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 Revista Trimestral de Jurisprudência volume 215  janeiro a março de 20 11

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Revista Trimestral de Jurisprudncia

volume 215 janeiro a maro de 2011

Diretoria Geral Alcides Diniz da Silva SecretariadeDocumentao Janeth Aparecida Dias de Melo CoordenadoriadeDivulgaodeJurisprudncia Leide Maria Soares Corra Cesar SeodePreparodePublicaes Cntia Machado Gonalves Soares SeodePadronizaoeReviso Rochelle Quito SeodeDistribuiodeEdies Maria Cristina Hilrio da Silva Diagramao: Ludmila Araujo e Luiza Superti Pantoja Capa:Ncleo de Programao Visual

(Supremo Tribunal Federal Biblioteca Ministro Victor Nunes Leal)Revista Trimestral de Jurisprudncia / Supremo Tribunal Federal. V. 1, n. 1 (abr./jun. 1957) - . Braslia : STF, 1957- . v. ; 22 x 16 cm. Trimestral. Ttulo varia: RTJ. Repositrio Oficial de Jurisprudncia do Supremo Tribunal Federal. Nome do editor varia: Imprensa Nacional / Supremo Tribunal Federal, 1957 a 2001; Editora Braslia Jurdica, 2002 a 2006; Supremo Tribunal Federal, 2007- . Disponvel tambm em formato eletrnico a partir de abr. 1957: http://www.stf.jus.br/portal/indiceRtj/pesquisarIndiceRtj.asp. ISSN 0035-0540. 1. Tribunal supremo, jurisprudncia, Brasil. 2. Tribunal supremo, peridico, Brasil. I. Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF). Coordenadoria de Divulgao de Jurisprudncia. II. Ttulo: RTJ. CDD 340.6

Solicita-sepermuta. Pdese canje. On demande lchange. Si richiede loscambio. We ask forexchange. Wir bitten umAustausch.

STF/CDJU Anexo II, Cobertura Praa dos Trs Poderes 70175-900 Braslia-DF [email protected] Fone: (0xx61)3217-4766

Su RE oTRIBuNALFEDERAL P mMinistro Antonio CEZAR PELUSO (25-6-2003), Presidente Ministro Carlos Augusto AyRES de Freitas BRITTO (25-6-2003), Vice-Presidente Ministro Jos CELSO DE MELLO Filho (17-8-1989) Ministro MARCO AURLIO Mendes de Farias Mello (13-6-1990) Ministra ELLEN GRACIE Northfleet (14-12-2000) Ministro GILMAR Ferreira MENDES (20-6-2002) Ministro JOAQUIM Benedito BARBOSA Gomes (25-6-2003) Ministro Enrique RICARDO LEWANDOWSKI (16-3-2006) Ministra CRMEN LCIA Antunes Rocha (21-6-2006) Ministro Jos Antonio DIAS TOFFOLI (23-10-2009) Ministro LUIZ FUX (3-3-2011)

COMPOSIO DAS TURMASPRIMEIRA TURMA

Ministra CRMEN LCIA Antunes Rocha, Presidente Ministro MARCO AURLIO Mendes de Farias Mello Ministro Enrique RICARDO LEWANDOWSKI Ministro Jos Antonio DIAS TOFFOLI Ministro LUIZ FUXSEGUNDA TURMA

Ministro GILMAR Ferreira MENDES, Presidente Ministro Jos CELSO DE MELLO Filho Ministra ELLEN GRACIE Northfleet Ministro Carlos Augusto AyRES de Freitas BRITTO Ministro JOAQUIM Benedito BARBOSA Gomes

PROCURADOR-GERAL DA REPBLICA

Doutor ROBERTO MONTEIRO GURGEL SANTOS

COMPOSIO DAS COMISSESCOMISSO DE REGIMENTO

Ministro MARCO AURLIO Ministro GILMAR MENDES Ministro JOAQUIM BARBOSA Ministro DIAS TOFFOLI SuplenteCOMISSO DE JURISPRUDNCIA

Ministra ELLEN GRACIE Ministro AyRES BRITTO Ministra CRMEN LCIACOMISSO DE DOCUMENTAO

Ministro CELSO DE MELLO Ministro DIAS TOFFOLI Ministro LUIZ FUXCOMISSO DE COORDENAO

Ministro GILMAR MENDES Ministro RICARDO LEWANDOWSKI Ministro LUIZ FUX

SumRIoPg.

ACRDOS .................................................................................................................... 9 NDICE ALFABTICO ........................................................................................... 633 NDICE NUMRICO .............................................................................................. 651

ACRDOS

AoDECLARATRIADECoNSTITuCIoNALIDADE12DF (ADC 12-MC na RTJ 199/427) Relator: O Sr. Ministro Carlos Britto Requerentes: Associao dos Magistrados Brasileiros AMB Requerido: Conselho Nacional de Justia Interessados: Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico da Unio no Distrito Federal SINDJUS/DF, Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho ANAMATRA, Federao Nacional dos Trabalhadores do Judicirio Federal e Ministrio Pblico da Unio FENAJUFE e Associao Nacional dos Magistrados Estaduais ANAMAGES Aodeclaratriadeconstitucionalidade,ajuizadaemprol daResoluo7,de18102005,doConselhoNacionaldeJustia. Atonormativoquedisciplinaoexercciodecargos,empregose funesporparentes,cnjugesecompanheirosdemagistradose deservidoresinvestidosemcargosdedireoeassessoramento, nombitodosrgosdoPoderJudicirioedoutrasproviden cias.Procednciadopedido. 1.oscondicionamentosimpostospelaResoluo7/2005do CNJnoatentamcontraaliberdadedeproveredesprovercar gosemcomissoefunesdeconfiana.Asrestriesconstantes doatoresolutivoso,norigordostermos,asmesmasjimpostas pelaConstituiode1988,dedutveisdosrepublicanosprincpios daimpessoalidade,daeficincia,daigualdadeedamoralidade. 2.Improcednciadasalegaesdedesrespeitoaoprincpio daseparaodosPodereseaoprincpiofederativo.oCNJno rgoestranhoaoPoderJudicirio(art.92,CF)enoesta submeter esse Poder autoridade de nenhum dos outros dois.

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R.T.J. 215 oPoderJudiciriotemumasingularcomposturadembitona cional, perfeitamente compatibilizada com o carter estaduali zadodeumapartedele.Ademais,oart.125daLeimagnadefere aos Estados a competncia de organizar a sua prpria Justia, masnomenoscertoqueessemesmoart.125,caput,jungeessa organizaoaosprincpiosestabelecidosporela,Cartamaior, nelesincludososconstantesdoart.37,cabea. 3.Ao julgada procedente para: a) emprestar interpre tao conforme Constituio para deduzir a funo de chefia do substantivo direo nos incisos II, III, IV,V do art. 2o do ato normativo em foco; b) declarar a constitucionalidade da Resoluo7/2005doConselhoNacionaldeJustia. ACRDO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em, por unanimidade de votos, julgar procedente a ao declaratria de constitucionalidade e, por maioria de votos, emprestar interpretao conforme a Constituio para deduzir a funo de chefia do substantivo direo, constante dos incisos II, III, IV e V do art. 2 da Resoluo 7, de 18-10-2005, do Conselho Nacional de Justia, o que fazem nos termos do voto do Relator, em sesso presidida pelo Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigrficas. Vencidos os Ministros Menezes Direito e Marco Aurlio. Deciso dotada de efeito vinculante, nos termos da Lei 9.868/1999. Votou o Presidente. Acolhida questo de ordem proposta pelo Ministro Marco Aurlio no sentido de fazer constar a rejeio da preliminar de inadequao da ao declaratria de constitucionalidade que suscitou quando do julgamento da cautelar, ocasio em que Sua Excelncia ficou vencido. Braslia, 20 de agosto de 2008 Carlos Ayres Britto, Relator. RELATRIO O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto: Cuida-se de ao declaratria de constitucionalidade, proposta pela Associao dos Magistrados do Brasil (AMB), em prol da Resoluo 7/2005 do Conselho Nacional de Justia. Ato normativo, esse, que disciplina o exerccio de cargos, empregos e funes por parentes, cnjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direo e assessoramento, no mbito dos rgos do Poder Judicirio e d outras providncias. 2. So estes os fundamentos do pedido: I o Conselho Nacional de Justia (CNJ) tem competncia constitucional para zelar pela observncia do art. 37 da Constituio e apreciar a validade dos atos administrativos praticados pelos rgos do Poder Judicirio (inciso II do 4 do art. 103-B da CF/1988);

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II a vedao ao nepotismo regra constitucional que decorre dos princpios da impessoalidade, igualdade, moralidade e eficincia administrativa; III alm de estar subordinado legalidade formal, o Poder Pblico fica adstrito juridicidade, conceito mais abrangente que inclui os comandos diretamente veiculados pela CF; IV a Resoluo 7/2005 do CNJ no prejudica o necessrio equilbrio entre os Poderes do Estado por no subordinar nenhum deles a outro, nem vulnera o princpio federativo, dado que tambm no estabelece vnculo de sujeio entre as pessoas estatais de base territorial. 3. Prossigo neste relato para anotar que a postulante, aps declinar os fundamentos jurdicos da sua pretenso de ver julgada procedente esta ao declaratria de constitucionalidade, requer, liminarmente, a suspenso: a) do julgamento dos processos que envolvam a aplicao da Resoluo 7/2005 do CNJ at o julgamento definitivo da presente ao, ficando impedidos de proferir qualquer nova deciso, a qualquer ttulo, que impea ou afaste a eficcia da Resoluo em questo; b) com eficcia ex tunc, dos efeitos de quaisquer decises, proferidas a qualquer ttulo, que tenham afastado a aplicao da Resoluo 7/2005 do CNJ. J no tocante ao mrito, a acionante pugna pelo reconhecimento da constitucionalidade da resoluo em causa. 4. Sigo para dizer que, na assentada plenria de 16-2-2006, este Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, deferiu o pedido de medida liminar (fls. 511/514). 5. Na sequncia, determinei a remessa dos autos ao Procurador-Geral da Repblica, o qual opinou pela procedncia da ao, em parecer assim ementado:Ao declaratria de constitucionalidade. Resoluo 7/2005, do Conselho Nacional de Justia. Disciplina do exerccio de cargos, empregos e funes por parentes de magistrados no mbito do poder judicirio. Competncia do CNJ regularmente exercida. Direta vinculao dos juzes e tribunais aos princpios prestigiados pelo art. 37 da CF/1988. Concretizao, pelas regras ordenadas, do contedo normativo da lei maior. Parecer pela procedncia da ao.

6. derradeira, anoto que figuram na presente ao, na condio de amici curiae, o Tribunal de Justia do Rio de Janeiro e as seguintes entidades: Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico da Unio no Distrito Federal (SINDJUS/DF), Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho (ANAMATRA), Associao Nacional dos Magistrados Estaduais (ANAMAGES) e Federao Nacional dos Trabalhadores do Judicirio Federal e Ministrio Pblico da Unio (FENAJUFE). o relatrio.

