28O 0,63 38O

16 Produtos farmacêuticos 2,31 21O 16 24O 1,01 15O

17 Artigos de borracha e plástico 2,93 6O 34 16O 0,80 29O

18 Cimento e outros produtos de minerais não metálicos 2,61 16O 23 21O 0,83 27O

19 Siderurgia e metalurgia 2,87 7O 8 32O 0,69 35O

20 Produtos de metal - exclusive máquinas e equipamentos 2,73 11O 40 14O 0,94 18O

21 Máquinas e equipamentos, inclusive manutenção e reparos 3,01 2O 52 6O 0,70 33O

22 Eletrodomésticos, máquinas, aparelhos e materiais elétricos 2,98 4O 32 17O 0,69 34O

23 Eletrônico, de comunicação e aparelhos médico-hospitalares 2,74 10O 11 27O 0,89 22O

24 Indústria automotiva 3,24 1O 7 33O 0,68 36O

25 Outros equipamentos de transporte 2,98 5O 20 23O 0,81 28O

26 Móveis e produtos das indústrias diversas 2,86 8O 52 8O 0,80 30O

27 SIUP 1,89 29O 6 35O 1,07 10O

28 Construção civil 2,27 23O 49 11O 1,15 5O

29 Comércio e serviços de manutenção e reparação 1,59 37O 47 12O 1,13 6O

30 Transportes, armazenagem e correio 2,05 27O 25 20O 1,07 11O

31 Serviços de informação 2,16 26O 10 30O 0,94 17O

32 Financeiro 1,67 35O 6 34O 1,08 9O

33 Imobiliário 1,14 38O 8 21O 1,06 13O

34 Alojamento e alimentação 2,31 21O 52 7O 1,07 12O

35 Serviços às empresas 1,74 34O 53 5O 1,15 2O

36 Saúde e educação mercantis 1,89 30O 29 19O 1,12 8O

37 Serviços às famílias e doméstico 1,76 32O 29 18O 1,15 3O

38 Administração pública, saúde e educação públicas 1,60 36O 43 13O 1,13 7O

Fonte: Elaboração própria com base na matriz de insumo-produto.Nota: 1 Foram utilizados dados da Rais/Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) para construção do vetor

de pessoal ocupado em 31/12/2009, por setor de atividade econômica mineira. Nesse sentido, admite-se um grau de subestimação uma vez que os dados da Rais não contabilizam os empregos informais da economia.

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

Quando se trata de renda gerada ou valor adicionado, isto é, de salários, lucros, juros e aluguéis, o multiplicador de renda indica a variação nestes compo-nentes oriunda da variação unitária em qualquer componente da demanda final de um determinado setor, isto é, variação nas exportações, consumos das famílias, investimentos e gastos do governo. Neste sentido, o setor agricultura, silvicultura e exploração florestal é o que apresentou o maior multiplicador e, com isso, se configura como um importante setor da economia mineira no que remeta à geração de renda. A tabela 4 informa que, para cada aumento de R$ 1,00 na demanda final deste setor, isso gerará R$ 1,22 de renda adicional na economia de Minas Gerais.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi construir, a partir da análise de insumo-produto, um conjunto de informações relevantes sobre a estrutura produtiva de Minas Gerais em 2009, de forma que possa auxiliar a elaboração e implementação de políticas de planejamento do estado.

Do ponto de vista da formulação de eventuais políticas de planejamento, foi observado que a produção de alguns setores (tais como petróleo e gás natural; outros da indústria extrativa; produtos de madeira – exclusive móveis; celulose e produtos de papel; jornais, revistas e discos; artigos de borracha e plástico; pro-dutos de metal – exclusive máquinas e equipamentos; máquinas e equipamentos; eletrodomésticos; máquinas; aparelhos e materiais elétricos; outros equipamentos de transporte e serviços às empresas) é insuficiente para abastecer a demanda interna do estado. Estes setores podem ser incentivados localmente para que seja possível reduzir a dependência da importação regional de insumos. Além disto, o diagrama de autossuficiência indica ao setor privado em que setor ele pode alocar, de maneira mais eficiente, seus investimentos.

Outro resultado que pode subsidiar políticas públicas é relativo ao fortaleci-mento dos setores produtivos no estado, uma vez que os resultados para o ano de 2009 parecem indicar a importância de se conciliar e integrar políticas setoriais e regionais, tendo em vista os efeitos positivos verificados, especialmente, em qua-tro setores-chave relacionados a alimentos e bebidas; têxteis; produtos químicos diversos; e siderurgia e metalurgia. Neste sentido, tais setores podem alavancar, de maneira mais rápida, o crescimento econômico em Minas Gerais, impactando as demais atividades econômicas.

