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Jornal da ABI Julho de 2006 • Número 310 Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa O que há por trás da escolha do modelo japonês, segundo os que contestam a opção feita pelo Governo. JUPITERIMAGES

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Jornal da ABIJulho de 2006 • Número 310Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

O que há por trásda escolha do

modelo japonês,segundo os que

contestam a opçãofeita pelo Governo.

JUP

ITERIM

AGES

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Jornal da ABI

2 Julho de 2006

Jornal da ABI

Associação Brasileira de Imprensa

Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andarTelefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012Rio de Janeiro - RJ ([email protected])

Editores: Francisco Ucha, Joseti Marques e Maurício AzêdoProjeto gráfico, diagramação eeditoração eletrônica: Francisco UchaApoio à produção editorial: Ana Paula Aguiar,Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme Povill Vianna,Maria Ilka Azêdo e Solange Noronha.Diretor responsável: Maurício AzêdoImpressão: Gráfica LanceRua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletemnecessariamente a opinião do Jornal da ABI.

DIRETORIA – MANDATO 2004/2007Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretor Administrativo: –Diretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Souza (Pajê)Diretora de Jornalismo: Joseti Marques

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira,Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura

CONSELHO FISCALJesus Antunes, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento,Secretário; Adriano do Nascimento Barbosa, Arthur Auto NeryCabral, Geraldo Pereira dos Santos, Jorge Saldanha e Luiz Carlosde Oliveira Chester.

CONSELHO DELIBERATIVO (2006-2007)Presidente: Fernando Segismundo1º Secretário: Estanislau Alves de Oliveira2º Secretário: Maurílio Cândido Ferreira

Conselheiros efetivos (2006-2009)Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob,Arthur Cantalice, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos AugustoXisto da Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo,

Glória Suely Alvarez Campos, Heloneida Studart, Jorge MirandaJordão, Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif EliasHidd Sobrinho e Pery de Araújo Cotta.

Conselheiros efetivos (2005-2008)Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, AraquémMoura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, CarlosArthur Pitombeira, Conrado Pereira (in memoriam), Ely Moreira,Fernando Barbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata, MaurícioAzêdo, Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho

Conselheiros efetivos (2004-2007)Antonieta Vieira dos Santos, Arthur da Távola, Cid Benjamin,Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Héris Arnt, Irene Cristina Gurgel doAmaral, Ivan Cavalcanti Proença, José Gomes Talarico, JoséRezende, Marceu Vieira, Paulo Jerônimo, Roberto M. Moura (inmemoriam), Sérgio Cabral e Teresinha Santos

Conselheiros suplentes (2006-2009)Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilo deAthayde, Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup,Estanislau Alves de Oliveira, Hildeberto Lopes Aleluia, JorgeFreitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marco Aurélio BarrandonGuimarães, Marcus Miranda, Mauro dos Santos Viana, Oséas deCarvalho, Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza.

Conselheiros suplentes (2005-2008)Anísio Félix dos Santos, Edgard Catoira, Francisco de PaulaFreitas, Geraldo Lopes, Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone,Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedro doCoutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J. Magalhães

Conselheiros suplentes (2004-2007)Adalberto Diniz, Aluísio Maranhão, Ancelmo Gois, André Louzeiro,Jesus Chediak, José Silvestre Gorgulho, José Louzeiro, LílianNabuco, Luarlindo Ernesto, Marcos de Castro, Mário AugustoJakobskind, Marlene Custódio, Maurílio C. Ferreira e Yaci Nunes

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira, Presidente, Jarbas Domingos Vaz, José ErnestoVianna, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio CândidoFerreira

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan AlvesFilho e Paulo Totti

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSArthur Cantalice, Arthur Nery Cabral, Daniel de Castro,Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy MaryCarneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário AugustoJakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

EDITORIAL

Decisão autoritáriaFoi com inegável surpresa que os setores

da sociedade que acompanhavam os estu-

dos acerca da implantação da tv digital no

País receberam a decisão do Governo de

optar pelo padrão tecnológico criado pelosjaponeses para esse fim. Havia inúmeras e

fundadas razões para se considerar que não

estava amadurecido o juízo sobre qual pa-

drão seria mais adequado para o País – o ja-

ponês, afinal privilegiado pela escolha ofici-

al, o norte-americano e o europeu, sem con-

tar a hipótese, não remota, de uma simbiose

entre um desses padrões e uma proposição

brasileira, resultante dos estudos e pesqui-sas em realização em grande número de ins-

tituições universitárias nacionais.

Robustecia a expectativa de que tal deci-

são não seria adotada de imediato o estado

das análises e debates efetuados no âmbito

do próprio Governo, que mobilizou para o

exame de tão relevante questão dirigentese técnicos de nada menos que 12 Ministé-

rios, numa prova de que se conferia ao tema

a preocupação que ele enseja. Ao contrário

do que costuma ocorrer em grupos de tra-

balho constituídos no âmbito da adminis-

tração pública de todos os níveis da Fede-

ração, em que um ou outro órgão e um ou

outro especialista assumem solitariamen-

te a responsabilidade de elaboração das pro-postas que depois serão dadas como plas-

madas pelo coletivo, no caso da tv digital

houve participação efetiva, intensa e, sem

sacrifício da pertinência do que se susten-

tava, até apaixonada dos integrantes do

organismo interministerial, o Conselho

Gestor. No caso dos estudos sobre a tv di-

gital não se deu assim: houve nesse Conse-lho uma fecunda e produtiva discussão, a

qual apontava para conveniência e neces-

sidade de se estender por mais tempo os

estudos em curso.

Na intervenção que fez no debate que a

ABI promoveu acerca do tema, o Ministro

da Cultura, Gilberto Gil, com as cautelas quedeve ter um membro do Governo sobre

questão ainda a ser decidida pelo Presiden-

te, admitiu que havia no Conselho Gestor o

consenso de que era preciso prolongar e

ampliar esses estudos e que já se cristaliza-

va a proposição de uma solução que não era

a defendida pelo Ministro das Comunica-

ções, Senador Hélio Costa, que, pela

especificidade de seu Ministério, supunhaque a decisão deveria processar-se exclusi-

vamente no âmbito deste, sem intervenção

eficaz dos muitos outros Ministérios a que

a questão dizia e diz respeito. Sonhador, tal-

vez ingênuo, o Ministro Gil via a Ministra

Chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, como

uma espécie de fiadora da solução preconi-

zada pela maioria dos agentes governamen-tais que se debruçaram sobre a matéria du-

rante meses e meses. Menos de um mês de-

pois, com a edição do decreto presidencial

que optou pelo padrão japonês, viu-se que o

Ministro Gil apostou em vão suas esperan-

ças na Ministra Rousseff.

A decisão adotada é fruto de um certo

golpismo no interior do próprio Governo,

em que setores comprometidos com inte-

resses que não são os do País agiram na

sombra, à sorrelfa e à socapa, como se di-

zia antanho, para impor e fazer prevalecer

suas proposições. Em relação aos demaisintegrantes do Governo, incluídos Minis-

tros de Estado, como o da Cultura, houve

reprovável autoritarismo, o qual se esten-

deu para o conjunto da sociedade, a que se

impõe de cima para baixo uma solução dis-

tante do melhor interesse do País e do povo

e que, sendo autoritária, atropela a aspira-

ção de democratização da comunicaçãoentre nós.

Aos leitores – Esta edição número 310 do Jornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABIIIII,com data de capa julho de 2006, foi produzida editorialmentee impressa na primeira quinzena de outubro de 2006, quandose iniciou a sua circulação nacional.

O Ministro Hélio Costa e seu interlocutor japonês, HeizoTakenaka, Ministro do Interior e das Comunicações.

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Jornal da ABI

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onge de diminuir o interesse pelos

relatos e opinamentos dos partici-

pantes do debate, o tempo decorri-

do desde a sua realização avivou a

atualidade do que foi exposto e dis-

cutido no evento, principalmente

quando esses relatos e opinamentos são

considerados à luz da decisão oficial de es-

colha do padrão japonês de tv digital, ado-

tado pelo Governo com a assinatura pelo

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva,a 29 de

junho, do Decreto nº 5.820, datado daque-

le dia, o qual “dispõe sobre a implantação

do SBTVD-T – sigla cuja significação é fei-

ta no artigo 2º , inciso I —, estabelece dire-

trizes para a transição do sistema de trans-

missão analógica para o sistema de trans-

missão digital do serviço de radiodifusão de

sons e imagens e do serviço de retransmis-

são de televisão, e dá outras providências”.

Um dos participantes do debate, Profes-

sor Gustavo Gindre, que além de membro

do Coletivo Intervozes é Diretor do Insti-

tuto de Estudos e Projetos de Comunica-

ção e Cultura-Index, chegou a mencionar

com todas as letras que para a adoção do

padrão japonês talvez existisse uma espé-

cie de “acordo de gaveta” entre a mais po-

A ABI conclui nesta edição a publicação da íntegra das intervenções feitas no debate que promoveu no dia 5 de junhoacerca do tema A Questão da TV Digital, com a participação do Ministro da Cultura Gilberto Gil, principal expositor dasessão, da Deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), do Diretor do Intervozes-Coletivo Brasil de Comunicação Social,Professor Gustavo Gindre, do Diretor da Oboré Projetos Especiais de Comunicação e Artes, de São Paulo, jornalista SérgioGomes da Silva, e do Assistente Técnico da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão-Abert, RonaldSiqueira Barbosa. O evento foi organizado pelo Vice-Presidente da ABI e Presidente da Representação da Casa em SãoPaulo, Audálio Dantas, que mediou as intervenções. Ex-Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado deSão Paulo e da Federação Nacional dos Jornalistas-Fenaj, Audálio foi também deputado federal, circunstância quelembrou no decorrer do debate, quando se fez menção a textos legais aprovados ou discutidos no Congresso Nacional.

L

P A R TP A R TP A R TP A R TP A R T E E E E E 22222A QUESTÃODA TV DIGITALO QUE HÁ POR TRÁS DOS PANOS

derosa empresa de comunicação do País, a

Rede Globo de Televisão, e a multinacional

japonesa Sony, conclusão ou suspeita a que

chegara em razão de inúmeros contratos

de fornecimento de equipamentos feitos

entre as duas empresas.

As denúncias de Gindre foram tão vigo-

rosas que um dos debatedores, o jornalis-

ta Sérgio Gomes da Silva, chegou a suge-

rir, com uma ponta de ironia e outra de

seriedade, que a ABI postulasse garantia

de vida para ele, por ser Gindre o mais

qualificado e mais bem informado crítico

do sistema de comunicação: ele sabe o que

há por trás dos panos da disputa em torno

da tv digital.

O debate – afora os realizados em audiên-

cias do Congresso e divulgados em diários

oficiais e, portanto, com baixo índice de lei-

tura, o primeiro cujas intervenções são

publicadas na íntegra – permitiu que os es-

pecialistas divulgassem informações igno-

radas pelo conjunto da sociedade, como:

• as potencialidades que a tv digital pode

oferecer se adotada sob o ângulo do inte-

resse público, e da democratização da pro-

dução e difusão de programação para a te-

levisão, inclusive com a marcação de con-

sultas no sistema público de saúde;

• a necessidade de cumprimento das dis-

posições constitucionais relativas à

regionalização da produção;

• a democratização da produção e difu-

são de programação;

• o desamparo em que se encontram as

rádios comunitárias, principalmente no

Estado de São Paulo, em razão de uma le-

gislação que as obriga a buscar sustenta-

ção na área de alcance de suas transmis-

sões, o que significa deixá-las expostas ao

domínio do crime organizado, do

narcotráfico e de políticos corruptos;

• os custos para os usuários da fruição

dessa inovação tecnológica, que os otimis-

tas estimam cheguem a 100 ou 300 reais,

com a colocação de um pequeno dispositi-

vo sobre os televisores atuais, e que os pes-

simistas ou realistas calculam possam al-

cançar a casa dos l0 mil reais por televisor,

com a instituição no País de um sistema

de televisão para os ricos, para os que po-

dem pagar, e bem, pela novidade, e outro

de televisão para os pobres – que, afinal,

estão querendo o quê?

Essas e outras questões instigantes estão

nas páginas a seguir. Boa leitura.

A degravação deste debate foifeita por Celeste Cintra.

A edição e montagem final do texto,por Maurício Azêdo.

A operação de som foide Neilson Lopes Paes.

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Audálio Dantas – Vamos iniciar o de-bate primeiro na mesa e, como disse, depoisno auditório. Primeiramente, o ProfessorGustavo Gindre dirige a sua pergunta aosdois outros debatedores, que terão depoisa oportunidade de se dirigir a ele ou a ou-tro integrante da mesa.

Gustavo Gindre – A pergunta era atémais específica ao Ronald, mas é claro queo Sérgio está convidado a participar. É a se-guinte: em janeiro deste ano, a Camex, queé a Câmara de Comércio Exterior do Brasil,baixou a alíquota de importação de equipa-mentos ligados à televisão digital de 16% para2%. Ao mesmo tempo, começamos a ouvirboatos de que a principal emissora do Bra-sil já estava importando equipamentos detransmissão digital do padrão japonês, cu-jos acordos comerciais já foram feitos e queportanto a defesa do padrão japonês tempouco a ver com as possibilidades tecnoló-gicas do padrão e tem muito mais a ver comacordos de gaveta que já teriam sido feitose que favorecem a Globo. É bom lembrar quea Globo foi acionista da Nec do Brasil, queé a empresa que produz transmissores digi-tais e a empresa que é a vice-presidente doISDB, que é o padrão japonês.

Para que sobre essa decisão não paire amácula de um acordo já negociado de algoque, enfim, atende a interesses privados, ainteresses que já estavam tramados e quena verdade a decisão pública respalda ape-nas o interesse comercial da Globo, pergun-to se a Abert poderia – é claro que ela nãopode definir isso – solicitar às suas associ-adas que permitissem que tivéssemos acessoa um sistema chamado Siscomex, que dáconta das exportações e das importaçõesbrasileiras. Esse Siscomex é dividido porrubricas; essas rubricas agora estão padro-nizadas pelo Mercosul, há agora o mesmonúmero para todo mundo da Mercosul.Existe um dos itens dessa rubrica chama-do transmissores digitais. Eu queria pergun-tar se a Abert poderia solicitar às suas afi-liadas que abrissem o sigilo desse índice,apenas desse tópico, transmissores digitais.Aí nós veríamos se alguém já importoutransmissores, se alguém já avançou o si-nal, já sabia do resultado, trabalhou a favorde um resultado com um contrato de ga-veta já feito ou se na verdade isso não existe,foi uma interpretação equivocada e o pro-cesso está completamente revestido da li-sura que deveria ter.

A Abert poderia solicitar publicamenteàs suas associadas que abrissem a informa-ção sobre a importação de transmissoresdigitais? Os transmissores já foram impor-tados? Ou aquela antena que a Globo já estápraticamente terminando de construir naAlameda Santos, em São Paulo, é apenas an-tena e o transmissor ainda está utópico?

Ronald Siqueira Barbosa – Na verdade,quando eu falo como Abert, falo como as-sociação das emissoras, e não particularmen-te como uma afiliada da Abert, que, naverdade, teria condições de responder àsquestões formuladas a ela, que tem gentemais gabaritada que eu para responder so-bre a situação particular de cada emissora.Eu quero dizer que a radiodifusão se repre-

senta através da Abert com grandes redese pequenos e médios radiodifusores; quandosentamos na mesa e trabalhamos para aradiodifusão não estamos pensando se es-tamos com as cores de um afiliado ou ou-tro. Nós estamos trabalhando pela radiodi-fusão.

No caso da Camex, como você colocouem primeiro lugar, são quatro produtos;lembre-se, quatro produtos. E foram pro-dutos de estúdio, não são produtos de trans-missão. E nós estamos com equipamentosde estúdio, as grandes redes, as emissorasde capitais, já têm um padrão digital den-tro do estúdio porque no estúdio vocêtem liberdade para trabalhar com qual-quer sistema digital que você queira. Nahora em que você vai botar no ar é di-ferente, porque tem que ter receptor paraentender o que você está transmitindoe aí você precisa de um padrão. Masdentro do estúdio você trabalha comqualquer produto. Então o que aconte-ce? Nós já estamos realizando testesdesde 1998. Então é comum você pedir,pleitear equipamentos e produtos e isen-ção para você já ter o equipamento dis-ponível. E até você pedir até a questãodo transmissor mesmo. Nós estamosfazendo testes com transmissor desde1998. E transmissores da Nec. Umaoutra coisa, o Dibeg não é controladomais pela Nec. O Dibeg é um institutoque trabalha com digitalização. É comose você criasse amanhã um instituto noBrasil para tratar disso também. O Di-beg é hoje controlado pela Toshiba. ANec já foi uma das diretoras, mas nãoé mais, é a Toshiba.