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R.T.J. 215 QUESTO DE ORDEM

O Sr. Ministro Marco Aurlio: Presidente, Vossa Excelncia me permite, apenas para primar pela celeridade? Procedi leitura do dispositivo do acrdo alusivo liminar e constatei que nele no figurou a rejeio da preliminar de inadequao da ao ajuizada, inadequao que sustentara em voto. Alis, o ilustre advogado, Doutor Lus Roberto Barroso, fez justia ao voto que proferi ao apontar que o indeferimento da medida acauteladora, em meu voto, lastreou-se em tema instrumental, no levando em conta o tema de fundo. Procurei, considerado o que foi versado nos jornais nos ltimos dias, a inspirao no que se lanou que teria sido eu o nico a votar indeferindo a liminar. Pesquisando a administrao que tive na Presidncia desta Corte, bem como na Presidncia do Tribunal Superior Eleitoral, vislumbrei uma razo equivocada evidentemente para concluir-se dessa forma, como se fosse a favor do nepotismo: que mantive, nas referidas administraes no Supremo e no Eleitoral , um Parente, mas o Renato Parente, patronmico do nosso Secretrio de Imprensa e no um parente consanguneo ou afim. Agora, ponderaria a necessidade de corrigir-se a omisso para no voltarmos a discutir a natureza do ato e consignar que o Colegiado ante a preliminar que levantei de inadequao, porque no se trataria de questionamento de ato normativo abstrato do Conselho Nacional de Justia afastou essa preliminar. O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Vamos fazer isso para consignar, portanto, na deciso. O Sr. Ministro Marco Aurlio: Engraado que, no voto que proferi, inclusive comecei cogitando dos apressados:Senhor Presidente, aos apressados, em termos de concluso, recomendo a leitura do voto que proferi ao relatar a ADI 1.521-4/RS, atentando para o enquadramento que dei ao famigerado nepotismo ante o texto da Constituio Federal.

E, ao trmino do voto, voltei, inclusive, a mencionar essa problemtica:(...) reportando-me mais uma vez, at mesmo para afastar maledicncias, ao voto custico, com tintas fortes, que proferi na ADI 1.521-4/RS que, inclusive, rendeu-me inimizades , peo vnia para, nesse primeiro passo (...)

E prossegui. Deixo estreme de dvidas que jamais, como juiz, placitei o que enquadrado como famigerado nepotismo. VOTO O Sr. Ministro Carlos Ayres Britto (Relator): Tenho que a matria constitucional desta ao declaratria foi exaustivamente examinada por este Supremo

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Tribunal Federal quando do enfrentamento do pedido de medida liminar. Pedido, esse, que foi deferido em 16-2-2006, mediante a prolao de julgado assim ementado:Ao declaratria de constitucionalidade, ajuizada em prol da Resoluo 7, de 18-10-2005, do Conselho Nacional de Justia. Medida cautelar. Patente a legitimidade da Associao dos Magistrados do Brasil (AMB) para propor ao declaratria de constitucionalidade. Primeiro, por se tratar de entidade de classe de mbito nacional. Segundo, porque evidenciado o estreito vnculo objetivo entre as finalidades institucionais da proponente e o contedo do ato normativo por ela defendido (inciso IX do art. 103 da CF, com redao dada pela EC 45/2004). Ao declaratria que no merece conhecimento quanto ao art. 3 da resoluo, porquanto, em 6-12-2005, o Conselho Nacional de Justia editou a Resoluo 9/2005, alterando substancialmente a de nmero 7/2005. A Resoluo 7/2005 do CNJ reveste-se dos atributos da generalidade (os dispositivos dela constantes veiculam normas proibitivas de aes administrativas de logo padronizadas), impessoalidade (ausncia de indicao nominal ou patronmica de quem quer que seja) e abstratividade (trata-se de um modelo normativo com mbito temporal de vigncia em aberto, pois claramente vocacionado para renovar de forma contnua o liame que prende suas hipteses de incidncia aos respectivos mandamentos). A Resoluo 7/2005 se dota, ainda, de carter normativo primrio, dado que arranca diretamente do 4 do art. 103-B da Carta-cidad e tem como finalidade debulhar os prprios contedos lgicos dos princpios constitucionais de centrada regncia de toda a atividade administrativa do Estado, especialmente o da impessoalidade, o da eficincia, o da igualdade e o da moralidade. O ato normativo que se faz de objeto desta ao declaratria densifica apropriadamente os quatro citados princpios do art. 37 da Constituio Federal, razo por que no h antinomia de contedos na comparao dos comandos que se veiculam pelos dois modelos normativos: o constitucional e o infraconstitucional. Logo, o Conselho Nacional de Justia fez adequado uso da competncia que lhe conferiu a Carta de Outubro, aps a Emenda 45/2004. Noutro giro, os condicionamentos impostos pela Resoluo em foco no atentam contra a liberdade de nomeao e exonerao dos cargos em comisso e funes de confiana (incisos II e V do art. 37). Isto porque a interpretao dos mencionados incisos no pode se desapegar dos princpios que se veiculam pelo caput do mesmo art. 37. Donde o juzo de que as restries constantes do ato normativo do CNJ so, no rigor dos termos, as mesmas restries j impostas pela Constituio de 1988, dedutveis dos republicanos princpios da impessoalidade, da eficincia, da igualdade e da moralidade. dizer: o que j era constitucionalmente proibido permanece com essa tipificao, porm, agora, mais expletivamente positivado. No se trata, ento, de discriminar o Poder Judicirio perante os outros dois Poderes Orgnicos do Estado, sob a equivocada proposio de que o Poder Executivo e o Poder Legislativo estariam inteiramente libertos de peias jurdicas para prover seus cargos em comisso e funes de confiana, naquelas situaes em que os respectivos ocupantes no hajam ingressado na atividade estatal por meio de concurso pblico. O modelo normativo em exame no suscetvel de ofender a pureza do princpio da separao dos Poderes e at mesmo do princpio federativo. Primeiro, pela considerao de que o CNJ no rgo estranho ao Poder Judicirio (art. 92, CF) e

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R.T.J. 215no est a submeter esse Poder autoridade de nenhum dos outros dois; segundo, porque ele, Poder Judicirio, tem uma singular compostura de mbito nacional, perfeitamente compatibilizada com o carter estadualizado de uma parte dele. Ademais, o art. 125 da Lei Magna defere aos Estados a competncia de organizar a sua prpria Justia, mas no menos certo que esse mesmo art. 125, caput, junge essa organizao aos princpios estabelecidos por ela, Carta Maior, neles includos os constantes do art. 37, cabea. Medida liminar deferida para, com efeito vinculante: a)emprestar interpretao conforme para incluir o termo chefia nos incisos II, III, IV, V do art. 2o do ato normativo em foco b)suspender, at o exame de mrito desta ao declaratria de constitucionalidade, o julgamento dos processos que tenham por objeto questionar a constitucionalidade da Resoluo 7/2005 do Conselho Nacional de Justia;c) obstar que juzes e Tribunais venham a proferir decises que impeam ou afastem a aplicabilidade da mesma Resoluo 7/2005 do CNJ; e d)suspender, com eficcia ex tunc, os efeitos daquelas decises que, j proferidas, determinaram o afastamento da sobredita aplicao.

9. Isso posto, e nada tendo a acrescentar fundamentao em que se louvou este Supremo Tribunal Federal para deferir o provimento acautelatrio, o meu voto julga procedente o pedido para: Iemprestar interpretao conforme a Constituio para deduzir a funo de chefia do substantivo direo nos incisos II, III, IV, V do art. 2o do ato normativo em foco; II declarar a constitucionalidade da Resoluo 7/2005 do Conselho Nacional de Justia. 10. como voto. VOTO O Sr. Ministro Menezes Direito: Senhor Presidente, quando esta Corte julgou a Ao 3.377, de que foi Relator o Ministro Peluso, tenho a sensao de que ela enfrentou a questo mais delicada, que era a prpria existncia do Conselho Nacional de Justia na sua perspectiva constitucional. E esta Corte, em votos brilhantssimos, assentou a plena compatibilidade da instaurao do Conselho Nacional de Justia como rgo integrante da estrutura do Poder Judicirio. claro que fao minhas as palavras do Ministro Peluso quando, em debate, se no me falha a memria, com o Ministro CarlosVelloso, assinalou a sua dificuldade com referncia participao de pessoas estranhas ao Poder Judicirio como membros desse Conselho Nacional de Justia, mas essa questo est plenamente superada e j no nos cabe mais examin-la aqui. Duas so as questes que a meu ver, simplificadamente, devem ser enfrentadas nesta ao. A primeira diz com a competncia do Conselho Nacional de Justia de editar uma resoluo sobre este tema. E, neste ponto, ao meu sentir, est embutida a questo relativa ao poder do Conselho se admitirmos que esta matria reservada a uma lei formalmente emanada, portanto, do Poder Legislativo.

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Mas eu tenho entendido, e creio que essa a convergncia do Supremo Tribunal Federal, que esses princpios que esto insculpidos no caput do art. 37 da Constituio Federal tm uma eficcia prpria, eles so dotados de uma fora prpria, que podem ser imediatamente aplicados. E eu diria at mais: sem um retorno s origens tcnicas da diferenciao entre o princpio e a norma, que hoje, na perspectiva da Suprema Corte, esses princpios revestem-se da mesma fora, tanto isso que, em precedente recentssimo que julgamos aqui neste Pleno, ns aplicamos um desses princpios com a fora efetiva de uma norma constitucional, e, portanto, esse princpio pode, sim, ser aplicado diretamente, independentemente da existncia de uma lei formal. Se essa concepo verdadeira, e, ao meu sentir, verdadeira, ns temos de admitir que dentro das atribuies do Conselho Nacional de Justia est a de preservar os princpios que esto presentes no caput do art. 37 da Constituio. E um desses princpios aquele relativo moralidade; e da a pertinncia temtica da resoluo do Conselho Nacional de Justia. Nunca demais repetir-se que necessrio sempre assinalar que o Conselho Nacional de Justia no tem atividade jurisdicional. Ele tem uma atividade meramente administrativa. Da a minha afirmao reiterada de que dvidas devem persistir no tocante, por exemplo, utilizao, pelos membros do Conselho Nacional de Justia, de medidas liminares, considerando que as medidas liminares so prprias da ao jurisdicional do Estado e, logo, so da competncia especfica daqueles que tm atividade judicante. Entendo, portanto, que essa primeira questo deve ser superada no sentido de que, sim, da competncia do Conselho Nacional de Justia fazer a disciplinao dos princpios insculpidos na Constituio no que tange ao poder administrativo que detm no mbito do Poder Judicirio. A segunda questo seria a de saber concretamente se o contedo daquela resoluo que est agora sob exame esbarraria em alguma dificuldade de natureza constitucional. Tambm a minha resposta negativa. Tenho a sensao de que o que est disposto ali um pouco o senso comum, que se vem aplicando coerentemente at mesmo em diversas etapas, no apenas do Poder Judicirio Federal, mas tambm do Poder Judicirio dos Estados. J h alguns Estados que tm uma regulamentao suficiente ou, pelo menos, uma orientao nesse mesmo sentido. Ora, se as duas respostas com relao s dificuldades relativas pertinncia temtica, competncia do Conselho Nacional de Justia e ao contedo so negativas no que concerne Constituio, evidentemente que outra concluso no posso chegar seno pela procedncia da ao. Todavia, eu vou pedir vnia ao Ministro CarlosAyres porque entendo que desnecessrio fazer qualquer complementao com a utilizao da interpretao conforme. A resoluo como est redigida tem um alcance sistemtico extremamente ampliado e, ao meu sentir, alcana, at pela natureza mesmo da expresso constitucional no que diz com os cargos em comisso, que se diferenciam at mesmo daquelas funes gratificadas, que so cargos de direo e assessoramento

