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2 O Mercado de Energia Elétrica no Brasil 2.1 O Setor Elétrico Brasileiro É previsto pela Constituição Brasileira que a exploração dos serviços e instalações de energia elétrica pode ser realizada diretamente pelo governo brasileiro ou indiretamente por meio da outorga de concessões, permissões ou autorizações à iniciativa privada. Historicamente, no entanto, o setor elétrico brasileiro foi explorado principalmente por concessionárias de geração, transmissão e distribuição controladas pelo governo federal e pelos governos estaduais. Face às características da indústria de energia elétrica de ganhos associados à escala dos empreendimentos e verticalização das atividades de geração, transmissão e distribuição, o modelo monopolista estatal era eficiente. Entretanto, do ponto de vista econômico, o setor passou a se tornar inviável a partir de 1980, em razão das políticas de contenção tarifária e de antecipação de grandes investimentos, bem como das ingerências políticas na gestão de concessionárias de serviço público de energia elétrica. Em virtude de tal situação, o equilíbrio econômico do setor foi sendo abalado até que, devido a iminente insolvência do setor alcançada em 1993, o Governo Federal foi levado a assumir dívidas das concessionárias de energia num montante de US$ 26 bilhões, promovendo, também, o aumento das tarifas de energia em torno de 70%. Em 1995, na esteira do crescimento da demanda resultante dos efeitos do Plano Real, e da conseqüente estabilidade da economia, o setor elétrico voltou a apresentar problemas com novo ciclo de inadimplência das concessionárias, aumentando o risco de déficit de energia e restrições crescentes nos sistemas de transmissão. Diante deste cenário, o Governo Federal iniciou a reestruturação do setor elétrico brasileiro dando conseqüência ao comando constitucional relativo às concessões de serviços públicos.

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Page 1: 2 O Mercado de Energia Elétrica no Brasil · O Mercado de Energia Elétrica no Brasil 2.1 O Setor Elétrico Brasileiro É previsto pela Constituição Brasileira que a exploração

2 O Mercado de Energia Elétrica no Brasil

2.1 O Setor Elétrico Brasileiro

É previsto pela Constituição Brasileira que a exploração dos serviços e

instalações de energia elétrica pode ser realizada diretamente pelo governo

brasileiro ou indiretamente por meio da outorga de concessões, permissões ou

autorizações à iniciativa privada.

Historicamente, no entanto, o setor elétrico brasileiro foi explorado

principalmente por concessionárias de geração, transmissão e distribuição

controladas pelo governo federal e pelos governos estaduais.

Face às características da indústria de energia elétrica de ganhos

associados à escala dos empreendimentos e verticalização das atividades de

geração, transmissão e distribuição, o modelo monopolista estatal era eficiente.

Entretanto, do ponto de vista econômico, o setor passou a se tornar inviável a

partir de 1980, em razão das políticas de contenção tarifária e de antecipação de

grandes investimentos, bem como das ingerências políticas na gestão de

concessionárias de serviço público de energia elétrica.

Em virtude de tal situação, o equilíbrio econômico do setor foi sendo

abalado até que, devido a iminente insolvência do setor alcançada em 1993, o

Governo Federal foi levado a assumir dívidas das concessionárias de energia num

montante de US$ 26 bilhões, promovendo, também, o aumento das tarifas de

energia em torno de 70%.

Em 1995, na esteira do crescimento da demanda resultante dos efeitos do

Plano Real, e da conseqüente estabilidade da economia, o setor elétrico voltou a

apresentar problemas com novo ciclo de inadimplência das concessionárias,

aumentando o risco de déficit de energia e restrições crescentes nos sistemas de

transmissão.

Diante deste cenário, o Governo Federal iniciou a reestruturação do setor

elétrico brasileiro dando conseqüência ao comando constitucional relativo às

concessões de serviços públicos.

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Nesse contexto foram promulgadas as Leis nº. 8.987 e nº. 9.074, de 13 de

fevereiro de 1995 e 7 de julho de 1995, respectivamente, que tratam da outorga de

concessões no âmbito do Setor Elétrico e, dentre outras disposições:

- Estabelecem a necessidade de licitação prévia para outorga de concessões;

- Criam a figura de Produtores Independentes de Energia (PIE);

- Criam a categoria de Consumidores Livres (CL); e

- Estabelecem o Livre Acesso aos sistemas de transmissão e distribuição.

A Emenda Constitucional nº. 6, de 15 de agosto de 1995 permitiu a

exploração de potenciais hidráulicos por brasileiros ou por empresas brasileiras,

de capital nacional ou não, com sede e administração localizadas no País. Desta

forma, ficaram estabelecidas as bases para a criação do Programa Nacional de

Desestatização (PND) e início da privatização do setor elétrico, com vista a maior

participação de capitais privados por meio de concessões, autorizações e

permissões.

Em agosto de 1996, o Governo Federal contratou um grupo de consultores

internacionais para, juntamente com técnicos brasileiros, estabelecer as bases

comerciais e operacionais do processo de reestruturação do setor. A consultoria

teve como objetivo a elaboração do Projeto de Reestruturação do Setor Elétrico

Brasileiro (Projeto RESEB) e teve como meta a proposição de um novo modelo

institucional para o setor.

Ainda em 1996, por meio da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro, foi

instituída a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, com a finalidade de

regular e fiscalizar o setor elétrico, em substituição ao antigo Departamento

Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE. A nova agência foi criada numa

condição de maior independência em relação ao Poder Executivo, visto que

receberia recursos para custeio de suas despesas diretamente dos agentes do setor,

partindo de uma Taxa de Fiscalização específica.

Foi estabelecida, também, a desverticalização das atividades de geração,

transmissão, distribuição; e a comercialização de energia elétrica no sistema

interligado nacional no âmbito do Mercado Atacadista de Energia – MAE, hoje

denominado Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE. A operação

do sistema interligado nacional passou a ser realizada pelo Operador Nacional do

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Sistema Elétrico – ONS, visando a coordenação e controle da rede de transmissão

e despacho centralizado e otimizado da geração.

Apesar da abertura do setor à iniciativa privada, a falta de regulamentação

plena do modelo competitivo proposto inibiu os investimentos necessários para

assegurar o atendimento pleno da demanda em constante crescimento. Em

decorrência disso, e de regime hidrológico de baixa afluência que perdurou até

fevereiro de 2002, foi lançado através do Decreto 3371, de 24/02/2000 e da

Portaria MME 43, de 25/02/2000, o Programa Prioritário de Termeletricidade

(PPT). O PPT tratava-se de um programa emergencial de estímulo à construção de

usinas termelétricas, que contava com o apoio da ANEEL, da PETROBRAS e do

Banco de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, que acrescentaria

15GW à capacidade de geração instalada no parque gerador de energia elétrica

nacional.

