1.4. elster. pecas e engrenagens das ciencias sociais. 1994 (capitulos i, ii, iii, iv, x, xii, xi

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TraduçãoAntônio Trânsito

Revisão TécnicaPlínio A. S. Dentzien

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Prefácio à edição brasileira

Prefácio e agradecimentos

SUMÁRIO

ParteUm IntroduçãoI Mecanismos

Parte Dois Açao humana11 . Desejos e oportunidades

III Escolha racionalIV Quando a racionalidade falhaV Miopia e previsão

VI Egoísmo e altruísmoVII Emoções .

VIÍI Seleção natural e socialIX Reforço

Ensaio bibliográfico

Parte Três InteraçãoX Conseqüências'não-intencionais

XI EquilíbrioXII Normas sociais

XIII Ação coletivaXIV NegociaçãoXV Instituições sociais

XVI Mudança social

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CDD-300.1CDU-301 .

CIP ..Brasil.Catalcgação-na-fonte,Sindicato Nacional dos Editoresde Uvros, RI.

Elster, Jon, 1940~Peças e engrenageos das ciências sociais / Jon E1ster;

tradução Antônio Trânsito; revisão técnica, Plínio A. S.Deatzien.~ Rio de Janeiro: Relume-Dumarã, 1994.

Tradução de: NulS and Bolts for the Social Sciences.Inclui bibliografia.ISBN 85-85427-91-4

. .1. Ciências Sociais - Metodologia. 2. Inte~ação social,

1.Título.

E44p

94-1053

Todos os direitos reservados,A reprodução não autorizada desta publicação,por qualquer meio, seja ela total ou parcial, constitui víolação da lei 5.988.

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EditoraçãoKaoa 'PiIi Serviços de Editoração Ltda. MIl

CapaGustavo Meyersobre Mareei Duchamp,LesTamis(l965-1966).Detalhe do GrQnd Verre.

~[~t-- "-Título,'originai: Nuts andBolts, for lhe, SocialScietlces ,~~~~CCopyright 1989,Jon Elster' ,- ~ ,C Copyrightda edição brasileira, 1994 .' çr~~.DUMARÁ DISTRIBUIDORA DI!PuBUCAçOliS LIDA. ·1 ~"Ô...·'"Rua Barata Ribeiro, 17 -sala 202 1= "'" -, .22011..(J()()-RiodeJaneiro, PJ i~ ..,.;~~...I • :'#

tel.: (021)542-0248 fax: (021)275-Q294 J~ -ec . ~. "-t*' ..... o ~L..

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MECANISMOS

NESTE livro a ênfase está nare-;~o Rormecanismol~O n.vro oferece uma 1c-aixa de ferramentas de ~çªnisIllºsJ­

Qorcas ~I!..arafusos, engretlãgefrs-epôl~podem sef"USajLdas-"p_ara~plicãrTênôm~JLs.QCiais-aeYeras-c_QmQle~~~\.

IAs ciências sociais, como as outras ciências empíricas~I9plicar dois tipos de fenômenos: eventos e fatos. IKe1eição de 'Geocge BuslfC~é um evento. A presença de umamaioria de votantes republicanos no eleitorado é um fato, ou um~~de cois~.J Não é1iTIéd~~~e~t~ óbvio õ-~~-e ~aisfun~l

( dame~t!I., ~v~t110s Q.!J_fªlQs.\ Poder-se- la, bastante plausIverffien~\te~plicar a maioria republicana como sendo o resultado deuma série de eventos, cada um dos quais assumiu o caráter deformação de crença por um eleitor individual. 'IA segunaa pers-}

1p ectivã é mais fundamental:explicar eventos é logicamente an­terior a explicar fatos1 Um fato é um instantâneo temporal deuma torrente de eventos, ou uma pilha de tais instantâneos. Nasciências sociais, os eventos elementares são ações humanas indi-viduais, incluindo atos mentais tais como f<>.®~çãode crençÇ

Explicar um evento é fazer um relato de por que o mesmo~nteceu. Geral~ente, e sempre_~~.~~anális·e."!1 isso assu~l

1me a forn1ãdé CItar um evento previo como a causa do eventoque ~sejamos explicar.Junto com algum relato do mecanism2

Às vezes as pessoas explicam eventos citando outros eventos que ocorrem demodogeral mais tarde do que mais cedo no tempo. Quando válidas, tais expli­caçõesconformam-se em ültirna análiseao padrãoprincipal. O tópicoé adicio-nalmente discutido noscapítulos VIII e XI. .

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Mecanismos

causal que conecta os dois eventos. Aqui está um exemplo sim­ples, paradigmâtico. Queremos saber por que alguém mudou deidéia a respeito de um emprego que -prevlamenteconsíderavamuito desejável, mas agora acha totalmente desprovido de inte­resse. A explicação tem dois elementos. Primeiro, antes de mu­dar de idéia ele descobriu que não tinha chances de obter o em­prego. Segundo, há um mecanismo causal, com freqüênciareferido como redução de dissonância cognitiva, que faz as pes­soas cessarem de desejar o que não podem obter, como na histó­ria da raposa e das uvas verdes. Um evento mais complexo po­deria ser uma queda na média de manutenção de emprego. Oevento prévio teria sido legislação destinada a aperfeiçoar a esta­bilidade no emprego ~través da determinação de que os empre­gadores assegurassem a estabilidade no emprego a todos que te·nhamestadoernpregados por, digamos, dois anos{b mecaniSmO)causale a adaptãçâo raciónal-ã legislação' pelOSempregadores,que descobrem ser de seu interesse' demitir trabalhadores justa, ',_m~!1_t~_~~tesdoexpiramento do perí090 de doisanosr---

i Proposições qüe-prefenoem-:-êxpliCãr:üm-evel1l0-Uevem ser)cuidadosamente distinguidas de diversos outros tipos de proposi-

~ ~çõ.es.! Primei,ro,. expli.C.. ,a,ções .cau,sais de,v,.em,· 's,er distingUida,s. de \proposições causais verdadeiras, Citar a causa não é suficiente: omecanismo causal tarpbém dé'~ ser proporcionado, oi! ao menossu~rido.ZNa linguagem cotidiana, na maioriãdos éScritos histó­ricos e em muitas análises sociais científicas, omecanismónão éexplicitamente citado. Ao invés, é sugerido pelo modo pelo quala causa é descrita. Qualquer evento dado ,pode ser descrito demuitos modos, Em explicações narrativas pressupõe-se tacita­mente que apenas aspectoscausalménte relevantes do evento sãousados para identificá-lo. Se informados de que alguém morreuem conseqüência de ter comido alimento estragado, supomosque o mecanismo foi intoxicação alimentar. Se informados deque morreu em conseqüência de comer alimento ao qual eraalérgico, supomos que, o mecanismo foi' reação alérgica. Supo-

, nhamosagora que realmente morreupor causa de intoxicaçãoalimentar, mas que também era alérgico ao alimento 'em questão,

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.' Introdução

lagosta. Dizer que morreu porque comeu alimento ao qual tinhaalergia seria verdadeiro, mas enganoso. Iria sugerir o mecanismocausal errado. Dizer que morreu porque comeu lagosta seria ver­dadeiro, mas não-informativo. Não irie sugerir qualquer .meca­nismo causal e excluir muito poucos. Com efeito..o mecanismode fato poderia ser quase qualquer coisa, desde, ser atropeladoaté ser atingido por uma bala, se qualquer desse eventos fossed~adeado~ fato de a pessoa comerlagosta. ,','. ,; .. _

_I segu.ndo, as explicações causais deve.m ser distinguidas de\\afirmações sobre correlação. As vezes estamos em posição dedizer que um evento de certo tipo é ínvenavetmerae ou usual- !

mente seguido por um evento de outra eS.Pécie. Isso nãonos per-,!mite dizer que eventos do primeiro tipo causam eventos do se­gundo, porque há outra possibilidade: os dois poderiam serefeitos ~uns de um,terceiro,evento.! Consideremos 'a descober­ta de que as crianças em.casos âe custódia litigiosa,sofrem maisdo que as crianças cujos pais alcançaram um acordo particularsobre a custódia. Poderia ser que o próprio julgamento da cus­tódia explicasse a diferença, causando dor e culpa nas crianças.Também poderia ser, entretanto, que as disputas pela custódia ti­vessem mais probabilidade de ocorrer quando os pais são amar­gamente hostis um ao outro e que os filhos de tais pais tendam aser mais infelizes. Para distinguir entre as duas interpretações te­ríamos que medir o sofrimento antes e depois do divórcio. ':' ,

Eis um exemplo mais complexo, meu exemplo favorito, comefeito, dessa espécie de ambigüidade. Em Democracia na Amé­rica, Alexis de Tocqueville discute a alegada conexão causalen­tre casar-se por amor e ter um casamento infeliz.' Ele salientaque essa conexão ocorre apenas em sociedades onde- tais casa­mentos são a exceção e os casamentos arranjados a regra. Ape­nas pessoas teimosas irão contra a corrente e duas pessoas-tei­mosas 'provavelmente não terão um casamento muito felíz.?

2 Aqui o "terceiro fator" não é um evento, mas um traço de caráter: teimosia.Paraexplicaro traçode caráter,entretanto, teríamos que invocar eventos (gené­ticose sociais). Issoilustrao ponto,destacado anteriormente, de que a priorida­

"de doseventos sobreos fatosocorreem última instância, nãoimediatamente.

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Introdução

Os dois problemas que acabamos .de discutir' somam-se for­mando uma debilidade na mais .conhecida teoria da -explícaçãocientífica, aquela proposta por Carl Hempel. Ele diz que a expli­cação é a dedução lógica do evento aser explicado, com leis ge­rais e· colocações de condições iniciais como .premissas.: Umaobjeção é que as leis gerais poderiam refletir .correlação.vnãocausalidade. Outra é que as leis, mesmo que genuinamentecau-.sais, poderiam ser substituídas por outros mecanismos, É porisso que aqui coloquei a ênfase em mecanismos, e não em leis.Esta não é uma discordância filosófica profunda. Um mecanis­mo causal tem um número finito de elos. Cada elo. terá que serdescrito por uma lei geral; e nesse sentido por uma"caixa 'preta"sobre cujas engrenagens e polias permanecemos ignorantes.' Noentanto, para propósitos práticos - os propósitos do. cientistasocial atuante - o lugar da ênfase é importante. Áo concentrar­nos em mecanismos captamos o aspecto dinâmico da explicaçãocientífica: o impulso de produzir explicações cada vez-mais .re-finadas _. .~_._...~--~------. ~'~

ij~ Quarto, as explicações causais devem ser distinguidas do con,

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""tãr histórias. Uma explicação genuína dá conta do que aconteJceu, como aconteceu. Contar uma história é dar conta do queacont~eu.como p-oderia ter acontecíd..o_(~IDI v~z_tenha...aç0fl.teci-\do).(Acabo de argumentar que as explicações genuínas diferemde relatos do que tinha que acontecer. Estou dizendo agora quetambém diferem de relatos do que pode ter acontecido. O pontopode parecer trivial, ou estranho. Por que iria alguém querer vircom um relato puramente conjetural de um evento? Há algumlugar na ciência para especulações dessa espécie? A resposta ésim - mas este não deve ser confundido com o das explicações.

Contar histórias pode sugerir explicações novas, parcimonio­sas. Suponhamos que alguém afirme que o auto-sacrifício ou ocomportamento de ajuda é prova conclusiva de que nem todaação resulta do auto-interesse ou que o comportamento ernocio-

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3 . A preempção causaldeveria ser distinguida da sóbredetermlnação causal. Esta::úItima' é ilustrada por umapessoa sendoatingida simultaneamente por duas ba­

"h:. las;cadaumadasquaisseriasuficiente paramatá-la. Aprimeira é ilustradapor.. uma pessoasendoatingida por uma balae tombando em conseqüência disso,

.Adicionalmente, pessoas quev~_ª corrente são maltrata­das .por seus pares mais conformistas, induzindo amargura emais infelicidade. O primeiro desses argumentos apóia-se numacorrelação não-causal, entre' casar-se por amor e infelicidade. O

. segundo aponta para uma conexão causal verdadeira, se bem quenão a que os críticos dos casamentos por amor a quem Tocque­ville dirigiu seu argumento tinham em mente. Casar-se 'por amorcausa infelicidade apenas num contexto onde essa prãtica é ex­cepcional. Os biólogos com freqüência ser referem a tais efeitoscomo "dependentes de freqüência". Discuto essa noção no capí­tulo IX.

~Têfceiro, expliCãÇãescauSãisoevem ser âistiilguiOas oeafIrfrações sobre necessitação. Explicar um evento é fazer um relat9~e por que est~ aconteceu como aconte~eu. O f~to de que podeipa ter acontecido de alguma outra maneira, e teria acontecido de~lgum~ outr~ m~eira se ~ão tiv~sseacontecido com~ aco~e},ceu, nao está agUl nem ahJlConslderemos alguém. que sofre deuma forma incurável de câncer, que com certeza irá matá-lo den­tro de um ano. Contudo é morto num acidente de automóvel. .Para explicar por que morreu dentro de um certo período detempo, é fora de propósito dizer que tinha que morrer nesse pe­ríodo porque tinha câncer. Se tudo o que sabemos a respeito docaso é o estabelecimento do câncer, a limitada expectativa devida de pessoas com esse tipo de câncer e a morte da pessoa, éplausível inferir que morreu por causa do câncer. Temos o even­to anterior e .ull~t:me.c_anismº_~ªº_@L!uficiente p'~a pr~v~ar oevent.º-p,Qs..~..flor.1 Mas o mecamsm~.não énecessano: poaenaser}

\ subst!tUldo por outrofPara aescoonr o que realrrrenteaconteceuí\necessitamos de um conhecimento mais refinado. A busca nuncatermina: até o último segundo alguma outra coisa poderia terocorrido em lugar do câncer. No entanto, quanto mais sabemos,mais confiança temos de ter a explicação correta.!

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.Introdução

pode-se sempre contar uma histór~ eIll.9!:1e as coisas-sãocoloeg;das de cabeça para baixol Mas isso não prõva que elas reàlrrrerlté7)se.fãn1ãssim,'·nrais-:-doqJe as Just so Stories, de Kipling,' expU-" )fi '" ; ." .....~ .•• ",;<;,....-l''''''''''

!cam como o leopardo ganhoY-ªS_m~ou o etlo~ sua cQt.~:"

,iTFinãíffien,te; explicaÇõeScausais devem ser disdnguiO~, )\predições. As vezes podemos explicar sem sermos capazes 'deJpredi~r, e às ve.zes p~izeU~Ill..E....rmo.s~capa1;eJ-~e-explic~rj Êverêtãde, em muitos casos uma só e mesma teoria Irá capacitar­nos a ambas as coisas, mas acredito que nas ciências sociais issoé mais ã exceção que a regra;

Para ver por que podemos ter poder explicativo sem poderdepredição, consideremos mais uma vez a redução dadissonânciacognitiva. Em muitas pessoas esse mecanismo coexiste .com oexatamente oposto, capturado por ditos familiares como: :"A gra­ma é sempre mais verde 90 outro lado da cerca" e "Afruta proi­bida é a mais gostosa". As vezes parece que as pessoas queremser infelizes, desejando objetos demonstravelmente .fora de. seualcance simplesmente porque estão fora de alcance. Construauma cerca ao redor de alguém, e ele imediatamente quer sair.en­quanto que antes não tinha tal pensamento em mente. Até ondeeu saiba, não temos teorias que. nos digamquan<!~t.'m_Q"LOU"tI:.O

._de.sses-"mecanismo.s_ir-ª-ºp~~.\Quando-·um-dêies opera, reco,j

lnhecemo-lo ime~iata"mente e aSS,im podem.os eXPlicaro. cO,m,',.p,o.'.. r­tamento que gera. Mas níio podemos predi?er co~fj.avel~rite

g!Lando irá º~(ar:\. -'. ..' ,.~,~,.,:,."