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superior, portanto, inclui necessariamente os cargos de chefia. Da eu no ver necessidade especfica de recorrermos ao princpio da interpretao conforme de forma a fazer um acrscimo disciplina includa na Resoluo 7. Com essa pequenssima e insignificante divergncia com relao ao voto do Ministro AyresBritto, no seu mrito, eu acompanho, mesmo que a Constituio tenha feito qualquer referncia ao cargo de chefia. Tenho a convico, e peo vnia ao meu eminente amigo Ministro CarlosAyresBritto para mant-la, de que no h necessidade especfica do recurso interpretao conforme, que deve ser utilizado quando, de fato, a ausncia se faz necessria para o cumprimento da regra, de forma compatvel com a Constituio. Neste caso, evidente, pelo menos no meu entender, essa complementao no se faz necessria. Julgo, portanto, apenas procedente a ao nos termos em que foi posto, com extremo brilho e extrema lucidez, pelo eminente Ministro CarlosAyresBritto. O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Totalmente procedente. O Sr. Ministro Menezes Direito: Sim, porque, na realidade, a interpretao conforme no tira o contedo de procedncia da ao direta. nesses termos que voto. DEBATE O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Ministro Carlos Britto, quando do julgamento da liminar, no nos pronunciamos sobre essa questo? O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): O Ministro Nelson Jobim falou exatamente nos termos em que hoje se pronunciou o eminente Ministro Menezes Direito. Agora, j que a Constituio, s expressas, no inciso V do art. 37, diz que os cargos em comisso se destinam apenas s atribuies de direo, chefia e assessoramento usando os trs substantivos , e a resoluo no falou de chefia, mas de direo e assessoramento, achei por bem conciliar com a Constituio e deixarmos claro. A Sra. Ministra Crmen Lcia: porque a chefia pode ser intermediria, no diretiva. Pode ser uma chefia administrativa, quer dizer, no dirige. No entanto, a direo j inclui a chefia. O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Foi s por isso. Da a Corte decidiu pela incluso da palavra chefia. A Sra. Ministra Crmen Lcia: Isso em juzo cautelar? O Sr. Ministro Carlos Britto (Relator): Em juzo cautelar. VOTO A Sra. Ministra Crmen Lcia: Senhor Presidente, de pronto afirmo a minha total concordncia com o Relator, uma vez que no vislumbro qualquer

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mcula de juridicidade que pudesse, de qualquer forma, tisnar a validade constitucional da Resoluo 7, de 14-11-2005, do Conselho Nacional de Justia. Tambm manifesto a minha imparcialidade em relao queles que vierem a ser atingidos pelos efeitos deste julgamento. Como posto na inicial da presente ao, dou como constitucionalmente correto que a) o CNJ detm competncia constitucional para zelar pela observncia do art. 37 da Constituio e apreciar a validade de atos administrativos praticados pelos rgos do Poder Judicirio (CF, art. 103-B, 4, II), pelo que se h de concluir ter ele atuado em sede que lhe prpria; b) o nepotismo prprio no espao pblico no sistema constitucional brasileiro. Tal proibio advm do princpio constitucional da impessoalidade, sendo de se lhe acoplar a moralidade administrativa (art. 37 da Constituio brasileira); c) a juridicidade que obriga o Poder Pblico, em qualquer de suas manifestaes pelos rgos prprios, emana dos comandos constitucionais, no assim de norma infraconstitucional. Os princpios constitucionais aplicam-se a todos os Poderes da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios. O traado histrico brasileiro expe a utilizao dos espaos pblicos pelos interesses privados, do que decorre, em grande parte e que j haveria de ter sido extirpada h muito a manuteno de atuaes nepotistas no Pas. H duas passagens desta histria muito lembradas e que mereceriam aqui citao especial: a primeira, a de que ao final da Carta endereada por Pedro Vaz de Caminha ao Rei de Portugal, dando notcia do descobrimento, j se continha pleito que no poderia ser desconhecido:E, pois que Senhor He certo que asy neeste careguo que leuo como em outra qualquer coussa que de vosso serucio for uosa alteza h de seer de mym mujto seruda, aela peci que por me fazer singular mercee made viyr dajha de Sam thomee Jorge dosoiro meu jenro, o que dela receberey em mujta mercee. Beijo as maos de vossa alteza. Deste porto seguro da vossa jilha de vera cruz oje sesta feita primeiro dia de mayo de 1500.

Dissertando sobre este tema, afirmava ento que, No Brasil, tudo comeou, pois, nesta passagem. O nepotismo desembarcou em terras brasileiras com as primeiras navegaes aqui chegadas. E esta bandeira no parou mais de ser desfraldada (talvez mais certo fosse dizer desfraldada) (Princpios constitucionais da Administrao Pblica. Belo Horizonte: Del Rey, 1993, p. 159). Contra a pessoalidade que assolava em terras brasileiras, sobreveio em 1828 a Lei de 10 de outubro, em cujo art. 38 dispunha:Nenhum vereador poder votar em negcio de seu particular interesse, nem dos seus ascendentes ou descendentes, ou cunhados, enquanto durar o cunhadio. Igualmente no votaro aqueles que jurarem suspeio.

Sob a vigncia da Constituio de 1824, ensinava o grande Pimenta Bueno:

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R.T.J. 215A admisso dos cidados nos cargos pblicos, sem outra diferena que no seja de seus talentos e virtudes, uma bela e lgica consequncia, da igualdade perante a lei. No so, pois, as condies de nascimento, as distines ou prejuzos aristocrticos, e sim a capacidade, as habilitaes, o mrito pessoal, que do a preferncia aos cargos pblicos; uma conquista preciosa da civilizao e da justia, que produz importantes resultados. Primeiramente, bvio que os empregos, que os servios pblicos no podem ser bem desempenhados seno pela capacidade, pelos talentos e virtudes; sem isso os negcios sofrero e a sociedade ter o duplo sacrifcio de contribuir para as respectivas gratificaes e de ver os seis interesses mal dirigidos, sacrificados. Em segundo lugar cumpre reconhecer que os talentos e a probidade, alm das garantias que do, e servios que prestam, so foras naturais e de grande intensidade, pois que dispe de meios, recursos, e de muitas outras foras. (...) A abolio dos privilgios, salva a nica exceo dos que forem essencial e inteiramente exigidos por utilidade ou servios pblicos, uma outra consequncia necessria do justo e til princpio da igualdade perante a lei. Por privilgio em geral, ou na considerao do direito pblico, entende-se toda e qualquer espcie de prerrogativas, vantagens, isenes ou direitos quaisquer concedidos com exceo da lei comum... Consequentemente o privilgio pode expressar-se por uma das seguintes formas: (...) Ter direito superior ou preferncia quando entrar com outros em concorrncia.

(Direito pblico brasileiro e anlise da Constituio do Imprio. Rio de Janeiro: Ministrio dos Negcios Interiores, 1958, p. 412.) A Repblica veio reforar todas as formas de ingresso no servio pblico sem que o critrio nico do mrito atestado em concurso pblico no qual se garante a efetividade do direito igualdade fosse regra incontrastvel. Entretanto, parece que no h compreenso de que no h Repblica sem repblicos, nem h igualdade onde o personalismo prospera. Os princpios estampados no art. 37 da Constituio brasileira de 1988 erigiram ao nvel fundamental e de maneira expressa o que se continha na legislao brasileira (de se lembrar, entre outras, a Lei 4.717, de 1965 lei de ao popular), que rompe a presuno de legitimidade dos atos administrados quando se cuide de nomeao sem concurso pblico, mxime em se cuidando de parentes. E a legislao eleitoral, que, com fundamento constitucional, vem impedindo, desde a dcada de 30 de sculo passado, candidaturas de parentes. Tudo a demonstrar que os fundamentos constitucionais no permitem o parentesco como fonte ou critrio de admisso no servio pblico, sequer em cargo dito de confiana, que confiana a se pe na qualificao do candidato e no na qualidade do nome por ele ostentado. Nem precisaria haver princpio expresso quer da impessoalidade, quer da moralidade administrativa para que se chegasse ao reconhecimento da constitucionalidade das proibies de contratao de parentes para os cargos pblicos. Bastaria que se tivesse em mente a tica democrtica e a exigncia republicana,

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contidas no art. 1, da Constituio, para se impor a proibio de maneira definitiva, direta e imediata a todos os Poderes da Repblica. Do que decorre ntida a competncia do Conselho Nacional de Justia para fiscalizar a efetividade dos princpios constitucionais da administrao pblica, exatamente nos termos do art. 103-B, 4, II, da Constituio da Repblica. Acompanho o eminente Ministro Relator. VOTO O Sr. Ministro Marco Aurlio: Presidente, quanto legitimidade da Associao dos Magistrados do Brasil, assento a pertinncia temtica. Aqueles que esto congregados, os agentes pblicos, tm interesse em certo balizamento, considerada a administrao dos tribunais. No mais, Presidente, reporto-me ao voto que proferi na ADI 1.521-4, referida quando da apreciao do pedido de concesso de medida acauteladora. A partir do momento em que a Corte consignou que o ato editado pelo Conselho Nacional de Justia um ato normativo abstrato autnomo isso j est decidido pelo menos neste caso, e deixo para rediscutir a matria em outro processo , tendo, portanto, o Conselho a competncia legiferante, concluo pela constitucionalidade, sem qualquer acrscimo, sem interpretao conforme. Adiro colocao do ministro Menezes Direito, votando pela constitucionalidade da Resoluo editada. VOTO O Sr. Ministro Ricardo Lewandowski: Senhor Presidente, primeiramente gostaria de cumprimentar o eminente Ministro Carlos Britto pelo brilhante voto que deu na sequncia do voto que proferiu na cautelar no ano de 2006. Comungo com Sua Excelncia no entendimento de que os princpios que esto inseridos no caput do art. 37, sobretudo o princpio da impessoalidade, da moralidade e da eficincia, so autoaplicveis no que diz respeito vedao ao nepotismo. Eu farei uma exposio mais verticalizada acerca do tema no voto que proferirei em seguida no RE 579.951. Entendo tambm que a edio da Resoluo 7, de 2005, insere-se na competncia do Conselho Nacional de Justia. Isso porque o art. 103-B da Constituio, em seu 4, inciso I, estabelece, com todas as letras, que: 4 Compete ao Conselho (...) I zelar pela autonomia do Poder Judicirio e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares (...).

Ento, a Resoluo 7, de 2005, nada mais fez do que regulamentar, no mbito no Poder Judicirio, aquilo que se contm nos princpios do art. 37, caput, da Constituio Federal.

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E mais. Em nenhum momento, o Conselho Nacional de Justia extrapolou a sua competncia, ouso dizer, porque, no mesmo 4, o inciso II estabelece, com toda a clareza e com todas as letras, que compete, tambm, a esse rgo:II zelar pela observncia do art. 37 (...).

