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1 GESTÃO AMBIENTAL PÚBLICA Jorge Gabriel Moisés Filho 1 O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Os modelos econômicos A atividade humana, sobretudo a econômica, é a maior exploradora dos recursos naturais e os modelos adotados desde a Revolução Industrial possuem grande impacto sobre as condições de vida da população. São três os estágios de evolução dos modelos econômicos: crescimento econômico, desenvolvimento econômico e desenvolvimento sustentável. O crescimento econômico preocupa-se simplesmente com a criação de riqueza. É um dado quantitativo, como o crescimento do PIB, por exemplo, que não leva em conta a qualidade desse crescimento. Sua principal preocupação é com a eficiência técnica (produtividade) e econômica (lucro). O meio ambiente era visto como fonte de riqueza inesgotável a serviço do homem. Esse conceito evoluiu para desenvolvimento econômico, que incorpora outras variáveis relacionadas com a qualidade de vida da população. Saúde, educação, habitação, emprego, distribuição de renda e outros indicadores de bem-estar social foram incorporados a esse novo paradigma. Nesse conceito, se busca compatibilizar o crescimento econômico com a justiça social. Posteriormente, o reconhecimento de que os recursos naturais são limitados diante das necessidades humanas ilimitadas, e que os efeitos do uso indiscriminado dos recursos naturais podem afetar as condições de vida das gerações futuras deu origem ao conceito de desenvolvimento sustentável. A incorporação do “sustentável” ao desenvolvimento implica no reconhecimento de limites. Ele é definido como o modelo que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades. Tenta compatibilizar três objetivos: eficiência técnica e econômica, justiça social e preservação ambiental. 1 Técnico em Políticas Públicas do Departamento de Coordenação do SISNAMA DSIS/Ministério do Meio Ambiente

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GESTÃO AMBIENTAL PÚBLICA

Jorge Gabriel Moisés Filho1

O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Os modelos econômicos A atividade humana, sobretudo a econômica, é a maior exploradora

dos recursos naturais e os modelos adotados desde a Revolução Industrial possuem grande impacto sobre as condições de vida da

população. São três os estágios de evolução dos modelos econômicos: crescimento econômico, desenvolvimento econômico e

desenvolvimento sustentável.

O crescimento econômico preocupa-se simplesmente com a

criação de riqueza. É um dado quantitativo, como o crescimento do PIB, por exemplo, que não leva em conta a qualidade desse

crescimento. Sua principal preocupação é com a eficiência técnica

(produtividade) e econômica (lucro). O meio ambiente era visto como fonte de riqueza inesgotável a serviço do homem.

Esse conceito evoluiu para desenvolvimento econômico, que incorpora outras variáveis relacionadas com a qualidade de vida da

população. Saúde, educação, habitação, emprego, distribuição de renda e outros indicadores de bem-estar social foram incorporados a

esse novo paradigma. Nesse conceito, se busca compatibilizar o crescimento econômico com a justiça social.

Posteriormente, o reconhecimento de que os recursos naturais são

limitados diante das necessidades humanas ilimitadas, e que os

efeitos do uso indiscriminado dos recursos naturais podem afetar as

condições de vida das gerações futuras deu origem ao conceito de

desenvolvimento sustentável. A incorporação do “sustentável” ao

desenvolvimento implica no reconhecimento de limites. Ele é definido

como o modelo que atende às necessidades do presente sem

comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem a suas

próprias necessidades. Tenta compatibilizar três objetivos: eficiência

técnica e econômica, justiça social e preservação ambiental.

1 Técnico em Políticas Públicas do Departamento de Coordenação do SISNAMA –

DSIS/Ministério do Meio Ambiente

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Figura I – Evolução dos Modelos Econômicos

O contexto atual, com as evidências do aquecimento global e suas

conseqüências e a atual crise financeira mundial, indica que o único

caminho viável para a humanidade é o Desenvolvimento Sustentável.