Em 2001, foi criada uma Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica –

CGCE que, em 1º de junho do mesmo ano, instituiu um Programa de

Racionamento de Energia Elétrica no Brasil, que vigorou até 28 de fevereiro de

2002. E em 29 de agosto de 2001, foi criada a Comercializadora Brasileira de

Energia Emergencial – CBEE, empresa pública criada para contratação de energia

térmica emergencial com o objetivo de recuperar a capacidade de atendimento ao

sistema de forma emergencial. A CBEE celebrou contratos de reserva de geração

que foram pagos por meio do chamado “seguro apagão”.

Após o término do racionamento, a demanda por energia elétrica

permaneceu nos novos patamares de consumo alcançados durante o racionamento,

em torno de 20% menores, e os regimes hidrológicos foram recuperados, adiando

assim, a necessidade de investimentos na expansão do setor por alguns anos e

promovendo, de forma imprevisível até então, uma situação de sobre oferta de

geração e queda generalizada de faturamento. O racionamento repercutiu

fortemente no equilíbrio de todas as empresas. Por isso, em dezembro de 2001, a

CGCE, as distribuidoras e as geradoras de energia elétrica concluíram

negociações que resultaram no Acordo Geral do Setor Elétrico, que visou

compensar perdas e restaurar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de

concessão. Por outro lado, os Produtores Independentes de Energia (PIE),

assumindo o risco de mercado associado à parcela não contratada de sua energia,

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passaram a competir num cenário de sobre oferta a preços insuficientes para

recuperação dos investimentos.

Nesse contexto, a Lei nº. 10.438, em 26 de abril de 2002, dentre outras

determinações, estabeleceu:

- Recomposição Tarifária Extraordinária (RTE) para as empresas

distribuidoras;

- Rateio junto aos consumidores dos custos de contratação de energia pela

Comercializadora Brasileira de Energia Emergencial (CBEE);

- Repasse aos consumidores de custos com aquisição de energia livre;

- Criação do Programa de Incentivo a Fontes Alternativas (PROINFA);

- Criação da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) para dar

competitividade às energias alternativas e universalizar o serviço de energia

elétrica;

- Implantação dos Leilões de Energia de Serviço Público; e

- Prorrogação da vigência dos encargos associados à Conta de Consumo de

Combustíveis Fósseis (CCC) e a Reserva Global de Reversão (RGR).

Em 4 de junho de 2002, o Poder Executivo extinguiu a CGCE e criou a

Câmara de Gestão do Setor Energético (CGSE), com o objetivo de gerir a

chamada revitalização do setor elétrico. O novo órgão, então presidido pelo

ministro de Minas e Energia, seria vinculado ao Conselho Nacional de Política

Energética (CNPE).

Em 21 de outubro de 2003, foi criada linha de financiamento junto ao

BNDES para dar suporte financeiro às distribuidoras. E, em 15 de março de 2004,

o Governo Federal promoveu nova correção de rumos no setor promulgando a Lei

nº. 10.848 , conhecida como Lei do Novo Modelo do Setor Elétrico, em um

esforço para corrigir deficiências do modelo anterior, cujos objetivos principais

foram a criação de um marco regulatório estável, a garantia da segurança do

suprimento de energia elétrica aos consumidores e a promoção da modicidade

tarifária.

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2.2 O Novo Modelo Institucional

A Lei do Novo Modelo do Setor Elétrico introduziu importantes

alterações, pois permite maior participação do Estado no setor elétrico em

comparação com o modelo anterior, e cria incentivos por meio de processos de

licitação mais competitivos, para a redução das tarifas de suprimento de energia

elétrica no país. Em linhas gerais, as principais modificações introduzidas pela Lei

do Novo Modelo do Setor Elétrico incluem:

- Criação de dois ambientes de comercialização de energia elétrica: o

ambiente de comercialização regulada (ACR), para venda de energia elétrica a

distribuidores e atendimento a consumidores cativos; e o ambiente de

comercialização livre (ACL) destinado a livre comercialização entre os demais

agentes do setor (produtores independentes, consumidores livres e

comercializadores);

- extinção da chamada auto-contratação de energia pelas distribuidoras,

para incentivar a compra de energia pelos menores preços disponíveis;

- garantia de respeito aos contratos existentes e segurança jurídica às

operações já realizadas;

- indicação pelo governo federal de membros de entidades independentes,

como o ONS, e retomada para a União e para o Ministério de Minas e Energia de

algumas atribuições da ANEEL.

A Figura 2-1 abaixo apresenta esquematicamente, o relacionamento entre

os diversos órgãos do setor dentro do Novo Modelo Institucional.

Figura 2-1 – Modelo Institucional do Setor Elétrico Brasileiro

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– Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) – órgão do Governo

Federal, presidido pelo Ministro de Minas e Energia , responsável pela

homologação da política energética em articulação com as demais políticas

públicas e de desenvolvimento.

– Ministério de Minas e Energia (MME) – órgão responsável pela

formulação e implementação de políticas para o setor energético do país, de

acordo com as diretrizes do CNPE;

– Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) – órgão

responsável pelo monitoramento das condições de atendimento e recomendação

de ações preventivas para garantir o suprimento de energia elétrica à sociedade;

– Empresa de Pesquisa Energética (EPE) – órgão responsável pela

execução de estudos para a definição da Matriz Energética e planejamento da

expansão da geração e transmissão do Sistema Elétrico Brasileiro. Dentre as

atribuições da EPE está a de elaborar e publicar anualmente o BEN (Balanço

Energético Nacional);

– Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) – órgão responsável

pela regulação e fiscalização, visa garantir a qualidade dos serviços prestados

pelos agentes de geração, transmissão e distribuição, a universalização do

atendimento e acesso à energia elétrica e estabelece as tarifas para os

consumidores finais, preservando a viabilidade econômica e financeira dos

agentes.

– Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) – órgão responsável pela

coordenação e controle da operação da geração e da transmissão no sistema

elétrico interligado;

– Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) – órgão

responsável pela administração dos contratos de comercialização, liquidação do

mercado de curto prazo e pela realização dos leilões de energia elétrica;

Devido à relevância no contexto da dissertação, o ONS e a CCEE são

abordados mais detalhadamente nas seguintes subseções.