Em particular, os setores relacionados à siderurgia e à metalurgia e à pro-dução de metal (exclusive máquinas e equipamentos) são altamente interligados com a Região Metropolitana do Vale do Aço e a do Quadrilátero Ferrífero como expoentes tanto da produção mineral quanto da siderurgia e metalurgia, bem como da produção de metal, o que exige uma atenção maior devido à aglomeração

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produtiva já existente. Tal resultado parece indicar que há na região uma maior capacidade de absorção de produção e emprego evitando, assim, esforços que, sob a ótica municipal, podem ser descoordenados ou não uniformes nos municípios que fazem parte desta aglomeração industrial.

Diante da configuração estrutural apresentada pelos multiplicadores de im-pacto, os agentes responsáveis por políticas de planejamento defrontam-se com um “tripé”: vetores de produto, emprego e renda. Um setor pode ser importante gerador de produto, mas apresentar pouco impacto na geração de emprego e ren-da – ou vice-versa –, o que induz à desconexão entre políticas. Entretanto, uma combinação de políticas e prioridades econômicas, associadas com as estratégias do setor privado, poderia delinear os resultados globais da economia do estado. Como visto, mesmo tendo os setores-chave como ponto de partida, as demais atividades produtivas também são importantes para Minas Gerais e, neste caso, devem ser analisadas e estudadas visando aumentar a distribuição e a diversificação setorial da dinâmica econômica mineira.

Em suma, as conclusões sugerem algumas políticas que permitem identificar as oportunidades setoriais produtivas. No caso dos quatro setores-chave observados – ali-mentos e bebidas; têxteis; produtos químicos diversos; e siderurgia e metalurgia –, algumas medidas poderiam fomentar e fortalecer o desenvolvimento industrial e regional, como as opções indicadas nestas considerações finais.

Investimentos nos setores da siderurgia e metalurgia e produtos químicos diversos, como os destinados à infraestrutura – principalmente em logística –, bem como uma carga tributária menor e disponibilização de crédito às indústrias, são alguns exemplos de políticas setoriais importantes que auxiliariam, paralelamente, as políticas de planejamento no estado. No caso específico do setor de siderurgia e metalurgia, a redução do custo da eletricidade e um processo de licenciamento ambiental mais ágil permitiriam que novas siderurgias fossem instaladas.

Para o setor de alimentos e bebidas, podem-se destacar incentivos às em-presas que permitam a capacitação de recursos humanos, aliados às interações entre universidades e centros de pesquisas, por exemplo. Desta forma, estudos com aplicações industriais proporcionariam um ambiente propício à criação de novas tecnologias ao longo da cadeia produtiva das respectivas indústrias. Outra opção seria estimular a criação e o fortalecimento de uma estrutura agroindustrial local/regional – economicamente sustentável – integrada ao mercado consumidor e, permitindo a oferta de insumos de qualidade, bem como a diversificação de produtos alimentares.

No caso do setor têxtil, não só no aspecto regional mas também no âmbito nacional, é observado que as aglomerações de empresas, chamadas de arranjos pro-dutivos locais (APLs), representam, para as médias e pequenas empresas, vantagens

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Estrutura Econômica e Encadeamentos Setoriais de Minas Gerais: uma contribuição para as políticas de planejamento

importantes que potencializam o incremento de sua competividade. Ademais, os incentivos para o surgimento e a manutenção dessa concentração de empresas devem ser articulados com os investimentos e o reforço das interações entre em-presas e universidades, assim como a intensificação do papel das instituições que capacitam e qualificam a mão de obra.

Por fim, deve-se ressaltar que os resultados encontrados são frutos do modelo utilizado, isto é, o formulador de políticas públicas deve considerar as limitações originadas pela linearidade dos modelos de insumo-produto, entre outras hipóteses já descritas. Em trabalhos futuros, a partir da base de dados aqui gerada, pretende-se realizar simulações por meio de choques de investimentos em setores específicos, a partir de alguma política proposta.

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planejamento e políticas públicas | ppp | n. 41 | jul./dez. 2013300

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Originais submetidos em outubro de 2012. Última versão recebida em dezembro de 2012. Aprovado em janeiro de 2013.