Porém, para se transformar em realidade, e não ficar somente no

campo ideológico, é necessário muito trabalho, capacidade técnica e

operacional, troca de informações e coordenação entre

empreendedores, sociedade civil e o Poder Público, em todas suas

esferas.

Para os empreendedores é necessário investir em tecnologia limpa,

projetar produtos recicláveis ou reutilizáveis e implementar o conceito de ecoeficiência (produzir mais, porém com menor agressão ao meio

ambiente), transformando a questão ambiental de problema em oportunidade.

À sociedade, cabe diminuir o desperdício, facilitar a coleta seletiva,

não consumir produtos que agridam o meio ambiente e participar

efetivamente da elaboração e controle das políticas públicas.

Quanto ao Poder Público cabe o grande desafio de criar capacidade técnica e operacional para planejar e implementar políticas públicas

que visem o desenvolvimento sustentável. Para isso, é necessário mais que boa vontade: é necessário políticas eficientes e exeqüíveis,

profissionais capacitados e infra-estrutura adequada.

FORMAS DE ATUAÇÃO DO PODER PÚBLICO

O Estado tem papel central no planejamento do futuro da sociedade como um todo. Esse planejamento passa pela pactuação social de

políticas de desenvolvimento, envolvendo comunidades e empreendedores, fazendo de maneira conjunta a avaliação de qual a

melhor opção. É preciso superar a visão de crescimento incondicional,

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baseado na utilização sem critérios dos recursos naturais, para um

padrão de Desenvolvimento Sustentável.

Uma boa maneira de compreender as diferentes formas de atuação

das esferas do poder público executivo é através de uma classificação das vias de atuação do poder público sobre a questão ambiental.

José Carlos Barbieri (1997) estabelece em seu estudo um quadro no

qual ele divide esta atuação em três gêneros de instrumentos

políticos: Comando e Controle, Econômico e Diversos, conforme

apresentado no quadro abaixo:

Quadro I – Instrumentos de Gestão Ambiental

Gênero Espécie

Comando e Controle

Padrão de Emissão

Padrão de Desempenho Proibições e restrições sobre produção, comercialização e uso de produtos

Licenciamento ambiental

Econômico

Tributação sobre poluição

Tributação sobre o uso de recursos naturais

Incentivos fiscais

Criação e sustentação de mercados

Financiamentos em condições especiais

Licenças negociáveis

Diversos

Educação Ambiental

Reservas ecológicas e outras áreas de proteção ambiental

Informações ao público

Mecanismos administrativos e jurídicos de defesa do meio ambiente Fonte: Barbieri 1997, p. 143

O conceito de Comando e Controle se refere à atuação pública pela criação de leis, regulamentações e limites técnicos (Comando); e a

verificação e medição destes parâmetros (Controle). Atualmente o

Brasil conta com uma das legislações ambientais mais avançadas do mundo, porém, com grande déficit de implementação.

Os instrumentos de Comando e Controle são os mais facilmente associados ao poder público que, muitas vezes, a eles se limita.

Padrões de emissões e desempenho, restrições e proibições são os principais instrumentos deste tipo e normalmente se encontram em

leis estaduais (Comando), com órgãos fiscalizadores (Controle) vinculados ao Estado. Entre eles, está o Licenciamento Ambiental, o

nosso objeto de estudo desse curso, que será tratado mais adiante.

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Os Instrumentos Econômicos vão um pouco mais além. São

aplicados visando incentivar a mudança de comportamento das pessoas e das organizações, ligando a interferência das mesmas no

meio ambiente com benefícios e custos. Constituem-se de:

tributações sobre a poluição (emissão) e sobre o uso dos recursos naturais, incentivos fiscais, financiamentos em condições especiais,

criação e sustentação de mercados.

