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Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de Évora Processo: 2563/05-1 Relator: F. RIBEIRO CARDOSO Descritores: CONTRA-ORDENAÇÃO IMPUGNAÇÃO PRAZO Data do Acordão: 10-01-2006 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NÃO PROVIDO Sumário: 1. O recurso de impugnação faz parte da fase administrativa do processo, não da fase judicial, pelo que nunca a interposição de um tal recurso pode ser considerado, seja para que efeito for, como acto praticado em juízo. 2. Com efeito, tal recurso é deduzido num processo contra-ordenacional e nem sequer dá origem imediatamente à fase judicial, que até pode nem vir a ter lugar se a autoridade administrativa revogar a decisão, até ao envio do processo ao tribunal (cf. art. 62, n.º 2 do RGCO). 3. Por o prazo para a impugnação da decisão ter natureza administrativa e não judicial, não são aplicáveis os ditames dos artigos 104 n.º1 e 107 n.º 5 do Código de Processo Penal e 145 do Código de Processo Civil, ou seja, as regras privativas dos prazos judiciais não lhe são aplicáveis. FRC Decisão Texto Integral: Acordam, precedendo conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. M.F., melhor identificado nos autos, recorreu do despacho proferido pelo Senhor Juiz do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de…, no processo de contra ordenação n.º …que decidiu não receber, por extemporâneo, o recurso de impugnação judicial da decisão da Chefe de Divisão de Contra-Ordenações da Direcção Regional de Viação do Algarve que lhe aplicou a coima de € 112,23 e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias, pela prática de uma contra-ordenação estradal, p. e p. pelos art. 69 n.º1, alin. a) e 76, alin. a) do Regulamento dos Sinais de Trânsito e 139 e 146, alin. i) do Código da Estrada. 2. Extraiu da motivação do recurso as seguintes conclusões: I - Foi o arguido autuado pela prática de uma contra-ordenação no pagamento de uma coima no valor de Euro: 112,23, bem como na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias. II - Foi notificado da decisão condenatória no dia 19/04/2005. III - O arguido impugnou junto do Tribunal "a quo" tal decisão, dando entrada junto da autoridade administrativa do seu recurso, em 19/05/2005. IV - O recurso foi interposto no primeiro dia útil após o terminus do prazo, que ocorreu em 18/05/2005. V - Por isso, o Tribunal "a quo" rejeitou liminarmente, por ser intempestivo, o recurso interposto pelo arguido. VI - Outra opinião manifesta o arguido no presente recurso, que considera que lhe deve ser aplicado o art. 145°, n° 6 do CPC por força do disposto nos art°s 104, n° l do CPP e 41°, nº 1 do Regime Geral da Contra-Ordenações. VII - Ou seja, uma vez que o recurso da autoridade administrativa foi interposto no primeiro dia útil após o terminus do prazo, podendo sê-lo nos termos do disposto no art. 145, nº 5 do CPC, e não tendo sido liquidada a multa a que alude a última disposição legal mencionada, o Tribunal só pode rejeitar o recurso após notificar o recorrente para proceder ao pagamento da multa a que alude o art. 145 n.º6 do CPC e este não efectuar tal pagamento. VIII – Consideramos que ao rejeitar liminarmente o recurso interposto pelo arguido da decisão da autoridade administrativa o tribunal "a quo" violou o disposto nos art. 41º n° l do Regime Geral das Contra-Ordenações, o art.104º, nº l do CPP e ainda o disposto nos art. 145° n° 5 e 6 do CPC. IX – Termos em que, com o douto suprimento de V.Exªs, deverá o aliás douto despacho recorrido ser Page 1 of 3

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Acórdãos TRE Acórdão do Tribunal da Relação de Évora

Processo: 2563/05-1Relator: F. RIBEIRO CARDOSODescritores: CONTRA-ORDENAÇÃO

IMPUGNAÇÃO PRAZO

Data do Acordão: 10-01-2006Votação: UNANIMIDADETexto Integral: SMeio Processual: RECURSO PENALDecisão: NÃO PROVIDOSumário:

1. O recurso de impugnação faz parte da fase administrativa do processo, não da fase judicial, pelo que nunca a interposição de um tal recurso pode ser considerado, seja para que efeito for, como acto praticado em juízo. 2. Com efeito, tal recurso é deduzido num processo contra-ordenacional e nem sequer dá origem imediatamente à fase judicial, que até pode nem vir a ter lugar se a autoridade administrativa revogar a decisão, até ao envio do processo ao tribunal (cf. art. 62, n.º 2 do RGCO). 3. Por o prazo para a impugnação da decisão ter natureza administrativa e não judicial, não são aplicáveis os ditames dos artigos 104 n.º1 e 107 n.º 5 do Código de Processo Penal e 145 do Código de Processo Civil, ou seja, as regras privativas dos prazos judiciais não lhe são aplicáveis. FRC