Às vezes, a gente acaba, a partir de umfalso silogismo, criando uma base de re-ferência e a partir daí transformando issonuma lei, numa regra geral. Com relaçãoa importação, eu trabalhei muitos anoscom a isenção de produtos de importa-ção, de equipamentos para radiodifusão.Nós tínhamos um processo. Primeiro nóspublicávamos em Diário Oficial se aqueleproduto era fabricado no Brasil.Dávamos30 dias para qualquer fabricante no Brasildizer se fabricava ou não. Em seguida, senão houvesse manifestação, a gente en-

tão ia no Mercosul e dizíamos que queríamosa isenção desse produto em nosso País, por-que nós trabalhamos com um acordo inter-nacional. Se estivesse sendo produzido na Ar-gentina ou no Paraguai, a gente não poderiater o produto aqui sendo isento, porque vocêiria produzir um fluxo de equipamentos láno país dele partindo de dentro da gente. En-tão havia esse cuidado.

Quando o Mercosul declarava que nãoproduzia aquele produto, então nós criáva-mos uma exceção ou criávamos uma isen-ção fixa dentro da regra do Mercosul.

Poucas pessoas importaram nos últimostempos produtos digitais de transmissão, anão ser os institutos que estivessem comdesejo de fazer experimento na transmis-são digital.

Audálio Dantas – Sérgio Gomes da Sil-va, você tem a sua pergunta a um dos ou-tros debatedores. Depois falará Ronald Si-queira Barbosa e passaremos em seguidapara o debate com o auditório.

Sérgio Gomes da Silva – Ninguém vaifazer pergunta para mim?

Audálio Dantas – Suponho que sim.

Sérgio Gomes da Silva – O Ronald disseuma coisa aqui que dá um belo debate. Qualo canal disponível para as rádios comuni-tárias? Ficou definido que era o canal 200para o Brasil inteiro. No caso de São Paulo,não precisa entender de rádio, o tal canal 200significa a posição em que está a RádioGazeta. É uma grande emissora, está lá hámuito tempo, ela precisaria se deslocar paraa direita e a esquerda, o que significavamexer em 16 posições do dial, entre elas aRádio Rock 89, imaginem a 89 virar 91.Então, não teríamos força política e social,enfim, para fazer esse rearranjo do dial;como dizia o Ziraldo na época do Pasquim,devagar se vai ao longe, só que quando sechega lá já está tudo ocupado. Negócio docara que chega tarde para ir para a praia. Eo que aconteceu foi exatamente isso. Em SãoPaulo – estou falando aqui dessa província– durante décadas nós trabalhamos lá como ideário contraditório. São Paulo não podeparar, é pau na máquina, é a locomotiva ea felicidade é no campo. O sujeito vai paraSão Paulo, ganharia muito dinheiro, depoisvoltaria para Minas, Portugal, para a terradele na Itália. Esse ideário contraditórioproduziu um grande caos urbano. Houvepoucos planos diretores, seja em relação atransporte, seja em relação a comunicação,em relação a habitação, etc. E o que é pro-visório fica definitivo e enrascado de umamaneira que para poder mexer tem que termuita força.

No caso específico da radiodifusão, todoo espectro foi tomado pelas emissoras co-merciais, que não respeitam minimamen-te o que está nos termos da concessão: nãoproduzem informação, não ajudam a popu-lação a saber das coisas.

Há emissoras que simplesmente sãomantidas pelo jabá e não valorizam a cul-tura brasileira. É fato. Você tem emissorashoje que só fazem proselitismo religioso eisso é proibido no Brasil. O proselitismo tem

“Quando falo comoAbert, falo comoassociação dasemissoras e nãoparticularmentecomo uma afiliadada Abert, querepresenta aradiodifusão comsuas grandes redese seus pequenose médiosradiodifusores.Quando sentamos àmesa e trabalhamospara a radiodifusão,não estamospensando se estamoscom as cores de umafiliado ou outro.Estamos trabalhandopela radiodifusão.”

Ronald Siqueira Barbosa

DIÁLOGO AMPLOIdealizador e organizadordo debate, Audálio Dantasressaltou o empenhoda ABI em manter umdiálogo amplo sobrea questão da tv digital.

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que ser plural, diverso. O que sobrou nodial para coisas que sejam de interessepúblico? A Rádio Cultura e a Rádio Usp.Mais nada além disso.

Quando chega a hora das rádios co-munitárias, isso há oito anos atrás, vocêacha que o CPQD, a Anatel, etc em oitoanos não seriam capazes de encontraruma posição para as rádios comunitári-as? Afinal, depois de muita pressão – estádito aqui, depois vou distribuir estematerial para vocês – em que fizemosuma campanha muito dura, cadê canalpara a capital e esses 32 Municípios daGrande São Paulo? E finalmente locali-zaram, aí sim, o canal 198, que é a últi-ma posição do dial a esquerda. Isso estáautorizado pela Anatel, depois de con-sulta pública, etc., desde março de 2004.Nós já estamos em junho de 2006, doisanos e tanto já se passaram e não hou-ve um chamamento sequer. Nem paraesse estribo quase fora do ônibus. Por queisso? Quem conseguisse alguma posiçãono bairro, mesmo que fosse essa posiçãodificílima, passaria a discutir de igualpara igual na hora da digitalização. Masnem isso aconteceu. Quero ficar por aquie dizer o seguinte...

Audálio Dantas – A pergunta, Sérgio.

Sérgio Gomes da Silva – A perguntaé assim: o Élio Gaspari, em fevereiro, pro-duziu um artigo chamado A síndrome dasreivindicações sucessivas. Ele fala que a pro-priedade de um imóvel é o principal patri-mônio dos brasileiros. Se o trabalhador tema casa mas não tem escritura, sua vida ficamais difícil para obter crédito e abrir um ne-gócio; ele é empurrado para a economia in-formal. Pode-se estimar que o andar de bai-xo do Terceiro Mundo e do Leste Europeuesteja sentado num ervanário de 10 trilhõesde patrimônio imobiliário marginalizado.Num cálculo grosseiro, as propriedades dossem-escritura brasileiros podem estar na casados 150 bilhões de reais. Os programas de re-gularização dessas propriedades foram viti-mados pelas chamadas síndromes das reivin-dicações sucessivas. Trata-se de um ardil doandar de cima. Consiste em reconhecer queuma coisa deve ser feita, condicionando as-tuciosamente a sua execução a outra medi-da, sempre razoável. Malandragem suprapar-tidária, a reivindicação sucessiva envenenainiciativas para melhorar a vida de quemprecisa de atenção.

Um exemplo: na segunda metade doséculo XIX discutia-se a Lei do Ventre Li-vre, um remendo para postergar a aboliçãoda escravatura. Ela foi combatida com o ar-gumento de que não se podia libertar as cri-anças sem antes dar escolas e um ofício.Seria uma desumanidade. Ou seja, enquan-to não se fizer B não se pode fazer A . Osfazendeiros não queriam escolas. O negó-cio deles era preservar a escravaria. A sín-drome das reivindicações sucessivas conta-mina também pessoas e governos que sin-ceramente desejam endireitar o torto. Elaentortece inúmeros programas de regulari-zação, por exemplo, de lotes urbanos, sus-tentando que não se deve dar a escritura aodono de uma casa enquanto sua rua não

tiver coisas como asfalto, calçada e bueiros.O sujeito paga impostos e o Estado que nãolhe dá serviços nega-lhe a escritura do quefalta, isto é, os serviços negados. O truquepermite a uma gama defender todas as cau-sas sem trabalhar em nenhuma; enaltece aparolagem, o blablablá e disfarça o compro-misso; permite aos governantes o usufru-to da publicidade dos projetos, resguardan-do-lhes o direito de justificar a inércia doplano que prometia A ou por que alguém,às vezes ele mesmo, não fez B.

Eu pergunto: qual o gesto que você podeme dar da história recente da Abert, dosúltimos oito a dez anos, a favor da demo-cratização das rádios comunitárias?

Ronald Siqueira Barbosa – Você me fazlembrar aquele escritor George Orwell, queem 1948 falou que em 1984 se teria o Es-tado olhando pela televisão todo o país. Ouseja, seria a inclusão total. Eu tenho traba-lhado, também, em movimentos sociais etenho visto muitas vezes que as pessoas seperdem no pleito da reparação. Quandopede reparação, ele está reclamando do es-paço no estádio em que ele não conseguesentar, ele diz que vai passar e, depois, acabasentando. Quando você entra num estádiode futebol lotado, você pede eu quero pas-sar, o sujeito abre, e você acaba sentando.Outras vezes você quer um assistencialis-mo, ao invés da reparação. O que eu vejo éque nós precisamos ter projetos de desen-volvimento, e projetos de desenvolvimen-to empreendedores quase não aparecem. AAbert tem participado, sim, de toda a dis-cussão da democratização em termos deestudo da canalização. Mas você sabe quenuma cidade como São Paulo fica difícil.Fora de São Paulo, o Brasil todo já tem aco-modação para radiodifusão comunitária atédentro da faixa de radiodifusão FM. Mas SãoPaulo é um caso à parte, é um caso compli-cado. A gente não consegue resolver os pro-blemas de São Paulo facilmente. Você vaimexer numa situação de São Paulo – quan-tas estações comerciais há em São Paulo?Quantas têm pleiteado espaço, espectro, já

que não se diz que o espectro é infinito?Digamos que conseguissemos acomodar asque estão pleiteando, daqui a pouco apare-ceria uma leva maior pedindo. Até quandonós poderíamos suportar em termos deespectro essa capacidade de oferecer canal?E oferecer canal com que tipo de programa?Diferente do que está aí? Vai buscar audi-ência como? Essas perguntas também pre-cisam de respostas senão ficam pleiteandoum espaço no estádio para passar, sentam,mas não torcem, nem fazem parte da tor-cida. Querem apenas assistir ao jogo.

Audálio Dantas – Vai comentar, Sérgio?

Sérgio Gomes da Silva – Agora sim. Eufaço parte da equipe de apoio do InstitutoAyrton Senna. Durante três ou quatro anosnós fizemos parte do júri. Houve um anoem que três das cinco finalistas na área derádio eram reportagens de rádios comuni-tárias e uma delas ganhou, do Ceará. Porcoincidência, quem fez a entrega do PrêmioAyrton Senna foi exatamente o representan-te da Abert. Tiraram a foto. O pessoal doCeará, ao invés de ficar satisfeito, protes-tou: «Aí o pessoal da Abert não deixa lega-lizar». Pois bem, a partir daí houve pressãoentre as instituições que dão apoio institu-cional ao Instituto Ayrton Senna e ao Prê-mio de Jornalismo Ayrton Senna – a Abert,a Fenaj, a Associação Nacional de Jornais emais uma ou outra entidade. A Abert pres-sionou o Instituto a não aceitar inscriçõesde rádios comunitárias, mesmo das 3.500legalizadas. Tanto é que não teve nada.

Audálio Dantas – Sérgio, nós vamosvoltar ao debate, mas o estabelecido é que éa vez do representante da Abert de dirigir apergunta a quem ele escolher. Antes, porém,o Professor Gustavo Gindre tem uma obser-vação rápida a fazer. Um minuto, Gindre.

Gustavo Gindre – É rápido. Há um mitoque diz assim: se não fosse a porcaria quese transmite no rádio e na televisão brasi-leiros hoje – e, convenhamos, a programa-ção é muito ruim – se não for assim a po-pulação brasileira não assiste; tem que serisso, não dá para ser diferente, alega-se. Voucontar uma história rápida para vocês. OColetivo Intervozes, do qual faço parte,junto com outras organizações, entrou naJustiça junto com o Ministério Público e ti-ramos do ar, por desrespeito aos direitoshumanos, o programa do João Kleber e ga-nhamos na Justiça o direito de ocupar omesmo espaço, uma hora por dia, durante30 dias, com um programa chamado Direitode Resposta. Nesse programa nós discuti-mos, naquele horário da tarde que virouhorário mulherzinha no sentido mais pejo-

rativo, o horário em que o sujei-to fala de fofoca de novela, fala

de cozinha, diminuindo in-clusive o que deveria ser

discussão do gênerofeminino, nesse ho-rário nós discutimosos direitos dos ho-mossexuais, dostravestis, dos ne-gros, das prosti-

POPULAÇÃO REFÉMCrítico do atual modelode exploração daradiodifusão, GustavoGindre considera que apopulação é refém de um“modelo fracassado”.

“Ganhamos naJustiça o direitode ocupar o espaçodo João Kleberuma hora por dia,durante trinta dias,com um programachamado Direito deResposta. Naquelehorário da tardeque virou horáriomulherzinha nosentido maispejorativo, nósdiscutimos questõesessenciais e tivemosa mesma audiênciado João Kleber.”

Gustavo Gindre

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tutas, dos sem-terra, dos sem-teto, a ques-tão ambiental, o esporte, a comunicação.Vocês sabem que demos no Ibope a mes-ma pontuação do João Kleber sem nenhu-ma divulgação, sem mídia, sem chamada natv para dizer que aquele programa existia?Então, não é verdade que a população bra-sileira quer consumir apenas lixo. Ela querprogramação de qualidade. Acontece que ameia duzia de donos da capitania hereditáriado rádio e da televisão brasileira não forneceessa programação de qualidade à população.Quando fornecem a população consome.Não foram temas fáceis, foram temas den-sos, difíceis, temas às vezes dolorosos queforam tratados no horário da tarde da te-levisão brasileira e a população assistiu a es-ses temas. Não é verdade que a populaçãoquer apenas jabá no rádio, só quer venda detapete e anel, só quer culto evangélico; quea população só quer o jabá do Faustão, o jabádo Gugu. Não é verdade. A população queroutras coisas. O problema é que essas ou-tras coisas não são oferecidas às pessoas. Enão são oferecidas não é por acaso, não éporque o modelo de negócio indicou essetipo de coisa. Porque, convenhamos, boaparte da radiodifusão brasileira com essemodelo de negócio está quebrada. Só nãoquebra de vez porque o Estado dá guarida.Então esse modelo de negócio nem é vito-rioso. O rádio e a televisão estavam comágua no pescoço. Apesar de toda a publici-dade estatal, apesar de ter satélite subven-cionado durante anos – a Embratel estatalsubvencionava a transmissão via satélite dasemissoras privadas –, apesar do Caso Time-Life, apesar do escândalo da Nec, que mo-tivou até uma CPI na Câmara dos Depu-tados, apesar de tudo isso a radiodifusão bra-sileira está quebrada. Boa parte dela estáquebrada, porque tem um modelo de negó-cios fracassado. Só que é único. As pesso-as não têm acesso a outro. Então acabamficando reféns desse modelo fracassado. Sepuder escolher, a população vê o Direito deResposta, o programa que passou na RedeTV à revelia da Rede TV.

Audálio Dantas – Com a palavra Ro-nald Siqueira, da Abert. Antes quero dizerque este debate está sendo inteiramentegravado e a ABI o reproduzirá nos seusveículos da comunicação. O representanteda Abert, Ronald Siqueira, dirigirá a pergun-ta a um dos debatedores.

Ronald Siqueira Barbosa – Gostaria,primeiro, de ressaltar a excelência da progra-mação da radiodifusão brasileira. Só quemvai para fora do Brasil é que percebe a dife-rença entre a programação da tv aberta naEuropa ou nos Estados Unidos e o nível daprogramação brasileira. É muito injustoquando a gente classifica toda uma progra-mação, compromete tudo por causa de de-terminados programas. Tudo tem exceção.Eu vou a Genebra, vou aos Estados Unidos...

Audálio Dantas – Nós vamos abrir asperguntas depois para o público, por favor.

Ronald Siqueira Barbosa – Quero fa-zer a seguinte pergunta: temos atualmen-te no Brasil quase cerca de 20 mil estações-

piratas que não procuram a regulariza-ção. Pergunto ao Sérgio o que ele con-sidera correto: lutar pela questão regu-latória oficial, para se regularizar pelomenos metade dessas estações, ou vocêacha que está todo mundo certo agin-do irregularmente e colocando sinal noar nessas 20 mil estações?

Audálio Dantas – Antes de o Sér-gio responder, queremos comunicar quepassaremos à platéia e teremos meiahora para os interessados em fazer per-guntas aos integrantes da mesa. Sérgio,por favor.

