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Nosso sócio Paulo Evaristo, Cardeal Arns Setembro/Outubro de 2005 • Número 302 Jornal da ABI Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa “Na democracia não se prende jornalista pelo que escreve” José Hamilton ainda sonha fazer “aquela” matéria Páginas 14 e 15 Numa decisão histórica, cuja íntegra o Jornal da ABI publica nesta edição, o Presidente do Su- perior Tribunal da Justiça, Minis- tro Edson Vidigal, reafirmou prin- cípios que o próprio Poder Judi- ciário tem agredido: Na demo- cracia não se prende jornalista pelo que escreve ou fala. É ve- dado também censurar redações, apreender jornais, livros e revis- tas ou tirar do ar estações de rá- dio e TV e portais. Páginas 2, 7 e 8. Associado da ABI desde os anos 50, Dom Paulo Evaristo Arns, Cardeal e Arcebispo Emérito de São Paulo, não sai de casa sem a carteira da entidade. É o que ele revela numa entrevista exclusiva, em que confes- sa que teve medo em muitos momentos da ditadura militar. Páginas 9, 10, 11 e 12. Quem faz os ídolos da TV Uma lei para abrir os arquivos O Conselho da Transparência Pública, presidido pelo Ministro Waldir Pires, quer uma lei de abertura dos arquivos da ditadu- ra. A íntegra do anteprojeto. Página 24 VLADO, 30 ANOS DEPOIS Trinta anos após seu assassinato numa prisão militar em São Paulo, o jornalista Vladimir Herzog, o Vlado, foi homenageado pela Secretaria de Educação do Estado do Rio com um opúsculo que narra sua trajetó- ria para as novas gerações: 150 mil alunos do curso médio. Páginas 9, 10, 11, 12 e 29 ENTREVISTA EXCLUSIVA ALEXANDRE DE PAULO WAGNER SANTOS Ana Paula Arósio em Mad Maria, em Rondônia: fotógrafo ralou para obter fotos exclusivas da estrelíssima.. Às vezes incompreendidos por colegas de Redação e até por ar- tistas, repórteres, fotógrafos e editores de publicações sobre te- levisão produzem ídolos e os mantêm na crista da fama. Páginas 3, 4 e 5.

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Page 1: 2005__302_setembro-outubro

Nosso sócio Paulo Evaristo, Cardeal Arns

Setembro/Outubro de 2005 • Número 302

Jornal da ABIÓrgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

“Na democracia não se prendejornalista pelo que escreve”

José Hamilton ainda sonha fazer “aquela” matériaPáginas 14 e 15

Numa decisão histórica, cujaíntegra o Jornal da ABI publicanesta edição, o Presidente do Su-perior Tribunal da Justiça, Minis-tro Edson Vidigal, reafirmou prin-cípios que o próprio Poder Judi-ciário tem agredido: Na demo-cracia não se prende jornalistapelo que escreve ou fala. É ve-dado também censurar redações,apreender jornais, livros e revis-tas ou tirar do ar estações de rá-dio e TV e portais.

Páginas 2, 7 e 8.

Associado da ABI desde os anos 50, Dom Paulo Evaristo Arns, Cardeale Arcebispo Emérito de São Paulo, não sai de casa sem a carteira daentidade. É o que ele revela numa entrevista exclusiva, em que confes-sa que teve medo em muitos momentos da ditadura militar.

Páginas 9, 10, 11 e 12.

Quem fazos ídolosda TV

Uma leipara abriros arquivosO Conselho da TransparênciaPública, presidido pelo MinistroWaldir Pires, quer uma lei deabertura dos arquivos da ditadu-ra. A íntegra do anteprojeto.

Página 24

VLADO, 30 ANOS DEPOISTrinta anos após seu assassinato numa prisão militar em São Paulo, ojornalista Vladimir Herzog, o Vlado, foi homenageado pela Secretariade Educação do Estado do Rio com um opúsculo que narra sua trajetó-ria para as novas gerações: 150 mil alunos do curso médio.

Páginas 9, 10, 11, 12 e 29

ENTREVISTA EXCLUSIVA

ALEXA

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Ana Paula Arósio em Mad Maria, emRondônia: fotógrafo ralou para obter

fotos exclusivas da estrelíssima..

Às vezes incompreendidos porcolegas de Redação e até por ar-tistas, repórteres, fotógrafos eeditores de publicações sobre te-levisão produzem ídolos e osmantêm na crista da fama.

Páginas 3, 4 e 5.

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Jornal da ABI

2 Setembro/Outubro de 2005

NESTA EDIÇÃO

Jornal da ABI

Associação Brasileira de Imprensa

As lições de Vidigal

EDITORIAL

Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andarTelefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012Rio de Janeiro - RJ ([email protected])

Editores: Francisco Ucha, Joseti Marques e Maurício AzêdoProjeto gráfico, diagramação eeditoração eletrônica: Francisco UchaDiretor responsável: Maurício AzêdoImpressão: Gráfica LanceRua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletemnecessariamente a opinião do Jornal da ABI.

DIRETORIA – MANDATO 2004/2007Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretora Administrativa: Ana Maria Costábile SoibelmanDiretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Souza (Pajê)Diretora de Jornalismo: Joseti Marques

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira,Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura

CONSELHO FISCALJesus Antunes – Presidente, Miro Lopes – Secretário,Adriano Barbosa, Hélio Mathias, Henrique João Cordeiro Filho,Jorge Saldanha e Luiz Carlos Oliveira Chester

CONSELHO DELIBERATIVO (2004-2005)Presidente: Ivan Cavalcanti Proença1º Secretário: Carlos Arthur Pitombeira2º Secretário: Domingos Xisto da Cunha

Conselheiros efetivos (2005-2008)Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, AraquémMoura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, CarlosArthur Pitombeira, Conrado Pereira, Ely Moreira, FernandoBarbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata, Maurício Azêdo,Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho

Conselheiros efetivos (2004-2007)Antonieta Vieira dos Santos, Arthur da Távola, Cid Benjamin,Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Héris Arnt, Irene Cristina Gurgel doAmaral, Ivan Cavalcanti Proença, José Gomes Talarico, JoséRezende, Marceu Vieira, Paulo Jerônimo, Roberto M. Moura,Sérgio Cabral e Teresinha Santos

Conselheiros efetivos (2003-2006)Antonio Roberto da Cunha, Aristélio Travassos de Andrade,Arnaldo César Ricci Jacob, Carlos Alberto Caó Oliveira dosSantos, Domingos João Meirelles, Fichel Davit Chargel, GlóriaSueli Alvarez Campos, João Máximo, Jorge Roberto Martins,Lênin Novaes de Araújo, Moacir Andrade, Nilo Marques Braga,Octávio Costa, Vitor Iorio e Yolanda Stein

Conselheiros suplentes (2005-2008)Anísio Félix dos Santos, Edgard Catoira, Francisco de PaulaFreitas, Geraldo Lopes, Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone,Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedrodo Coutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J.Magalhães

Conselheiros suplentes (2004-2007)Adalberto Diniz, Aluísio Maranhão, Ancelmo Gois,André Louzeiro, Jesus Chediak, José Silvestre Gorgulho,José Louzeiro, Lílian Nabuco, Luarlindo Ernesto,Marcos de Castro, Mário Augusto Jakobskind,Marlene Custódio, Maurílio Ferreira e Yaci Nunes

Conselheiros suplentes (2003-2006)Antônio Avellar C. Albuquerque, Antônio Calegari, AntônioHenrique Lago, Antonio Roberto Salgado da Cunha, DomingosAugusto G. Xisto da Cunha, Hildeberto Lopes Aleluia, JoséCarlos Rego, Lorimar Macedo Ferreira, Luiz Carlos de Souza,Marco Aurélio B. Guimarães, Marcus Antônio M. de Miranda,Mauro dos Santos Vianna, Pery de Araújo Cotta, RogérioMarques Gomes, Rosângela Soares de Oliveira e RubemMauro Machado

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira – Presidente, Jarbas Domingos Vaz, José ErnestoVianna, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio CândidoFerreira

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan AlvesFilho e Paulo Totti

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSArthur Cantalice, Arthur Nery Cabral, Daniel de Castro,Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy MaryCarneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário AugustoJakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

Eles fazem a estrela brilhar 3

Uma saudação à ̀ ”Folha Dirigida” por seus 20 anos 6

Um desagravo a Niemeyer 6

Diploma de Jornalismo novamente obrigatório 6

Uma sentença histórica 7

O anjo da guarda dos jornalistas 9

A história de Vlado para as novas gerações 12

A morte de um herói 13

O sonho-ambição de José Hamilton Ribeiro 14

A Biblioteca em festa 18

Terrorismo em Marília 19

A censura em debate em Alagoas 20

A defesa da fonte, a qualquer preço 20

No meio do caminho, a 9 mm 21

Apreciados mais 98 pedidos de reparação 22

“Olha aí o Caveirão. Vim buscar a tua alma” 23

Uma proposta em discussão: uma lei de abertura dos arquivos 24

Natal 100 anos 25

Uma coleção com o pé no passado e o olho no futuro 26

“Aqui retumbaram hinos!” 27

A utopia do Brasil sem armas 28

Uma noite para Tim e Herzog 29

A morte de surpresa de Roberto Moura 30

O adeus de Apolônio 31

Cinema exalta ação da imprensa na liberação de Rio, 40 graus 32

A decisão adotada pelo Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Ed-

son Vidigal, no pedido de hábeas-corpus impetrado em favor do jornalista José

Arimatéia de Azevedo, de Teresina, Piauí, transcende o âmbito já em si relevante

de privação da liberdade individual de um cidadão para adquirir a exponencial

dimensão de vigorosa defesa da legalidade republicana e democrática.

Em seu histórico pronunciamento, o Ministro Vidigal reafirmou preceitos do Es-

tado Democrático de Direito que o próprio Poder Judiciário vinha e vem atrope-

lando, em muitos casos com a colaboração de advogados e membros do Ministério

Público desafeiçoados às conquistas que a Constituição de 5 de outubro de 1988

inscreveu em seu texto.

“Na democracia, não se prende jornalista pelo que escreve ou pelo que fala. A

força, qualquer que seja, tem que obedecer à idéia”, salientou o Presidente do STJ,

que pôs em destaque primados democráticos que têm sido ignorados em despa-

chos e sentenças judiciais em diferentes pontos do País, desde Rondônia, onde

uma desavisada juíza proibiu que um jornal sequer citasse o nome da prefeita da

capital do Estado, a Goiás, onde tivemos o absurdo da prisão domiciliar em Goiânia

de um jornalista que mora em São Paulo e a proibição de um livro em todo o

território nacional para atender ao interesse de um político local.

Em muitos desses casos, ficou evidenciado o dissídio entre o poder judicante e o

senso de humanidade: no caso do jornalista Arimatéia, o juiz local postergava a

decisão no pedido de hábeas-corpus, condenando o paciente a prolongada priva-

ção da liberdade, sob o pretexto de obter informações que já constavam dos autos,

como acentuou, em tom de velada censura, o ilustre Presidente do STJ.

Deveriam ter um sentido pedagógico para membros do Judiciário e do Ministé-

rio Público, instituições arejadas pela crescente presença de jovens que não co-

nheceram a ditadura e não apreenderam a inteireza de significados da Constitui-

ção Cidadã de 1988, estes postulados esgrimidos com veemência pelo Ministro

Edson Vidigal:

1. “A imprensa livre é essencial para a democracia, ainda que livre demais, até

para os excessos. A Constituição da República ordena o que fazer nessas situações

–– direito de resposta proporcional à ofensa, direito à indenização por dano mo-

ral, afora as outras sanções previstas na lei penal.”

2. “Prender jornalistas; censurar redações; apreender jornais, livros, revistas;

tirar rádios do ar, portais ou televisões só configuram violação ao direito da socie-

dade à informação. A sociedade tem o direito de ser bem informada. Se essa infor-

mação não é de boa qualidade a própria sociedade a rejeita, a recusa, a condena.”

Que não se percam estas lições, como dever de casa.

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3Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

����� José Reinaldo MarquesTELEVISÃO

lém de render boasmatérias, os bastido-res das emissoras detelevisão são uma óti-ma opção de lazer pa-ra os leitores. É o

que dizem os editores dos cadernos erevistas especializados que circulamno País.

A pesquisadora Ana Carolina Pes-soa Temer, em sua tese de doutoradosobre os 50 anos da TV brasileira, afir-ma que “atualmente o Brasil é o únicopaís que não pertence ao HemisférioNorte e que está entre as oito naçõesonde se concentram três quartos daaudiência mundial”. Os brasileiroscostumam passar de três a quatro ho-ras diante da TV.

Lançada no Brasil em 18 de setem-bro de 1950, por iniciativa de AssisChateaubriand, dono dos Diários As-sociados, cadeia de jornais e emisso-ras de rádio, a TV se popularizou tan-to que logo começaram a ser criadaseditorias e publicações especializadasem bastidores das produções e a vidados artistas.

— O povo gosta de saber quem é apessoa que está por trás do personagem

Como repórteres, fotógrafos

e editores de suplementos e

revistas especializadas em

televisão produzem as

informações que criam ídolos

e os mantêm na crista da onda.

da novela; é isso que o atrai e faz aspublicações sobre televisão serem tãopopulares – conta Marly Schall, que foirepórter da extinta revista Amiga pormais de 20 anos. No período em que elafez cobertura de TV para a Bloch Edi-tores, de 1973 a 1993, a Amiga era umadas revistas mais populares do grupo:

— Ela foi inspirada na Revista doRádio. Quando foi lançada, a TV aindanão era tão popular, mas conseguíamosatrair o interesse do público fazendomatérias investigati-vas sobre a vidaparticular dos elencos dos programas.Com isso, a revista encostava em ven-dagem na Manchete, cuja linha editori-al sempre foi dedicada aos assuntosconsiderados mais sérios.

Em novelas, sem igualPara Rosani Alves, editora da revista

semanal TV Brasil, lançada há seis anospela Editora Escala, a qualidade da tele-visão brasileira estimula a existência detantas publicações dedicadas ao veícu-lo:— Nossa TV é uma das melhores domundo e ímpar na produção de novelase minisséries, nosso principal alvo decobertura. Ela está sempre gerando curi-osidades e, por conseguinte, publicaçõesespecíficas como a nossa.

Rosani acha que, apesar da suprema-cia da TV Globo na produção de nove-las, outros canais abertos estão inves-tindo em qualidade:— Não podemosesquecer que a extinta TV Mancheteabalou a supremacia global com obras

como Pantanal, que rendeu várias ca-pas de revistas e suplementos de jor-nais. No momento, a Rede Record tam-bém está fazendo excelente trabalho.Recebemos constantemente cartas denossos leitores sobre suas novelas e seusastros principais.

A editora destaca ainda que a cober-tura de TV é um trabalho muito sério,mas que às vezes não é bem-compreen-dido e devidamente respeitado, atémesmo por parte dos artistas. Ela afir-ma que a cobertura de televisão é tam-bém jornalismo investigativo:— Em88, o Brasil parou para saber quem ma-tou Odette Roitman, personagem deBeatriz Segall em Vale tudo. E foi a re-vista Amiga, na qual eu era repórter, que

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Jornal da ABI

4 Setembro/Outubro de 2005

deu em primeira mão que a assassinaera Leila, interpretada por Cássia Kiss.Houve um trabalho de investigaçãonisso. Recentemente, em Celebridade,fizeram até bolo de apostas para desco-brir quem matou o Lineu Vasconcelos(Hugo Carvana).

Diz Rosani que esse tipo de matériaprovocou uma mudança de comporta-mento nos autores e diretores. Temen-do que revistas e jornais adiantem o queirá acontecer no fim das novelas, elespassaram a gravar o desfecho das tramaspraticamente no dia de ir ao ar o últimocapítulo ou gravar vários finais diferen-tes, fazendo a escolha em cima da hora.

Além da editora-chefe e da editora-assistente, a TV Brasil, cuja redaçãofunciona no Rio de Janeiro, tem doisrepórteres e dois fotógrafos fixos, res-ponsáveis pelas entrevistas com cele-bridades, os bastidores das gravações, acobertura de eventos, os flagrantes deartistas, além das colunas de moda, cu-linária, horóscopo e opinião e, claro,dos resumos de todas as novelas exibi-das na TV.

Trama, a atraçãoA jornalista Amélia Gonzalez está

há quatro anos na função de editora-chefe da Revista da TV do jornal O Glo-bo. Antes, trabalhava na editoria Gran-de Rio e diz que não se arrepende daopção que fez: — Gosto muito do tra-balho que desenvolvo. Antes de maisnada, ao contrário de muita gente, nãotenho preconceito em relação à TV.

Há dois anos, logo após migrar para acobertura de televisão, a primeira pro-vidência de Amélia foi criar com suaequipe um grupo de discussão, para en-tender as características da publicaçãoe apurar os assuntos de preferência dosleitores: — Era necessário fazer um le-vantamento de seus verdadeiros inte-resses para que pudéssemos desenvolverum bom trabalho. Verificamos que osassuntos de que eles mais gostam são astramas das novelas. Em segundo lugar,aparecem as notícias sobre curiosidades.

Léo Tavejnhansky, editor de Arte doGlobo, conta que a Revista da TV foilançada no dia 5 de abril de 1981, emformato tablóide, substituindo o Ca-derno de TV. Em 1995, o escritório dedesign WBMG (WalterBernard & MiltonGlaser), de Nova York,foi contratado para cui-dar da reformulaçãográfica do jornal. Comisso a revista — bem co-mo os demais suplemen-tos do jornal — sofreusua primeira modifica-ção e adotou novo vi-sual. O último ajusteaconteceu em 1998,quando a publicação pas-sou a ser grampeada, tor-nando-se definitiva-mente uma revista.

A equipe da Revista daTV é formada por uma

editora-chefe, uma editora-adjunta, umacolunista que produz notícias sobre te-levisão a cabo e quatro repórteres. O fe-chamento é às quartas-feiras e as reuni-ões de pauta, com toda a equipe, às quin-tas. Diariamente, o grupo contribui comuma página para o Segundo Caderno, como noticiário sobre a programação geraldas emissoras.

Outro detalhe que Amélia Gonzalezfaz questão de ressaltar com relaçãoao suplemento que dirige é que suasmatérias não se restringem ao univer-so dos elencos das novelas: — Fazemostambém matérias de comportamentoe de cunho educativo. Histórias sobrea vida particular dos atores não são onosso foco principal de reportagem.

Cobrindo TV no Globo há cinco anos,o repórter Paulo Ricardo diz que paracumprir bem essa função é necessárioque, além de acompanhar a programa-ção, o profissional conheça um poucoda história do veículo: — Também temque gostar do que faz. São requisitosbásicos. No dia-a-dia da cobertura, é pre-ciso ter boas fontes, boa apuração e sa-ber que às vezes uma simples gravação,seja de novela ou de programa, poderender uma matéria mais interessantedo que se imagina.

Encarregado das reportagens sobre aprogramação das emissoras SBT, TVE eRede TV!, da novela Alma gêmea e dos

programas Mais você, Domingão doFaustão, A grande família e Casseta &Planeta, Paulo Ricardo faz ainda entre-vistas e matérias de comportamento: —A cobertura de telenovela é sempre maiscomplicada. Nos oito meses de grava-ções e exibição, acontece de tudo, na tra-ma e nos bastidores. A cobrança e a res-ponsabilidade aumentam se for uma no-vela das oito, porque todos os jornaisficam atentos, atrás de um de furo.

Não ao preconceitoEm outubro do ano passado, após

uma reforma gráfica emtodas as suas seções, O Es-tado de S. Paulo lançou ocaderno TV& Lazer. Cris-tina Padiglio-ne, sua edito-ra, diz: — O TV&Lazerestá na 681ª edição e é her-deiro do Telejornal — tãoherdeiro que preservamos,no número da edição, acontagem iniciada há 13anos. Sua estratégia é atra-ir leitores para a edição dedomingo e o projeto foicriado por nossa própriaequipe.

O suplemento ganhoumais duas páginas de pro-gramação de filmes — an-

teriormente tinha apenas uma —, a gra-de com as produções que vão ao ar du-rante a semana toda — e seções de ho-róscopo e quadrinhos. SegundoCristina, a decisão de mudar também onome do suplemento teve como prin-cipal proposta chamar a atenção daspessoas para as opções de lazer de queelas dispõem dentro de casa: — No do-mingo ou em qualquer dia da semana,o item “lazer” amplia o leque proporci-onado pela “TV”, com dicas de DVD,sites, rádio, tecnologia, passatempo...Tudo isso merece uma seção fixa. Te-mos ainda, com freqüência, dicas detodo tipo de serviço de entrega em do-micílio e hobbies em geral.

A filosofia de trabalho no Estadão édispensar qualquer tipo de preconcei-to em relação à TV, como afirma a edi-tora: — Fazemos a cobertura de televi-são para quem sabe apreciar os benefí-cios dela. No entanto, nem por issoestamos de acordo com tudo o que vaiao ar. Tentamos refletir as insatisfaçõese satisfações do leitor e servir tambémcomo guia de programação semanal.

No guia, é claro, não pode faltar oresumo dos capítulos das novelas: — Éessencial. Temos também grande pro-cura por notícias sobre as séries norte-americanas e pelos horários e as sinop-ses dos filmes que serão exibidos nos

Amélia, da Revista da TV, e Rosani, da TV Brasil: dá gosto trabalhar nacobertura da televisão, mesmo com incompreensões de colegas e artistas.

Amiga, do Grupo Manchete, foi uma das publicações especializadas de maior circulação, buscada agora por Contigo! e TV Brasil.Cadernos como TV&Lazer do Estadão e Revista da TV de O Globo atraem leitores.

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5Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

canais abertos. Também é indispensá-vel o perfil de alguém interessante — enão interessa se o entrevistado dá umponto ou 50 de audiência.

Para verificar a interação do leitorcom o veículo, são realizadas pesquisase enquetes através do portal do Estadão,por meio de e-mails ou cartas que che-gam à redação: — A correspondência éuma revelação espontânea do que agra-da ou não ao nosso público. De certaforma, essa avaliação orienta nossa co-bertura e às vezes pode render uma pau-ta específica.

Sobre preconceitos que os repórte-res do caderno sofrem por parte de co-legas de outras editorias, Cristina dizachar natural que isso ocorra, mas nãoé motivo para subestimar essas equi-pes: — Não tenho qualquer pudor emreconhecer que um repórter que ouvedenúncias políticas tem de estar comos ouvidos muito mais atentos do queos de quem entrevista a protagonistada novela do horário nobre. Porém, nosúltimos 12 anos houve uma evoluçãomuito grande nessa área. Quem cobretelevisão deve, com um mínimo de co-nhecimento, estar atento às novastecnologias, à política que envolve aimplantação da TV digital no País, àlegislação que agrada a uns e desagradaa outros... Ou seja, é preciso ter maispreparo do que saber com quem o mo-cinho vai ficar no fim da história. Te-mos uma infinidade de canais a cabo,além de produções brasileiras de emis-soras estrangeiras que utilizam recur-sos da Ancine (Agência Nacional doCinema). É preciso conhecer bem essecenário todo.

“Flagra combinado”Muitos detalhes do dia-a-dia dos

núcleos dos programas das emissorasque aparecem nas capas e matérias daspublicações especializadas em TV sãoresultado de um trabalho minuciosodos repórteres-fotográficos. No casodas novelas, os veículos recorrem aopróprio contingente de fotojornalistasou, no caso da Globo, usam os serviçosdos sete profissionais contratados pelaCentral Globo de Comunicação(CGCOM), dos quais quatro trabalhamno Rio e três em São Paulo.

Chefe de reportagem da revista Con-tigo! no Rio de Janeiro, José EsmeraldoGonçalves diz que há várias situaçõesque orientam essa decisão, entre elas ocusto e a determinação dos diretoresde fazer algumas gravações a portas fe-chadas: — Apelar para a compra de fo-tos de divulgação é uma alternativa dosveículos que fazem a cobertura de tele-visão. Se os nossos fotógrafos não têmpermissão para registrar cenas nas ci-dades cenográficas, compramos esseserviço, que acaba virando uma práticarotineira. Isto também acontece quan-do a revista deseja fotos exclusivas parauma matéria especial ou bastidores degravações no exterior — como as deComeçar de novo em Moscou e de A Luame disse em Viena —, quando, finan-ceiramente, não compensa enviar nos-sos fotógrafos.

A Contigo! tem uma equipe de seterepórteres-fotográficos, responsáveis,em média, por duas matérias por dia,como conta Rodrigo Queiroz, editor deFotografia da revista: — As pautas vari-am muito. Os fotógrafos fazem basti-

dores, making off e o que chamamos de“flagra combinado”, que são as matériasproduzidas e previamente marcadas comos atores. No mesmo dia, porém, eles po-dem ser deslocados para um factual degravação externa de uma novela.

No caso de matérias que pedem ummaterial diferenciado, a opção é deslo-car para a locação um profissional darevista, como Wagner Santos, que pas-sou oito dias na selva amazônica, acom-panhando as gravações da minissérieMad Maria. A missão do fotógrafo eraregistrar a ação de atores e personagensna cidade cenográfica montada pela Glo-bo em Abunã, no interior de Rondônia:

— Não foi fácil cumprir essa pau-ta. Passei oito dias penetrando em lu-gares de difícil acesso para conseguir

O fotógrafo Wagner Santos, de Contigo!, enfrentou uma maratona para acompanhar a equipe de Mad Maria no interior deRondônia, mas seu empenho foi premiado: conseguiu fotos exclusivas da estrelíssima Ana Paula Arósio.

fotografar as cenas com a Ana PaulaArósio, pois não tinha permissão parair até o local das gravações feitas den-tro de um barco, num rio próximo auma cachoeira. Por sorte, fiz amizadecom o dono de um pequeno sítio vizi-nho à locação e, metido no meio domato, consegui concluir o trabalho.

Programada para ocupar duas pági-nas da Contigo!, a matéria, lembraWagner, acabou sendo publicada emseis: — Isto graças a um princípio quetodo fotógrafo de TV tem que ter: sa-ber fazer amizades, seja com atores,direção, pessoal da produção ou pesso-as comuns, que em muitos casos podemser fundamentais, como aconteceu co-migo em Rondônia. Esse fator é tão re-levante quanto saber fotografar.

Cristina Padiglione, de TV&Lazer: Estadão não tem preconceitos em relação à TV.

FILIPE ARAÚJO

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Jornal da ABI

6 Setembro/Outubro de 2005

A ABI divulgou uma saudação ao 20ºaniversário do jornal Folha Dirigida,que, “sob a firme e criativa liderança dojornalista Adolfo Martins, seu funda-dor, construiu um modelo de cobertu-ra e reflexão sobre as questões relacio-nadas com a formação educacional, aseleção de pessoal para órgãos públicos,dignificando o sistema do mérito, e adiscussão dos aspectos culturais maisrelevantes da vida do País”. É o seguinteo teor da declaração:

“““““É com especial ênfase que a Asso-ciação Brasileira de Imprensa saúda o20º aniversário de fundação da FolhaDirigida, que ao longo dessas duas dé-cadas, cumprindo uma trajetória decrescente credibilidade junto aos lei-tores, às representações da sociedadecivil e ao Poder Público, alcançou umpatamar de notável prestígio e se fir-mou como a principal publicação pe-riódica do País no campo da educação.

Sob a firme e criativa liderança dojornalista Adolfo Martins, seu funda-dor, a Folha Dirigida construiu um mo-delo de cobertura e de reflexão sobre asquestões relacionadas com a formaçãoeducacional, a seleção de pessoal paraos órgãos públicos, dignificando o sis-tema do mérito, e a discussão dos as-pectos culturais mais relevantes da vidado País. A Folha Dirigida retomou, ele-

ANIVERSÁRIO

Uma saudação à “FolhaDirigida” por seus 20 anos

vando-a a níveis excepcionais, a tradi-ção jornalística de cobertura perma-nente da área educacional, expressa naseção que o saudoso Diário de Notíciasde Orlando Dantas manteve durantelargo tempo e na qual colaborou, noinício da sua atividade profissional, apoeta Cecília Meireles. Foi nessa fontecristalina que Adolfo Martins se inspi-rou para criar e manter o Escolar JS,,,,,seção especializada do Jornal dos Sports,na qual ele sedimentou a experiênciaque faz agora da Folha Dirigida um ve-ículo imprescindível para quantos sededicam à educação e à cultura no País.

A Associação Brasileira de Impren-sa, que conta em seu quadro social comprofissionais que participaram da se-ção pioneira do Diário de Notícias,como seu ex-Presidente FernandoSegismundo, destacado colaborador dojornal de Orlando Dantas, assinala apassagem dos 20 anos da Folha Dirigidacomo um momento muito grato nãosó para Adolfo Martins, sua equipe deprofissionais e os funcionários de suaempresa, mas para a comunidadejornalística do Brasil.”

Festa no CopaA festa de comemoração dos 20 anos

do Grupo Folha Dirigida, no dia 15 desetembro, reuniu educadores, autori-

dades, intelectuais e representantes deinstituições públicas e privadas noCopacabana Palace, onde foi servidoum coquetel, seguido de jantar.

O evento foi aberto com a apresen-tação de um vídeo sobre a história dogrupo, que incluía uma mensagemgravada por Barbosa Lima Sobrinho em1998 — o ex-Presidente da ABI, quemorreu em 2000, dá nome ao prédioda Rua do Riachuelo que hoje abriga asede do jornal Folha Dirigida .

Ao discursar, o Ministro da Educa-ção, Fernando Haddad, ressaltou a con-tribuição do Grupo Folha Dirigida àárea, “através de textos editoriais so-bre educação e cultura e de valoriza-ção dos concursos para a administra-ção pública”.

Na mesa ao lado da do Ministro es-tavam o Diretor-fundador do grupo,jornalista Adolfo Martins, o Vice-Go-vernador do Rio de Janeiro, Luiz PauloConde, e o Senador Saturnino Braga.

O Presidente da ABI, Maurício Azê-do, compareceu ao evento juntamen-te com outros representantes da insti-tuição, como Gioconda Cavalieri,Fernando Segismundo, Murilo MelloFilho e Cícero Sandroni. Também es-tava presente o Secretário estadual deCultura, Arnaldo Niskier, associado daCasa.

O Conselho Deliberativo da ABIaprovou em sua reunião de outubrouma manifestação de desagravo a Os-car Niemeyer, em razão de reporta-gem considerada ofensiva a ele feitapelo jornalista Fred Melo Paiva, quefoi recebido no escritório do arquite-to, na Avenida Atlântica (Zona Sul doRio), com a maior cortesia e montouum texto que, buscando ser jocoso,expôs ao ridículo o entrevistado.

Na reportagem, publicada em pági-na inteira do caderno Aliás de O Esta-do de S. Paulo na edição de 9 de outu-bro, o repórter traça um retrato despri-moroso de Niemeyer, dizendo que, aos97 anos de idade, o decurso do tempo ofez diminuir de altura, em contrastecom o crescimento das orelhas, e afe-tou sua visão, o que é verdade e foi de-plorado pelo próprio entrevistado.

CONSELHO

UM DESAGRAVO A NIEMEYERConselho Deliberativoaprova moção desolidariedade aoarquiteto, agredidonuma matériadominical do Estadão.

Desrespeitoso e deselegante, o re-pórter diz que Niemeyer está “meioceguinho”, deficiência que, ao invés

de lhe inspirar compreensão, o leva aoferecer uma imagem desairosa do ar-quiteto. Ao se referir à altura deNiemeyer, Melo Paiva exacerba suadeselegância em relação ao entrevis-tado, pois diz que, como diminui detamanho, brevemente, sentado emsua cadeira de trabalho, ele não con-seguirá alcançar o chão com os pés.

Numa das muitas passagens demau gosto da reportagem, Melo Paivafaz referências também jocosas a umcolaborador de Niemeyer, Luiz Otá-vio, apresentado como um dorminho-co que durante o sono emite “uns si-nais de seu interior”.

A proposta de desagravo foi apre-sentada pelo jornalista Mário Barata,que foi crítico de artes plásticas doantigo Diário de Notícias e professorda Escola Nacional de Belas-Artes daUniversidade Federal do Rio de Janei-ro, pela qual se aposentou.

Oscar Niemeyer, nascido em 15 dedezembro de 1907 e que há 52 anos ésócio da ABI —, filiou-se em 30 de ju-lho de 1953, tendo sido admitido naentidade pelo então PresidenteHerbert Moses; na ocasião, era pro-prietário e editor da revista Módulo,especializada em arquitetura.

O Tribunal Regional Federal da3ª Região, sediado em São Paulo, de-cidiu por unanimidade em 26 de ou-tubro revogar a sentença da juízasubstituta Carla AbrantkoskiRichter, da 16ª Vara Cível da JustiçaFederal no Estado, que em outubrode 2001 suspendera a exigência dodiploma de Jornalismo para o exer-cício da profissão. Com essa decisão,a Justiça acatou o recurso da Federa-ção Nacional dos Jornalistas e do Sin-dicato dos Jornalistas do Estado deSão Paulo.

Os votos dos juízes Manoel Álva-res, relator do processo, Alda Basto eSalette Nascimento foram baseadosno entendimento de que o Decreto-Lei nº 972, de 1969, que regulamen-tou a profissão de jornalista, foi re-cepcionado pela Constituição de1988; portanto, sua manutenção nãosignifica violação da constituciona-lidade. Os juízes justificaram seusvotos afirmando que o faziam emreconhecimento à “responsabilida-de ética dos jornalistas com sua pro-fissão”.

A exigência do diploma foi insti-tuída por esse decreto-lei em 1969.Até então, não era necessário cursarfaculdade de Jornalismo para se ob-ter o registro profissional. Em 2001,o Procurador regional dos Direitosdo Cidadão do Ministério Público Fe-deral André de Carvalho Ramos en-trou com Ação Civil Pública na 16ªVara Cível da Justiça Federal de SãoPaulo contra o decreto-lei, argumen-tando que a exigência do diplomarestringe o acesso a uma profissão ecerceia a liberdade de imprensa.

O Presidente do Sindicato dos Jor-nalistas Profissionais do Municípiodo Rio de Janeiro, Aziz Filho, decla-rou após o julgamento que “uma dasprimeiras medidas a serem tomadasagora será informar as Delegacias Re-gionais do Trabalho, em todo o País,da decisão da Justiça e pedir que osregistros precários de jornalista queforam concedidos a partir da liminarda juíza Carla Richter sejam consi-derados ilegais”.

A decisão do TRF-3ª Região foicomemorada com euforia pelos cer-ca de 300 jornalistas, estudantes erepresentantes de entidades de defe-sa da categoria que acompanharamo julgamento na capital paulista. Aofinal, todos saíram em passeata até àsede do Sindicato, onde foram dis-cutir com a assessoria jurídica da en-tidade as medidas que deverão sertomadas a partir da decisão judicial,que pode ser objeto de recurso aoSuperior Tribunal de Justiça, massem efeito suspensivo. Em todo o Paísforam organizadas manifestaçõesem defesa do diploma.

LEGISLAÇÃO

Diploma deJornalismonovamenteobrigatório

Niemeyer: Traído em sua hospitalidadepor um repórter imaturo.

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7Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

A íntegra da decisão do Ministro Edson Vidigal:HABEAS CORPUS Nº 49.517 - PI (2005/0183881-3)IIIIIMMMMMPPPPPEEEEETRTRTRTRTRANTE ANTE ANTE ANTE ANTE : THYAGO RIBEIRO SOARESIIIII MMMMM PPPPP EEEEETRTRTRTRTRADO:ADO:ADO:ADO:ADO: DESEMBARGADOR RELATOR DO HC NR05002559-7 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍPPPPPAAAAACICICICICIENTE:ENTE:ENTE:ENTE:ENTE: JOSÉ ARIMATÉIA DE AZEVEDODECISÃOVistos, etc.

O Juiz José Bonifácio Júnior, da 6ª Vara Criminal de Teresina,PI, decretou a prisão preventiva do Jornalista José de ArimatéiaAzevedo. E ainda mandou fechar o seu “Portal AZ”.

O Jornalista está preso sob a acusação de crime de imprensa,(Lei nº 5.250/67, Arts. 21 - difamação e 22 – injúria). A outraacusação é coação no curso do processo (CP, Art. 344).

Matérias veiculadas no portal, numa seção de humor, assinadapor Chico Pitomba, espécie de Macaco Simão, da Folha de S.Paulo,referiam-se “às peripécias de uma fogosa advogada na Bahia” .

Em outros comentários, Pitomba deslizou e escreveu – “Incrí-vel, gente, como a bonita advogada Audrey Magalhães está se es-pecializando em ser advogada contra o chefinho. Obsessão pura”.

O chefinho, no caso, é o Jornalista Arimatéia Azevedo, donodo portal e agora preso. A advogada, realmente, patrocina ações

JURISPRUDÊNCIA

Decidindo num sábado o habeas-corpus impetrado por um jornalista do Piauí, o Presidentedo Superior Tribunal de Justiça, Ministro Edson Vidigal, mandou libertá-lo e reafirmou umprincípio que muitos teimam em violar: “Na democracia, não se prende um jornalista pelo

que escreve ou pelo que fala. A força, qualquer que seja, tem de obedecer à idéia”.

judiciais contra o dono e editor do “AZ”.Daí para isso tudo virar querela na Justiça é cabível no Estado

de Direito Democrático. Houve tempo no Nordeste em que jorna-lista era obrigado a engolir, literalmente, o que escrevia. Agora, não.

Na democracia, eventuais abusos hão que ser resolvidos naJustiça, observados rigorosamente o devido processo legal, o am-plo direito de defesa, o contraditório, a presunção da inocência.

O humorismo de Pitomba no portal de Arimatéia logo seectoplasmou, também, no crime do Código Penal, Art. 344 –coação no curso do processo.

CP, Art.344 - “Usar de violência ou grave ameaça, com o fim defavorecer interesse próprio ou alheio contra a autoridade, parte,ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervirem processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral.Pena – reclusão de um a quatro anos e multa de dois a dez milcruzeiros, além de pena correspondente à violência”.

Ao fundamentar seu decreto mandando prender o Jornalista,escreveu o Juiz:

“Trata-se a toda evidência de delitos, em tese, de imprensa (Arts.21 e 22) em concurso formal com o delito do Art. 344 do CP –coação no curso do processo, como se infere do seguinte julgado:

“Para a plena caracterização do delito previsto no Art.344 doCP, é indispensável que o agente tenha a intenção de favorecer

O Presidente do Superior Tribunalde Justiça, Ministro Edson Vidigal,concedeu liminar em habeas-corpus,no sábado 29 de outubro, para colocarem liberdade o jornalista José Arima-téia de Azevedo, dono do Portal AZ.Com isso, o Ministro Vidigal revogoua decisão do juiz da 6ª Vara Criminalde Teresina, José Bonifácio Júnior, quetinha decretado a prisão de Arimatéiade Azevedo, na quarta-feira anterior,dia 26, e mandado fechar o site de no-tícias.

“A liberdade é a regra no Estado deDireito Democrático; a restrição à li-berdade é exceção, que deve ser excep-cionalíssima”, diz o Ministro Vidigalna decisão, na qual assinalou aindacom forte ênfase: “O decreto de prisãopreventiva deve ser devidamente mo-tivado, surgindo como resultadoda análise de fatos concretos. É impres-cindível que se demonstre, através deelementos objetivos, o periculum li-bertatis, ou seja, tem que restar claroque a liberdade do réu poderá causargrandes danos à paz social, à instruçãocriminal ou à realização da norma re-pressiva”. Disse ainda o Ministro nes-se ponto:

“Padece de razoabilidade a decisãoque impõe o sacrifício da liberdade in-dividual com base em referência ge-nérica aos pressupostos determinadosno dispositivo procedimental. Assim,presentes os pressupostos ensejadoresda medida liminar pleiteada e, conso-ante o entendimento recente da Excel-sa Corte, defiro o pedido liminar e sus-

pendo em seu inteiro teor a Decisãoora atacada, da lavra do Dr. Juiz da 6ªVara Criminal de Teresina, PI.”.

Vidigal determinou também a ime-diata expedição do alvará de soltura emfavor de José Arimatéia de Azevedo.

Secretário prendeA prisão do jornalista mobilizou a

imprensa nacional. Em nota oficial, oSindicato dos Jornalistas do Estado doPiauí classificou a prisão como formade cerceamento da liberdade de im-prensa. Arimatéia de Azevedo, quetambém assina uma coluna sobre po-lítica no jornal O Dia, foi detido pes-soalmente pelo Secretário de Seguran-ça Pública do Estado, Robert Rios Ma-galhães, quando chegava a um super-mercado, no bairro de Ilhotas, zona sulde Teresina. O fato foi denunciadotambém por organizações internacio-nais de proteção aos jornalistas.

O processo que resultou na prisãode Arimatéia é movido pelo jornalistaRivanildo Feitosa, sob a acusação decrime de imprensa. A advogada AudreyMagalhães, que defende Feitosa e ou-tros jornalistas, se empenhou para queArimatéia fosse transferido da Secre-taria de Segurança para a Casa de Cus-tódia, sob a alegação de que o jornalis-ta não possui curso superior.

Audrey Magalhães explicou quemove “algumas ações” contra Arima-téia e que no curso desses processosteria sido vítima de “calúnias e injúri-as” no portal. Ela alegou que “essasagressões” seriam uma forma de inti-

midá-la. O jornalista é conhecido noEstado do Piauí pela autoria de maté-rias polêmicas. Foi o primeiro profissio-nal a denunciar o crime organizado noEstado; por duas vezes, chegou a servítima de atentado.

“Agora, não”Para decretar a prisão de Arimatéia,

o Juiz José Bonifácio Júnior levou emconta matérias veiculadas no Portal AZassinadas por Chico Pitomba, no qualeste se referia “às peripécias de umafogosa advogada da Bahia”. Na deci-são, o Ministro Vidigal aponta que “daípara isso tudo virar querela na Justiça écabível no Estado de Direito Democrá-tico. Houve tempo no Nordeste em quejornalista era obrigado a engolir, lite-ralmente, o que escrevia. Agora, não”.

Ainda segundo o Ministro Vidigal:“Na democracia, eventuais abusos hãoque ser resolvidos na Justiça, observa-dos rigorosamente o devido processolegal, o amplo direito de defesa, o con-traditório, a presunção da inocência”.O Presidente do STJ relata mais adian-te que o pedido de liminar em habeas-corpus em favor de Arimatéia de Aze-vedo, distribuído no dia seguinte à pri-são, ou seja, na quinta-feira 27, “aindanão foi apreciado porque o relator, De-sembargador Luís Fortes do Rego, pe-diu informações no prazo de dez dias”.

Porém, os advogados de Arimatéiade Azevedo destacam: “não obstantejá estar o mesmo instruído com as ra-zões das quais valeu-se o juiz de 1ª ins-tância para decidir”. Desse modo, res-

“PRENDER JORNALISTAS CONFIGURA VIOLAÇÃO AO DIREITO À INFORMAÇÃO”interesse próprio ou alheio em processo”. (Ap Crim – QuartaCâmara Criminal. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – Rel.Constantino Lisboa de Azevedo. Julgamento em 01.09.2005)

No caso em apreço, o Sr Arimatéia Azevedo é parte querelada(ré) em Queixa Crime, que lhe promove o Jornalista Rivanido Fei-tosa, cuja advogada é a Dra. Audrey Martins Magalhães, por conse-qüência, caracteriza-se o delito, pelo menos em tese, do interes-se do ora querelado Arimatéia Azevedo em favorecer interessepróprio.

(...)É certo que o ordenamento pátrio consagrou o direito de

liberdade de expressão e comunicação (Art.5º, IX da CF/88) mastal prerrogativa deve ser cotejada com o resguardo da vida privada,observado o princípio da proporcionalidade entre as normas cons-titucionais.

Ainda que se considere reconhecido o direito à divulgaçãodos fatos que são considerados públicos, da vida externa dapessoa humana, essa divulgação deve observar os limites da vidaprivada do indivíduo, sem o que a paz social é impossível. Dessaforma, os direitos individuais não podem ser exercidos de formaabsoluta e ilimitada, na medida em que a sua prática danosa àordem pública ou ao direito alheio a preservação da intimidade,notadamente de uma mulher, pode e deve ser considerada ilícita.

tou à defesa do jornalista recorrer aoSTJ. O Ministro Vidigal disse, na deci-são, que existe entendimento no STJ“de que o não conhecimento de umpedido ou sua postergação injustifica-da, sendo omissão, configura denega-ção, o que por si só atrai a nossa compe-tência para conhecer”.

“É o caso aqui. O DesembargadorRelator, mesmo tendo em mãos cópiado inteiro teor do processo do primei-ro grau, portanto, com todos os ele-mentos da convicção do juiz aponta-do como autoridade coatora, ainda as-sim, deixando de examinar o pedidode liminar, deu prazo de dez dias paraas informações”, diz o Ministro, queacentuou: “Na prática, inviabilizou aprestação jurisdicional mediante o‘habeas corpus’, que constitui provi-dência urgente, de rito sumário, direi-to constitucional individual do cida-dão. A informação comprovada de que,com muita sorte, o jornalista que estápreso só poderá ter o seu pedido de sol-tura apreciado por volta do fim do mêsde novembro diz mais que qualqueroutro argumento”.

O presente texto reproduz, comadaptações, aquele divulgado em seusite pelo Superior Tribunal de Justiça,elaborado por Roberto Cordeiro, daAssessoria de Comunicação Social do STJ.Os intertítulos são da Redação do Jornalda ABI. É também do Jornal da ABI otítulo que precede a transcrição integralda Decisão do Ministro Edson Vidigal.

UMA SENTENÇA HISTÓRICA

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Jornal da ABI

8 Setembro/Outubro de 2005

Assim, o requerido Arimatéia Azevedo, na qualidade de editordo “Portal AZ”, ao publicar a notícia supra na internet (um tópicode seis linhas sob o título “Derrubadona”, na coluna de ChicoPitomba, digo eu), ao alcance do grande público, nos termos emque foi posta, evidentemente, provocou desnecessária e violentaagressão moral irreparável, a ora querelante e ofendida, demons-trando por outro lado, o querelado, conforme os indícios acosta-dos extraídos da internet, que o seu objetivo era atingir a imagemda querelante/vítima, seja como mulher, seja como advogada nodesempenho do seu mister.

Por essas razões e pela periculosidade ostentada pelo agen-te, no uso do “Portal AZ”, que demonstra o nexo entre a notíciaincriminada e o fato de ser ele réu em ação penal, nesta 6ª VaraCriminal, em que é advogada a querelante/vítima, caracterizado ocrime denunciado de coação no curso do processo (Art. 344 doCP), punido com reclusão recomenda tal circunstância, a medidacautelar requerida pela Querelante e pela Representante do Mi-nistério Público, com o objetivo de manter a ordem pública e apaz social, abaladas pela notícia degradante.

Havendo assim a prova material do crime pelos documentosde fls. 64/71 (cópias dos textos veiculados, digo eu) e indícios su-ficientes da autoria do delito do Art. 344 do CP c/c os Arts. 21 e 22da Lei nº 5.250/67 (lei da ditadura, lembro eu), e tratando-se decompetência deste Juízo, delineada pelos Arts. 76, III e 83 doCPP, acolho as alegações da Querelante e Requerimento do Mi-nistério Público, para decretar a prisão preventiva de José de Ari-mateia Azevedo, nos termos dos Arts. 311, 312 e 313, I do CPP.

Decreto, ainda, o trancamento do “Portal AZ” a requerimentoda ofendida, respaldado pelo Ministério Público, até posteriordeliberação, bem como, determinar a proibição da veiculação donome da Querelante ou qualquer nota que a identifique”.

E com estes fundamentos, o Jornalista está preso há três dias.O pedido de “habeas corpus”, providenciado junto ao Tribunal

de Justiça do Piauí, distribuído um dia depois, ainda não foi apre-ciado porque o Relator, Desembargador Luis Fortes do Rego, pe-diu informações no prazo de dez dias, “não obstante já estar omesmo instruído com as razões das quais valeu-se o juiz de 1ªinstância para decidir”, registra a defesa.

Daí este “habeas corpus” aqui, no Superior Tribunal de Justiça,com pedido de liminar.

O pedido de informações, sustenta a defesa, tornou:“(...) totalmente inócuo um agravo regimental, porquanto o

Tribunal não funcionará nos dias 31, 01 e 02 de novembro próxi-mos, ou seja, o julgamento de eventual agravo regimental apenaspoderia acontecer no dia 08 de novembro, data da próxima ses-são, e caso possível adentrar em pauta. Não julgado naquele dia,o que não se revela improvável, apenas aos 22 dias do mês denovembro haverá novel oportunidade, vez que o dia 15 é, noto-riamente, feriado nacional.

Mesmo ciente de tais percalços o e. Desembargador relatornegou-se a decidir acerca do pleito liminar. Vê-se, portanto, atra-vés dos fatos, que se engendra um abuso sem precedentescontra o paciente, o qual já está durante todo este iter processualpreso e, mesmo sem o desembargador relator ciente da flagranteofensa ao direito fundamental ora ventilado, permanece a patroci-nar a medida restritiva da liberdade, que se deu sob o fundamen-to cautelar e nem ao menos acurado olhar poderia subsistir”.

A petição aqui sob meu exame argumenta que o ato omissivodo Desembargador Relator, não apreciando o pedido de liminar,não obstante as notórias dificuldades para o julgamento, em tem-po razoável, do mérito da impetração, há que ser consideradocomo indeferitório, de modo a justificar a intervenção do SuperiorTribunal de Justiça.

O óbice do entendimento firmado no STJ, segundo o qual nãocabe liminar em “habeas corpus” contra despacho indeferitóriode liminar, estaria superado pelo Supremo Tribunal Federal, quetambém editou súmula no mesmo sentido e, no entanto, a har-monizou com mandamentos constitucionais que não admitemflagrante ilegalidade.

O decreto de prisão preventiva, aqui atacado, não se sustenta,no entender da defesa, porque:

“(...) 1. carece de qualquer fundamentação acerca da necessi-dade da cautelaridade exarada, 2. inexiste, ainda, qualquer possibi-lidade de prejuízo à instrução processual, 3. não houve indício deprova de que tenha sido o paciente, sequer, o autor do fato; 4. ofato imputado é atípico e, 5. ainda, caso crime houvesse (o que seadmite apenas no resguardo argumentativo), carece o delito,mesmo em tese, de potencialidade lesiva, vez que cominação depena mínima é de apenas 1 (um) ano, sendo, pois, desarrazoada,desproporcional, ilegal e abusiva a subsistência da vertente or-dem de prisão preventiva”.

Ademais, acrescenta, nem há indício de autoria, até porque ostextos incriminados não foram escritos pelo dono e editor doportal e, sim, alguns enviados por leitores e outros de colaborado-res do site (sendo um deles, digo eu, o Chico Pitomba).

Aduz, ainda, a inicial:

“O que nos causa estranheza, entretanto, é que, mesmo cientede tal fato, limitou-se o Ministério Público, ao realizar sua denúncia,a determinar a prisão de editor chefe do portal, sem realizar qual-quer sorte de investigações a fim de identificar os reais agressorese, ainda, fundado na falsa perspectiva de que a responsabilidadepor crimes de imprensa fossem, sempre, do editor chefe.

A verdade é que a RESPONSABILIDADE PENAL nestes deli-tos deve ser apurada na forma do Capítulo V, Seção I, da Lei deImprensa, onde a mesma declina:

‘Art. 37. São responsáveis pelos crimes cometidos através daimprensa e das emissoras de radiofusão, SUCESSIVAMENTE:

I – o autor do escrito ou transmissão incriminada, sendo pes-soa idônea e residente no País, salvo tratando-se de reproduçãofeita sem o seu consentimento, caso em que responderá comoseu autor quem a tiver reproduzido;

’Ora, o autor não é o Sr. Arimatéia Azevedo, que é inclusivecolunista político. Noutra face, se até agora não se identificou o realautor das notas, não foi por outro motivo que não a omissão dopróprio órgão ministerial em solicitar a realização das investigaçõespertinentes e limitando-se, de modo abusivo, a requerer a prisãodo ora paciente, em franco desacordo com a disciplina legal.

Ademais, absurda se faz a prisão cautelar do paciente ante asvedações expostas na própria Lei de Imprensa, art. 66:

‘Art. 66. O jornalista profissional não poderá ser detido nemrecolhido preso antes da sentença transitada em julgado; emqualquer caso, somente em sala decente, arejada e onde encon-tre todas as comodidades.

Parágrafo único. A pena de prisão de jornalista será cumpridaem estabelecimento distinto dos que são destinados a réus decrimes comum e sem sujeição a qualquer regime penitenciárioou carcerário’.

Mais uma vez – continua a defesa – revela-se claro o engen-dramento de uma situação que, não se sabe por qual fundamen-to, e ao constante arrepio legal, tem por escopo único levar àprisão um jornalista político, que não oferece qualquer sorte delesividade ou ofensividade a que a esfera seja do meio social.

Em verdade, a denúncia de coação processual é parte de umaarmadilha que visa escapar a questão do foco que deveras existe,ou seja, a existência em tese de delito de imprensa. É isto que sejulga e é isto que motivou toda queixa e decisão.

A prisão do jornalista por coação e, bem assim, a determinaçãode lacrar-se o portal de notícias é totalmente desproporcional,casuística e em hipótese alguma contempla a luta por valoresmaiores que não os refletidos nos crimes de imprensa.

Busca, então, o nobre órgão ministerial afastar-se da delituosi-dade vinculada a atividade de imprensa, que em tese pode existire através da qual não se permitiria, juridicamente, a execução dacoação ilegal que se perpetra e, a par disto, fundamenta-se, forço-samente, a existência de coação no curso de um processo que,inclusive, já está instruído, ou seja, inexiste razão por completapara a decisão segregativa (...)”

Decompondo o dispositivo do Código Penal, Art. 344 (coaçãono curso do processo), a defesa lembra que o mencionado disposi-tivo tem como tipo objetivo as condutas de usar “violência ou gra-ve ameaça”.

Relata, também, que:“A violência, frise-se, deve ser física, como bem assinala o Prof.

Damásio, Curso de Direito Penal, 4.vol.10ª ed., p.280) ao discorrersobre o tema:

‘trata-se de violência física, exercida contra pessoa’Já a grave ameaça é consubstanciada na promessa de causar

mal futuro, serio e verossímil, requisitos que em nenhum momen-to restaram evidenciados, inclusive pela narrativa da própria repre-sentante.

(...) Simples notas de fofocas não têm o condão de infligir apecha de grave ameaça. Noutro flanco, inexiste um mal futuro aser suportado eventualmente pela queixosa.”

Depois de rebater a invocação dos requisitos do CPP, Art.312,para a prisão preventiva, sustentando sua inaplicabilidade ao caso,a defesa pede, ao final, concessão da liminar para reformar a de-cisão e, in continenti, determine-se a expedição de alvará de sol-tura, revogando o mandado de prisão preventivo expedido emdesfavor do ora paciente, José Arimatéia de Azevedo; seja ouvidaa autoridade coatora; seja ouvido o representante do MinistérioPúblico; seja, ao final, confirmada a ordem para, em definitivo,determinar-se a ilegalidade do mandado de prisão expedido, jul-gando-se procedente a presente ordem de “habeas corpus” e,ainda, determinando-se o trancamento da ação penal onde seapura o alegado crime de coação no curso do processo.

DECIDO.

Há entendimento reiterado neste Superior Tribunal de Justiçade que o não conhecimento de um pedido ou sua postergaçãoinjustificada, sendo omissão, configura denegação, o que por siatrai a nossa competência para conhecer. Nesse sentido: HC

40.414-SP, Rel. Min. Paulo Medina, DJ de 03.02.05.É o caso aqui. O Desembargador Relator, mesmo tendo em

mãos cópia do inteiro teor do processo do primeiro grau, portanto,com todos os elementos da convicção do juiz apontado comoautoridade coatora, ainda assim, deixando de examinar o pedidode liminar, deu prazo de dez dias para as informações.

Na prática, inviabilizou a prestação jurisdicional mediante o“habeas corpus”, que constitui providência urgente, de rito sumá-rio, direito constitucional individual do cidadão. A informação com-provada de que, com muita sorte, o Jornalista que está preso sópoderá ter o seu pedido de soltura apreciado por volta do fim domês de novembro diz mais que qualquer outro argumento.

A Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal afirma não com-petir àquela Corte “conhecer de habeas corpus impetrado contradecisão de relator que, em habeas corpus requerido a tribunalsuperior, indefere liminar”.

Esta Corte também partilha do mesmo entendimento, ressal-vando a possibilidade de impetração de “habeas corpus” emcasos tais somente na hipótese de flagrante ilegalidade ou dedecisão teratológica. A propósito:

“PROCESSO CIVIL - HABEAS CORPUS - LIMINAR - ALIENAÇÃOFIDUCIÁRIA - BUSCA E APREENSÃO DE AUTOMÓVEL - CONVER-SÃO EM DEPÓSITO - PRISÃO CIVIL - WRIT CONTRA ATO DEDESEMBARGADOR - CABIMENTO - CONCESSÃO DA ORDEM.

1 - Quando manifesta a ilegalidade da decisão, tem-se admiti-do o processamento do writ contra decisão liminar de relator emhabeas corpus anterior, evitando, destarte, a ocorrência ou manu-tenção da coação ilegal (v.g. HC 35.221/GO, Rel. Ministro CESARASFOR ROCHA, DJ 25.10.2004; HC 13.878/DF, Rel. MinistroCARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 11.12.2000; HC15.782/MA, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJU de 23.04.2001).

(...)” (HC 38125, Rel Min. Jorge Scartezzini, DJ de 25.05.05).Recentemente, inclusive, esclareceu a Eg. Corte, sob a relatoria

do Ministro Carlos Veloso, no HC 86.864-9 São Paulo, que “oEnunciado 691 não impede o conhecimento do habeas corpus,se evidenciado flagrante constrangimento ilegal”.

Não há, prima facie, a menor dúvida, de que estamos aquidiante de um manifesto constrangimento ilegal.

Na democracia, não se prende um jornalista pelo que escreve oupelo que fala. A força, qualquer que seja, tem que obedecer à idéia.

A imprensa livre é essencial para a democracia, ainda que livredemais, até para os excessos. A Constituição da República ordenao que fazer nessas situações – direito de resposta proporcional àofensa, direito à indenização por dano moral, afora as outras san-ções previstas na lei penal.

Prender jornalistas; censurar redações; apreender jornais, li-vros, revistas; tirar rádios do ar, portais ou televisões só configuraviolação ao direito da sociedade à informação. A sociedade tem odireito de ser bem informada. Se essa informação não é de boaqualidade a própria sociedade a rejeita, a recusa, a condena.

A nenhuma autoridade é permitido interpretar a lei a seu modopara constranger o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ouprofissão, atendidas as qualificações que a lei estabelecer.

Dois comandos constitucionais chamam aqui a atenção dian-te deste caso:

“CF, Art. 5º.LXVI - Ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando

a lei admitir a liberdade provisória com ou sem fiança.LXI – Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por

ordem escrita e fundamentada a autoridade judiciária competen-te, salvo nos casos de transgressão militar.”

A liberdade é a regra no Estado de Direito Democrático; arestrição à liberdade é exceção, que deve ser excepcionalíssima.

O decreto de prisão preventiva deve ser devidamente motiva-do, surgindo como resultado da análise de fatos concretos. Éimprescindível que se demonstre, através de elementos objeti-vos, o periculum libertatis, ou seja, tem que restar claro que aliberdade do réu poderá causar grandes danos à paz social, àinstrução criminal ou à realização da norma repressiva.

Padece de razoabilidade a decisão que impõe o sacrifício daliberdade individual com base em referência genérica aos pressu-postos determinados no dispositivo procedimental.

Assim, presentes os pressupostos ensejadores da medidaliminar pleiteada e, consoante o entendimento recente da ExcelsaCorte, defiro o pedido liminar e suspendo em seu inteiro teor aDecisão ora atacada, da lavra do Dr. Juiz da 6ª Vara Criminal deTeresina, PI.

Determino a imediata expedição do alvará de soltura em favordo ora paciente, José Arimatéia de Azevedo.Publique-se.Intime-se.Brasília, 29 de outubro de 2005.

MINISTRO EDSON VIDIGALPresidente

“A imprensa livre é essencial, até para os excessos”

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9Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

����� por Gil Campos ~ fotos Alexandre de PauloCONFISSÕES

ENTREVISTA EXCLUSIVA COM O ARCEBISPO EMÉRITO DE SÃO PAULO

Em 1934, aos 13 anos, DomPaulo Evaristo Arns teveo seu primeiro artigo publicado no jornal Juventu-de Seráfica, do Seminário

Menor dos Franciscanos, em Rio Ne-gro (PR). Naquele ano, assumiu ocargo de redator-chefe da publicação.“Sabe quantos números saíram noprimeiro ano? Um”, contou sorrindoo Cardeal e Arcebispo Emérito de SãoPaulo, ao relembrar seu primeiro con-tato com o vírus do jornalismo, queo contagia até hoje, aos 84 anos.

Dom Paulo não sai de casa, na Zo-na Norte de São Paulo, para nenhumcompromisso sem a sua carteira daABI (número 0309, matrícula 0839),assinada por Barbosa Lima Sobri-nho. “Em qualquer lugar onde euvou, a carteira da ABI vale mais àsvezes do que a própria identifica-ção”, disse empunhando o docu-mento, que lhe confere isenção dasmensalidades – ele recebeu o títulode Remido Honra ao Mérito da ABI,em setembro de 1994. Aliás, o pri-meiro contato de d. Paulo com a ABIaconteceu no final da década de1950, quando ele era professor de Di-dática Geral da Faculdade de Filo-sofia de Petrópolis.

Para poder dirigir algumas revis-

tas no Rio de Janeiro, Dom Pauloprocurou a ABI, esperou algumashoras, e saiu com o documento semo seu nome de batismo – Paulo, mascom o nome religioso – Frei EvaristoArns. Ainda em Petrópolis, ele con-seguiu o registro de “jornalista não-profissional” na 14ª Delegacia Re-gional do Trabalho. E não mais pa-rou de atuar junto à imprensa.

Seu envolvimento com a profis-são foi tamanho que, pouco mais deuma década depois, Dom Paulo, jácomo Arcebispo de São Paulo, se tor-nou o “anjo da guarda da impren-sa” durante o regime militar; defi-nição de que, humildemente, discor-da. “Eu me defino quase como umprotegido da imprensa brasileira,porque os jornalistas, todos, comexceção de um ou dois do Estadão[jornal O Estado de S. Paulo], erammeus amigos”, afirmou.

No período sombrio vivido peloPaís, igrejas e conventos em SãoPaulo foram transformados pelo re-ligioso em abrigos para os jornalis-tas. Muitos deles, tão logo termina-vam o expediente nas redações, cor-riam para perto do Arcebispo, quelhes dava apoio moral e espiritual.Dom Paulo era uma voz isolada con-tra a ditadura militar. Trinta anos

depois, ele revela que sentia medode ser preso e torturado. “A luta erameio solitária porque todo mundotinha medo, inclusive eu. Eu sem-pre avisava quando saía de casa: Se,em tanto tempo, eu não telefonar,vocês telefonam pra lá (destino) per-guntando se Dom Paulo chegou”.

Mesmo temeroso, o arcebispo foium dos protagonistas do primeirogrande protesto contra a ditaduradesde a promulgação do AI-5, em1968: o ato na Catedral da Sé seisdias após a morte sob tortura do jor-nalista Vladimir Herzog, o Vlado.No dia 31 de outubro de 1975, 8 milpessoas protestaram contra o assas-sinato, ocasião em que Dom Pauloclamou por justiça em sua homilia.

De saúde frágil, principalmentedepois do infarto que sofreu em mar-ço, o lúcido Dom Paulo continua cum-prindo seu papel de sarcedote, de jor-nalista e de grande homem público:celebra missas, escreve artigos, con-cede entrevistas, lê quatro jornais pordia, atende de pessoas mais humil-des a personalidades políticas todasàs quintas-feiras no Convento SãoFrancisco, no Largo São Francisco,Centro de São Paulo, e ainda preten-de visitar a ABI, onde esteve pela últi-ma vez no século passado.

Trinta anos apóstransformar igrejas

e conventos emabrigos parajornalistas

perseguidos,Dom Paulo

Evaristo Arnsrevela que teve

medo de ser presoe torturado e

relembrasua luta em defesa

da imprensa.Ele não sai de casa

sem a suacarteira da ABI.

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Jornal da ABI

10 Setembro/Outubro de 2005

No dia em que o Brasil decidiu man-ter o comércio de armas de fogo, DomPaulo Evaristo Arns chegou de táxi àpequena Capela de São José, das depen-dências do Hospital Geriátrico e deConvalescentes D. Pedro, no Jaçanã,Zona Norte de São Paulo, às 7h50min.Todos os domingos, desde 1998, quan-do o hospital, mantido pela Irmanda-de da Santa Casa, ainda era conhecidocomo “Asilo do Jaçanã”, ele celebramissa no bairro, que se tornou nacio-nalmente conhecido quandoAdoniram Barbosa, em 1964, fez amúsica de maior sucesso do Carnavaldo Rio em 1965, Trem das Onze (“.../Moro em Jaçanã/ Se eu perder essetrem/ Que sai agora/ Às onze horas/Só amanhã de manhã/...)

Os fiéis o recebem de pé e são cum-primentados um a um. Dom Paulo seajoelha diante do altar, de costas para aentrada da capela, e faz uma rápida ora-ção. Veste a batina e inicia a celebração,pontualmente, às 8h, acompanhado deum coro de 11 vozes, sendo quatromasculinas. Ele dedica à missa daquelamanhã ao jornalista “Vlado Herzog,morto pela repressão” e pede a Deus ilu-minação a todos para votarem direito“no que for melhor para o Brasil”. Sem-pre falando na verdade e justiça, aumen-ta a voz: “Rezemos pelo Brasil para quediminua a violência e aumente a soli-dariedade”. Exorta os fiéis a repetiremem voz alta: “Nós amamos o Brasil e atodos os que moram no Brasil”.

Na homilia, clama para que acabem“as lutas nos campos de futebol” e paraque “a gripe aviária não chegue ao Bra-sil”. Nesse instante, diante do altar, vári-os pacientes do hospital, em suas cadei-ras de rodas, acompanham com olharfixo o gesto quase teatral de Dom Paulo.

Às 9h, ele pede a Deus que guie empaz os fiéis para seus lares. Enquantotira a batina numa sala ao lado do al-tar, um grupo de fiéis o aguardava parabeijar-lhe a mão e pedir-lhe bênção. OCardeal e Arcebispo Emérito atende atodos pacientemente, brinca com al-guns internos e deixa a capela às9h15min para votar “sim” no referen-do e descansar, pois no final da tardeiria participar de um grande atoecumênico pela alma de VladimirHerzog, como há 30 anos.

Um ritualdos domingos,no Jaçanã

“Se ele, judeu, morreu; eu,cristão, posso morrer da mesmamaneira pelo povo”.

Com este pensamento, oArcebispo de São Paulo, Dom PauloEvaristo Arns, deixou a Cúria no dia31 de outubro de 1975 para a missapela alma do jornalista VladimirHerzog, o Vlado, na Catedral da Sé,absolutamente decidido a dar a vidapelo povo. Isso, mesmo depois davisita de dois Secretários enviadospelo Governador Paulo EgídioMartins (1975-1979), com a missãode convencê-lo a não comparecer àcerimônia.

A resposta do religioso foirepassada não só ao Governador,como ao Presidente Ernesto Geisel(1974-1978), que naquele diaestava na capital paulista: “Onde aovelha está em perigo, o pastor nãose furta de correr o mesmo perigo.Vou estar lá na catedral ao lado dopovo”.

Após receberem o recado, osenviados do Governo aindatentaram amedrontar o Arcebispo:“Se houver um grito, será umamorte”. Dom Paulo reagiu: “Osjornalistas são muito mais espertos emuito mais humanitários que vocês.Eles têm em cada janela umfotógrafo, que vai documentarquem atirou, de maneira que, emqualquer lugar que vocês atirarem,vai ter um fotógrafo”. A missão deintimidar Dom Paulo foi umfracasso.

“Eu fui pra lá [Catedral da Sé]absolutamente decidido a dar avida pelo povo. Naquele momento,eu não tive um tremor ou qualquercoisa interior ou exterior”.

Seis dias antes da missa, DomPaulo esteve diante do caixão deVlado, que ele conhecia apenasprofissionalmente, como diretor deJornalismo da TV Cultura. Aochegar ao velório, no HospitalAlbert Einstein, amigos o avisaram:“Olha, Dom Paulo, o senhor nãopode fazer pronunciamento. Aqui,eles já avisaram que quem fizerpronunciamento será preso”.

O Arcebispo respondeu queestava ali para rezar e abriu a Bíbliano Livro de Salmos. Ao seaproximar do caixão de Vlado,alguém lhe alertou: “Só pode ser emvoz baixa, não pode ser em vozalta”. D. Paulo rezou quasemurmurando, dois Salmos pelaeternidade do jornalista, pela suafamília e amigos – uns 50 estavamno velório. D. Paulo estavaacompanhado de dois padresmineiros.

Dom Paulo foi à missa de Vladodecidido a dar a vida pelo povo

Estamos diante de Deus, único donoda vida, Senhor da História e esperançados que n’Ele confiam.

1) De fato, Deus é o dono da vida. Nin-guém toca impunemente no homem, quenasceu do coração de Deus, para ser fontede amor em favor dos demais homens.

Desde as primeiras páginas da BíbliaSagrada até a última, Deus faz questãode comunicar constantemente aos ho-mens que é maldito quem mancha suasmãos com o sangue de seu irmão.

Nem as feras do Apocalipse hão decantar vitórias diante de um Deus queconfiou aos homens sua própria obra deamor. A liberdade – repito – a liberdadehumana nos foi confiada como tarefafundamental, para preservarmos, todosjuntos, a vida do nosso irmão, pela qualsomos responsáveis tanto individual quan-to coletivamente.

Jamais poderemos delegar poder algumque vá contra esta disposição de Deus eque vá contra nossa missão histórica.

2) Deus é também o Senhor da Histó-ria. Ao longo de toda a experiência huma-na, incentivou Ele os homens a se unireme a marcharem juntos para construir ummundo de paz, onde os pobres não fos-sem oprimidos e ninguém fosse opressor.

As marchas da História, quando feitaspara unir os homens em favor de todos,sempre tiveram um Deus que caminhas-se à frente deles, como uma coluna defogo durante as noites e como a colunade defesa durante os dias.

O Senhor da História não aceita a vio-lência em fase alguma, como solução deconflitos. Prefere sacrificar o próprioUnigênito para que não morram os de-mais irmãos. No meio da caminhada, ofe-rece-lhes o Decálogo, para os orientar. Eno meio do Decálogo, aparece a ordem,como imperativo inarredável, princípio uni-

Texto da homilia feita pelo Cardeal Dom PauloEvaristo Arns, no culto ecumênico na Catedral daSé, em São Paulo, pelo jornalista Vladimir Herzog

versal, indiscutível: Não matarás. Quemmatar se entregará a si próprio nas mãosdo Senhor da História e não será apenasmaldito na memória dos homens, mastambém no julgamento de Deus.

3) Nosso Deus é um Deus de espe-rança. Acontece facilmente que esquece-mos o nosso Deus, quando achamos quesozinhos resolvemos os problemas. MasEle está aí, na hora do caos, na hora dadesesperança, nos acontecimentos semsaída. Ele se apresenta como Deus da es-perança e da salvação, volta a apontar-nos o caminho da justiça, a caminhadada solidariedade nas sendas da paz.

Justiça que respeite a todos e não pre-judique a ninguém. Justiça que não ex-clua o perdão, se este for o adubo deuma justiça maior. Justiça que possaconsubstanciar-se nas leis, mas que te-nha sua força no interior de cada ho-mem, disposto a dizer a si mesmo e aosoutros: Basta!

É hora de se unirem os que ainda que-rem olhar para os olhos do irmão e aindaquerem ser dignos da luz que desvenda afalsidade. A esperança reside na solidarie-dade. Aquela solidariedade que é capazde sacrificar os egoísmos individuais egrupais no altar de uma Pátria, no altar deum Estado, no altar de uma cidade.

Nesse momento, o Deus da esperan-ça nos conclama para a solidariedade epara a luta pacífica, mas persistente, cres-cente, corajosa, em favor de uma gera-ção que terá como símbolos os filhos deVladimir Herzog, sua esposa e sua mãe.

O Deus da vida, o Deus da História eo Deus da esperança coloca em nossasmãos a missão, exigente mas pacífica,oposta a qualquer arbitrariedade e a qual-quer violência, no que temos em nós dedivino e de mais humano., Construamosa Paz, na Justiça e na Verdade.

Paulo lê sua homilia no ato por Vlado, em outubro de 1975. À dir., o Rabino Sobel.

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É sempre assim nas missas em Jaçanã:fiéis recobrem Dom Paulo com carinho.

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11Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

Na época da ditadura,consta que o senhor abri-gou muitos jornalistas per-seguidos pelo regime naArquidiocese de São Pau-lo. O senhor lembra de al-gum caso especial?D. Paulo – Em um certomomento, a revolução pren-dia a todos por “arrastão”,que era o termo oficial de-les. Quer dizer, eles prendi-am 70, 80, e só então esco-lhiam aqueles que achavamter mais informações de es-querda. Eles costumavamprender em maior númerona sexta-feira à tarde e sába-do pela manhã, porque asautoridades estavam fora dacidade e, assim, ninguém po-dia recorrer a uma autorida-de para ser solto logo.

Prendiam para depois fa-zer a seleção?

D. Paulo – Exatamente, prendiam paradepois fazer a seleção. Mas torturavama todos. Eu soube disso e fui protestarveementemente e para todos os jorna-listas que não tinham sido presos euprocurei um lugar para ficarem. Den-tro dos conventos pusemos alguns; atédentro de conventos de irmãs, que fi-cavam em locais mais resguardados.

Houve casos de jornalistas terem deusar o hábito para escaparem dasperseguições?D. Paulo – Nós não fizemos isso por-que era muito perigoso, pois depois doConcílio nós mesmos não usamos há-bito; se alguém usasse o hábito, a Polí-cia poderia suspeitar.

No caso do jornalista Vladimir Herzog,o senhor tinha contatos com Vladoantes de sua prisão, tortura e morte?D. Paulo – O Vlado era um dos chefesda Televisão Cultura e eu era convidadomuitas vezes a falar [em programas], atéfui um dos sócios-fundadores da emis-sora. E o Vlado, evidentemente, nos re-cebia. Mas nunca chegamos à intimida-de e a conversar, nem mesmo sobre arevolução. De maneira que, quando elefoi morto, eu conhecia o nome dele econhecia a fama dele, e sabia da gravida-de do caso. Agora, eu não pude dizer:“Sou amigo dele e tenho obrigação dedefendê-lo”. Eu o defendi como defendia todo comunista e a toda pessoa queveio me pedir auxílio.

Trinta anos depois da morte deVlado, qual lição que a imprensa bra-sileira deve tirar deste caso?D. Paulo – A imprensa brasileira temrazão de lembrar a vida do Vlado, por-que ele era um homem muito capaz,muito honesto e muito simples, trans-parente.

Qual era a sua função na Editora Abrilno final da década de 1960?D. Paulo – Eu nunca tive função naEditora Abril. Eu fui nomeado comoresponsável pela evangelização ou, di-gamos, pelo trabalho missionário emSão Paulo. Eu visitava toda a imprensa,a Folha, o Estadão, ia para a Editora Abrile diversos õrgãos.

A ABI e o senhor tiveramparticipação decisiva naluta pela democracia noPaís. Quais são as melho-res lembranças que o se-nhor tem daqueles pioresdias vividos pelo Brasil?D. Paulo – As melhoreslembranças são, sem dúvida,a união dos jornalistas e aparticipação de muitos de-les na redemocratização doBrasil. Eu tinha todos os diasna Cúria, ao menos, meiadúzia ou uma dúzia de jor-nalistas, que no fim do ex-pediente me sugeriam ascoisas interessantes a dizerpara o público ou através daimprensa.

Naqueles dias de terror, osenhor se transformou no“anjo da guarda” de mui-tos jornalistas. Como sur-giram essa confiança e oestreito laço entre o senhor e a im-prensa?D. Paulo – Esse laço de confiança vemde longe. Eu sou da ABI muito antes deser bispo. Eu era professor de Teologiaem Petrópolis, Rio de Janeiro, e, então,eu pedi a carteira da ABI para poderdirigir algumas das revistas; eram mui-tas em Petrópolis. Eu dirigi, por exem-plo, o Grande Sinal, o CIC (Comunica-ção Internacional Cristã) e uma sériede outras. Então, eu tive a carteira, quelevo sempre comigo desde aquele tem-po, porque em qualquer lugar onde euvou a carteira da ABI vale mais às ve-zes do que a própria identificação.

Então, seu contato com a ABI é mes-mo de muito tempo, pois o senhorfoi ordenado bispo em 1966.D. Paulo – Muito antes de ser bispo,só que meu nome era Frei Evaristo Arns,em vez de Paulo, que é meu nome debatismo; Evaristo é meu nome religio-so. O interessante é que fui isento [dopagamento das mensalidades da ABI]pelo próprio Barbosa Lima Sobrinhonuma sessão no final da vida dele, por-que eu paguei por mais de 30 anos acota de colaboração para a ABI.

O senhor era muito amigo do jorna-lista Barbosa Lima Sobrinho?D. Paulo – Eu propriamente não pos-so dizer que nós éramos muito amigos.Éramos admiradores um do outro, maseu era mais admirador dele. Um dia, elepediu licença para me visitar e veio aSão Paulo com a esposa à minha casa,passando a tarde comigo. Isso foi em1977, no dia em que eu ganhei o títulode Cidadão de São Paulo, quando Bar-bosa então fez um pequeno discursona cerimônia.

A carteira da ABI assinada por Bar-bosa Lima Sobrinho foi entregue emmãos?D. Paulo – Sim. Esta minha carteirafoi após uma conferência para qual eleme convidou, no Rio de Janeiro. Euproferi a conferência e, ao final, houveuma pequena sessão, e dentro dessa ses-são, ele, com aquela simplicidade, meentregou a carteira isento de qualquercolaboração ou contribuição.

“No momento,a imprensa é oprimeiro poder”

O Cardeal e Arcebispo Emérito deSão Paulo, Dom Paulo Evaristo Arns,aguardava o momento desta entrevista,no dia 27 de outubro, em uma pequenasala na entrada da clausura do Conven-to de São Francisco, no Centro, ondemorou durante muitos anos de sua mo-cidade. Passavam dez minutos das 15h.

A primeira coisaque fez foi tirar dobolso a carteira daABI e mostrar, no do-cumento, a assinatu-ra de Barbosa LimaSobrinho. Disse quequem fosse fazer asperguntas ficassebem próximo dele.“Não estou escutan-do muito bem”, afir-mou bem-humorado.

Aos 84 anos,Dom Paulo, o “anjoda guarda dos jorna-listas”, está mais lú-cido que nunca. Beminformado, lê, todosos dias, quatro jor-nais – pela ordem, Fo-lha de S. Paulo, Esta-dão, Diário de S. Pau-lo e o Agora São Paulo.Lê, também, sema-nalmente, a revistafrancesa La Vie, e acompanha, atenta-mente, o noticiário na tevê.

Ao falar de jornalismo, seus olhos

brilharam e o tom de voz ficou maisforte. “A finalidade do jornalismo é di-fundir a verdade, sem deturpá-la e semcomentá-la. A imprensa não só é o quar-to poder, mas no momento é o primei-ro poder”, disse, levantando as mãos.

Ainda sobre o tema, se mostrou con-trário à obrigatoriedade do diploma para

o exercício da profis-são: “Sou a favor domelhor escritor, e damais verdadeira nar-ração e análise dosfatos na formação doleitor, porque o jor-nalista é que forma oleitor. Eu fui forma-do pelos jornalistas”,acrescentou.

Nesta entrevista,Dom Paulo contou oepisódio em que le-vou para uma fazen-da jornalistas brasi-leiros e estrangeiros,contrários à revolu-ção; relembrou seusprimeiros contatoscom a ABI; avaliou aimprensa brasileirana atualidade e, nofinal, brincou com orepórter-fotográficoAlexandre de Paulo:

“Se alguma foto tiver ficado boa, vocême mande, pois até agora ninguém ti-rou uma foto decente minha”.

Dom Paulo orgulha-se de sua carteirade sócio da ABI, assinada no verso por

Barbosa Lima Sobrinho.

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Jornal da ABI

12 Setembro/Outubro de 2005

PARA AS NOVAS GERAÇÕESSecretarias deEducação do Rioe São Paulodistribuem para osalunos do ensinooficial folheto coma biografia deVladimir Herzog,jornalista mortonuma prisãomilitar em 1975.

ASecretaria de Estadode Educação do Riodistribuiu entre os150 mil alunos da

rede pública de ensino médioum folheto com uma biogra-fia do jornalista VladimirHerzog, cujo assassinato noDoi-Codi de São Paulo com-pletou 30 anos em 25 de ou-tubro. O Prefeito de São Pau-lo, José Serra, também man-dou imprimir o texto e determinou asua distribuição entre os alunos daquinta à oitava séries da rede públicamunicipal. O texto do folheto foi ela-borado pelo jornalista Milton Coelhoda Graça, membro do ConselhoDeliberativo da ABI.

No texto de abertura do folheto,intitulado Uma visão da História parajovens, Cláudio Mendonça, Secretáriode Estado de Educação, e Ricardo Bru-no, Secretário de Estado de Comunica-ção, explicam aos alunos por que resol-veram lançar o projeto Série CartilhasContemporâneas e escolheram iniciá-la com a história de Vladimir Herzog.

Segundo Cláudio e Ricardo, histo-riadores e jornalistas são cronistas damesma realidade e por isso ocorreu-lhes a conveniência de produzir tex-tos sobre a História do País cuja im-portância contemporânea seja facil-mente entendida por estudantes e, aomesmo tempo, lhes sejam atraentes,pelo estilo jornalístico.

Diz o texto assinado pelos Secretá-rios:

“Vladimir Herzog, morto sob tor-tura em 25 de outubro de 1975, pare-ceu-nos o nome ideal para ser o temado primeiro número desta coleção, queserá distribuída a 150 mil estudantesde ensino médio. Ele foi contemporâ-neo da maioria dos pais dos adolescen-tes de hoje e a recordação de sua vida e

morte coloca — para todos nós, maisjovens ou mais velhos — o dever per-manente de defender as liberdades de-mocráticas.

Do ponto de vista pedagógico, o alu-no aprenderá através da interatividadeem sala de aula e o projeto visa aestimulá-lo a trabalhar em grupo e asocializar informações coletadas. Osorientadores serão os professores daárea de Ciências Humanas — Históriae Geografia — que procurarão integrá-los bem como suas comunidades aoprocesso histórico brasileiro, neles de-senvolvendo as capacidades de análisecrítica e de identificação factual. Nes-te processo, compete à escola valori-zar os profissionais do magistério nes-sas áreas e, a estes, valorizar os alunosatravés de suas pesquisas e produções.

Com esse pequeno livro, o alunodeverá ser capaz de conhecer vida, pri-são e morte de Vladimir Herzog e omomento histórico e nacional em queocorreram; identificar e analisar as ide-ologias e os sistemas políticos da épo-ca, no Brasil e no mundo, tendo comoreferência as questões éticas e morais;estender os conhecimentos da geogra-fia humana.

Esperamos que este esforço con-junto das Secretarias de Estado deEducação e de Comunicação do Riode Janeiro tenha o efeito e o sucessomerecidos.”

Além desse papel de dar apoio mo-ral e espiritual aos jornalistas, o se-nhor não tinha a função de obser-var o que ia sair no outro dia paraevitar uma repressão contra o jornal?D. Paulo – Nunca fui encarregado disso.

O senhor teve algum tipo de ingerên-cia direta no jornal da Arquidiocese,O São Paulo (fundado em 1956)?D. Paulo – Eu era encarregado de tudoque saísse no jornal O São Paulo. Eu fi-gurava como diretor, nos anos de 68,69 e 70. Naquele tempo, eu já era indi-cado como diretor, junto com DomLafaiete, que era o vigário-geral. Eu eradepois dele.

O São Paulo tinha alguma linha edito-rial comunista, além da linha cristã?D. Paulo – Não tinha absolutamentenenhuma ideologia. O Cardeal [DomAgnello] Rossi eraa n t i c o m u n i s t aconfesso e conhe-cido em toda a ci-dade.

Como o senhordefine o seu papeldiante da impren-sa nos últimos 30anos?D. Paulo – Quan-do eu assumi comoarcebispo, nomeeiD. Lucas MoreiraNeves como meurepresentante jun-to aos jornalistas.Ele reunia todas assemanas um peque-no grupo, e todomês fazia um gran-de grupo comigo. Discutiamos os pro-blemas do dia-a-dia, não ideológicos.Agora, houve uma só vez em que eu le-vei os jornalistas para uma fazenda nointerior. Só levamos jornalistas queeram contra a revolução, os que com-batiam a revolução, tanto jornalistasestrangeiros como brasileiros. Quandochegamos ao lugar, eu pedi que todosdesligassem os aparelhos para que nóspudéssemos falar livremente, cada qualdizendo aquilo que pensava. Era jorna-lista dizendo para mim aquilo que eu

VLADOA HISTÓRIA DE

podia ter feito ou fiz de errado. Assim,passamos uma tarde inteira no interi-or de uma fazenda, que eu não sei ondefica, porque andamos por tantos cami-nhos para que ninguém guardasse o lu-gar onde estivemos.

Qual foi o resultado prático dessaconversa?D. Paulo – Foi a confiança mútua en-tre mim e eles. Observei que muitasvezes os jornalistas estrangeiros sabi-am mais coisas que os jornalistas brasi-leiros.

O senhor chegou a convencer algumjornalista de que a revolução era justa?D. Paulo – Não discutimos ideologia,discutimos justiça para todo mundo,para os pobres, para os operários etc,mas não discutimos comunismo, capi-talismo ou qualquer coisa assim.

Então, o senhorse define como o“anjo de guarda”dos jornalistasbrasileiros?D. Paulo – Não,não. Eu me definoquase como prote-gido da imprensabrasileira, porqueos jornalistas, to-dos, sem exceção,ou com exceção deum ou dois doEstadão, eram meusamigos.

Como o senhoravalia hoje a atu-ação da imprensabrasileira?

D. Paulo – Avalio como sendo muitoimportante e, talvez, até decisiva.

No momento de crise do GovernoLula, do “mensalão” e outras denún-cias, o senhor acha que a imprensaestá atuando com isenção?D. Paulo – A imprensa não tem outraintenção a não ser a de informar o má-ximo possível, e até agora poucas vezesela foi desmentida, porque realmentefoi ela que trouxe os fatos mais impor-tantes à luz do dia.

Um mês antes de morrer, Vlado exibia sua faceserena, como nesta foto para o seu passaporte.

“Eu o defendi como defendi a todo comunistae a toda pessoa que veio me pedir auxílio.”

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13Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

HOMENAGEM

Criado pelo idealismo do jornalistaCriado pelo idealismo do jornalistaCriado pelo idealismo do jornalistaCriado pelo idealismo do jornalistaCriado pelo idealismo do jornalista

JoJoJoJoJouuuuurdan Amora e mantido pela suardan Amora e mantido pela suardan Amora e mantido pela suardan Amora e mantido pela suardan Amora e mantido pela sua

obstinação, o Centro de Pobstinação, o Centro de Pobstinação, o Centro de Pobstinação, o Centro de Pobstinação, o Centro de Pesquisa eesquisa eesquisa eesquisa eesquisa e

Preservação da Memória da ImprensaPreservação da Memória da ImprensaPreservação da Memória da ImprensaPreservação da Memória da ImprensaPreservação da Memória da Imprensa

Brasileira, sediado em Niterói, temBrasileira, sediado em Niterói, temBrasileira, sediado em Niterói, temBrasileira, sediado em Niterói, temBrasileira, sediado em Niterói, tem

um acervo invejável sobre a evoluçãoum acervo invejável sobre a evoluçãoum acervo invejável sobre a evoluçãoum acervo invejável sobre a evoluçãoum acervo invejável sobre a evolução

editorial e tecnológica dos veículoseditorial e tecnológica dos veículoseditorial e tecnológica dos veículoseditorial e tecnológica dos veículoseditorial e tecnológica dos veículos

impressos no Pimpressos no Pimpressos no Pimpressos no Pimpressos no País.aís.aís.aís.aís.

A MORTE DEA seguir reproduzimos,

na íntegra, o texto do

jornalista Milton CoelhoMilton CoelhoMilton CoelhoMilton CoelhoMilton Coelho

da Graçada Graçada Graçada Graçada Graça para o folheto

da SEE. A pesquisa sobre

a vida de Vladimir Herzog

também é de sua autoria.

Os títulos são do original.

Na página 29, a homenagem da Associação Bra-sileira de Jornalismo Investigativo-Abraji a VladimirHerzog e Tim Lopes.

Vladimir Herzog nasceu em 1937,na cidade sérvia de Osijsk, filho

de um casal de judeus, Zigmund e ZoraHerzog, que emigrou para o Brasil fu-gindo do nazismo.

Professor da Universidade de SãoPaulo, Vladimir era um dos mais respei-tados profissionais da imprensa paulistaquando, em 1975, com 38 anos de ida-de, assumiu a Direção de Jornalismo daTV Cultura. Era casado com ClariceHerzog e o casal tinha dois filhos.

Em 24 de outubro, trabalhava nor-malmente no início da noite quando aportaria da emissora lhe informou pelotelefone interno que “uns policiais es-tavam procurando por ele”.

O Brasil vivia desde 1964 uma dita-dura militar e Vlado — seu apelido paraa família e para os amigos — era umdefensor das liberdades de pensamen-to e expressão, de um governo eleitopelo povo e de maior justiça social. Enão se limitava apenas a dizer isso aamigos e companheiros de trabalho.Fazia parte de um grupo clandestinode jornalistas que também lutavam poresses objetivos.

Vlado já sabia que a polícia e os mili-tares responsáveis pela repressão polí-tica estavam prendendo muitos estu-dantes e jornalistas, seus amigos e com-panheiros. Mas resolveu não mudar suarotina de vida e tinha ido trabalhar nohorário de sempre.

Dirigentes da TV Cultura foram comele até o portão da emissora para expli-car aos policiais que Vlado era respon-sável pelo jornal da noite e não pode-ria se ausentar naquele momento. Ospoliciais alegaram que queriam apenasalgumas informações, “ninguém deviase preocupar, não era prisão”. E, depoisde muita conversa e telefonemas dosdois lados, entregaram uma intimaçãopara que Vlado comparecesse no diaseguinte, pela manhã, ao prédio da RuaTutóia, onde funcionava o Doi-Codi,órgão que comandava o terror contraos adversários políticos da ditadura.Vlado foi sozinho, depois de convencera família de que nada havia a temer, por-que o entendimento da véspera fora fei-

to diante de muitas teste-munhas e, por isso, os mili-tares responsáveis peloDoi-Codi não ousariam fa-zer nenhuma violência.Mas ele não sabia que to-dos os presos estavam sen-do torturados e alguns já ohaviam apontado comocompanheiro de luta clan-destina.

Pouco mais de uma horadepois, Vlado estava sendoespancado para confessar.Pelo menos dois outros pre-sos podiam ouvir, numacela próxima, como ele, co-rajosamente, resistia atodo tipo de violência dosdois torturadores, um de-les conhecido pelocodinome “Naval”. Em certo momen-to, eles enfiaram uma bola de sal naboca de Vlado, curvando-o para trás.Esse é um tipo de tortura que começoua ser usado pelos pára-quedistas fran-ceses durante a guerra de independên-cia dos argelinos. A bola vai para a gar-ganta e a idéia é provocar a sensação deasfixia. Mas no caso de Vlado não fi-cou apenas na sensação. Vlado morreu,assassinado.

O Brasil vivia em um regime demo- crático, com os poderes Executi-

vo, Legislativo e Judiciário funcionandonormalmente segundo a Constituiçãoaprovada por uma Assembléia Nacional,livremente eleita pelo povo em 1946.

Mas os militares, alegando que opresidente João Goulart estava sob in-fluência esquerdista e sob a influên-cia da política externa dos EstadosUnidos de confronto com os países co-munistas, derrubaram o Governo, pra-ticamente sem resistência, no dia 1ºde abril de 1964.

Assumiu como presidente o GeneralCastelo Branco, que procurou manter

O Brasil de nossoherói Vlado

Farsa econfissão

as instituições políticas do país e res-taurar gradualmente as liberdades civis.Seu sucessor, General Costa e Silva,mostrou-se inclinado a concordar comesses objetivos, especialmente depoisque uma passeata no Rio de Janeiro mo-bilizou mais de 100 mil pessoas — qua-se todos jovens — em clara demonstra-ção de que o povo brasileiro queria oretorno da legalidade constitucional.

Mas a pressão dos generais mais radi-cais era no sentido contrário e, quandoCosta e Silva sofreu um derrame e mor-reu, instalou-se uma Junta Militar, queeditou o Ato Institucional número 5, emdezembro de 1968, suspendendo todosos direitos democráticos e instaurandouma ditadura militar sem limites.

Começa, então, com o GovernoMédici um dos períodos mais negros dahistória do Brasil. Alguns grupos se for-maram para organizar uma resistênciaarmada à ditadura, mas foram sendo di-zimados sob a maior violência. Milita-res brasileiros foram treinados nas téc-nicas mais modernas e brutais de tortu-ra, usadas para obrigar prisioneiros a re-velar nomes, esconderijos etc.

Em 1974, a luta armada praticamen-te havia deixado de existir. E a ditadu-ra, que havia mantido eleiçõeslegislativas como uma máscara de lega-

lidade, mesmo com todas as costumei-ras formas de controle e intimidação,sofreu grande derrota.

O foco da repressão voltou-se entãocontra o Partido Comunista Brasileiro,que também era ilegal mas não partici-pava da resistência armada, por acredi-tar que seria possível obrigar os milita-res a deixar o poder através da pressãopolítica. Os militares radicais declara-ram, então, guerra total ao PCB. Onzede seus líderes foram caçados e desapa-receram. E seus militantes nas fábricas,imprensa, universidade e profissões li-berais foram sendo sistematicamenteidentificados e presos.

Vlado foi uma das vítimas dessa per-seguição. Mas sua morte não foi emvão, tornou-se elemento decisivo paraa desmoralização da repressão políticae a desmontagem do Doi-Codi, abrin-do caminho para a redemocratizaçãodo país, com a luta pelas eleições dire-tas, a vitória de Tancredo Neves na elei-ção indireta e a posse do primeiro Pre-sidente civil em 20 anos — José Sarney.

A mais evidente confissão de culpae desrespeito às leis e a opinião pú-

blica do País foi dada pelo Comandan-te do II Exército e pelo próprio Minis-tro da Guerra, ao tentarem encobrir ocrime com a escandalosamente falsaversão de que Vlado havia se enforca-do com o cinto. A fotografia de umacena forjada, com o corpo do jornalis-ta pendurado na grade da cela, foi dis-tribuída a toda a imprensa. Um médicolegista, Harry Shibata (mais tarde ex-pulso da profissão), aceitou o triste pa-pel de assinar um atestado mentiroso.

A família de Herzog iniciou e ven-ceu um processo contra a União, mas avitória política de Vlado — como a deTiradentes — chegou antes da Justiça.Os testemunhos dos jornalistas GeorgeDuque Estrada e Rodolfo Konder ini-ciaram a desmontagem da farsa. E oMinistro Silvio Frota acabou demiti-do ao procurar esconder um novo as-sassinato nos porões do Doi –Codi,quase três meses depois — desta vez avítima foi o operário Manuel Fiel Fi-lho, estrangulado barbaramente por tersido “acusado” de distribuir um jornalentre seus companheiros de fábrica.

A censura à imprensa foi suspensa,em janeiro de 1976, primeiro passo deum processo de reconquista da demo-cracia, cujo herói maior foi VladimirHerzog.

UM HERÓICapa do opúsculo da

Secretaria de Educação doEstado do Rio, com tiragem

de 150 mil exemplares. OPrefeito José Serra adotou-

a nas escolas paulistas.

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Jornal da ABI

14 Setembro/Outubro de 2005

DEPOIMENTO

“Ainda estou por fazerminha grande matéria”

José Hamilton Ribeiro

Jornal da ABI — A guerra doVietnã, que o senhor cobriupela revista Realidade, em1968, foi o fato mais marcan-te dos seus 50 anos de car-reira profissional?José Hamilton RibeiroJosé Hamilton RibeiroJosé Hamilton RibeiroJosé Hamilton RibeiroJosé Hamilton Ribeiro —A reportagem da guerra doVietnã foi a mais marcante doponto de vista anatômico.Mesmo assim, sucederam-semomentos de alegria e re-gozijo, entre uma tristezae outra.

Jornal da ABI — Qualdeve ser o comporta-mento do repórternum campo de bata-lha?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton —Ser repórter é estar deolho aberto e consci-ente de sua missão de

denunciar o abuso,o preconceito, aatrocidade, a vi-olência e o po-

der mal-utilizado, seja no campo de bata-lha, ou na vidinha mais ou menos de cadaum de nós.

Jornal da ABI — Como aconteceu seuacidente no Vietnã?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — O livro Diário da guer-ra, que acabei de lançar pela Editora Objeti-va (RJ), trata disso. Contém um “diário” daguerra, do ano de 1968, e um capítulo novo,referente à viagem de volta que fiz aoVietnã, há nove anos, num ambiente de paz.O que aquele povo heróico, que venceu osnorte-americanos, fez com o seu país é dedoer. Doeu mais do que o estrago da mina.

Jornal da ABI — Havia outros jornalistascom o senhor no momento da explosão?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Sim, o fotógrafo japo-nês Kei Shimamoto. Ele ficou ao meu ladonos dias dolorosos que passei nos hospitaisde guerra. Shimamoto vinha trabalhar noBrasil assim que terminasse a coberturaque fazia no Vietnã para uma publicaçãojaponesa. Mas não deu tempo. O helicóp-tero em que viajava foi alvejado, duranteuma ação, e explodiu no ar. InfelizmenteKei Shimamoto virou apenas uma página

Aos 70 anos de idade e 50 de profissão, ele é considerado uma

referência do jornalismo brasileiro. Mesmo que isto seja

atestado por sete Prêmios Esso de Reportagem, sua ambição é

fazer uma reportagem que ainda não realizou.

Paulista de Santa Rosa do Viterbo, 70 anosde idade e 50 de profissão, José HamiltonRibeiro se considera um repórter por voca-ção. Por causa de sua obstinação pela notí-cia, foi muito premiado, acumulando, entreoutros troféus, sete Esso de Reportagem, oPrêmio Personalidade da Comunicação1999 e o título de “rosto do jornalismo bra-sileiro”, conferido pela revista Ícaro no anopassado.

Em sua eterna missão de informar, ZéHamilton — como costuma ser trata-

do pelos colegas — conheceu os hor-

rores da guerra do Vietnã, onde perdeu umaperna num acidente com uma mina terres-tre, em 1968. Seu trabalho nas redações dasrevistas Realidade e Quatro Rodas, na Folhade S. Paulo e nos programas Globo Repórter,Fantástico e Globo Rural, em que há 25 anosexerce as funções de repórter e editor, otransformou numa referência do jornalis-mo brasileiro.

Nesta entrevista, ele fala da qualidade dojornalismo no País, de sua experiência naguerra e dos livros que escreveu e afirmaque ainda está atrás da sua grande matéria.

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����� entrevista a José Reinaldo Marques

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15Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

no livro norte-americano Réquiem, que con-ta a história dos repórteres-fotográficos quemorreram no front.

Jornal da ABI — O que o senhor acha dadecisão do Governo Bush de tentar proi-bir a mídia norte-americana de mostrarimagens dos seus soldados mortos noIraque, bem como da devastaçãoprovocada pelo furacão Katrina, em NovaOrleans?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Sou contra tudo o quefor proibição do trabalho da imprensa.

Jornal da ABI — Não é estranho que essecontrole ocorra numa nação tida comodemocrática?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — O jornalismo livre eindependente é uma dádiva e umparâmetro da democracia — di-ferentemente da ditadura, emque o produto final da imprensafigura como um aleijão. Um ve-lho professor de Jornalismo di-zia que os três piores jornais domundo — Pravda (da antigaUnião Soviética), Gramma (deCuba) e L’Osservatore Romano(do Vaticano) — eram fruto deditaduras. Conclusão: onde setenta controlar a imprensa, nãohá democracia.

Jornal da ABI — Recentemen-te, o Presidente Lula disse que fazia opapel de “rádio peão”, porque a maio-ria do povo não lê jornal. O senhor con-corda?José Hamilton — José Hamilton — José Hamilton — José Hamilton — José Hamilton — Infelizmente, está cor-reto. O País tem mais de 100 milhões depessoas semi-analfabetas e outros tantosanalfabetos por inteiro. O jeito de mudarisso é investir em escola de ensino básico enão apenas na universidade, como faz o Go-verno.

Jornal da ABI — Depois que foi eleito Pre-sidente da República, Lula tem reclama-do muito da imprensa...José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Não adianta xingar aimprensa. Quando ele fez birra para com-prar o avião novo, eu ouvi o Brizola dizerna televisão: “Mas, companheiro Lula, com-prar avião? Logo você, que em um ano emeio de Governo não fez uma sala de aula?”

Jornal da ABI — Como o senhor iniciousua carreira jornalística?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Dos meus 50 anos dereportagem, 25 foram atuando no jornalis-mo impresso, tanto em jornal como em re-vista. A outra metade eu tenho passado naTV, grande parte desse tempo trabalhandono programa Globo Rural, da Rede Globo.Mas comecei na Rádio Bandeirantes, emSão Paulo.

Jornal da ABI — Que outra profissão osenhor teria escolhido se não tivesseabraçado a carreira jornalística?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — O jornalismo de repor-tagem é vocação impositiva. Se eu fosse fa-zer outra coisa, na certa não seria feliz.

Jornal da ABI — Em outubro, o senhor

participa de um Congresso na ABI sobrejornalismo investigativo. Qual será suaabordagem sobre o tema?José Hamilton — Vou fazer um balanço daminha vida de jornalista, com o cuidado denão balançar muito para ninguém marear.

Jornal da ABI — O senhor acha que aimprensa brasileira — como escreveu ojornalista Sérgio Augusto num artigo parao Estado de S. Paulo — sofre de uma cri-se de qualidade?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — O jornalismo brasilei-ro não passa por um bom momento e não épor falta de bons jornalistas e projetos dereportagem de qualidade. Acho que a causareside na gestão das empresas, muitas delasenroladas com investimentos temeráriosfora de sua área.

Jornal da ABI — Quem são os grandesjornalistas da sua geração?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Narciso Kalili, EuricoAndrade, João Antônio, Hamilton AlmeidaJr., Evandro Carlos de Andrade e CláudioAbramo. Citei somente os que já morreram.Do contrário, a relação seria longa demais.

Jornal da ABI — Em todo o País pessoastêm recorrido à Justiça para ameaçar comprocessos órgãos de imprensa e jornalis-tas por causa de matérias pelas quais sesentem ofendidos. Qual a sua opiniãosobre esse assunto?José Hamilton — É justo e saudável quepessoas atingidas pela imprensa recorram àJustiça para reparar danos causados por in-justiça, injúria, calúnia, difamação. O mauuso da liberdade de imprensa pode fazermuito mal à sociedade. E mais: não deviahaver prisão especial para jornalista. Con-

denado num processo regular, com todo odireito de defesa, ele deve sim ir beber caféde canequinha.

Jornal da ABI — Por que o senhor é umdefensor de altos salários para parlamen-tares?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Porque o deputado fe-deral e o senador, ao lado do Presidente daRepública, são as maiores autoridades doPaís. Precisam ganhar o suficiente para exer-cer o mandato sem pressão de nenhumaordem. Quando eles não ganham o sufici-ente, são tentados a arranjar meios — comomensalão, mensalinho, valeriodutos, caixadois etc. — para não terminarem o manda-to na miséria.

Jornal da ABI — O seu livro Jornalistas,37/97 é um resgate da história do sindica-lismo no Estado de São Paulo?José Hamilton — Esse livro não é exata-mente sobre sindicalismo. É uma publica-ção que reflete sobre a história da imprensaao longo dos 60 anos de existência do Sin-dicato dos Jornalistas de São Paulo (funda-do em 1937) mais sob o ponto de vista dosprofissionais da área do que pela represen-tação sindical.

Jornal da ABI — Quantos livros o senhorjá escreveu?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Se me lembro bem, são14, e todos eles foram conseqüência de al-guma reportagem. O primeiro, O gosto daguerra, aconteceu em função da reportagemsobre a guerra do Vietnã que eu fiz para arevista Realidade. O segundo teve comotema uma cobertura que fiz sobre o Panta-nal. Meus livros são o resultado de pesqui-sas para matérias especiais.

Jornal da ABI — O senhor está envolvidoem algum outro projeto de livro no mo-mento?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — Estou terminando ago-ra um livro sobre música caipira, com umaseleção das 260 melhores modas de viola detodos os tempos, de Raul Torres às IrmãsGalvão, de Carreirinho a Rolando Boldrin.O prefácio é do Cícero Sandroni, escritor ejornalista carioca, ex-diretor da ABI e atu-almente membro da Academia Brasileirade Letras. A matéria-prima é coisa fina, va-mos ver a obra.

Jornal da ABI — Qual é a principal carac-terística de um programa como o GloboRural, dirigido ao telespectador cuja vidaé o campo?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — É fundamental que elenão seja um programa agrotécnico, masque, ao mesmo tempo, cubra o mundo dequem vive na roça, abordando aspectoscomo trabalho, angústia existencial, polí-tica, culinária, dança, cultura e diversão. Éum programa cuja dimensão é a alma hu-mana.

Jornal da ABI — O senhor já pensou emse aposentar ou o espírito de repórtercontinua prevalecendo?José HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé HamiltonJosé Hamilton — A minha grande maté-ria no Globo Rural é aquela que ainda voufazer.

“O jornalismolivre eindependenteé umadádiva e umparâmetro dademocracia.”

Zé Hamilton preservainvejável agilidade: atende

a convites para fazerpalestras (acima) e

participar de debates, semdescurar de seus encargos

como repórter de campodo Globo Rural, que o

levam a diferentes pontosdo País para trabalhos (ao

lado) que exigemdisciplina e paciência –

ele as tem de sobra.

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Jornal da ABI

18 Setembro/Outubro de 2005

VITÓRIA

Jornalista e professor, ti-tular da Escola de Comu-nicação Social da Universi-dade Federal do Rio de Ja-neiro, Muniz Sodré foi cau-teloso após ser convidadopara assumir a direção daBiblioteca. Ele considerouprematuro fazer qualquerprognóstico sobre comoserá sua atuação na Presi-dência da BN, mas adian-tou que assumiria sem re-ceio de encarar os proble-mas que a instituição vemenfrentando:

— Sei que há dificulda-des – disse. – Não me gabode ser o melhor dos ges-tores, mas minha experiên-cia na direção da TV Educativa e da Es-cola de Comunicação Social da UFRJ vaicontar. Posso garantir que qualquer irre-gularidade na Biblioteca Nacional vai sersanada.

Entre as muitas irregularidades denun-ciadas pelos funcionários da BibliotecaNacional constam infiltrações nos arma-zéns onde ficam guardadas as obras ra-ras e a situação dos 35 mil livros catalo-gados e tratados tecnicamente, mas nãodisponíveis para os usuários.

Muniz Sodré afirma que uma dasmarcas da sua administração será to-mar uma posição em relação à políticade livros — investindo na preservação eincentivando a leitura — e prometeu queuma de suas primeiras medidas seriaprocurar os funcionários da BN para umdiálogo. Sua esperança é resolver os pro-blemas o mais rapidamente possível, “atéporque o mandato é curto”.

— Eu não dependo decargo, mas fui convidadoe aceitei. Em geral, quandohá reclamação, há proce-dência. Por isso, como souum baiano com a cabeçaaberta, vou ouvir os fun-cionários e tentar pacificara Casa.

O Presidente da Asso-ciação dos Funcionários daBN, Rutônio Sant’Ana, dizque os servidores recebe-ram bem a indicação:

— O Muniz Sodré é umapessoa conceituadíssima.De início, assim que ele to-mar posse, vamos procurá-lo para uma conversa emque, de imediato, quere-

mos tratar da preservação e conserva-ção do acervo, das obras de infra-estru-tura e do plano de carreira.

Muniz Sodré substitui o bibliófilo emarchand Pedro Corrêa do Lago, quepediu demissão do cargo em meio auma auditoria de uma comissão forma-da pela Controladoria-Geral da União,o Ministério Público, a Polícia Federal eo Ministério da Cultura, para apurar de-núncias de irregularidades na sua ges-tão, como o sumiço de 150 fotos histó-ricas do Brasil do século XIX, ocorridoem julho deste ano.

Corrêa do Lago ocupava a Presidên-cia da Biblioteca Nacional desde o iníciodo Governo Lula. Na noite de 6 de ou-tubro, alegando que necessitaria deixaro cargo por problemas pessoais, pediuexoneração em carta enviada ao Minis-tro da Cultura, Gilberto Gil, que a acei-tou, mesmo estando na Europa.

A BIBLIOTECA EM FESTAServidores da BibliotecaNacional soltaramfoguetes peladerrubada de PedroCorrêa do Lago, omarchand acusado dedilapidar o patrimônioda instituição.

A saída de Pedro Corrêa do Lago daPresidência da Biblioteca Nacional foicomemorada no dia 20 de outubro nasescadarias do prédio da instituição, naAvenida Rio Branco, no Centro do Rio,por iniciativa dos funcionários, quefestejaram a sua exoneração, reclama-da em campanha dos servidores quese estendeu por três anos. O movimen-

to foi apoiadopela ABI, em ra-zão dos danoscausados pelagestão de Corrêado Lago a um dosmais valiososacervos da Bi-blioteca: suas co-leções de perió-dicos, essenciaispara o conheci-mento da Histó-ria do País.

A manifesta-ção começou demanhã e se es-tendeu até o iní-

cio da tarde. Durante o ato, os servido-res enfeitaram a entrada da sede da BNcom bolas, cartazes e faixas — com osdizeres “Vitória: adeus, Pedro Corrêado Lago” e “Fora, diretores da BN” —,partiram um bolo e soltaram fogos deartifício. Jorge Paixão, representantedos funcionários da BN no Núcleo deBase do Sindicato dos Trabalhadores doServiço Público Federal no Estado doRio de Janeiro-Sintrasef, explicou a co-memoração:

— Durante três anos acalentamos asaída do Pedro Corrêa do Lago, por issodecidimos em assembléia que este fatodeveria ser comemorado com festa.Estamos aqui com toda essa alegria,mas lembrando também que os pro-blemas ainda não acabaram, porquequeremos que toda a Diretoria que oacompanhou seja também exonerada.Como servidores, temos o dever de to-mar conta do patrimônio público e de-nunciar os maus-tratos ao acervo daBiblioteca Nacional, que é o oitavomaior do mundo.

As bibliotecárias Maria Lúcia Gua-raná e Vanda Santana, ambas há maisde 20 anos trabalhando na BN, na se-ção de Obras Gerais, disseram estarcontentes com a saída de Corrêa do La-go. Maria Lúcia falou ainda sobre a ex-pectativa de uma boa administraçãodo Professor Muniz Sodré, no dia se-guinte anunciado oficialmente como

o novo Presidente da BN: — Espera-mos que ele seja muito feliz na admi-nistração da BN, pois o setor de ObrasGerais sofre com a falta de manuten-ção. É um grande risco, porque temossob a nossa responsabilidade cerca de 3milhões de livros, que ocupam seis an-dares do prédio.

Sua colega Vanda espera tambémque a instituição retome seu prestí-gio:— A estrela da BN tem que voltara brilhar. A Casa está-se deteriorando,mas precisa recuperar o seu status.

EsperançaOs servidores da BN demonstraram

depositar muita confiança em MunizSodré. Os comentários eram de quesua nomeação é bem-vinda e da expec-tativa de que, ao assumir o cargo, acei-tasse logo o convite para um diálogo,com o propósito de uma rápida im-plementação de mudanças:

— Não haverá uma real correção doserros administrativos que vinhamocorrendo na BN se não houver umamudança profunda de mentalidade degestão — disse Sílvio Gonçalves, tam-bém coordenador do Núcleo de Basedo Sintrasef.

O Presidente da Associação dos Fun-cionários da Biblioteca Nacional, Ru-tônio Sant’Ana, disse que tal reformu-lação é uma esperança de todo o corpofuncional da instituição:— Nossa ex-pectativa é que o Muniz Sodré come-ce com calma, pois o clima dentro daBiblioteca ainda está muito pesado.Apoiamos sua indicação e queremosdialogar com ele sobre a situação ge-ral, pois nosso principal objetivo é quea BN volte a ser o que era antes da ad-ministração do Pedro Corrêa do Lago,quando os interesses privados estive-ram acima do interesse público.

Um baiano de cabeça aberta

– Posso garantir quequalquer irregularidade

na Biblioteca será sanada,promete Muniz Sodré.

Gonçalves (à esq., no alto) e Rutônio, Presidente da Associação dos Funcionários, defendem nova mentalidade na gestão da biblioteca.

Paixão: Temos odever de proteger

o acervo da BN.

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19Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

LIBERDADE DE IMPRENSA

A ABI manifestou solidariedade aoSindicato dos Jornalistas de Rondôniapela defesa dos jornalistas agredidos nasede de uma delegacia de Porto Velho,capital do Estado. No ofício, a ABIapóia “todas as iniciativas que visem àidentificação dos autores das violên-cias e sua responsabilização adminis-trativa e penal”.

Em nota oficial, o Presidente do Sin-dicato dos Jornalistas Profissionais deRondônia, Marco Antônio Grutzma-cher, escreveu: “Repudiamos veemen-temente as agressões contra profissio-nais de imprensa no desempenho desuas funções.” Ele pede também pro-

Jornalistas agredidos em Rondônia

Na madrugada do dia 8 de se-tembro, um incêndio des-truiu 80% do prédio ondefuncionam o jornal Diá-rio de Marília e as rádiosDiário FM e Dirceu AM,do grupo paulista CMN(Central Marília Notíci-as). De acordo com informa-ções publicadas no Diário, a Po-lícia Civil considerou a hipótese de aten-tado em razão da linha editorial do jor-nal, que criticava a política local.

O crime aconteceu por volta das2h30, quando o vigia Sérgio Silva deAraújo, único funcionário na empre-sa naquele momento, foi rendido eagredido por três homens encapuzados.A quadrilha, que carregava galões degasolina para incendiar o prédio, teria

TERRORISMO EM MARÍLIAInimigos do Diário de Marília contratam incendiários para tentar silenciá-lo.

anunciado um assalto; no en-tanto nada foi levado.

Salas e equipamentosforam atingidos pelo in-cêndio, principalmenteos estúdios das rádios e a

Redação do jornal, que nodia do incêndio funcionou

improvisadamente comequipamentos pessoais em-

prestados pelos funcionários. A equi-pe de jornalismo produziu a edição quecirculou no dia seguinte com detalhessobre o atentado criminoso, que desen-cadeou protestos da população local ede entidades da classe jornalística, co-mo a ABI e a Associação Nacional deJornais.

O Presidente da Comissão de Liber-dade de Imprensa e Direitos Humanos

A Polícia prendeu dois suspeitos deterem provocado o incêndio: o funcio-nário público Carlos Roberto Valdenebreda Silva, empregado da Companhia deDesenvolvimento de Marília-Codemar,e Amaury Campoy, que foi preso antese o denunciou. O Delegado RobertoTerraz, que investigava a relação entrea Codemar e o atentado, informou queValdenebre da Silva, que tem antece-dentes criminais, negou todas as acusa-ções. Para o delegado, uma pessoa coma ficha de Valdenebre jamais poderia tra-balhar num órgão público.

Matéria divulgada no site do jornalDiário de Marília apontou Bruno Gau-dêncio Coércio, de 22 anos, como a pes-soa que contratou os responsáveis peloatentado contra o jornal e as rádios Diá-rio FM e Dirceu AM. De acordo com areportagem, Bruno, que estava foragi-do, é ex-assessor parlamentar do Depu-tado estadual Vinícius Camarinha e fi-lho do comerciante Carlos Coércio, oGuru, que foi sócio de Vinícius e, quan-do o pai deste, Abelardo Camarinha, eraPrefeito, ocupou a vice-presidência doórgão municipal Emdurb. Segundo oDiário, o envolvimento de Bruno Gau-

UM SUSPEITO FORAGIDO

A violência contra o Diário de Marília foi repudiada também pelo Presidentedo Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, jornalista ArnaldoNiskier, que pediu à ABI, em ofício datado de 12 de setembro, que “preste todoo apoio possível às instituições que foram alvo desta violência”. Niskier, que ésócio remido da ABI, diz em seu ofício:

“Ao ter notícia do ataque e incêndio às instalações do jornal Diário de Maríliae das rádios Dirceu AM e Diário FM, bem como da prisão de pessoa que alegouter recebido valores para praticar estes crimes, o Conselho de ComunicaçãoSocial do Congresso Nacional deliberou, na reunião plenária de 12 de setembrode 2005, encaminhar a presente moção de apoio às vítimas desse violentoatentado à liberdade de manifestação do pensamento, da criação, da expressãoe da informação, assegurada em nossa Constituição Federal em seu art. 220.

Solicitamos à Associação em apreço que preste todo o apoio possível àsinstituições que foram alvo desta violência, bem como aos órgãos públicosenvolvidos na apuração do caso e punição dos responsáveis – sobretudodaqueles que foram os mandantes do crime. Atenciosamente (a) Arnaldo Niskier,Presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional.”

NISKIER CONDENA

e Vice-Presidente da ABI, AudálioDantas, exigiu, em nota, rapidez e ri-gor na apuração dos fatos:

“A Associação Brasileira de Impren-sa manifesta profunda preocupação emface do atentado praticado na madru-gada de ontem contra o Diário de Marí-lia e as rádios Dirceu AM e Diário FM,da cidade de Marília, SP. Numa ação quelembra os atentados terroristas pratica-dos durante a ditadura militar contraórgãos de comunicação, três homensencapuzados e armados invadiram asinstalações do jornal e das emissoras derádio, que foram incendiadas.

Sejam quem forem os autores daação criminosa, a ABI espera que as au-toridades ajam com todo o rigor naapuração dos fatos, com a rapidez queo caso exige.”

dêncio “aproxima ainda mais a investi-gação do ex-prefeito Abelardo Camari-nha, apontado como principal suspeitode ser o mandante do crime”.

A Procuradoria-Geral de Justiça emMarília designou o Promotor José Ben-to Campos Guimarães para acompa-nhar o caso do atentado contra o jor-

Em ofícios enviados à ABI,vereadores de Santos, São Paulo, e deToledo, Paraná, protestaram contra adecisão judicial que vem impondocensura ao jornal A Tribuna emanifestaram preocupação com umpossível arquivamento das ComissõesParlamentares de Inquérito queapuram denúncias de corrupção.

Em seu ofício, o Presidente daCâmara Municipal de Toledo,Winfried Mossinger, comunicou àABI a manifestação do VereadorLeoclides Bisognin, enviada ao SenadoFederal e à Câmara dos Deputados,para que não haja o arquivamentodos trabalhos das CPIs do Mensalãoe dos Correios. A decisão de enviaro expediente ao Congresso Nacionalfoi aprovada em sessão ordinária e odocumento pede, entre outras coisas,que seja afastada a hipótese de um“acordão”, sem que “os culpadossofram a devida punição”.

No comunicado assinado por seuPresidente, Vereador Paulo GomesBarbosa, a Câmara Municipal deSantos informa a ABI sobre a moçãode apoio manifestada ao proprietáriodo jornal A Tribuna, em razão da“equivocada e infeliz decisão judicialque vem impondo verdadeiracensura” ao periódico santista.

A iniciativa partiu de umrequerimento do Vereador BrazAntunes Mattos, referendado pelascolegas Sandra Arantes Felinto eSuely Morgado, e contou com o apoiodos também Vereadores AntonioCarlos Banha Joaquim, Fábio Nunes,Jorge Vieira, José Lascane, ManoelConstantino, Marcelo Del Bosco,Marcus de Rosis e Reinaldo Martins.

Em sua manifestação, os vereadoreschamam a atenção para o fato de que apopulação de Santos vem sendoprivada de informações sobre o desviode dinheiro público e destacam que éobrigação de toda coletividadeprotestar contra tal procedimento daJustiça, que “coloca em risco um dosbens mais preciosos da humanidade:a liberdade de imprensa”.

nal e as rádios. O Promotor — quetambém teve um encontro com o De-legado Seccional Roberto Terraz, res-ponsável pelas investigações — rece-beu da direção das empresas um dossiêcom informações sobre o crime, rela-tório dos danos e as informações obti-das pela sua equipe de reportagem.

SANTOSE TOLEDOPROTESTAM

vidências à Polícia Militar e à Secreta-ria da Segurança e Defesa para investi-gar e punir os excessos relatados, a fimde que não se repitam.

Cinegrafistas da Rondoniagora TVe da Rede TV!, um fotógrafo do jor-nal Diário da Amazônia e alguns re-pórteres acompanhavam o depoi-mento do Sargento Walterci MoreiraLuna — acusado de ser o assassino deClauserindo Ferreira Marforte, fun-cionário da empresa de ônibus Eucaturmorto no dia 1º de outubro. Ao ten-tarem registrar o momento em que osargento deixava a delegacia, os jor-nalistas foram agredidos fisicamente

por policiais militares, protegidospelo Delegado Everaldo Castro Ma-galhães.

Indignado, Marco Antônio decla-rou: — Um absurdo que profissionaisnão sejam somente impedidos de tra-balhar, mas também brutalmente agre-didos sob a alegação da preservação deimagem. Sabemos que o interesse co-letivo se sobrepõe ao pessoal e qual-quer conflito poderia ser discutido noâmbito da Justiça, mas não com o usoda força física.

O ofício da ABIO texto do ofício da ABI, encami-

nhado ao Presidente Marco Antônio,é o seguinte:

“A Associação Brasileira de Impren-sa solidariza-se com esse Sindicato pelaenérgica posição assumida em defesados jornalistas agredidos numa dele-gacia de Polícia dessa capital e apóiatodas as iniciativas que visem à identi-ficação dos autores das violências e suaresponsabilização administrativa epenal. Peço-lhe a gentileza de nos en-viar um relato mais circunstanciadodo episódio, via e-mail ou via postal,de modo que possamos detalhar nossaintervenção junto às autoridades esta-duais e divulgar desde logo a violên-cia, o protesto do Sindicato e a nossasolidariedade no site da ABI. Transmi-ta aos companheiros agredidos o forteabraço de conforto da ABI.”

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Jornal da ABI

20 Setembro/Outubro de 2005

LIBERDADE DE IMPRENSA

Os jornalistas Maurício Azêdo eAudálio Dantas, Presidente e Vice-Pre-sidente da ABI, participaram no dia 28de outubro, em Maceió, do seminárioCensura, nunca mais!”, organizado pelaRepresentação da Casa em Alagoas. Otema principal foi o recrudescimentoda censura no Brasil, principalmente achamada “censura togada”, que vematingindo publicações nacionais e re-gionais em todo o País, além de progra-mas de rádio e televisão.

Aberto pelo jornalista Oswaldo Lei-tão e tendo como mestre-de-cerimô-nias Renan Leahy, âncora da TV Gaze-ta de Alagoas, o evento foi rea-lizado no auditório da Fede-ração das Indústrias e con-tou com a participação dejornalistas, radialistas, pro-motores de Justiça, religi-osos, sindicalistas, advoga-dos e estudantes. Além depalestras, houve a exibição dodocumentário Vlado, 30 anos de-pois, de João Batista de Andrade, queconta o processo de prisão, interrogató-rio e assassinato de Vladimir Herzognas dependências do Doi-Codi de SãoPaulo, em 25 de outubro de 1975.

Maurício Azêdo falou das lutas his-tóricas da ABI contra os regimes auto-ritários ao longo de seus 97 anos, lem-

A censura em debate em Alagoasbrando que a entidade continua aten-ta às violações dos direitos fundamen-tais da pessoa humana e protestandocontra qualquer tipo de cerceamentode informação. “Se a censura já é terrí-vel nos tempos de ditadura, nos tem-pos de democracia, então, ela é inad-missível”, declarou, assegurando oapoio da ABI a todos os profissionaisde comunicação que forem atingidospor atos de truculência jurídica.

Audálio Dantas, por sua vez, disseque “o sacrifício de Herzog, há 30 anos,não foi em vão; sua morte deflagrou oprocesso de desmoronamento da dita-dura e, conseqüentemente, do fim dacensura”. Portanto, disse, “não podemosadmitir que haja censura em plena vi-gência do Estado de Direito”.

Falando em nome do MinistérioPúblico, o promotor de Justiça Maurí-

cio Barros Pitta condenou as ten-tativas de alguns parlamenta-

res de calar o MP com a “Leida Mordaça”. Disse ele queessa é “uma tentativa sórdi-da de impedir que o povo

brasileiro saiba das maracu-taias que ocorrerem nos bas-

tidores dos três Poderes; aConstituição brasileira garante,

em seu artigo 5º, o direito à informa-ção. Qualquer tentativa de impediressa conquista deve ser combatida comfirmeza”.

Representando a Igreja Católica, oPadre Manoel Henrique de Mello San-tana convocou todos os democrataspara uma grande vigília cívica contra

a censura e outros atos que venhamferir a Constituição. “Nossa jornadapara vencer a ditadura foi muito dura.Enfrentamos forças terríveis que nãoqueriam a liberdade do povo. Não dápara aceitar que hoje, em plena demo-cracia, ainda tenhamos que assistir aatos arbitrários praticados contra o di-reito do povo. Precisamos ficar vigi-lantes”, alertou.

Já o jornalista João Marcos Carva-lho, um dos profissionais de imprensamais censurados do País no regime de-mocrático, salientou que, ao contrá-rio dos tempos do regime militar, quan-do a censura era exercida pelos agen-tes da repressão, “a mordaça agora épraticada por membros do Judiciário,que, lançando mão de artifícios jurídi-cos inconstitucionais, vem ferindo de

A defesa da fonte, a qualquer preçoA repórter Judith Miller,do New York Times,perdeu a liberdademas não revelou quemlhe deu informações.

Após 85 dias de prisão, a repórter doThe New York Times Judith Miller dei-xou no começo de setembro um cen-tro de detenção na Virgínia, medianteacordo de seus advogados com um pro-curador federal, e depôs diante de umjúri. Judith foi presa no dia 6 de julhopor se recusar a entregar sua fonte,num escândalo que envolvia a identi-dade secreta de uma agente da Agên-cia Central de Inteligência-Cia. Umdia após ser libertada Judith Miller tes-temunhou por mais de três horas dian-te do júri que julga o caso.

Antes de seguir para sua casa emLong Island, Judith respondeu a per-guntas dos repórteres em frente à Cor-te. Sua libertação foi negociada porseus advogados junto ao ProcuradorFederal de Justiça Patrick J. Fitzgerald.No acordo, ficou acertado que seu de-

parada para permanecer al-guns dias mais na prisão.

Judith disse ainda queespera que sua prisão possachamar atenção para a ne-cessidade de uma lei fede-ral que assegure aos repór-teres o direito de não en-tregar suas fontes. Sua de-cisão de falar ao júri tam-bém foi motivada pela au-torização “voluntária e pes-soal” de I. Lewys Libby, che-fe dos assessores do Vice-Presidente Dick Cheney,que lhe garantiu que nãoprecisaria mais preservarsua identidade e deixouclaro seu desejo de que elatestemunhasse.

Arthur Sulzberger Jr.,editor do NYT, reafirmouque o jornal apoiou a deci-são da jornalista em recu-sar-se a entregar sua fonte:— Ela se manteve firme naposição de resguardar a

identidade de seu entrevistado e fica-mos muito agradecidos quando sou-bemos da autorização, telefônica e es-

crita, dada por ele, isentando-a de qual-quer culpa.

Há mais de um ano o procuradorFitzgerald aguardava o depoimento deJudith Miller sobre suas conversas comLibby, que, de acordo com fontes ofi-ciais envolvidas na investigação, dissenão fazer nenhuma objeção no casode a jornalista divulgar o conteúdo desuas conversas. Fitzgerald disse que odepoimento de Judith era uma das úni-cas coisas que faltavam para a conclu-são de seu inquérito.

Os contatos telefônicos entre Judithe Libby durante a prisão da jornalistacomeçaram no fim de agosto, apósintermediação de seus advogados. Em-bora Libby tenha autorizado Judith adepor, algumas pessoas envolvidas nainvestigação dizem que ela só se dei-xou convencer quando recebeu a per-missão por escrito.

Judith Miller diz orgulhar-se por terido para a prisão para preservar o prin-cípio ético de que o jornalista não devejamais revelar a identidade de uma fon-te confidencial: — Preferi todas as con-seqüências de 85 dias de prisão a violaressa promessa. O princípio foi maisimportante que a minha liberdade.

morte a Constituição”.— A censura, em suas mais diversas

formas — direta ou indireta, prévia ouposterior, administrativa ou judicial —,tem merecido o repúdio dos povos. Por-tanto, repudiar intransigentementeessa prática é dever fundamental nãosó para jornalistas, mas para todos osque enxergam a democracia como bemuniversal inegociável —, disse JoãoMarcos.

No final do evento, os jornalistasfiliados à ABI prestaram uma home-nagem ao Governador de Alagoas,Ronaldo Lessa, por ter sido o únicoChefe do Executivo a criar um Conse-lho Estadual de Comunicação Social,órgão encarregado de monitorar as vio-lações da a liberdade de imprensa noEstado.

Gera preocupaçãosua forma atual: a“censura togada”.

poimento ficaria sob sigilo, limitadoaos bastidores do julgamento. Do con-trário, a jornalista disse que estaria pre-

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“O princípio da preservação da fonte é mais importante doque a minha liberdade”, disse Judith Miller após libertada.

A ABI entrega ao Secretário de Comunicação Social Joaldo Cavalcante a placaem homenagem à decisão pioneira do Governador Lessa.

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21Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

Ferida num tiroteio entre policiais etraficantes no dia 29 de agosto, no Rio,a repórter da TV Bandeirantes NadjaHaddad ficou internada quase três se-manas no Hospital Samaritano. Segun-do informações divulgadas pela emis-sora, Nadja recuperou-se e pôde retornaà casa da família, em Belford Roxo, RJ.

A repórter estava se preparando paracobrir uma incursão da Polícia no Mor-ro Dona Marta, em Botafogo, quandofoi atingida no ombro por uma bala decalibre nove milímetros. Agentes da 10ªDelegacia Policial, sediada em Botafogo,

Em expediente encaminhado à Di-visão de Acordos e Assuntos Multilate-rais Culturais do Ministério das Rela-ções Exteriores, a ABI apresentou suacandidatura ao Prêmio Mundial de Li-berdade de Imprensa Unesco/Guiller-mo Cano, que será atribuído pelo ór-gão da ONU em 3 de maio de 2006.Batizado em homenagem ao jornalistacolombiano morto no exercício da pro-fissão, o prêmio — de US$ 25 mil, alémdo troféu — é promovido anualmente.

No texto vertido para o inglês ane-xado ao expediente, a ABI ressalta que“mantém vigorosa atuação em defesada liberdade de imprensa no Brasil des-de a sua fundação, em 7 de abril de 1908”.Diz ainda a justificativa da entidade:

ABI candidata ao Prêmio Guillermo Cano

Com base nas possíveis ligações entre os assassinatos dos ex-Prefeitos Toninho do PT e Celso Daniel, a ABI pediuao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana que apure os dois crimes em investigações ligadas entre si.

O representante da ABI no Conse-lho de Defesa dos Direitos da PessoaHumana, jornalista Silvestre Gorgu-lho, propôs na reunião do dia 15 de se-tembro que o órgão acompanhe os des-dobramentos do assassinato do ex-Pre-feito de Santo André Celso Daniel, emface das possíveis ligações entre estecrime e a morte do ex-Prefeito de Cam-pinas Toninho do PT.

Foi a segunda vez que o Conselhose reuniu fora de Brasília. A primeiraocorreu no Espírito Santo, em junhode 2002, a pedido da Ordem dos Advo-gados do Brasil-OAB, para investigar amorte de um advogado que fora jura-do de morte; desta vez, a reunião acon-teceu em Fortaleza, Ceará, Estado commaior número de denúncias encami-nhadas ao Conselho.

Silvestre Gorgulho baseou sua pro-posta no relatório dos Conselheiros

Humberto Pedrosa Espíndola e JoséEdísio Simões Souto, queacompanharam to-dos os desdobra-mentos do assassi-nato do ex-Pre-feito de Campi-nas, ocorridoem 10 de setem-bro de 2001: —Há forte correla-ção entre a mor-te de Toninho doPT e o assassinatode Celso Daniel. Co-mo no caso de Santo An-dré, em Campinas também asduas testemunhas foram executadas.

Informou Silvestre Gorgulho queo relatório dos Conselheiros aponta fa-tos novos. Entre eles, documentos in-cluídos nos autos do processo crimi-

nal do caso de Campinas, em que cons-tam alusões a revelações feitas so-

bre o seu assassinato “no con-texto da apuração do caso

Celso Daniel”. Tais decla-rações teriam sido extraí-das da gravação do depoi-mento do detento Denei

Luiz Gasparino a pro-motores de Jus-tiça: — O rela-tório dos conse-lheiros mostra

que o esclareci-mento da morte de

Toninho do PT estárelacionado ao indício de que as

cápsulas encontradas próximas ao car-ro dirigido pelo Prefeito foram “plan-tadas” e ao desvendamento do casoCaraguatatuba.

O caso em questão refere-se ao in-

quérito policial aberto em 2001 — eainda não concluído — para investi-gar a morte de quatro seqüestrado-res — três dos quais tinham envolvi-mento com a morte de Toninho doPT — numa ação da Polícia de Cam-pinas em Caraguatatuba para liber-tar uma vítima do cativeiro.

A proposta do representante daABI para que o Conselho de Defesada Pessoa Humana, que apura o as-sassinato de Toninho do PT, investi-gue também os indícios de que o cri-me esteja relacionado à morte deCelso Daniel foi aprovada por todosos seus membros. Diz Gorgulho: —Fiz uma exposição para que a mes-ma comissão estenda seus traba-lhos e acompanhe os desdobramen-tos do caso de Santo André, mesmoque este esteja correndo em sigilode Justiça.

O radialista José Cândido AmorimPinto, da Rádio Comunitária Alterna-tiva de Carpina, Município de Pernam-buco, foi assassinado no estacionamen-to do seu trabalho no dia 1º de julhopassado. Ele foi abordado por volta das6h40min da manhã e levou 20 tiros.Os assassinos conseguiram fugir nu-ma motocicleta.

Há 19 anos no mercado, Amorimera conhecido localmente por denun-ciar casos de corrupção na Prefeitura.Recentemente, ele fizera denúnciascontra o prefeito da cidade, Mandel Bo-tafogo, e o Deputado Antônio Moraes.Ambos estariam supostamente envol-vidos em casos de corrupção.

Amorim já tinha sofrido ameaçasem maio, quando dois homens atira-ram contra seu carro. A Deputada Car-la Lapa participou de um programa naRádio Folha e acusou Moraes e Botafo-go de serem os mandantes do crime. Ocaso foi denunciado, entre outras en-tidades, pela instituição Repórteressem Fronteiras.

A morte de Amorim foi denuncia-da na reunião de outubro do Conse-lho Deliberativo da ABI pelo associa-do Daniel M. F. de Castro, membro daComissão de Defesa da Liberdade deImprensa e Direitos Humanos, que,em moção subscrita por outros mem-bros da Comissão e do Conselho, pro-pôs que a Casa se dirigisse ao Ministé-rio Público de Pernambuco solicitan-do rigor nas investigações.

LIBERDADE DE IMPRENSA

DIREITOS HUMANOS

A ABI pede apuração conjunta das mortes de ex-prefeitos

Radialistasilenciado parasempre emPernambuco

No meio do caminho, a 9 mmRepórter Nadja foialvejada ao cobriruma ação antitráfico.

e peritos do Instituto de CriminalísticaCarlos Éboli fizeram a reconstituiçãodo tiroteio e concluíram que a hipótesemais provável é a de que traficantes ati-raram do alto da favela, de um local co-nhecido como Cerquinha, que fica a800 metros da Rua Barão de Macaúbas,onde o carro da TV Bandeirantes esta-va estacionado.

O cinegrafista Moabe Ferreira, quedirigia o carro e foi atingido de raspãona mão, participou do trabalho de re-constituição, que chegou a interditar aRua São Clemente por alguns instan-tes. Um carro de reportagem tambémfoi usado para simular a chegada daequipe jornalística ao local. Os peritosfizeram fotos e subiram o morro. Ementrevista ao Jornal do Brasil, o Diretordo Instituto Carlos Éboli, Liu Tsun, disse

que do mesmo local de onde partiramos tiros que feriram Nadja e Moabe po-dem ter saído as balas que atingiramum tenente do 2º Batalhão da PolíciaMilitar, sediado em Botafogo, e a facha-da de um prédio. Liu Tsun informouque foram feitas fotos com tomada dezoom a partir da Cerquinha, que per-mitem uma visualização perfeita emlinha reta dos três locais.

Através da reconstituição, ficou des-cartada a possibilidade de o tiro ter par-tido da arma de um policial. Liu Tsundisse que o laudo da perícia será enca-minhado para investigação. Em casode identificação de alguma arma quepossa ter sido usada no tiroteio, seriafeito o confronto balístico. Após o con-fronto o Morro Dona Marta foi ocu-pado pela Polícia..

“Sua atuação foi extremamentecorajosa na quadra dramática que oBrasil atravessou entre 1 de abril de1964, quando se instalou uma ditadu-ra militar no País, e 15 de março de1985, quando um civil assumiu o Go-verno do País.

Essa militância a expôs às represáli-as do regime ditatorial e seus aliados,como a explosão de uma bomba emsua sede em agosto de 1976. Mesesantes desse atentado, a ABI tivera in-tervenção destacada nos protestoscontra o assassinato do jornalistaVladimir Herzog numa prisão militarna cidade de São Paulo, em 25 de outu-bro de 1975.

Coerente com a perseverança na de-

fesa da liberdade de imprensa que mar-ca a sua prolongada existência, a Asso-ciação Brasileira de Imprensa promo-veu no período 2004-2005 interven-ções decisivas de exigência do respeitoà liberdade do exercício profissional,como ao defender o jornalista norte-americano Larry Rohter, correspon-dente do The New York Times no Brasil,contra a ameaça de cassação de suacredencial e de sua expulsão do País, eao liderar a resistência à tentativa doGoverno do Brasil de instituir o Con-selho Federal de Jornalismo, que noentender da ABI constituiria um ins-trumento de controle da liberdade deinformação, da liberdade de opinião eda liberdade do exercício da profissão.”

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Jornal da ABI

22 Setembro/Outubro de 2005

O Conselho Deliberativo daABI decidiu encaminhar uma re-presentação formal ao Conselhode Defesa dos Direitos da PessoaHumana, órgão do Ministério daJustiça, denunciando os métodosfascistas adotados pelo Batalhãode Operações Especiais da PolíciaMilitar do Estado do Rio de Janei-ro-Bope, cujos integrantes desfi-lam diariamente, no Parque Guin-le, localizado no bairro de Laran-jeiras, na Zona Sul do Rio, ento-ando refrões em que expõem seudesrespeito aos direitos humanose os métodos criminosos que ado-tam em suas missões policiais.

O relato sobre o Bope foi feitona reunião de outubro do Conse-lho da ABI pelo jornalista FritzUtzeri, que mora no Parque Guinlee se sente agredido pelos refrõesque ouve diariamente nas sessõesde treinamento do Batalhão.

“Tem geladeira,/ tem pau-de-arara,/ tem quebra-nozes,/ temmuita porrada.” Este refrão, segun-do Utzeri, é alternado com outroscom o mesmo teor de desrespeitoaos direitos humanos, como quan-do a tropa faz uma pergunta a queela mesma responde: “Homem depreto, qual é a tua missão? Entrarna favela e deixar corpo no chão.”

Fritz Utzeri declarou que hátrês anos denuncia essa apologiado assassinato e da tortura feitapelo Bope, que fica ainda mais gra-ve quando se considera que ela éfeita nas proximidades do PalácioLaranjeiras, onde moram a Gover-nadora Rosinha Garotinho e o ex-Secretário de Segurança do RioAnthony Garotinho.

“Tem geladeira,tem pau-de-arara,tem quebra-nozes,tem muita porrada”

DIREITOS HUMANOS

Esse é o refrão do cântico de treinamentodo Batalhão de Operações Especiais da PM-RJ,o temido Bope. A ABI quer acabar com essecântico e a prática de violências que ele retrata.

A intervenção de Utzeri provo-cou manifestações de outros Con-selheiros da ABI, entre os quaisMilton Coelho da Graça, segundoo qual o que causa horror não é ocanto em si entoado pela tropa,mas a ideologia que ele retrata.

Itagiba, o desinformadoO Conselheiro Mário Augusto

Jakobskind propôs que, além darepresentação contra o Bope noConselho de Defesa dos Direitosda Pessoa Humana, a ABI encami-nhe denúncias a organismos inter-nacionais, em especial à Comis-são Interamericana de DireitosHumanos.

Durante a realização do II Fó-rum de Debates Mídia e Violên-cia, no auditório da Federação dasIndústrias do Estado do Rio de Ja-neiro-Firjan, o Diretor Econômico-Financeiro da ABI Domingos Mei-relles, que também é membro doConselho Deliberativo da Casa, re-produziu as denúncias de FritzUtzeri diante do Secretário de Es-tado de Segurança do Rio de Janei-ro, Delegado Marcelo Itagiba, queruborizou diante da denúncia, de-clarou que desconhecia essa orien-tação do Bope e anunciou que iriaapurar o caso.

No artigo Criminosos são os quenos governam, publicado no site daABI, Fritz Utzeri diz que todasas manhãs “um grupo de exter-mínio chamado Bope” passa pelasua janela e a da Governadora, fa-zendo “apologia da morte e datortura”. Na página seguinte otexto de Utzeri, com título daRedação do Jornal da ABI.

APRECIADOSAPRECIADOSAPRECIADOSAPRECIADOSAPRECIADOSMAMAMAMAMAIS 98 IS 98 IS 98 IS 98 IS 98 PEDIDOSPEDIDOSPEDIDOSPEDIDOSPEDIDOSDE REPDE REPDE REPDE REPDE REPARAÇÃOARAÇÃOARAÇÃOARAÇÃOARAÇÃOComissão Especial do Estado do Rio aprovouo pagamento de indenização moral a mais83 vítimas de prisão e tortura sob a ditadura.

Em sua reunião de setembro, a Co-missão Especial de Reparação da Secre-taria de Direitos Humanos do Estadodo Rio deferiu mais 43 processos deindenização a título de reparação mo-ral a vítimas de prisão e tortura duran-te o regime militar, dez das quais já fa-lecidas. Dos 50 processos apreciados,sete foram indeferidos. Ao todo, a Co-missão apreciou em setembro e outu-bro 98 processos.

A Comissão, instituída por lei esta-dual, é integrada por organizações dasociedade civil – ABI, Ordem dos Ad-vogados do Brasil/Seção do Estado do

Os processos de setembroDEFERIDOS

Amadeu Pereira de Lima (falecido)Adalberto Teixeira Fernandes

Afrânio Marciliano de Freitas AzevedoAlipio Cristiano de FreitasAmaurilio Felipe SantiagoBenedito Matos da Costa

Carlos Cardoso de AlmeidaDemisthóclides BaptistaEmerita Andrade RamosEulina Jorge de Oliveira

Eurípedes Veiga Costa (falecido)Florentino Marques Carneiro

Frederido José FalcãoGerço Carvalho de S. RosaGilberto Carvalho MolinaHelio Marques da Silva

Hernande PrudencioHordener Nascimento

Humberto Antão de Sousa e SilvaIvan Ramos Ribeiro (falecido)João Cesar Belisário de Souza

Padre João Daniel de Castro FilhoJosé André Borges

José Joaquim Pontes (falecido)José Mendes de Sá Roriz (falecido)

José Olavo de Souza GuerraJosé Roberto G. de Rezende (falecido)

Luiz Cordouro FulcoMagno da Silveira Couto (falecido)

Maria Auxilladora Lara Barcellos (falecida)Maria Elodia Alencar de Lima

Maria Helena do Nascimento BarbosaMarta Maria KlagsbrunnMarta Regueira Teodósio

Ney RoitmanNicanor Prezidio Brandt

Odilon de Souza PachecoRomeu Bianchi (falecido)

Samuel Henrique Dibe MalevalSonia Maria Goulart SallesSpartacus da Silva Ulyssea

Sylvio R. Ulysséa de MedeirosUbaldino Pereira Santos (falecido)

INDEFERIDOSTupan Nunes dos Santos

Nicodemos Alves MachadoJamir Ribeiro

Amaurilio Gomes (falecido)Ezechias de França

José Francisco Medina (falecido)Santos Cardoso da Rosa

Rio de Janeiro, Grupo Tortura NuncaMais, Conselho Regional de Medicinado Estado do Rio de Janeiro-Cremerj –e por órgãos do Estado – a Procurado-ria-Geral do Estado, a Secretaria de Es-tado de Ação Social e a Secretaria deEstado de Direitos Humanos. A Comis-são reúne-se uma vez por mês, em ses-são pública que conta com a assistên-cia dos interessados nos processos emtramitação e militantes políticos daépoca da ditadura, que querem saber odesfecho dos processos de seus compa-nheiros de lutas.

A seguir, as decisões da Comissão.

Os processos de outubroDEFERIDOS

Adauto Gomes dos SantosAdson de Souza LeiteAntônio Negrão de Sá

Arnaldo Alberto Werlang (falecido)Benedito Costa (falecido)

Benedito Rosa de Almeida (falecido)Carlos Alberto Marques da Silva

Christóvão da Silva RibeiroClarice GuimarãesClóvis Daminace

Constantino Cavalcante de MeloDavid Farias

Dirceu da Fontoura TrilhaDiva Borges NoronhaEdir Inácio da Silva

Francisco Rodrigues de LimaHilário Neves de Moraes (falecido)

Jarbas Dourado de CarvalhoJesus da Luz dos Reis (falecido)Lúcio de Brito Castelo Branco

Lúcio Flávio PachecoLuiz Carlos Natal

Luiz Rodolfo de B. C. V. de CastroManoel João da Silva (falecido)

Maria Alice Albuquerque SaboyaMarijane Vieira Lisboa

Marly Dionizia Santos WerlangMaurício Paredes SaraivaMaurílio Cândido Ferreira

Murilo Martins de Souza (falecido)Paulo Ribeiro Martins

Priscila Melillo de MagalhãesRonaldo David Aguinaga

Sidney LianzaTânia Marins Roque

Themistocles Alves CardosoValdo Albino Moreira

Victor Hugo KlagsbrunnVivaldo Alves da Silva

Wilson Francisco Machado

INDEFERIDOSCid de Carvalho

Dayse Maria Carvalho CananoGlória Maria Vargas de Queiroz

Iedson Lopes BastosPaulo Alves Conserva

Roque Santos de CarvalhoSerge Michel Sévin

Zélia Gonçalves Amorim Santana

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23Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

“Todas as manhãs um grupo de ex-termínio chamado Batalhão de Opera-ções Especiais da PM-Bope passa sob aminha janela no Parque Guinle e sob ajanela da “Governadora” e do Governa-dor (?) deste Estado, fazendo a apologiada morte e da tortura. É uma força poli-cial, mas declara em coro o seguinte:“Homem de preto, qual é tua missão?/É entrar lá na favela e deixar corpo nochão.” A favela é um território habita-do por inimigos e não cidadãos brasilei-ros. É terra para uma força militar en-trar gritando “olha aí o Caveirão, vimbuscar a tua alma!” e sair atirando, ar-rombando portas, roubando e execu-tando, como se fosse uma horda medi-eval em território estrangeiro, inimi-go. Tropa que não respeita as conven-ções de Genebra aplicáveis a conflitosentre nações e não entre o asfalto e afavela de uma mesma cidade, entre ci-dadãos de uma mesma república.

O que o Bope prega e faz é crime,crime pelo qual acuso os Governos doEstado e da União. Os moradores dasáreas pobres da cidade vivem sob o do-mínio feudal de verdadeiros baronetesda droga, submetidos a um código defidelidade cuja quebra é punida com aexpulsão da favela ou com a morte, vi-vem sujeitos às leis do traficante, sobtoque de recolher e sujeitos a todo tipoabuso de poder.

E o Estado faz o quê? Vai construirtorres de observação para vigiar essascomunidades. O Comandante da PM,Coronel Hudson Miranda, se regozi-

ja: “É uma estratégia sensacional e ino-vadora, que coloca o Rio na vanguar-da”, diz o celerado, celebrando a cons-trução, iniciada, da primeira torre noComplexo da Maré, uma torre de 20metros de altura (equivalente a umedifício de sete andares), blindada,rodeada por um muro de dois metrosde altura, guarnecida por soldados equi-pados com binóculos e visores notur-nos e dotada de possantes holofotes.

Segundo o Comandante da PM,será a primeira de muitas. Parece coisade israelense contra palestino — os “is-raelenses” no caso somos nós e os “pa-lestinos” moram nas favelas. São en-carados como inimigos, não como ci-dadãos, gente que é preciso vigiar e re-primir. Nem na África do Sul doapartheid houve algo parecido, emSoweto ou em qualquer outro bairronegro da periferia de Joanesburgo.

Os traficantes têm um termo parareferir-se aos inimigos: “alemão”. Paraeles, e por extensão inevitável para to-dos os favelados, os que não são de suacomunidade são “alemães” e o Estadobrasileiro aceita esse jogo e tem comopolítica oficial tratar os pobres das fa-velas como inimigos. A coisa é tão sé-ria que essa cultura contamina as cri-anças onde começa uma guerra de fac-ções, são “alemães” contra “alemães”.

Em lugar de garantir a liberdade, odireito de ir-e-vir e de cidadania, as for-ças da “ordem”, como o Bope, jogamos moradores das favelas nos braços dostraficantes, não lhes dando qualquersaída, já que só atuam de forma vio-lenta e arbitrária. Se eu fosse favelado,diante de uma força armada montadacom o dinheiro de meus impostos eque declara abertamente que sua mis-são é me exterminar, eu me armaria eresistiria a ferro e fogo a essa guerradeclarada e suja. O direito à legítimadefesa é uma das bases da democraciae da liberdade.

Os traficantes exercem o poder de vidaou de morte, fecham e abrem comércioe escolas, cobram pedágio e exigem le-aldade. Não o fazem com armas de pe-queno calibre, roubadas dos chamados“cidadãos de bem”, mas com armamen-to pesado, de guerra, contrabandeado,roubado de quartéis ou ainda consegui-do das próprias polícias através dos am-plos e múltiplos canais de corrupçãoque intercomunicam intimamente omundo dos policiais e o dos bandidos.

A situação é tão séria que médicosmilitares suíços vêm fazer estágio noHospital Miguel Couto, para ter con-tato com ferimentos produzidos porarmas de guerra, ferimentos raríssimoslá e freqüentes por aqui, apesar de 38%dos lares suíços guardarem armamen-to pesado do Exército daquele país (ossuíços são convocados aos 18 anos epermanecem mobilizados até depoisdos 40 e as armas ficam nas casas doscidadãos).

O que faz a nossa “Governadora”?Ocupa a favela com um policiamentoque vise garantir direitos democráti-cos aos moradores? Reprime o tráfi-co? Orienta e oferece oportunidadesde educação e inserção profissionais inloco para os jovens? Garante o direito àvida, sem facções criminosas, sem “ale-mães”, a esses brasileiros? Nada disso,ela adota torres de observação, dignas

de campos de concentração. Já que épara ser assim, por que não aproveitar aonda e não cercar logo a favela com ara-me farpado e eletrificado? Vamos esta-belecer lagers (campos deconcentração em ale-mão), passes, uma cartei-ra de identidade especialamarela, com um “P” depobre estampada nela. Jávejo a cena, a turma doBope parada no portão dafavela pedindo em ale-mão — uma língua boapara isso — os ausweis(carteira de identidade,pronuncia-se hausvais)ou papieren (documen-tos) para que os morado-res possam sair de seusguetos para trabalharaqui fora (com direito atoque de recolher, pois alei marcial já existe).

Mas a Governadora prefere sujar aLagoa com isopor, vestir-se de brancoe sair por aí, apregoando uma paz hi-pócrita, sustentada por ongs como aViva Rio que alegam um poder que ja-mais lhes foi concedido e que, comotodas as demais, mantém obscuras assuas motivações e sua história finan-ceira. Estamos cansados de blablablá,de soltar pombinhas brancas e respon-sabilizar cidadãos honestos pelo crime,ao mesmo tempo em que temos umGoverno local incapaz sequer de do-minar o território de sua própria cida-

de, além de um Governo federal —campeão de corrupção — que olha parao outro lado e finge nada ter a ver como contrabando de armas, com os rou-bos ou o tráfico nos quartéis e com adesestruturação das polícias. O máxi-mo que este Governo faz é um refe-rendo ridículo, que prima pela confu-são, pela desinformação (nos dois cam-pos, é bom que se diga), pelo vazio daproposta e por jogar os verdadeiros pro-blemas para debaixo do tapete.

Enquanto tivermos governos quedão as costas para a educação, que ga-rantem a desigualdade econômica esocial, destruindo o pouco que o mal-fadado Estado brasileiro conseguiu fa-zer e deixando a infra-estrutura do Paísnaufragar, com o objetivo declarado dehonrar contratos “sagrados” com ban-queiros e especuladores e ignorar qual-quer tipo de contrato com a sociedade

“OLHA AÍ O CAVEIRÃO.VIM BUSCAR A TUA ALMA”

brasileira e — notadamente — a maio-ria de sua população, entregue à pró-pria sorte, não dá para dizer SIM à per-da do menor direito que seja.

Não sou um crimino-so, jamais pus a mãonuma arma de fogo, lu-tei contra a ditadura,mas não aderi à luta ar-mada (andei perto), poracreditar que a via de-mocrática poderia resol-ver. Hoje, restabelecidao que chamam de “de-mocracia”, devo declarara minha descrença, de-sengano e repúdio àsinstituições que estão aí.Elas não são republica-nas nem democráticas.

Na Segunda Guerra,cidadãos (homens e mu-lheres) indignados, naItália, foram à luta con-

tra os alemães (estes verdadeiros ale-mães, ou tedeschi — lê-se “tedesqui”— como dizem os italianos). Pegaramem armas e se prepararam para expul-sar de vez o invasor e acabar com ofascismo. Nada de pombinhas brancasou discursos de “paz” dos pusilânimese oportunistas, sempre do lado dos ver-dadeiros assassinos. As armas nas mãosdaqueles italianos dispostos a reafirmarsua condição de cidadãos, que lhes ha-via sido usurpada pelo fascismo e peloocupante inimigo, não são instrumen-to de morte, mas de libertação da tira-nia e da morte. Em certos momentosda História, povos têm-se libertado re-correndo a elas.

Ghandi é admirável, considero-oum santo e o melhor ser humano pú-blico do século XX, mas infelizmenteé uma exceção e de uma cultura bemdiferente da nossa. Só para dar umexemplo recente, ao decidir fazer gre-ve de fome até a morte para protestarcontra a transposição do São Francis-co, Frei Cappio foi advertido severa-mente pelo Vaticano e provocou rea-ções até da CNBB, afirmando que,como cristão, não teria o direito de dis-por da própria vida. À luz (?) de nossacultura, boa parte dos atos de Ghandiseriam considerados ilegítimos, a co-meçar pela auto-imolação.

No Brasil, é uma pena que a revolu-ção ou a desobediência civil não te-nham a menor possibilidade de acon-tecer, mas a degradação da sociedade ea desmoralização institucional são tãograndes que vai ser necessário, numdia não muito longe e se nada mudar,que todos nos defendamos como nofaroeste. Numa sociedade em que va-lem somente o direito e o poder dosmais fortes, não vejo por que abrir mãode meu direito de defesa, mesmo quenão o exerça. Meu voto é NÃO!”

“Hoje, restabelecida o que chamam de “democracia”, devodeclarar a minha descrença, desengano e repúdio às instituiçõesque estão aí. Elas não são republicanas nem democráticas.”

�����por Fritz Utzeri

Fritz Utzerié editor do jornal Montbläat,que circula pela internet em

edição exclusiva paraassinantes

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Jornal da ABI

24 Setembro/Outubro de 2005

DIREITOS HUMANOS

Em reunião presidida pelo Minis-tro do Controle e da Transparên-cia, Waldir Pires, em 20 de se-

tembro, o Conselho da TransparênciaPública e Combate à Corrupção, órgãoda Controladoria-Geral da União, cons-tituiu um grupo de trabalho para apre-ciar o texto de um anteprojeto de leidestinada a regular o acesso a informa-ções detidas pelos órgãos da Adminis-tração Pública, conforme está previstono artigo 5º, inciso XXXIII, da Consti-tuição Federal.

O grupo de trabalho é constituído porcinco membros, entre os quais Maurí-cio Azêdo, Presidente da ABI, que ex-pôs na reunião o interesse da entidadena modificação da legislação restritivaatual, que impede o acesso a informa-ções da História recente do País, de in-teresse não só para pesquisadores, comopara os cidadãos comuns. Ele citou o casodos mortos na guerrilha do Araguaia,cujas famílias têm o direito de saber odestino dos corpos para lhes proporcio-nar um enterro digno, ainda que comrestos mortais simbólicos.

Do grupo participam também osmembros do Conselho Cláudio WeberAbramo, Diretor-Executivo da Transpa-rência Brasil; Antônio Carlos AlpinoBigonha, Procurador regional da Repú-blica em Brasília; Francisco de Assis daSilva, Diretor da Associação Brasileiradas Organizações Não-Governamen-tais-Abong, e o Ministro MarcosVinicius Pinta Gama, representante doMinistério das Relações Exteriores.

O texto do anteprojeto, compostopor dez artigos, destaca logo no inícioque “todos têm o direito a receber dosórgãos públicos informações de seu in-teresse particular ou de interesse cole-tivo geral” e que “é assegurado o direitode pleno acesso às informações detidaspela Administração Pública”.

Para oferecer seu parecer ao textofinal da proposição, a ABI está pedin-do a instituições representativas dasociedade civil — não só da área deimprensa, mas também de associaçõesde arquivistas e pesquisadores em geral— o envio de sugestões, a fim de que aproposta, a ser encaminhada pelo Mi-nistro Waldir Pires ao Presidente LuizInácio Lula da Silva, possa remover asdificuldades atualmente impostas aoconhecimento de informações de ór-gãos governamentais, especialmentepelas Forças Armadas.

Conselho da Transparência Pública elabora anteprojeto de lei destinada aampliar o acesso a informações que o Poder Público possui e esconde.

Dispõe sobre o acesso às informações detidas pelos ór-gãos da Administração Pública previsto no art. 5º, inciso XXXIII,da Constituição.

O Presidente da RepúblicaO Presidente da RepúblicaO Presidente da RepúblicaO Presidente da RepúblicaO Presidente da RepúblicaFaço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sancio-

no a seguinte Lei:

ArArArArArt.1ºt.1ºt.1ºt.1ºt.1º Todos têm direito a receber dos órgãos públicosinformações de seu interesse particular ou de interesse coleti-vo ou geral, contidas em documentos detidos pela Administra-ção Pública, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindívelà segurança da sociedade e do Estado, bem como àinviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e daimagem das pessoas.

ArArArArArt. 2ºt. 2ºt. 2ºt. 2ºt. 2º É assegurado o direito de pleno acesso às informa-ções detidas pela Administração Pública, na forma desta Lei.

§ 1º A manutenção de documentos em arquivos públicosnão prejudica o exercício do direito de acesso às informaçõesneles contidas.

§ 2º No caso de documentos constantes de processos nãoconcluídos ou de documentos preparatórios de uma decisão,o acesso à informação somente ocorrerá após a tomada dadecisão ou o arquivamento do processo, ou após decorridoum ano da elaboração do documento.

§ 3º Os documentos relativos a procedimentos de investi-gação e sindicância somente estarão sujeitos ao conhecimen-to de terceiros após a conclusão da fase decisória.

ArArArArArt. 3ºt. 3ºt. 3ºt. 3ºt. 3º A Administração Pública franqueará a consulta aosdocumentos públicos nos prazos e pelas formas estabeleci-dos nesta Lei.

Parágrafo único: A autoridade ou o servidor responsávelpor recusa injustificada de acesso a documento público incor-rerá nas penalidades disciplinares previstas no art. 127 da Leinº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, sem prejuízo dasdemais sanções cabíveis.

ArArArArArt. 4ºt. 4ºt. 4ºt. 4ºt. 4º O interessado em obter informações da Administra-ção Pública deverá requerê-las por escrito, por meio de docu-mento que contenha dados essenciais do solicitante, em es-pecial o nome completo, o número do documento de identi-dade, o endereço e a assinatura, e ainda outros dados úteisou relevantes.

ArArArArArt. 5ºt. 5ºt. 5ºt. 5ºt. 5º O requerimento de que trata o artigo anterior deveráespecificar a informação solicitada do modo mais objetivo pos-sível e indicar a forma de sua obtenção, dentre as seguintes:

I - vista de documentos;II - reprodução de documentos; ouIII - obtenção de certidão, expedida pelo órgão ou entida-

de consultado.§ 1º Quando não for possível o fornecimento de cópia

pelos meios usuais de reprodução, em razão de risco dedanos ao documento em que se contém a informação, ointeressado poderá proceder a traslado manual ou a repro-dução do documento por outro meio que não lhe ameace aconservação, às suas expensas e sob a supervisão de servi-dor público.

§ 2º A informação requerida que se encontrar armazenadaem ambiente eletrônico poderá ser fornecida por esse meio, apedido ou com a anuência do interessado.

§ 3º Nas hipóteses previstas nos incisos II e III deste artigopoderá ser cobrado do interessado exclusivamente o valor

necessário para ressarcir o custo dos serviços e materiais utili-zados, segundo tabela previamente fixada pela Administração.

§ 4º Estará isento de ressarcir os custos previstos no pará-grafo anterior todo aquele cuja situação econômica não lhepermita fazê-lo sem prejuízo do sustento próprio ou da famí-lia, declarada conforme o disposto na Lei 7.115, de 29 deagosto de 1983.

ArArArArArt. 6ºt. 6ºt. 6ºt. 6ºt. 6º A autoridade ou o servidor público a quem fordirigido o requerimento de acesso à informação deverá, noprazo de trinta dias, responder ao interessado, indicando:

I - data, local e procedimento, conforme o caso, para queseja realizada a consulta, a reprodução de documento emque se contém a informação ou para que seja obtida a res-pectiva certidão; ou

II - indicar as razões da recusa, total ou parcial, do acesso àinformação.

§ 1º A efetiva concessão de vista, a reprodução do docu-mento ou a expedição da certidão respectiva far-se-á no pra-zo de cinco dias contados da decisão que deferir a solicitaçãode acesso.

§ 2º No caso de indeferimento do pedido, poderá o inte-ressado oferecer, no prazo de dez dias contados da ciência,recurso contra a decisão.

§ 3º O recurso será dirigido à autoridade ou ao servidorque indeferiu o pedido de acesso à informação, o qual, noprazo de cinco dias, poderá rever a decisão recorrida ou, casoentenda que deva ser mantida, remeter o recurso à autorida-de imediatamente superior, juntamente com as razões dadenegação.

§ 4º A autoridade superior decidirá a questão no prazo dequinze dias, determinando o imediato atendimento do pedidoou seu arquivamento, e dará ciência ao interessado da deci-são proferida.

ArArArArArt. 7ºt. 7ºt. 7ºt. 7ºt. 7º Os órgãos e entidades da Administração Públicaclassificarão os documentos e informações sigilosos por elesproduzidos ou detidos segundo os graus de sigilo estabeleci-dos em regulamento.

§ 1º Os documentos e informações cuja divulgação ponhaem risco a segurança da sociedade e do Estado, bem comoaqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade da intimi-dade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas sãooriginariamente sigilosos.

§ 2º O acesso a documentos e informações sigilosos, clas-sificados em qualquer grau, não poderá ser restrito por prazosuperior a sessenta anos, a contar da data de sua produção.

§ 3º Não poderá ser oposto sigilo à solicitação de informa-ção necessária a subsidiar investigação de violações a direitosfundamentais

ArArArArArt. 8ºt. 8ºt. 8ºt. 8ºt. 8º É vedada a utilização de informações com desres-peito aos direitos de propriedade intelectual, assim como areprodução, difusão e utilização de documentos ou de infor-mações neles contidas de modo que possa configurar práticade concorrência desleal.

Parágrafo único: A Administração pode recusar ou limitar oacesso a documentos cuja publicidade represente violação desegredos comerciais ou industriais

ArArArArArt. 9ºt. 9ºt. 9ºt. 9ºt. 9º O Poder Judiciário poderá determinar a exibiçãoreservada de qualquer documento sigiloso, sempre que indis-pensável à defesa de direito próprio ou esclarecimento desituação pessoal da parte.

ArArArArArt. 1t. 1t. 1t. 1t. 10º0º0º0º0º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Leia o texto e faça suas sugestõesANTEPROJETO DE LEI

Uma proposta em discussão:Uma proposta em discussão:Uma proposta em discussão:Uma proposta em discussão:Uma proposta em discussão:uma lei de abertura dos arquivosuma lei de abertura dos arquivosuma lei de abertura dos arquivosuma lei de abertura dos arquivosuma lei de abertura dos arquivos

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25Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

ACONTECEU NA ABI

A Escola de Samba Portela escolheu a ABI parapalco da sua comemoração do centenário de nasci-mento de Natalino José do Nascimento, o Natal, seugrande líder nos anos 50 a 70, quando morreu. Afesta, no Auditório Oscar Guanabarino, incluiu odebate Natal e as escolas de samba, num evento queembalou a platéia com muitas histórias do homena-geado. E tudo, é claro, ao som de muito samba. Asessão foi organizada pelo jornalista Lênin Novaes,membro do Conselho Deliberativo da ABI

O Presidente da ABI abriu a cerimônia agradecen-do a presença do público que estava prestigiando “al-guém que tanto contribuiu para a cultura populardo Rio de Janeiro e a mais antiga escola de sambacarioca”. Em seguida, convidou para compor a mesade debates o jornalista e escritor Sérgio Cabral, mem-bro do Conselho Deliberativo da ABI; a professora eescritora Marília Barboza; o médico e escritor HiramAraújo, Diretor Cultural da Liga Independente dasEscolas de Samba-Liesa; o radialista e produtor cul-tural Rubem Confete e o Presidente da Portela, NiloFigueiredo.

O mediador do debate foi o engenheiro e escritorCarlos Monte, Diretor Cultural da Portela, que sedisse orgulhoso de participar da homenagem a “umafigura carismática e polêmica”. Em seguida, SérgioCabral iniciou sua exposição, afirmando que Natalfoi um líder e sua presença, fundamental na fase maisgloriosa da Portela. Ele recordou um momentomarcante na vida de Natal: — Uma vez o Natal deuuma entrevista para o Pasquim e, em razão disso, foichamado para depor no Dops. Quando chegou lá,disse que tinha sido convidado por mim para dar aque-le depoimento e que podia até ser preso por sercontraventor, mas jamais por ser subversivo.

Sérgio também lembrou que, em 1960, quando aPortela disputava o tetracampeonato, a Prefeitura,que organizava o desfile através do antigo Departa-mento de Turismo e Certames, queria descontar pon-tos das escolas que tinham se atrasado, o que deixariaa azul e branco em segundo lugar. Para solucionar oproblema, Natal sugeriu que houvesse cinco campe-

�����por Rodrigo Caixeta

NATAL100 ANOS

ãs, proposta aceita por to-dos e que fez a Portela ga-nhar o quarto campeona-to consecutivo, para ale-gria de seu patrono.

Outra lembrança deSérgio foi a de uma visitaà modesta casa de Natal:— Perguntei por que elenão construía uma casamaior para deixar para seusherdeiros. Ele acatou a su-gestão e construiu umabelíssima casa, enorme, na qual, logo que adentravao hall, o visitante via pintados na parede os 25 ani-mais do jogo do bicho.

Hiram Araújo contou que, apesar de toda a fortu-na acumulada, Natal morreu pobre, pois distribuiutudo o que tinha: — Ele era uma pessoa rara, perten-cente a uma categoria privilegiada de inteligênciafora do habitual. Era daqueles que tinham seus senti-dos apurados e vitorioso nas atividades que exerceu.Por isso era um líder, rei de Madureira e adjacências erei da Portela.

Rubem Confete recordou que foi criado numarua de Madureira próxima à primeira banca do bichode Natal, de quem guarda grandes histórias: — Eleera um agente comunitário. Certa vez, conseguiuunir a Portela e o Império Serrano para realizar asobras de uma capela do bairro.

Outro fato marcante, lembrou Confete, foi quan-do Jair do Cavaquinho passou por dificuldades fi-nanceiras e pediu ajuda a Natal. Ele, então, pediu aalguém para ir à casa de Jair pegar o que de maisvalioso houvesse: — Foi uma grande brincadeira.Natal não só o ajudou com mantimentos, como re-novou algumas peças do mobiliário da casa.

Até o enterro de Natal foi tumultuado, contouConfete: — Fizemos uma grande passeata, que pre-tendia seguir até o cemitério cantando o samba He-róis da liberdade. No entanto, o ato foi interrompidopara não atrapalhar a ordem pública.

Entusiasmada, MaríliaBarboza destacou que suapresença no debate erauma demonstração deque “o samba não émachista, mas igualitá-rio”: — Na Portela euaprendi a ser mais brasilei-ra. Como infelizmentenão tive o prazer de con-viver com Natal, querotransferir esta homena-gem para o povo dele.

Marília disse que o sam-ba começou na Portela,graças a dois grandes líde-res: Natal e Paulo. — Eleslevaram a procissão àsruas, com as baianas e to-cando instrumentos queos ricos não tocavam. E osamba e a macumba erama mesma coisa, pois o sam-ba só foi trazido para nósquando a Umbanda velhaganhou letras profanas.

Marília e Hiram defen-dem datas diferentes paraa fundação da Portela: ele

diz que foi em 1923; ela, em 1926. Para encerrar apolêmica, Carlos Monte brincou, ao dizer que a es-cola não está se aposentando por tempo de idade: —Independentemente dos anos, a Portela é a mais an-tiga de todas.

O Presidente da Portela, Nilo Figueiredo, lamen-tou a morte recente do filho mais velho de Natal,Mazinho, e agradeceu a presença no auditório deportelenses famosos, como Monarco. Afirmou tam-bém seu “orgulho, satisfação e vaidade de ter sido umadas pessoas que mais conviveu com Natal”, que o le-vou até a escola: — Mais importante do que fundar émanter a Portela, e ela foi mantida graças a ele. Quan-do me tornei presidente, decidi que Natal seria opatrono da escola. Aprendi muitas coisas com ele, queme dizia que ninguém aprende a viver nos livros, sóvivendo, ensinamento repassado por mim para osmeus filhos. E ele era um contraventor diferente, poistinha ligação muito próxima com as autoridades.

Após a apresentação de todos os componentes damesa, Carlos Monte abriu para debate, seguido deuma apresentação de integrantes da Portela. A pla-téia foi contagiada pela bateria da escola, que finali-zou o evento ao som do samba-enredo do desfile de2005, com passistas e espectadores misturando-se noauditório e no palco.

Grande conhecedor das histórias que se passamno mundo do samba, o jornalista e pesquisador JoséCarlos Rego, membro do Museu da Imagem e doSom e também do Conselho Deliberativo da ABI,conta que a relação de Natal com a imprensa era mui-to acidentada. — O repórter podia fazer 15 matériasfalando bem da Portela, mas se escrevesse uma noti-nha contra, virava inimigo mortal. E todos os quecobriam carnaval apreciavam sua autenticidade, quese revelava até na decoração de sua mansão emMadureira, onde ele mandou pintar na parede deuma sala todos os animais do jogo-do- bicho.

José Carlos Rego recordou outra história de Na-tal, esta ocorrida num Carnaval dos anos 60. A porta-bandeira Vilma Nascimento, muito atrasada, seguianervosa num táxi para o desfile, que na época se rea-lizava na Avenida Rio Branco, quando ouviu pelorádio que a festa tinha sido paralisada a pedido doPresidente da Portela, para que limpassem a pista. Aochegar à concentração da escola, Vilma notou umgrupo de repórteres em volta de um carro alegóricoatravessado na pista, supostamente com uma rodaquebrada. José Carlos contou o desfecho da história.Ao vê-la aproximando-se, Natal avisou: “Pessoal,pode botar a roda que a Vilma já chegou”.

— Ele era polêmico, mas foi uma liderança muitoimportante – frisou José Carlos Rego.

Natalino José do Nascimento, oNatal – O homem de um braço só,título de uma samba de JoãoNogueira –, tornou-se figura populare controvertida por façanhas nacontravenção do jogo-do-bicho eno segmento escolas de samba,quando presidente da Portela. Ele équase mito em Madureira, bairroconsiderado a Capital do Samba, eno mundo do samba em geral.

Nascido em 31 de julho de1905 na cidade de Queluz, interiorde São Paulo, Natal chegou meninono Rio de Janeiro, onde morreu a8 de abril de 1975. Parte dainfância passou na miséria, que

Contraditório, mas com certeza queridoainda nos dias de hoje, acrescidade violência, castiga principalmenteos morros e favelas do Rio.Ferroviário da Central do Brasil, eleteve o braço direito amputado em1925, vítima de acidente de trem.Em 1928, para complementar apífia pensão por invalidez, ingressouno jogo-do-bicho. A partir daí avida foi marcada por perseguiçãopolicial, prisões e envolvimento emcrimes. Foi talvez o mais populardos banqueiros do jogo-do-bichoque dominaram e que aindacomandam a maioria das principaisescolas de samba.

À frente da presidência da

Portela, a escola obteve váriostítulos. Alguns conquistados “namarra”, como dizia. Em 1960, porexemplo, provocou uma grandebriga na apuração, ao impor a idéiade que cinco escolas deveriam secampeãs; com isso, proporcionou àPortela o título de tetracampeã.

Natal é ou não é fundador daPortela? Para alguns, ele era ligadoao futebol, ao Madureira FutebolClube, e só ingressou na escola emfins da década de 40. Outrosgarantem que Natal é fundador daescola, no que seria precoce, poisem 1923, quando a Portela foicriada, ele ainda completaria 18 anos.

A Portela festeja na ABI o centenário de seu grande líder.

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Jornal da ABI

26 Setembro/Outubro de 2005

ACONTECEU NA ABI

Resgatar idéias e biografias de gran-des figuras do jornalismo no País nosdois últimos séculos é a idéia que nor-teia a coleção Imprensa brasileira — Per-sonagens que fizeram história, cujo pri-meiro volume foi lançado em 14 desetembro na ABI, no Salão JoãoMesplé, hall do Auditório Oscar Gua-nabarino. Organizada pelo ProfessorJosé Marques de Melo, a obra reúnetextos de nomes como Hi-pólito José da Costa, patro-no da imprensa brasileira efundador do Correio Brazi-liense, Rui Barbosa, AssisChateaubriand, Gustavo deLacerda, fundador e primei-ro Presidente da ABI, e Bar-bosa Lima Sobrinho, — trêsvezes Presidente da Associ-ação, biografados no livro.Em 221 páginas, o leitor ésurpreendido com a ousadia e a li-derança de todos os jornalistas bio-grafados.

Sinval de Itacarambi Leão, diretor-editor da revista Imprensa, publicaçãoque também patrocina o projeto, achaque a maior contribuição da coleção éservir como fonte para a pesquisa quepara atual geração de estudantes de Jor-nalismo:— Essa obra tem um pé nopassado e outro no futuro. No passa-do, porque é um resgate de pessoas quecontribuíram de forma significativapara o desenvolvimento e enriqueci-mento da imprensa brasileira. O futu-ro está no fato de que em 2008, quan-

Uma coleção comUma coleção comUma coleção comUma coleção comUma coleção como pé no passadoo pé no passadoo pé no passadoo pé no passadoo pé no passadoe o olho no futuroe o olho no futuroe o olho no futuroe o olho no futuroe o olho no futuroLançada na ABI aprimeira de uma sériede obras destinadas amostrar quem fez o quêna imprensa brasileira.

do teremos lançado a coleção comple-ta, estaremos comemorando os 200anos da imprensa no Brasil.

Ana Arruda Callado, que contribuiuno livro com um artigo sobre JennyPimentel Borba e a saga das jornalistas-empresárias brasileiras, considera queo mais importante da coleção é que elapermitirá que se faça um importantelevantamento histórico sobre a impren-sa no País: — Entrei nisso para falar deJenny Pimentel Borba, que é uma figu-ra importante, mas pouco conhecida. Eacho esse livro muito bom, porque nãoé uma obra isolada. Outros volumes vi-rão, e com jornalistas igualmente im-portantes. Essa publicação é bela, por-que faz parte de um grande trabalhoque é a recuperação da história da im-

prensa no Brasil.Carmem Pereira, jorna-

lista e mestre em CiênciaPolítica pela Pontifícia Uni-versidade Católica do Riode Janeiro, conta que resol-veu escrever sobre Rui Bar-bosa porque poucos conhe-cem a sua contribuição aojornalismo: — Rui foi umbrasileiro ilustre e muitoconhecido, com atuação

destacada no cenário político nacionale internacional, mas poucos conhe-cem a sua trajetória como jornalista.Rui teve textos publicados na impren-sa ao longo de 50 anos.

Idealizada pela Rede Alfredo de Car-valho, assim denominada em home-nagem ao historiador pernambucanoque começou, no fim do século XIX, apesquisar e inventariar o panoramados jornais e revistas publicados noBrasil, a série pretende suprir exata-mente lacunas como essa citada porCarmem e servir como fonte de pes-quisa para os interessados em resgatara história da nossa imprensa.

Os alunos dos Cursos Livres de Jor-nalismo promovidos pela ABI recebe-ram certificados de participação, duran-te cerimônia realizada em 15 de setem-bro, na Sala Belisário de Souza, um dosauditórios da Casa. Cerca de 200 alu-nos foram capacitados na primeira fasedo projeto, que começou em abril de2005 e terminou em abril deste ano.

A cerimônia de aberturado evento foi conduzida peloPresidente da ABI, MaurícioAzêdo, que convocou para amesa os jornalistas e profes-sores Admar Branco, AndréLouzeiro, Antônio Nery,Chico Otávio, Jorge AntonioBarros, Mário AugustoJakobskind, Vitor Iório e ZildaFerreira. Maurício felicitouos alunos e associados da ABIenvolvidos na organizaçãodos cursos e agradeceu o em-penho de todos em transmi-tir aos alunos os conhecimen-tos necessários ao exercíciodo bom jornalismo: — Oscursos livres marcaram a retomada,pela ABI, da programação de aperfei-çoamento profissional. Foi uma inicia-tiva que encontrou boa acolhida entreestudantes de Comunicação Social etambém junto ao corpo de associadosda nossa instituição, que tiveram a res-ponsabilidade de ministrar a capaci-tação, que foi objeto de aplauso dos alu-nos inscritos.

Vitor Iório, Coordenador-Geral dosCursos Livres, disse que o resultado al-cançado compensou o esforço da atu-al administração. — Esse projeto nostomou um tempo precioso, mas quefoi consagrado com o resultado positi-vo alcançado. Tivemos a oportunida-de de reciclar os antigos jornalistas epreparar, à luz da experiência, aquelesque representam o futuro.

Os cursos tiveram a duração de 30horas/aula e ofereceram capacitação nasdisciplinas Jornalismo Investigativo,Cobertura de Segurança Pública, Co-bertura do Fato Cultural, JornalismoEconômico, Cobertura do Fato Políti-co, A Reportagem e o Cinema, Améri-ca Latina Fora da Mídia, Fotografia, Jor-nalismo Ambiental, Jornalismo Digi-tal, Locução no Jornalismo, Reporta-gem e Texto Esportivo, Revisão e Copi-desque, Gestão em Comunicação Soci-al e Jornalismo Popular.

Para Nivaldo Pereira, aluno do cursode Jornalismo Investigativo, a ABI deuum grande passo para ajudar a formarbons jornalistas que venham a contri-buir para crescente liberdade de expres-são: — Espero que esse tipo de iniciati-va tenha continuidade e que a ABI con-tinue a exercer esse papel, para que aimprensa e os jornalistas possam exer-cer a liberdade de pensamento.

Maria Luiza Muniz, aluna do 6ºperíodo de Comunicação na Universi-dade Federal Fluminense, fez Jornalis-

A hora do canudoA hora do canudoA hora do canudoA hora do canudoA hora do canudoEm cerimônia singela, alunos dos Cursos Livresreceberam seus certificados de participação.

mo Econômico e se disse satisfeita como que aprendeu: — O que eu mais gos-tei no curso foi que ele permitiu aosalunos aprender o que um repórter deEconomia tem que saber e ganhar noexercício da função, com uma amplavisão social e de mercado.

André Madruga, recém-formadopela Faculdade Hélio Alonso-Facha, foi

Editor da revista Imprensa,Sinval de Itacarambi Leão é um

dos idealizadores da coleção,que conta com estudos de Ana

Arruda (à esq.) e CarmemPereira, entusiastas do Projeto.

O repórter Chico Otávio (à esq., no alto) comseu aluno Nivaldo Pereira. O fotógrafo Antônio Nery

(à dir., abaixo) com seu aluno Celso Pupo.

aluno de Cobertura do Fato Político etambém gostou do nível do curso daABI: — Foi muito bom. Acho inclusi-ve que o momento em que me inscre-vi não poderia ter sido melhor, pois oprofessor Antonio Idaló nos ensinou acompreender as questões atuais queenvolvem o ambiente político contur-bado em que se encontra o Brasil.

Chico Otávio, repórter especial daEditoria Nacional do Globo, deu aulasde Jornalismo Investigativo e aprovouo resultado do projeto: — Adorei, prin-cipalmente pela oportunidade de atrairpara a ABI estudantes e jovens jornalis-tas, que poderão se tornar associados daCasa, contribuir para a instituição eusufruir melhor das suas ações. Esperoque o projeto tenha continuidade.

Grande também foi o entusiasmoda professora, jornalista e poetisaMarylena Barreiros Salazar, que cur-sou Jornalismo Ambiental: — É inten-sa a minha emoção por estar nesta Casa,que provocou uma grande revoluçãona minha alma. Nós, alunos, nos tor-namos multiplicadores deste momen-to que a ABI está nos proporcionando.

Após a cerimônia de entrega dos cer-tificados, alunos e professores foramconvidados para um coquetel servidona Sala Heitor Beltrão.

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27Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

COMEMORAÇÃO

“AQUI RETUMBARAM HINOS!”Militante e historiadora da campanha do petróleo,a médica Maria Augusta Tibiriçá se emociona aolembrar, em ato comemorativo dos 52 anos daPetrobrás, os atos cívicos realizados na ABI.

O Brigadeiro Rui Moreira Lima, Pre-sidente da Associação DemocráticaNacionalista dos Militares-Adnam, ea médica Maria Augusta Tibiriçá, Pre-sidente do Movimento em Defesa daEconomia Nacional-Modecon, evoca-ram em ato público realizado na ABI,no dia 3 de outubro, os momentos ini-ciais da campanha O petróleo é nosso,de que ambos participaram. O ato foiorganizado pela Associação dos Enge-nheiros da Petrobrás-Aepet para come-morar o 52º aniversário da Lei nº 2.004,de 3 de outubro de 1953, que instituiuo monopólio estatal do petróleo.

Maria Augusta, que é autora de umlivro considerado clássico sobre a cam-panha, lembrou que o movimento pelomonopólio estatal do petróleo foi lança-do pelo Centro de Estudos e Defesa doPetróleo e da Economia Nacional, cria-do em 4 de fevereiro de 1948, no auditó-rio da ABI. “Aqui retumbaram hinos!”,disse Maria Augusta, que se emocionouao fazer esta evocação e defendeu a ne-cessidade de restabelecimento da inte-gridade do monopólio estatal do petró-leo, rompido pela Lei nº 9.478, propostaao Congresso em 1997 pelo então Presi-dente Fernando Henrique Cardoso.

Brasileira, na campanha contra o na-zismo nos céus da Itália, recordou ain-da que nessa época era um jovem pilo-to do Correio Aéreo Nacional e ia àscidades mais longínquas do País, espe-cialmente na Amazônia e no Nordes-te, para distribuição de correspondên-cia. Ele contou que mesmo em cidade-zinhas do interior via inscrições emmuros com o slogan da campanha Opetróleo é nosso.

“O petróleo é mágico”, disse Mo-reira Lima, que elogiou a Aepet porsua permanente atuação em defesa daempresa.

O hino, com vigorDo ato participaram, entre outros,

o Deputado estadual Paulo Ramos(PDT); o Coronel Luiz Augusto Hor-ta Barbosa, filho do General Júlio Cae-tano Horta Barbosa, que iniciou a lutapelo monopólio estatal do petróleo emmemorável conferência no Clube Mi-litar; o sindicalista Abílio Tozzini, re-presentante do Sindicato dos Petro-leiros do Município do Rio de Janei-ro, e o Diretor da Petros, fundo de pre-vidência dos empregados da Petrobras,Sérgio Lira.

Como queria Maria AugustaTibiriçá, o ato foi aberto com a trans-missão do Hino Nacional e encerradocom o Hino da Independência, ambosentoados com vigor pela assistência,especialmente nos versos “Ou ficar aPátria livre/Ou morrer pelo Brasil.

Lançado pela Editora Insular, o livroViagens de um repórter — um barriga-

verde na terra azul” re-úne impressões das vi-agens que o jornalistaPaulo Ramos Deren-goski realizou duran-te 30 anos por iniciati-va própria, a convite degovernos estrangeirose a trabalho.

Narrando suas an-danças, Paulo procuraabordar com riquezade detalhes os aspectossocioculturais, geo-

gráficos e históricos das regiões visita-das. O texto de orelha, assinado por Pau-lo Henrique Ribeiro, destaca que eleconseguiu “mostrar que através das vi-agens pode-se combinar imaginação erealidade; ver o mundo como ele real-mente é, além dos frívolos ou trágicosacontecimentos do dia-a-dia”.

O jornalista Paulo Ramos Derengo-ski é natural de Lages, Santa Catarina,e começou sua carreira no extinto jor-nal Última Hora, no Rio de Janeiro, sen-do depois transferido para Porto Alegrecomo repórter especial. Trabalhou tam-bém na Folha de S. Paulo e na revistaManchete. Ao longo da carreira, fez inú-meras viagens internacionais. Há maisde duas décadas ele se radicou em Lages,mas continua produzindo e publican-do textos com limpidez de estilo e finacapacidade de observação e descrição.

Derengoski,o que correueste mundo

O Instituto Triangulino de Cultu-ra, com sede em Uberaba, MG, inau-gurou um portal na internet com oobjetivo de facilitar o acesso aos exem-plares da revista Dimensão e aos livrosque edita desde 1995.

No catálogo da instituição podemser encontrados vários títulos sobre ahistória dos primeiros cem anos do ci-nema e os seis volumes da coleção En-saios de crítica cinematográfica, quecomeça com O cinema de Bergman evai até O cinema brasileiro nos anos 90— novos filmes, do crítico . ensaísta epoeta Guido Bilharinho, que produzno aparente isolamento de Uberabauma sólida obra de crítica cinemato-gráfica, uma das mais densas e versá-teis realizadas no País.

Os livros sobre literatura abordam,entre outros temas, a crítica e a poesia— como o ensaio-antologia A poesia emUberaba: do modernismo à vanguarda,de 2003.

Em Uberaba,o portal deBilharinho

LIVROS

Um grupo de 36 estudantes de Ar-quitetura da Escola de Engenharia deSão Carlos, da Universidade de SãoPaulo, percorreu o Edifício HerbertMoses, sede da ABI, como parte de umroteiro de visitas a construções histó-ricas do Centro do Rio.

Os alunos conheceram os principaisandares do prédio, sob a coordenaçãodo Professor Joubert Lancha, do De-partamento de Arquitetura e Urbanis-mo da Universidade. Lancha revelouque a visita integra a programação dosegundo ano do curso, no qual os estu-dantes fazem um estudo prévio dasobras que marcam a história da arqui-tetura moderna do País — Em seguida,vamos a campo para conhecer as obras.Fazemos isso habitualmente — disseo professor, que, embora já conhecesseo edifício-sede da ABI, trouxe pela pri-meira vez um grupo de universitáriospara visitá-lo.

O estudante Marlon Longo ficouempolgado com o que viu: — É baca-na vermos o que só conhecíamos pe-los livros. Na verdade, fazemos o estu-

do de um projeto e apenas depois va-mos ver como ele realmente foi feito.E a grande vantagem é que tivemos aoportunidade de entrar no prédio, poisàs vezes é difícil conseguirmos permis-são para entrar nas dependências deuma construção importante. Tivemossorte aqui no Rio, pois conseguimosentrar em todos os lugares que visita-mos. Em São Paulo é mais difícil.

Tereza Cordido, estudante da pós-graduação, impressionou-se com as so-luções adotadas pelos irmãos Rober-to.— Eles fizeram uso de uma tecnolo-gia pioneira, através de uma resoluçãogenial. Imagino o quanto foi difícil pa-ra, naquela época, construir um edifí-cio como este, porque o surgimento dagrua, por exemplo, é posterior ao perío-

VISITA

Estudantes deSão Carlosencantados coma sede da ABI

do. Aqui é tudo racionalizado, dentrode uma tecnologia não racionalizada. Éuma obra espartana, extremamenteelegante e rica em detalhes. E o espaçoestá muito bem conservado, pois mes-mo as intervenções têm respeitado oprojeto original.

Também estudante da pós-gradua-ção, Thaís Cruz admirou a constru-ção:— Gostei muito do prédio. A no-ção do “ao vivo” é muito melhor doque aquela dos livros e vídeos. Aquipodemos ver o entorno, ver como oprédio se encaixa na paisagem urbana,contrastando com outras construções.O que me surpreende também é verque não só o edifício da ABI, mas vári-os outros no Rio estão passando porobras de restauração.

“O petróleo é mágico”Rui Moreira Lima lembrou que em

julho de 1948, quatro meses após a cri-ação do Centro de Estudos e Defesa doPetróleo e da Economia Nacional, acampanha do petróleo ganhou as ruascom a realização de manifestação noLargo do Russel, na qual teve papeldestacado o professor e jornalistaHenrique Miranda, ex-Vice-presiden-te da ABI falecido recentemente.

Contou Moreira Lima que Miran-da identificou a presença na assistên-cia de Charles Borer, irmão do Dele-gado Cecil Borer, Diretor do Dops (De-partamento de Ordem Política e So-cial), órgão de repressão do regime.Charles comandaria uma turma paraprovocar incidentes durante o ato. Aodiscursar na manifestação, com suavoz poderosa, Miranda dirigiu-se di-retamente a Charles Borer e o adver-tiu de que seria responsabilizado porqualquer violência contra os manifes-tantes. Denunciado publicamente,Charles Borer desistiu da provocaçãoque planejara, juntamente com o ir-mão Cecil Borer.

Moreira Lima, que foi um dos he-róis do Grupo de Caça da Força Aérea

O grupo de alunos de Arquitetura de São Carlos: os homens são pequeno contingente.

O endereço do portal éwww.institutotriangulino.com.br.Correspondência pode ser enviadapara a instituição pelo [email protected] para Caixa Postal140, Uberaba, MGCep 38001-970.

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Jornal da ABI

28 Setembro/Outubro de 2005

Cerca de 800 pessoas superlotarama sede da ABI, no Centro do Rio, no dia26 de agosto, para o lançamento daFrente Parlamentar Brasil Sem Armas,que visava a promover a campanhapela vitória do sim no plebiscito sobrea proibição de armas marcado para 23de outubro seguinte. Estiveram presen-tes à ,manifestação, entre vários líde-res políticos de prestígio, o Presidentedo Senado e também Presidente daFrente, Senador Renan Calheiros; oVice-Governador do Estado do Rio,Luiz Paulo Conde; o Prefeito de SãoPaulo, José Serra; o Senador SérgioCabral Filho; o Secretário-Executivodo movimento, Deputado RaulJungmann, e a Deputada JandiraFeghali, que teve participação desta-cada na organização do ato.

Também compareceram ao lança-mento o Deputado Federal AntonioCarlos Biscaia; os Deputados EstaduaisPaulo Pinheiro, Edmilson Valentim,Leandro Sampaio e Carlos Minc; osVereadores Andréa Gouvêa Vieira eEliomar Coelho, além de outros repre-sentantes políticos de vários Municípi-os do Estado. Entidades religiosas, orga-nizações não-governamentais, sindica-tos, associações de vítimas e outras en-tidades que apoiavam a campanha dosim também marcaram presença.

Renan Calheiros citou as estatísti-cas do crime e das armas de fogo noBrasil para ressaltar o que ele conside-ra um “equívoco” de pessoas que pen-sam se proteger estando armadas. “Pre-cisamos enfrentar a epidemia da vio-lência por arma de fogo. Temos quedizer sim, para a mudança dessa cul-tura”, sustentou.

O Vice-Governador Luiz PauloConde fez questão de parabenizar osorgani-zadores do evento, ressaltandoa importância de iniciativas que visemao combate à violência, e afirmou queo Governo do Estado do Rio de Janeirodaria todo apoio à campanha:— EssaFrente representa um fato positivopara o controle das armas no País e, con-seqüentemente, da violência no Bra-sil. Quanto menos armas nós tivermos,menor será a violência.

No seu discurso a Deputada JandiraFeghali (PCdoB-RJ) citou a violênciacom uso de armas de fogo que atingeas mulheres em todo o Brasil, frisandoo “papel decisivo” da população femi-nina na discussão do assunto. Jandiraacentuou, também, que a diminuiçãodos índices de criminalidade somenteserá efetiva se as armas de fogo foremretiradas de circulação. A Deputada fezainda severas críticas à indústria dearmas, que segundo ela “lucra com a

PLEBISCITO

A utopia do Brasil sem armasRenan, Serra, SérgioCabral, Conde, Feghali,Biscaia e outros líderesde prestígio vieram àABI lançar a propostaque não pegou.

Ao participar do painel Os Tribunaisde Contas e os Meios de Comunicaçãocom a Sociedade”, em Gramado, RioGrande do Sul, no dia 11 de outubro, oPresidente da ABI, Maurício Azêdo,sugeriu a produção de um manual des-tinado aos jornalistas com informaçõesbásicas sobre os Tribunais de Contas,suas funções e suas atividades, a fimde familiarizar os profissionais de im-prensa com as questões ligadas ao cha-mado controle externo — a fiscaliza-ção das contas públicas por esses Tri-bunais.

O Presidente da ABI participou dopainel juntamente com o representan-te da Associação Nacional de Jornais,Marcelo Rech, que é Diretor de Reda-ção do diário Zero Hora, de Porto Ale-gre, e do Auditor Inocencio HernándezGonzález, membro da Audiência deContas das Ilhas Canárias, região autô-noma da Espanha. O coordenador dopainel foi o jornalista Salomão RibasJúnior, Conselheiro do Tribunal, subs-tituindo membro pelo título do cargo.

Segundo a intervir no debate, apóso representante da ABI, que abriu essasessão do XXIII Congresso dos Tribu-nais de Contas do Brasil / I CongressoInternacional dos Sistemas de Contro-le Externo Público, Marcelo Rech ob-servou que se multiplicaram no mun-do inteiro os meios de comunicação, atal ponto que uma cidade como NovaYork tem mais de 500 rádios comuni-tárias, sintoma da pulverização dasfontes de informação com que a cida-de conta atualmente:

— Com o advento da internet —disse Rech —, nosso principal encargonum jornal diário não é buscar infor-mações, mas descartar 95% do materi-al informativo que nos chega.

Justificando a proposta de produçãodo manual sobre o controle externo, oPresidente da ABI disse que já houveuma iniciativa pioneira do gênero,com a edição do manual Por dentro doMPF — Ministério Público Federal parajornalistas, de Maria Célia Néri de Oli-veira, com o qual a Procuradoria-Ge-ral da República e a Escola Superior doMinistério Público da União oferecemaos jornalistas, de forma didática, co-nhecimentos essenciais sobre o Minis-tério Público Federal. Um manual des-se tipo — Por dentro dos Tribunais deContas — O controle externo para jor-nalistas ––, disse Maurício Azêdo, “po-derá oferecer contribuição inestimá-vel ao Sistema Tribunais de Contas eaos responsáveis pela mídia” na cober-tura das atividades e decisões dessesórgãos.

A ABI manifestou no Conselho daTransparência Pública e Combate àCorrupção, órgão da Controladoria-Geral da União de que ela é membro,seu interesse na aprovação da propostade melhoria do controle de recursos fe-derais transferidos a Estados e Municí-pios, através de anteprojeto de lei queserá submetido à apreciação do Presi-

morte”, e alertou para o trei-namento que deve ser feitocom as forças policiais na re-pressão ao armamento.

Lembrando que a FrenteBrasil Sem Armas foi “umacampanha de mobilização”, osociólogo Rubem CésarFernandes — coordenador-ge-ral da ong Viva Rio e Secretá-rio-Executivo da Frentefluminense — defende a par-ticipação de toda a sociedadeno debate sobre as armas defogo no País.

O cantor Marcelo Yuka, ex-Rappa, que ficou paraplégicohá quatro anos, por causa deum ferimento com arma defogo, compareceu à sede daABI como representante daclasse artística e disse que nãoacredita em “paz armada”. De-clarou voto na campanha dosim, afirmando que o referen-do era “uma luta contra a vio-lência com inteligência”.

Última personalidade a sepronunciar, o Prefeito de São Paulo, JoséSerra, declarou que a utilização de ar-mas de fogo acaba alimentando a vio-lência, que não deve ser combatida commais violência. Logo à sua chegada naABI, o Prefeito chegou a ser vaiado porum grupo de estudantes da União daJuventude Socialista. José Serra foi cha-mado de “golpista” por uma parcela dejovens da organização, que carregavamuma faixa com os dizeres “A juventudecontra o golpe direitista”.

Para evitar um incidente maior, oPresidente da ABI, Maurício Azêdo, in-terveio em apoio ao Prefeito paulistano,antes de este discursar. Pedindo à pla-téia “respeito à civilidade e à educaçãopolítica”, Maurício lembrou que a ABIé uma Casa que prima pela liberdade epela pluralidade. Após sua intervenção,Serra foi ouvido com respeito pela as-sistência, que foi comedida nos aplau-sos Os jovens da UJS não repetiram asmanifestações de hostilidade.

Com um vademecumdesses, o uso dasverbas contaria commelhor cobertura.

CONFERÊNCIA

Um manualpara entenderos Tribunaisde Contas

A ABI defendemelhor controledos recursos quea União repassa

dente Luiz Inácio Lula da Silva.Segundo estudo apresentado por

Paulo Roberto Wiechers Martins, re-presentante do Tribunal de Contas daUnião, na reunião do Conselho de 20de setembro, o sistema atual de con-trole apresenta uma série de falhas edeficiências, que resultam na perda deeficácia na aplicação dos recursos, alémdos prejuízos causados em função dosdesvios de valores.

O estudo do representante do TCUdestaca que, no atual modelo, “cerca dedois terços das ações governamentaisna esfera federal são realizados de for-ma descentralizada pelos diversos Es-tados da Federação”. Outra questão res-saltada no parecer de Paulo RobertoWiechers é que o atual modelo de ges-tão pública, introduzido a partir da re-

forma do Estado, é descentralizador, ouseja, “é voltado para a redução do ta-manho do Estado”.

Paulo Roberto Wiechers diz que onovo modelo de Estado, traçado a par-tir da reforma administrativa, apresen-ta maior possibilidade de transferên-cia de recursos para a execução de des-pesas e que as inovações introduzidasno âmbito da administração públicabrasileira “têm impacto direto na atua-ção do controle interno, externo e so-cial, forçando uma adequação às mu-danças ocorridas”. Ele assinala que aintempestividade é o ponto crítico dasações de controle de repasses. “O ideal— diz — é que haja um acompanha-mento mais concomitante da execuçãodas despesas, com vista a evitar o des-perdício de recursos”.

Conde: Quanto menos armas tivermos,menor será a violência.

TRANSPARÊNCIA

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29Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

HOMENAGEM

Em 27 de outubro aconteceu na ABIa abertura do 1º Congresso Internacio-nal de Jornalismo Investigativo, pro-movido pela Associação Brasileira deJornalismo Investigativo-Abraji e pelaPontifícia Universidade Católica doRio de Janeiro. O evento foi aberto comhomenagens a Tim Lopes e VladimirHerzog, seguidas da palestra 50 anos dereportagem”, de José Hamilton Ribeiro,e debate.

Para compor a mesa inicial, foramconvidados o Presidente da ABI, Mau-rício Azêdo; o Presidente do Sindicatodos Jornalistas Profissionais do Muni-cípio do Rio de Janeiro, Aziz Filho; oPresidente da Abraji e ombudsman daFolha de S.Paulo, Marcelo Beraba; os jor-nalistas Chico Otávio e José HamiltonRibeiro; e os professores FernandoFerreira e Álvaro Caldas.

Aziz Filho cumprimentou os congres-sistas ressaltando a importância do con-gresso para o jornalismo investigativo elembrando Tim Lopes como um marcoda cobertura da guerra do tráfico carioca:

— Ele investigava a alma das pesso-as. Tudo indica que a tragédia de suamorte foi devida à perda de seu anoni-mato com o Prêmio Esso, mas isso de-sencadeou uma série de discussões so-bre segurança nas redações.

Maurício Azêdo iniciou sua inter-venção lamentando a perda do jorna-lista Roberto Moura, Conselheiro daABI a cujo enterro comparecera pelamanhã. Em seguida, relembrou os tem-pos em que trabalhou com José Hamil-ton na revista Realidade e disse ser umahonra para a ABI abrigar a abertura deum congresso que homenageia duas fi-guras tão importantes: Tim e Vlado.

— A morte de Herzog motivou um

silêncio pungente neste auditório. AABI havia proposto que se fizesse umamissa em sua memória na Igreja de San-ta Luzia, onde normalmente a institui-ção realizava seus atos religiosos, masDom Eugênio Sales proibiu a aberturada Igreja para os manifestantes. Fize-mos então o ato com grande conster-nação neste Auditório Oscar Guana-barino. Desejamos que este Congressoda Abraji seja um ponto alto da presen-ça de jornalistas nas mudanças sociais.

O professor Fernando Ferreira lem-brou-se de quando foi estudante de Jor-

Uma noite para Tim e HerzogCongresso de Jornalismo Investigativo presta homenagem aos dois e ao repórter José Hamilton Ribeiro.

nalismo da PUC-Rio e deuma entrevista de CarlosLacerda da qual partici-pou: - Ele respondia às per-guntas enquanto escreviamais um de seus caudalo-sos editoriais. Ao mesmotempo, emitia conceitospolíticos formidáveis. Foimuito mais estimulanteque a sala de aula.

Declarando-se feliz pelofato de José Hamilton Ri-beiro ter concordado emfazer a palestra de abertu-ra do Congresso, MarceloBeraba convidou os parti-cipantes a assistir a umvídeo em homenagem aojornalista, a quem entregouuma placa comemorativa,dizendo:

— Suas reportagensdespertam para o prazerdo texto, de acompanharuma história bem conta-da, e provam que um jor-nalismo bem-feito nãotem que ser chato, pedan-

te ou hermético.Descontraído, José Hamilton levou

a platéia diversas vezes às gargalhadas,principalmente quando disse que “an-tigüidade só é posto no Exército”.

— No jornalismo é diferente, o queeu aprendi ontem pode mudar hoje.Fico lisonjeado em participar desteCongresso, no qual devemos valorizaros repórteres que buscam a verdade portrás das notícias.

Ele recordou o período em que tra-balhou na Folha de S.Paulo e grandes re-portagens que produziu. Segundo dis-

VIDAS

O jovem Luiz Alexandre LafayetteStockler entrou na ABI pela mão deHerbert Moses, em 5 de maio de 1944.A expressão pela mão tem aí razão deser: Luiz Alexandre completara 20 anosmenos de um ano antes em 5 de setem-bro de 1943, e tateava no encaminha-mento profissional. Ele acabou desvia-do do jornalismo, que não constituíaentão uma profissão consolidada nemde remuneração atraente. O jovem Luiz

Alexandre ingressou então na Polícia doentão Distrito Federal como inspetor,aplicou-se à atividade funcional e alcan-çou os mais importantes cargos da hie-rarquia policial, entre eles, no GovernoChagas Freitas, o de Superintendenteda Polícia Judiciária, o mais elevado deuma autoridade civil na Secretaria deEstado de Segurança Pública.

Stockler, o sobrenome com que pas-sou a ser conhecido, não era homemde enjeitar desafios. Acusado injusta-mente pelo Governador do Estado daGuanabara, Carlos Lacerda, levou-o aostribunais, onde saiu vitorioso, em epi-sódio singular na trajetória de Lacerda,que não costumava perder os embatesem que se empenhava. Encerrado oprocesso, Lacerda apresentou descul-pas em público pelas inverdades assaca-das contra a honra de Stockler. Foi essaaltivez que impôs Stockler ao respeitodos colegas da Polícia e o transformouem líder da categoria: foi fundador eprimeiro Presidente da Associação Bra-

sileira dos Delegados de Polícia e daAssociação dos Delegados de Polícia doEstado do Rio de Janeiro. Como Dele-gado, recebeu diversas honrarias, entreas quais a Medalha de fidelidade àGuanabara e o Diploma de Bons Servi-ços Prestados à Guanabara. Preocupadocom o aperfeiçoamento profissionaldos companheiros, promoveu com oDelegado Antônio Malfitano a revisãoe atualização, em quarta edição, do NovoManual do Delegado, obra em dois vo-lumes de autoria de Amintas Vidal Go-mes, Delegado do Departamento deInvestigações de Minas Gerais, lançadaem 1978 pela Editora Forense.

Após aposentar-se, Stockler pôdededicar-se a duas paixões: o hipismo,que incentivou como Presidente daFederação Eqüestre do Estado do Riode Janeiro e membro do Conselho daConfederação Brasileira de Hipismo,e as artes plásticas, que lhe proporcio-naram grandes alegrias por cerca deduas décadas, com os inúmeros prêmi-

os que conquistou nas muitas mostrasde que participou. Aluno de pintura,desenho e xilogravura da ProfessoraMisabel Pedrosa e de pintura de SandroDonatello e Gian Paolo, Stockler ga-nhou a partir de 1985 medalhas deouro, de prata e de bronze e mençõeshonrosas em destacadas mostras ecompetições.

Fiel à ABI nos seus 61 anos devinculação à Casa, Stockler participouda eleição de abril de 2005, quando re-cebeu as homenagens dos companhei-ros, como José Gomes Talarico, que ociceroneou desde a chegada até ao lo-cal de votação, no nono andar do Edi-fício Herbert Moses, e à saída, no tér-reo, onde Stockler foi cumprimenta-do por integrantes da Chapa Prudentede Morais, neto. Ele faleceu no dia 18de agosto, de complicações advindasde problemas cardíacos. Deixou viúvaa Senhora Maria Alice Antunes MacielLafayette Stockler, seis filhos, onzenetos e um bisneto.

se, porém, foi a guerra do Vietnã, ondeperdeu uma perna ao pisar numa minaterrestre, que o fez famoso por 15 dias:

— Eu estava na pauta de todos os jor-nais e revistas do País. Certa vez me per-guntaram se era difícil ser repórter comum perna só. Respondi que não, que eramais fácil do que se tivesse quatro.

José Hamilton fez um balanço deseus 50 anos de carreira e emocionou-se ao fim do discurso, sendo aplaudidode pé pela platéia:

— Somo 25 anos de jornalismo im-presso e mais 25 de televisão. O repór-ter de papel pode ser conhecido e o deTV, reconhecido. Nesse tempo, o Brasilmelhorou, o jornalismo melhorou, coma captação de novos talentos a partirda exigência do diploma. Mas a mudan-ça mais dramática foi a invasão da mu-lher nas redações. Quando comecei,havia apenas três na Folha. É com muitaemoção que agradeço esse convite, quepara mim é um ato de generosidade.

O professor Álvaro Caldas disse quea homenagem a José Hamilton simbo-liza o reconhecimento do trabalho dorepórter: — Ele faz parte de uma gera-ção com forte espírito de investigação.Hoje, as empresas se tornaram grandesconglomerados e o repórter perdeu es-paço e autonomia, além de ser prove-dor de conteúdo, pois produz materialpara todas as mídias. Antigamente, umbom repórter era a grife da redação. Épreciso reconhecer essa função, sem aqual não existe jornalismo.

Em seguida, o debate foi aberto à pla-téia. O jornalista Chico Otávio foi omediador e o público participou inten-samente. O Congresso teve prossegui-mento no dia seguinte, em dependên-cias da Puc.

Stockler,delegadoe artista

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Jornal da ABI

30 Setembro/Outubro de 2005

VIDAS

A mensagem de Tereza Cristina co-municando — “com uma dor profun-da no coração e na alma” — o faleci-mento do marido, Roberto M. Moura,e convidando para o velório noMemorial do Carmo pegou de surpre-sa os amigos do jornalista, que, aos 58anos, morreu no dia 26 de outubro, noRio, vítima de febre maculosa, doençatransmitida por carrapatos infectados.

Sócio número 1.672 da ABI, onde in-gressou em 1977, e membro efetivo doConselho Deliberativo, Roberto Mourafaleceu às oito horas da noite no Hospi-tal São Lucas, em Copacabana, onde ha-via sido internado. Ele contraiu a febreao se hospedar numa pousada emPetrópolis, na região serrana fluminen-se, e resistiu umas poucas horas.

Além de sua mulher, do casal de fi-lhos e outros parentes, compareceramao funeral de Roberto, no Cemitério doCaju, dezenas de amigos, alunos e ex-alunos das Faculdades Integradas HélioAlonso (Facha), jornalistas e represen-tantes da ABI, como o Presidente da en-tidade, Maurício Azêdo; a Diretora deJornalismo, Joseti Marques; e os Conse-lheiros Sérgio Cabral, Amicucci Gallo,Domingos Xisto e Chico Paula Freitas.

Também estiveram presentes mú-sicos, produtores culturais, pesquisa-dores e professores — entre eles amuseóloga Lygia Santos, filha deDonga, e o jornalista José Carlos Rego,ambos membros do júri do Estandartede Ouro de O Globo, que Roberto inte-grou por 28 anos; o compositor Sílvioda Silva Júnior; o violonista CláudioJorge; e Moacyr Luz, que comentou:— Eu teria muitas coisas para falar doRoberto, inclusive menciono no meulivro (Nos butiquins mais vagabundos)que ele foi o primeiro jornalista a citarmeu trabalho como compositor. Eraum grande amigo de bar, de samba ede projetos. Fizemos vários trabalhosjuntos, como O samba falado, e atual-mente ele estava cuidando do roteirodo show de lançamento do meu CDVoz e violão e do projeto Sedução e voz.Acima de tudo, Roberto era meu com-panheiro de toda hora, vou sentir mui-ta falta desse parceiro que era a cara dacultura do Rio.

Muito emocionado, Sérgio Cabralexaltou o trabalho de Roberto Mouracomo pesquisador da MPB: — Era umbrilhante analista da nossa música eda cultura popular de maneira geral.

A morte de surpresa de

Uma febre contraídanum fim-de-semanalevou-o no vigor daprodução intelectual.

Roberto conhecia o tema e escreviasobre ele com absoluta profundidade.

Roberto M. Moura foi diretor de es-petáculos, produtor e crítico musical.Atualmente, além de dar aulas nasFacha, era comentarista de programasda TV Educativa e colunista do ABIOnline e da Tribuna da Imprensa. Mes-tre em Comunicação e Cultura pelaEscola de Comunicação da Universida-de Federal do Rio de Janeiro e doutorem Música pela UniRio, escreveu os li-vros Carnaval — da Redentora à Praçado Apocalipse (Jorge Zahar, 1986); MPB— Caminhos da arte brasileira mais re-conhecida no mundo (Vitale, 1998); Pra-ça Onze — no meio do caminho tinha asmeninas do Mangue” (Prefeitura do Rio/Relume Dumará, 1999); Sobre cultura emídia (Vitale, 2003); e No princípio, eraa roda (Rocco, 2004).

Para Iris Agatha, que foi sua “foca” noDiário de Notícias e colega no jornal Úl-tima Hora e na Rádio Mec, RobertoMoura foi “um grande mestre debrasilidade”. Para a também jornalistaZilmar Basílio, que foi aluna de Robertona Facha, “esse carioca da Praça Onzefez da sua vida uma grande contribui-ção para a cultura da cidade do Rio deJaneiro e deixou marcas importantesdessa mesma cultura para o nosso País”.

Em depoimento encaminhado àABI, o advogado José Guerra Neto lem-brou momentos de sua convivênciacom Roberto Moura, falecido no fimde outubro e que começara a trabalharem seu escritório como office boy, comoeram então chamados os contínuos. Foiesse o primeiro emprego de RobertoMoura.

Na missa de sétimo dia de RobertoMoura, oficiada na Igreja de Nossa Se-nhora da Conceição, em Botafogo, peloPadre Marcos William, Guerra Netocontara que foi seu jovem contínuoque lhe revelou a existência de um es-critor importante, Campos de Carva-lho, autor de A Lua vem da Ásia e Vacade Nariz Sutil. Na carta à ABI, GuerraNeto evoca o Roberto feito de “poesiae ânsia cultural”. Eis sua carta:

“Existe a morte e existem “certasmortes” e disso sabemos, por tanta

“Um meninovoltado paraa beleza”

Roberto Mouravida, e verbalizamos na carona de Jor-ge Amado. A morte do Roberto Mouraestá entre as “certas mortes” com osquais jamais nos conformamos. Va-mos dividindo o essencial de cada umde nós com as afinidades que vamosconstituindo ao longo da vida com ra-ros e perenes amigos.

Aquela missa com os aplausos pu-xados pelo inspirado Padre MarcosWilliam foi perfeita como abertura deuma biografia do Roberto. A paixão ea erudição do Padre, os muitos amigos,a família e acima de tudo o vigor efeti-vo de tantos jovens transformaramaquele ato na síntese da vida de ummenino permanentemente voltadopara a beleza.

Garoto, trabalhando em meu escri-tório de advogado me surpreendia comsua paixão pelas letras. Devo-lhe a apre-sentação de Campos de Carvalho, cujaobra inteira passei a ler e a comentarcom todo o entusiasmo que ele mecobrava. Apresentei-o literariamente aCecília Meireles e Raul de Leoni, pelosquais se apaixonou.

Nesse dividir crescente consolideiuma profunda afinidade sempre sur-preendente pelo jovem com alma esensibilidade de adulto. Vou registrarum detalhe simples mas riquíssimo deum dia-a-dia de meu escritório, no qualcom sua presença não se permitia aburocrática rotina. Fazíamos para nos-sos clientes inúmeras minutas de es-crituras e contratos para a venda deimóveis. Sem exceção, o texto de to-das as escrituras era um só consagradopelos Cartórios de Notas: “Saibamquantas estas virem que no dia talcompareceram perante mim Tabeliãoos Srs. fulano e beltranos que me dis-seram: seguia-se então a descrição dospactos. O Roberto, não se conforman-do com a chatice, veio me propor umaabertura diferente:

“Era uma bela manhã de sol, quan-do adentraram em meu cartório as fi-guras nervosas e risonhas de dois ca-sais cuja felicidade contagiou-me eaos meus colegas de cartório: o pri-meiro casal realizaria o sonho da casaprópria e o segundo receberia o di-nheiro com o qual certamente reali-zaria seus sonhos imediatos”. E segui-riam os pactos.

Poesia pura. Confesso ter tentadomas os escribas não concordaram.

Roberto é assim. Poesia e ânsia cul-tural por todos os poros. Existem den-tre os meus “certos mortos” quatro oucinco e agora seis dos quais simples-mente me recuso despedir.

Dentre as pérolas que cultivávamosseparo duas:

- “Naquela nuvem, naquela, te man-do meu pensamento. Que Deus se ocu-pe do Vento” (Cecília Meirelles).

- “Vês que a vida, afinal, é bela. E abeleza é a mais generosa das verdades”.(Raul de Leoni).”

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31Setembro/Outubro de 2005

Jornal da ABI

VIDAS

O ADEUS DE APOLÔNIOO ADEUS DE APOLÔNIOO ADEUS DE APOLÔNIOO ADEUS DE APOLÔNIOO ADEUS DE APOLÔNIOFoi na ABI que essa figura mitológica da vida nacional fez o seu último pronunciamento público.

“Queridos amigos e amigas,

Tudo o que se poderia falar do meuquerido amigo Cachapuz, chamado dePaulo de Castro no Brasil, já foi feito aqui.O seu retrato foi composto de maneira fiele, sobretudo, marcante. Eu me atreveria afazer, se permitissem, um pequenoadendo. Foi mostrado aqui o homem detalento, o combatente político, o historia-dor, o jornalista. Eu gostaria de lembrar, sevocês permitirem, como um pequenoadendo, o cidadão e, como marca princi-pal do cidadão, o militante político, emparticular, como muitos de nós, o militantede esquerda. Essa característica comum fezque peregrinássemos, em nossa juventu-de, por várias áreas marcadas pelos níveismais altos das crises políticas da época,que nos víssemos ali onde o espírito desolidariedade, o espírito de contato e aomesmo tempo a vivência comum dos po-vos irmãos nos tinham levado à defesa,como voluntários, da República Espanho-la invadida, mutilada e, após, batida pelasforças conjugadas dos elementos ditatori-ais que vinham da Itália e da Alemanha ede dentro da própria Espanha, fruto dacoligação conservadora das centenas develhos generais espanhóis, dos príncipesda Igreja, dos restos da monarquia. Tudoisso fez que fôssemos conhecer pessoal-mente o nosso Cachapuz, o nosso Paulode Castro, já com 20 e poucos anos, emcondições muito especiais, como “hóspe-des” do Governo francês em seus cam-pos de concentração da área dos Pirineus.

Foi num dos campos de concentraçãoque nós viemos a conhecer-nos. E é nes-te aspecto que eu queria trazer a vocêsum pouco do que me traz a memória. Seno quadro de História de ontem e de hojeos que me precederam de maneira muitorica marcaram a imagem da época e dohomem, a memória ajuda a mostrar tam-bém os elementos mais íntimos, a análisedo passado e do presente e a busca decaminhos para um futuro melhor. Nesteponto eu queria marcar, antes de tudo, umadas características flagrantes do nosso ho-menageado: o sentimento de família, ogrande amor por sua Ethel, sua esposa,por sua Andréia, por seus filhos, e o cari-nho imenso que tinha pelos amigos e com-panheiros e o desvelo por acompanhar assuas condições e suas dificuldades dentrodesses anos e dessas décadas que marca-vam, já com ele aqui no Brasil, o nossoperíodo mais próximo da clandestinidade.

dos da noite para o dia. Ele ensinou tam-bém que a militância política não pode serefetiva, não pode ser criadora se não seapóia no conhecimento da realidade e aomesmo tempo no conhecimento da His-tória, nas lições e experiências acumula-das no ontem, no anteontem e no hoje,ainda em busca de algo melhor amanhã.

Entre as lições que recebi de Cachapuz,do nosso Paulo de Castro, queria lembrarainda a sua visão da democracia como agrande arma, o grande sistema políticocapaz de abrir os caminhos do amanhã.Ele me fez compreender que a democra-cia, em seu desenvolvimento constante,abre caminho para as sociedades melho-res e mais justas e para uma sociedadesuperior amanhã.

Quero agradecer muito a honra queme deram numa reunião que é quase umagrande família de amigos e lembrar comoelemento final uma das lições mais altasque permanentemente recebi do nossohomenageado: a visão do mundo comconfiança, a certeza e a confiança de queas forças do progresso, as consciências li-vres, os que pensam, sentem e lutam peloprivilégio de sonhar e de viver são chama-dos a olhar as condições mais difíceis e osmomentos mais duros com um espíritonovo, com a visão de confiança nos hori-zontes novos, com muita e muita espe-rança.

Muito obrigado.”

Com grande emoção os parentes,amigos e antigos companheiros de Paulode Castro ouviram o último orador dasessão em que, em 6 de abril, a ABI pres-tou homenagem póstuma ao jornalista eescritor acolhido no Brasil, como exila-do político, depois de participar da resis-tência à ditadura salazarista, em seu país,de combater nas brigadas de voluntári-os de defesa da República Espanhola e,

É verdade que na Espanha não éra-mos figuras isoladas. A Espanha reunia,ao lado da República traída e mutilada, oque havia de mais ardoroso no quadrodos partidários da liberdade, dos direitoshumanos e da busca de uma sociedademelhor. E não apenas dentre os paísesvizinhos, como era o caso dele, que vinhade Portugal. Era o caso dos demais paí-ses da Europa Meridional, mas tambémde áreas muito longínquas, como a Malásia,como a China e a Índia, como a Austrália,como as Américas do Norte, do Centro edo Sul. Havia assim para mim, jovem devinte e poucos anos como Cachapuz, umcampo imenso de riqueza de idéias e delições de vida para aprender.

Queria lembrar finalmente, para nãoroubar mais tempo de vocês neste finalde tão bela cerimônia, alguns elementosparticulares que fizeram de Cachapuz nãoapenas o organizador do debate de idéi-as na sua equipe de voluntários portu-gueses. Ele dava cursos para os seus com-panheiros porque sabia que a Históriamuda não apenas pela presença ativa dopovo, mas na medida em que os níveisnovos de consciência, nascidos do debatede idéias, ajudam a compreender a ne-cessidade dessas mudanças. Assim, ele foium elemento teórico que ajudou a com-preender que os horizontes mais longín-quos não são alvos assim inatingíveis, aocontrário, porém não podem ser alcança-

Dentro desse quadro eu queria lem-brar o que nos unia particularmente nosmeses em que vivemos juntos nos cam-pos de concentração franceses e nas pou-cas vezes em que pudemos ver-nos e sen-tir-nos depois, já aqui, com sua presençano Brasil. Seria importante reafirmar umdos traços fundamentais de Paulo de Cas-tro que nos foram lembrados aqui hápouco, em especial a sua condição deprofessor. Quando o conheci num cam-po de concentração francês, eu, participan-te da delegação de voluntários brasileiros,ele como participante da delegação por-tuguesa, pude sentir, no contato com ele,a profundidade de sua sede de cultura, asua capacidade, colhida em Portugal, masparticularmente na França, de sentir o on-tem e o hoje da sociedade e poder assimacumular elementos no debate de idéiaspara as perspectivas do amanhã.

Queria lembrar particularmente a suavisão ampla e abrangente do quadro dedebate político e de confronto de idéias.Cachapuz foi, antes de tudo, uma figuraaberta a compreender a imensa impor-tância da existência do que é diferente, aimensa importância das contradições queasseguram o desenvolvimento não ape-nas da natureza, não apenas da socieda-de, mas sobretudo do espírito de nossasconsciências. Sob esse aspecto aprendicom Cachapuz uma série de ensinamentose de lições.

com a derrota desta, ser internado numdos campos de concentração em que oGoverno da França confinou os sobre-viventes da Guerra Civil da Espanhaapós a vitória das forças do General Fran-cisco Franco. É que esse orador, Apolôniode Carvalho, convivera com Paulo deCastro nesses campos de concentraçãoe podia prestar, quase 70 anos depois,um depoimento sobre os verdes anos em

que ambos, como milhares de comba-tentes de vários continentes, lutavamde armas na mão por um mundo de li-berdade e justiça.

Na homenagem a Paulo de Castro,Apolônio de Carvalho — que morreuaos 93 anos de insuficiência respirató-ria, em 23 de setembro,— compareceuà ABI vestindo uma vistosa camisa co-ral e se levantou sem dificuldade na pla-

téia para integrar a mesa-diretora — aolado do jornalista e ex- Presidente daABI Fernando Segismundo, do soció-logo Clóvis Brigagão, dos professoresSaul Fuks e Leodegário Azevedo e doEmbaixador de Portugal, Francisco deSeixas da Costa. Último orador da noi-te, Apolônio comoveu a platéia com oque viria a ser seu último pronuncia-mento público.

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Jornal da ABI

32 Setembro/Outubro de 2005

HISTÓRIA

N a sessão comemorativa do50º aniversário do filmeRio, 40 graus, realizada em23 de setembro na SalaCecília Meirelles, a ABI

recebeu uma placa em homenagem àparticipação dos jornalistas na lutapara a liberação do filme de NélsonPereira dos Santos. A obra fora proibi-da pelo então Chefe de Policia do an-tigo Distrito Federal (o Rio ainda eraa capital do País), Coronel Geraldo deMenezes Cortes, sob a alegação deque o filme não reproduzia a realida-de do Rio de Janeiro, a começar peloseu título, pois, segundo ele, a cidadenunca teve temperatura de 40 graus.Na justificação da homenagem à ABI,os organizadores do ato destacaram acontribuição do jornalista Pompeu deSouza, na época diretor do jornal Diá-rio Carioca, na campanha para a libera-ção de Rio, 40 graus — o que finalmen-te aconteceu no dia 23 de setembrode 1955. O apresentador da sessão foio ator Carlos Vereza, que em 1984 in-terpretou Graciliano Ramos no filmeMemórias do cárcere, também dirigidopor Nelson Pereira dos Santos.

Além da ABI, foram homenageadosna cerimônia, organizada pela Univer-sidade Federal do Rio de Janeiro, ar-tistas e integrantes da equipe de pro-dução do filme, entre os quais os ato-res Mauro Mendonça e Jece Valadão,o diretor de produção Ciro Freire Curye as escolas de samba Portela e Uni-dos do Cabuçu.

A sessão foi aberta com a execuçãode A voz do morro pela Orquestra Sin-

fônica da UFRJ, sob a regência do ma-estro Leonardo Bruno: essa criação deZé Kéti foi a base da trilha musical dofilme. Primeiro orador da sessão, o Rei-tor da UFRJ, Professor Aloísio Teixeira,destacou a importância de Rio, 40 grauscomo marco do Cinema Novo, obrainspirada no neo-realismo italiano e degrande influência nas utopias que mo-viam os que lutavam pelo progressosocial do País.

Durante o ato foi lançado o livroNelson Pereira dos Santos, uma cinebio-grafia do Brasil — Rio, 40 graus, 50 anos,editado em colaboração pelo CentroCultural Banco do Brasil e a UFRJ. Olivro contém 13 capítulos, ilustradoscom fotos de filmes do diretor e deoutros longa-metragens nacionais doperíodo do Cinema Novo. Os textossobre a vida e a obra do homenageadosão assinados pelos jornalistas RobertoD’Ávila e José Carlos Avellar, este tam-

bém crítico de cine-ma, os cineastas CacáDiegues e Luiz CarlosLacerda, a ProfessoraMariarosaria Fabris,da Faculdade de Filo-sofia, Letras e Ciênci-as Humanas da Uni-versidade de São Pau-lo, que publicou entreoutros livros NelsonPereira dos Santos: umolhar neo-realista?, eoutros intelectuaisque acompanham atrajetória do cineasta.

Há 50 anos,uma guerra pelofilme que setornou o marcodo Cinema Novo.

Rio, 40 grausCINEMA EXALTA AÇÃO DA

IMPRENSA NA LIBERAÇÃO DE

Carlos Vereza conduziu a sessão, a que nãofaltaram sambistas da Portela e da Unidos do

Cabuçu, que participaram da produção do filme.

Nélson (na foto maior e à esq.) festejao diretor de produção Ciro Freire Cury.

FOTOS UFRJ