. Outro exemplo ajudará a estabeleceresse ponto. Quando aspessoas tentam resolver-se quanto a participar numémpreend].mento cooperativo, tal como recolher o lixo do gramado ou vo­tar numa eleição nacional; elas com freqüência procurain saber oque os outros estão fazendó.AlgúmáSirãó pensar assim: "Se amaioria dos outros cooperar.eu também farei a minha parte, masse não cooperar, não terei obrigação de fazer isso." Outras irãoraciocinar de forma exatamente oposta: "Se amaioriacooperar,não há necessidade de eu fazê-lo. Se poucos dos outros c()opera­rem, minha obrigação de fazê-lo será maior." Com efeito, a

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4 Um conhecido exemplo de outro domínioé proporcionado pelos numerososbiólogos que afirmaram não haver possibilidade de explicar os organismos vi­vos por teorias químicas e físicas.

: ....; lo entanto, o sentido de realismo que também caracteriza a boa ciência deveria. :fazer-nos suspeitar da tendência simpllstade acreditar que todas as tentativas_ reducionistas terão suces$O.

Mecanismos

na! é prova conclusiva de que nem toda ação é racíonal.é Poder­se-ia concluir que há três formas irredutivelmente' diferentes decomportamento: rácional e egoísta, racional e não-egoísta e irra­cional. A' propensão à parcimônia que caracteriza a boa ciênciadeveria levar-nos a questionar esse ponto de vísta.ê Não poderiaestar no auto-interesse de alguém ajudar outros? Não poderia serracional sofrer influência das próprias emoções? O primeiro pas­so na direção de encontrar uma resposta positiva é contar umahistória plausível 'para mostrar como essas possibilidades pode­riam realizar-se. Poderia ocorrer, por exemplo, que pessoas aju­dam-os outros porque esperam reciprocidade ou que pessoas fi­cam zangadas porque isso as ajuda a conseguir o que desejam.Contando-se uma história é possível transformar um tema que

- seja metafísico em um que seja tratâvel pela pesquisa empírica.A questão agora é se as premissas da história são verdadeiras,não se é possível ou, impossível explicar uma faixa de fenôme­nos em termos de outros fenômenos, menos complexos.

Ao mesmo tempo, o contar histórias pode ser pernicioso sefor confundido com a coisa real. Muito da ciência social é guia­do pela idéia de que "tudo tem uma função". Mesmo' o compor­tamento que parece pernicioso e inadaptadodeveria ser mostra­do como útil e,alémdisso, ser explicado .ern termos de suautilidade. Para demonstrar função e utilidade, os estudiosos comfreqüência recorrem a contar histórias. Têm'umnümero conside­rável de expedientes à disposição.' Comportamento 'que não éótimo agora pode tê-lo.sido sob outras circunstâncias no passa­do. Comportamento que não é ôtímo tomado isoladamente podeser um ingrediente necessário numa solução de pacote ótimo; Oque é inadaptávelpara o indivíduo pode ser bom para a socieda­de. Com algum engenho -' e muitos estudiosos têm bastante -

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Mecanismos

maioria dos indivíduos está sujeita a ambos os mecanismos psí­quicos, e é difícil dizer, antes do fato, qual irá predominar., ,As vezes se diz que o oposto de uma verdade profunda é outra

verdade profunda," As ciências- sociais oferecem várias ilustra­ções dessa verdade profunda. Podem isolar tendências, propen­sões, e mecanismos, e mostrar que têm implicações freqüente­mente surpreendentes e contra-intuitivas para o comportamento.O que só mais raramente são capazes de fazer é estabelecer con­dições necessárias e suficientes sob as guais os vários mecanis­J:!1.9_S,_~ªo_P9s.tQs..eIIlJuncionamento.IEstaé outra razão para enfã-1

ftizar mecanismos de preferência a leis. As leis, por sua natureza,1I ~ão gerais e não sofrem exceções. Não se pode ter uma lei para oJJ~feito-de-qu~se-p,entãÇ)-a-lgl:1'maS-y.eles-q:,rOs mecariisrrfa-s-;---­por contraste, não têm pretensões à generalidade. Quando identi­ficamos um mecanismo através do qualp leva a q, o conhe­cimento progrediu porque acrescentamos um novo item a nossorepertório de modos pelos quais as coisas acontecem. '

Contrariamente, podemos ter poder de predição sem poder ex··plicativo. Para predizer que menos mercadoria será compradaquando seu preço subir não há necessidade de formar-se uma hi­pótese sobre o comportamento doscorisumidores. Sejam quaisforem as molas da ação individual - racionais, tradicionais ousimplesmente aleatórias -, podemos predizer que as pessoasirão comprar menos da mercadoria simplesmente porque pode-

cJ:iio .arcar.com.menos deloJAqni há váiios mecaniSmrnr'l~~Iforçados a levar ao mesmo desenlace, de modo que para pro-

Ipósitos d.e predição não há necessidade de decidir entre eles. oentantolPara propósitos explicativos, o que importa é o mecani~

6 "Oposto"deve ser tomado antes no sentido de negação interna do que externa.A negação interna de "As pessoas preferem o que podem ter ao que não podemter" é "As pessoas preferem o que nãopodem ter ao que podemter," Ambasas,colocações produzem percepções verdadeiras e importantes. A negação externada primeira colocação é simplesmente que "As pessoas não preferem o que po-

. dem ter ao que nãopodem ter", umacolocação que não sugerequaisquerper­cepções importantes.

T .. Embora SidneyMorgenbesser tenha sugerido como"primeiralei da lógicaju­.;::' d.~if~:':, sep, porque.nãoq'! ,

Introdução

mo. Ele proporciona compreensão onde a predição oferece, nomáximo, controle.s

Com propósitos de predição, também, a distinção entre corre­lação, necessitação e explicação fica sem sentido.lâe há uma re­gularidade com aspecto de lei entre um tipo de evento e outro,não importa se o mesmo se deve a uma relação causal entre elesou a serem efeitos comuns de uma terceira causa. Em qualquercaso podemos usar a ocorrência do primeiro tipo de evento para­predizer a ocorrência do segundo. Ninguém acredita que os pri­meiros sintomas de uma doença mortal causam a posterior mor­te, no entanto eles são regularmente usados para predizer esseeventoí Similarmente, não importa para os propósitos de predi­ção se um mecanismo. de necessitação poderia ser substituídopor outro. Saber que uma pessoa tem câncer incurável permite­nos dizer que ela morrerá, aconteça isso ou não de fato devidoao câncer. '

8 "No máximo", por razões discutidas nocapítulo11.

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DESEJOS E OPORTUNIDADES

A'- UNIDADE elementar da vida social é a ação humana indivr--'dual. Explicar instituições sociais e mudança social é 'mos­

trar como elas surgem como resultado da ação e interaçãodein­divíduos. Essa visãQ, com_freQüência'chamada individualismdmetodológico~é, na minha" opinião, trivialmente verdadeira. ,Muitos pensam diferentemente, entretanto, e alguns de seus ar­gumentos serão mostrados no capítulo XV:..."lAqui desejo salien~

\ que as aç~~.~_~~~i~idu~is, elas pról?rias, necessitam e:plicaçãoLJUm esquema sImples para explIcar uma ação é ve-la como r~-f

(Sultado final de duas _~pera.ções filtrad..Qras sucessfv~fcorneça­mos com um grande conjunto de todas as ações_a~mentepossíveis que um indivíduo Qoderia empreender. Pprimeiro fir;tro é constituído por todas as coerções fíSicas, econômicas, le­gais e psicológicas com que o indivíduo se depara. As açõesconsistentes com essas coerções formam seu conjunto de opor-uni~es10 segundo filtro é um mecanismo qiieaeternllna quãf\

ão do conjunto de oportunidades será de fato executaºª'-.Nesta~osJÇ1l2 os prfiiêIPãis mecanismos a serem consiCfêi1Klos-são ascolha racionar (capítulo Il~~ormas s~iarS\(~apítulo XII).2

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o termo "indlvíduo'' será usado num sentidoampliadoque também inclui res:ponsãvels por decisõescorporativas. como firmas ou governos.:(Mas veja o ca­pituloxv.>, .

2 Poder-se-iaargumentar. ao invés,que'as normassociais estão entre as coerções, colocadas diante de um indivíduo. Considero mais útil pensar nas coerções

como criando uma forte distinção entre o que é factível e o que não é. Umapessoa não pode gastar mais que sua renda.suspendera gravidadeou votar emocasiões diversas que dias de eleições. mas pode violar a norma que impedeusar sapatosmarrons com roupasde noiteou a de reciprocidade de favores.

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Há escolas de'teoria social, freqüentemente referidas como "estruturalistas",que afirmam que toda explicação de comportamento assume essa forma-. Osmarxistas freqüentemente argumentam; por exemplo, que os trabalhadores sãoforçados pelas circunstâncias a vender seu labor aos capitalistas; 'exatamentecomo estes são forçados pela competição a exploraros trabalhadores. Para vera falha no argumento é suficiente notarque ninguém é forçado a ser um capita­lista:sempreexistea opçãode tornar-se umtrabalhador.

.Pode haver ainda umaescolha não trivial comosob que ponteo pobredeveriadormir, O pontoé geral: o conjunto de oportunidades raramente se reduza.lite-ralmente umaopçãofísica.

Desejos e oportunidades

têm nenhum papel.4 O rico e o pobre igualmente têm a oportuni­dade de dormir sob as pontes deParís.rnas o pobre pode. não teroutras oportunldades.> Há, também, casos em que a natureza dosegundo filtro não afeta o resultado. Como foi observado no.ca­pítulo I, o fato de que as pessoas (globalmente) comprammenos

•de uma mercadoria quando seu preço sobe pode ser explicadoindependentemente do que motiva as pessoas (individualmente)a comprar ou não comprar. Se os seus rendimentos permanecemos mesmos, comprarão menos da mercadoria simplesmente por­que poderão arcar com menos. Os estudiosos discordam da im­portância relativa das preferências e oportunidas na explicaçãodo comportamento. Alguns economistas argumentam que todasas pessoas têm essencialmente as mesmas preferências e. dese­jos, apenas as oportunidades diferem. Embora comumente, fiéisdefensores da teoria da escolha racional, eles são levados, para­doxalmente a argumentar que a escolha quase não importa por­que quaisquer variações emcomportamento devem ser explica­das por variações em oportunidades. A 'maioria. dos cientistassociais, entretanto, acreditá. que as pessoas diferem em seus'de­sejos assim como em suas oportunidades, e essa visão parece-meobviamente correta de modo a não exigir defesa ulterior.' ., No entanto, em casos particulares ainda há espaço para deba­te. Os historiadores da escravidão, na antiguidade clássica ou nosul dos Estados Unidos, sugeriram duas explicações diferentesna baixa taxa de investimentos nessas sociedades. Alguns argu­mentaram que aos proprietários de escravos faltavam oportuni­dades para investimento. Os escravos tratavam-suas ferramentas

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. . .. . . .3 .Alérndísso.normas sociais internalizadas poderiam impedir-me de furtarmes-

mo quandonão houvesse risco de descoberta e punição. .

Ação humana

, Irei concentrar-me~em mecanismos gerados pela esc~principalmente pela'::iiiêilidade-de....exp..osl a mas também por­que acredito sere I estes mais· fundamentais que os gerados pornOPllas. . ___

íNessa perspectiva as ações são explicadas por oportunidadesrecrese.is>"~.,~l1elOgueas Qess~Q.odeQl~...P1:10..9~eg~LL~er!O comportamento dos consumidores é um exemplo sim­

ples. Se vou a uma loja com vinte dólares no bolso e a firme in­tenção de gastá-los (queimarão um buraco em meu bolso se nãoo fizer), há um sem-número .de combinações de mercadoriascom as quais poderei sair. Quais delas realmente terminarei porcomprar depende de minhas carências, preferências; desejos. Ocomportamento criminoso proporciona um exemplo mais com­plexo. O efeito das coerções legais .não é tornar as ações crimi­nosas impossíveis, mas torná-las mais dispendiosas. Sem essascoerções, o furto sem riscos seda uma de minhas oportunidades.Dadas as coerções, minha escolha está entre o comportamentosubmisso à lei e o furto arriscado. Depende dos ganhos certos epossíveis perdas associados com as alternativas e, desde que oganho do furto é imediato e certo, enquanto a perda é protelada eincerta, de minhas preferências de tempo (capítulo v) e de minhaatitude em relação ao risco.ê ." .....:..,._.:.>.._-~---~--_._._--.-lMü"ITodil" ciê'ilCíã"soê1ãfCõnsiste em variações interminaVel-){mente elaboradas sobre o tema das oportunidades e desejos.Tentarei i,mPQr_alg~~eestnituraa essa atordoante~~~deprátic~s.1 Isso tambémme-pe'rmitil'â~discüfiralgumas das razões-.. boas e não tão boas - que as pessoas aduzein para argumen­tar..Q.1!.~e2.rtunidadessão mais fundamentais que p~ferênçjpso--

,...- Para começar, pooemõ'S'í1õtar (!ueTí1emsémpre preci~amosjapelar·tanto para oportunidades como para preferências. As ve­zes as coerções são tão fortes que não é deixado espaço para qu~o segundo filtro~Qp.eJ~~~todç~ortUJ;~idad~~é redl.ltidcul!uma únic_La.ç~~a.explicaçãodàqua~ escolhas (ou normas) não

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estão sob controle do governo' não são sempre os causalmenteimportantes. Suponhamos que um desempenho econômico fracopossa ser rastreado até chegar ahomens de negócios avessos àriscos e a sindicatos fortes. O governo pode estar plenamenteconvencido de que a atitude mental dos administradoresseja acausa mais importante, e no entanto ser incapaz de' fazer qual­quer coisa a respeito. Em contraste, os sindicatos podem ser con-trolados até certo ponto por.políticas salariais. 'JAté aqui .estiveargumentando como se os desejos e oportuniJdades fossem dado.s independentemente uns dos outros e pUdes-~sem variar independentemente uns dos outros. Volto-me agorapara casos em que ambos são influenciados por um terceiro fa-

r tor, e dePOis. ~ar~ casos em que podem i.!!fluenciar diretaJ11eIJ!~ .I._~ns~LO~ (ver Fig. 11.1). . .

Para ilustrações do caso A na Fig. 11.1 remeto-me inicialmente,a Tocquevílle. Em A Democracia na America abundam instãn­

.cias nas quais desejos~e.-ºportunidades são rastreadoa.devoltaaté uma causa comum'IAs vezes ambos agem em conjunto.\As­sim, diz Tocqueville, a escravidão não apenas impede que os ho­mens brancos façam fortuna, como até os desvia de desejarem

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(8)

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Desejos e oportunidades

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6 Adicionalmente, comose argumenta mais adiante,o melhorcaminho para mu­. " dar suas opiniões pode ser mudarsuas circunstâncias. Masesse é um argumen-

to à parte, .

. Ação humana "".

tão mal que o investimento em produção mecanizada; não i erauma opção real. Outros argumentaram que aos proprietários deescravos faltava motivação para investir porque preferiam umavida de consumo luxuoso e conspícuo. Debates similares são en­contrados na sociologia da educação. As crianças de famílias declasses trabalhadoras abandonam a escola cedo porque não têmrecursos para continuar ou porque seus valores diferem dos dascrianças com uma formação de classe média? Esses temas nãopodem ser resolvidos em bases metodológicas. Devem ser discu­tidos caso por caso, considerando a evidência empírica. E no en­tanto são freqüente mas desorientadoramente apresentados comoquestões m~todológicas. '. . ..J As oportunidades são mais' básicas que os desejosemu~as.\Ipecto: são mais fáceis de o~ervar,-,}ª-º_ª~º-ªª-~ientis~ so­cial, mas tamOém por outros indivíduos na sociedad~tra­tégia militar um ditado básico é que se deve fazer os' planos nabase das capacidades (verlficãveisjdo oponente, não de suas in­tenções (não-verificáveis). Com freqüência isso implica planejara partir de uma suposição de pior-das-hipóteses: ó oponente tra­tará de ferir-nos se puder fazê-Io.§e caêlalaêlo'pranejã combãSêtas capacidades do outro lado, e sabe que o outro lado está faizendo. o ~esmo, suas verdad~~~~refer!~cias p~dem não infp-º-rtar mUltd; .

---rAmãã uma outra razão pela qual as oportunidades pOderiamjF

lparecer mais fundamenta.is que osdesejos tem a ver com a possí­bilidade de influenciar o comportamento, Comumente é mais fá­cil mudar as circunstâncias e oportunidades das pessoas do quelE.!:!dar suas opiniões.fEsse é um argumento ê1e cusfo-oenefíCiõsobre a eficáciíCnronetária de pol]iticas alternativas' - não umargumento sobre poder explicativo relativo. Mesmose o gover­no tem uma boa teoria que permite tanto a explicação como apredição, ela pode não permitirmuito controle. Os fatores que-;

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7 Ou, mais perversamente, o que não podem conseguir.

Desejos'e'opoftunidades

melhoramentos encontrou-se com oportunidades para melhora­rnentos. Onde a natureza é pródiga demais não há necessidade, eond~.,..é ~gassadem~há op~~~nidades. '. .~Desejos e oportunidadés tamoempodem afetãi'-se uns ao-s-olf'/I tros diretamente~Consloeremo-s-jn--rctãIÍllente o mecanismo indi­

cado pelo.ca~- 'e-da-P1~l..,I,•...o~~ tocou em.alguns modos

e atS as oportunídadse podem afetãroscl'e-seJos· as ssoaspodem terminar por desejar oQue podem conseguir. Mais umavez p emos citar Toçqueville sobre a escravidão: "Será umabênção de Deus, ou uma maldição última essa disposição daalma que dá aos homens uma espécie de gosto depravado pelacausa de suas aflições?" Isso proporcionaria uma razão a: maispara acreditar as oportunidades como mais básicas gtié as prefe~

:~.~rConjun:amente, oPortU?i~.ad:~ e desejos são as.' cau.s~s.J'J

!:lmedlatas da açao, mas a uma distância maior apenas' as oportu-nidades importam, uma vez que também modelam os dese 'os;~modo de colocar o assuntQ,~ntretanto, é drástico dem;J:'qmecarnsmo das "uvas verdes" asse~ã011aJaõpção forado conjunto de oportunidades que' seja preferida à opção preferi­da dentro do mesmo, mas isso não faz com que qualquer opçãofactível em Qarticul ..'a a preferida, "

\Q me~anismo oposto o do caso, C da Fig. n.i, também pode~ , operar·IAs vezes o conjunto de oportunidadesé-creTil5efãaamenté \

\ modelado p~os desej<?!.2e uma pesso~I''1ão tentio em mente""

e~q!!! o ~..e.s.ejQ.,-4nRorta.nte na p.rá,tica mas teoricamente tri~.i~l, '~e

I expandir o~~e oportunId~des, mas os caso~ m.~l;'g e-s-;-n'b"squals as pessoas podenam empenhar-se~e?UZIrJoconjunto de opções disponíveis. Discutirei' duas razões pelasquais as pessoas podem adotar tal comportamento autolimitadorou auto-restritivo.

Primeiro,. há a fraqueza da vontade. Discuto esse fenômenomais~xtensamente nos capítulos IY .e v.~ é rele-vante aq~i. Como ilustra a história de1Ulis~e~.l:_as.~er~spessoas nao podem confiar sempre emquengnao racionalmente.

34

Ação humana

fazê-lo. Na América os eleitores numca elegem homens de dis­tinção, em parte porque não têmoportunidade de fazê-lo (ho­mens de distinção não desejam entrar, para a política) e em parteporque não elegeriam candidatos_ sqp~~, estes apa­rczesse~.IÊffi outros casos, argumenta Tocqueville , o efeitõSõ.l

\ bre os desejos-!,S> efeito sobre oportunid~es trabalham em direfl ções opostasA Não há tempo nas vidas dos norte-americanos,áfirma ele, nõ qual os mesmos tenham tanto o lazer como a in­clinação a estudar, donde a ausência de norte-americanos bem­educados. Nos Estados Unidos a religião - em si mesma umefeito da democracia - afasta o desejo de fazer o que. a demo­cracia permite que as pessoas façam.

Há um ditado segundo o qual a necessidade é a mãe da inven­tiva. Similarmente, os historiadores sociais com freqüência su­põem que a privação é a mãe da revolta e de outras formas deação coletiva. Nenhuma das afirmações é obviamente válida. Oque é verdade é que quando as pessoas estão em situação muitomá a sua motivação para inovar ou rebelar-se é muito alta; Suacapacidade ou oportunidade de fazê-lo, entretanto, é a maisbai­xa quando estão em circunstâncias difíceis. A inovação requerrecursos, tempo, investimentos caros com um resultado pro­telado e incerto -' mas é exatamente com isso que empresas àbeira da falência não podem arcai.'Empresas prósperas podemarcar com inovações - mas podem não .incomodar-se em fazê­10. A participação na ação coletiva requer a capacidade de retirartempo de atividades diretamente produtivas - mas é exatamen­te com isso que o trabalhador ou camponês empobrecido nãopode arcar. O camponês médio e o trabalhador que conseguiupoupar um pouco podem arcar com juntai-se a uma rebelião ougr-eve, mas sua motiv!1çã2.-é menos aguda.fUma vez que tantõàJ:e'f~Jivªjnovaçãocomo a efêtiVãpãitlcipáÇão dependem tanto deIdesejos, como dê-oportunidades, e uma vez que estes variam eITfdireções opostas com a adversidade das circunstâncias, não po­.demos dizer a priori que nivelde adv~rsidade tenderá a favoreLcer o efeito em guestão~ Marx argumentou que a civffizaçãosur­giu nas zonas temperadas porque apenas ali a necessidade de

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Ação humana

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37

Desejos e oportunidades

será (1,1). Para evitar isso ele vai, ao invés, para a esquerda.Mais concretamente, suponhamos que I e 11 sejam dois exércitosoponentes. O primeiro movimento de I corresponde à escolhaentre abrir negociações e atacar. Se I escolher o ataque, 11 teráentão a escolha entre recuar e lutar. Porque a guerra seria muitodestrutiva, o interesse de 11 seria recuar. Entretanto, 11 pode usaro clássico estratagema de queimar suas pontes e, dessa maneira,tomar a retirada fisicamente impossível e, como conseqüêneía,trazer I à mesa de negociações.8

Falando estritamente, há algo de incongruente em explicaruma ação em termos de oportunidades e desejos. As oportunida­des são objetivas, externas a uma pessoa. Os desejos são subjeti-

"vos e internos. Não temos problemas em compreender como osobjetos externos podem agir um sobre o outro para produzir umresultado, nem emcaptar a noçãode causalídade puramente 'psí­quica. E menos claro como elementos objetivos e subjetivos po­'dem interagir para produzir Uma ação. Com efeito, o 'que explica, a ação são os desejos da pessoa juntamente com ~uas crenças arespeito das oportunidades. Como as crenças podem ser equivo­cadas, a distinção não é trivial. A pessoa pode deixar de percebercertas oportunidades e por isso não escolher o melhor meio dis­ponível de realizar o seu desejo. Inversamente, se acreditar quecertas opções não exeqüíveis sejam exeqüíveís, a ação pode terresultados desastrosos. Seria ingênuo pensar, por exemplo, que apolítica pública pode ser e?,plicada pelos objetivos do governo eas oportunidades que, objetivamente falando, lhe estão abertas.Mais exat.amente, os objetivos interagem com as crenças -,_ na

'verdade, teorias altamente polêmicas - sobre o que são polí-ticas econômicas exeqüíveís.

,,8 O jogador 11 também poderia queimarsuaspontes,se antecipasse que a fraque­za de vontade poderia evitarque lutasse caso tivesse outrasarda. '

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" iníci0---9ue a oportunidade sur.ffi. Posso decidir não irà festa aoescritório se estiver com receio e fazer algo tolo. A 1ºde janei-ro posso pedir ao meu dentista para enviar-me a conta integral sea.20 de janeiro eu cancelar minha consulta de 21 de janeiro. Umgoverno pode entregar o controle da política financeira ao FundoMonetário Internacional para impedir-se a si mesmo de ceder aexigª--l},.Çias.QQpulares de aumento de salários. ' '

\Ém seguida11r~a Ínteração estiãiegíca. 'PõOê--s--e"""'-às::-':v::-:-e=-=z::-:-e=-s=m=-=etlihorar os próprios resultados ao _~.iminar certas-Ep_ç.§es do .confjunto.,4~po~nidades'IParaver como, consideremos um jogoentre dois agentesou-jõgaetores, I e 11 (Fig. 11.2). Nesse jogo lé oprimeiro a mover-se. Ele pode, ou terminar o jogo movendo-separa a esquerda, caso em que ambos recebem um prêmio de 3,ou mover-se para a direita, caso em que II tem o mov imento se­guinte. Nesse caso, 11 pode garantir 2 para si mesmo e 4 para Iao mover-se para a esquerda, enquanto que, se se mover para adireita, ambos receberão 1. Naturalmente, se II é racional, ele semoverá para a esquerda. Similarmente, se I é racional e sabe quepode contar com a racionalidade de Il, ele se moverá para a di­reita. Note-se, entretanto, que o resultado (4,2)nãó é o que IIpreferiria. Ele gostaria mais que I se movesse para a"esquerda,para o resultado (3,3). Um rriodo pelo qual 11 pode alcançar esseobjetivo é eliminar sua opção de ir para a esquerda no segundoestágio. Nesse caso I saberá que o resultado de ir para a direita

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isuliàdo global. Essa sente~_g~nt~s,imp1.es-t:esumG-a.

,te.ori.a..d~scolharaciona:ql~estee no próximo C~@,ítUlOS ten,_tareimos~~plexidades §Curtas nessa form~ção. .' ' _~.,~ escolha racional ê instrumental: é guiada pelo resultado da, ação. As ações são avaliadas e escolhidas não por elas mesma,5,

mas como meios mais-ou-l1WR0S-e.Hc.ientes...para um flm.nlterícr,.Um exemplo simples é oempreendedor que deseja maximizar olucro. Para alcançar essa finalidade ele considera cuidadosamen-te 9U~.P~.Ylºª.~9fere?e~!.qu8:nto,s .gel~ª-p..r,odJJ.ÚLe....comº:p-r,oduzi::.....!2§t Um exemplo mais complex() é o general a quem fOI orc;kna-l~do derrotar o exército inimigo aQu~lgyer custol[ara si próprio.Antes que possa distribuir os seus soldados, ele precisa formaruma opinião sobre os planos iriirrijgd.s._Acii.cionalmente, deve to­mar§edidas p~dar ao inimigo uma idéia errada Isobre os se~própnos Qlanos~J1mivez que sabe que os generais inimigos ,es­:tão cientes desses cálculos e, com efeito, estão realizando ele,jmesmos um raciocínio similar, deve tentar adiv~orreta

ente suas intençõe~e vencê-los em esperteza. Um exemplomais polêmíC'()é-o-d ator que está experimentando diferentesmaneiras de desempenhar uma cena até que' "acerta na mosca".Ele está considerando meios alternativos visando o mesmo fim,

..1;.,i:.m contraste, ocomportamento orientadopor normassociaisnão estã preocu­pado com resultados. Essecontrasteé.explorado nocapituloXlii •. '

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Escolha racional

a criação de um trabalho que tenha valor estético, rejeitando all\aioria deles e finalmente aceitando um. 'i;", .' j·i. ,,- ,,',l~vez~Sããistil1çãõel1tre meiõ':"e fim parecesemsen@õl'Se,

.ao ser-me oferecida aesc~a hranjae uma maçã, euescolher a laranja, não será por qualquer resultado que eu queiraprovocar. Não é como se eu escolhesse a laranja para criar certasensação em minhas papilas gustativas.ê Eu a pego porque prefe­riria uma laranja a uma maçã. Quando decido que gostaria maisde passar algum tempo com um amigo do que ficar até mais tar­de no escritório, não é necessário ter qualquer objetivo comumpara o qual asduas ações sejam meios alternativos. Vamos suporque seja simplesmente mais importante para mim estar com meuamigo do que terminar meu trabalho. Embora essas categorias'não se encaixem na categoria meio-para-um-fim, issonão é mo-tivo para dizer'que não sejam racionais. ' . " ".- - ,

Há um modo, entretanto" pelo qual tais escolhas podem serassimiladas à ação instrumental. Perguntando-se ao indivíduo ouobservando-se o seu comportamento pode-se descobrir como ele~~~.~,~~~'pçõeS.3!(Jfuãpê~-põâêr~ã-prefêfirtrê-0a:anjã"S-a7(~tro ma~as, ma~:scalh:r CinCO ma.~~m}ug~~~~~jas, Uma lista de tais opçoes emparelhadas e chamaqa a,oraenz­aeprê!i;:e;;,Clai'de uma pessoa. Pelo uso de um truquematémâti:~ctfta"qrQem-de-~referências podeser convertida Í1umal,lU,!ça~'uiilidade:lque é uma maneira de atribuir números às opções, de

- modo que as opções preferidas recebam números mais altos,". . , . '; .,

2 Entretanto, a minhaescolhada laranjaobviamente temalgoa ,vercom.as sensa-çõesde paladar. como veremos nocapitulo IX. '. .," '. , " " '. . . '

3 Essas opções podem estar dentro de' seu conjunto de oportunidades ou foradele.' . " . " : " . ., ',i'" ;'

4 Esse passodaspreferências às funções de utilidade é possívelapenasse as pre­ferências são "bem-comportadas", Três condições devem. ser'preenchidas. (1)A pessoadeveser capazde comparar qualquerpar de opçõescom qualquerou­tro, Deve preferirum-deles, preferiro outro, ou acreditá-los igualmente bons.(2) A pessoadeveser consistente em suaspreferências: se prefereumalaranja aumamaçãe umamaçãa umapera,deve também preferira laranja à pera. (3) Apessoadevesercapazde negociarentre valores quese encontram opostos. Paraexplicaressacondiçãoé maisfácil usarumexemplo que a viola: umeleitorqueclassificaos candidatos apenas por seus pontos de vista sobre a política fiscal,

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Ação humana

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Então podemos dizerque a pessoa age--àssim pãfa maXimizar-r-­utilidade, desde que tenhamos em mente que isso nada mais ésenão uma maneira conveniente'de dizer que ela faz, o que pre­

LienJ Nã<rl1ãiítijillCãção de hedolUsmo. Naveroacre-;--sua-opçãpreferida poderia ser uma que dá. prazer a outros c nenhum a simesma.L , __ r

,~ preocupação com resultados pode causar o pr6prio fracasVso. Embora a ação racional seja instrumental, algumas formas de~ção i~s~mental sã~ positiv~ente .i~ionai~ A insônia, armpotêncía e a gagueira ficam piores quanô<H(nenta fazer algoa respeito. São mais passíveis de desaparecer quando se pára de

. pensar a respeito - mas isso não é algo que possa ser resultadode uma ação. A espontaneidade nos fugirá se tentarmos agir es­pontaneamente. Não podemos acreditar ~ vontade ou esquecer àvontade, ao menos não no sentido em que podemos erguer o bra­ço à vontade. Não podemos fazer cócegas em nós mesmos, sur­preender a n6s mesmos ou enganar deliberadamente a n6s mes­mos, por mais que assim o desejássemos. Podemos desejar serestimados e admirados pelos outros, mas as ações que nós ou ou­tros empreenderem com o único propósito.de alcançar esse fimirão minar a si mesmas. Um importante exemplo no campo dapolítica é o da criação de emyregos com o propósito de aumentara auto-estima das pessoas. E verdade que ter um emprego regu­lar é uma fonte, importante de auto-estima" mas apenas sob acondição de que o ponto principal do emprego seja produzir umbem ou serviço que os consumidores ou contribuintes valorizema ponto de pagar por ele. lA auto-estima é essencialmente umsubproduto de ações empreendidas com outras finalidades -,não pode ser o propósito único da políticajOu tomemos o pontode vista de TocquevilIe de que o principal valor da democraciapolítica é o de que a mesma gera incessante atividade e energiasuperabundante na sociedade e desse modo a toma próspera.

exceto 'quando ocorre manterem a mesma posição sobre esse tema, caso no, qual eleos classifica de acordocom seus pontosde vistasobredesarmamento.

:5 Digomaisa esserespeitonocapituloVI.

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Escolha racional

Embora possivelmente verdadeira, .a asserção poderia não ser, um argumento suficiente para apresentar as instituições' demo­cráticas. Para que a democracia tenha a prosperidade como sub­produto é preciso que seja antes levada a sério como forma dego_y.emo.

• ~ A escolha racional, busca encontrar os melhores meios para!

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i,n ns dados. E um modo de adaptar-se otimamente às circunstân­cias. A adaptação 6tima também pode ser obtida por meios ou­tros gl.te_a_e,s,c.Qlha.raciQnalFE~derados nos capítulOs~VIII e Ix.lAqui de.vemos notar que a escoltia racional não é urnol

!mecanismo infalível, uma vez qu~ a pessoa racional pode esco­.lher apenas o que acredita ser o melhor meiohsomo fOi exphca~Oõ-rnrfiõãfdO capítulo 11, essa crença bem ~e ser errônea. Apessoa pode deixar escapar algumas oportunidades ou tropeçar

,por engano. Não apenas errar é humano: pode ser mesmo racio~"~nal fazê-lo, se acontecer de todos os indícios apontarem na dire- lição errada. No próximo capítulo discuto algumas maneir~~aquais a formação de crenças pode deixar de ser rar';~nal.jAqui omeu-pontoesimplesmenie que o processo pode ser racional eainda assim deixar de alcançar a verdade. A verdade é u~la-.ção entre uma çrellÇ_a e aguHo sobre o qU€LLa..cren~tQuando..fOtelo acredita que Desdêmona o está enganando e ela não está,ele está alimentando uma falsa crença. Em cont.raste, a racionali­dade é uma relação entre uma crença e a premissa sobre a qualesta é mantida. A luz dos indícios apresentados a ele por Iago, acrença de Otelo bem poderia ser racional.

No entanto esse exemplo sugere a necessidade de ir além,porque não pensamos realmente que a crença de Otelo seja ra­cional. No mínimo ele deveria ter investigado mais sobre o queDesdêmona havia feito. Maisgeralmente,ideVem<ls-edgir nmapenãSque as crenças sejam ràcíonals e~ relação aos indíciotdisponíveis, mas tam,bé~, que a q~anti,dade de, indício,s reunid~sseja de celta forma ôtimá.Por um lado há o risco de reunir'ev' _dência insuficiente.ltYméôiCõ deve examinar ó paciente antes de

,operá-lo, soB o riséo de cortar no lugar errado. Por outro lado, háo risco de reunir evidência demais. Se o exame do médico for

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A longo prazo, o agricultor ganhará mais com o cultivo A doR,l'e com o cultivo B. uma vez.queo mesmo tem um resultadomédio maior. Nos anos ruins, entretanto.ele se sairá pior com A

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8 A honestidade intelectual requer que eu sublinhe que o conceito de utilidade~" aqui empregado é menos inocente do que aquilo ao que -me referi antes como

"nada mais que" a expressão de preferências, O escopo da presente exposiçãonão me dá margem para entrar em detalhes.' ,

:, .uma conclusão desse.modo; e muitas vezes seria ~dantefaz~19. .de outra maneir~'Noentanto, em princípio tõdãsáS crenças fac:;

'tuais são uma questão de probabilidades. Para todos os fins prálticos, posso contar com não set:atingido por um nieteoro ~.quanto escrevo este capítulo, e no enta to ex.i.sJe_UnlfLp.e..q.u.ella'chance de ue isso aconte a. 'Em muitas situações de escolha as 1

1pr~~abilidades dc~em ser c~~i?cradas~~it~~se~iamen_t4~~=cólher entre plantios, os agncultores devem considerar a possibi­lidade de geada precoce' no outono, de escassez de chuva na pri­mavera e excesso no verão. Com freqüência eles garantem seuspalpites escolhendo um cultivo que lhes resulte razoavelmentebem independentemente do tempo. .

Um exemplo numérico pode ajudar. Há dois cultivos, Ae B, eduas condições possíveis do tempo, 'Bom e Ruim, que se supõeserem igualmente prováveis. A renda dos cultivosemambas ascondições está dada na tabelaaseguír, Os númerosentreparên­teses indicam a utilidade que um agricultor obtém dos vários ní­veis de renda, Estão escolhidos 'pará refletir a. tendência.quaseuniversal de cada dólar extra de renda proporcionar incrementossempre menores de utilidade (o princípio da utilidade marginaldecrescentej.ê '.'

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6 Nos casos de custÓdia de crianças li 'demora na apuração dos fatos pode tam­bém' modificar o que é o' interesse da criança. Desde que as cortes colocamgrande ênfase na contínuldade do relacionamento criança-progenitor. existe apressuposição. que se toma mais forte à medida que o caso se arrasta. a favordo progenitor que tem a custódia temporária. . .

7 Issonãodeve ser confundido com a seguinte verdade lógica. Ou acreditamos: :;j quealgo seja o caso. ou não acreditamos que o seja (a distinção entre negação~ot interna e externaj.i. ," ..,~,' i,:

Ação humana,

exaustivo demais, o paciente pode morrer.Permitam..me elabo­, rar sobre o segundo desses perigos.

As outras coisas sendo iguais, adecisão provavelmente serámelhor' quanto mais indícios reunirmos e quanto mais tempo de­liberarmos, mas as outras coisas não são sempre iguais. Quandotivermos alcançado uma decisão, a ocasião de agir pode ter pas­sado. O paciente poderá estar morto, a firm, ter ido à falência oua batalha perdidaJMenos dramaticamente,' os custos da delibêi~o~odem,exceder os ~enefíciost O~ c~sos oeNlitígio so~re. a

custódia de filhos proporcionam uma boa ilustração, Na maionados países ocidentais estes são decididos na base dos "melhoresinteresses da criança"; isto é, a custódia é dada àquele dos paisque a corte considera-maispreparado para cuidar da criança.Esse princípio requer comparações cuidadosas e demoradas en­tre os pais para decidir-se qual está mais bem preparado. Vamossupor queno final seja selecionado o mais apto dos pais. No en-

,tanto, o litígio de custódia impõe grandes danos emocionais àcriança, argumentavelrnente maiores que os que resultariam se acustódia fosse concedida ao menos preparado dos pais. Dever­se-ia perguntar se está no melhor interesse da criança deixar quea.custôdia obedeça aos melhores interesses da criança. A decisãoque teria sido a melhor se alcançadainstantaneamente e sem

.s.rstos pode não ser a melhor.tudo considerado, se os custos datomada de decisão forem levados em conta.6

I J:.Õ lugar da crença na escolha' racional requer uma discussão IImaiscuida~osa. Até-aqui àrgU1ne~te~...com? se as crenças fos~emluma ~uestão de {2reto oubranco[ou acreditamos que algo seja ocaso, ou acreditamos que não o s~jii:7Mui~as vezes chegamos a

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do que com BrPor essa razão irá preferir B a A.9 Se for escolhi­do o cultivo A; a reridamédia é de US$20.000 com um nível deutilidade correspondente de 50. A utilidade média é de 35. Cor­respondentemente., a utilidade d.. renda média de B é 45, en­quanto que a utilidade média é 43. A renda média (e portanto autilidade da renda média) é mais alta com A. Não há nenhumano, entretanto, no qual a renda média e o nível de utilidade cor­respondente sejam realizados. Q agricultor não pode viver nabase da renda médía,'? mais do que pode ter uma família médiade 2,2 filhos. O que conta é a média dos níveis de utilidade reali­zados.'! Uma vez que a utilidade média é mais alta com B, seráesse o cultivo escolhido. '. . .

';Ã teoria da to~~ilitd-edecisõesSõDriscoaconselnaaspesscnr~a maximizarem a uti.!.i..dm1ee..s.~'IEm casos como o queaci~bo de discutir, isso significa o mesrno queamédiade utilidadealcançada em muitos períodos.~stehdidi!Z entretanto,para cobrir situações de escolha que não se repetem dia após diaou ano após ano. Nesse caso o tomador da decisão é solicitado a

.apoiar-se em suas "probabilidades subjetivas" ou, em Iinguagernmenos solene, em seus pal~sJnfolmªc;tos.jA útilidade de caaaresultado possivelOeüiTIãação é ponderada pela probabilidadeestimada desse resultado, para produzir a utilidade esperada daação. A teoria' manda empreender a a~que_se-assoc-iQ\,;I--eêm a~~próximocaQítul~ apresento asrazões de meu')c'efiCiª!Iio..;.em relação a essa extensãoJia_te.oria.....-1Agir racionãImente éfazer tãõbem por si mesmo quanto se él

lcapaz. Quando dois ou mais indivíduos interagem, eles podem

9 Por issonão há necessidade de estipular o conservadorismo camponês paraex­plicara resistência a alguns doscultivos de altaprodução introduzidos pela Re­volução Verde nosEstados Unidos. Se os cultivos também apresentassem umavariação maiselevada. areslstênciapoderia tersidoperfeitamente racional.

10 Elepoderia fazê-lo. é claro,se economizasse nosanosbons.11 O leitorpoderia justificadamente perguntar se a aversão ao risco não poderia

levaro agricultor a também levarem contaa diferença entre os níveis de utili­dadedosanosbons e ruins. Comoa. noção de utilidade usadaaqui é definidadeum modo que já incorpora atitudes em relação a riscos, essa proposição iria,contudo, envolver duplacontagem. .')',,;; .

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Escolha racional

"fazer muito pior por si mesmos do: que agindo isolados. Essa 1percepção é talvez a principal conquista prática da teoria dos jO-/gos, ou a teoria das decisões interdependentes. Mas a teoria tam­bém é útil de vários outros modos. Com efeito, uma vez que aI-Iguérn chegue a examiná-la plenamente, ela mostra ser não umateoria no sentido ordinário, mas o contexto natural e indispen­sável para compreender a interação humana. É, nesse sentido,mais próxima à lógica que a uma disciplina empírica. Toma-seuma teoria empírica uma vez que acrescentemos princípios decomportamento que possam ser testados e verificados verdadei­ros ou falsos, mas não se mantém ou cai com o teste empíricof~Os·-princípiosoáslcõs da teófia dos jogos são ilustrados pelojogo da Fig. 11.2. Os ingredientes desse exemplo são comuns a to­dos os jogos. Há dois, 011 mais jogadores. Cada um deles tem aescolha entre duas ou mais estratégias. Cada·conjunto deesco­lhas gera um conjunto de recompensas. A recompensa de cadajogador depende das escolhas feitas por todos os outros, nãoapenas de sua própria decisão. Supõe-se que,os participantes fa­çam suas escolhas independentemente de cada um dos outros, nosentido de que não podem estabelecer alianças para coordenarsuas decisões. Em outro sentido, entretanto, as escolhas são in­terdependentes, porque cada um deve tomar sua decisão na basede sua antecipação do que o(s) outro(s) ir(á/ão) fazer. No jogo daFig. 11.2 o jogador I deve colocar-se na posição de n antes de po­der tomar sua decisão. Contrariamente, a decisão de 11 de quei­mar suas pontes iria basear-se em sua análise do que I faria seforçado a escolher entre negociar e lutar.

No mais conhecido de todos os jogos, o Dilema do Prisionei­ro,12 ambos os jogadores têm uma estratégia dominante. isto é,

12 O dilemaderivaseu nome da seguinte anedota (com os números dos prêmiosinseridos). Doisprisioneiros, suspeitos de terem colaborado numcrime.são co­locados em celas separadas. A políciadiz a cada um que será libertado (4) sedenunciar o outroe este nãoo denunciar. Se denunciarem um ao outro, ambosreceberão trêsanosde reclusão (2). Se ele nãodenunciaro outro, maso outro odenunciar, será condenado a cinco anos (I). Se nenhum denunciar o outro, apolícia tem provas suficientes paramandar cadaum à prisãopor umano (3).

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Ação humana

uma estratégia que é a melhor resposta a todos os movimentosdo oponente. '"

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QUANDO A RACIONALIDADE FALHA

A explicaçãocorreta pode ainda, como sabemosdo capítulo I, ser diferente.Aescolha racionalpodeser substituídapor outro mecanismo. Ou a pessoa,embo­ra não racional.poderiapor acidentefazero que a racionalidade exigiriaque fi-zesse. '

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ATEORIA da 'e~lha "rãciõilãrtem o oó]efivoae, exptTêãfo,', comportamento humano. Para isso deve, em qualquer caso,!proceder em dois passos. O primeiro passo é .determinaro queuma pessoa racional faria nas circtinstâncias.O"sêgundó~paSSo-é ,-verificar s: isso é .o~-:. apessoai~~lment~,{Sé;~ 'pe~~,<?âfe,{,ôque a teoria predisse que fana;:'ocaso pode ser acrescêntàdoã

)6~~~in,d~~~~~~~e:J~ff~f~~i~e~~~of:",~~tr,~~~W~)t~inadaspredições",- Segundo, 'as pessoas podem não se'àj~ãs suas predições - podetllIomp-ortar-se irracionalmentV'~)'c;",

Para explicar como se originam esses problemas; vamos 'ini­cialmente resumir o principal argumento do capítulo 111. Umaação, para ser racional, deve sero resultado detrêsdecisões óti­mas. Primeiro, deve ser o melhor modo dereâlizar o -desejo deurna pessoa, dadas suas crenças. Depois,'essas crenças, devem

, ser elas mesmas ótimas,' dadas as evidências disponíveis à pes­soa. Finalmente, a pessoa deve reunir uma quantidade ótima deevidência - nem demais nem de menos. Essa quantidade de­pende tanto de seus desejos - da importância que atribui à deci­são - como de suascrenças relativas aos custos e benefícios dereunir mais informação. O processo todo, então, pode ser visua­lizado como mostra, a Fig. IV.1. '

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Denominemos ai e bi estratégias cooperativas e a2 e bi estra­tégias não-cooperativas. Vemos que para cada jogador a não­cooperação domina a cooperação. Um jogador racional irá esco­lher a estratégia não-cooperativa,' sabendo perfeitamente que ooutro fará o mesmo e o resultado proporcionado por sua açãoserá pior para ambos do que o que eles poderiam alcançar co­operando. O capítulo XIII é dedicado ~. urna maior discussão des-

~e dl!e~~~s.:~.t~!,~,_~~dasocial~AqU,i desejo 3imples~ente,1

Iprevenir contra a tentação dê argumentar que, desde que os Joga-, dores conscientemente fazem pior para si próprios do que pode­riam fazer, eles não podem realmente ser racionais. Se os doi~

I, jO,gadores agissem como um, esse argumento seria, correto, maj,'li! como não o fazem, o mesmo não é válido. A noção de escolh,q racional é definida para um indiví,duo, não e.ara uma cole.Vivida~-e..de_~mais.indivíduos.L~eum indivíduo tem uma

opção que é superior a suas outras opções independentemente doque as outras pessoas fazem, ele seria irracional se não a prati­casse.O fato de que todos se.beneficiariam se todos agissem ir­racionalment~

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3 Umaexceçãoé o comportamento de equilíbrio com escolha aíeatoria-de estra-tégia.Ess tópicoé discutido no capitulo Xl, ' ' ,.... "

.' 4 "Também podem surgircasos bizarros, como o seguinte. Dizem-me que se euescreverum número positivo (estritamente maiorque zero). receberei umare­compensa em dólares igual a ! dividido por esse número. Claramente. para

';;; .qualquer número que eu escrever há um número menorque me proporcionaria, umarecompensa maior.

Quando a racionalidade falha

,:inente como paladares e "degustibus nonest disputandum":~ Posteriormente irei questionar essa vísão, . .....,.. . '. "

?"",,!~.' ...rprffiiê'iro expl"icãi'ei comoã1éõria da escolha racional põdefãJ

".W."<:.:.~.'.~;,:)1nar a~avé~da indeterminaç~o; Em g:r,al há, dU.a~ fo~.as de i.~1~c,? determinação. Pode haver cJ:versas açoes que seJ~ Igual ~ Ot1~

:,,' rnarnente boas. Ou pode nao haver nenhuma ~çao gue seja ao.:' menos tão boa como todas as demaisf. ~ Considêremos primeiro a indete~inação da ação, dadas nos­, sas crenças e desejos. Múltiplos ótimos surgem com freqüência.

Sou trivialmente indiferente entre duas latas idênticas de sopaCampbeIl's no supermercado. Desejo uma delas, mas não im-

. porta qual. Menos trivialmente, um administrador poderia maxi­mizar os lucros de dois modos diferentes: por um baixo volumede vendas com altos lucros por venda ou um alto volume de ven­das com baixos lucros por venda. O que ele fará pode ser alta­mente importante para os empregados que serão demitidos se ele.escolher a opção de menor volume, mas se o lucro é tudo com,que se importa, ele não será capaz de explicar por que escolheuma opção de preferência à outra. No entanto tais casos ocorremapenas por acidente. Pode acontecer com facilidade que umapessoa seja indiferente entre duas opções qualitativamente dife­rentes, mas apenas por acidente que estas sejam também as maisbem classificadas no conjunto de oportunidades. Não há situa­ções de escolha nas quais múltiplos ótimos tendam a surgir siste­maticamenteê

Casos nos quais, para dadas crenças e desejos, não há açãoótima surgem quando as pessoas são incapazes de comparar eordenar todas as opções," Se há várias ações entre as quais ne­nhuma é melhor, posso ser incapaz de dizer qual delas prefiro e

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2 Iremos verquealguns efeitos dos desejos sobreo processo de remlr evidênciassão ilegltimos porrazõessimilares. . .. ,\,:,

Ação humana

Figura IV.!

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"desejos -4-+ crenças

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.J[Aqui os-desejOs são o único elemento independente, ao quàl)

\tOOos osoutros são subordinados. Como escreveu David Hume:["~ razão é, e deveria.set=-apenaS:,- a es~a_das...p.ail.<...õ.e.s.~rEle nãoquis dizer, tenho certeza, que a razão deveria dobrar-se a cadacapricho das paixões. Em particular, ele não teria sancionadoque o-poder das paixões agisse diretamente sobre as crenças dealguém, como caso do wishful thinking. (Na ilustração, isso estáindicado pela seta bloqueada.f Como colocou o historiadorfrancês, Paul Veyrne, crenças nascidas da paixão servem mal àpaixão; pois os escravos, para bem servir aos seus senhores, de­vem ter algum grau de independência e autonomia de execução.

Antes de continuarmos, vamos olhar mais de perto a afirma­ção de Hume. Ela implica que a noção de desejos racionais ésem sentido. A razão não pode ditar às paixões quais devem seros seus objetos. Hume certamente' teria concedido que a razãopode ajudar a eliminar desejos logicamente incoerentes, comoquerer assobiar e chupar cana ao mesmo tempo, mas no mais aspaixões não estão sujeitas ao tributo racional. Uma pessoa podenão gostar de um desejo, talvez considerá-lo imoral, mas não fazsentido desacreditá-lo como irracional. Essa visão também é adominante na ciência social contemporânea. Para a maioria doseconomistas, em particular, desejos e preferências são simples-

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. Ação humana .

também incapaz de dizer que elas são igualmente boas. Isso é\incom~nsurabilidad~, nãoHndiferençapJm teste simples permi­'te-nos distinguir entre aml>as.,Suponhamos que, para duas op­ções x e y, eunão tenha preferência por nenhuma. Se eu for indi­ferente entre elas, deverei sempre preferir x mais-um dólar extraa y. Se, entretanto, eu não preferir x-mais-um-dólar a y, issomostra quex e_~ são incomensuráveis. . _ '!Decisóes importantes com freqüência envolvem opções incot

rmensuráveis. A escolha, digamos, entre fazer o curso de direitoL~ o de engenharia florestal.!-assumfnâo que amDos me atrai~fortemente, é uma escoií1i de carreira e estilo de vida. Se eu ti-vesse experimentado ambos por uma vida inteira, poderia ser ca­paz de realizar urna escolha informada entre eles. Na realidade,sei~ouco de!!l..&s. at.e.~l2-eit{Ldeles_p-ar.a.ta.tm\r. uma decis&.Q .m.$>-

,l13!.J) que acontece com freqüência em tais casos é que considerrações periféricas se movem para o centro. Em minha ignorâncirfl respeito da primeira casa decimal - se a minhuida..se.t:á.JU~

jlho.r.como advogado ou engenheiro florestall~eu me volto paraa segunda. Talvez eu opte pela faculdade4e direito porque comisso me será mais fácil visitar meus pais nos fins-de-semana.êEssa maneira de decidir é tão boa como qualquer outra - masnão é aquela que pode ser ratificada pela teoriada escolha racio­nal como superior a, digamos, apenas jogar uma moeda.J.:.-As crenças são indeterminadas quando a evidência é insufi-hciente para justificar. um julgamento sobre a probabilidade dosvários resultados da ação. Isso pode acontecer de duas maneirasprincipais: através da incerteza, especialmente sobre o futuro, e,através da interação estratégica./'--, . . ~

Consideremos a decisão de uma firma sobre quanto investirem pesquisa e desenvolvimento. Para decidir racionalmente, afirma deve estimar o resultado provável do investimento - o ní­vel de probabilidade de que suas atividades inovadoras levarão àinovação lucrativa - assim como os investimentos feitos por

5 Mesmo que eu não possa compararx e y, não tenhodificuldade em compararumdólarcom nenhum dólar. '

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Quando a racionalidade falha

'.' outras firmas e o resultado provável desses Investimentos. Ora, oresultado de atividades inovadoras.é altamente incerto. A empre-

". sa não pode prever com qualquer,precisão se-vai acertar na mos­ca ou sair de mãos vazias: No panorama de uma tecnologiaconstantemente mutável, os registros passados não são boas ga­rantias de sucesso futuro.

Mesmo que a empresa pudesse estimar. as chances de fazeruma inovação lucrativa, ela não poderia estar certa de chegar àmesma antes que as outras firmas. Sob condições de o-vencedor­leva-tudo, isso é crucial. Quanto mais uma empresa investe empesquisa e desenvolvimento, maiores as suas chances de chegarlá antes," Se outras empresas investem grandes quantias, a nossatem poucas chances de vencer. A decisão racional bem poderiaser não investir nada. Outras firmas, entretanto; estão presumi­velmente fazendo os mesmos cálculos. Se todas decidirem in­vestir pouco, a nossa deveria investir pesadamente. Mas, .umavez mais, esse raciocínio aplica-se igualmente às outras e; se.to­das idv-rstirem pesadamente, nossa empresa deveria cair fora.

,1'Estamos'anoando em círculos: cada empresa deve investir muitoj'se e apenas se as outras investirem pouco. Não há base aqui para

.a formação de crença racional, e conseqüentemente, nãdhá baSe\firme para a açãojl-Para explicar as decisões de investimento po­deríamos sair-nos melhor seguindo Keynes e invocando 'os "es-píritos animais" dos empresários. . .

Há ~~guns - são chamados)os te6ricos da decisão bãYesilfriãj-quefd1SCõroari'ãtn/ do que acabo de dizerJE!es argumentamrue, desde que sempre temos algum confiêcirnento sobre a situa-Ição-da...e.sc.olha,_deve ser melhor usá-lo para formar estimativas]

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6 Essacolocação se mantém verdadeira mesmo se a incerteza. sobre o futuronãon?s penn~te diz~r qualquercoisasobrequão grandes são as chances emvãrlosnlvelsde investimento. ,. ",' "" r: "c ;, .; •. :

7 Isso não é bem verdade. Existe umequilíbrio no qual todas as empresas usamum instrumento aleatorizante paradecidirquanto gastarem pesquisa e desen­volvimento. O problema, como explicado no capitulo XI, é que o equilíbrio éaltamente instável. Bmpírlcarnente, não observamos' empresas usando roletasoudadosparachegaràs suasdecisõesde investimento. ' ", '

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subjetivas de probabilidade do que não usá-lo em absoluto. O ar­gumento é sedutor, mas não acho que seja válido. Embora saiba­mos muito sobre o Golfo Pérsico, não há modo pelo qual possa­mos reunir nossos fragmentos de informação de modo a chegar auma probabilidade subjetiva confiável de uma guerra írrompen­do entre o Irã e os Estados Unidos dentro dos próximos seis me- ,s~6 conhecimento sobre a segun<Iacasa decimal de um nÚ-1

,ero, tomado em si mesmo, é estritamente inúti!L_'_---­lJsso não ê negar que tais pro5aõihdades possam ser inferidas]

'I . - apenas negar que são confiáveis e que é racional usá-las',como base para a aç~ Podemos oferecer a uma pessoa a escõ-'lha entre duas apostas. Uma delas diz que se houver uma guerraela receberá mil dólares e de outro modo nada. A outra apostadiz que ela receberá mil dólares com uma probabilidade de p porcento e nada com uma probabilidade de 100 - p por cento. O va­lor de p para o qual ela ficaria indiferente entre as duas apostas éa probabilidade subjetiva que ela atribui à guerra. Resulta, entre­tanto, que esse valor depende fortemente do procedimento usadopara inferi-lo. Se começamos com um valor baixo de p e nosmovemos para cima, o valor resulta muito mais baixo do que secomeçássemos com um valor alto de p e nos movêssemos parabaixo. Se estivermos de fato medindo algo na mente da pessoa, oresultado não deveria depender do método de mensuração. Co­mo isso oç"Qrre_,~~Lprobabilidade é um artefato do procedimento.

1Decidir quanta evidêncià reunir pode ser comp'!!cadol Sea si­~uâÇão é altamente estereotipada, como o é um diagnóstico mé­dico, conhecemos muit ia.custos e benefícios da infor­mação. adicional.? Em situações que são úni.cast-DQ~s~e

8 Época em que escrevo: outubro de 1987.9 "Para detectar câncer intestinal tomou-se comum realizar uma série de seis tes­

tes simples e pouco dispendiosos... Os benefícios dos dois primeiros testes sãosignificativos. Entretanto. quando são feitos cálculos para cada um dos quatroültímos testes para determinar o custo de detectar um caso de câncer (sem se­quer curá-lo), descobre-se que os custos são de, US$49.150, US$469.534,US$4.724.695 e US$47.W7.214. respectivamente." (P. MENZEL. Medicalcosts,moralchoices; New Haven, Conn.•YaleUniversity Press.1983; p. 6.)

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i '~€mte-s, como íuternuma batalha ou ajudaravítima de umaci~•... :1.Udente de ~uto.móv~o_c.~s~b~nefícios.são_al~e~/,' mcert0FHá um fiSCO de agir cedo-demais, com informação de, ' menos - e um risco de protelar até que seja tarde demais. Se,' ,..soubéssemos mais, poderíamos dizer qual risco era o maior _

mas Inãotemos base para decidknicionalmente se arriscamosl;]!I áêfciúirir tal conhecimento. Assim simplesmente temos que agir, 't~mais ou menos arbitrariamente. Entre esses dois extremos entra, ' ­a maioria das situações de escolha da vida cotidialliLlSe sai~PãfãCõíher'cogumelos, sei que deveria gastar mais tempo procu­rando um bom lugar e também que seria inútil continuar procu­rando até que escureça. Devo procurar por algum tempo e entãoparar de procurar e começar a colher, onde "por algum tempo"poderia ser qualquer coisa entre dez minuto~e_ll1JJ-paule. horas. !/pen!r~xa e~is~!ndete~~nação;,",Como não p~o eSl í

jp.er.a,r ..t.ornar u.ma d.eClsão. Ó.tlm,.a, terel.~contentar-me cOW.Jlma~ja~'glll~~nten~!1teb<>a".r .JQuando a escolha racional é inoetenninada, algum outro me]~anismodeve preencher a brecha.~ Este poaeila ser o principIO <Ie"satisfazer", de escolher algo que seja suficientemente bom; Acarga explicativa é então transferida à noção de um nível de as­piração, que determina o que conta como "suficientementebom". Até que seja conhecido mais a respeito de por que os ní­veis de aspiração das pessoas diferem, a teoria de "satisfazer"permanece insatisfatória. I De modo mais geral, não temos U,mã)teoria do que as pessoas azem quando gostariam de agir racio­nalmente mas a escolha racional é indeterminada. Uma coisaque fazemos às vezes é negar a indeterminação. Os seres huma-

Inos têm um forte desejo de ter razões para o que fazem e ach~difícil aceitar a indeterminaç~ I en<Iem a fugir aos processos:a~

aecisao sugeriôos pela indeterminação, tais como resolver-se jo­gando uma moeda. Podem, ao invés, colocar sua confiança em

lO A brecha também poderia ser preenchida por algo como as normas sociais, aserem discutidas no capitulo xm, Ali. entretanto. considero as normas sociais

, como uma alternativa li escolha racional, não um mero suplemento li mesma.

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Desejaria não gostar. porque. comopessoamoderadamente vaidosa acho maisimportante permanecer esbelto. Masdesejaria ser menos vaidoso. (Maspensonisso apenasquandodesejocomerbolode creme?)

12 Não é uma questão de adotar deliberadamente a crença de que os fatos são. como gostariaque fossem. Comodisseno capitulo ~I1. umapessoa não pode se

decidir a acreditar maisdo que pode decidir-se a esquecer. Melhor dizendo.omecanismo operainconscientemente. "pelasminhas costas....

13 Isso não explicaa tendência do pessimista empedernido a acreditar que as col­sas são como ele gostariaque não fossem. Análoga dessemecanismo perversoé a tendência. mencionada no capítulo I; a desejar o que nãose podeobter.exa­tamenteporquenãose podeobtê-lo.Nãoconheço nenhuma explicação satísfa­tóriapara'essaspropensões autodestrutivas.

14 Na Fig. IV.I deveriaaparecer. por esse motivo. umaseta bloqueada de desejospara evidência. adicionalmente à seta indicando a influência justificada dos de­sejossobrea decisãoquaIlto à quantidade de evidência a reunir.

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Quàndo a racionalidade falha

JÕeompor"iãmentô irracional"tariíbéilíPod; derivar de crenças. irracionais. Muito conspicuamente, as crenças podem ser .sub'1:v~J!!das pelas paixões a que supostamente devem serv!ifO wish-..fui thmking - a tendência a acreditar que os fatos são como apessoa gostaria que fossem - é um fenômeno difuso, cuja im-

•• portância nos negócios humanos dificilmente pode ser superesti­mada. Freud explicou-o em termos do "princípio do prazer", atendência da mente a buscar gratificação imediata.l? Sinto-memelhor se acredito que as coisas são como eu gostaria que fos­sem, mesmo que eu estivesse mais bem servido acreditando-ascomo são de fato.1J O wishful thinking pode operar diretamente,através da seta bloqueada da Fig. IV.I, ou indiretamente, atravésda coleta de evidências. O último mecanismo, mais sutil, operacomo segue. Suponhamos inicialmente quea evidência não, dásuporte ã crença que eu gostaria que fosse verdadeira. Passo en­tão a reunir mais evidência, ajustando e colocando em dia asmi­nhas crenças à medida que avanço. Se em algum ponto a somatotal das evidências até então reunidas der sustentação ã minhacrença preferida, parô:-~õSSõ entãÕ-diZei-ver<fâdei.rnmêiíTe a m.'iffil(~esmo e aos outros que minha crença é apoiada pela evidênciaIdisR2!ili'e1, d~en:ntel1!entt;.S!Q wi§.b/u.J.11JilJ:#ngnu e crullfüe s"Í'm-='pIesmente desaparece em face da evidência.!"

O wishful thinking, embora indesejável emsi mesmo, às vezes

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probabilidades subjetivas fictícias. Ou como no caso da custódiade uma criança; discJllido-no-capÍ.tlÜQJ!I,rc:ontinuam em frentê)

~~~decisão que teria sido ótima caso encontra­a instantânea e gratuitamente. Ou decidem na base da segunda

casa decimal, mesmo ignorantes a re~pe~!o da' primeiJ1l.r~s;;praticas representam 'uma \cr~1!..irmcion~Lno Pi'der da rac!Qn.iJ:,lidadefA primeira tarefrd'é=l:J-ffia-ree>riaê:leesêólha racional é s~

\êlãíi1obre seus próprios limitest*s~zes, comoã'isse Pasca ,nãaãe Ifiál.SfãCiõhãTão que a aoa1cação da razão.

Outrasormas de trraci diõã'aê\ podem ser localizadas emvários níve da FIg. IV.IJÀS vezes ~eixam ae esco..l,lher~o-que acreditam ser o melhor meio de realizar seus desejos ISe acontece por engano - ao apertar o botão errado - não é ir.,racional. Se consciente e deliberadamente agem contra seus de~sejos, 'é:jSuponhamôS que me.sejã-Cif'erecidcrtmrdgantrqmmdô~'itO'ü1entando deixar de fumar. Avaliando, meus desejos dizem­me para recusar, e no entanto posso aceitá-lo. A culpada aqui é afraqueza de vontade, a vulnerabilidade a desejos que eu próprioreconheço como mais fracos que os desejos que apontam na di­reção oposta. Quando os desejos mais fracos vencem, deve serporque são mais· fortes em algum sentido - não mais fortescomo razões, porém mais fortes como.pura turbulência psíquica.No próximo capítulo discuto um caso especial de fraqueza devontade que é causado pelo maior imediatismo do presente e oefeito correspondenternentemenor do futuro. Mas a fraqueza devontade pode assumir muitas. outras formas. Posso dobrar-me aoegoísmo quando acredito que os reclamos de outras pessoas sãorealmente mais fortes. Contrariamente, posso pensar, em algumaocasião dada, que minhas preocupações orientadas para o pre-

.sente ou egoísticas têm maior peso que as exigências do futuroou de outras pessoas, e ainda assim ser incapaz de conceder-meuma folga. A acumulação compulsiva pode uma expressão defraqueza de vontade tanto quanto o dispêndio impulsivo. I I •

l l Aqui há um exemplo maiscomplicado: desejoqueeu nãodesejasse nãodesejarcomer bolo de creme. Desejo comer bolode cremeporque gosto do mesmo.

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Ação humana

ac0rt.Ipanha.?utras cois~,_9~~:_.~ã.0_~osta~.~~~~d~e~. ,uma~deseeberta'dã pSicologIa SOCial é que os mdlvldUo~~~?~melhorjulgamentd'==isto e~são mais capãZesoe .ser guiaaos' pelõPnriciPlõ--áarealida[e iqUr~elo princípio doprazer~lini~ntedeprimidas São mais tristes,porém mairs'áoÍos-:1nversamente, pessoas em estado hedônicononnal-' que não são maníacas nem depressivas -' tendem asuperestimar suas habilidades e a acreditar que outras pessoas astêm em melhor conta do que de fato ocorre. Se queremosalcançar alguma coisa que seja, deve!1!0s acreditar que p'QQgnos

. fazer ~a;.s d~g~e de fato e9demosjJm certo grau de WishM

[l.hiiiKing-;irracion.al, é o preço que pagamos pela motivaç!2..lli!~continuar a viver. ~bora nossas pàixõespossam ser mal ser­viOâ'SPéfás~ que geram- nôs somos mais bem servidospreocupando-nos tanto com álgumas coisas que acabamos porperder a cabaça por elas. Tenho mais a dizer sobre as emoçõesno capítu lo VII. -::-.~_.----:---:-_-:- -.,.._--.,

jkrormação de crenças também pode sair errada sem qualquerinterferência das paixões. Especialmente ao lidar com a~s.untos

estatísticosfnoS'sus-metites sao sujettas-aiJttsü~iasqueforam mapeadas com fascinante detalhamento durante osúltimos dez ou quinze anos. Muitas foram inicialmentedemonstradas em expe(imentos-eJTIai-s-tar~hecida~msituações de vid~Um erro comum. é atribuir excesSíVãjImportância à expérlênõia pessoal e eventos correntes às ex~~sas de font~sjmp-essoais e event.os Rass~l~Os-pre-ç\)s âeãÇões,por exemplo, são excessivamente influenciados pelo desempe­nho corrente de empresas e insuficientemente por seus registrospassados. Na campanha presidencial de 1972, repórteres trei­nados predisseram que McGovem não podia perder por maisque dez pontos. Sabiam que ele estava vinte pontos abaixo naspesquisas e que em vinte e quatro anos nem uma única pesquisaimportante havia errado por mais que 3 por cento, mas as mul­tidões loucamente entusiasmadas que haviam visto com seuspróprios olhos lhes falaram mais alto. . . . .

~n~~ãSõ~~!~~êfôSêleme!!~~e:!nféfênc.~:resta-

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Quando a.racionalidade falha

rística é outro problema comum. A força aérea israelense notouem certa ocasião que, ao serem criticados após um mau desem­penho, os pilotos tendiam a sair-se melhor na vez seguinte. Osinstrutores concluíram que a crítica é efetiva I'!') treinamento depilotos, presumivelmente forçando-os a se concentrarem, en­quanto que o elogio tem o efeito oposto, presumivelmente estra-'gando-os, \Eles não estavam. conscientes do simples princíPi.o es-\tatístico de que um desempenho muito bom tende a ser seguidopor um medíocre, enquanto um mau desempenho é'Sffi-.geral,seguido por um melhor,fJogadores de beisebol que,' após uma

. temporaaa-excepciõi1almente boa, não se saem tão bem na se­guinte são com freqüência injustamente criticados por treinado­res ou fãs como estragados pelo sucesso. Também, as pessoastêm dificuldade em compreender a noção de aleatoriedade.. Ten­dem, por exemplo, a subestimar o volume de agrupamento-numprocesso aleatório. Durante a blitz, os londrinos notaram que asbombas caíam em grupos e inferiram, incorretamente, que haviaum padrão intencional no bombardeio alemão.

\.Finalmente, nossas vi11as_~-emirmal1-p=o~r=-:q~u:-:::e-:n:-::o:':s:::'so:::-s::-aesej~

~ão irraci~aiJõ'esdequ~ a própria noção de aesejus I acionai~°maciofiãis ê contestada, começo com um exemplo que é relati­vamente não controvertido. Se meus desejos se enfocam forte­mente no presente, de modo que não me empenho em planeja-

I mento de longo prazo, poderei sair perdendo a longo prazo.'>Esse exemplo sugere uma definição de desejos racionais: são de­sejos tais que, dadas nossas oportunidades, nos tomam tão feli­zes quanto possível. Para uma pessoa com uma constituição fér­rea, uma grande fortuna e um bom advogado, desejos orientadospara o presente bem poderiam ser racionais, mas para aquelescom menos oportunidades é necessária alguma preocupaçãocom o futuro. Após alguma reflexão, entretanto, a definição pro­posta não é adequada. Consideremos pessoas que vivem em re­.gimes totalitários estáveis. Se há uma oposição interna de dissi-

.;15 Não me refiro aqui à fraqueza de vontade. Como disse antes c irei explicar nopróximo capitulo, pode haver impulsividade sem fraqueza de vontade.

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dentes, tenderão a ser infelizes. Seu maior desejo é o de liberda-.de política, que é exatamente o que não podem obter. 16 Inversa­mente, muitas pessoas estarão relativamente, satisfeitas, porquenão alimentam desejo de liberdade e encontram toda sorte de de­feitos em sociedades que a oferecem; Seria absurdo, penso, dizerque os primeiros são irracionais e os últimos, racionais. Emboraos dirigentes de regimes totalitários tendam a trancafiar dissi­dentes em hospitais pisquiátricos,' não devemos aceitar seusdiagnósticos.

Podemos emendar um pouco a definição distinguindo entredois mecanismos que têm mais ou menos o mesmo resultado.Por um lado, existe a adaptação e ajustamento inconsciente aoçonjunto.de oportunidades, conforme ilustrado na fábula da ra­posa e das uvas verdes. Isso assume a forma, tipicamente, não devalorizar o que se pode conseguir, tal como a doçura dos moran­gos (ou limões), mas desvalorizar o que não se pode conseguir.Quando nossas mentes nos pregam esse tipo de peça, seria estra­nho dizer que os desejos resultantes são racionais. São, se algu-

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liberadamente o lado bom do que podemos obter e tentar reduzlra inten39flde,""~k...Qoss.o..d~0-J:'ie-i0,qll~? podemos co.nseguit:l,Esse é o métode de planejamento raciona~do caráter advogado

, ,~10 budismo,.~los estóicos e Ror Espinoza 17 Nessa construçãode desejos racionais não seríaillôS compeJ:t os a dizer que OS que,apóiam os regimes. totalitários são racionais. Entretanto, aindateríamos que dizer que os dissidentes são irracionais, contrarian­d2 noções pré-analíticas intuitivas do que é ser racional..JNão-sei como resolver essa charad~" Desejos altamente impul­sivos podem plausivelmente ser ditos irracionais, porque tendemanos prejudicar. Rendendo-me hoje à .espontaneidade,: reduzo o

16 Estousupondo aqui que sua Incapacidade de consegui-ia nãoé a causade a de-sejarem. '

17 O que o budismo advoga é na realidade um poucodiferente. Recomenda redu­zir-seos desejos a pontode se estarsatisfeito compouco.mesmo quando se pu­

,.. desse ter muito - porque os desejos. mesmo quando realizados. produzemmaisdorqueprazer.

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Quando a racionalidade falha

.número de ocasiões em que posso comportar-me espontanea­

.rnente no futuro. A espontaneidade é um valor que deve ser pro­:. tegido por preocupações não-espontâneas com o futuro. Há tam­

bém um argumento para dizer que os desejos que se tomamrealidade por meio de mecanismos causais ignominiosos, ope­rando pelas costas de uma pessoa de' um modo do qual ela fica­ria envergonhada caso deles tivess consciência, são írraclonaís.t"Esses exemplos não constituem uma definição, mas sugeremque o lugar da razão poderia ser mais importante do que uma lei­tura literal do aforismo de Hurne indica.

18 Quando desejo algo simplesmente porque não posso consegui-lo, o desejo étantoprejudicial quanto produto de um mecanismo causa! ignominioso. Ome­canismo das"uvasverdes"nãoé prejudicial.

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. _CONSEQÜÊNCIAS NÃO-INTENCIONAIS

A s coisas nem sempre saem como esperamos que saiam.Muitos eventos ocorrem não-intencionalmente. Como na

memorável frase de Adam Ferguson, "A História é o resultadoda ação humana, não do desígnio humano." Seu contemporâneo,Adam Smith, referiu-se a uma "mão invisível" que molda os as­suntos humanos. Meio século depois, Hegel invocou a "astúciada Razão", c trinta anos depois dele Marx falou sobre a "alie­nação" das pessoas em relação à própria ação. O tema das con- ,seqüências não-intencionais da ação foi uma das .duas -pre­ocupações centrais das ciências sociais emergentes nesseperíodo, sendo a outra a visão da sociedade como uma unidadeorgânica. Essas duas imagens ainda estão conosco. Por um lado,há a idéia de ações individuais interferindo uma com a outrapara produzir um resultado não pretendido. Por outro lado, há aidéia -- mais amplamente discutida no próximo capítulo - deajustamento mútuo entre planos individuais, permitindo que to­dos sejam desenvolvidos sem distorção.

Antes de considerar as conseqüências que se originam da in­teração e interferência sociais, gostaria de sublinhar alguns me­canismos que operam dentro da mente. Conforme explicado an­tes, uma ação é o resultado de desejos e oportunidades. Mas a .ação também pode dar forma a oportunidades e desejos, de mo­dos não-intencionais (Fig. X.I).

Adicionalmente ao resultado intencional da ação, há algumasvezes um não-intencional: uma mudança de desejo. O vício é umexemplo.simples, O que eu desejo pode ser um outro gole, mas oque obtenho pode ser o gole e um desejo mais forte. Se eu sou-

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3 Isso não pode ser literalmente verdadeiro. desdeque na ocasiãoda primeirabe­bida posso desfrutar tanto da bebidacomo de boa saúde. Emum dado momen­to no tempo uma pessoapode sofrerdano apenasdo que fez em momentos an­teriores:o que ela fizer mais.tarde aindanão podeferi-Ia. Masurnapessoa-podeser atingidapelo que todasas outras fazem. ;' ,,:-" :r?Ai:,;.,

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Conseqüênciasnão-intencionais

provável que o fazendeiro se recusasse a trocar seu cavalo porum saco de maçãs podres. A curiosidade e a sede de novidadessão desencadeadas por opções que não são nem similares demaisnem dissimilares demais do, estado corrente. As ações tambémpodem ter um impacto não-intencional sobre as oportunidades.

• Sei que beber afeta meu bolso, mas essa é uma das conseqüên­cias esperadas que são parte de minha decisão. Posso não saber,entretanto, que beber também afeta minha saúde e, dessa forma,minha capacidade futura de derivar prazer de outras atividades.A qualquer tempo dado, beber poderá parecer uma boa idéia,mas se eu aproveitar todas as ocasiões para beber, posso termi­nar em muito mau estado. A interferência entre as escolhas'deuma pessoa em diferentes pontos no tempo éum pouco como ainterferência entre, as escolhas de diferentes pessoas. Se eu sem­pre fizer o que parece melhor no momento, posso terminardan­do-me mal em todas, asvezes.! Se ,cada pessoa fizer:Oqúe':é:m-

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Voltando-nos agora para asconseqüênciasnão'2ifitériéiohaisque ocorrem por causa da interação entre'diversãS'Péssóas,lva;,mos começar com um exemplo famoso 'da teoria' econôriiíca-á"teia", também chamada "ciclo do porco" porque.foiexpostainicialmente como explicação das flutuações cíclicas na produ­ção de porcos. Entretanto, tem uma aplicação muito mais ampla.As flutuações na indústria da construção naval em 'décadas re­centes tiveram um padrão praticamente igual, com: um mercadovendedor seguido por superinvestimentos e superabundância.

Os criadores de porcos devem decidir um ano antes o quantopretendem !evar ao mercado no ano seguinte, uma decisão que édeterminada pelo preço que esperam que os porcos alcancem e

, pelo custo de produzi-los. Um aumento no preço esperado indu­zirá os fazendeiros a produzirem mais, como se vê refletido pela

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'/"'-.oportunidades mudança nâo-Intenclonal de

oportunidades

FiguraX.l

, ,besse, poderia não ter tomado aquele gole. Os desejos também'podem ser afetados do modo oposto, por uma inclinação à novi­dade.'Na história de H. C. Andersen "O que o pai faz está sem..precerto", um fazendeiro vai ao mercado de manhã para venderou trocar seu cavalo. Primeiro, encontra um homem com umavaca, da qual gosta tanto que a troca pelo cavalo. Em transaçõessucessivas, a vaca é trocada por um carneiro, o carneiro por um

.ganso, o ganso por uma galinha e, finalmente, a 'galinha por umsaco de maçãs podres. O caminho do fazendeiro para a ruína é

"pavimentado de melhoramentos-graduaís.! A cada vez o fazen­-deíro'acreditasalr-se melhor com a troca, mas o resultado Iíqui­

dó de' todas as trocas é desastroso.s O que sai errado é que, junta­mente com cada novo objeto, ele adquire um novo gostoinesperado. Se fosse, capaz de antecipar a rampa escorregadia,poderia não aventurar-se por ela. Embora a história não o diga, é..n) ~I;'

,1: N~ verdadeele não fica arruinado porque um par de turistas ingleses faz e per­'\ "de'umaaposta de que sua mulher ficaria zangada com ele quando voltasse com-:;.ras maçãs. , , "'2,Mai$ formalmente, imaginemos Uma pessoa que ajuste regularmente (embora

", B ;.J;tão.cons,cientemente) seus desejos de modo que prefira com m~is intensidade o, bem do qual correntemente, tem menos. Suponhamos que seja exposto à se­,"O'guiriteseqüênciade combinações de dois bens: (1/2,312), (3/4, 1/2), (1/4. 3/4),>'; (3/8, 114)... Então.se num dado momentoele estiver consumindoa combinação

~if~J~le~:~üênda e lhe for oferecida. parao periodo seguinte, a escolha entre a'Y;",m:.'~9,tl}!>~~~~ão neac~mbil1ação n +'1. ele sempre irá escolher a (iltima~ que ofe­

o. -;.."i· 'rece mais do bem do qual correntemente ele tem menos. Mas desde que a se'r2G·Qif qílêricili';convergé pára zero, esses melhoramentos graduais pavimentam o ca