Decisão Texto Integral: Acordam, precedendo conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. M.F., melhor identificado nos autos, recorreu do despacho proferido pelo Senhor Juiz do 2.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de…, no processo de contra ordenação n.º …que decidiu não receber, por extemporâneo, o recurso de impugnação judicial da decisão da Chefe de Divisão de Contra-Ordenações da Direcção Regional de Viação do Algarve que lhe aplicou a coima de € 112,23 e a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias, pela prática de uma contra-ordenação estradal, p. e p. pelos art. 69 n.º1, alin. a) e 76, alin. a) do Regulamento dos Sinais de Trânsito e 139 e 146, alin. i) do Código da Estrada. 2. Extraiu da motivação do recurso as seguintes conclusões: I - Foi o arguido autuado pela prática de uma contra-ordenação no pagamento de uma coima no valor de Euro: 112,23, bem como na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias. II - Foi notificado da decisão condenatória no dia 19/04/2005. III - O arguido impugnou junto do Tribunal "a quo" tal decisão, dando entrada junto da autoridade administrativa do seu recurso, em 19/05/2005. IV - O recurso foi interposto no primeiro dia útil após o terminus do prazo, que ocorreu em 18/05/2005. V - Por isso, o Tribunal "a quo" rejeitou liminarmente, por ser intempestivo, o recurso interposto pelo arguido. VI - Outra opinião manifesta o arguido no presente recurso, que considera que lhe deve ser aplicado o art. 145°, n° 6 do CPC por força do disposto nos art°s 104, n° l do CPP e 41°, nº 1 do Regime Geral da Contra-Ordenações. VII - Ou seja, uma vez que o recurso da autoridade administrativa foi interposto no primeiro dia útil após o terminus do prazo, podendo sê-lo nos termos do disposto no art. 145, nº 5 do CPC, e não tendo sido liquidada a multa a que alude a última disposição legal mencionada, o Tribunal só pode rejeitar o recurso após notificar o recorrente para proceder ao pagamento da multa a que alude o art. 145 n.º6 do CPC e este não efectuar tal pagamento. VIII – Consideramos que ao rejeitar liminarmente o recurso interposto pelo arguido da decisão da autoridade administrativa o tribunal "a quo" violou o disposto nos art. 41º n° l do Regime Geral das Contra-Ordenações, o art.104º, nº l do CPP e ainda o disposto nos art. 145° n° 5 e 6 do CPC. IX – Termos em que, com o douto suprimento de V.Exªs, deverá o aliás douto despacho recorrido ser

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revogado, dando-se provimento ao recurso, devendo ser substituído por outro que ordene a notificação do recorrente para proceder ao pagamento da multa que alude o art. 145 n.º6 do CPC, sob pena de rejeição do recurso que o arguido interpôs da decisão da autoridade administrativa, com o que se fará JUSTIÇA. 3. O recurso foi admitido por despacho de 10 de Outubro de 2005 (v.fls.59). 4. Respondeu o Ministério Público no tribunal recorrido defendendo que deverá ser negado provimento ao recurso e confirmada a decisão recorrida, pois, em seu entender, fazendo o recurso de impugnação parte da fase administrativa do processo e não da judicial, não pode o acto de interposição ser acto praticado em juízo e, consequentemente, não pode o respectivo prazo ser considerado “prazo judicial”, a que seja aplicável o disposto no art. 145 do CPC. 5. Subidos os autos a esta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso. 6. Cumprido o disposto no art. 417º nº 2 do CPP e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir: 7. O objecto do recurso penal é delimitado pelas conclusões da respectiva motivação – art. 403, n.º1, e 412, n.º 1, do CPP, podendo sempre o tribunal de recurso conhecer de quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida ou ainda os vícios referidos no art. 410 do CPP. No caso dos autos, das conclusões formuladas pela recorrente, emerge uma única questão, que consiste em saber se deveria ter sido cumprido o disposto no art. 145 n.º 6 do Código de Processo Civil, uma vez que o próprio recorrente admite que o recurso foi interposto no 1.º dia útil após o termo do prazo. Vejamos: 8. O despacho recorrido: “M.F. impugnou a decisão proferida pela Direcção Regional De Viação Do Algarve, a qual lhe aplicou uma coima no valor de € 112,23, bem como a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias. Nessa decisão consta que a mesma tornava-se definitiva 20 (vinte) dias após a sua notificação se não fosse nesse prazo impugnada judicialmente. O arguido foi notificado da decisão condenatória no dia 19/04/2005 (cfr. fls. 12). Contudo, o recurso só deu entrada na Direcção Geral de Viação em 19/05/2005 (cfr. fls. 13). Nos termos do art° 60°, n° l, do Dec-Lei n° 433/82, de 27 de Outubro, " O prazo para a impugnação da decisão da autoridade administrativa suspende-se aos sábados, domingos e feriados ". Por outro lado, conforme se decidiu no Ac. de 26.2.97, da RP, proferido no recurso n° 40212, e citado por Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in " Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral ", p.343 " O prazo para a impugnação da decisão administrativa, na área das contra-ordenações e coimas, não se suspende nas férias judiciais. O recurso de impugnação faz parte da fase administrativa do processo, não da fase judicial, pelo que nunca a interposição de um tal recurso pode ser considerado, seja para que efeito for, acto praticado em juízo ". Assim sendo, de acordo com o que se acabou de referir, tendo o ora recorrente sido notificado da decisão administrativa que lhe aplicou a coima em 19/04/2005, tal significa que, o prazo de 20 (vinte) dias de que dispunha para impugnar judicialmente tal decisão, terminava a 18/05/2005. Ora, tendo o recurso entrado na DGV em 19/05/2005, é o mesmo extemporâneo, porque interposto para além dos aludidos vinte dias. Dispõe o art° 63°, n° l, do citado Dec-Lei, que " O juiz rejeitará, por meio de despacho, o recurso feito fora de prazo ... ". Pelo exposto, em conformidade com as citadas disposições legais, rejeito liminarmente, por ser intempestivo, o recurso interposto porM.F. Custas pela recorrente, fixando-se em 2 Uc’s a taxa de justiça - cfr. art°s 93°, n° 3 e 94°, n°3, ambos do Dec-Lei n° 433/82, de 27 de Outubro e 87°, n° l, ai. c), do Cód. Custas Judiciais. Notifique.

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Comunique à entidade administrativa competente.” 9. Como já se referiu supra, não está em causa que o recorrente foi notificado da decisão administrativa em 19 de Abril de 2005 e que o recurso foi apresentado na autoridade administrativa, via fax, no dia 19 do mês seguinte, ou seja, no primeiro dia útil subsequente ao termo do prazo de 20 dias que o recorrente dispunha para impugnar judicialmente a decisão da autoridade administrativa (cf. art. 59 e 60 do RGCO). A questão que se coloca é a da aplicabilidade ou não ao recurso de impugnação judicial, apresentado no 1.º dia útil seguinte ao termo do prazo, do preceituado no art. 145 n.º6 do CPC. No despacho recorrido, bem como o Ministério Público na primeira instância e neste Tribunal, baseando-se em Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in " Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral ", p.343, entendem que “o recurso de impugnação faz parte da fase administrativa do processo, não da fase judicial, pelo que nunca a interposição de um tal recurso pode ser considerado, seja para que efeito for, como acto praticado em juízo”. E não podemos deixar de concordar com tal asserção. Com efeito, tal recurso é deduzido num processo contra-ordenacional e nem sequer dá origem imediatamente à fase judicial, que até pode nem vir a ter lugar se a autoridade administrativa revogar a decisão, até ao envio do processo ao tribunal (cf. art. 62, n.º 2 do RGCO). Como se decidiu no acórdão para fixação de jurisprudência n.º 2/94, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 10-03-1994, publicado no DR, I série, de 07-05-1994, pág. 2372, “não tem natureza judicial o prazo mencionado no n.º 3 do art. 59 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27-10, com a alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17-10”. Embora este acórdão tenha sido proferido ao abrigo de uma norma anterior à actual redacção do art. 60 do RGCO, a fundamentação nele utilizada continua a ser utilizável, pois a suspensão do prazo aos sábados, domingos e feriados, expressamente prevista na redacção introduzida pelo DL 244/95, de 14 de Setembro, não é exclusiva dos prazos judiciais (como se constata pela alínea b) do art. 72 do Código de Procedimento Administrativo) e o acto de interposição de recurso de impugnação da decisão de aplicação da coima não deixou de ter a natureza que anteriormente tinha. Por o prazo para a impugnação da decisão ter natureza administrativa e não judicial, não são aplicáveis os ditames dos artigos 104 n.º1 e 107 n.º 5 do Código de Processo Penal e 145 do Código de Processo Civil, ou seja, as regras privativas dos prazos judiciais não lhe são aplicáveis (cf., neste sentido, os ac. Rel. Lisboa de 17.12.97 e 24.11.98, publicados, in BMJ 472, pag.551 e BMJ 481, pag. 527, respectivamente, e os acórdãos da Relação do Porto de 24.5.2000, in rec. 40346/00, e de 29.11.2000, in proc.10.781 10. Pelo exposto, e pelos fundamentos indicados, acorda-se em negar provimento ao recurso mantendo-se na íntegra a decisão recorrida. Custas a cargo do recorrente, fixando-se a Taxa de Justiça em três UC (art. 92 n.º1 e 3 e 93 n.º3 do RGCO e 87 n.º1, alin.b) e n.º3 do CCJ) (Processado e revisto pelo relator que assina e rubrica as restantes folhas – art. 94 nº2 do CPP). Évora, 2006.01.10 F. Ribeiro Cardoso/Gilberto Cunha/Martinho Cardoso

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