Os instrumentos econômicos são fundamentados nos seguintes princípios:

Princípio do Poluidor-pagador (PPP) e Princípio do usuário-pagador (PUP): obriga os agentes econômicos à

incorporação dos custos de controle dos custos externos gerados pela suas atividades (impacto ambiental) aos seus

custos privados. Princípio do beneficiário-pagador (PBP): pelo qual a

comunidade afetada subsidia os agentes econômicos para a adoção das medidas corretivas nas suas atividades.

Outra característica dos instrumentos Econômicos é a sua maior aplicabilidade em nível federal e estadual, por serem estas as

instâncias de controle mais amplo sobre as variáveis econômicas de desenvolvimento.

O grupo de instrumentos Diversos tem sido interpretado

principalmente nos dois primeiros itens do Quadro I, educação ambiental e reservas ecológicas e outras áreas de proteção

ambiental. Os outros dois, informação ao público e os mecanismos administrativos e jurídicos de defesa do meio ambiente, são quase

sempre relevados. No entanto, estes últimos são exatamente os de maior possibilidade de atuação local, indicando os maiores tópicos de

atuação para uma Prefeitura.

Ainda no grupo de instrumentos Diversos, pode-se também ver

explicitamente o que é chamado de Gestão Ambiental e alguns pontos de integração da mesma com atores externos à organização

pública da Prefeitura: mecanismos administrativos e jurídicos de defesa do meio ambiente é a institucionalização da maneira de gerir o

ambiente, seja ela linear ou sistêmica.

Quando o poder público administra as riquezas ambientais, reservas ecológicas e outras áreas de proteção ambiental, temos um exemplo

desta atuação não sistêmica. A natureza é tratada como externa à sociedade, e a ação é considerada uma simples prestação de serviço,

tomando o sentido de Manejo Ambiental.

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A POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE

A história da Gestão Ambiental Pública no Brasil tem pouco mais de

40 anos, conforme demonstrado no Quadro II abaixo. Porém, foi em

1981 que se deu seu grande marco, com a publicação da Lei

6.938/81. Segundo vários autores, essa lei é a certidão de

nascimento do Direito Ambiental brasileiro, é o marco zero da

consciência ambiental do Brasil e todo gestor ambiental público tem a

obrigação de conhecê-la.

Quadro II – Marcos históricos da Gestão Ambiental Pública no Brasil

Ano Norma Fato

1967 Decreto-Lei

303/67 Cria o Conselho Nacional de Controle da Poluição Ambiental

1973 Decreto

73.030/73

Cria a Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA e o Conselho Consultivo do Meio Ambiente - CCMA no âmbito do

Ministério do Interior

1981 Lei 6.938/1981 Estabelece a Política Nacional do Meio Ambiente

1989 Lei 7.735/89 Cria o IBAMA e extingue a SEMA

1992 Lei 8.490/92 Cria o Ministério do Meio Ambiente (ano de realização da

ECO-92)

A Lei 6.938/81 estabelece os princípios e objetivos da Política

Nacional do Meio Ambiente, cria o Sistema Nacional do Meio

Ambiente – SISNAMA, o Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA e estabelece quais são os seus instrumentos.

Entre os princípios da Política Nacional do Meio Ambiente é

importante destacar os seguintes pontos:

Considera a questão ambiental como assunto de segurança nacional (artigo 2º, caput).

Buscou no terceiro princípio constitucional a sua inspiração mais nobre: a proteção da dignidade humana (art. 1º, III, CF

88). A dignidade da vida humana está vinculada de maneira indissociável à qualidade do meio ambiente, já que é nele que

acontecem todas as ações humanas e é ele que garante nossa existência.

A necessidade e obrigatoriedade da ação governamental na

manutenção do equilíbrio ecológico. O meio ambiente é considerado como um patrimônio público e

de uso coletivo.

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Outro ponto importante é que a Política Nacional de Meio Ambiente

estabelece o desenvolvimento sustentável como o seu primeiro objetivo, conforme artigo 4º, inciso I:

Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: I - à compatibilização do desenvolvimento econômico-social

com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.

Dessa forma, a questão ambiental não deve ser obstáculo para o

desenvolvimento, porém, ela aponta para a forma pela qual se deva dar esse desenvolvimento.

O Sistema Nacional de Meio Ambiente-SISNAMA

Devido à amplitude do tema e sendo interesse de toda a sociedade, a

gestão ambiental só pode ser vista de forma sistêmica. Por isso, o arranjo político-administrativo adotado pelo Brasil para o Poder

Público é o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA.

O SISNAMA é a forma de demonstrar o arcabouço institucional da

gestão ambiental no Brasil. Este arcabouço compreende os entes federativos e o conjunto de órgãos e instituições do poder público que

utilizam recursos naturais. Tem por objetivo ampliar a efetividade da gestão ambiental pública e consolidar o processo de Gestão

Ambiental Compartilhada.

Em síntese, esse Sistema existe e atua na medida em que existem e atuam os órgãos que o compõem. Sua alma é a comunicação que

transmite e recebe estímulos, de alto a baixo, de um lado ao outro, entre os entes federados e seus partícipes.

GESTÃO AMBIENTAL COMPARTILHADA E A IMPORTÂNCIA DOS

MUNICÍPIOS

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu diversos serviços comuns a todas as esferas da federação, entre os quais a preservação do

meio ambiente. Estes serviços remetem à cooperação entre os responsáveis e à gestão compartilhada. Fortaleceu, assim, de várias

formas a ação municipal e a ação cooperada entre os entes federados.

Gestão ambiental compartilhada é o processo previsto pela Política

Nacional de Meio Ambiente pelo qual formas de cooperação e integração são estabelecidas entre os entes da federação, de forma a

assegurar a qualidade ambiental necessária à manutenção e melhoria

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da qualidade de vida e ao desenvolvimento sustentável, através de

uma repartição adequada de responsabilidades e recursos.

A ação ambiental dos municípios pode estar associada a inúmeras

possibilidades de interação entre os Estados e a União, compartilhando responsabilidades em condições de autonomia,

cooperação e complementaridade.

O município ao assumir seu papel constitucional traz uma série de benefícios, tais como: (i) mais proximidade dos problemas a

enfrentar e melhor acessibilidade dos usuários aos serviços públicos; (ii) maiores possibilidades de adaptação de políticas e programas às

peculiaridades locais; (iii) melhor utilização dos recursos e mais eficiência na implementação de políticas; (iv) maior visibilidade e

conseqüentemente mais transparência das tomadas de decisões; e (v) democratização dos processos decisórios e de implementação,

favorecendo a participação da população envolvida e as condições para negociação de conflitos.

O LICENCIAMENTO AMBIENTAL: Instrumento qualificador do

Desenvolvimento Sustentável

O licenciamento de atividades econômicas potencialmente poluidoras é um dos instrumentos de gestão ambiental.

Tem como objetivo qualificar o desenvolvimento: é um dos

mecanismos de que o Poder Público dispõe para assegurar que os empreendimentos produtivos levem em consideração os riscos que

sua instalação podem trazer ao meio ambiente, à sociedade e à sustentabilidade do desenvolvimento.

O Curso de Licenciamento pretende tornar mais eficiente a aplicação

do instrumento nos estados e municípios e, assim, contribuir para a

qualificação daquelas atividades

Bibliografia

BARBIERI, J. C. Políticas públicas indutoras de inovações tecnológicas

ambientalmente saudáveis. Revista de Administração Pública, Rio

de Janeiro, v.31 (2), p.135-52, mar-abr, 1997.

GODOY, André Vanoni de. A Eficácia do Licenciamento Ambiental

como um Instrumento Público de Gestão do Meio Ambiente –

Brasília. OAB Editora, 2005. 80p.

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SILVA FILHO, José Carlos Lázaro. GESTÃO AMBIENTAL MUNICIPAL: O caso da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2000