Sérgio Gomes da Silva – Quandohouve a abolição da escravatura no Bra-sil, ela foi precedida de duas leis, a doVentre Livre e a do Sexagenário, exata-mente para que não se assumissem res-ponsabilidades nem em relaçao aos ve-lhos que já tinham sido chupados emtoda a sua energia, nem em relação àscrianças, porque iria ser muito caro man-tê-las. As duas leis, na verdade, eram paraprotelar até o momento da abolição daescravatura, que quando vem, em 1888,não oferece abolutamente nenhuma in-denização. Você sabe disso, porque vocêé um negro, você sabe da necessidade delutarmos contra essa barbaridade: 1888,abolição; 1889, República. Todos os pro-prietários de escravos foram indeniza-dos pelo que perderam, porque escravoera uma propriedade; esses bens foramdesapropriados. Todos receberam. O Esta-do brasileiro pagou. E nenhum dos libertosrecebeu qualquer tipo de indenização ou

apoio para reconstruir a sua vida. Pelo con-trário, chamaram os italianos, espanhóis,etc., mão-de-obra mais barata. Não foi as-sim? Essa é a tara do Brasil, a tara do na-vio negreiro, em que o comando é sempreo mesmo, 10% no convés e 90% no porão,na casa das máquinas, fazendo conta de quenosso povo não existe. Milhões de anos daÁfrica para cá não há sequer um registro deum diário de bordo, de um caderno dizen-do o que aconteceu. Então faz de conta queo nosso povo não existe. Eu falo aqui doponto de vista do porão, da casa das máqui-nas, mas alertando a todos que se esse naviofor a pique morre quem está no porão, mastambém não se salva quem está no convésou quem está no comando. Os últimos si-nais dão conta disso. Ou democratiza sobtodos os pontos de vista ou veremos umasituação muito, muito complicada pro pes-soal do convés e pro pessoal do comando.Ora, qualquer meio de comunicação queabre de manhã e feche à noite tem que terevidentes cinco questões: apoio político, asociedade tem que estar de acordo; tem queter leis que o favorecem nessa vontade po-lítica ou criam dificuldades; existem as ques-tões técnicas, os equipamentos; as questõesde saber fazer a programação e a última, queme parece mais importante, que está liga-da à abolição da escravatura, que é a auto-sustentação, a possibilidade de o sujeito serliberto e dono de si. Ora, a lei aprovada naCâmara dos Deputados proíbe publicida-de e apoio cultural às emissoras comunitá-rias. Portanto, coloca-as na mão do narco-tráfico, do crime organizado, que tem di-nheiro; na mão das religiões fundamenta-listas, que têm dinheiro; na mão dos polí-ticos, já disse aqui, padrão Roberto Jeffer-son, que têm dinheiro para que essas emis-soras se sustentem. É preciso que se dêemcondições para que essas emissoras possamse auto-sustentar.

Nesse sentido, foi aprovado pela CâmaraMunicipal de São Paulo, após quatro anosde tramitação, um projeto de lei, número145, de iniciativa conjunta de dois vereado-res, um do PT, Carlos Neder, que era líderdo PT na Câmara, e do filho do falecidoGovernador Franco Montoro, RicardoMontoro, um dos mais votados do Muni-cípio. Contrariando toda a lógica do deba-te nacional, estadual e municipal, PSDB ePT firmaram um pacto de que nessa ques-tão da democratização não se iria cair na lidafácil da encrenca, do diz-que-diz, do dá-lá,toma-cá. Esse projeto, aprovado por unani-midade em todas as Comissões e pelo Ple-nário, sancionado pelo José Serra e regula-mentado, permite que o Município parti-cipe da definição sobre quantos canais de-vem existir no seu território. É preciso nãoesquecer que somos uma República Fede-rativa, constituída pela União, Estados,Municípios e o Distrito Federal. Do mesmojeito que você tem atribuições para Legis-lativo, Executivo e Judiciário, do mesmojeito existem atribuições para a União, paraos Estados, para os Municípios e para oDistrito Federal. Uma lei municipal não émenor que uma lei estadual ou federal. É aLei Maior, a Constituição, que, no artigo 5º,garante a liberdade de expressão, que tem deser respeitada. Pois bem, a Abert fez de tudo

VER PARA CRERAssessor Técnico da Abert,Ronald Barbosa diz que éexcelente a programaçãoda tv aberta do Brasil epropõe uma comparaçãocom a tv dos EstadosUnidos e da Europa.

“Eu falo aqui doponto de vista doporão, da casa dasmáquinas, masalertando a todosque se esse naviofor a pique morrequem está no porão,mas também não sesalva quem está noconvés ou quemestá no comando.Ou democratizasob todos os pontosde vista ou veremosuma situação muitocomplicada propessoal do convése pro pessoal docomando.”

Sérgio Gomes da Silva

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O VENCEDORO Ministro Hélio Costa,que é detentor deconcessão de radiodifusão,ganhou a parada e fezprevalecer com a escolhado modelo japonês osinteresses dasconcessionárias.

para derrubar essa lei. Alexandre Kruel Jo-bim: esse nome lhe diz alguma coisa? Asses-sor jurídico da Abert, filho do ex-Ministrodo Supremo Tribunal Federal Nélson Jobim,Alexandre Kruel Jobim é o contratado pelaAbert para ser o advogado lobista contra asrádios comunitárias. Ele ajuizou uma açãodireta de inconstitucionalidade, intimidandoo prefeito e os vereadores, porque todosdependem dos meios de comunicação parafazerem campanha, dizendo que essa lei éinconstitucional. Kruel Jobim cometeu abobagem de entrar com isso no Tribunal deJustiça de São Paulo, não sabendo que leisinconstitucionais têm que ser questionadasno SupremoTribunal Federal e não no Tribu-nal de Justiça de São Paulo. Eles vão come-ter barbaridades porque são irracionais, nãoentendendo que há uma contradição, a taldas três leis gerais da dialética, como se fa-lava antigamente, tudo é dinâmico, tudo écontraditório e tudo se relaciona.

Na área da tecnologia a tendência é ademocratização, cada vez você tem equipa-mentos melhores e mais baratos; se não forassim não há escala na indústria. Por outrolado, há também uma vontade de manterrestrito o acesso aos equipamentos, porquesó podem ter meios para atuar na área decomunicação os de sempre, os donatários,o pessoal das sesmarias. É perfeitamentepossível, hoje, com as novas tecnologias,ampliar o processo de produção dainformação.Por isso temos que ter uma le-gislação que favoreça a democratização dasociedade brasileira. Lamentavelmente,Ronald, os seus interesses – não os seusinteresses particulares, pois você está repre-sentando aqui uma instituição – colidemcom essa aspiração de democratização. Suainstituição, a Abert, representa basicamentea Rede Globo, e a Globo, por essa tara doescorpião, tem que morder o sapo que estáajudando-a a atravessar o rio. É tudo con-traditório: ao mesmo tempo que tem umpadrão que está acima da média mundial,é verdade, ela consegue ser antidemocráti-ca, a ponto de não ter nenhum programade debates, nem mesmo sobre futebol, comofoi dito. Não há na Globo nenhum programade debates, você não me cita um. E quan-do se fala em alguma coisa parecida com umdebate, que seria o programa de entrevis-tas do Jô Soares, só ele fala.

Eu quero dizer o seguinte, isso aqui é real:não só aqui em São Paulo, mas também emvários Municípios há escolas que, respeitadaa Lei de Diretrizes e Bases, podem e devemter emissoras de rádio para se articular comsuas comunidades. No caso de São Paulo,93% das crianças do ensino fundamentalmoram a uma distância de até um quilôme-tro de suas escolas. Portanto, mesmo essaemissora restrita – 25 watts, antena de 30metros – pode alcançar a comunidade dosalunos da escola.

Audálio Dantas – Sérgio, favor concluir.

Sérgio Gomes da Silva – Então, isso crianova condição de interatividade entre ascomunidades e os meios de comunicação, asescolas, Abert, outras entidades, etc. Ou aAbert tem a compreensão de que isso é umbem e abre mão de alguma coisa para que

a sociedade se democratize ou vai serrar ogalho em que seus membros estão sentados.

Audálio Dantas – Vamos iniciar o de-bate com a platéia. Já temos uma inscriçãolá do fundo, outra aqui. Serão 30 minutos.As perguntas podem ser dirigidas a um dosnossos convidados. Por favor, a maior bre-vidade nas perguntas e a mesma coisa nasrespostas.

Pergunta 1 – Realmente a gente com-preende que o tema tv digital e a democra-tização da comunicação é complexo, a partetécnica muito mais ainda para todos nós.Creio que quando se fala na questão da tvdigital para a sociedade, o Sérgio Gomesfalou muito bem, pois temos que pensarqual é o projeto para o desenvolvimento dasociedade brasileira. E isso não foi levantadoaqui. Quando Sérgio Gomes toca na Lei doSexagenário e na Lei do Ventre Livre, eu,como negro, acho que estamos entrandonuma retórica que não é a realidade de hoje.

Acho que estamos aqui para discutir ademocratização da comunicação no avan-ço que a sociedade conquistou, não adian-ta querer nessa retórica colocar o quê, di-zer que estamos impedidos de ter um pen-samento de realidade para o futuro. Nóstemos que pensar assim, houve um passa-do, temos que registrar historicamente essepassado. Porque a escravização continua atéhoje, não só do negro, mas também do bran-co e do indío. A escravização sempre exis-tiu no mundo. E hoje, afirmo, há uma es-cravidão na nossa sociedade. Nós temos queabrir os olhos para isso. Dizer que temosliberdade: de quê? Vocês mesmo estão fa-lando da comunicação. Ela não é livre, éapenas aparentemente livre. Se há oportu-nidade de que a sociedade, independente-mente do partido que esteja no Governo,avance no caminho da democratização queas novas tecnologias proporcionam, estastêm também um viés de risco, porque po-dem ficar nas mãos de alguém que as ma-nipule e assim detenha mais poder. E a tv

digital tem essa capacidade. A regulamen-tação é que tem de ser debatida aqui e nãofoi. Não foi levantado qual é o projeto paraimplantar a tv digital no Brasil, como será,e não como experimento.

Em todos os planos que temos visto é anação que paga o seu preço. E vai se pagarmais um preço por esse também, porque nofinal ele só vai favorecer uma minoria que vaiexplorar o povo, haja vista, por exemplo, quetemos aí o Fome Zero com o Bolsa-Família.Distribuem-se 7 bilhões para o Bolsa-Família,o que é maravilhoso, mas em compensaçãogastam-se 167 bilhões por ano para pagar adívida pública, que favorece a quantos? Foifalado aqui que esses 167 bilhões favorecemapenas 20 mil famílias, enquanto 7 bilhõesvão para os pobres que são 40 milhões. Essarealidade não se colocou aqui.

Aquele aparelho que vai ser colocado noaparelho para captar a tv digital hoje tem opreço de 300 reais. Então há essa questão eco-nômica, sim. Há interesses econômicos? Há.Nós vamos ser usados como manobra, comosempre: o povo é mero espectador para pagaras contas, que vão favorecer meia dúzia.

Quanto à oportunidade do debate, oSérgio Gomes da Silva falou bem, temos depensar qual o projeto melhor. No fim nãosaiu nada. Não houve essa discussão. Aminha pergunta: qual o projeto de tv digi-tal capaz de favorecer a sociedade de hoje?(Autor da pergunta não identificado)

Audálio Dantas – Eu entendo que apergunta é dirigida...

Pergunta 1 – A todos.

Audálio Dantas – O Professor Gusta-vo Gindre, pelo conhecimento técnico quetem, responderá a essa pergunta. Se fornecessário, o Sérgio Gomes complementa.

Pergunta 1 – Na questão de conteúdotemos a mesma situação da televisão aber-ta, em que até hoje ela não foi solucionada.Estamos numa discussão que não vai levar

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DILMA AMARELOU?Em sua intervenção naABI, o Ministro Gilberto Gilrevelou a esperança deque a Ministra Dilma

Rousseff apoiaria asua posição. Nahora h, Dilmafrustrou essaexpectativa.

a nada porque na tv aberta também não semelhorou conteúdo. Dizer que a nossa te-levisão é pior também é mentira, porque osprogramas que são sucesso aqui no País sãoquase todos importados. Big Brother não édaqui, é importado lá de fora, e assim os de-mais. O padrão da televisão brasileira não édiferente dos demais países do mundo. A ma-nipulação econômica é mundial. Hoje nãoexiste territorialidade para o poder econômico.

Audálio Dantas – O Professor Gusta-vo Gindre e em seguida o companheiroSérgio Gomes. Peço que sejam breves nascolocações.

Gustavo Gindre – Acho que a genteconseguiu acumular alguma coisa aqui, masé óbvio que num debate não dá para a gentese aprofundar como gostaria. Eu queriachamar a atenção, e aí me referindo aoSérgio Gomes, que sempre fala desse vícioda consciência infeliz que a gente tem. Nocaso da tv digital, se a gente comparar como que a gente gostaria de debater com asociedade, é óbvio que a gente está muitodistante do que seria o ideal. A sociedadeenvolveu-se pouco, poderia ter-se envolvi-do mais, principalmente os movimentossociais não ligados diretamente à comuni-cação, os quais deveriam perceber que acomunicação é questão central para todasas lutas sociais e não apenas para quem fazcomunicação. Agora, se a gente compararcom a realidade que a gente tinha antes, essetema galvanizou a sociedade de uma formaque, arrisco-me a dizer, o empresariado eo Governo não esperavam .

Quando o Ministro Hélio Costa falou quea bola estava na risca do pênalti, achou queesse jogo estava liquidado – aliás, Costa é omineiro menos mineiro dos mineiros, foitrombando, achou que esse jogo estivesseliquidado e se surpreendeu com a capacidadede reação da sociedade civil, com o fato deestar acontecendo debates todos os dias. Nósdo Intervozes estamos todos os dias emdebate no Brasil inteiro. Ainda esta semanaeu vou a Porto Alegre e a Salvador partici-par de debates. Hoje ainda está havendo noClube Militar e no Clube de Engenharia. Vá-rias entidades da sociedade estão-se envol-vendo – a ABI, o Clube Militar, várias outrasentidades. É sinal de que parte da socieda-de chamou para si esse debate. E propostasexistem. Não estamos só discutindo princí-pios, ainda que os princípios sejam funda-mentais. Propostas existem. Eu queria cha-mar a atenção, primeiro, para esta publica-ção, que é o segundo número, que o Coleti-vo Intervozes está fazendo; não é só o Inter-vozes, mas eu posso falar pelo Intervozes.Nós encartamos o primeiro número emCaros Amigos de novembro do ano passado.Estamos fazendo um segundo número com24 páginas, discutindo tv digital. Tiramos 55mil exemplares, passando o chapéu para fazerisso. Quem comprar a Caros Amigos este mêsvai receber esta publicação. São 40 mil quevão circular na Caros Amigos mais 15 mil queestamos distribuindo para todo o País.

Aqui a gente discute operador de rede,discute interatividade, política industrial,a gestão do espectro, o marco regulatório,leis de incentivo à produção audiovisual.

Então, a sociedade civil tem propostas.Quem for ao site do Intervozes –www.intervozes.org.br – vai achar umdocumento de 28 páginas que foi entre-gue em mãos ao Ministro Gilberto Gil,à Dilma Roussef, Ministra Chefe da CasaCivil, ao Ministro Sérgio Resende, da Ci-ência e Tecnologia. Só não foi entregueao Ministro das Comunicações porque elese recusa a nos receber. Nós pedimos au-diências três vezes; ele recebe os radio-difusores mas não nos recebe. Esse docu-mento de 28 páginas traz propostas con-cretas, específicas, sobre marco regulató-rio, modelo de serviço, política industri-al e sobre produção e distribuição de con-teúdo audiovisual no Brasil. Não é só prin-cípios. São propostas concretas para comotransformar a tv digital numa mídia de-mocrática. A sociedade civil tem propos-tas. A sociedade civil amadureceu. A socie-dade civil sabe o que quer. A nossa questãonão é falta de propostas. Nós temos propos-tas. A questão é o poder político que está portrás de um determinado viés a favor da im-plantação de um determinado modelo de tvdigital no Brasil.

Audálio Dantas – Sidney tem algumacoisa a acrescentar? Então abrimos o debate.A quem se dirige a sua pergunta?

Pergunta 2 – Bruno, estudante deJornalismo – A minha pergunta vai parao representante da Abert. Com relação aopadrão tecnológico de tv digital, a Abert eos radiodifusores defendem o padrão japo-nês apostando numa suposta superiorida-de técnica desse padrão. No entanto, os es-tudos realizados pela Abert e pela Set, da-tados de 2000, indicam que nenhum dos trêspadrões estrangeiros alcançou 100% das

residências. Considerando que a modulaçãobrasileira é mais robusta e poderia até terum desempenho melhor, por que essa de-fesa tecnológica nesse sentido? E outracoisa: essa defesa da alta definição. Gostariade saber se a alta definição não cria duas clas-ses de telespectadores, os que têm acesso aessa alta definição, que podem comprar umaparelho ao custo de 10 mil reais, aproxima-damente. Se isso é justo, se não deveria ha-ver um princípio de isonomia para que to-dos os receptores recebessem a mesma qua-lidade de imagem?