Portanto, ao editar a Resoluo 7, nada mais fez o Conselho Nacional de Justia do que exercer o seu poder regulamentar, expedindo ato apropriado, exatamente dentro de seu mbito de competncia que, dentre outras atribuies, consta essa incumbncia de zelar pela estrita observncia do que se contm no art. 37. Portanto, acompanho integralmente o voto do eminente Relator. VOTO O Sr. Ministro Eros Grau: Senhor Presidente, tambm vou acompanhar o voto do Relator. Quero fazer aluso bela sustentao feita pelo Professor Barroso, e apenas, dando a Csar o que de Csar, observar que no precisaramos ter ido doutrina estrangeira para falar no princpio da juridicidade, porque, j em 1990, num livro da Professora Crmen Lcia, tudo que foi dito depois a respeito dessa matria da extravaso, digamos assim, da legalidade est l no primeiro captulo desse livro. VOTO O Sr. Ministro Cezar Peluso: Senhor Presidente, tambm acompanho o voto do eminente Relator e peo vnia para fazer incluir no acrdo a declarao de voto que oralmente j tinha proferido no julgamento da liminar, ao qual, creio, nada precisa ser acrescentado. Estou de acordo com que, para efeito de explicitao, conste a palavra chefia em relao ao servidor que a fonte da incompatibilidade, porque os incisos III e IV do art. 2 da Resoluo falam apenas em servidor investido em cargo de direo ou de assessoramento. Penso que seria bom constasse de direo, chefia ou assessoramento. VOTO O Sr. Ministro Celso de Mello: Reafirmo, Senhor Presidente, o teor do voto queproferi quando do julgamento, peloPlenrio desta Suprema Corte, do pedido de medida cautelar formulado na presente sede de fiscalizao normativa abstrata. E, ao reiterar os fundamentos que deram suporte ao meu voto, desejo expressar o meu entendimento de que o Conselho Nacional de Justia dispe de competncia constitucional paraformular, de modo inteiramente legtimo, aresoluo cuja constitucionalidade se busca confirmar nesta sede de controle normativo abstrato.

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Na realidade, a Resoluo CNJ 7/2005 traduz emanao direta do que prescreve aprpria Constituio da Repblica, considerados, notadamente, para esse efeito, almdaregradecompetncia fundada no art. 103-B, 4, inciso II, do texto constitucional, ospostulados da impessoalidade e da moralidade querepre sentamvaloresessenciais na conformao das atividades do poder. Sabemostodos que a atividade estatal, qualquer que seja o domnio institucional de sua incidncia, estnecessariamentesubordinada observncia de parmetros tico-jurdicos queserefletem na consagrao constitucional do princpio da moralidade administrativa, quesequalifica como valor constitucional impregnado de substrato tico eerigido condio de vetor fundamental no processo de poder, condicionando, de modo estrito, oexerccio, pelo Estado e por seus agentes, da autoridade que lhes foi outorgada pelo ordenamento normativo. Essepostulado, que rege a atuao do Poder Pblico, confere substncia e dexpresso a uma pauta de valores ticos, nosquais se funda a prpria ordem positiva do Estado. poressarazo que o princpio constitucional da moralidade administrativa, aoimporlimitaes ao exerccio do poder estatal, legitimaocontrole de todos os atos do poder pblico quetransgridam os valores ticos quedevem pautar o comportamento dos rgos e dos agentes governamentais, noimpor tando em que instncia de poder eles se situem. Na realidade e especialmente a partir da Constituio republicana de 1988 , a estrita observncia do postulado da moralidade administrativa passoua qualificarsecomopressupostodevalidade dos atos que, fundados ou no em competncia discricionria, tenhamemanado de autoridade ou rgos do Poder Pblico, consoante proclama autorizado magistrio doutrinrio (MANOEL DE OLIVEIRA FRANCO SOBRINHO, oPrincpioConstitucionaldamoralidade Administrativa, 2. ed., 1993, Genesis; ALEXANDRE DE MORAES, DireitoConstitucional, p. 284, item 2.3, 3. ed., 1998, Atlas; LCIA VALLE FIGUEIREDO, Curso de DireitoAdministrativo, p. 132/134, 2. ed., 1995, Malheiros; CELSO ANTNIO BANDEIRA DE MELLO, Curso de Direito Administrativo, p. 412/414, itens 14/16, 4. ed., 1993, Malheiros; HELy LOPES MEIRELLES, DireitoAdministrativo Brasileiro, p. 83/85, 17. ed., 1992, Malheiros; MARIA SyLVIA ZANELLA DE PIETRO, Discricionariedade AdministrativanaConstituiode1988, p. 116/118, item 2.5, 1991, Atlas, v.g.). Caberelembrar, neste ponto, Senhor Presidente, oaltosignificado que o princpio da moralidade assume, em nosso sistema constitucional, talcomo esta Suprema Corte jteveoensejo de enfatizar:O PRINCPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA ENQUANTO VALOR CONSTITUCIONAL REVESTIDO DE CARTER TICO-JURDICO CONDICIONA A LEGITIMIDADE E A VALIDADE DOS ATOS ESTATAIS. A atividade estatal, qualquer que seja o domnio institucional de sua incidncia, est necessariamente subordinada observncia de parmetros tico-jurdicos que se refletem na consagrao constitucional do princpio da moralidade

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R.T.J. 215administrativa. Esse postulado fundamental, que rege a atuao do Poder Pblico, confere substncia e d expresso a uma pauta de valores ticos sobre os quais se funda a ordem positiva do Estado. O princpio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitaes ao exerccio do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Pblico que transgridam os valores ticos que devem pautar o comportamento dos agentes e rgos governamentais. (...).

(RTJ182/525526, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno.)

A prtica do nepotismo, tal como corretamente repelida pela Resoluo CNJ 7/2005, traduz aprpriaanttese da pauta de valores cujo substrato constitucional repousa no postulado da moralidade administrativa, que no tolera porque incompatvel com o esprito republicano e com a essncia da ordem democrtica oexerccio do poder pro domo sua. Tambmnovislumbro, de outro lado, Senhor Presidente, nalinhado que acentuado pelo eminente Relator, a ocorrncia de qualquer transgres so ao postulado da separao de Poderes e ao princpio federativo, tal como estaCorte j acentuara, quandodojulgamentodaADI3.367/DF, de que foi Relator o Ministro CEZAR PELUSO, emdecisoquereconheceu considerados os lineamentos constitucionais que definem a organizao do Conselho Nacional de Justia tratarse de rgo posicionado naprpria estrutura institucional do Poder Judicirio, projetandose, em consequncia, comoeste, em uma dimenso de carter nacional, achandoseinvestido, constitucionalmente, de atribuies quelheconferem a prerrogativa de exercer, mediante deliberaes tpicas, poderes normativos cuja gnese emana, diretamente, do prprio texto da Constituio, permitindolhe, desse modo, ocontrolelegtimo da atividade administrativa e financeira do Poder Judicirio. Tratase, pois, de atribuio cuja legitimidade jurdica traduz expresso que deriva, demododireto, do prprio texto da Lei Fundamental equeencon tra, na Constituio, o seu fundamento de validade e de eficcia. Esta Suprema Corte, Senhor Presidente, ao manter a Resoluo CNJ 7/2005, confirmandolhe a plena legitimidade e integral eficcia, nada mais estar fazendo senopreservaraforanormativa da Constituio da Repblica resultante da indiscutvel supremacia, formal e material, de que se revestem as normas constitucionais, cuja integridade, eficcia e aplicabilidade, por isso mesmo, hodeservalorizadas emface de sua precedncia, de sua autoridade e de seu grau hierrquico. Vale referir, neste ponto, que a discusso das questes suscitadas nesta sede de fiscalizao normativa abstrata permite, a esta Suprema Corte, elaborar comotpico dos Tribunais Constitucionais aconstruo de um significado mais amplo em torno do conceito de Constituio, considerando, para esse efeito, no apenas os preceitos de ndole positiva, expressamente proclamados no documento formal que consubstancia o texto escrito da Carta Poltica, mas reconhecendo, por igualmente relevantes, em face de sua transcendn

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ciamesma, os valores de carter suprapositivo, os princpios ticos e o prprio esprito que informam e do sentido e razo Lei Fundamental do Estado. No foi por outra razo que o Supremo Tribunal Federal, certa vez, e para alm de uma perspectiva meramente reducionista, veio a proclamar, distanciando-se, ento, das exigncias inerentes ao positivismo jurdico, que a ConstituiodaRepblica, muito mais do que o conjunto de normas e princpios nela formalmente positivados, hdesertambmentendida em funo do prprio esprito que a anima, afastandose, desse modo, deumaconcepoimpreg nada de evidente minimalismo conceitual (RTJ 71/289, 292 RTJ77/657). Tratandose de fiscalizao normativa abstrata, a questo pertinente noo conceitual de parametricidade vale dizer, do atributo que permite outorgar, clusula constitucional, a qualidade de paradigma de controle desempenha papel de fundamental importncia na admissibilidade, ou no, da prpria ao direta (ou da ao declaratria de constitucionalidade, comona espcie), consoantejenfatizado pelo Plenrio do Supremo Tribunal Federal (RTJ176/10191020, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Issosignifica, portanto, que aideiadeinconstitucionalidade(ou de constitucionalidade), por encerrar um conceito de relao (JORGE MIRANDA, manual de Direito Constitucional, tomo II, p. 273/274, item 69, 2. ed., Coimbra Editora Limitada) que supe, por isso mesmo, o exame da compatibilidade vertical de um ato, dotado de menor hierarquia, comaqueleque se qualifica como fundamento de sua existncia, validade e eficcia tornaessencial, para esse especfico efeito, aidentificaodoparmetrodeconfronto, que se destina a possibilitar a verificao, in abstracto, da legitimidade constitucional de certa regra de direito positivo, asernecessariamentecotejada em face da clusula invocada como referncia paradigmtica. Abuscadoparadigmadeconfronto, portanto, significa, em ltima anlise, aprocura de um padro de cotejo, que, ainda emregimedevignciatem poral,permita, ao intrprete, oexamedafidelidadehierrquiconormativa de determinado ato estatal contestado em face da Constituio. Peseemevidncia, desse modo, oelementoconceitual, que consiste na determinaodaprpriaideia de Constituio enadefinio das premissas jurdicas, polticas e ideolgicas que lhe do consistncia. por tal motivo que os tratadistas consoante observa Jorge Xifra Heras (Curso de Derecho Constitucional, p. 43) -, em vez de formularem um conceito nico de Constituio, costumam referirse a uma pluralidade de acepes, dandoensejo elaborao terica do conceito deblocodecons titucionalidade (que atuar como parmetro constitucional), cujosignificado revestido de maior ou de menor abrangncia material projetase, tal seja o sentido que se lhe d, para alm da totalidade das regras constitucionais meramente escritas e dos princpios contemplados, explicita ou implicitamente, nocorponormativo da prpria Constituio formal, chegando, at mesmo, a compreendernormasdecarterinfraconstitucional, desde que vocacionadas

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a desenvolver, em toda a sua plenitude, a eficcia dos postulados e dos preceitos inscritos na Lei Fundamental, viabilizando, desse modo, eemfuno de perspectivas conceituais maisamplas, a concretizao da ideia de ordem constitucional global. Sob tal perspectiva, que acolhe conceitos mltiplos de Constituio, pluralizase a noo mesma de constitucionalidade/inconstitucionalidade, em decorrncia de formulaes tericas, matizadas por vises jurdicas e ideolgicas distintas, que culminam por determinar quer elastecendo-as, quer restringindo-as as prprias referncias paradigmticas conformadoras do significado e do contedo material inerentes Carta Poltica. Tornaserelevante destacar, neste ponto, por tal razo, omagistrio de J. J. Gomes Canotilho (Direito Constitucional eTeoria da Constituio, p. 811/812, item 1, 1998, Almedina), quebemexpsanecessidade de procederse determinao do parmetro decontrole da constitucionalidade, considera dasasposiesdoutrinrias que se digladiam em torno do tema:Todos os actos normativos devem estar em conformidade com a Constituio (art. 3/3). Significa isto que os actos legislativos e restantes actos normativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao parmetro constitucional. Mas qual o estalo normativo de acordo com o qual se deve controlar a conformidade dos actos normativos? As respostasa este problema oscilam fundamentalmente entreduasposies: (1) o parmetrocons titucionalequivale constituioescrita ou leis com valor constitucional formal, e da que a conformidade dos actos normativos s possa ser aferida, sob o ponto de vista da sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade, segundo as normas e princpios escritos da constituio (ou de outras leis formalmente constitucionais); (2) o parmetroconstitucional aordemconstitucionalglobal, e, por isso, o juzo de legitimidade constitucional dos actos normativos deve fazer-se noape nas segundo as normas e princpios escritos das leis constitucionais, mastambm tendo em conta princpios noescritos integrantes da ordem constitucional global. Na perspectiva (1), o parmetro da constitucionalidade (=normas de referncia, bloco de constitucionalidade) reduzse s normas e princpios da constituio e das leis com valor constitucional; paraaposio(2), o parmetro constitucional maisvastodo que as normas e princpios constantes das leis constitucionais escritas, devendo alargarse, pelo menos, aos princpios reclamados pelo esprito ou pelos valores que informam a ordem constitucionalglobal.