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COLABORADORES

Para os dois números da PPP, em 2013, a editoria da revista contou com a colabo-ração de um conjunto importante de pareceristas de diferentes instituições e regiões brasileiras. Agradecemos a cada um da listagem a seguir, pois desta colaboração generosa dependem a melhoria contínua da qualidade e a pontualidade da PPP.

Acir dos Santos Almeida (Ipea)

Adelar Fochezatto (PUCRS)

Adriana Moreira Bastos de Faria (BC)

Alexandre Cunha (Ipea)

Alexandre Marinho (Ipea)

Alexis Maka (Ipea)

Almir Bittencourt da Silva (UFC)

Almir de Oliveira Júnior (Ipea)

Álvaro Hidalgo (UFPE)

Ana Cleusa Serra Mesquita (Ipea)

Bernardo Patta Schettini (Ipea)

Bruno Cesar Pino Oliveira de Araújo (Ipea)

Bruno Cruz (Ipea)

Bruno Milanez (UFJF)

Caio Mussolini (INSPER/SP)

Camilo Bassi (Ipea)

Carla Bronzo (FJP/MG)

Carlos Alberto Ramos (UnB)

Carlos Eduardo Gasparini (UFPB)

Carlos Henrique Ribeiro de Carvalho (Ipea)

Patrícia Morita Sakowski (Ipea)

Carolina Pescatori (UnB)

Cleandro Henrique Krause (Ipea)

Daniela Schettini (USP)

Denise Salles (FGV)

Diego de Faveri Pereira Lima (FGV)

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Elson Pires (UNESP)

Ernesto Pereira Galindo (Ipea)

Fábio Veras Soares (Ipea)

Fernanda Sauerbronn (UFRJ)

Fernando Antônio Ribeiro Soares (MF)

Fernando Meneguin (SENADO)

Fernando Perobelli (UFJF)

Frederico Augusto Barbosa da Silva (Ipea)

Gabriel Caldas Montes (UFF)

Guilherme Resende (Ipea)

Hugo Borsani (UENF)

Joanilio Teixeira (Unb)

João Veloso (GDF)

Jose Eustáquio Alves (IBGE)

Jose Eustáquio Ribeiro Vieira Filho (Ipea)

José Gustavo Feres (Ipea)

Junior Macambira (IDT/CE)

Leonardo Monastério (Ipea)

Lucas Ferreira Mation (IPEA)

Luis Henrique da Silva de Paiva (MDS)

Manoel Leonardo Santos (UFMG)

Marcelo Caetano (Ipea)

Márcio Salvato (Unimontes)

Marco Antônio Montoya (UPF)

Marcos Mendes (Senado)

Marcos Yamada Naskaguma (USP)

Maria Bernadete (Ipea)

Maria Cristina Cacciamali (USP)

Maria da Piedade (Ipea)

Maria do Carmo Meirelles Toledo Cruz (FGV)

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Maurício Bugarin (UnB)

Maurício de Paula Pinto (UnB)

Mauro Salvo (BCB)

Milko Matijascic (Ipea)

Nelson Zackseski (Ipea)

Oliveira Alves Pereira (MP)

Paola Cappellin (UFRJ)

Paulo Delgado (Ipardes)

Paulo Mol Junior (CNI)

Paulo Nascimento (Ipea)

Paulo Roberto Scalco (UFG)

Pedro Henrique Zuchi da Conceição (UnB)

Pedro Herculano G. F. de Souza (Ipea)

Priscilla Albuquerque Tavares (FGV)

Rafael Henrique Moraes Pereira (Ipea)

Renato Garcia (USP)

Roberta da Silva Vieira (Ipea)

Roberto Ellery (UnB)

Roberto Henrique Sieczkowski Gonzalez (Ipea)

Rodrigo Valente Serra (ANP)

Ronaldo Seroa da Motta (Ipea)

Sabino Porto Jr (UFRGS)

Sandro Sacchet de Carvalho (Ipea)

Sergio Monteiro (UFRGS)

Sonaly Rezende (UFMG)

Tito Belchior S. Moreira (UCB)

Tufi Machado Soares (UFJF)

Vander Lucas (UnB)

Viviane Luporini (UFRJ)

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Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