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2.2.1 Câmara de Comercialização de Energia Elétrica

Criada pela Lei 10848, em sucessão ao Mercado Atacadista de Energia

(MAE), a CCEE é constituída de uma Assembléia Geral, de um Conselho de

Administração cujo presidente é indicado pelo MME e uma Superintendência. A

Câmara é regida por um conjunto de regras e procedimentos comerciais, que

devem ser cumpridos por todos os agentes que a ela pertencem. As

responsabilidades da CCEE são as seguintes, [12]:

- implantação e divulgação das Regras de Comercialização e dos

Procedimentos de Comercialização;

- administração do Ambiente de Contratação Regulada (ACR) e Ambiente

de Contratação Livre (ACL);

- medição e registro da energia verificada;

- registro dos contratos firmados entre os Agentes de CCEE;

- apuração das infrações e cálculo de penalidades por variações de

contratação de energia;

- realização de leilões para a compra de energia pelos distribuidores, desde

que autorizados pela ANEEL;

- exercer as funções de contabilização e liquidação das transações

realizadas no mercado de curto prazo, nos ambientes de contratação livre e

regulada.

Dentro do novo marco legal, a regulamentação estabeleceu que no

ambiente da CCEE, todo agente consumidor deve contratar a totalidade de sua

carga, todo agente vendedor deve comprovar o correspondente lastro físico de

venda a partir de empreendimento de geração próprio ou de terceiros, e desde o

ano de 2005, anualmente, todo agente de distribuição, gerador, comercializador,

auto-produtor ou consumidor livre deve declarar sua previsão de mercado ou

carga, para cada um dos cinco anos subseqüentes. Adicionalmente, os agentes de

distribuição devem declarar, até sessenta dias antes de cada leilão de “energia

existente” ou de “energia nova”, os montantes para contratação.

Os leilões de compra de energia de novos empreendimentos de geração

para atendimento da carga própria das distribuidoras serão realizados cinco anos

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antes do início da entrega (leilões “A-5”), ou três anos antes do início da entrega

(leilões “A-3”).

Haverá, ainda, leilões de compra de “energia existente”, realizados no ano

anterior ao de início da entrega (leilões “A-1”) e leilões de ajuste de mercado, cujo

início de entrega se dará em até 4 meses após o respectivo leilão.

Os Contratos de Comercialização de Energia do Ambiente Regulado

(CCEAR), provenientes dos leilões “A-5” e “A-3” terão prazo de 15 a 30 anos, e

os CCEAR provenientes dos leilões “A-1” terão prazo de 5 a 15 anos. Os

contratos provenientes do leilão de ajuste terão prazo máximo de dois anos.

Para os CCEAR decorrentes de leilões de “energia existente”, existe

opção da distribuidora contratar até 3% a mais do que o seu mercado previsto e,

no decorrer do contrato, de reduzir as quantidades contratadas até o limite de 4%

ao ano em decorrência da saída de consumidores potencialmente livres, de desvios

de mercado ou de variações de montantes contratados até 11 de dezembro de

2003.

Quanto ao repasse dos custos de aquisição de energia dos leilões às tarifas

dos consumidores finais, o Decreto n°. 5.163, de 30 de julho de 2004, estabelece

como limite máximo o Valor Anual de Referência – VR, que é a média ponderada

dos custos de aquisição de energia elétrica nos leilões “A-5” e “A-3”, calculado

para o conjunto de todas as distribuidoras.

2.2.2 Operador Nacional do Sistema Elétrico

Criado pela Lei 9648, de 27 de maio de 1998, o ONS foi instituído como

personalidade jurídica de direito privado, e sua principal atribuição é coordenar e

controlar a operação do Sistema Interligado Nacional – SIN, visando à otimização

eletro-energética ao menor custo operacional com garantia dos padrões de

segurança e qualidade, respeitando também, as condições impostas pelo uso

múltiplo da água e pelas limitações associadas às instalações de geração e

transmissão do SIN.

O ONS é regido por uma Assembléia Geral, por um Conselho de

Administração e por uma Diretoria Executiva.

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2.3 O Despacho Hidrotérmico Centralizado

O Planejamento da Operação tem como objetivo definir uma política de

operação, despachando as unidades geradoras das usinas para o atendimento da

demanda (carga), minimizando o custo total de operação do sistema, [16].

O custo de operação de cada unidade geradora é função do combustível

por ela utilizado para a produção de energia. Em um sistema hidrotérmico, as

usinas hidráulicas utilizam a água como combustível para produção de energia.

Em princípio, poderia se pensar que o custo de operação de usinas hidrelétricas é

nulo, pois não há nenhum desembolso para obter a água que está armazenada nos

reservatórios das usinas hidrelétricas.

Na verdade, na operação energética de um sistema hidrotérmico existe

uma relação entre a decisão tomada em um estágio qualquer e sua conseqüência

futura. Se no presente for gasto água em excesso e se não chover o suficiente para

repor a água dos reservatórios, no futuro o custo de operação do sistema pode vir

a ser altíssimo, pois o atendimento a carga terá de ser feito através do uso de

geração térmica cara, ou porque pode ser necessário até realizar um racionamento

de energia. Por outro lado, utilizando geração térmica em excesso no presente de

modo a economizar a água dos reservatórios, caso um período de muita chuva vier

a ocorrer, pode ser necessário verter água dos reservatórios no futuro, resultando

em um desperdício de energia. A Figura 2-2 abaixo apresenta as conseqüências do

processo de decisão de operação de um sistema hidrotérmico, ilustrando o

acoplamento temporal entre estas decisões.

Figura 2-2 – Acoplamento Temporal em Sistemas Hidrotérmicos

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Além de acoplado no tempo, um problema de operação energética de um

sistema hidrotérmico é também estocástico, já que não existe certeza a respeito

das afluências futuras no momento em que a decisão operativa é tomada.

Na tomada de decisão da operação de um sistema hidrotérmico deve-se

comparar o benefício imediato do uso da água e o benefício futuro de seu

armazenamento, [17]. O benefício do uso imediato da água pode ser representado

através de uma função denominada “Função de Custo Imediato” (FCI), enquanto

que o benefício de armazená-la no presente para o seu uso futuro pode ser

representado através de uma Função de Custo Futuro (FCF). O termo “futuro”

está relacionado a todos os estágios futuros até o horizonte de planejamento. Estas

duas funções são ilustradas pela Figura 2-3 abaixo:

Figura 2-3 – Função de Custo Imediato e Função de Custo Futuro

O eixo das abcissas do gráfico apresentado na figura representa o volume

final armazenado no reservatório de uma usina hidráulica, e o eixo das ordenadas

representa o valor da função de custo futuro ou custo imediato expresso em

unidades monetárias.

Como é de se esperar, a função de custo imediato aumenta com o volume

final armazenado nos reservatórios. Isto ocorre porque a decisão de economizar

água no presente está relacionada a um maior custo com geração térmica no

atendimento a carga. Deste modo, a função de custo imediato está associada ao

gasto com geração térmica no estágio atual. Por outro lado, a função de custo

futuro diminui com o volume final armazenado nos reservatórios, porque a

decisão de economizar água no presente está relacionada a um menor uso de

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geração térmica no futuro. Logo, a função de custo futuro está associada ao valor

esperado do gasto com geração térmica no futuro para o atendimento a demanda.