Ronald Siqueira Barbosa – Bem, antesde mais nada eu agradeço a pergunta. E lhedigo uma coisa, começando pela alta defini-ção. É importante que se tenha flexibilida-de porque há pessoas que querem comprarum programa com a qualidade de vídeomelhor do que outro. É como você oferecerem qualquer situação de mercado no Brasilprodutos com valores diferenciados depen-dendo do tipo de informação que você quer. Então, por exemplo, se você quer compraruma Ferrari e vão andar na mesma pista, eo outro quer comprar um Fusca, um carromais barato. Acho que tem que ter opção.Quando nós pensamos num padrão para atv nós estávamos pensando numa flexibili-dade tanto para o radiodifusor quanto parao público. O radiodifusor vai oferecer aqui-lo que seu público deseja, ele vai fazer umasondagem com o seu público. Se eu estivernuma cidade e o público tiver interesse numdeterminado tipo de informação, quiser maisdados de informação adicional do que altadefinição, esse radiodifusor vai oferecer maisdados para o público dele. Se o público é deoutro tipo, quer ver mais filme, está acostu-mado a ver em dvd e quer ver filmes em altaqualidade, ele vai oferecer também filmescom alta qualidade para o público. Porque,na verdade, quando se pensou num padrãopara o público, pensou-se também na flexi-bilização desse público. Aquele que quiser verum programa numa telinha pequena combaixa resolução, como a da telefonia celular,em que vocês não precisam de 19 Mb, tam-bém vai receber a sua imagem no aparelhocelular, numa resolução menor e com umataxa bem menor. E o MP4 está aí para essedesenvolvimento.

Você tinha falado na questão de 90% doslares. Nenhum teste feito pelo grupo Abert-Set cumpriu o seu objetivo. Não é verdade,não. Nós fizemos exercício, por exemplo, láem São Paulo, e ficou demonstrado que eramuito pequena a potência que usamos noteste de tv digital quando a gente colocouno ar, lá na TV Cultura. Mas mesmo assimsurpreendeu para a gente a cobertura quefoi dada na estação em torno da cidade. Ago-ra, eu quero dizer para você que todo o pla-nejamento em radiodifusão é um projeto deengenharia, em que você usa curvas, e queessas curvas dão o campo mediano excedi-do em 90% do tempo, que é um campo ex-celente. Não existe uma condição dessa me-lhor em engenharia. Você cobre todas as mo-radias. É lógico que se há cidades com pro-blemas topográficos muito acentuados, comoSão Paulo tem, você precisa em determina-das cidades a frequência de televisão comofrequência de FM; são frequências de refle-

“Eu não acredito quevamos ter vazios derecepção porque nãohá interesse daradiodifusão emhaver lugar em queninguem recebasinal de televisão.A gente quer todotipo de público, sejaA, B, C, D e E.”

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LUTA DESIGUALPor meios impressos(acima) ou eletrônicos(ao lado), o Intervozese a Oboré têm travadouma luta desigual pelamelhor solução naimplantação da tv digital.

xão e não frequências de encurvamento. Vocêpode ter zonas de sombra e você pode pre-encher isso, a gente chama de gap filler parapoder aquela região ali ser coberta e você po-der ter toda a sua cobertura sem desconti-nuidade de sinal. Mas, na verdade, camposque você trabalha com 90% significam quevocê está usando uma curva e que 90% doslocais são recebidos durante 90% do tempo.Você está fazendo uma cobertura. Em termosde planejamento não há situação melhor nomundo para fazer planejamento como foifeito no caso do Brasil.

Eu não acredito que vamos ter vazios derecepção porque não há interesse da radi-odifusão em haver lugar em que ninguémreceba sinal. A gente quer todo tipo de pú-blico, seja A, B, C, D e E. Por isso, na pro-gramação, inclusive, a gente tem programa-ção diversificada que muitos podem acharque não serve, não é boa; não é lixo, não éruim na sua maioria. Você tem programasque precisam ser realmente melhores, masonde você não tem que melhorar neste Paísem alguma coisa, em alguma situação? Essaé a grande pergunta.

Respondendo ao Sérgio Gomes, eu sóqueria dizer uma coisa a ele. Quando euperguntei sobre as 20 mil emissoras-piratas,e ele me deu o exemplo da escravidão, real-mente na escravidão nós ficamos despojadosde tudo. Eu trabalho em movimento social.Sou conselheiro do CNPI-Conselho Nacionalde Promoção da Igualdade Racial, mas nempor isso nós saímos invadindo fazendas, nemtomando terras porque os quilombos foramperdidos; foram perdidos mas não foram in-vadidos para poder justificar ações ilegais,como se faz na transmissão da estação-pi-rata. Era essa a comparação que queria fazercom você, Sérgio Gomes.

Audálio Dantas – Companheiro, aquino centro, no microfone, por favor. Eu queroanunciar a presença do associado ArthurCantalice, que é membro do Conselho De-liberativo da ABI e Secretário da Comissãode Liberdade de Imprensa e Direitos Huma-nos da ABI..Quero dizer também que vamosapressar um pouco. Já tivemos aqui cerca de200 pessoas e agora vamos esvaziando.

Pergunta 3 – Cleber Alcazar – Há 5anos iniciei um projeto cultural chamado TVBobo, que deixei na mesa para vocês. Isso hácinco anos atrás foi uma semente pequena,uma tentativa de utilizar uma linguagemaproximada da televisão dentro de um veí-culo livre, democrático até então e que ain-da é, a internet. E essa semente já era umatentativa de se pensar numa tv digital. Na-quela época eu tinha esse veículo disponívele com isso consegui de maneira independenterealizar uma incursão num universo social,que é o universo da base da pirâmide, ondeestão incluídos os cortadores de cana de Per-nambuco e os moradores de rua da Zona Suldo Rio de Janeiro, como exemplo.

Hoje, neste debate, me vêm à mentequestões fundamentais sobre as quais é pre-ciso refletir ao longo do tempo que for uti-lizado para chegar a um ponto ideal de apro-vação da sociedade, que é a visão que temosde veículo de comunicação como concessãodo Governo para ser utilizado pela socieda-

de. E aí nós temos conceito de uma sociedaderesponsável capaz de produzir com essa con-cessão, capaz de administrar recursos tecno-lógicos e poder pensar essas questões da fre-quência, dos curvamentos, de todo esse de-talhamento para se colocar à disposição daspessoas um conteúdo que seja cultura e queacaba esbarrando na disputa do poder peloespaço e na questão do uso do espaço comoconcessão do Governo de maneira comercial.

Quando a gente chega nesse ponto do usocomercial já começa a criar as estratosferasda problemática onde temos num pontoalto da pirâmide essa sociedade aparelhadae responsável que a gente pode reduzir apoucas famílias, as oito famílias que detêma maior parte desse veículo, transmitindoum conteúdo ideológico que acaba sendo as-similado pela pirâmide inteira mas nuncachegando verdadeiramente até à base.Enessa leitura a gente enxerga um grande pro-blema que é o elemento da base da pirâmidee aí a gente pode até incluir essa história daescravidão como um resquício de toda essadominação ao longo do tempo; ele sempreé tratado como um personagem, um perso-nagem a ser retratado. Quando a gente as-siste às grandes produções, por exemplo, agente se sensibiliza e chora. A gente choraquando vê uma boa reportagem feita na Ro-cinha, quando é exibida a vida mediocre e des-materializada da senhorinha que vende re-frigerante na praia, ou coisa parecida. Esseconteúdo, que é intelectualizado, é vistocomo uma coisa agradável aos olhos dessasociedade idealista, que detém esse rumo detecnologia e de controle do veículo, e esse ci-dadão que é retratado é sempre visto comopersonagem, e não como ator do processo.

Quando a minha sementinha nasceu hácinco anos atrás eu imaginava que a internetpoderia ser a porta aberta para que esse per-sonagem saísse dessa tela pintada com coresde uma dramaticidade real e pudesse entãoassumir o seu papel como cidadão e aí, quemsabe, surgir uma inversão de valores, onde essecidadão organizado em pequenos grupos e atéindividualmente começaria a reescrever ahistória ideológica do País e aí poderia retra-tar essa classe que controla esses recursos deuma maneira não tão agradável que essescontrolados pudessem esperar...

Audálio Dantas – Por favor, em funçãodo tempo o companheiro pode formularuma pergunta.

Pergunta 3 – Perdão. Então eu gostariasó de deixar o seguinte questionamento: oGoverno está sinalizando para a sociedadeque é presa desse grupo controlador. Ou seja,o Governo, que é o concessor desse conteú-do, tem menos voz ativa de condução do queesse grupo controlador. O veículo em si, nasua essência, é democrático porque ele abrea possibilidade de um uso muito maior pelasociedade. Gostaria de saber dos membros damesa como garantir que esse veículo funci-one na base essencial dessa concessão.

Sérgio Gomes da Silva – Não está sen-do levado em conta pelos meios de comu-nicação de massa comercial que, através dasestações institucionais existentes, como astvs legislativas, a TV Justiça, a Radiobrás,as TV Cultura, eles poderiam refletir na suaprogramação a sociedade de base que vocêdiz que pode não estar sendo contempladapor esses meios comerciais de comunica-ção. Eu sugeriria um ponto de partida de dis-cussão: utilizar os meios que o próprio Go-verno tem, seja ele federal ou estadual, paraa divulgação e para a informação do trabalhoque é feito na parte da base da pirâmide,como você sugeriu. Outro ponto seria vocêter parte do espectro. Como já há algunscanais a que você poderia atribuir esses ser-viços, poderia destinar-se um determinadocanal para que ele pudesse ter uma progra-mação específica, que pudesse contemplarnum Município a sua demonstração da par-ticipação da população num canal de tele-visão. Esta seria uma sugestão.

Audálio Dantas – Professor GustavoGindre, por favor.

Gustavo Gindre – Eu apontarei algumascoisas rapidamente. Primeiro, essa coisa depirata. Piratas são aqueles que singram osmares atrás do ouro. Se as rádios comuni-tárias são sem fins lucrativos, piratas nãosão elas. Não são elas que estão atrás doouro. Desobediência civil não pode ser con-fundida com pirataria. São duas coisas bemdiferentes, historicamente bem diferentes.

Outra coisa: esse negócio de transmitir emHD, em alta definição. É preciso que as pes-soas entendam o seguinte: se eu transmitoem alta definição, o sujeito que não tem os10 mil reais para comprar o aparelho lá ficaimpossibilitado de assistir à transmissão. Temque ser de tela grande porque senão nãoadianta nada. Uma alta definição em tela de17 polegadas fica igualzinha à definição co-mum. Esse sujeito lá só vai receber, porquetv digital tem um problema: você não rece-be com chuvisco, não recebe com chiado. Sevocê não receber bem, não recebe nada. É telaazul. Esse sujeito só vai receber a imagem láse ela for transmitida em alta definição, deduas formas: ou ele vai ter que comprar o te-levisor de 10 mil reais ou a emissora vai trans-mitir duas vezes a mesma programação, numbaita desperdício de um bem público e fini-to. Você ocupa um bem público e finito trans-mitindo duas vezes a mesma programação

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em alta definição para aquela elite que podepagar os 10 mil reais e em definição padrãopara quem não pode. Você desperdiça umbem público e finito apenas para atender co-mercialmente a uma faixa da população. Oué isso ou você vai fazer pior. Você vai dizerpara o sujeito que não tem os 10 mil reais:compre um setox boxe – um aparelhinho– que faça a decodificação da alta definiçãopara você poder receber na sua tv comum.Ou seja, compre uma Ferrari para poderandar em estrada de terra. Você vai compraralgo mais caro para não receber esse maiscaro porque você vai ter que codificar essaimagem para ela entrar na tv comum. Ouseja, pagamos todos nós desperdiçando umbem público para ser usado duas vezes coma mesma programação, ou paga o consumi-dor tendo que comprar uma caixinha quepossa fazer a decodificação. Não tem saí-da. De qualquer maneira alguém dança. Eaí é preciso lembrar o seguinte: os radiodi-fusores precisam ter cuidado, inclusive eraum alerta que deveria ser feito, para nãoseguirem o caminho de seus co-irmãos datv paga, que insistiram num modelo tãoelitizado que fracassaram. O modelo de tvpaga no Brasil é um fracasso comercial, com8% de penetração. É um fracasso. Eles têmque ter cuidado para não fazerem com a tvdigital o que os seus co-irmãos, que sãoquase os mesmos grupos empresariais, fi-zeram com a tv paga, que no Brasil fracas-sou. Cuidado para que a tv digital no Bra-sil não seja uma coisa de penetração eliti-zada e dar um tiro no pé e daqui a poucosuportamos a Varig, suportamos não sei oquê e agora vamos ter de correr atrás paraajudar os radiodifusores.

Rapidinho, outra coisa: o estudo Set-Abert. É verdade. Nenhum dos sistemasinternacionais conseguiu alcançar100% das residências hipotéticas docenário. Significa que se ele fossetransmitido comercialmente boaparte das pessoas estaria rece-bendo tela azul. O sistema sor-ce, desenvolvido pela Puc do RioGrande do Sul, como trabalhacom inteligência artificial, é umsistema mais desenvolvido sim-plesmente porque veio depois,pode-se valer do desenvolvimentojá existente para melhorar esse de-senvolvimento; tem umataxa de recepção melhor.

Portanto, se fosse

adotado o Sistema Brasileiro poderia se teruma taxa de recepção maior. O que nos levaa discutir: se não é a recepção, por que asemissoras querem o padrão japonês? E aí sópara lembrar. Vocês sabem quem financioua compra dos equipamentos para fazer o tes-te Set-Abert, que foi realizado no laboratórioda Mackenzie? A Nec. Quem financiou osequipamentos foi a mesma empresa quepertenceu durante 13 anos à Globopar, aholding da família Globo no Brasil. Vocêssabem quem é a vice-presidente do Dibeg,que é o consórcio das empresas que divul-gam o ISDB ? A Nec. A presidência é aToshiba; a vice-presidente, a Nec. Está lá nosite do Dibeg. Foi ela que pagou os equipa-mentos que estão lá no estúdio da Macken-zie para que a Mackenzie fizesse os estudosque concluíram que o ISDB era melhor.

Quem coordenou os estudos da Macken-zie com equipamentos da Nec para concluirque o ISDB era melhor é o diretor da Ma-ckenzie que vem a ser o diretor da Set(aplausos). Bem, outra coisa, rapidinho.Não é verdade que os radiodifusores têmpreocupação de que todo mundo receba tvno Brasil. Se fosse isso, 20% da populaçãobrasileira não estariam, hoje, assistindo a tvaberta com antena parabólica de banda C,porque a tv aberta não chega às suas resi-dências, inclusive em centros urbanos –basta ver no Rio de Janeiro a quantidade deantenas parabólicas de banda C que exis-tem. Essas pessoas não têm o direito decolocar suas antenas internas e receber tv.Têm que pegar de banda C. São 20% doslares brasileiros.

A tal ponto que a Globo pediu ao Gover-no brasileiro que a obrigasse a abrir o sinal

na banda C para transmi-tir a Copa do Mundo. A

Globo, por contrato, não poderia abrir osinal dela para a banda C para que as pes-soas recebessem porque o contrato dela láfora só permite transmissão para televisãoaberta. Acontece que você teria uma revo-lução no Brasil porque 20% dos lares bra-sileiros não recebem tv aberta. E aí ficari-am sem o sinal da Copa do Mundo. Quala saída? É a Globo pedir ao Governo paraeditar um decreto obrigando-a a abrir o si-nal. Aí a Globo pode ir lá na Fifa e dizer: “In-felizmente, eu vou ter que abrir o sinal. Ocontrato me impede, porém o meu Gover-no está obrigando porque simplesmente20% da população brasileira não têm aces-so à tv aberta”. Quem me garante queesse cenário não se repete ou se amplificana tv digital?