EDITORIAL

CoordenaçãoCláudio Passos de Oliveira

SupervisãoEverson da Silva MouraReginaldo da Silva Domingos

RevisãoClícia Silveira RodriguesIdalina Barbara de CastroLaeticia Jensen EbleLeonardo Moreira de SouzaMarcelo Araujo de Sales AguiarMarco Aurélio Dias PiresOlavo Mesquita de CarvalhoRegina Marta de AguiarKaren Aparecida Rosa (estagiária)Luana Signorelli Faria da Costa (estagiária)Tauãnara Monteiro Ribeiro da Silva (estagiária)

EditoraçãoBernar José VieiraCristiano Ferreira de AraújoDaniella Silva NogueiraDanilo Leite de Macedo TavaresDiego André Souza SantosJeovah Herculano Szervinsk JuniorLeonardo Hideki Higa

The manuscripts in languages other than Portuguese published herein have not been proofread.

LivrariaSBS – Quadra 1 − Bloco J − Ed. BNDES, Térreo 70076-900 − Brasília – DFTel.: (61) 3315 5336Correio eletrônico: [email protected]

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Composto em adobe garamond pro 11/13,2 (texto)Frutiger 67 bold condensed (títulos, gráficos e tabelas)

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Brasília-DF

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NORMAS AOS COLABORADORES DE PLANEJAMENTO E POLÍTICAS PÚBLICAS

1. Os artigos enviados para seleção devem ser inéditos. A remessa do artigo à revista implica autorização do autor para a sua publicação.

2. Os trabalhos podem ser submetidos em português, inglês, francês ou espanhol. Aceitam-se, eventualmente, artigos traduzidos já publicados em outro idioma que, pela sua relevância, mereçam divulgação em português.

3. A revista reserva-se o direito de recusar trabalhos submetidos para publicação, conforme a avaliação de seus pareceristas. Todos os trabalhos submetidos serão julgados por dois pareceristas no processo de avaliação. Caso haja divergência entre os dois primeiros pareceristas, o artigo será encaminhado para um terceiro parecerista.

4. No caso dos artigos selecionados para publicação, os autores deverão enviar uma versão editada em Word (2007 ou posterior). Os artigos devem ser submetidos pelo site da revista (acessar a seção Publicações, subseção PPP, em: <http://www.ipea.gov.br>).

5. Cada artigo deverá conter um resumo de cerca de 150 palavras, o qual propicie uma visão global e antecipada do assunto tratado. O resumo e o título do artigo devem ser enviados em quatro idiomas: português, inglês, espanhol e francês. Cada resumo deve conter até cinco palavras-chave.

6. As fórmulas matemáticas devem ser claras e insertas no próprio texto: jamais podem dar margem a dupla interpretação. Se as deduções de fórmulas forem abreviadas, o autor deverá apresentar a derivação completa em um anexo, o qual não será publicado.

7. Diretrizes gerais para formatação dos artigos:

7.1 Os artigos enviados devem ser anonimizados. Ou seja, qualquer referência aos autores no corpo do texto deve ser excluída.

7.2 O autor deverá informar até cinco códigos no sistema de classificação do Journal of Economic Literature (JEL), disponível em: <https://www.aeaweb.org/jel/jel_class_system.php>.

7.3 Os artigos não devem exceder vinte e cinco páginas, considerando-se todos os elementos do artigo, inclusive as partes não textuais. O texto deve ser formatado em A4 (29,7 x 21 cm), espaço simples, letras Times New Roman, corpo 12, margens superior e esquerda com 3 cm e inferior e direita com 2 cm, justificado.

7.4 Gráficos de dados devem ser editados em Microsoft Excel, versão 2007 ou posterior. No caso de gráficos, pode-se fazer a edição também em Corel Draw. Mapas e gravuras deverão vir em arquivo separado, com extensão CDR, BMP, TIF, JPG e EPS, para possibilitar edição eletrônica.

7.5 As notas devem aparecer no final da página, numeradas sequencialmente.

7.6 O artigo deve seguir as normas estabelecidas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), NBR-6023.

7.7 As indicações bibliográficas no texto devem obedecer, por exemplo, à forma (Barat, 1978) e, se for o caso, acrescidas de referência ao número da página citada: (Barat, 1978, p. 15). A referência completa deverá ser apresentada no fim do artigo, em ordem alfabética, com: no caso de livros – autor(es), título completo do livro, nome e número da série ou coleção (se houver), edição, local, editora e ano de publicação; e, no caso de artigos de periódicos – autor(es), título completo do artigo, título completo do periódico, local, número e volume, número de páginas, mês e ano da publicação.

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Missão do IpeaProduzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro.