1º miniensaio expandido

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO TURMA 2015 Disciplina: TEORIAS ORGANIZACIONAIS: Estudos Avançados Professores responsáveis: Fernando Dias Lopes e Maria Ceci Misoczky Aluno: Kellerman Augusto Lemes Godarth 1º Miniensaio Expandido Data: 29/05/2015 UM NOVO PARADIGMA PARA A TEORIA DAS ORGANIZAÇÕES: evidências empíricas ou pura crença ideológica? Este ensaio teve sua gênese em três textos principais, que me trouxe à tona o âmago da ciência: a dúvida. Dallagnelo e Machado-da-Silva (2000) nos deram a pista inicial de que uma verificação apurada pode elucidar se houve ou não a ruptura com o modelo tradicional das organizações. Agostinho (2003) corrobora que um novo paradigma não pode ser inferido só teoricamente, e apresenta pesquisa empírica aplicando novas bases cientificas à Administração. Já Rebelo e Silva (2003) apresentam o Pensamento Complexo como a nova via emergente para as organizações. Estes escritos, além das leituras de autores como Chanlat, Morgan, Etkin, Capra, Morín, Pena e Gómez, Vergara e Branco, Kuhn, Alves- Mazzotti, Lamas e Godoi, Santos, entre outros, me despertou a questão se será mesmo a Teoria da Complexidade uma nova base científica para a administração ou somente mais uma tentativa ideológica malfadada? Apresento adiante um referencial teórico apurando a possível aplicação da Teoria da Complexidade nas organizações. Para que este levantamento possa ser possível, propus uma série de construtos retirados de tal Teoria, os quais podem indicar a emergência de um novo paradigma para a Teoria das Organizações. Analisando o ambiente empresarial, é possível perceber que as organizações estão diante de um ambiente altamente complexo em que a imprevisibilidade é o elemento que permeia todos os seus contextos. PARADIGMA E MUDANÇAS: possibilidades de diversos autores Thomas Kuhn indicou o conceito de paradigma, que para ele é direcionado para as realizações científicas, fornecendo problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes. Podemos entender também como modelos, padrões e exemplos compartilhados por uma comunidade para a descrição, explicação e compreensão da realidade. Assim, não é uma simples teoria, mas sim uma estrutura que gera teorias. Para Kuhn, um paradigma está em crise quando questões já não podem ser resolvidas pelas respostas modelares do mesmo. Sendo assim, diversos autores afirmam que estamos em plena revolução, na eminência de um novo paradigma.

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texto sobre teoria da complexidade

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL ESCOLA DE ADMINISTRAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ADMINISTRAO DOUTORADO EM ADMINISTRAO

    TURMA 2015

    Disciplina: TEORIAS ORGANIZACIONAIS: Estudos Avanados Professores responsveis: Fernando Dias Lopes e Maria Ceci Misoczky

    Aluno: Kellerman Augusto Lemes Godarth 1 Miniensaio Expandido Data: 29/05/2015

    UM NOVO PARADIGMA PARA A TEORIA DAS ORGANIZAES: evidncias empricas ou pura crena ideolgica?

    Este ensaio teve sua gnese em trs textos principais, que me trouxe tona o mago da cincia: a dvida. Dallagnelo e Machado-da-Silva (2000) nos deram a pista inicial de que uma verificao apurada pode elucidar se houve ou no a ruptura com o modelo tradicional das organizaes. Agostinho (2003) corrobora que um novo paradigma no pode ser inferido s teoricamente, e apresenta pesquisa emprica aplicando novas bases cientificas Administrao. J Rebelo e Silva (2003) apresentam o Pensamento Complexo como a nova via emergente para as organizaes. Estes escritos, alm das leituras de autores como Chanlat, Morgan, Etkin, Capra, Morn, Pena e Gmez, Vergara e Branco, Kuhn, Alves-Mazzotti, Lamas e Godoi, Santos, entre outros, me despertou a questo se ser mesmo a Teoria da Complexidade uma nova base cientfica para a administrao ou somente mais uma tentativa ideolgica malfadada? Apresento adiante um referencial terico apurando a possvel aplicao da Teoria da Complexidade nas organizaes. Para que este levantamento possa ser possvel, propus uma srie de construtos retirados de tal Teoria, os quais podem indicar a emergncia de um novo paradigma para a Teoria das Organizaes. Analisando o ambiente empresarial, possvel perceber que as organizaes esto diante de um ambiente altamente complexo em que a imprevisibilidade o elemento que permeia todos os seus contextos. PARADIGMA E MUDANAS: possibilidades de diversos autores Thomas Kuhn indicou o conceito de paradigma, que para ele direcionado para as realizaes cientficas, fornecendo problemas e solues modelares para uma comunidade de praticantes. Podemos entender tambm como modelos, padres e exemplos compartilhados por uma comunidade para a descrio, explicao e compreenso da realidade. Assim, no uma simples teoria, mas sim uma estrutura que gera teorias. Para Kuhn, um paradigma est em crise quando questes j no podem ser resolvidas pelas respostas modelares do mesmo. Sendo assim, diversos autores afirmam que estamos em plena revoluo, na eminncia de um novo paradigma.

  • Nas Cincias Administrativas, vrios candidatos a novo paradigma foram apresentados. Dos autores que consultei para esta pesquisa, Rebelo e Silva chamam de Lgica Administrativa Ps-Industrial. Dellagnello e Machado-da-Silva adotam a nomenclatura de Ps-Modernismo. Pena e Gmez proporcionaram em seu estudo a dvida sobre se a Responsabilidade Social seria uma nova forma organizacional, adotando o nome Business Ethics, ou de Empresa tica. Vergara e Branco, na mesma linha de pensamento, tomaram como designao Cidadania Corporativa, ou Empresa Humanizada. Boaventura de Sousa Santos afirmou que h um Paradigma Emergente, em substituio ao Paradigma Dominante. Agostinho denomina Teoria da Complexidade, designao que adotei neste texto. COMPLEXIDADE: construtos, pilares e conceitos-chave Num mesmo espao e tempo, h ordem e desordem; h determinismos e acasos; emerge a incerteza. Complexidade, para Morn (2002) um tecido de constituintes heterogneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do uno e do mltiplo, pois tudo muda do simples para o complexo, ou melhor, do menos para o mais complexo. Problemas complexos tratados como simples, agravam-se, apresentando como resposta para estes problemas o pensamento complexo. O argumento principal sobre uma teoria que pode servir como explicao para fenmenos organizacionais, chamada de Teoria da Complexidade. Para Agostinho (2003) o objetivo desta teoria propiciar novas maneiras para a emergncia de melhores solues para problemas organizacionais, sendo tambm considerada uma nova prtica administrativa que estaria mais adepta ao ambiente organizacional moderno. Morn (2002) afirma que o pensamento complexo deve ligar a autonomia e a dependncia, ainda que possamos ser, como seres humanos, produtos e produtores no processo da vida, indivduos, seres sociais. Por isso compreender a unidade e a diversidade muito importante, visto que estamos num processo de mundializao. Onde quer que estejamos somos atingidos, ao mesmo tempo em que preciso preservar a riqueza da diversidade cultural da humanidade. Ainda Agostinho (2003) deu conta do fenmeno da auto-organizao, que parte do pressuposto de que as organizaes tem a capacidade de serem flexveis, resistentes e inteligentes, do ponto de vista auto-regulador. Apesar de estar pouco desenvolvida, as pesquisas da teoria da complexidade tem hoje uma vertente direcionada para a administrao, tendo uma profunda relao com as teorias de sistemas, dinmica de sistemas e a ciberntica (GIOVANNINI, 2002). Este autor explica que o surgimento da teoria da complexidade se deu a partir das cincias naturais, sendo que tambm foi utilizada fundamentao da teoria de sistemas, e ao mesmo tempo a complexidade influencia a teoria dos sistemas, apresentando possibilidades de desenvolvimento antes inexistentes. No campo organizacional, a teoria da complexidade pode mostrar a mais interessante caracterstica dos sistemas complexos adaptativos: a capacidade de auto-organizao. Os sistemas complexos adaptativos (SACs) so estabelecidos em conformidade com quatro conceitos-chave: autonomia,

  • cooperao, agregao e auto-organizao. Agostinho (2003) os denomina princpios da Administrao Complexa. O pensamento complexo , portanto, essencialmente aquele que trata com a incerteza e consegue conceber a organizao, apto a unir, mas ao mesmo tempo a reconhecer o singular o individual e o contexto. Morn (2002) afirma que o objetivo do pensamento complexo ao mesmo tempo unir e aceitar o desafio da incerteza.

    Seguindo abordagem de Agostinho (2003), as vantagens da autonomia tornam-se evidentes nos sistemas complexos adaptativos. A seguir cito vrios construtos da teoria da complexidade relacionados autonomia. 1. Adaptabilidade Quando se abre mo da estrutura clssica de controle e se diminui o nmero de nveis hierrquicos, surge o incio das vantagens da autonomia: menor custo e maior agilidade e, portanto, maior adaptabilidade. 2. Aumento da diversidade A autonomia garante a gerao de idias novas e sua sobrevivncia at a ocasio de sua realizao, quando ento sero testadas e nomeadas. A autonomia um organismo que permite a criao. Desta forma, novas solues so inventadas, aperfeioadas e reproduzidas a todo instante, acrescentando a variedade das solues a serem selecionadas. 3. Aprendizado A explicao para o aprendizado vem da afirmao que, tanto indivduos como as organizaes aprendem, no sentido de que so capazes de observar as conseqncias de seu desempenho e de ajustar seus atos para buscar novos propsitos desejados. O aprendizado privilgio dos seres humanos e de suas organizaes, assim sendo um considervel benefcio sobre os demais seres. O ciclo da comunicao globalizada, a velocidade das informaes e a capacidade de prever teoricamente as conseqncias de suas aes resultam em uma enorme capacidade de aprendizado. Contudo, tamanho potencial s realizado quando permitido ao ser colocar seu julgamento em ao, isto , quando ele independente. 4. Reduo de erros Outra grande vantagem da autonomia a diminuio de erros, pois os indivduos autnomos possuem tendncia a rever suas aes em funo das suas experincias e tambm daqueles que convivem ao seu redor. Trata-se de uma avaliao dentro do seu consciente. 5. Soluo de conflitos As organizaes so ambientes de conflitos naturais, e a soluo destes conflitos s existe porque h cooperao. Entretanto, ao contrrio das estruturas rigidamente hierrquicas, os modelos organizacionais baseados na autonomia conseguem fazer com que o conflito seja resolvido localmente e de forma adjacente, evitando que tome maiores propores.

  • As discrdias que no so logo tratadas pelos atores diretos, tendem a se disseminar pela rede, contagiando outros agentes e dificultando o restabelecimento da cooperao. Estes indivduos que recebem o conflito e no sabem o real motivo da discrdia, possuem apenas o conhecimento parcial do todo, tendo apenas uma viso imperfeita do contexto. SACs - Sistemas Adaptativos Complexos As implicaes da teoria da complexidade para o campo organizacional so bastante recentes na viso de Lamas e Godi (2006). A anlise das caractersticas organizacionais atravs da lente do pensamento complexo de Morn (2002), possibilitam perceber as organizaes como Sistemas Adaptativos Complexos SACs. Concebidos por Holland (1995), os SACs constituem uma nova atitude de olhar o mundo, na qual os sistemas configuram-se como complexos por natureza, e adaptativos, na medida em apresentam caractersticas co-evolucionrias, isto , quando dependem da aprendizagem do sistema.

    Para Rebelo e Silva (2003) a complexidade estuda os SACs, e cada SAC nico. Cada qual emerge a partir de uma histria especfica e interage com um ambiente que, enquanto possa parecer similar, nunca exatamente o mesmo para outro sistema. Um SAC produz resultados que so diferentes e mais eficazes que aqueles que podem ser produzidos pelas partes do sistema trabalhando independentemente. Os SACs possuem uma caracterstica dinmica que os torna capazes de responder ativamente ao que ocorre ao seu redor, em sntese, so sistemas que aprendem luz de suas experincias reais. No entender de Holland (1995) os SACs exibem coerncia sob mudana, via ao condicional e previso e eles fazem isso sem direo central. Ao mesmo tempo, o autor esclarece que os SACs parecem ter pontos de alavancagem, nos quais pequenas quantidades de entradas podem produzir mudanas significativas. Morgan (1995) apresenta tambm, em sua analogia com os sistemas orgnicos, uma definio para organizao complexa, que um conjunto de partes interdependentes que, juntas, formam um todo, porque cada uma delas contribui com alguma coisa e recebe alguma coisa do todo que, por sua vez, interdependente com algum ambiente maior. A sobrevivncia do sistema tomada pelo objetivo e as partes e seus relacionamentos presumivelmente so estipulados por processos evolutivos. O debate trazido tona neste ensaio sobre a necessidade de um novo paradigma para as organizaes. Procuramos trazer alguns pontos de vista de autores que defendem esta possibilidade, cada um apresentando sua perspectiva, porm em concordncia quanto a alguns itens: supremacia da importncia do ser humano sobre a organizao em si, percepo complexa da realidade e queda da viso material consequencialista dos atos humanos e organizacionais. Assim, o novo paradigma posto deve gerar uma mudana na concepo de empresa, de um terreno de homens sem escrpulos movidos pela ganncia e lucro em direo a uma instituio socioeconmica que tem uma responsabilidade tica para com a sociedade (os consumidores, os acionistas,

  • os empregados e os provedores). Neste aspecto, a cada dia mais vigente uma conceituao antropolgica de empresa, que parte do entendimento da pessoa humana como autora, centro e fim de toda atividade econmico-social. Esta conceituao concebe a empresa como um grupo social constitudo por pessoas livres que organizadas, hierrquica e profissionalmente, cooperam de diversas formas como sujeitos de direitos com base em contratos livremente tratados e com a finalidade comum de produzir bens ou servios para intercmbio econmico. Em outras palavras pode-se dizer que uma vez que a empresa, enquanto uma organizao social, deve dar conta de funes que a sociedade dela espera e exige assumindo suas responsabilidades neste mbito, ela est obrigada a tomar decises com implicaes ticas. Assim, fica a pergunta: Ser a tica e a complexidade um novo paradigma adequado para a teoria das organizaes? Ou so apenas evidncias empricas ou pura crena ideolgica?

    Referncias AGOSTINHO, M. Administrao Complexa: Revendo as Bases Cientficas da Administrao. Revista de Administrao de Empresas RAE-Eletrnica, v.2, n.1. 2003. CAPRA, F. MINDWALK. Filme, DVD. CHANLAT, J. Cincias Sociais e Management. So Paulo: Atlas, 2000. CHANLAT, J. F. (Org.). O Indivduo na organizao. So Paulo: Atlas, 1991. DELLAGNELO, E.; MACHADO-DA-SILVA, C. Literatura sobre novas formas organizacionais. XXIV Encontro da ANPAD. Anais. Florianpolis, 2000. ETKIN, J. Gestin de la complejidad en las organizaciones: La estrategia frente a lo imprevisto y lo impensado. Mxico: Oxford University Press, 2003. GIOVANNINI, F. As Organizaes e a Complexidade: Um Estudos dos Sistemas de Gesto da Qualidade. Dissertao de Mestrado apresentada Faculdade de Economia, Administrao e Contabilidade da Universidade de So Paulo, 2002. HOLLAND, J. Emergence: from chaos to order. Massachusetts: Perseus Books.1995. HOLLAND, J. H. Hidden Order: How Adaptation Builds Complexity, edio em paperback, s.1.: Heliz Books, 1996. KUHN, T. A Estrutura das Revolues Cientficas. So Paulo: Perspectivas, 2003. LAMAS, Z. J. e GODOI, C. K. O Processo de Aprendizagem em Sistemas Adaptativos Complexos: Um Schema Terico de Interpretao. I Seminrio de Estudos sobre o Gerente. NAC-PMA-UNIVALI, Biguau, 2006. MACHADO, A. A Arte do Ndeo. 2 ed. So Paulo: Brasiliense, 1988. MORGAN, G. Imagens da organizao. So Paulo: Atlas, 1995.

  • MORIN, E. Da necessidade de um pensamento complexo. In: MARTINS, F. & SILVA, J.M. (Orgs.) Para navegar no sculo 21. Tecnologias do imaginrio e cibercultura. 2 Ed. Porto Alegre: Sulina, 2002. MORIN, E., CARVALHO, E., ALMEIDA, M., FIEDLER-FERRARA, N., COELHO, N. tica, solidariedade e complexidade. So Paulo: Palas Athena, 1998. PENA, R. P.; GOMEZ, P. F. La empresa tica: un nuevo paradigma? Condiciones, desafos e riesgos del desarrollo de la business ethics. XXVIII Encontro da ANPAD. Anais. Curitiba, 2004. SANTOS, B. S. Um discurso sobre as cincias. So Paulo: Edies Afrontamento, 1993. SILVA, A. B., REBELO, L. M. B. A emergncia do pensamento complexo nas organizaes. Revista de Administrao Pblica, v.37, n.4, 2003. VERGARA, S. C. & BRANCO, P. D. Empresa humanizada: a organizao necessria possvel. Revista de Administrao de Empresas, v. 41, n.2. XAVIER, A. M.; SOUZA, W. J. Responsabilidade social empresarial: estudo terico-emprico luz dos instrumentos Ethos. XXVIII Encontro Nacional da ANPAD. Anais. Curitiba, 2004.