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6 Com inclinações diferentes das curvas de abastecimento e demanda, omoví­mento teri.. sidoumaespiral voltada paradentro, convergindo parao eqililtbrio. , ;

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117

Conseqüências não-intencionais

perado iguala o' preço realizado e os produtores vendem tudo oque produziram ao preço que os induziu a produzi-lo em primei-ro lugar. ' ,

A maneira mais simples de formar uma expectativa de preço ésupor que o preço do próximo ano será como o preço deste ano.Suponhamos que, na Fig. X.2, o preço no ano 1 sejap. Esperandoque esse preço prevaleça no ano 2 também. os produtores ofere­cem um volume a no ano 2. Os consumidores, entretanto, nãoestão dispostos a comprar essa quantidade por aquele preço, e opreço é forçado para baixo até q. Agindo sobre a suposição deque o preço irá permanecer constante do ano 2 ao ano 3, os pro­dutores oferecem um volume b no ano 3. Como resultado, o pre­ço realizado r excede o preço esperado. Esperando que r preva­leça no ano. 4,03 produtores oferecem o volume c, mas paravendê-lo devem aceitar o preço mai.s baixo, s. O movimento depreços e volumes forma uma espécie de teia de aranha,' es­piralando parafora do ponto deequllíbrío." Os preçose osfâ~u­

ramentos são alternadamente mais altos e mais baixos do que osesperados. Surpresas agradâveis alternam-se com surpresas de-sagradáveis. O resultado esperado nunca ocorre. . , i

O comportamento eleitoral pode ilustrar o mesmo mecanís­.mo. Pesquisas publicadas antes do dia das eleições podem in­fluenciar de várias maneiras a votação efetiva. Alguns eleitoresquerem embarcar na caravana da alegria e mudam seu voto parao candidato com a maior posição na pesquisa. Outros favorecemo lanterninha, talvez porque acreditem importante que o perde­dor não perca por muita margem. O raciocínio lanterninha pode­ria, entretanto, ser autoderrotante se um número suficientementegrande de pessoas agisse segundo ele. Para cada votante, o racio­cínio faz sentido apenas se todos ou a maioria dos outros eleito­res se conformarem às predições das pesquisas - isto é, se elesnão se comportarem como ele. Mas se muitos passarem a apoiaro lanterninha na suposição de que poucos o farão, eles terão pro-

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;~:!,j:;;: "curva" de oferta de inclinação ascendente na Fig. X.2. 4 O preçoII .. \~._;. ,_, ..

.tk/·.. real pelo qual os porcos são vendidos irá determinar .quanto os~rh{;j: ,p.9.n~umidores comprarão, como se vê refletido na curva desce~­~~~?;;:,n'; Q.e,nte!~Se os produtores, esperando um preço, oferecerem maisf%i;<t·\q~e.,9S consumidores irão comprar por esse preço, a competição2:;.·;·I,e.ptre .os produtores irá forçar o preço para baixo até que o mer­~~:f~;; 1-çad.ose aclare. Se oferecerem menos do que os consumidores

i!I:~:;\·,;. : i, jrão comprar, a competição entre consumidores irá forçar o mer­;~!;i< ,( .cado para cima até que o mercado se aclare. O equilíbrio ­;~i;,!,J marcado comasteriscos na figura - ocorre quando o preço es-i~;g~,'"'';,,;';';:., "'l:tEssa curva de ofertaé na realidade a somade muitas curvasde abastecimento

<;;.l '?'J ê,individuais, uma paracada fazendeiro. Cadaponto em uma curva de abasteci-;-:{. .mento individual mostra o volume de maximização do lucroparao preçodado.:' '1\"" .Nesse volume, o customarginal (o custo de produzir mais um porco) igualao'\>j". ':,npreço de um porco. Quando Opreçosobe, a produção expande-se até o pontoá:k· fi: :'emqueo customarginal é mais uma vez igual ao preço. O customarginal cres­~k ce porque cada fazenda operacom dadoequipamento. o qual se torna um gar­

" .' galo quando a produção se expande. Embora algumas partesdo equipamento~;rj (construções etc.) possam ser. facilmente expandidas sem perda de eficiência,:-}l~.ioutras (notadamente a capacidade de tomardecisões) nãopodem.:5,~ Essacurva, similarmente, é a somade muitas curvas de demanda individual de'9por~s.:~ua inclinação tendepara baixoporque os consumidores voltam-se pa-.'ra,qutros produtos ~ medida queos porcosficam maiscaros..

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~~~:._~"'!":: ... "' ",. '._sóletivàniente' poderiam terminar colocando o' can-

f<)1i1'ôlg~i:Hneté'quando;individualmente, queriam apenas as­flit':'lhepma posição decente."~:"qo~seqüências não-intencionais mais surpreendentes pio­

iY'ai'isitúàção :pará todos. Jean-Paul Sartre referiu-se a isso:dm({~'cô'ntrafinalidade", usando a erosão como exemplo. Quan­

;ilr.,Bt:>:'b's fazendeiros tentam obter mais terras derrubando árvores,:~::';Pôdeni'acabarperdendo terras porque o desmatamento emgran-~., ' • "0

')':'de' escala leva à erosão. Instâncias de contrafinalidade abundam.::Ô~r Quando todos ficam em pé para ter uma visão melhor do jogo,:":~·f.::'nil1guémOconseguee todos se cansam de ficar em pé. Quando to­

'OO$~fsão:inotivados pelo desejo de ganhar um pouco mais queseus vizinhos, terminam por correr tão rápido quanto podem semo~ãír:;do 'mesmo 'lugar. Quando todos os chefes-de-família deci­'d~rriterniu,itosfilhosque possam cuidar deles na velhice, a su-~"" ..pe)pópula~ão ,resultante,pode deixar todos, em situação pior.,Q~hihdó todos tentam simultaneamente retirar seus depósitos doPM~O; todos podem perder seus depósitos. Quando todas as flr­#las:tehtarii suportar uma recessão cortando salários, a perda re-

,.,_J~,su.1tante de poder aquisitivo pode transformar a recessão numa~i;~li t,c>.dêpressão a profunda. , .1~Z:Ii;;';'~:'ilNam:os considerar o último exemplo mais detalhadamente. As~{~;~::~~"~é~presaS 'mantêm Um relacionamento duplo com os emprega­~"':'-;Y":~:jdos:!.urila vez que necessitam de trabalhadores corno consumi-

;':{::: dõr~s':deseus produtos, elas têm interesse em salários altos, de~,;~~;;~:jlÍ~9;que os trabalhadores possam gastar mais. Mas corno as;1I;1~'i:,e~i1'pfesas:tãInbém empregam trabalhadores, elas têm jnteresse~~in;ero':sáládosbaixos,Idealmente, a firma individual gostaria que;:bi;\vi:s~tj;~;~~~~g~dosrecebessem salários baixos enquanto os traba­it'l.'iJ.fi~é1ores,empregados por todas as outras firmas recebessem altos

Sãláriôs.~Nãoháobstáculológicopara que uma empresa alcanceõstCí(jis'fóbjetivós; embora num mercado de trabalho competitivo

~R~~f:!J::,'" ", '" , ' ''la;~Co,l1tecer, entretanto,que o efeito lanterninha fosse superadopelo efeí­~~an~~,~a alegria. de modo que os resultados efetivos correspondessernsultados preditos.·S~~!· .

118

Conseqüência$,não-in,tencionais, , ,

isso não aconteça. O que é logicamente impossível.é que todasas empresas alcancem ambos os, objetivos -' que cada uma' e,toda empresa seja a única, a pagar salários baixos a seusem-pregados," , , " ",' . <: ::;,:",

Mas as conseqüências não-intencionais também podem deixartodos em situação melhor. Essa é a mão irivisível de AdamSmith: a perseguição do auto-interesse serve ao interesse co­mum. Uma firma que introduz nova tecnologia é motivada ex­clusivamente por seus próprios lucros, no entanto, produzindoprodutos para. consumo (ou insumos usados por outras firmas)menos caros, serve indiretamente o interesse comum. O consu­mo para benefício próprio cria empregos - e, assim, oportuni­dades de consumo - para outras pessoas.? As pessoas.pintamsuas casas para protegê-las contra o mau tempo,. mas. fazendoisso também podem oferecer a outros o benefício, de .uma visãoagradável. Se todos os membros de, uma comuni<1á9~,m~tiY.e.,:rem um olho sobre suas própriascrianças enquanto, as 'inesmasestão brincando, não podem evitar estar vigiànd<?~b,éiri.Jtpró;le dos outros. Como resultado, os filhos de todos recebem maiorproteção. '- " - ',',' ,.,:'.... ;

A contrafinalidade e a mão invisível têm uma estrutura co­mum. Uma pessoa age de modo a beneficiar-se. Ao fazê-lo, tam­bém afeta outras pessoas (e com freqüência a si mesmej'? de um

8 A crença de que o que poderia ser verdadeiro para qualquer unidade tomadaseparadamente tambémpoderiaser verdadeiro para todas as unldades.simulta­neamente é 'às vezeschamadade "faláciade composição", Cometemo-la quan­do aplicamos a taxa marginal de imposto para calculare custo real de-todos ositens com dedução no imposto, esquecendo assim que apenas um dólar pode,ser o últimodólar.

9 Essaera uma idéia acalentada peloprecursor de AdamSmith, BernardMande­ville, cujo slogan, "Vícios privados, beneficios públicos" é talvez a primeiraafirmaçãodo mecanismo da mãoinvisível.

10 Umaempresase, prejudicaum poucoao cortaros saláriosde seus própriosem­pregados,uma vezqueeles gastampartede-sua renda.emboratipicamente umaparte muito pequena.com os produtos da firma, Ou consideremos uma finnade computadores que surge com um novo designo O beneficioprimáriopara afirma é que ela tem um lucro vendendo o novocomputador. Um beneficiose-cundárioé que podeusaro computador em suaspróprias operações. ' "

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1,~M9 s~~nçi,~~q~'I~pi~l.lffiente, o impacto secundário, seja nega­,;.~i~~,:o~::~'s.it,~X~;,é.}·~~I~entep~queno comparado ao beneficio;.JJ.~11l:1áI101 m~en91~n}~1.,>Amdaassim, se todos agem dessa forma,""cadà'pessôà s'e tomá' oalvo de muitos pequenos benefícios ou,~u'itÓ1!i'peg;ti(;~:os':éianos;~(Esses pequenos efeitos colaterais são. geralmente'referidos 'corno externalidades.) Se o efeito secundá­':'rioé PositiV9, temos um mecanismo de mão invisível, Se o rnes­:'"Jll~fnegativo, há duas possibilidades. Ou a soma total dos mui-•',' tos ;"!:pequenos 'danos 'excede o benefício primário (isso é

contrafinalidade), .ou:o benefício primário excede o dano"cumulativo. Todos saem beneficiados 'ao agir do modo especifi­

';dido;': porém; menos beneficiados do que esperavam. Alguns','exefuplós de contrafinalidade sugeridos antes poderiam, de for-'ma modificada, ilustrar também esse caso.'! '.:,.;'!I.Nessás ilustrações, as pessoascujas ações têm conseqüências ".'não~intencionais são ,também aquelas que sofrem ou se bene­ficíamdelas. Igualmente importantes e numerosos são os casos

.em que 'as conseqüências são sentidas por outras pessoas. Na"China tradicional, muitas famílias pobres praticavam o infanticí-dio de meninas. O resultado foi um excesso de meninos e umnúmero substancial de jovens adultos solteiros que constituíamexcelente material para recrutamento por bandidos. As vítimasdo banditismo eram principalmente os senhores de terras e cam­poneses prósperos, que não praticavam o infanticídio de meninas

.na mesma extensão. A predação dos ricos foi uma conseqüêncianão-intencional das autodefesas dos pobres.P Quando os sindi­

.catos insistem na segúrança de trabalho para seus membros, não. : têm em mente os interesses da firma. No entanto, como conse-. t·.·..,~.)·l.,- .. '.

. .; 11 Suponhamos que, antesdo desmatamento. os camponeses dispusessem de dez"' ,.mil acresde terra, metade cultivável e metade em mata. Após o desmatamento,"":'irtdois mil acres são perdidos devidoà erosão. mas a quantidade de terra cultl-(, ..:nvávelsubiu decincomilparaoito milacres. .: 12 Poder-se-ia dizerque os ricos foram vitimas de suas próprias atitudes. umavez

');;,;i,,:~:..que-a pobreza era devida principalmente à exploração dos senhores de terras."}:~~FoFüm efeitoda exploração que. por puroacidente, gerou umcontrapeso à ex­

·~ploração: ~'" ':;,~.~ r\\,~.:.,~~ ',.,' .

120

Conseqüências não-intencionais

. qüência não-intencional, as taxas mais baixas de rotatividadeau­mentam a produtividade ao reduzir os custos de treinamento:erecrutamento.P Mecanismos como esses são o material daciên­cia social.

Um antigo enigma na filosofia da explicação social é se asconseqüências não-intencionais podem entrar na explicação daação ou ações que as causaram. Em um sentido óbvio, não po­dem. Para explicar uma ação devemos apelar para algum evento

. que a precedeu no tempo. O futuro não pode causar o passado.Mas podemos fazer a pergunta diferentemente, com respeito aum padrão ou seqüência de ações em lugar de uma única ação.Nesse caso, poderiam as conseqüências não-intencionais de algoque faço hoje explicar porque eu também o faço amanhã?14

A variação casual com seleção subseqüente é um modo peloqual isso poderia acontecer. Na vída social, a seleção artificial, enão a natural, é o mecanismo mais plausível. O padrãodasativi­dades de pesquisa, por exemplo, é explicado em grande parte pe­los benefícios desejados pelas instituições financíadoras, 'masnão intencionais para os cientistas. Muitos cientistas buscam ro­tineiramente financiamento do Departamento de Defesá/-pararealizar trabalho motivado por preocupações puramente intelec­tuais,ls O Departamento de Defesa, presumivelmente, financiaos pedidos que julga terem o maior potencial militar. A alocaçãoresultante de fundos para pesquisa é explicada por conseqüên­cias que são incidentais do ponto de vista dos cientistas.

O reforço proporciona outro mecanismo pelo qual as conse­qüêncías não-intencionais poderiam explicar a persistência docomportamento que as causa. O primeiro ataque de raiva ocorre,suponhamos, porque a criança é frustrada por não obter algo que

13 Não é Claro que as empresas devam aplaudir os sindicatos. entretanto. pois es­tes também tendem a obtermelhores salários paraseusmembros. '

14 Podemos restringir-nos a conseqüências que sejamem certosentidobenéficas.Os benefícios não precisam. entretanto. resultar paraos próprios agentes, con­forme demonstrado peloexemplo do financiamento de pesquisas notexto. ," ..

15 Muito trabalho em lingüística pura, por exemplo. foi financiado peloCorpodeSinalização Naval norte-americano. ..) "

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Conseqüências não-tntencionais

< algum tempo ela quebra e ressurge de uma forma nova, modi­ficada. Ou a nova forma permite o conflito, ou não. Se permite, é

. viável e pode-se esperar que persista por algum tempo. Se nãopermite, quebrará novamente. Mais cedo ou mais tarde irá surgiruma forma estável. Se descobrimos que a maioria das organiza­~oes existentes permitem o conflito, a explicação é que as quenão o permitem são instáveis e estarão fortemente representadasna população de organizações. O argumento não explicaria porque uma organização qualquer em particular permite o conflito,mas explicaria porque uma maioria delas o faz. E explicariaesse fato em termos de uma conseqüência não-intencional e útildo conflito.

Esse argumento é um pouco como o argumento da seleção so­cial discutido no capítulo VIII, e vulnerável a objeção similar.Para funcionar, o processo de adaptação deve ser bastante rápidocomparado à taxa de modificação. do ambiente. Esta última de..'pende de duas coisas:· a velocidade .em que novas organizaçõessão criadas e a velocidade em que as antigas organizações se to~~ .nam obsoletas. A rapidez.de adaptação também dependededoisfatores:.o tempo necessário a uma organização instável para que­brar e a probabilidade de que a sucessora de uma organízaçãoinstável venha a ser estável. Nas complexas sociedades moder­nas o ambiente poderia muito bem mudar tão rapidamente que oprocesso de adaptação tivesse poucas chances de acompanhâ-Io. '

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.,;~.(7' '.~~i'f&b';'i -s-Imeraçãa

,~iílo'um pouco de sorvete. Após algum tempo, ela ob­. 'J~t:te~ .queé o que queria. E também obtém algo maisDáftãrite~l.jque não era pane de sua. intenção '- a atenção de

lb.1.~paí8.-D: algum.m~o - não. sabemos como - a gratifica­~ôJpor te~sldo ouvId~ fica as.socIada com o _comportamento de

{ptftéi"' pé e.o reforça. AInda assim, obter atençao nunca se torna o':,~óbjetivo pretendi~o do comp0:tamento da criança. '.ó),Quando os sociólogos explicam o comportamento por conse­