(Grifei.) Vejase, pois, a importncia de compreenderse, com exatido, o sig nificado que emerge da noo de bloco de constitucionalidade tal como este concebido pela teoria constitucional (BERNARDO LENCIO MOURA COELHO, o Bloco de Constitucionalidade e a Proteo Criana, in Revista de Informao Legislativa123/259-266, 263/264, 1994, Senado Federal; MIGUEL MONTORO PUERTO, Jurisdiccin Constitucional y Procesos Constitucionales, tomo I, p. 193/195, 1991, Colex; FRANCISCO CAAMAO DOMNGUEZ/ANGEL J. GMEZ MONTORO/MANUEL MEDINA GUERRERO/JUAN LUIS REQUEJO PAGS, Jurisdiccin y

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Procesos Constitucionales, p. 33/35, item C, 1997, Berdejo; IGNACIO DE OTTO, Derecho Constitucional, Sistema de Fuentes, p. 94/95, 25, 2. ed./2. reimpresso, 1991, Ariel; LOUIS FAVOREU/FRANCISCO RUBIO LLORENTE, Elbloquedelaconstitucionalidad, p. 95/109, itens I e II, 1991, Civitas; JOS ALFREDO DE OLIVEIRA BARACHO, o Princpio da Subsidiariedade:ConceitoeEvoluo, p. 77/81, 2000, Forense; DOMINIQUE TURPIN, Contentieux Constitutionnel, p. 55/56, item n. 43, 1986, Presses Universitaires de France, v.g.) , pois, dessa percepo, resultar, em ltima anlise, a determinao do que venha a ser o paradigmadeconfronto, cujadefi nio mostra-se essencial, em sede de controle de constitucionalidade, prpria tutela da ordem constitucional. Earazodetalafirmaojustificaseporsimesma, eisque a delimitao conceitual doquerepresenta o parmetro de confronto quedeterminar, em ltima anlise, aprprianoo do que constitucional ou do que inconstitucional, consideradaaeficciasubordinante dos elementos referenciais que compem o bloco de constitucionalidade, conformetiveoensejodeassinalar em deciso proferida nesta Suprema Corte:AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INSTRUMENTO DE AFIRMAO DA SUPREMACIA DA ORDEM CONSTITUCIONAL. O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMO LEGISLADOR NEGATIVO. A NOO DE CONSTITUCIONALIDADE/ /INCONSTITUCIONALIDADE COMO CONCEITO DE RELAO. A QUESTO PERTINENTE AO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE. POSIES DOUTRINRIAS DIVERGENTES EM TORNO DO SEU CONTEDO. O SIGNIFICADO DO BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE COMO FATOR DETERMINANTE DO CARTER CONSTITUCIONAL, OU NO, DOS ATOS ESTATAIS. (...). A definio do significado de bloco de constitucionalidade independentemente da abrangncia material que se lhe reconhea reveste-se de fundamental importncia no processo de fiscalizao normativa abstrata, pois a exata qualificao conceitual dessa categoria jurdica projeta-se como fator determinante do carter constitucional, ou no, dos atos estatais contestados em face da Carta Poltica. (...).

(ADI595/ES, Rel. Min. CELSO DE MELLO, in Informativo/STF 258, de 2002.)

Tenhoparamim, Senhor Presidente, consideradas as razes que venho de expor, queaResoluoCNJ7, de 2005, prestou efetiva reverncia ao texto da Constituio Federal, revelandosefiel aos grandes princpios fundadosna ticarepublicanaeconsagradosnaCartaPolticadoBrasil. No custa rememorar, neste ponto, tal como pude acentuar, em voto que proferi no julgamento daADI 1.521/RS, Rel. Min. MARCO AURLIO (RTJ 173/424, 439), queaconceporepublicana depoder mostra-se absolutamente incompatvel com qualquer prtica governamental tendente a restaurar a inaceitvel teoria do Estado patrimonial. Sabemos que o Estado, no exerccio das atividades que lhe so inerentes, inclusive na esfera institucional do Poder Judicirio, nopodeignorar os

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princpios essenciais, que, derivando da constelao axiolgica que confere substrato tico s aes do Poder Pblico, proclamam que as funes governamentais, noimporta se no mbito do Poder Executivo, no mbito do Poder Legislativo ounodomnio do Poder Judicirio, hodeserexercidas com estrita observncia dos postulados da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa. Essesprincpios, erigidos condio de valores fundamentais pela Carta Poltica eaosquais o Conselho Nacional de Justia se mostrou extremamente fiel na Resoluo ora em exame, representam pauta de observncia necessria por parte dos rgos estatais, especialmente por parte dos rgos do Poder Judicirio. mais do que isso, Senhor Presidente, tais postulados qualificam-se como diretrizes essenciais quedosubstnciaesignificadorepulsa que busca fazer prevalecer, nombito do aparelho de Estado, osentidoreal da ideia republicana, que no tolera prticas e costumes administrativos tendentes a confundir o espao pblico com a dimenso pessoal do governante, emclaro desvio de carter tico-jurdico. Comoobjetivodeproteger valores fundamentais, Senhor Presidente, tais como se qualificam aqueles consagrados nos princpios da transparncia, da igualdade, da moralidade e da impessoalidade, oConselhoNacionaldeJustia, na Resoluo 7/2005, definiu, a meu juzo, demodocompatvel com o sistema constitucional, normas destinadas aobstar a formao de grupos familiares cuja atuao facilitada pelas nomeaes em comisso ou por designaes para funes de confiana acaba, virtualmente, porpatrimonializar o poder governamental, con vertendoo, em razo de uma inadmissvel inverso dos postulados republicanos, emverdadeira res domestica, degradandoo, assim, condiosubalterna de instrumento de mera dominao do Estado, vocacionado, no a servir ao interesse pblico e ao bem comum, mas, antes, a atuar comoincompreensveleinaceitvel meio de satisfazer convenincias pessoais e de realizar aspiraes particulares. A teleologia da Resoluo CNJ 7/2005 derivadanecessidade mesma de consolidarse a ordem democrtica em nosso Pas, justificandose, plenamente, em face de seus altos propsitos. Tenhoparamim, analisada a questo sob essa perspectiva, que se impe fazer essencial distino entreoespaopblico, de um lado, eoespaopri vado, de outro, emordemaobstar que os indivduos, mediante ilegtima apropriao, culminem por incorporar, aombito de seus interesses particulares, a esfera de domnio institucional do Estado, marginalizando, como consequncia desse gesto deindevida patrimonializao, oconcursodosdemaiscidados na edificao da res publica. Da a reflexo doutrinria, impregnada de acentuado componente filosfico, que examina o pensamento democrtico luz das grandes dicotomias, como, por exemplo, aquela pertinente dualidade pblico/privado, subjacente ideia mesma dequeorespeito, pelos indivduos, aoslimitesquedefinem o domnio pblico de atuao do Estado, separandoo, de modo ntido, do espao

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meramente privado, qualificase como pressuposto necessrio ao exerccio da cidadania e do pluralismo poltico, querepresentam, enquanto categorias essenciais que so (poisdonfase prtica da igualdade, do dilogo, da tolerncia e da liberdade), algunsdosfundamentos em que se estrutura, em nosso sistema institucional, o Estado republicano e democrtico (CF, art. 1, incisos II e V). Cabe preservar, desse modo, as relaes que os conceitos de espao pblico e de espao privado guardam entre si, para que tais noes no se deformem nem provoquem a subverso dos fins tico-jurdicos visados pelo legislador constituinte. Aconsagraodonepotismo na esfera institucional do poder poltico no podesertolerada, sob pena de o processo de governo quehdeser impessoal, transparente e fundado em bases ticas serconduzido a verdadeiro retrocesso histrico, oqueconstituir, na perspectiva da atualizao e modernizao do aparelho de Estado, situaodetodoinaceitvel. o fato um s, Senhor Presidente: quem tem o poder e a fora do Estado, em suas mos, notem o direito de exercer, emseu prpriobenefcio, a autoridade que lhe conferida pelas leis da Repblica. o nepotismo, alm de refletir umgestoilegtimo de dominao patrimonial do Estado, desrespeita ospostuladosrepublicanos da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa. EestaSupremaCorte, Senhor Presidente, nopodepermane cerindiferenteatogravestransgresses da ordem constitucional. Porissomesmo, Senhor Presidente, e com estas consideraes, acompa nho o doutssimo voto proferido pelo eminente Ministro CARLOS BRITTO, eisqueconsideroplenamentelegtima, sob uma perspectiva de ndole estrita mente constitucional, aResoluo7/2005, que o Conselho Nacional de Justia editoucomoobjetivodebanir, definitivamente, de nossos costumes administrativos, nombito do Poder Judicirio, aprticainaceitveldonepotismo. omeuvoto. VOTO O Sr. Ministro Gilmar Mendes (Presidente): Tambm, na linha do voto proferido, manifesto-me no sentido de acompanhar, integralmente, o brilhante voto proferido pelo Ministro Carlos Britto. Estou fazendo juntar as razes que j constaram do voto proferido na cautelar, superadas as questes preliminares suscitadas. E, no mrito, estou subscrevendo integralmente o judicioso voto de Sua Excelncia, inclusive no que concerne interpretao conforme, tendo em vista a necessidade de que ns no tenhamos aqui qualquer risco, qualquer dvida, qualquer possibilidade de evaso da interpretao fixada pelo Supremo Tribunal Federal. Entendo bem as razes aqui colocadas pelo Ministro Carlos Alberto Direito e, agora, seguidas pelo Ministro Marco Aurlio, mas, diante do esforo