Outra questão: pedir às emissoras públi-cas que cumpram seu papel público. Duasquestões: se for feito o modelo da Abertquem tem 6 Mh e ganha mais 6 Mh nãoadianta pedir para as tvs públicas fazeremisso por uma questão muito simples. As tvspúblicas não vão estar disponíveis na tvaberta. Se fizer 6 Mh e mais 6 Mh no Rio,São Paulo, Porto Alegre, Baixada Santistapelo menos, que nós verificamos isso jun-to à Anatel, não entra TV Câmara, nãoentra TV Senado, não entra tv comunitá-ria, não entra tv universitária, não entracanal AM BR. Não entra mais ninguém. Ficasó quem está. Então, mesmo se você pedira essas emissoras para cumprirem um requi-sito público, não dá. Como elas vão cum-prir se não têm espaço? Agora, segundaquestão: esquece-se que pública é a radio-difusão. Cada emissora tem apenas umaoutorga para uso, para transmitir essa pro-gramação. Toda a radiodifusão é um bempúblico. Então, quem tem que se submeteraos interesses públicos não são as emisso-ras públicas. São todas. É como se vocêchegasse num ônibus e dissesse: “Numônibus privado o idoso não vai entrar pelaporta da frente. Sinto muito. Vai entrar numônibus público, mas num privado não en-tra”. Por que o idoso entra pela frente numônibus público? Por que o transporte urbanoé uma outorga pública. Importa pouco seo ônibus é privado ou público. Todos osônibus têm que se submeter ao interessepúblico. Ora, se todos os ônibus têm que sesubmeter ao interesse público, por que a ra-diodifusão não pode se submeter? Porquea radiodifusão é tão exclusiva neste País queela trabalha ainda com uma legislação de1962, que não lhe imputa nenhuma obri-gação. O que garante à radiodifusão essepoder tão grande no Brasil que o capítulode radiocomunicação não foi regulado atéhoje? E portanto você não tem regra con-tra monopólio, não tem regra contra oligo-pólio. Portanto a regra lá que diz que a tvtem que ser regionalizada não é cumprida.As tvs todas geram do eixo Rio-São Paulopara o Brasil inteiro. Então, eu já estive noPiauí, num feriado, liguei o Jornal Nacionale soube que se eu estivesse no Rio e quisesseir para a Região dos Lagos deveria evitar aPonte Rio–Niterói. porque a ponte estavacongestionada. Isto passa no Piauí. Só queeu não estava no Rio de Janeiro, eu estavalá, porque lá não passa nada de Piauí. Pas-sa só um jornalzinho local.

DEFESA DO RÁDIOSérgio Gomes da Silvareclama atenção parao setor de rádio, cujaprogramação agradaa grande parte dapopulação. Nasdiscussões, diz, o rádionão tem merecido aatenção de que precisa.

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Se vocês forem nesses locais vocês vão verque as tvs são uma casinha. O sujeito pegaum estúdio, um jornalista, um cameramane faz a tv dele. E se vocês lincarem es-sas tvs com o quadro das oligarquiasregionais no Brasil, vão ver que a coin-cidência é impressionante. Quem é o re-transmissor da Globo na Bahia? Antô-nio Carlos Magalhães. Quem é em Ala-goas? Collor. Quem é no Ceará? Jereis-sati. Quem é em Sergipe? O AlbanoFranco. Vocês vão ver que são as oligar-quias. Por que a radiodifusão, que é umbem público, não se submete aos inte-resses públicos? Não são os radiodifuso-res públicos que têm de se submeter aosinteresses públicos. São todos. O espec-tro eletromagnético é um bem público.

Só para encerrar, uma vez eu estavapassando ali em São Paulo onde tem sedea Central Globo de Jornalismo e aí eufalei para o motorista de táxi:

“Pois é, esse prédio é da Globo”.Ele disse: ”Claro, está escrito Rede

Globo”.E eu:“Essas antenas aí em cima são da Globo,

não”.“É, são”.Deve ter pensado: “Tenho de concor-

dar, o cliente tem sempre razão. Pegueimais um louco no trânsito”.

Aí eu falei:“Pois é esses carros de reportagem que

estão aqui são da Globo e o cara é. Ocanal 5, pelo qual a Globo transmite emSão Paulo, não é da Globo”.

O cara deve ter pensado: “Agora eu te-nho certeza de que peguei um louco mes-mo”.

O cara:“Como não é da Globo?”Eu falei:“Não, o prédio é da Globo, as antenas

são da Globo, os carros são da Globo maso canal é nosso”.

O canal é um bem público, nos pertence.É uma outorga. Nós é que temos de definircomo aquela empresa vai explorar aquelebem público. Não cabe àquela empresa de-cidir por conta própria como ela vai explo-rar um bem público. Isso é subverter toda alógica do que é um bem público. O que épúblico nos pertence. A gente tem que pa-rar com essa mania no Brasil de que públi-co não é de ninguém, é terra de ninguém, quecada um faz o que quer porque afinal decontas é público. Não é verdade: público énosso, cabe a nós exigirmos isso. (palmas)

Audálio Dantas – Por favor. O que vocêquer, Sérgio? Depois você terá tempo parafalar.

Sérgio Gomes da Silva – Na verdade,quando a gente fala em canais para o pú-blico existem canais de tv de 60 a 69 que sãoda radiodifusão e poderiam ser utilizados.Foi por isso que sugeríamos que fosse dadopara a TV Justiça um canal que eles estãopleiteando, já há até projeto de lei delespleiteando. Então, teria canais para se fa-zer esse planejamento e eles poderiam fazê-lo muito bem. Quando você diz que umbem público pertence ao público, é lógico.

Todo o trabalho do Congresso Nacionaltambém é público porque é uma casa dopovo. E nós deveríamos estar lá tambémcom todas as nossas reivindicações atendi-das. Os governos estaduais, os governos fe-derais, todos eles se sucedem e tudo é pú-blico e a tudo devemos ter acesso e pediras coisas que achamos interessantes. Masvocês sabem que essa obrigação não seriasó na radiodifusão. Nós fazemos um esforçomuito grande para numa programação aten-der a maior parte da população. E eu te ga-ranto pela audiência que tem a radiodifu-são brasileira: eles não estão descontentesconosco, o povo brasileiro. Mas nós sabe-mos que realmente determinada sociedadeorganizada não demonstra essa mesma ale-gria, mas não reflete isso na audiência quenós temos no País como um todo. Nós te-mos grande audiência, coisa que não é con-seguida em outra mídia, não é conseguidapor outro meio de comunicação popular.

Pergunta 4 – Carlos Rodrigues – Soujornalista, associado da Casa e membro doConselho da ABI. Voltando ao padrão di-gital, como jornalista eu leio muitas coisasque me caem às mãos e às vezes não guar-do as referências, mas eu li numa publica-ção dessas que o padrão digital japonês, dostrês oferecidos ao Brasil, é o menos avan-çado. E o coleguinha que escrevia lá diziaque era até incipiente, que o Japão custoua entrar muito nessa área de conhecimen-to. Eu fiquei até surpreso, porque este estásendo o padrão mais badalado. Eu queriaesclarecer isso: é verdade o que eu li ou foichute do coleguinha?

Audálio Dantas – A pergunta é espe-cífica para algum representante aqui? Orepresentante da Abert responderia?

Ronald Siqueira Barbosa – Na verda-de, quando nós começamos a testar os pa-drões de tv disponíveis no mundo só haviao americano, o padrão TSC, que era umpadrão que permitia uma alta definiçãoembutida na transmissão, mas não permitiaa flexibilidade de você ter o sinal na mobi-lidade e na portabilidade. E aí você tinha,então, um padrão capenga. Quando fomospara o padrão europeu, ele tinha um padrãode definição padrão, mas não atendia à altadefinição, porque na concepção ele não foiprevisto para alta definição e nem para amobilidade. A mobilidade veio depois como DVBH, em que ele faz esse serviço numafaixa adicional. O Japão, olhando o padrãoDVB, que é uma evolução do DVB, fez al-gumas evoluções no padrão, tornando-ocompatível com alta definição, com defini-ção padrão, com mobilidade, para você fa-zer uma transmissão fazendo o internível,fazer mais uma transmissão com 4 milportadoras, o que não havia no DVB. Inclu-indo uma transmissão hierárquica, na qualna mesma transmissão você pode colocardefinição padrão, com alta definição, comdefinição para multimídia, com definiçãopara móvel, de modo que você possa ter emdiversos receptores o sinal que está saindoda emissora, com a qualidade que você quer,inclusive possibilitando que se tenha umreceptor diferente para receber uma televi-

são digital em alta definição e outra comdefinição padrão e outra com definição paramobilidade. Isso está sendo testado em SãoPaulo e as pessoas podem ver lá que vocêrecebe no celular, recebe num determinadotipo de receptor. Recebe num receptor de altadefinição. Não é verdade que você vai ficarcom uma transmissão de alta definição eninguém vai ficar com transmissão nenhu-ma porque nós não seríamos irresponsáveisque você tirasse a maioria dos receptoresbaratos. Não é isso. Nem queremos tambémcriar um legado como a Austrália, que lan-çou os receptores baratos e depois queria aalto definição e já tinha os receptores nomercado e não podia mudar a qualidade datransmissão. Então, quero dizer para o se-nhor que o padrão japonês é uma evoluçãodo padrão DVB e surgiu por último. Em 1998,quando começamos o teste, ele não haviasido aprovado com recomendação pela UIT,testando simplesmente o americano DVB.Quando chegou ao final do teste, nós adici-onamos o japonês, que tinha sido recém-aprovado pela UIT e nós conseguimos uti-lizá-lo ainda nos testes que tínhamos feito.Mas ele é uma evolução do padrão DVB, nãoé um retrocesso.

Audálio Dantas – Agora temos a últi-ma pergunta. Antes eu gostaria de umarápida observação. A respeito dos canaispúblicos que não estão na tv aberta, gostariade lembrar que essa questão, ainda quan-do fui deputado federal, nos anos 80, foimuito discutida e conseguimos que tevêspor cabo fossem concedidas também a ins-tituições representativas da sociedade, uni-versidades, rádios e televisões comunitári-as, etc e tal. No entanto, como foi dito aqui,esses canais não chegam ao grande públi-co porque não se constituíram como tele-visão aberta. É outra questão que acho im-portante discutirmos.

Vamos à última pergunta e, depois, cadaum dos debatedores fará sua exposição final.

Pergunta 5 – Ana Lúcia de Alvaren-ga Silva – Eu tive na rede comunitária detv dos Estados Unidos, por dois anos e meio,um programa que ia para a comunidadebrasileira e a gente difundia por oito canais.Eu sou produtora formada pela (diz o nomeem inglês) Television, que é um dos progra-mas que existem em Nova York e nos gran-des centros dos Estados Unidos que possi-bilitam que as pessoas da comunidade seformem e produzam programas que, seaprovados, podem ser veiculados nessas tvscomunitárias. A minha pergunta é para oGustavo Gindre, mas antes eu queria dar umtestemunho. Eu acho o seguinte: a gentevive essa questão de radiodifusão no Brasil,é importante que a gente fale dessas práti-cas. Essa prática é monopolista. Eu estouaqui como bisneta de escravos. Meu pai énegro. Sem essa coisa de raça e tal, na rea-lidade a gente não é americano, eu moro láhá oito anos, e somos bem diferentes. Nãoé questão de raça. Mas acho que é impor-tante a gente estar reportando essa práti-ca monopolista. Eu tinha esse programa detv na radio comunitária de NY. A RedeGlobo Internacional entrou nos EstadosUnidos, nos últimos anos, com uma força

“O canal é umbem público, nospertence. É umaoutorga. Nós é quetemos de definircomo aquelaempresa vaiexplorar aquelebem público. Nãocabe àquelaempresa decidir porconta própria comovai explorar umbem público. Issoé subverter toda alógica do que é bempúblico. A gente temque parar com essamania no Brasil deque público não éde ninguém, é terrade ninguém.”

Gustavo Gindre

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muito grande, e o que eles fizeram, na re-alidade, foi tomar o mercado dessas peque-nas produtoras de tv nos Estados Unidos.E transformou todo mundo que estava pro-duzindo conteúdo e se auto-sustentandoem produtores de comerciais para a RedeGlobo. Na verdade, essa é uma prática queela está exportando e levando com a RedeGlobo Internacional. Hoje em dia, todosesses pequenos produtores que entravamna tv comunitária para fazer conteúdo emostravam o carinha do local ali, o dono dapadaria brasileira, o dono do bistrô brasileiroque fazia uma advertising nessas tevês co-munitárias, essas produtoras brasileiras queestavam colocando conteúdo local no aracabaram pegando essas advertising para aRede Globo. A Rede Globo matou nossasproduções locais. Há dois anos atrás fiz umareportagem com o cara que era responsá-vel pela Latino American Net, que é brasi-leiro, a parte latina, e eu perguntei isso paraele: Por que vocês, que são Rede Globo, nãocontratam essas produtoras para colocar noar algo que estamos produzindo aqui? Elenão falou nada. Esta é uma prática mono-polista que está sendo exportada. Como odebate está sendo gravado, quero deixar umrelato. Vocês sabem o que está acontecen-do lá nos Estados Unidos? Por isso queriadeixar aqui este relato sobre prática preda-tória da Globo junto a pessoas que já nãoestão aqui. As pessoas que estão lá, que sãoimigrantes, continuam vendendo essa pro-gramação que vem do Brasil. A gente temque consumir os produtos de nossa própriacomunidade e não essa exportação e impor-tação de algo que é feito aqui também. Aminha pergunta é a seguinte: quero saberse o pessoal do Intervozes conhece uma or-ganização chamada Abusar, que trabalhacom democratização das comunicações, enessa questão da banda larga, eles consegui-ram retorno do dinheiro do pessoal. Vocêsabe sobre a Abusar? Eu queria saber comoestá essa questão, porque lá fora, em NovaYork, existe na juventude um processo deabandono da tv. mesmo. As pessoas estãoseguindo para comprar projetos. Vocês vãodizer: nas classes mais favorecidas. Mas atémesmo nas classes mais populares. Querdizer, o computador é um substituto da te-levisão. Ponto. Aqui a gente escuta, todahora, essa coisa de tv digital, mas, ao mes-mo tempo, lá fora isso já está ultrapassa-do e a gente está vendo mesmo é a evolu-ção para o computador e o acesso. O quese paga aqui de Velox é um absurdo, é umagrilagem o que se faz no Brasil. Na Europacom 90 euros você tem acesso a tv a cabo,você tem acesso a alta velocidade, você temtelefonia para dentro do país. Para todos osEstados. 90 reais? O equivalente a 90 reais,na realidade. Então, não entendo o queacontece no Brasil, o que se faz aqui é umagrilagem. Acho que está na hora de a po-pulação saber o que acontece lá fora jus-tamente para evitar esse tipo de coisa. Paraevitar esse tipo de discussão, de se dizerque o conteúdo da tv brasileira é maravi-lhoso. Olha, eu não sei, por isso eu ques-tiono o senhor.

A gente viaja muito, montamos umaprodutora. Eu assisto televisão porque te-nho de assistir. É péssimo, é horrível. Na

Europa se paga uma taxa de 149 dólares, naFrança é meio euro, porém têm proprieda-de da tv. Não vão botar qualquer porcariano ar, porque sou proprietário, eu estoupagando. Meio euro, mas estou pagando.Temos que dar uma tv totalmente gratui-ta. O cara vira um benfeitor. Só oito, novepessoas podem dar tv gratuita para o povo.E o povo que quer fazer tv? Chegou a horade o povo fazer tv. Então, a tv digital sig-nifica isso. A gente pode passar de passi-vo para ativo. E isso é fundamental. Entãoquero saber qual a relação do Intervozescom a Abusar? E essa questão da banda lar-ga, que eu vejo como fundamental: ela deveficar disponível para a maior parte da po-pulação. Não adianta distribuir computa-dor para Deus e o mundo, computador de100 dólares, pá, pá, se a pessoa não tembanda larga. Essa questão é fundamental:quero saber do Intervozes o que estão fa-zendo por isso?

Audálio Dantas – O Professor Gusta-vo Gindre responde e depois, em seguida,o representante da Abert faz suas condera-ções finais; por fim, o Sérgio Gomes.

Gustavo Gindre – Rapidinho. Pri-meiro, vou começar não necessariamentena ordem, mas só uma questão sobre atv gratuita, é bom que tenha sido toca-do isso. Não se sabe ainda se o sujeitoestava falando de algo mais sério ou dopreço do bandejão, mas na verdade o queele disse é que não existe almoço grátis.E isso é verdade, não existe tv grátis, tvgratuita; alguém está pagando. Hoje, porexemplo, eu estava lendo o ranking dosmaiores anunciantes brasileiros. AsCasas Bahia entraram nesse ano de 2005com 1 bilhão e 200 milhões de reais empropaganda. Ora, as Casas Bahia tiraramesse dinheiro de onde? De onde veio odinheiro que as Casas Bahia colocaramna publicidade? Dos produtos que as pes-soas compram nas Casas Bahia. Portan-to, parte do valor que nós gastamos aocomprar produtos vai para a televisão;portanto, a tv não é gratuita. A outra par-te do dinheiro que a tv recebe para vei-cular sua mensagem vem de verba pu-blicitária estatal, portanto de nossos im-postos. Não existe almoço grátis. Al-guém está pagando essa brincadeira ouentão teremos um bando de abnegados,São Francisco de Assis fazendo televisãono Brasil, que não é exatamente o caso.

Segunda coisa: os canais públicos vi-rem do 60 ao 69. No plano de canaliza-ção da Anatel, esses canais 60 a 69 nãoserão ocupados. Por quê? Para que elescontinuem servindo para o que servemhoje. Para que eles servem hoje? Para línkentre as emissoras, link esse que poderia serfeito em meio confinado. Mas como a UHFera meio terra de ninguém, puseram lá o linkno 60 a 69, só que agora as emissoras nãoquerem sair de lá, porque não querem gas-tar dinheiro para ir para um meio confina-do para fazer um link entre elas. Oficialmen-te, no plano de canalização da tv brasilei-ra, que pode ser consultado no site da Ana-tel, os canais de 60 a 69 não serão utiliza-dos. Então, não adianta colocar os canais

públicos lá porque não vai ter lá.Outra coisa: chegou a tal nível de sofis-

ticação a concentração do monopólio da tvbrasileira que quem aqui já passou a ter Netdigital procura encontrar na Net digital ocanal universitário, a TV Câmara, a TVSenado, a tv comunitária, mas estas emis-soras não estão lá. Sumiram do dial da se-leção digital. Por quê? Porque a Net tem queocupar a programação com HBO 1, 2, 3, 4,5, 10, 15 mil. O que ela fez? Ela tirou os ca-nais públicos do quadro. Aí ela diz: “Masclaro que você pode continuar recebendo osconteúdos desses canais. Você faz o seguinte:desconecta o cabo do seu top boxe, colocaa ponta do cabo diretamente na tv, porquepela banda do cabo que não é ocupada hojepelos canais digitais continuam chegandoos canais comunitários e universitários”.Tudo fácil para você que está deitado na suacama e quer assistir ao canal comunitário,à TV Câmara, à TV Senado. Você levantade sua cama, vai na tv, tira aquele cabinhodetrás do seu top boxe, coloca o cabinhodireto na tv, aí tem que ter cuidado queaquele negócio de atarracha-desatarrachapode acabar soltando o negócio. Aí vocêvolta para a sua cama e comodamente ficaassistindo aos canais. Não é uma soluçãodemocrática?

Venhamos e convenhamos: é óbvio quecom tamanha boa vontade esses canaisestarão disponíveis na tv aberta. Se elesfazem isso com a elite dos 8% mais ricos,que são aqueles que já estão digitalizandoa tv a cabo, imaginem o que farão com asala de máquinas desse navio.

Em relação ao ISDB. O ISDB é um me-lhoramento do DVB, os dois trabalham comum sistema de divisão ortogonal, que reco-nhece tudo chamado OFDM. Portanto,estrito senso, sob o ponto de vista tecno-lógico o ISDB, o padrão japonês, é melhordo que o DVB por uma questão simples.Espera aí: é inconcebível imaginar que aEuropa e os Estados Unidos ficarão paradosassistindo a um melhor desenvolvimentojaponês. Isso não corre em nenhuma áreatecnológica. Portanto, por exemplo, os eu-ropeus já estão desenvolvendo o DVB-T2.O que vão fazer? Vão incorporar os bene-fícios que os japoneses legaram e, provavel-mente, mais coisa. É óbvio. Esse é o desen-volvimento. É inacreditável imaginar queos americanos, porque inventaram o primei-ro – americanos e coreanos, mas na verda-de o padrão é mais americano que corea-no –, vão ficar parados assistindo ao predo-minio japonês. Todos irão evoluir. Tantoevoluem que quem quiser acesse o site daonda digital, que é a operadora de rede daFinlândia, e irá descobrir que, ao contráriodo que os radiodifusores brasileiros falam,não é apenas pelo padrão do DVB H, DVBde palm top, etc. etc., que se transmite parameio móvel. O DVB-T já é usado para trans-mitir para meios móveis. Está lá no site daonda digital, operadora da Finlândia, estáem inglês, ninguém precisa entender finlan-dês. Está lá, é fácil ver, porque está sendotransmitido.

A única melhoria que o japonês tem hojeque o europeu não tem é a segmentaçãoespectral. É um negócio meio complexo,mas, enfim, permite dividir o canal em

“A Rede GloboInternacional entrounos Estados Unidos,nos últimos anos,com uma forçamuito grande e oque eles fizeram,na realidade, foitomar o mercadodessas pequenasprodutoras de tvnos Estados Unidose tranformar todomundo que estavaproduzindoconteúdo e seauto-sustentandoem produtores decomerciais para aRede Globo.”

Ana Lúcia de Alvarenga

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vários subcanaizinhos. Mas, agora, pasmem,o gaúcho também tem. O sorce da Puc-RStambém tem, porque nossos cientistas sãobrilhantes e, também, por uma questãoóbvia: esse padrão experimental veio depois.Se veio depois, também vai incorporar aqui-lo que já fora feito.

A questão é: se o brasileiro tem as mes-mas características do japonês comoOFDM, trabalha com toda a tecnologia comque o europeu e o japonês trabalham, acres-centa ao europeu, assim como ao japo-nês, a segmentação espectral e acrescentaao japonês uma transmissão mais robus-ta, típica para um país de situação to-pográfica irregular, de cidades mal pla-nejadas, como as do Brasil; então, vol-to a dizer, a escolha não é técnica. Abrama Siscomex e a gente vai descobrir porque se adotou o padrão japonês. A gen-te vai descobrir o que há de acordo degaveta nesse negócio. Porque é óbvio:você pega os equipamentos da Globo. Étudo Sony. Por que a Globo fez emissãode debêntures há pouco tempo para sairda água que estava chegando aquiao´gogó e, por acaso, quem mais com-prou debêntures da Globo foram os fun-dos asiáticos. Só que a Globo não é so-ciedade anônima, ela não abre o caixa ediz que asiáticos foram esses. Quemforam os asiáticos que puseram dinheirona Globo? Por que que em janeiro, muitoantes da definição do padrão tecnológico,se abaixou a alíquota da importação detransmissores? Essa é uma história queainda vai ser contada. O futuro ainda vaicontar. No futuro vai ter um outro Da-niel Hertz, como teve o que escreveu aHistória Secreta da Rede Globo, que vaiescrever uma outra história contando ahistória dos transmissores do ISDB, dosacordos que foram feitos. Aí talvez nos-sos filhos e nossos netos saibam por quesó nós no mundo, junto com os japone-ses, vamos adotar o ISDB.

Outra questão é a da banda larga. OColetivo Intervozes não tem nenhumarelação com a Abusar, Mas eu, por exem-plo, pessoalmente, fui eleito. No Brasil e nomundo inteiro existem órgãos que cuidamda governança da internet . Cada país temo seu. A internet não é que nem Deus, in-visível, está aí de forma concreta. Tenho umamigo que diz: internet é que nem Deus,está aí. Não, a internet tem governança, temuma estrutura; essa estrutura é centralizada.É preciso dizer que quem controla o ende-reçamento de todos os computadores nomundo da internet, o chamado endereço IPde todos os computadores do mundo, é umainstituição sediada na Califórnia que res-ponde por mandato ao Senado norte-ame-ricano e ao Departamento de Comércio dosEstados Unidos. Portanto, esse negócio temdono e tem controle. A internet não é tãolivre como gostariam os mais inocentes.Cada país do mundo tem um órgão de go-vernança, que é fruto de sua própria His-tória. A Argentina, até hoje não sei por quê,trata disso no Ministério das Relações Ex-teriores. Cada país trata de um jeito. NoBrasil há um grupo chamado Comitê Ges-tor da Internet. No atual Governo, é pre-ciso reconhecer, dar a mão a palmatória, 11

dos 21 membros, portanto a maioria des-ses membros do Comitê Gestor, passarama ser eleitos pela sociedade. Dez são indica-dos pelo Governo e 11 são eleitos. Quatrodesses são eleitos dentre as entidades dasociedade civil, ongs, sindicatos, associaçõesas mais diversas. Eu fui um dos quatro elei-tos e a gente parrticipa do Comitê Gestor.Lá no Comitê Gestor um dos temas centraistem sido a baixissima penetração da ban-da larga no Brasil e a concentração na mãodo monopólio privado da telefonia e datransmissão de dados, monopólio esse quecontou com o apoio da Rede Globo na pri-vatização. A Rede Globo tentou comprar osatélite, em parceria com esse monopólio,só não comprou porque há a história doDaniel Dantas com a Brasil Telecom; enfim,uma história também que está para sercontada. Não é verdade que a Globo fossetão inimiga das teles. Se fosse, não teriavendido a rede cabo da Net, agora, para omesmo cara que é o dono da Embratel e daClaro. Não é tão inimiga assim, concordam?

Mas, enfim, estamos discutindo isso euma das idéias que se tem é a de a gentecomeçar, entre este ano e o ano que vem,a escolher dez cidades do Brasil construirredes wimax, que é essa tecnologia nova,sem fio, redes gratuitas, em parcerias comprefeituras, enfim, e criar um fato político.Qual o fato político? É que o Comitê Ges-tor tem recursos: é preciso que se diga quecada vez que as pessoas pagam seus 30 re-ais por ano para ter um domínio na inter-net, um ponto.br qualquer coisa, e comohoje são 800 mil domínios no Brasil, isso dá24 milhões de receita por ano. Como essedinheiro não foi sendo gasto, sabe-se Deuspor quê, o Clube de Gestores hoje tem 140milhões em caixa. A idéia é pegar pelo menos10 cidades do Brasil e criar redes públicas,sem fio, abertas, para que qualquer cidadãoconectado com computador que tenha aces-so sem fio possa estar na internet de ma-neira gratuita, livre. Assim como já estáfazendo Los Angeles, por exemplo, só quelá em parceria com a Google. Teríamos en-tão duas redes, uma gratuita; outra paraquem quiser pagar mais para ter uma redede melhor qualidade.

A nossa idéia é criar uma rede públicapara todo mundo em cidades brasileiras evirar para o Governo e dizer: “É possíveldemocratizar o uso da internet. Estão aquidez cidades funcionando. Agora você pegao Fust e vai criar no resto do Brasil”. Se nãocriar, é porque, realmente, há algum inte-resse por trás que não quer expandir essamalha de acesso sem fio de maneira gratuita.

Audálio Dantas – Ronald, para comen-tários e suas considerações finais.

Ronald Siqueira Barbosa – Quero co-meçar também fora de ordem, falando umpouco a respeito dos canais 60 a 69. A ra-diodifusão tinha para os links os canais de70 a 83. Os canais de 60 a 69 eram usadospara retransmissão. O que acontece? Coma entrada da telefonia celular bandas A e B,a radiodifusão perdeu os canais de 70 a 83,que foram todos para a telefonia celular.Então a radiodifusão teve que colocar oscanais de retransmissão para link do 60 a 69.

Mas esses canais são da radiodifusão pararetransmissão e são ótimos canais de UGF,do final da faixa, para transmissão digital.É um engano achar que aqueles canais eramde link e não servem. Não, eles eram de re-transmissão. Os canais de link eram de 70a 83, que nós perdemos com a telefoniacelular, que, posteriormente, passou a ser-viço móvel pessoal, porque eles abriram mãoda transmissão de longa distância, ou seja,não precisariam mais da Embratel ou daIntelig para fazer ligações entre um Estadoe outro porque o serviço móvel pessoal temessa outra conformação. Mas essa é outraquestão. A questão posta em debate é a dasuposta inutilidade dos canais 60 a 69, quepodem ser utilizados, sim, para fazer trans-missão de tv digital. Não temos dúvidaquanto a isso: essa é uma faixa que vai sermuito importante para todos nós.

Esse é um ponto. Outro ponto é a ques-tão do DVB-H. Ele foi desenvolvido numafaixa fora da faixa que o DVB tem. Numafaixa que eles chamam de banda L ou nafaixa de UGF alta. O certo é que você temum serviço adicional em que você vai ter queter um decodificador para receber o sinal viaseu automóvel. Então, a multimídia quevocê diz assim feita pelo DVB-H não com-porta na banda do DVB terrestre. Se vocêcolocar dentro da faixa de DVB terrestre,não poderá ter alta definição no DVB, quenão foi projetado, não tem condição de teralta definição, mobilidade e algo em defini-ção padrão.

Como a França e a Alemanha manifes-taram interesse em utilizar o MPeg 4 , quefacilita o acesso a mídias menores, tipocelular, alguma coisa assim, eles tiveramcondições de fazer esse planejamento. Elestêm uma base instalada em MPeg 2. A Eu-ropa tem MPeg 2. Não é fácil você mudaressa base instalada nas casas das pessoas.O que você tem que fazer? Como a Alema-nha exporta muito carro e ela quer a tvdigital nos automóveis, teve que fazer umaforçação de barra – ela e a França – para queeles adotassem uma tecnologia numa fai-xa adicional para fazer a transmissão parao móvel, que é o caso do DVB-H.

O padrão americano também não tinhamobilidade. Então eles pegaram uma em-presa chamada Calcon e esta usou o mídiafloom para desenvolver uma faixa adicio-nal para também dar mobilidade àquelepadrão. Ele poderia usar o mesmo que aCoréia fez. A Coréia adotou o padrão ame-ricano ATSC, mas ela utiliza uma tecnologiada TDNB, que é uma empresa coreana. Paranão pagar royalties, os americanos desen-volveram a mesma tecnologia com a Cal-con para fazer através do mídia floom umatransmissão lado a lado da sua transmissãode tv digital. Com isso, o carro americanovai passar a ter mobilidade, só que é um ou-tro serviço pago em que para se ter aquelesinal no carro o usuário terá que ser assinan-te. Não é um serviço gratuito, diferentemen-te do serviço que o japonês propõe, pelo qualtudo isso seria colocado num mesmo pacote.Neste caso não haveria necessidade de umafaixa adicional.

Outra coisa que temos que ver é a ques-tão das mídias que estão se desenvolvendoem volta da radiodifusão. A gente não tem

“A única melhoriaque o modelojaponês tem hojeque o europeunão tem é asegmentaçãoespectral. É umnegócio meiocomplexo, mas,enfim, permitedividir o canalem váriossubcanalzinhos.Mas, agora,pasmem, o modelogaúcho tambémtem. O sorce daPuc-RS tambémtem, porquenossos cientistassão brilhantes.”

Gustavo Gindre

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um padrão definido, não consegue evoluirnenhum modelo de negócio e com isso asoutras mídias começam a ter penetração ea ter ponta em direções que você não temmais como controlar, isso em relação a suamídia. Esse é um ponto do DVB-H. O ou-tro ponto é a banda larga. As empresas detelefonia fixa achavam que só elas teriamacesso ao IPTV, que é todo o seu conteúdodigital de televisão dentro de um protoco-lo IP, de um protocolo de internet. Elas es-tavam tranquilas, achando que só elas e atv a cabo poderiam desfrutar dessas tecno-logias novas, desse acesso. As pessoas teri-am esse conteúdo através da internet. Mas,de repente, surgiu o Impeg 4, que favore-ceu a telefonia celular, mas não a telefoniafixa. Não era a telefonia fixa e sim a tele-fonia celular que passou a dar acesso aoIPTV similar, concorrendo com a telefoniafixa. Agora, a radiodifusão como a gente viunos Estados Unidos agora, na NAB, em LasVegas. Ela está querendo entregar o seu con-teúdo para qualquer mídia e dar acesso à in-ternet para essas mídias a que ela entregao sinal digital. Só que ela não tem a inten-ção de passar um programa e botar vocêabrindo uma página do Pantanal mato-gros-sense. Ela quer alguma coisa ligada ao pro-grama que você está vendo. Ela quer com-plementar uma informação da programa-ção com o acesso à internet, com você com-plementando esse dado pela internet. Elaquer também ter o acesso ao IPTV e comisso expandir a sua capacidade de oferecermultimídia ao broadcasting, multimídiasimilar ao multicasting service oferecidopela telefonia.

Ou seja, não são as mesmas coisas, massão coisas parecidas em que você estará comcondições de competir, mas para isso vocêprecisa, primeiro, definir um padrão, senão,quando você for definir e quiser competir,outro já tomou tudo. Você não precisa fa-zer mais nada. Só que estamos preocupa-dos simplesmente com uma situação quepode ser discutida por um marco regulatórioposterior no Congresso e insistimos emdiscutir tudo primeiro, antes de definirpadrão. Quando definir, você estará 35 anosatrás de qualquer país do mundo; isso ficamuito ruim. É ruim para o Brasil, é ruimpara a radiodifusao, é ruim para todo mun-do, produtores independentes, todos os quedependem da radiodifusão, é ruim para todoesse mercado.