O uso ótimo da água armazenada nos reservatórios é aquele que minimiza

a soma do custo de geração térmica no presente com o valor esperado do custo de

geração térmica até o fim do horizonte de planejamento. Pode-se observar que

este é o ponto de mínimo da curva formada pela soma da função de custo imediato

com a função de custo futuro, conforme apresentado na Figura 2-4 abaixo:

Figura 2-4 – Decisão Ótima para o Uso da Água

Observa-se também que este ponto é onde as derivadas da função de custo

futuro e da função de custo imediato, em relação ao volume final armazenado nos

reservatórios, se igualam em módulo. As equações 2-1 e 2-2 abaixo apresentam

esta formulação matematicamente:

0)(=

∂∂

+∂

∂=

∂+∂

VFCF

VFCI

VFCFFCI (2-1)

Logo:

VFCF

VFCI

∂∂

−=∂

∂ (2-2)

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Onde as derivadas da equação 2-2 são conhecidas como valores da água.

Logo, pode-se concluir que, a água armazenada nos reservatórios não tem custo

nulo, e sim possui um valor relacionado ao custo de oportunidade de se

economizar água hoje, para a utilização futura.

No Sistema Elétrico Brasileiro, assim como em outros sistemas regulados,

a produção de energia de cada usina (termelétrica, hidroelétrica ou de outra

tecnologia) é definida de forma integrada pelo Operador do Sistema (no Brasil,

pelo ONS). Cada agente gerador termelétrico declara ao Operador do Sistema seu

custo variável de operação (em R$/MWh) e sua disponibilidade de produção. Os

agentes geradores hidroelétricos, por sua vez, informam apenas sua

disponibilidade de produção. Tais geradores não declaram um custo variável de

geração, haja vista que hidroelétricas não possuem um custo direto unitário como

o do gás natural, carvão e outras commodities utilizadas como fonte de energia

térmica, mas sim um custo de oportunidade, que depende dos cenários de

hidrologia, demanda e produção de outros geradores no futuro. A partir destas

informações, o Operador define então a geração de cada usina do sistema,

definindo, conseqüentemente, o nível de armazenamento de água nos

reservatórios para uso futuro. O cálculo da política operativa que define o

despacho das usinas e que também fornece os custos de oportunidade para usinas

hidrelétricas é um problema complexo de otimização sob incerteza, usualmente

resolvido por técnicas de programação dinâmica estocástica. O despacho

centralizado tem como objetivo a utilização mais econômica possível dos recursos

de geração, e também de transmissão, garantindo o atendimento à demanda de

energia do sistema. A estratégia de despacho é aquela que minimiza o custo total

de operação do sistema ao longo de vários anos, levando em consideração os

custos imediatos (custo térmico hoje) e futuro (custo de oportunidade de

armazenamento de água nos reservatórios) de operação.

Em sistemas puramente térmicos, o despacho de mínimo custo se

estabelece ao ordenar as usinas térmicas por custo operativo e despachá-las por

sua disponibilidade, da mais barata para a mais cara, até se atender a demanda. O

preço da energia recebido por todos os geradores, e que é pago pela demanda, é

então igual ao custo marginal de operação do sistema, dado pelo custo operativo

do último gerador despachado (este, chamado de gerador marginal). Neste caso

não há acoplamento temporal entre etapas, ou seja, as decisões de hoje não têm

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conseqüências futuras. Além disso, assumindo-se que não há incerteza no

suprimento de combustível para as usinas termelétricas, a volatilidade nos preços

de energia de custo prazo se deve basicamente à flutuação da demanda ao longo

do dia, à indisponibilidade (parcial ou total) de produção por parte dos geradores,

seja devido a paradas programadas para manutenção ou por falhas aleatórias de

máquinas, ou ainda a flutuações nos preços dos combustíveis. Assim, o

movimento de curto prazo no preço da energia (também conhecido como preço

spot) ocorre porque o gerador marginal nem sempre é o mesmo: conforme a

demanda aumenta ou a geração ativa se torna indisponível, outros geradores de

custo maior ou igual ao do gerador marginal são despachados, deslocando o

marginal e eventualmente elevando o preço spot. Assim, sistemas térmicos

regulados apresentam importante volatilidade nos preços de curto prazo (hora

após hora). Entretanto, no médio e longo prazo (de semana para semana, mês para

mês e ano para ano), não há significantes flutuações nos preços de energia, exceto

pelo comportamento sazonal da demanda.

Em sistemas predominantemente hidroelétricos, como o brasileiro, onde

cerca de 76% da energia elétrica produzida no país é de origem hidráulica, o

“combustível” principal é a água, cuja disponibilidade é bastante variável ao

longo do tempo. Assim, torna-se necessário um mecanismo de regulação do

regime hidrológico que possibilite um maior controle da geração das usinas

hidroelétricas, dando a elas maior flexibilidade operativa. Tal regulação é feita

pelos reservatórios dessas usinas, que armazenam água nos períodos úmidos para

utilizá-la nos períodos secos, permitindo uma operação mais eficiente do sistema.

No curto prazo, os reservatórios permitem absorver os impactos da

flutuação da demanda e/ou indisponibilidade de outras usinas com grande

eficácia, reduzindo significativamente a volatilidade horária nos preços spot, que é

alta em sistemas predominantemente térmicos. Quanto maior a capacidade de

armazenamento dos reservatórios, maior é a facilidade de modulação da carga

pelo sistema (isto é, de acompanhar a variação na demanda), sem impor

variabilidade nos preços horários.

Entretanto, num horizonte de médio prazo e, de forma mais crítica, no

longo prazo, há uma maior incerteza quanto às vazões naturais afluentes aos

reservatórios e períodos prolongados de condição hidrológica desfavorável podem

levar ao esvaziamento dos reservatórios. Como conseqüência, uma vez que a

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geração hidroelétrica fica reduzida com o esgotamento da energia afluente

armazenada, para se garantir o suprimento à demanda sem corte de carga, as

térmicas são colocadas em operação, elevando os custos marginais (preço spot) e

total do sistema. Na maior parte do tempo os reservatórios das hidrelétricas

realocam água de períodos úmidos para períodos secos, mantendo uma operação

do sistema de baixo custo. Porém, com a possibilidade de ocorrência de eventos

extremos (secas prolongadas), esses longos períodos de preços baixos (vários

meses ou mesmo anos) se intercalam com períodos de preços altos, quando os

reservatórios estão vazios. A Figura 2-5 a seguir ilustra esse comportamento dos

preços spot no Brasil. Assim, o que se observa é que sistemas predominantemente

hidroelétricos têm baixa volatilidade nos preços spot no curto prazo, mas alta

variância no médio e longo prazo.

Figura 2-5 – Evolução do Preço Spot no Subsistema Sudeste

(Fonte:CCEE)

2.4 Formação do Preço Spot

Conforme visto na seção acima, o modelo de despacho adotado no Brasil

incorpora apropriadamente o valor implícito da água armazenada no momento do

despacho, possibilitando uma otimização dos recursos do sistema, isto é,

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despacha-se o sistema ao mínimo custo. O preço da energia é determinado então

pelo recurso de maior custo que foi utilizado e considerando-se a forte

predominância hidráulica do sistema brasileiro, o preço da energia é normalmente

determinado pelo valor da água e eventualmente pelo preço de uma termelétrica

ou pelos custos de déficit.

Como descrito, o despacho da geração é realizado de forma centralizada

pelo ONS, que define as metas de geração de modo a minimizar o valor esperado

do custo de operação do sistema, ao longo de todo o horizonte de planejamento da

operação.

A partir do despacho realizado pelo ONS, são definidos os custos

marginais de operação (CMO) dos 4 submercados (N, NE, S e SE/CO). O CMO

de um submercado reflete o acréscimo no valor esperado do custo de operação do

sistema, ao longo de todo o horizonte de planejamento da operação causado pelo

aumento marginal da demanda do submercado em questão.

A seguir, serão apresentadas as formulações referentes ao despacho

hidrotémico e à formação do preço spot da energia elétrica.

2.4.1 Formulação do Despacho Hidrotérmico para uma Etapa

Apresenta-se, a seguir, a formulação do despacho hidrotérmico para um

determinado estágio t, supondo que foi calculada a função de custo futuro

(FCF).O cálculo desta FCF será discutido posteriormente.

a) Função Objetivo – Como visto, o objetivo é minimizar a soma dos

custos imediato e futuro, conforme a equação 2-3 apresentada abaixo:

zt = Min Σcj gtj + αt+1(vt+1) (2-3)

O custo imediato é dado pelos custos operacionais térmicos na etapa t, ∑cj

gtj. Por sua vez, o custo futuro é representado pela função αt+1(vt+1), onde vt+1 é o

vetor dos níveis de armazenamento do reservatório ao final da etapa t (início da

etapa t+1). As restrições operacionais nesta etapa são discutidas a seguir.

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b) Balanço Hídrico – Conforme ilustrado anteriormente, a equação de

balanço hídrico relaciona o armazenamento e os volumes de entrada e saída do

reservatório: o volume final no estágio t (início do estágio t+1) é igual ao volume

inicial menos os volumes de saída (turbinamento e vertimento) mais os volumes

de entrada (afluência lateral mais os volumes de saída das usinas a montante).

vt+1(i) = vt(i) - ut(i) - st(i) + at(i) +Σ [ut(m) + st(m)] (2-4)

para i = 1,..., I

Onde:

i = índice das hidrelétricas (I número de hidrelétricas)

vt+1(i) = volume armazenado na usina i ao final do estágio t (variável de decisão)

vt(i) = volume armazenado na usina i no início do estágio t (valor conhecido)

at(i) = afluência lateral que chega na usina i na etapa t (valor conhecido)

ut(i) = volume turbinado durante a etapa t (variável de decisão)

st(i) = volume vertido na usina i durante a etapa t (variável de decisão)

m∈U(i) = conjunto de usinas imediatamente a montante da usina i

vazão

Vazão da usina

Afluência lateral

a montante

Figura 2-6 – Balanço hídrico do reservatório

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c) Limites de Armazenamento e Turbinamento

vt(i) ≤ v,_(i) para i = 1, ..., I

ut(i) ≤ u,_(i) para i = 1, ..., I

onde v,_(i) e u,

_(i) são respectivamente o armazenamento máximo e a capacidade

das turbinas.

d) Limites de Geração Térmica

São os mesmos do despacho térmico, vistos no início deste capítulo.

gtj ≤ g,_

j para j = 1, ... , J

e) Atendimento à Demanda

( ) ( ) ∑∑==

=+J

jtti

I

it dgiui

11ρ (2-5)

onde ρ (i) é o coeficiente de produção da usina i (MWh/hm3) (valor conhecido).

2.4.2 Solução do Problema e Custos Marginais

O problema é em geral resolvido por um algoritmo de programação linear

(PL). Assim como no caso térmico, o preço spot é o multiplicador associado à

equação de atendimento da demanda. Por sua vez, o valor da água de cada

hidrelétrica é o multiplicador associado à equação de balanço hídrico.

2.4.3 Cálculo da Função de Custo Futuro

Como visto, as decisões operativas de um sistema hidrotérmico se baseiam

no equilíbrio entre o custo de oportunidade hoje e seu valor esperado futuro,

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representado pela FCF, αt+1(vt+1). Esta função é calculada através de um

procedimento recursivo chamado programação dinâmica dual estocástica (PDDE)

apresentado a seguir:

a) para cada estágio t (tipicamente um mês) define-se um conjunto de estados do

sistema, por exemplo, níveis de armazenamento 100%, 90% etc. até 0%. A

Figura 2-7 abaixo, ilustra a definição dos estados para um reservatório. Supõe-

se conhecido o armazenamento inicial do primeiro estágio.

1 2 T-1 T

estados do sistema:armazenamento inicial para etapa T

estadoinicial

Figura 2-7 – Definição dos Estados do Sistema.

b) iniciar no último estágio, T, e resolver o problema de despacho de um estágio

supondo que o armazenamento inicial corresponde ao primeiro nível

selecionado no passo (a) - por exemplo, 100%. Dado que se está no último

estágio, supõe-se que a FCF é igual a zero. Resolva o problema de despacho

para cada um dos N cenários de vazões para o estágio. Este esquema está

ilustrado na Figura 2-8 abaixo:

1 2 T-1 T

problema de um estágiocenário de vazões #1

problema de um estágio

problema de um estágiocenário de vazões #2

cenário de vazões #N

Figura 2-8 – Cálculo da Decisão Ótima por Cenário - Último Estágio

c) Calcular o valor esperado do custo operativo associado ao nível 100% como a

média dos custos dos N subproblemas de um estágio. Com isto se obtém o

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primeiro ponto da FCF para o estágio T-1, i.e. αT(vT). Observe que a tangente

da FCF em torno deste ponto corresponde ao valor da água esperado (como

mencionado no item acima, o valor da água é obtido do multiplicador simplex

da equação de balanço hídrico). O procedimento está ilustrado na Figura 2-9

abaixo:

1 2 T-1 T custo

custo operativo esperado

tangente = derivada do custo operativo

com relação ao armazen.

Figura 2-9 – Cálculo do primeiro segmento da FCF

d) Repetir o cálculo do custo operativo e das tangentes da superfície de custo

futuro para cada estado de armazenamento no estágio T. O resultado final é

uma superfície linear por partes, que representa a FCF αT(vT) para o estágio T-

1, como mostrado na Figura 2-10:

1 2 T-1 T costo

Superfície linear por partespara o estágio T-1

Figura 2-10 – FCF Linear por partes para o Estágio T-1

e) Repetir o processo para todos os estados de armazenamento selecionados nos

estágios T-1, T-2 etc. como mostrado na Figura 2-11 abaixo. Observe que o

objetivo agora é minimizar o custo operativo imediato no estágio T-1 mais o

custo futuro esperado, dado pela função linear por partes calculada no passo

anterior.

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1 2 T-1 Custo futuro

Minimizar custo imediato en T-1+ custo futuro esperado

armaz. em T

Figura 2-11– Cálculo do custo operativo para o estágio T-1 e FCF para T-2.

O resultado final do esquema PDE (a)-(e) é um conjunto de FCFs

{αt+1(vt+1)} para todos os estágios t = 1, ..., T. Observa-se que o cálculo desta

função requer a representação da operação conjunta do sistema, com o

conhecimento completo dos estados de armazenamento de todas as usinas do

sistema. Em outras palavras, o valor da água de uma usina hidrelétrica é uma

função não-separável do estado das demais usinas do sistema.

O Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) de cada submercado,

utilizado para valorar a energia na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica

(CCEE) também é definido com base neste CMO, porém este sendo calculado

pela CCEE com alguns ajustes (valores máximo e mínimo) em relação ao CMO

descrito acima.

2.5 Geração Termelétrica no Brasil

Segundo o Banco de Informações de Geração, da ANEEL, a atual

capacidade instalada de geração de energia elétrica do Brasil é de cerca de 100 mil

MW, sendo cerca de 77 mil MW em geração hidráulica, e cerca de 22 mil MW

em geração térmica convencional (gás, petróleo, biomassa e carvão) e também

nuclear. A Tabela 2-1 abaixo apresenta a distribuição da capacidade instalada de

geração elétrica em operação no Brasil, por fonte, [18]:

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Tabela 2-1 – Capacidade Instalada de Geração do Brasil (Fonte: Aneel)

De acordo com o Balanço Energético Anual de 2007, da EPE,

considerando-se apenas a capacidade instalada não emergencial, a participação da

geração termelétrica (incluindo nuclear), no total passou de 13% médios no

período de 1993 a 1999, para 15,3% em 2000, 20,8% em 2002, 22% em 2004, e

24% em 2006. O gráfico 2-12 abaixo apresenta a expansão da capacidade de

geração hídrica e térmica em GW no período 1974-2006, [19].

Figura 2-12 – Evolução da Capacidade de Geração do Brasil

(Fonte: EPE)

O impulso na geração termelétrica verificado a partir de 2000 decorreu,

sobretudo, do Programa Prioritário de Termeletricidade, cujo objetivo foi o de

propiciar uma rápida implantação de centrais termelétricas movidas a gás natural.

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Inicialmente, o Programa visava a implantação de 43 usinas com potência total de

15 mil MW.

Ao longo do ano 2000, ocorreram seguidas adequações no Programa, com

a inclusão de alguns empreendimentos e a exclusão de outros, elevando a

quantidade para 54 usinas (a serem instaladas até 2003) com potência agregada de

20 mil MW. No biênio seguinte, a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica

(CGCEE) avaliou o Programa e o redefiniu para 34 usinas e cerca de 12 mil MW.

O PPT não se viabilizou inteiramente. Atualmente, existem 22 usinas

integrantes do Programa em operação comercial, totalizando 7,7 mil MW de

potência fiscalizada ante os 11 mil MW originalmente previstos para essas 22

usinas. Segundo a ANEEL, esse descompasso pode ser atribuído a retração dos

investimentos devido à rigidez das regras contratuais, custo do produto e

obrigação de pagamento condicionada a cláusulas take or pay, incertezas

associadas ao suprimento do gás e incompatibilidade entre a regulamentação do

setor elétrico e a do gás natural. Mesmo que o Programa não tenha produzido os

resultados desejados, o acréscimo representado na capacidade geradora nacional

foi significativo e contribuiu para firmar a energia termelétrica como a secundária

do sistema elétrico nacional.

2.5.1 Estratégia Operativa das Térmicas

Conforme abordado na seção 2.3, no Brasil, devido à predominância

hidrelétrica, observa-se uma baixa volatilidade de preços spot no curto prazo e alta

volatilidade no médio e longo prazo, e é neste contexto que as usinas termelétricas

do sistema brasileiro estão inseridas.

Como no Mercado Brasileiro os contratos de venda de energia são

instrumentos financeiros, sabe-se que uma usina térmica que produz energia

somente nos períodos de preço spot elevado pode atender seus contratos de

fornecimento de energia com um custo efetivo inferior ao seu custo de operação,

pois nos longos períodos de preços baixos, a usina pode comprar energia por um

valor muito menor no mercado de curto prazo. Tratando-se de volatilidade de

médio prazo, esta operação flexível permite ainda que a usina possa ser desligada

nos meses em que os preços spot estão baixos e operar na base nos meses em que

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eles estão altos. Em outras palavras, a flexibilidade operativa nas usinas térmicas é

uma característica atraente no sistema brasileiro para elevar a rentabilidade do

projeto.

Entretanto, uma operação flexível dos geradores térmicos, associada à

pouca diversificação do mercado de combustíveis como o gás natural, faria com

que a remuneração do produtor de gás fosse excessivamente variável e, como o

produtor necessita de um fluxo de caixa estável para atender seus compromissos

financeiros decorrentes dos investimentos fixos substanciais de perfuração,

extração e transporte do gás natural, este impõe aos geradores térmicos um

contrato de compra de combustível com cláusulas do tipo take-or-pay (ToP) e

ship-or-pay (SoP). A primeira constitui um instrumento simplesmente financeiro

para reduzir a volatilidade da remuneração do produtor de gás, impondo ao

gerador a compra antecipada de um determinado volume mínimo de gás mensal e

anual, seja o gás consumido ou não, e a segunda visa remunerar o investimento

feito na infra-estrutura necessária ao transporte do gás até a usina, análogo aos

custos associados ao uso das linhas de transmissão da rede elétrica. Usualmente,

define-se o montante de gás contratado (em milhões de m³/dia) necessário para

operar a usina em sua capacidade máxima e para o qual o gasoduto até a usina

deve estar dimensionado (com alguma margem superior), e especificam-se os

montantes de ToP mensal e anual respectivamente como percentuais do volume

de gás contratado para um mês e para um ano. O volume de gás pago e não

consumido é virtualmente armazenado por um período pré-estabelecido, durante o

qual pode ser recuperado (condição conhecida como make-up).

Os geradores termelétricos, além de submeterem seus custos de produção e

suas disponibilidades ao ONS, que definirá então seu despacho, declaram também

sua inflexibilidade operativa, ou seja, sua restrição de geração mínima,

basicamente devido à necessidade de conservação das unidades geradoras ou

decorrente de contrato de compra mínima de combustível (take-or-pay). Através

dessa declaração de inflexibilidade, os geradores térmicos podem impor seu

despacho ao Operador do Sistema, mesmo que seus custos operativos sejam altos.

No entanto, de acordo com as regras vigentes do ONS, apenas a parcela sem

inflexibilidade da capacidade dos geradores é considerada na formação de preços

de energia, garantindo que tais restrições não sejam onerosas para o consumidor o

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que acarreta um consumo ineficiente do insumo das térmicas, as quais geram com

um custo operativo maior ao da receita que recebem.

A partir da evolução da potência termelétrica, do consumo específico e da

disponibilidade, calculou-se o consumo de gás natural que garante o lastro destas

térmicas. A Figura 2-13 abaixo mostra o consumo total, referente ao lastro

termelétrico, o consumo das distribuidoras e das refinarias da PETROBRAS, onde

se observa que o consumo potencial das usinas térmicas é bastante significativo,

cerca de 40% do consumo total:

0

20

40

60

80

100

120

MM

m3/

dia

Lastro Térmico 30.4 34.5 35.6 35.6 35.6Cons. Não Térmico 47.5 56.3 61.7 66.7 70.5Total 77.9 90.7 97.3 102.3 106.1

2006 2007 2008 2009 2010

Figura 2-13 – Projeção da demanda total de Gás Natural (Fonte: ANP)

2.5.2 Modelo de Comercialização

A remuneração líquida de uma empresa geradora depende, essencialmente,

dos seguintes fatores, [22]:

- venda de energia no mercado de curto prazo, dada pelo produto do preço

de curto prazo (PLD) com a energia total produzida, deduzidos os custos

operativos (por exemplo, custos de combustível e O&M variáveis);

- devido ao fato da venda de energia no mercado de curto prazo ser

arriscada, por conta da grande volatilidade e assimetria dos preços, contratos

bilaterais são utilizados como uma forma de proteção contra esta volatilidade e

formam a segunda parcela de renda de um gerador, que é a venda de contratos de

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suprimento, dada pelo produto do preço do contrato (P) pelo montante contratado

(Ec), subtraídos os custos de compra dos montantes contratados no mercado de

curto prazo, cujo preço é uma variável aleatória, em função da incerteza no

pagamento (“default” das distribuidoras). Esta é a abordagem dos chamados

“contratos por quantidade”, onde o risco do suprimento está alocado ao gerador;

- a contratação multilateral nos leilões leva a assinatura de contratos entre

cada gerador vencedor do leilão e todas as distribuidoras. Embora estes contratos

estejam respaldados por cláusulas de garantias, pode existir a percepção do “risco

de crédito” de algumas distribuidoras por parte dos geradores. Este risco pode ser

encarado como uma redução do preço efetivamente pago por elas, que pode ser

modelado por uma variável aleatória que engloba a composição agregada de

reduções de todas as distribuidoras que estão contratadas com cada gerador.

Observa-se que, mesmo em caso de default, a obrigação de suprimento

continua sob responsabilidade do gerador.

Assim sendo, a expressão da renda líquida do gerador termelétrico para um

período (base mensal) t e uma série hidrológica qualquer pode ser expressa, de

maneira simplificada, pela equação 2-6 abaixo:

Rts = (Ec)P + (Gts – Ec) πts – (Gts)ct – Cf (2-6)

Onde:

Rts = Receita operacional líquida, em R$ (variável aleatória);

Ec = Montante do contratado, em MWh;

P = Preço do contrato, em R$/MWh;

Gts = Despacho da térmelétrica, em MWh (variável aleatória)2;

πts = PLD (preço spot), em R$/MWh (variável aleatória);

ct = Custo variável de operação (CVU) no período t, em R$/MWh. (valor

conhecido);

Cft = Custo fixo no período t, em R$. (valor conhecido).

2 No caso de uma hidrelétrica, esta parcela seria representada pela geração alocada pelo Mecanismo de Realocação de Energia (MRE).

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2.6 Gás Natural

Tendo em vista a grande influência no Mercado de Energia Elétrica,

sobretudo em relação às termelétricas, nesta seção, será abordada a evolução

recente da indústria de gás natural brasileira, principalmente, no que diz respeito

ao comportamento de oferta e demanda durante o período que sucedeu o início do

processo de liberalização do mercado de gás natural, que teve seu marco na edição

da Lei nº 9.478/97, a denominada Lei do Petróleo. Essa regulamentação, em seus

artigos específicos sobre a indústria de gás natural, preconizou um novo modelo

de organização industrial para este energético, contemplando, por exemplo, a

introdução de competição na cadeia de suprimentos.

O gráfico 2-14 a seguir, apresenta a evolução da oferta total disponível de

GN em termos mensais, entre setembro de 1998 e dezembro de 2006.

Figura 2-14 – Evolução da Oferta de Gás Natural (Fonte:ANP)

Observa-se um considerável incremento na disponibilidade de gás a partir

de julho de 1999. Este aumento da disponibilidade se deve à entrada em operação

do GASBOL (Gasoduto Brasil-Bolívia).

Entre 2000 e 2006, houve um crescimento da oferta total disponível de

14,7% a.a., sendo 7,4% a.a., devido ao aumento da produção nacional líquida e

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28,2% a.a., em razão do acréscimo de volume importado, principalmente da

Bolívia, mas também da Argentina, ambos a taxas anualizadas3.

Porém, devido à insuficiência de investimentos em ampliação de

capacidade de transporte e sua operação próxima ao limite de capacidade das

instalações existentes, mostra-se pouco provável que no curto prazo seja factível a

manutenção das taxas históricas observadas, que, em grande parte, devem-se a

uma base inicial de comparação muito baixa.

Desse modo, as previsões quanto ao crescimento da oferta de gás natural

para os próximos anos utilizam taxas em torno daquelas verificadas entre 2005 e

2006, ou seja, de cerca de 4,9% a.a., sendo 1,2% a.a. para a produção nacional

líquida e 8,8% a.a. para o volume importado.

Do ponto de vista do consumo, a Tabela 2-2 a seguir apresenta o volume

de vendas médias mensais de gás das distribuidoras entre 2000 e 2006 (em

milhões de m³/dia) por segmento de consumo: industrial, automotivo (GNV),

residencial, comercial e geração térmica4, evidenciando aqueles que mais

impactaram o aumento da participação de gás natural na matriz energética

brasileira. De acordo com os dados mais recentes do Balanço Energético Nacional

2007, referente ao ano de 2006, o gás natural representa hoje 9,6% do consumo

interno de energia, representando um aumento de 4,2% em relação à participação

no ano de 2000, quando a participação do gás natural era de 5,4%, [19].

3 A opção pelo período compreendido entre os anos de 2000 e 2006 para análise das taxas de crescimento anuais se deve ao fato de o GASBOL ter entrado em operação apenas em meados de 1999. 4 A diferença entre os valores das vendas pelas distribuidoras e os dados de oferta total disponível são decorrentes, principalmente, do consumo das refinarias da PETROBRAS.

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Tabela 2-2 – Vendas anuais de gás natural pelas distribuidoras5

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2005/2006

(% a.a)

2000/2006

(% a.a.)

Industrial 12.9 14.8 16.6 18.5 20.3 22.8 24.3 6.21 11.1

Automotivo 1.0 1.8 2.7 3.7 4.3 5.3 6.3 19.13 36.1

Residencial 0.5 0.5 0.5 0.5 0.6 0.6 0.7 7.08 4.6

Comercial 0.3 0.3 0.4 0.4 0.4 0.7 0.6 (21.36) 11.6

Geração 2.2 5.3 7.0 6.1 10.3 11.4 9.7 (14.80) 28.4

Total 16.8 22.6 27.1 29.2 35.9 40.8 41.5 1.58 16.2

Como demonstrado pela tabela, os segmentos industrial, automotivo e de

geração térmica são os principais consumidores de gás natural no Brasil, com

taxas anuais de crescimento superiores a 11% a.a. para o consumo industrial, e

chegando até 36,1% a.a. para o uso automotivo. No total dos segmentos, o

consumo apresenta um crescimento de 16,2% a.a..

Do ponto de vista dos consumidores industrias e automotivos, a razão para

esse acréscimo de demanda reside em uma política de preços deliberada de

incentivo ao uso de gás natural, em que o preço mais baixo do gás frente aos seus

concorrentes diretos (óleo combustível, gás liquefeito de petróleo – GLP, gasolina

e álcool) foi determinado de maneira a tornar viável sua rápida adoção,

compensando os custos de conversão. Com isso, objetivou-se esgotar a

capacidade considerada ociosa do GASBOL, tendo em vista a existência da

cláusula de take-or-pay de 80% da capacidade total do gasoduto.

A demanda induzida pelo diferencial de preço do gás ao consumidor final

industrial e automotivo permanece atualmente aquecida, com taxas de 6,2% a.a. e

19,1% a.a. respectivamente, como revelam as taxas de crescimento das vendas

entre 2005 e 2006.

Em relação à geração térmica, o aumento do volume de gás destinado às

usinas termelétricas, influenciou fortemente o incremento verificado nas taxas de

crescimento do período. Tal aumento foi devido ao racionamento de energia

elétrica ocorrido no Brasil no ano de 2001, episódio em que o Governo Federal

propôs o PPT como uma alternativa à geração hidrelétrica. Desse modo,

acreditava-se que quando os níveis dos reservatórios das usinas apresentassem

5 Fonte: Revista Brasil Energia.

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capacidade de geração insuficiente para suprir a demanda, bastaria que o despacho

das térmicas fosse acionado.

No entanto, o teste final de disponibilidade das UTE’s que utilizam gás

natural como combustível, realizado em dezembro de 20066, para os sub-

mercados Sul e Sudeste/Centro-Oeste, indicou uma geração em média 42,8%

abaixo da programada para o conjunto das usinas em teste, sendo que 85,0%

deveu-se à indisponibilidade ou falta de gás, [21].

Foi assim que a demanda de gás natural pelas UTE’s apresentou entre

2005 e 2006 uma queda de 14,8% a.a., ficando aquém do despacho exigido pelo

ONS. Aliado à isso, a queda de 21,4% a.a. do consumo comercial, apesar de sua

baixa participação nas vendas totais das distribuidoras, contribuiu para que o

crescimento agregado das vendas de gás natural, para o conjunto das

distribuidoras, fosse de apenas 1,6%, bastante inferior à média anual entre os anos

de 2000 e 2006.

Segundo Moreira,Veloso e Regra (2007) a demanda de gás natural no

Brasil já se encontra no limite de sua expansão, principalmente em virtude dos

limites mencionados de capacidade da oferta atual, quais sejam as deficiências na

infra-estrutura de serviço de transporte e produção insuficiente.

Dessa forma, observa-se o contexto de esgotamento da capacidade de

ampliação da oferta no curto-prazo e de incertezas, inclusive políticas, advindas

das fontes externas de suprimento, evidencia-se a preocupação com os meios de se

garantir um abastecimento contínuo e em volumes adequados para o atendimento

à demanda de gás natural no país, inclusive em relação às termelétricas,

principalmente as que tiveram montantes de energia vendidos nos leilões de

energia, em 2005.

A Resolução Normativa 222 da ANEEL, de 06 de junho de 2006,

determinou que os contratos de suprimento de Energia Elétrica dos agentes

geradores termelétricos despachados pelo ONS, deveriam contemplar cláusula

estabelecendo penalidade pela falta de combustível.

Além disso, o Termo de Compromisso, firmado entre a PETROBRAS e a

ANEEL, em 04 de maio de 2007, com seus efeitos aprovados pela Resolução

6 O teste de disponibilidade de gás natural para o despacho simultâneo de 13 UTE’s a plena capacidade ocorreu durante o período de 0:00h do dia 11/12/2006 às 24:00h do dia 21/12/2006, sendo realizado pelo ONS em cumprimento à Resolução 755, de 30/11/2006, a ANEEL.

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Page 30: 2 O Mercado de Energia Elétrica no Brasil · O Mercado de Energia Elétrica no Brasil 2.1 O Setor Elétrico Brasileiro É previsto pela Constituição Brasileira que a exploração

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Normativa 275, de 07 de agosto de 2007, reafirmou a aplicação desta sanção à

PETROBRAS, quando a potência disponibilizada em um determinado mês por

alguma usina da PETROBRAS constante do Termo fosse inferior ao estabelecido

em despacho pelo ONS, devido à falta de combustível.

Levando-se em conta a necessidade de lastro físico da energia que todo

agente gerador deve ter para a energia vendida nos leilões, as restrições de oferta

de Gás Natural e a possibilidade de pagamento de penalidade, abordadas nas

seções acima, torna-se interessante para os agentes de geração proprietários das

usinas, pensar na possibilidade de operação das térmicas com outro combustível,

além do Gás Natural, através da conversão da usina para bicombustível.

O objetivo maior deste trabalho é avaliar economicamente esta flexibilidade

da usina operar com o Gás Natural ou Diesel, e estas análises serão desenvolvidas

no Capítulo 5 desta dissertação.

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