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que o Tribunal faz no julgamento desta ao declaratria, o ideal que no haja descumprimento da deciso. Por essas razes, tambm acompanho o voto de Sua Excelncia s inteiras. EXTRATO DA ATA ADC 12/DF Relator: Ministro Carlos Britto. Requerentes: Associao dos Magistrados Brasileiros AMB (Advogados: Lus Roberto Barroso e outros). Requerido: Conselho Nacional de Justia. Interessados: Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico da Unio no Distrito Federal SINDJUS/DF (Advogados: Rudi Meire Cassel e outro), Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro (Advogados: Fellippe Zeraik e outros), Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (Advogados: Maurcio Gentil Monteiro e outros e Rafael Barbosa de Castilho), Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho ANAMATRA (Advogados: Alberto Pavie Ribeiro e outros), Federao Nacional dos Trabalhadores do Judicirio Federal e Ministrio Pblico da Unio FENAJUFE (Advogados: Pedro Maurcio Pita Machado e outros) e Associao Nacional dos Magistrados Estaduais ANAMAGES (Advogados: Gustavo Alexandre Magalhes e outro). Deciso: Acolhida questo de ordem proposta pelo Ministro Marco Aurlio no sentido de fazer constar a rejeio da preliminar de inadequao da ao declaratria de constitucionalidade que suscitou quando do julgamento da cautelar, ocasio em que Sua Excelncia restou vencido. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por unanimidade, julgou procedente a ao declaratria de constitucionalidade e, por maioria, emprestou interpretao conforme a Constituio para deduzir a funo de chefia do substantivo direo, constante dos incisos II, III, IV e V do art. 2 da Resoluo 7, de 18-10-2005, do Conselho Nacional de Justia, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Menezes Direito e Marco Aurlio. Deciso dotada de efeito vinculante, nos termos da Lei 9.868/1999. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, a Ministra Ellen Gracie e o Ministro Joaquim Barbosa. Falaram, pela requerente, Associao dos Magistrados Brasileiros (AMB), o Professor Lus Roberto Barroso; pela amicus curiae, Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho (ANAMATRA), o Doutor Alberto Pavie Ribeiro e, pelo Ministrio Pblico Federal, o Procurador-Geral da Repblica, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Presidncia do Ministro Gilmar Mendes. Presentes sesso os Ministros Celso de Mello, Marco Aurlio, Cezar Peluso, Carlos Britto, Eros Grau, Ricardo Lewandowski, Crmen Lcia e Menezes Direito. Procurador-Geral da Repblica, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza. Braslia, 20 de agosto de 2008 Luiz Tomimatsu, Secretrio.

R.T.J. 215 ARGuIoDEDESCumPRImENToDE PRECEIToFuNDAmENTAL144DF

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Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello Arguente: Associao dos Magistrados Brasileiros AMB Arguido: Tribunal Superior Eleitoral Interessados: Associao Nacional dos Membros do Ministrio Pblico CONAMP, Associao Nacional dos Procuradores da Repblica ANPR, Partido Progressista PP e Associao dos Juzes Federais do Brasil AJUFE Arguio de descumprimento de preceito fundamental Possibilidade de ministros do STF, com assento noTSE, partici paremdojulgamentodaarguiodedescumprimentodepreceito fundamentalInocorrnciadeincompatibilidadeprocessual,ainda que o Presidente doTSE haja prestado informaes na causa Reconhecimento da legitimidade ativa ad causam daAssociao dos magistrados Brasileiros Existncia, quanto a ela, do vn culo de pertinncia temtica Admissibilidade do ajuizamento de arguio de descumprimento de preceito fundamental contra interpretaojudicialdequepossaresultarlesoapreceitofun damentalExistnciadecontrovrsiarelevantenaespcie,ainda quenecessriasuademonstraoapenasnasarguiesdedescum primentodecarterincidentalobservncia,ainda,nocaso,do postulado da subsidiariedade mrito: relao entre processos judiciais,semqueneleshajacondenaoirrecorrvel,eoexerc cio, pelo cidado, da capacidade eleitoral passiva Registro de candidato contra quem foram instaurados procedimentos judi ciais,notadamenteaquelesdenaturezacriminal,emcujombito aindanoexistasentenacondenatriacomtrnsitoemjulgado Impossibilidade constitucional de definirse, como causa de ine legibilidade, a mera instaurao, contra o candidato, de proce dimentos judiciais, quando inocorrente condenao criminal transitada em julgado Probidade administrativa, moralidade para o exerccio do mandato eletivo, vita anteacta e presuno constitucional de inocncia Suspenso de direitos polticos e imprescindibilidade, para esse efeito, do trnsito em julgado da condenao criminal (CF, art. 15, III) Reao, no ponto, da Constituio democrtica de 1988 ordem autoritria que pre valeceusoboregimemilitarCarterautocrticodaclusulade inelegibilidadefundadanaLC5/1970(art.1,I,n),quetornava inelegvelqualquerrucontraquemfosserecebidadennciapor suposta prtica de determinados ilcitos penais Derrogao dessa clusula pelo prprio regime militar (LC 42/1982), que passou a exigir, para fins de inelegibilidade do candidato, a existncia, contra ele, de condenao penal por determinados

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R.T.J. 215 delitos Entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre o alcance da LC 42/1982: necessidade de que se achasse configu rado o trnsito em julgado da condenao (RE 99.069/BA, Rel. min.oscarCorra)Presunoconstitucionaldeinocncia:um direito fundamental que assiste a qualquer pessoa Evoluo histricaeregimejurdicodoprincpiodoestadodeinocncia otratamentodispensadopresunodeinocnciapelasdeclara es internacionais de direitos e liberdades fundamentais, tanto asdecarterregionalquantoasdenaturezaglobaloprocesso penalcomodomniomaisexpressivodeincidnciadapresuno constitucionaldeinocnciaEficciairradiantedapresunode inocnciaPossibilidadedeextensodesseprincpioaombitodo processoeleitoralHiptesesdeinelegibilidadeEnumeraoem mbitoconstitucional(CF,art.14,4a8)Reconhecimento, noentanto,dafaculdadedeoCongressoNacional,emsedelegal, definiroutroscasosdeinelegibilidadeNecessriaobservncia, em tal situao, da reserva constitucional de lei complementar (CF,art.14,9)Impossibilidade,contudo,dealeicomplemen tar, mesmo com apoio no 9 do art. 14 da Constituio, trans gredir a presuno constitucional de inocncia, que se qualifica como valor fundamental, verdadeiro cornerstone em que se es truturaosistemaqueanossacartapolticaconsagraemrespeito aoregimedasliberdadeseemdefesadaprpriapreservaoda ordem democrtica Privao da capacidade eleitoral passiva e processos, de natureza civil, por improbidade administrativa Necessidade, tambm em tal hiptese, de condenao irrecorr vel Compatibilidade da Lei 8.429/1992 (art. 20, caput) com a ConstituioFederal(art.15,V,c/coart.37,4)osignificado polticoeovalorjurdicodaexignciadacoisajulgadaReleitura, peloTribunalSuperiorEleitoral,daSmula1/TSE,comoobje tivodeinibiroafastamentoindiscriminadodaclusuladeinelegi bilidadefundadanaLC64/1990(art.1,I,g)Novainterpretao quereforaaexignciaticojurdicadeprobidadeadministrativa edemoralidadeparaoexercciodemandatoeletivoArguiode descumprimentodepreceitofundamentaljulgadaimprocedente, emdecisorevestidadeefeitovinculante. ACRDO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sesso plenria, sob a Presidncia do Ministro Gilmar Mendes, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigrficas, por unanimidade de votos, em acolher a questo de ordem suscitada pelo Ministro Celso de Mello (Relator), no sentido de julgar, desde logo, o mrito da arguio de descumprimento de preceito fundamental. Em consequncia do acolhimento

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desta questo de ordem, o Procurador-Geral da Repblica, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, proferiu, oralmente, parecer na presente sesso. Em seguida, o Tribunal, por maioria, vencidos os Ministros Marco Aurlio, Menezes Direito e Eros Grau, reconheceu a legitimidade da Associao dos Magistrados Brasileiros (AMB), rejeitando, por unanimidade, as demais preliminares suscitadas. No mrito, o Tribunal, por maioria, vencidos os Ministros Carlos Britto e Joaquim Barbosa, julgou improcedente a arguio de descumprimento de preceito fundamental, nos termos do voto do Relator, deciso esta dotada de efeito vinculante, segundo a Lei 9.882/1999. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Falaram: pela arguente, Associao dos Magistrados Brasileiros (AMB), o Dr. Alberto Pavie Ribeiro; pelo amicus curiae, Partido Progressista (PP), o Dr. Marcus Vinicius Furtado Coelho; e pela Advocacia-Geral da Unio, o Ministro Jos Antonio Dias Toffoli. O Relator comunicou ao Plenrio que, em decorrncia de pedido, somente nesta data formulado, admitiu a Associao dos Juzes Federais do Brasil (AJUFE) como amicus curiae. Braslia, 6 de agosto de 2008 Celso de Mello, Relator. VOTO (Explicao) O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Senhor Presidente, h um pedido que me veio s mos somente agora, formulado pela Associao dos Juzes Federais, requerendo a sua interveno, nestes autos, como amicus curiae. Nos termos das decises anteriores, tambm admito essa entidade de classe, inclusive para efeito de sustentao oral, de tal modo que ela passar a figurar, formalmente, como interessada. VOTO (Sobre questo de ordem) O Sr. Ministro Celso de Mello (Relator): Senhor Presidente, em questo de ordem, proponho, ao Tribunal, desde que todos concordem, inclusive a Associao dos Magistrados Brasileiros e o Senhor Procurador-Geral da Repblica, quejulguemos, desde logo, omrito da controvrsia, encerrando, assim, defi nitivamente, o debate em torno da matria suscitada na presente sede processual. observo que os rgos de que emanou a LC 64/1990, tanto quanto o E. Tribunal Superior Eleitoral, intervieram, formalmente, nestes autos, produ zindo informaes ediscutindo no apenas aspectos pertinentes ao provimento cautelar, masdebatendo, tambm, oprprio fundo da controvrsia. RELATRIO O Sr. Ministro Celso de Mello: Tratasede arguio de descumprimento de preceito fundamental, ajuizada pela Associao dos Magistrados Brasileiros

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(AMB), naqualsepostula sejadeclarada, pelo Supremo Tribunal Federal, a norecepo de parte das alneas d, e, g e h do inciso I, do art. 1, e parte do art. 15, todos da LC 64, de 18 de maio de 1990 (fl. 2 Grifei). Sustentase, ainda, napresente sede de controle normativo abstrato, que No pode mais a Justia Eleitoral ficar obstada (a) quer diante do entendimento adotado pelo eg. TSE, nosentido de que no seria autoaplicvel o 9 do art. 14 da CF diga-se e repita-se, em apertada maioria (b) quer diante da autoaplicabilidade do 9 do art. 14 da CF em razo de a ECR 4/1994 ter revogado parte das exigncias contidas nas alneas d, e, g e h do inciso I, do art. 1, e no art. 15, todos da LC 64/1990, quanto ao exerccio de sua competncia constitucional para promover o exame da vida pregressa dos candidatos (fl. 32 Grifei). Eis asregraslegais, que, constantesda LC 64/1990, constituem objeto dapresente arguio de descumprimento:Art. 1 So inelegveis: I para qualquer cargo: (...) d) os que tenham contra sua pessoa representao julgada procedente pela Justia Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apurao de abuso do poder econmico ou poltico, para a eleio na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (trs) anos seguintes; e) os que forem condenados criminalmente, com sentena transitada em julgado, pela prtica de crime contra a economia popular, a f pblica, a administrao pblica, o patrimnio pblico, o mercado financeiro, pelo trfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (trs) anos, aps o cumprimento da pena; (...) g) os que tiverem suas contas relativas ao exerccio de cargos ou funes pblicas rejeitadas por irregularidade insanvel e por deciso irrecorrvel do rgo competente, salvo se a questo houver sido ou estiver sendo submetida apreciao do PoderJudicirio, para as eleies que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da deciso; h) os detentores de cargo na administrao pblica direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econmico ou poltico apurado em processo, com sentena transitada em julgado, para as eleies que se realizarem nos3(trs) anos seguintes ao trmino do seu mandato ou do perodo de sua permanncia no cargo; (...) Art. 15. Transitada em julgado a deciso que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe- negado registro, ou cancelado, se j tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se j expedido.

(Grifei.) A ora arguente, embora no impugne a Smula 13/TSE, questiona a interpretao nela veiculada equedecorreude sucessivas decises que o E. Tribunal Superior Eleitoral proferiua propsito da aplicabilidade imediata, ou no, do9 do art. 14 da Constituio, naredaodada pela ECR 4/1994.

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O E. TSE, aoformularo enunciado constanteda Smula13, proclamou aindispensabilidadede edio de lei complementar, paraefeitodeconferir aplicabilidade imediata eincidncia direta ao9 do art. 14 do texto constitucional, queassimdispe:Art. 14. (...) 9 Lei complementar estabelecer outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessao, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exerccio do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleies contra a influncia do poder econmico ou o abuso do exerccio de funo, cargo ou emprego na administrao direta ou indireta.

(Grifei.) Emdecorrnciada orientao jurisprudencial prevalecenteno E. Tribunal Superior Eleitoral, firmouseentendimento, oraquestionado nesta sede processual, nosentidodenoserautoaplicvelo contedo normativo do9do art. 14 da Constituio da Repblica, naredaoque lhe deu a ECR 4/1994. A Associao dos Magistrados Brasileiros, aofundamentar a pretenso jurdica ora em exame, assimdestacouosaspectosessenciaisque do suporte presente arguio de descumprimento de preceito fundamental (fls. 16/31):No parece curial, ressalvado o devido respeito, que a lei complementar de inelegibilidade tivesse necessariamente de estabelecer os casos que poderiam implicar a inelegibilidade do candidato para o exame da vida pregressa. Os casos objetivos que levam inelegibilidade do candidato, sejam os previstos na Constituio Federal, sejam os previstos na Lei Complementar, no podem ser, necessariamente, os mesmos que haveriam de ser examinados em uma investigao da vida pregressa do candidato. E no parece correto esse entendimento, d.v., porque, nas demais carreiras pblicas nas quais o processo de seleo exige o exame da vida pregressa, as leis pertinentes no tratam de estabelecer os casos, mas apenas a existncia da investigao social na qual se far o exame da vida pregressa. o quanto basta. Com efeito, o exame da vida pregressa no pode contemplar a existncia de hipteses certas, em razo da viso conceitual precisa da lavra do Min. Felix Fischer, porque ela no se resume a analisar a vida pregressa do candidato quanto s infraes penais que porventura tenha praticado. Serve, tambm, para avaliar a sua conduta moral e social no decorrer de sua vida, visando aferir seu comportamento frente aos deveres e proibies impostos ao ocupante de cargo pblico da carreira policial e de outras carreiras do servio pblico no menos importantes. (STJ, 5 Turma, RMSn.22.089/MS, Min. Felix Fischer, DJ de13-8-2007.) No se mostra exigvel, pois, do legislador complementar, que ele venha a estabelecer qualquer hiptese ou caso para o fim de ser apurado em investigao social da vida pregressa de candidato poltico, conquanto possam ser estabelecidas algumas hipteses, a ttulo exemplificativo. (...) No h necessidade, pois, de que a lei complementar de inelegibilidade disponha sobre hipteses que haveriam de ser apuradas na investigao da vida pregressa, porque se trata de uma apurao ampla, impossvel de ser reduzida a

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R.T.J. 215determinada hiptese, conquanto, reafirme-se, possa a lei vir a estabelecer algumas dessas hipteses, de forma exemplificativa. (...) Ora, se para essas carreiras exige-se em respeito ao princpio da legalidade, apenas que a lei preveja a existncia da investigao social destinada a apurar a vida pregressa do candidato, a fortiori, para o caso de candidatos a cargos eletivos, havendo previso no prprio texto constitucional da investigao social destinada a apurar a vida pregressa destes, no se pode admitir o entendimento do eg. TSE, d.v., de que a norma do 9 do art. 14 da CF no seria autoaplicvel. Cuida-se de norma de eficcia plena e no de eficcia contida, porque o legislador complementar haver apenas de reproduzir no seu texto aquilo que j est contido no texto constitucional, uma vez que no parece razovel supor que seria necessrio ao legislador complementar vir a definir os casos de inelegibilidade passveis de serem apurados na investigao social destinada a apurar a vida pregressa do candidato. (...) Tal entendimento decorre da aplicao da prpria Teoria Constitucional, segundo a qual, diante da fora normativa da Constituio, uma regra constitucional apenas pode ser considerada no autoaplicvel quando no houver nenhum meio de lhe conferir aplicabilidade. E no o que acontece na hiptese. Da a concluso imperiosa, de que, se a norma contida no 9 do art. 14 da CF constitui norma de eficcia plena, haver esse eg. STF de julgar procedente essa arguio de descumprimento de preceito fundamental para lhe dar essa interpretao declarando sua autoaplicabilidade pela Justia Eleitoral , de forma a permitir a observncia do preceito fundamental nela contido, da probidade administrativa e da moralidade para o exerccio do mandato. (...) Com efeito, a autoaplicabilidade do 9 do art.14 da CF pode ser considerada igualmente a partir do momento em que se verifica que a exigncia prevista na Lei de Inelegibilidades, pertinente ao trnsito em julgado de decises condenatrias dos candidatos, no foi recepcionada pelo texto desse dispositivo constitucional, aps a ECR 4/1994. Sustenta, nesse quadro igualmente relevante, a AMB que (a) a exigncia do trnsito em julgado das decises mencionadas nas alneas d, e e h do inciso I, do art.1, (b) a ressalva quando a questo houver sido ou estiver sendo submetida apreciao do Poder Judicirio mencionada na alnea g, do incisoI, do art.1, (c) bem ainda a exigncia de que tenha transitado em julgado a deciso mencionada no art. 15, todos da LC 64/1990, conflitam diretamente com o texto do 9 do art. 14 da CF, com a redao dada pela ECR 4/1994, no ponto em que estabeleceu que a Lei de Inelegibilidade teria a finalidade tambm de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exerccio do mandato, considerada a vida pregressa do candidato. que tais exigncias, contidas na Lei Complementar, esto impedindo a Justia Eleitoral de realizar o exame da vida pregressa do candidato, tal como determinado na Constituio Federal a partir da ECR 4/1994. Seno vejamos o seu texto, dando-se destaque para a nova redao: Art. 14. (...) 9 Lei complementar estabelecer outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessao, a fim de proteger a probidade administrativa, a

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moralidade para o exerccio do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleies contra a influncia do poder econmico ou o abuso do exerccio de funo, cargo ou emprego na administrao direta ou indireta. Convm reproduzir, igualmente, os dispositivos impugnados, destacando-se em negrito os trechos no recepcionados: Art. 1 So inelegveis: I para qualquer cargo: (...) d) os que tenham contra sua pessoa representao julgada procedente pela Justia Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apurao de abuso do poder econmico ou poltico, para a eleio na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3(trs) anos seguintes; e) os que forem condenados criminalmente, com sentena transitada em julgado, pela prtica de crime contra a economia popular, a f pblica, a administrao pblica, o patrimnio pblico, o mercado financeiro, pelo trfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de 3 (trs) anos, aps o cumprimento da pena; (...) g) os que tiverem suas contas relativas ao exerccio de cargos ou funes pblicas rejeitadas por irregularidade insanvel e por deciso irrecorrvel do rgo competente, salvo se a questo houver sido ou estiver sendo submetida apreciao do Poder Judicirio, para as eleies que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da deciso; h) os detentores de cargo na administrao pblica direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econmico ou poltico apurado em processo, com sentena transitada em julgado, para as eleies que se realizarem nos 3 (trs) anos seguintes ao trmino do seu mandato ou do perodo de sua permanncia no cargo; Art. 15. Transitada em julgado a deciso que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe- negado registro, ou cancelado, se j tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, se j expedido. Pouco importa, d.v., que o eg. Tribunal Superior Eleitoral j tenha se pronunciado sobre o 9 do art.14 da CF, com a redao dada pela ECR 4/1994, e concludo pela no autoaplicabilidade, como se extrai da Smula13: No autoaplicvel o 9, art. 14, da Constituio, com a redao da Emenda Constitucional de Reviso 4/1994. que o entendimento do eg. TSE no sentido de que a exigncia que passou a constar do 9 do art. 14 da CF, estaria a depender de uma alterao do texto da Lei Complementar de Inelegibilidade, para estabelecer as hipteses de inelegibilidade passveis de ser apuradas no exame da vida pregressa no contemplou a possibilidade de ter ocorrido a revogao de parte da Lei Complementar de Inelegibilidade pelo novo texto constitucional proveniente da ECR 4/1994. (...) Basta ver que em um sistema judicirio como o brasileiro torna-se quase que materialmente impossvel, por exemplo, obter-se uma deciso transitada em julgado em representao julgada pela Justia Eleitoral, para que ela seja eficaz nos trs anos seguintes eleio (hiptese da alnea d do inciso I, do art. 1 da LC 64/1990). Seno vejamos:

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R.T.J. 215d) os que tenham contra sua pessoa representao julgada procedente pela Justia Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apurao de abuso do poder econmico ou poltico, para a eleio na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3(trs) anos seguintes; A exigncia do trnsito mostra-se impeditiva para a Justia Eleitoral reconhecer a inelegibilidade da maior parte dos candidatos que se encontram na situao ali prevista com representao julgada procedente pela Justia Eleitoral em processo de apurao de abuso do poder econmico ou poltico , j que a sano da inelegibilidade est adstrita para as eleies na qual ele estiver concorrendo ou nas que se realizarem nos 3anos seguintes. (...) O exame da vida pregressa, para o fim de recusar o registro do candidato condenado em representao julgada procedente pela Justia Eleitoral, somente se mostrar vivel se se entender inexigvel o trnsito em julgado da deciso condenatria. Fora dessa hiptese a exigncia letra morta. J quanto exigncia de sentena condenatria em processo criminal (hiptese da alnea e do inciso I do art. 1 da LC 64/1990), transitada em julgado, mostra-se ela complementar sano prevista no incisoIII, do art. 15, da CF, que estabelece a sano muito mais grave, para o perodo no qual estiver o condenado cumprindo a pena, da sano da cassao de direitos polticos (perda ou suspenso). (...): (...) De acordo com essas duas regras, o condenado criminalmente, aps o trnsito em julgado, ter seus direitos polticos suspensos durante o cumprimento da pena (decorrente da norma constitucional), e, aps o cumprimento dessa pena, ficar inelegvel por mais3anos (decorrente da norma legal). Em face do vasto arsenal de recursos e da morosidade natural do processo penal brasileiro, no qual raramente se verifica a existncia de decises transitadas em julgado, especialmente dos crimes previstos na alnea e, o que se pode depreender que se trata de regra de inelegibilidade praticamente incua. H, d.v., uma grande dificuldade de sua aplicao, decorrente do tempo transcorrido no processo penal e, assim, da possibilidade, concreta, da ocorrncia da prescrio no prprio processo penal, de forma a inviabilizar sua aplicao. Impe-se, pois, afastar a exigncia do trnsito em julgado, para que a Justia Eleitoral possa considerar a sentena condenatria em processo criminal, nas hipteses mencionadas independentemente do seu trnsito em julgado como fato passvel se ser apurado no exame da vida pregressa do candidato. A exigncia do trnsito em julgado na hiptese da alnea h, do inciso I, do art. 1 da LC 64/1990 mostra-se igualmente impeditiva para a Justia Eleitoral reconhecer a inelegibilidade do candidato que se encontrar na situao ali prevista, j que a sano da inelegibilidade est adstrita para as eleies que se realizarem nos 3 anos seguintes ao trmino do mandato ou do perodo da sua permanncia no cargo. Seno vejamos: h) os detentores de cargo na administrao pblica direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econmico ou poltico apurado em processo, com sentena transitada em julgado, para as eleies que se realizarem nos 3 (trs) anos seguintes ao trmino do seu mandato ou do perodo de sua permanncia no cargo; (...)

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Afastando-se, porm, a exigncia do trnsito em julgado, poder a Justia Eleitoral tomar em considerao a primeira deciso proferida que tenha reconhecido que o candidato se beneficiou ou beneficiou terceiros, por meio de abuso do poder econmico ou poltico. O exame da vida pregressa, para o fim de recusar o registro do candidato condenado por abuso do poder econmico ou poltico, somente se mostrar possvel se se entender inexigvel o trnsito em julgado da deciso condenatria. Outra regra que conflita com os preceitos fundamentais da probidade administrativa e da moralidade para o exerccio do cargo a contida na alnea g, no ponto em que ressalva aqueles candidatos que, tendo tido suas contas rejeitadas por irregularidade insanvel ou por deciso irrecorrvel do rgo competente (do Poder Legislativo ou do Poder Executivo), tenham submetido tais decises apreciao do Poder Judicirio. Seno vejamos: g) os que tiverem suas contas relativas ao exerccio de cargos ou funes pblicas rejeitadas por irregularidade insanvel e por deciso irrecorrvel do rgo competente, salvo se a questo houver sido ou estiver sendo submetida apreciao do Poder Judicirio, para as eleies que se realizarem nos 5 (cinco) anos seguintes, contados a partir da data da deciso; (...) Nesse ponto, por mais que o Tribunal Superior Eleitoral, aps inmeros debates, tenha assentado que no bastaria o ajuizamento da ao, mas sim que seria exigvel do candidato a existncia de deciso judicial suspendendo ou invalidando a deciso que rejeitara suas contas, est-se diante de uma norma que retira da Justia Eleitoral a possibilidade de considerar o fato a deciso que rejeita as contas para negar o registro. Da a necessidade de se afastar essa ressalva, para que a Justia Eleitoral possa proceder com plenitude ao exame da vida pregressa do candidato, de forma a observar o cumprimento, ou no, dos preceitos fundamentais da probidade administrativa e da moralidade para o exerccio do cargo. Por fim, mostra-se igualmente conflitante com os preceitos constitucionais apontados, a primeira parte do caput do art. 15 da Lei de Inelegibilidade, ao exigir o trnsito em julgado da deciso que declarar a inelegibilidade do candidato, para ser negado ou cancelado o seu registro. Seno vejamos: Art. 15. Transitada em julgado a deciso que declarar a inelegibilidade do candidato, ser-lhe- negado registro, ou cancelado, se j tiver sido feito, ou declarado nulo o diploma, seja expedido. Ora, para que a Justia Eleitoral pudesse negar o registro tendo em vista a vida pregressa do candidato, bastaria a verificao da existncia de deciso que declarasse a sua inelegibilidade, independentemente do trnsito em julgado. (...) A inconstitucionalidade, no caso, decorre do fato de a exigncia prevista no art. 15 estar impedindo que a Justia Eleitoral considere o fato ali previsto, antes do trnsito em julgado, para o exame da vida pregressa do candidato. Da a necessidade de se declarar no recepcionados pelo novo texto do 9 do art. 14 da CF as exigncias contidas nesses artigos e incisos da Lei de Inelegibilidades, de sorte a permitir que a Justia Eleitoral possa considerar os fatos previstos nesses artigos e incisos independentemente de trnsito em julgado, de deciso definitiva ou de submisso da deciso ao poder judicirio no

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R.T.J. 215exame da vida pregressa dos candidatos, visando ao deferimento ou indeferimento do registro.

(Grifei.) Em consequncia das razes que do suporte ao seu entendimento, a Associao dos Magistrados Brasileiros deduz postulao, cujo contedo foi por ela assim definido (fls. 33/34):94. (...) requer a Associao dos Magistrados Brasileiros AMB se digne esse eg. Supremo Tribunal Federal julgar essa ao procedente, para determinar a todos os juzos eleitorais, de qualquer instncia, que observem a autoaplicabilidade da norma do 9 do art.14 da CF, com a redao dada pela ECR 4/1994, bem ainda a ocorrncia da revogao das condies a seguir mencionadas, de forma a viabilizar exame da vida pregressa dos candidatos a cargos eletivos: (a) a exigncia do trnsito em julgado das decises mencionadas nas alneas d, e e h do inciso I, do art. 1, (b) a ressalva quando a questo houver sido ou estiver sendo submetida apreciao do Poder Judicirio mencionada na alnea g, do inciso I, do art. 1, (c) bem ainda a exigncia de que tenha sido transitada em julgado a deciso mencionada no art.15, todos da Lei Complementar 64/1990, 95. Requer ainda a AMB para evitar que a pretenso de impedir a ocorrncia de um determinado dano (observncia dos preceitos fundamentais da probidade administrativa e da moralidade para o exerccio do cargo) acabe por acarretar a ocorrncia de um outro mais grave (impedir as candidaturas diante de qualquer deciso no transitada em julgado) que essa eg. Corte, nos termos do art. 10 da Lei 9.882/1999, fixe como condio e como modo de interpretao dos preceitos fundamentais, que caber Justia Eleitoral sopesar a gravidade das condutas apontadas na lei complementar, mesmo sem trnsito em julgado, para deliberar pela rejeio ou no do registro do candidato.

(Grifei.) O Senhor Presidente da Repblica, nas informaes que prestou a esta Suprema Corte, suscitouduas questespreliminares pertinentes ao no conhecimento da presente arguio de descumprimento de preceito fundamental: aprimeira, referente No comprovao da Existncia de Relevante Controvrsia sobre o texto do art. 14, 9, da Constituio Federal (fl. 292), e a segunda, relativa Ausncia de Prova da Violao do Preceito Fundamental (fl. 295). ochefedoPoderExecutivodaunio, de outro lado, defendeu a plena validade da LC 64/1990, noqueserefere aos preceitos normativos dela constantes e ora impugnados, sustentando, ainda, acorreo da interpretao dada pelo E.Tribunal Superior Eleitoral, nosentido de que a regra inscrita no9 do art. 14 da Constituio da Repblica nosequalifica como norma de eficcia plena e de aplicabilidade direta, imediata e integral (fls. 297/300). ACmaradosDeputados, por sua vez, aoprestar asinformaes que lhe foram solicitadas, (fls. 304/306), abstevese de discutir a questo concernente autoaplicabilidade, ou no, do que se contm no9 do art. 14 da

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Constituio, sobaalegao de que no lhe cabe examinar a interpretao que o Tribunal Superior Eleitoral tem dado a referido preceito normativo. O Senhor Presidente da Cmara dos Deputados, de outro lado, sem se estender na anlise das relevantes questes suscitadas na presente sede processual, limi touseadizer que a LC 64/1990 foi aprovada nesta Casa Legislativa seguindo todos os trmites constitucionais e regimentais atinentes espcie (fl. 305). O eminente Senhor Presidente do E. Tribunal Superior Eleitoral, Ministro CARLOS BRITTO, prestou substanciosas informaes sobre a matria ora em exame (fls. 308/325), reconhecendoaadmissibilidade da presente arguio de descumprimento de preceito fundamental, inclusive no que se refere observncia da clusula da subsidiariedade (fl. 311): que a inexistncia de outro mecanismo de controle concentrado apto impugnao de direito pr-constitucional e de interpretao jurisprudencial, associado proximidade do pleito eleitoral e ao exguo prazo para anlise, pela magistratura eleitoral, dos pedidos de registro de candidatos (prazo que termina em16-8-2008), abonam a tese de ser a ADPF o nico instrumento capaz de viabilizar uma pronta soluo para a controvrsia sub judice; qual seja: pode a vida pregressa de um candidato ser aferida pela magistratura eleitoral, quando da apreciao dos pedidos de inscrio de candidatura? Ou, em palavras outras: pode um Tribunal Regional Eleitoral negar registro de candidatura a cargo poltico-eletivo, sob o fundamento de estar o candidato a responder por um nmero tal de processos criminais que, de parelha com certos fatos pblicos e notrios, caracteriza toda uma crnica de vida moralmente sinuosa, ao invs de retilnea? Todo um histrico de condutas profissionais, polticas e sociais de permanente submisso a questionamentos ticos e jurdicos? Um modo pessoal de ser e de agir aferrado sempre condenvel ideia de que os fins justificam os meios?

Expuseramse, nessas informaes, quanto orientao que o E. Tribunal Superior Eleitoral tem mantido no tema, as seguintes observaes (fls. 312/313):7. Bem vistas as coisas, o que me cabe acentuar, na condio de Presidente do Tribunal Superior Eleitoral (cujos precedentes so colocados em xeque) que esta nossa Corte firmou jurisprudncia (jurisprudncia sumulada, diga-se de passagem Smula13/TSE) no sentido de que a norma inscrita no 9 do art. 14 da CF no possui autoaplicabilidade, de sorte que a vida pregressa do candidato s poder ser considerada pela Justia Eleitoral se e quando lei complementar vier a estabelecer nova hiptese de inelegibilidade. 8. Essa orientao, consolidada em enunciado sumular h quase 12 anos (Smula 13/TSE, de 30-10-1996), tem-se mantido inalterada, muito embora entendimento contrrio haja sido sustentado mais recentemente por trs dos setes Ministros integrantes da Corte e por numerosas Cortes Regionais Eleitorais. 9. Ora bem, o posicionamento firmado pelo TSE assenta-se, de um lado, na ideia de que o 9 do art.14 da CF estabelece verdadeira reserva de lei complementar, de sorte que os valores ali homenageados (probidade administrativa, moralidade para o exerccio do mandato, normalidade e legitimidade das eleies) somente poderiam ser concretamente protegidos quando da interveno

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R.T.J. 215normativa do legislador infraconstitucional, pelo que o dispositivo em questo seria de eficcia limitada. Alm disso, a posio deste Tribunal Superior Eleitoral tambm tem levado em considerao o princpio da no culpabilidade (in