Por último, a questão do e-max, a radi-odifusão também. Você fala num ponto quepode ser recebido a 50 quilômetros, diferen-te do e-Fi. O e-Fi é um serviço que tem uti-lizado a banda de 2 giga e essa banda estápara a saída das emissoras dos grandes cen-tros. E ela tem interferido nos serviços deradiodifusão na saída das cidades. Você voltae meia quer sair com o sinal da cidade e estáum acesso à internet pelo e-Fi. O e-max ain-da tem um alcance de 50 quilômetros, atémais, mas as emissoras cobrem, só querolembrar, elas também cobrem uma distânciade 50 quilômetros ou mais. Isso é só paraa gente meditar.

Já fazendo as considerações finais, que-ro agradecer a oportunidade que foi dadapara que a gente tivesse participando des-te debate. Acho que aprendi bastante com

esta discussão toda, a gente sabe que istotem uma seqüência. A gente tem parti-cipado de debates do Sul ao Norte doPaís. Na semana passada eu estava emCuritiba. Acreditamos que queremos omelhor para o País. Todos nós queremoso melhor para o País. Todos nós que fa-zemos radiodifusão queremos o melhorpara o País. E nós defendemos a radio-difusão como um setor produtivo den-tro do País. Não estamos discutindo aquio papel de um afiliado A ou um afilia-do B. Estamos querendo falar do setorde radiodifusão. Se vocês me virem de-fendendo a radiodifusão por faixa de fre-qüência, por serviços que estão compe-tindo, é porque ninguém também falanada e ninguém toma uma providênciana competição desses serviços de radi-odifusão. Nossa maior precupação é o ra-diodifusor pequeno, do interior. Esse re-almente fica muito carente. Enquantoo grande centro se desenvolve e se de-fende bem, o radiodifusor da cidademédia e da cidade pequena tem gran-de dificuldade, seja pela concorrência queele tem das outras empresas ou poroutros serviços ou por outras mídias.

Quando eu falei em pirataria, estavafalando em clandestinidade. Eu não es-tava falando em ninguém que quisessecorrer atrás do ouro. Eu estava dizendoa clandestinidade em que você não tema autorização e mesmo assim você botano ar. Acho que isso daí é uma coisa pararefletir. As estações de radiocom já recla-mam das estações que são clandestinas eutilizam freqüência acima delas. E elas jáestão sofrendo com isso e se organizam paraver como vão resolver essa questão.

Eu queria agradecer a todos os senhorese pedir desculpas, mais uma vez, pelo atrasoe por não ter chegado aqui no início, poiseu gostaria de ver desde o começo, para vera fala de outros participaners da mesa, in-clusive a do Ministro Gilberto Gil. De qual-quer forma, saio satisfeito.

Audálio Dantas – Sérgio Gomes da Sil-va, o que você tem a acrescentar?

Sérgio Gomes da Silva – Eu já entre-guei ao Ronald Siqueira. Tenho aqui umaxerox. Há um ano atrás, em julho, eu pu-bliquei na revista A Rede, uma revista mensalde inclusão digital, em julho de 2005, umacarta-aberta à mídia. Vou ler só esta parteaqui, que se refere ao que foi discutido:

“O Ministério das Comunicações e aAnatel deixaram escorrer mais de seis anossem conceder a São Paulo capital e 32 Mu-nicípios vizinhos o direito de dispor de umcanal exclusivo para o funcionamento dasrádios comunitárias, conforme prevê a leifederal.

Foi preciso reunir Deus e todo mundo,no dia 23 de setembro de 2003, do Sindicatodos Jornalistas ao Itaú Cultural, da Câma-ra Municipal, todos os partidos, à Faculdadede Direito da Puc, das rádios na ilegalida-de aos artistas consagrados, do povo dasaúde às melhores escolas municipais e todasas entidades de coordenação do movimentode radiodifusão comunitária para arrancardas autoridades federais, finalmente, a res-

posta à campanha Cadê Canal.Desde o dia 22 de março de 2004, a Re-

solução 355 da Anatel está garantindo aomenos o canal 198, que significa a freqüên-cia 87.5 – 87.7, ou seja à esquerda do dial,lá quase à beira do precipício, para o fun-cionamento legal das rádios comunitáriasna Grande São Paulo. Até hoje – julho doano passado e vale hoje, um ano depois –nenhuma das 294 associações de radiodifu-são comunitária que entraram com os pa-péis em Brasília, isso desde 1998, lá no Mi-nistério, foi chamada para ocupar legalmen-te uma posição no dial.”

E dá-lhe perseguição à rádio de Heliopólis,exatamente de Heliopólis, que existe há doisanos na ilegalidade. E feche-se a Rádio Gua-dalupe, de Osasco, que desenvolve um tra-balho social magnífico, e mantenha-se osilêncio da imprensa sobre o que se passanessa área do porão do navio Brasil. Donavio negreiro Brasil.

Eu tenho três propostas. A primeira de-las é que a ABI, solenemente – estou falan-do sério –, entre com uma representação ju-dicial ou jurídica, não sei o quê mais, pedindohábeas-corpus preventivo ou garantia de vidapara o Gustavo Gindre, porque do nosso ladotemos pouca gente que consegue juntar es-sas pontas todas e as domina do ponto devista tecnológico, do ponto de vista histórico,do ponto de vista sociológico como ele. Seacontecer alguma coisa com Gustavo Gin-dre será responsabilidade de queima de ar-quivo. Não temos hoje ninguém no Brasilque tenha essa capacidade de juntar as vá-rias pontas e seja capaz de juntar com os doispés, tenha capacidade de discuti-las sob to-dos os pontos de vista. Eu venho acompa-nhando isso há alguns anos e sei que Gindreé a única pessoa no Brasil que realmente sededicou a estudar isso a sério. Portanto, queropedir que a ABI entre com um pedido degarantia de vida para ele. Se acontecer algumacoisa ao Gustavo Gindre, sei a quem dirigirmeu dedo. Isto que estou falando sério..

Segundo, proponho que exista ao me-nos um debate, um debate público, sobrea questão do rádio digital, que ficou comouma coisa secundária nesta discussão. Temsido assim ao longo desse tempo: é inevi-tável que todo mundo olhe para o farolofuscante do Scania.

Audálio Dantas - Para esta você foiconvidado, você que lida com o rádio.

Sérgio Gomes da Silva - A tendênciatoda, a atenção toda está voltada para aquestão da televisão, sobre a qual há maisreflexões e mais pensamentos acumulados.Ocorre que no caso brasileiro o povo seinforma de manhã através do rádio e vaipara a televisão à noite não para buscarinformação, mas para buscar diversão, parase distrair. O rádio bate a televisão em au-diência o dia inteirinho, até chegar a horada novela; aí, perde. Em seguida, o Brasildorme em torno de 9h15min, porque opovo tem que acordar cedo, pois a condu-ção é ruim. Então, proponho que se faça umdebate de verdade sobre a questão do rádiopara a gente discutir essas 20 mil estaçõesreferidas aqui, até porque há muita ficçãoaí sobre esses números.

“Outra coisa quetemos que ver é aquestão das mídiasque estão sedesenvolvendo emvolta da radiodifusão.A gente não tem umpadrão definido, nãoconsegue evoluirnenhum modelo denegócio e com issoas outras mídiascomeçam a terpenetração e a terponta em direçõesque você não temmais como controlar,isso em relação àsua mídia.”

Ronald Siqueira Barbosa

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Já pedi garantia de vida para o Gustavoe um debate exclusivo sobre a questão dorádio. A terceira que vou pedir é uma espéciede autovacina. Seria possível as tvs, levan-do em conta que esta é uma questão tão cru-cial, fazerem a tradução dessa informaçãotoda complexa para compreensão pelaspessoas comuns? Sei que a linguagem é umdos mecanismos do autoritarismo. Quan-do um economista começa a falar umascoisas enroscadas, a platéia diz: “Esse caraentende pra caramba”. Não entendeu nadado que ele disse, mas acha que ele entendepra caramba. Advogado costuma fazer isso.Médico também usa palavras empoladaspara enganar paciente. Engenheiro geral-mente vai direto ao tema, mas aponta a Luae olha para o dedo. Nós estamos falandoda necessidade de ter um horizonte. Esta-mos discutindo o futuro do País e estamosdiscutindo a qualidade da imagem, e nãoa democratização do acesso. São duas dis-cussões que se dão dentro do mesmo tema.Uma coisa é qual o nível da qualidade.O sujeito tem uma televisãozinha numtrem-bala a 300 quilômetros por hora eaqui não há esse trem. Essa questão damobilidade e várias outras estão sendodiscutidas no mundo, mas aqui no Brasiltemos questões específicas que se im-põem à discussão. Entre nós, 40% das tvsem funcionamento são preto-e-branco.Somos um país muito complexo, a talponto que o Tom Jobim dizia que o Brasilnão é para amadores. É muito comple-xo, é muito variado. Temos que exami-nar o Brasil real se queremos que essesmeios sejam apropriados de maneira cri-ativa, para que isso ajude a melhorar avida geral do povo, não apenas para me-lhorar a imagem dos programas. Essa dis-cussão tem que se prolongar. Não sejamtão açodados os que têm interesse naquestão, porque em política só aconte-ce o que é natural. Se vocês ganharemessa parada na base da esperteza e dorapidinho, vão pagar um preço muitosério lá na frente, porque inevitavelmen-te contra a natureza das coisas é impos-sível. É da natureza das coisas a socie-dade querer participar. Isto não é maisuma discussão só para especialistas, in-teressa a todo mundo. Quem pegar agoraem qualquer locadora um filme do di-retor mineiro Helvécio Ratton, UmaOnda no Ar, que retrata de uma manei-ra poética, numa ficção a partir da rea-lidade, uma rádio de uma favela de BeloHorizonte, que trabalhou na ilegalida-de durante um tempão, assim como tam-bém os quilombos ficaram na ilegalidade,verá a complexidade dessa questão das rá-dios comunitárias e sua relação com a po-pulação das áreas onde são criadas. Tambémquem luta por um novo patamar legal tra-balha pelo futuro, pelo progresso. O bomlegislador é subversivo, está querendo mu-dar a lei que está aí.

Nós estamos falando disso, antecipandonovos tempos, talvez. Esse filme dá contado seguinte: o cérebro do jovem na faixa de16-17 anos que organiza uma rádio comu-nitária ou um time de futebol é o mesmodo jovem que organiza o narcotráfico. Égente que tem capacidade de sacar as coi-

sas, fazer os links, organizar e fazer funci-onar essa máquina complexa. Um garotocom 15-16 anos antes de tudo quer ser con-siderado, respeitado, ele não quer levartábua. Quem assistiu ao filme Cidade deDeus ou Uma Onda no Ar sabe que esse é omomento trágico, em que o sujeito se vol-ta contra tudo e sai atirando.

Pois bem, em São Paulo, nos últimos seisanos, nós conseguimos reduzir em 60% onúmero de homicídios por conta de umtrabalho nas periferias de abrir as escolas,de ter rádios comunitárias, rádios nas esco-las. Foram para a frente dessas emissorasexatamente os alunos mais rebeldes, aquelesque queriam detonar a escola. Na hora emque se abrem os meios de comunicação, sãoeles os mais criativos, revelam-se os mais in-teligentes.

Há um momento na vida dessa juventu-de, na faixa de 15-16 anos, em que o sujei-to que não aceita ficar na média não vainunca enveredar por um caminho careta.Ou vai ser atraído pelo narcotráfico ou vaipara as atividades sociais, culturais e polí-ticas. Esses meios de comunicação – nãoestou falando nem de televisão, estou falan-do de rádio, que é muito simples, com 5-6mil reais você monta uma emissora – têmque ter um plano diretor, têm que contarcom o conhecimento da universidade. Du-rante esses anos todos, porém, os melhoresengenheiros da Poli, por exemplo, ficaramintimidados porque achavam que se ajudas-sem com seus conhecimentos do lado de cáperderiam o mercado de trabalho do lado delá. O Carlos Coelho, Presidente do Sindicatode Engenheiros Eletrônicos, pôs de pé 80%de tudo o que funciona via satélite. Ele di-zia: “Eu queria ajudar, mas não posso. Se euajudar a democratização, perco o empre-go do lado de lá”. O mesmo acontece comoutros profissionais que conheço – Takashi,Manhães, Guido, o pessoal do CPqD.

Nós já temos o apoio dos artistas, dosjuristas e muitos mais, mas está nos faltandoo apoio do conhecimento técnico e cientí-fico. Nós o teremos, rapidinho, porquevamos mostrar que o futuro mercado detrabalho, seja para engenheiros, jornalistasou artistas, está na multiplicação e não nessacentralização em que o mesmo dono começanuma área e depois diversifica os canais te-máticos, mas na verdade tudo permanecea mesma coisa.

Simplificar a natureza e impedir a diver-sidade cultural é a morte. Todo mundo sabeque nós estamos por um triz. Há pessoasque já acham que passamos do ponto deretorno, que não é possível mais reagregar,que a partir de agora será esse processo daglobalização virótica, mais a redução dacamada de ozônio, os grandes desequilíbriosclimáticos, etc., etc. que você, eu, nós to-dos aqui estaríamos vivendo, talvez comoa última ou penúltima geração de viventes,porque houve um processo de simplificaçãoda natureza. Na área da cultura, na área dademocracia, nosso desafio é o de abrir espaçopara que todos falem e se compreendam esaibam que a nossa sociedade é complexa,a nossa, nós não somos a Venezuela, nãosomos o Paraguai, nós somos Brasil, temosnossa identidade e vamos ter que olhar entreesquerda e direita, pensar nos de cima, pen-

sar nos de baixo, que são a maioria.Eu tenho possibilidade, pelo meu papel

na sociedade, de estar com os de baixo, eume sinto confortável. Eu estou com os debaixo. Eu baixo o centro de gravidade dosmeus projetos para tentar ver de que ma-neira esses meios de comunicação podemajudar, por exemplo, na área da saúde. Nãohá nos canais comerciais qualquer preocu-pação com os do andar de baixo. Posso di-zer isso aqui, é um anúncio e uma denún-cia. Nós tivemos um problema seríssimo dedengue em São Paulo. Foi pedido aos radi-odifusores comerciais que ajudassem a abrira cabeça das donas-de-casa porque 90% docriatório do mosquito transmissor da den-gue ficam nos quintais e não há Prefeitu-ra que seja capaz de ter fiscais que dêemconta disso tudo. Era preciso fazer umagrande campanha de esclarecimento paraque a populção ajudassse no combate àdengue, no interesse dela própria.

Pois bem: o pessoal das emissoras de rá-dio disse que só pagando. Tinha que terverba do Ministério da Saúde. Não tendoverba, não fariam e não fizeram. Não épossível tudo ser traduzido em toma-lá-dá-cá. Há coisas que não têm valor de troca,têm valor de uso.

No caso da nossa sociedade nós vamosprecisar de três propostas: um, garantia devida para o Gustavo Gindre; dois, um de-bate específico sobre a questão do rádio; três,que a própria televisão paute esse assuntoem programa que seja capaz de fazer a trans-formação da informação em compreensão.Essa complexidade toda poderia converter-se em vários programas de tv para esclare-cer o tema de que estamos falando .

Não tem acontecido isso. A própria tvpoderia prestar esse serviço, para maiorcompreensão da questão. Se os canais con-cedidos comercialmente não são capazes defazer isso, vamos chamar as tevês públicas,vamos chamar os reitores das universidades,vamos chamar os presidentes das grandesentidades e instituições, patronais, sindicais,e os movimentos sociais, porque todos elespodem nas novas tecnologias ter canal paraserem não apenas ouvintes, mas tambémfalantes.

Audálio Dantas - Muito obrigado. Nãosei se o Professor Gustavo Gindre tem al-guma coisa a acrescentar.

Sérgio Gomes da Silva – Eu esqueci defalar uma coisa. Paulinho da Viola diz quenão é possível contar a vida em uma sam-ba curto. A ABI não conseguiria, claro, dartratos à bola disso tudo em profundidadeem um único debate.

Audálio Dantas – Essas propostas, evi-dentemente, serão consideradas. A ABI estáaberta para os debates. Antes de encerrar,quero agradecer a presença de todos e maisuma vez dizer que houve um ruído de co-municação no caso do convite à Abert, por-que temos registrado que passamos à en-tidade o novo horário, o qual seria16h30min, ao invés de 18h30m. Mas issofoi um acidente de percurso. Nós vamoscontinuar. Agradeço a presença de todos.Está encerrada a sessão.

“Somos um paísmuito complexo,a tal ponto que oTom Jobim diziaque o Brasil nãoé para amadores.Temos que examinaro Brasil real sequeremos queesses meios sejamapropriados demaneira criativa,para que isso ajudea melhorar a vidageral do povo nãoapenas paramelhorar a imagemdos programas.Essa discussão temque se prolongar.”

Sérgio Gomes da Silva

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18 Julho de 2006

EM TOM SOLENEO Presidente Luladiscursa na cerimônia deassinatura do decreto deimplantação do SistemaBrasileiro de TelevisãoDigital Terrestre e deacordo tecnológico entreos Governos do Brasil edo Japão, pelo qual seassegura a adoção datecnologia japonesa nonovo sistema. Ao lado doPresidente (da esq. paradir.) os Ministros LuizFernando Furlan, HélioCosta e Dilma Rousseff, osPresidentes do CongressoNacional, Senador RenanCalheiros e da Câmarados Deputados, AldoRebelo, e o Ministrojaponês, Heizo Takenaka,que não perdeu umapalavra do que Lula dissegraças à traduçãosimultânea.

ANTO

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CR

UZ/AB

R

LULA OPTOU PELO JAPÃOEm 29 de junho, menos de um mês após

a realização do debate promovido pela ABI,o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva assi-nou o decreto de instituição do Sistema Bra-sileiro de Televisão Digital Terrestre–SBTD-T, pelo qual o Brasil adotará como tecnologiao sistema japonês. O decreto criou quatronovos canais digitais públicos, um do Po-der Executivo, um da área de educação, umde cidadania e um de cultura.

A adoção do sistema japonês represen-tou uma vitória da posição defendida peloMinistro das Comunicações, Senador Hé-lio Costa, e contrariou a expectativa doMinistro da Cultura, Gilberto Gil, que du-rante sua intervenção no debate realizadona ABI manifestara sua esperança de que oGoverno adiaria a decisão a respeito, a fimde permitir que o sistema de tv digital,embora pudesse ser baseado na tecnologiados modelos japonês, americano e europeu,pudesse absorver a contribuição resultantedo trabalho de pesquisa das instituiçõesbrasileiras que vêm estudando a criação deuma tecnologia nacional, ainda que basea-da num desses três modelos.

O Governo deu certa estridência ao atode assinatura do decreto, realizado no Pa-lácio do Planalto com a presença de auto-ridades do primeiro escalão, como a Mi-nistra-Chefe da Casa Civil, Dilma Rous-seff, o Ministro das Comunicações, o gran-de vitorioso na disputa que se travou nos

Presidente acata a proposta do Ministro Hélio Costae assina decreto estabelecendo que o Brasil adotaráo sistema japonês na implantação da tv digital.

bastidores oficiais, e o Ministro do Desen-volvimento Econômico, Luiz FernandoFurlan, além do Presidente do CongressoNacional, Senador Renan Calheiros, e doPresidente da Câmara dos Deputados, AldoRebelo. À mesa teve assento um represen-tante japonês, que acompanhou a cerimô-nia com o fone de tradução simultânea noouvido e não disfarçou em nenhum mo-mento sua alegria pela vitória na disputaque também se travou entre japoneses,americanos e europeus pela preferência deum país da dimensão política, econômicae populacional do Brasil.

• A Agência Brasil, órgão do sistema decomunicação do Governo, acompanhou asolenidade e relatou sua repercussão atra-vés dos repórteres Cecília Jorge, YaraAquino, Cristina Índio do Brasil e IvanRichard. Cecília e Yara destacaram no no-ticiário distribuído pela Agência Brasil al-guns aspectos do decreto:

• A partir do início das transmissões desinal digital, o usuário não terá que com-prar imediatamente um novo televisor;terá apenas de instalar um adaptador nacaixa de conversão do seu atual aparelho;

• O sinal analógico, entretanto, conti-nuará a ser transmitido ao longo dos próxi-mos dez anos, o que constituiria uma pro-va de que “este é um projeto destinado atodos os brasileiros” segundo disse na sole-nidade o Ministro Hélio Costa;

•As emissoras de televisão aberta recebe-rão automaticamente um canal digital e te-rão o prazo de dezoito meses para iniciar astransmissões com essa tecnologia; em seteanos, elas terão que estender o serviço a todoo território nacional; passados dez anos o si-nal analógico deixará de ser transmitido.

RICAR

DO

STUC

KERT/PR

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Julho de 2006

RAZÕES DA OPÇÃOApós a solenidade noPalácio do Planalto HélioCosta expôs em entrevistaà Rádio Nacional deBrasília os motivos queo levaram a propor essaopção, por ele antecipadaem audiência pública noSenado, como relatou nodebate o jornalista SérgioGomes da Silva.

VALTER CAM

PANATO

/ABR

Em entrevista a Cristina Índio do Bra-sil, da Rádio Nacional de Brasília, o Secre-tário-Executivo do Fórum Nacional pelaDemocratização da Comunicação, James

A Associação das Emissoras de Rádio eTelevisão–Abert festejou a opção do Go-verno pela tecnologia japonesa de tv digi-tal, sob o fundamento de que esse sistemaapresenta vantagens em relação aos mo-delos americano e europeu, principalmen-te no que se refere a mobilidade. Entrevis-tado pela Rádio Nacional, emissora do Sis-tema Radiobrás, após a assinatura do de-creto, o Presidente da Abert, José InácioPisani, fez as declarações a seguir:

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil – As emissoras de televi-são há algum tempo defendiam o modelojaponês. Por quê?

José Inácio Pisani José Inácio Pisani José Inácio Pisani José Inácio Pisani José Inácio Pisani - A Abert tem a res-ponsabilidade de representar mais de 300emissoras de televisão do Brasil. O Bra-sil hoje tem o privilégio de deter umamassa de conhecimento extremamentesignificativa no setor de transmissão deconteúdo gratuito pelo ar. Analisandotodos os modelos existentes no mundo,concluiu-se que o padrão japonês era omais adequado para a situação brasilei-ra, porque garante ao cidadão brasileiroa perenidade do modelo existente. Estageração e as que sucederão terão a certe-za de que continuarão recebendo a me-lhor televisão do mundo, produzida aqui

AS PRI M E I RAS REAÇÕES

A ABERTAPLAUDEA DECISÃOA entidade das emissorasde televisão analisa aopção oficial dando ênfaseà melhoria da qualidade datransmissão que o sistemade tv digital vai assegurar.

no Brasil, no melhor padrão de qualida-de existente em todo o mundo, de formalivre e gratuita em alta definição.

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - Uma das críticas que algu-mas entidades fazem é de que o sistema eu-ropeu seria mais democratizante, ao permi-tir mais acesso não apenas das emissorasjá existentes. Como a Abert responde a isso?

PisaniPisaniPisaniPisaniPisani - A Abert tem a responsabilidadede contribuir com as autoridades brasilei-ras para que consigamos trabalhar com umaqualidade compatível com qualquer outrotipo de mídia. Caso não fosse adotado o sis-tema japonês, teríamos o risco de não tertoda a cadeia de valor em um modelo atualde radiodifusão, desde a alta definição atéa mobilidade, que será um item novo na vidados cidadãos brasileiros. Ou seja, a televi-são brasileira poderá ser recebida com amesma qualidade dos televisores fixos nostelevisores móveis, de forma gratuita. Esseé o modelo que defendemos.

FÓRUM DE DEMOCRATIZAÇÃO LAMENTAmodelo poderia ser mais democratizante?

James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen - O Fórum entende que ocumprimento do decreto presidencial, quecriou o Sistema Brasileiro de Televisão Di-gital, seria o melhor caminho. Traria a par-ticipação da sociedade no momento da de-cisão e não criaria essa decisão arbitráriaque o Governo está tomando. O Governosimplesmente optou por manter o statusquo da radiodifusão, manter sob a mão dosmesmos donos que concentram a mídia noBrasil esse poder de decisão da digitalização,que permitiria vários avanços democráti-cos na área das comunicações.

Cristina Índio do BrasilAgência Brasil

Ativistas da luta pelademocratização dascomunicações consideramque o Governo prefere oatual modelo de domínio dacomunicação eletrônica.

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - Quem tem um televisorantigo vai precisar trocá-lo imediatamente?

PisaniPisaniPisaniPisaniPisani - Neste modelo sugerido esta é umagrande vantagem, porque o cidadão comumque não tiver interesse em substituir o seutelevisor poderá agregar uma pequena cai-xa que transcodificará este sinal, receben-do do ar o sinal digital e transcodificandopara o sinal analógico, para que ele possacom o seu televisor normal que tem em casareceber muito mais qualidade.

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - Qual o tempo da transmis-são completa do sistema atual para o digital?

PisaniPisaniPisaniPisaniPisani - Hoje estimamos em 10 anos. OBrasil é um país de dimensões continentais,mas pela qualidade que essa tecnologia ofe-rece, o empenho da radiodifusão é mini-mizar este tempo, mas imaginamos que emuma análise de hoje em dez anos talvez todoo País já tenha substituído todo o seu par-que técnico. Esse é um assunto que aindatem uma ligação profunda com futurologia.

Görgen, criticou a decisão do Governo, porentender que o modelo japonês não vaipermitir a inclusão digital de todos os seg-mentos sociais da população. Görgen con-sidera que a opção pelo modelo japonêsserá prejudicial ao País. A seguir sua en-trevista.

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - As emissoras de tv de-fendem o modelo japonês dizendo que man-terá a televisão brasileira com produção dePrimeiro Mundo, e que há possibilidade deabertura de novos canais. O Fórum enten-de que este é o melhor caminho ou um outro

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CIDADANIA PRESENTEUma das muitasdiscussões travadasem torno da tv digital:o Seminário NacionalCidadania, Mídia ePolítica, realizado emjunho. À mesa, IradjEghrari, da Ágere, ongde defesa dos direitoshumanos sediada emBrasília; Gustavo Gindre;Professor Luiz FelipeMiguel, da Universidadede Brasília-UnB;Deputado Carlos Abicalil(PT-MT); Professor LuizGonzaga Mota, tambémda UnB.

JOSÉ C

RU

Z/ABR

“Vamos gerar emprego emTóquio, e não no Brasil”, dizo principal especialistado Coletivo Intervozes.

A decisão do Governo Federal de esco-lher o padrão japonês de televisão digitalprejudicará o desenvolvimento tecnológicoe científico do Brasil, avalia o Coordena-dor-Geral do Instituto de Estudos e Proje-tos em Comunicação e Cultura-Indecs,Gustavo Gindre. “São empregos qualifica-dos que a gente perde”, diz. “Na verdade,vamos gerar emprego em Tóquio e não noBrasil, porque vamos ser apenas consumi-dores de tecnologia importada e não pro-dutores de tecnologia”.

O decreto presidencial que estabelece asregras para a implantação do Sistema Bra-sileiro de Televisão Digital-SBTVD prevêo uso das inovações tecnológicas nacionais.A pesquisadora da Faculdade de Engenha-ria Elétrica da Pontifícia Universidade Ca-tólica do Rio Grande do Sul (Puc-RS)Cristina de Castro avalia que as pesquisasfinanciadas pelo Governo no ano passadosobre tv digital estimularam a produção ci-entífica nacional nessa área.

Agora, para a pesquisadora, com a es-colha do sistema japonês, será precisoum trabalho para garantir a incorpora-ção das inovações tecnológicas brasilei-ras. “Conhecemos a complexidade dosistema e sabemos o que é propor algu-ma sugestão para um sistema já reco-nhecido. Não vai ser um trabalho fácil,mas estamos prontos para trabalharnesse contexto.”

Cristina de Castro defende que, doponto de vista técnico, o Governo deveriater optado por desenvolver um modelo na-cional de tv digital. “O nosso sistema foidesenvolvido para atender àqueles requi-sitos que o próprio Governo solicitou”, dis-

se. O decreto de criação do SBTVD esta-belece que o sistema escolhido precisa, porexemplo, promover a inclusão digital, o de-senvolvimento da tecnologia e ciência na-cionais e a democratização da comunica-ção através da possibilidade da existênciade novos canais.

A pesquisadora reconhece, no entanto,que a decisão do Governo não pode serapenas técnica e que questões como a po-lítica industrial e comercial também pre-cisam ser levadas em consideração. “Pare-ce que o Governo achou uma solução demeio-termo. Segundo a ótica do Governo,[o sistema japonês] é melhor para o desen-volvimento do País no contexto industri-al, talvez por agregar mais rápido as indús-trias em torno de um sistema já existente,ao mesmo tempo que garante a incorpora-ção da tecnologia nacional”.

Já Gustavo Gindre, que também é inte-grante do Intervozes-Coletivo Brasil deComunicação Social, diz que o estímulo àindústria nacional seria maior com umpadrão brasileiro. “Adotando tecnologiabrasileira iríamos ter condições de nos in-serirmos melhor na globalização, porquequem se insere melhor é quem tem algopara vender - e teríamos tecnologia paravender”, argumenta.

Gindre ressalta que uma das diferençasé quanto à necessidade de promover a in-clusão digital com essa nova tecnologia. “Apopulação japonesa, se quiser, tem em suacasa banda larga velocíssima, computado-res extremamente modernos e não precisausar a televisão para acessar a internet”,disse. No Brasil, segundo ele, apenas 6%da população têm acesso à internet de ban-da larga.

Para atender ao mercado japonês, omodelo de tv digital desenvolvido lá, naavaliação de Gindre, dá prioridade à quali-dade da imagem. A transmissão em altadefinição ocupa todo o espaço de radiodi-fusão, dificultando a ampliação de canaise serviços. (Colaborou Ivan Richard, da Agên-cia Brasil)

GINDRE: O BRASIL PERDEU

Por Cecília JorgeAgência Brasil

AAAAAgência gência gência gência gência BrBrBrBrBrasilasilasilasilasil - Há uma programaçãodo Ministério das Comunicações falan-do em 60 dias para estabelecer umcronograma de implantação. É possívelinfluenciar, ainda, para uma maior demo-cratização do setor de comunicação, prin-cipalmente, da televisão?

James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen - Sempre é possível quan-do há vontade. Se a racionalidade voltarpara a discussão, se nesse fórum que forcriado para a transição for permitido quea sociedade participe e não for mantidoum diálogo restrito entre radiodifusorese Governo, seria possível conseguir algunsavanços. Mas mínimos, uma vez que estepadrão nos isola do mundo, nos colocanuma conversa bilateral com o Japão. Tam-bém nos isola economicamente, uma vezque é o mais caro de todos. Hoje são 46milhões de domicílios com televisão. To-dos vão ter que comprar aparelhos parafazer a transição do sistema analógico parao digital. Tudo isso por uma simplescanetada do Presidente.

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - Mas o Ministério das Co-municações diz que o decodificador para atransição do analógico para o digital cus-taria no máximo R$ 100.

James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen - Mais uma vez o Gover-no vai ter que abrir mão de sua arrecada-ção tributária e fiscal para que isso possaacontecer. Em nenhum lugar do mundo, anão ser na China, se consegue um valor tãobaixo. Por enquanto, a tecnologia permi-tiria um valor assim se houver subsídio.Havia a esperança de que com a tv digital apopulação pudesse mais do que receber aqualidade da programação atual - e isso édiscutível, porque não dá para se falar queo Brasil tem uma grande qualidade de pro-gramação, a não ser que seja apenas visu-al. O Governo está abrindo mão disso aonão permitir a inclusão digital, porque nãoexiste inclusão digital no Japão pela tele-visão, eles não querem isso. O modelo de-les é outro, eles já estão incluídos digital-mente via outras tecnologias

Agência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência BrasilAgência Brasil - O Ministério das Comu-nicações diz que o padrão japonês será ado-tado com inovações tecnológicas e com ini-ciativas de pesquisadores brasileiros, o queseria um padrão nipo-brasileiro. O Fórumnão acredita neste ponto?

James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen James Görgen - O Fórum espera que issoseja feito e não vê nenhuma evidência paraisso, na medida em que o Japão já disse queessas incorporações não serão feitas emmédio prazo. É uma coisa para mais tardee não necessariamente as melhores inova-ções desenvolvidas no Brasil serão asadotadas. Existia já um jogo de cartasmarcadas há muito tempo; algumas des-sas universidades vêm recebendo mais re-cursos e mais apoio do Governo que outras,que desenvolveram soluções que precisa-riam de mais investimento por umpouquinho mais de tempo para que pudes-sem ter uma solução melhor. Existem pelomenos duas ou três soluções que trariampara o Brasil um padrão mais brasileiro etropicalizado do que este que vai ser im-plantado. Se for feito assim, é simplesmentea importação de um padrão.

“Adotandotecnologia brasileirairíamos tercondições de nosinserirmos melhorna globalização”

Gustavo Gindre

AS PRI M E I RAS REAÇÕES