.'"qüências não-intencionais, geralmente não têm em mente nem a,seleção e nem o reforço. Infelizmente, é difícil dizer o que elestêm em mente. Um exemplo muito discutido é a dança da chuvaexecutada em certas sociedades. A dança não traz chuva, mas'traz algo mais importante: coesão social e solidariedade. Emnossas sociedades, ir à igreja pode ter um efeito muito parecidoou; .corno declarariam muitos sociólogos, função. .Dizer que a

. função do ritual é manter a coes~o social é dizer mais do que di­zer que o ritual tem esse efeito. E afirmar que o efeito explica oritual. Ora, é difícil organizar os fatos corretamente em tais ca­sos. A coesão social é difícil de medir. No entanto, supondo quede algum modo poderíamos 'estabelecer que a coesão social émelhorada por esses rituais, como daríamos o passo seguinte ­explicar o ritual em termos da contribuição não-intencional àcoesão social?

Uma vez que a noção de coesão social é tão fugidia de qual­quer modo, um outro exemplo poderá ser mais útil. Poder-se-ia.pensar que o conflito declarado dentro de uma organização sejaruim para sua eficiência. No entanto a alternativa pode ser pior.Se todo conflito é suprimido, a tensão se acumula até que um diaa organização quebraE muito melhor se os membros puderemdeixar escapar pequenos jatos de vapor a intervalos regulares doque ver a máquina toda explodir. Podemos concluir, a partir dis­so, que a função do conflito é manter a organização em boa for-ma e que o conflito é explicado. por essa conseqüência não-in-tenclonal? '. ' :'. "'" ,,',.:, " . .

. JL', :p.mecanismo seguinte poderia apoiarurnaresposta afirmati­.vá. Uma organização que não permiteo cQnWto é instável. Após

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NORMAS SOCIAIS

A AÇÃO racional - seja ela econômica ou politicamente mo­tivada - está relacionada a resultados. A racionalidade diz,

"Se você quer alcançar Y, então faça X". A ação orientadapornormas sociais não é orientada por resultados.Asnonnas 'sociais

, mais simples são do tipo "façaX" ou '.'não façaX'\NoqUãs.rPa~scomplexas têm forma condicional: "se.você fize~'Y~r,ent&o~..f~çâX", ou "se outros fizerem Y, então faça X". Uma' norma aindamais complexa diz: "Se seria bomque.todos fizessemX,éní4o 'faça X". Para que tais normas .sejam sociais;' elas devem sercompartilhadas por outras pessoas e em parte sustentadaspor 'sua aprovação e desaprovação. Tipicamente são tambémsusten­tadas pelas emoções que se desencadeiam quando as normas sãovioladas: embaraço, culpa e vergonha no violador; raiva e in­dignação nos observadores. Muitas vezes uma norma para se fa­zer X é acompanhada por uma norma de nível mais elevado parapunir aqueles que violam a norma de primeira ordem.onde a pu­nição pode variar desde sobrolhos erguidos a ostracismo social. .

A caracterização das normas sociais é controversa, ainda maistalvez que a maioria dos outros argumentos neste livro. Discuti­rei as objeções mais adiante, mas primeiro precisamos de algu­mas ilustrações do que tenho em mente quando falo sobre nor- 'mas sociais. Abordarei a questão de se as normas sociais servema um propósito ulterior, isto é, se em algum sentido são úteispara o indivíduo ou para a sociedade. Quando são, não 'deve­ríamos concluir sem maiores argumentações; que .elas existem

'porque servem àquele propósito. ;.' ,.';.Algumas normas são um pouco como convenções, exceto .

136

P, ' -Intéração

,º;~~~:;~arece, uma vez que estão envolvidas duas com­".~~~;~~ara>9s fracos, a t.ei e.a ordem são muito importantes,§mq,;:quando fortemente Inclinadas contra eles. Sem lei,e or-

.:W~;poestado de natureza - eles não sobreviveriam. Os for­~ítarnbém,preferem a lei e a ordem ao estado de natureza, e na­

e,~ímente preferem a lei e a ordem inclinadas a seu favor à lei e.' '",;:'à',ordema favor dos mais fracos. Não obstante, porque são for-

i.:';·':,.?,(·r..l, .. ;f......'+;'"." .~ ~,~ _.".., •

'~,.', 'tes, eles poderiam sobreviver no estado de natureza. Há menos.,,<: ~,ii?"jogopara os fortes, o que é uma outra maneira de dizerque

, eles, têm maior poder de barganha, que podem usar para impor" s~~'equilíbrio preferido. Digo mais a esse respeito no capítulo

. t),,'_' ...., , .

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,',~;:)jmIegado desastroso da abordagem biológica à sociedade;', (Gapí~ulo, VIII) é a suposição de que as sociedades são estáveis.

., p:o.r,es~úvlsão, qualquer afastamento do equilíbrio coloca em'" riÍoyiiiiento forças que o' restabelecem, de modo semelhante a" como-qualquer desvio da temperatura corporal normal desenca-, (Iei~'processos (transpirar outremer) que a reconduzem ao nor­. ~áI,.Consideremos dessa perspectiva o ciclo da teia de aranha., Algúns desequilíbrios são eliminados pela simples convergência',~R,:equilí~riO. Se o processo não converge (como na Fig. X.2),

expectativas adaptáveis o estabilizarão. Se isso não funcionar~bém, a ação política o fará. As sociedades não são como or­gmlismos, 'entretanto. Não há razão para acreditá-las tão 'maravi­Ihosamente desenvolvidas que qualquer desvio do equilíbrio seja

, automaticamente cancelado.o", 0~;;;!'.~

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, .Interaçãorf.tf/.~~~:':~~)' .

16Sf~t:d'de não ser claro que qualquer propósito ulterior esteja~êid·()servido.Normasde como se vestir, regras de etiqueta e re­

gras >de'dietas entram nessa categoria. Algumas vezes essas nor­{mas são comparadas a regras de tráfego, mas um' momento de

, .:t{?reflexão de' mostra que a analogia é enganosa. Se violo uma re­,;;,:YJ'::~Igrade trânsito, duas coisas ruins podem acontecer-me. Posso en­',{, volver-me num acidente e posso ser culpado pelos circunstantes,

porque coisas ruins podem acontecer a eles se eu dirigir impru­(, dentemente. Se apanho o garfo errado à mesa do jantar, a única

coisa ruim que pode acontecer-me é que os outros me censura­',' rão por-minhas más maneiras. Mas por que fariam isso? Eles não" sofrem dano ou risco se eu apanhar o garfo errado. Eles pode­, ,riáin ser censurados, entretanto, se não me censurarem.

, , (~i~:"nutras normas sociais assumem a forma de códigos de honra,~:Muitas sociedades têm regras estritas de vingança, com vendet­:JàS séestendendo por gerações. A vingança não é orientada pela~JJ~rSpeCtlva'de ganho futuro, mas, desencadeada por uma ofensa':')mterjor. Embora a propensão a vingar-se não seja orientada por;, conseqüências, ela pode ter boas conseqüências. Se as outras

, , ", pêssoas acreditarem que eu me vingo invariavelmente pelasofensas, mesmo a um grande risco para mim próprio, elas toma­rão cuidado para não ofender-me. Se acreditam que irei reagir ã

~ ofensa. apenas quando for de meu interesse reagir, não precisam;,sertão cuidadosas. Do ponto de vista racional, uma ameaça não.;J:,verossímil a menos que seja de interesse de quem ameaça

cumpri-la quando chegar o tempo. Ameaçar matar a si mesmo,por exemplo, não é racionalmente verossímil. As ameaças apoia­das por um código de honra são muito eficazes, uma vez que se­r.ã9 cumpridas mesmo que seja contra o interesse de quem amea-

'Ç(?,i:I.~Assim poderia parecer como se um propósito ulterior\ ~~~~Ji,x~~se sendo servido pelo código, embora a pessoa que é fiel:;;"tJ:.<unesrno não seja motivada por um propósito ulterior. A ação':'Y:Y1}ãQ:-:in~trumental pode ser instrumentalmente útil. No entanto:~~p.ip,,1l10mçQt() de reflexão mostra que' esse'caso é uma exceção.rÃ; ·qúando. uma pessoa guiada por um código de honra, tem uma

rusgacom urna que é motivada exclusivamente porconsidrações~:~~\ . .

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Normas sociais

racionais, a primeira geralmente conseguirá se impor. Numa rus­ga entre duas pessoas guiadas pelo código, ambas poderão-sair­se pior do que se tivessem concordado em deixar que o sistema'legal resolvesse seu conflito.' Uma vez que estamos falandoso­bre códigos de honra que são normas sociais compartilhadas, o"último caso é o típico.

Há normas regulando o que o dinheiro pode comprar. Parece,por exemplo, existir uma norma social contra alguém dirigir-se auma pessoa na fila do cinema e pedir-lhe que lhe venda seu lu­gar.2 Notemos que ninguém seria prejudicado por essa prática.As outras pessoas na fila não perderiam seu lugar. A pessoa so- .licitada a vender seu lugar estaria livre para recusar. Se aceitas­se, tanto ela quanto o comprador ganhariam com a troca. Foi su­gerido que essa norma' é um caso especial de uma norma maisgeral contra a ostentação de riqueza, uma norma que serve a umpropõslto ulterior de reduzir a inveja e o conflito. Mas essa nor­ma 9'Pera dentro de uma comunidade de pessoas que conhecemumas às outras, não entre estranhos esperando numa fila. .Não hánormas contra estar em fila compeles ou jóias caras, embora talcomportamento seja também um modo de ostentar a riqueza. '

Como outro exemplo, consideremos uma comunidade subur­bana onde todas as casas tenham pequenos gramados do mesmotamanho. Suponhamos que o proprietário de uma casa estejadis­posto a pagar dez dólares ao filho de seu vizinho para aparar-lheo gramado, porém não mais. Ele preferiria passar meia hora apa­rando a grama ele próprio do que pagar onze dólares para que al­guém mais o faça. Imaginemos agora que essa mesma pessoa re­ceba a oferta de vinte dólares para aparar a grama de outrovizinho. E fácil imaginar que recusaria, provavelmente com al­guma indignação. Mas isso tem uma aparência de irraclonalida­de. Ao recusar a oferta de ter o filho de seu vizinho aparando-lhea grama por onze dólares, dá a entender que meia hora de~e~

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Talvezseja por issoque os mafiosos se dêem melhor nos Estados UnídosquenaSidlia. ' " ,,'." "'\'1

2 Perguntei a vâriascentenas de pessoas se acreditam queexistasemelharitenor­ma.Apenas 5%disseram que emsuaopinião nãoexiste." ,

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3 Altruísmo, ou uma versão mais impessoal do mesmo, poderia ser:\lniándfnl1~moral(capítulovi), , '," l,:'r::,'~'f;.{f 'f..ülJ;I','"

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Normas sociais

consideradas várias explicações, em termos de altruísmo, kantia­nismo 'e, eqüidade, Destas" as duas últimas são: normas sociaisnos termos 'de minha deflniçãof o kantianismo diz às pessoaspara fazerem X, se:Xé uma atividade que beneficiaria a todos setodos se engajassem nela.. Não é orientada pelos. resultados epode, com efeito, ter más conseqüências, Se alguns, porém nãotodos, se engajarem na atividade que beneficiaria todos se todosse engajassem nela, todos poderiam sair pior do que sairiam seninguém se engajasse nela. O desarmamento unilateral poderia,sob certas circunstâncias, ser um exemplo. A norma da eqüidadediz às pessoas que .façamX se a maioria das outras pessoas fizerX, se alguém se beneficiar por elas fazerem X e se alguém se be­neficiar por elas não fazerem X. É uma norma contra a carona.Mas não é orientada por resultados, uma ver. que insta U'TIa pes­soa a cooperar mesmo quando todos estariam melhor se ela pe­gasse uma carona.

Não há dúvida de que essas normas servem a um propósito ul­terior. Mesmo se em qualquer ocasião dada elas possam funcio­nar contra o interesse geral, esses -casos são pouco freqüentes.No todo, são imensamente benéficas. A civilização, como a co­nhecemos, não poderia existir sem elas. Mas isso não quer dizerque as pessoas ajam para manter a civilização quando seguemessas normas. Uma' vez mais, as normas não-instrumentais, po­dem ter conseqüências instrumentalmente úteis. A norma não­instrumental da vingança tem conseqüências úteis para o indiví­duo que' a segue, mas apenas, se .ninguém, mais o fizer. Asnormas de cooperação têm conseqüências úteis para outras pes-.soas, ao menos sob a maior parte das circunstâncias. Os.detalhesdo argumento são examinados no próximo capítulo.

Às vezes as pessoas invocam uma norma social para raciona­lizar o auto-interesse. Suponhamos que minha mulher e eu este­jamos oferecendo um-jantar para oito e que já tenham sido con-,vidadas quatro pessoas. Discutimos se convidar um casal-em

140

'Interação,

tempo vale no máximo onze-dólares. Ao recusar a oferta 'paraaparar o gramado do outro vizinho por vinte dólares, dá a enten­der que ela' 'vale no mínimo vinte dólares; Mas ela não pode aomesmo tempo valer menos que onze e mais que vinte dólares. .

Como explicação foi sugerido que as pessoas avaliam diferen­temente perdas e ganhos passados. As companhias de cartões decrédito exploram' essaciferença quando insistem que -as lojasanunciem descontos para pagamento em dinheiro de preferênciaa taxas de juros para cartões de crédito. O portador do cartão decrédito é,menos afetado pela chance perdida de obter o desconto,pelo pagamento em dinheiro do,que pelo custo extra para pagar'com o cartão.Similannente, o proprietário da casa é mais afeta­do pelas despesas que sairiam de' seu'bolso para pagar a alguémpara aparar seu gramado do que pela perda de uma renda ines­perada. Mas essa não pode ser 'a história completa, porque nãoexplica por que' o proprietório da casa deveria ficar indignadocom a proposta. Parte da explicação deve ser que ele não pensaem si mesmo como o tipo de pessoa que apara os gramados dosoutros por dinheiro. Isso não se faz, para usar uma frase revela­dora que com freqüência acompanha as normas sociais. Aqui éplausível que um propósito ulterior esteja' sendo servido. As rela­ções sociàis ~ntre vizinhos seriam 'perturbadas se diferenças deriqueza fossem espalhfatosamente expostas e se alguns deles tra­tassem os outros corno empregados assalariados. No entanto, emqualquer Ocasião dada isso geralmente não é razão ou motivopara recusar a oferta, ou para não fazê-la. Isso simplesmente nãore~ ', Um importante conjunto de normas diz às pessoas para coo­

perarem em situações do tipo Dilema do Prisioneiro. As normaspara' votar são um exemplo importante entre .muítos outros.,Émelhor para quase todos se a maioria das pessoas votar, porquede outra forma a democracia poderia ser minada e dar lugar aum regime autoritário. Para qualquer indivíduo, entretanto, fazpouco sentido votar, uma vez que sua influência para' aviabilida­de.da democracia é quase nula. E.no entanto, a maioria das pes­soas vota nas sociedades democráticas.' No capítulo IV foram

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Normas sociais

bre a manipulação de normas entre os Ik, citada no capítulo VI, éum excelente exemploe .Se algumas pessoas com sucessoexpJo,.;<ramnormas para propósitos auto-interessados, só pode ser por.. -; .que outros estão dispostos a deixar que as normas tenham pre­cedência sobre o auto-interesse. Além disso, mesmo aqueles queapelam à norma geralmente acreditam na mesma, ou então 6apelo poderia não ter muito poder. O poder das normas deriva da .'tonalidade emocional que lhes dá um controle sobre a mente.Fingir emoção é possível, mas a coisa real é mais convincente.

O manipulador de normas em perspectiva também é constran­gido pela necessidade de ser consistente. Mesmo que a normanão tenha controle sobre sua mente, ele deve agir como se tives­se. Tendo invocado a norma de reciprocidade em uma ocasião,não posso simplesmente ignorá-la quando minha mulher apelapara a mesma em outra ocasião. Um empregador pode ser bem­sucedido em apelar aos funcionários e conseguir que eles corn-'partilhem dos ônus de um ano ruim. O preço que ele paga é quenum ano favorável poderá precisar compartilhar também oslu­cros, Ao fazer o apelo anterior, ele se comprometeu com a nor­ma de uma divisão justa do excedente. . _ .

É tempo de encarar uma objeção óbvia ao meu relato sobre asnormas e, em particular, à declaração de que o comportamentoguiado por normas não é orientado para resultados. Quando aspessoas obedecem a normas, com freqüência têm um resultadoparticular em mente: desejam evitar a desaprovação de outras­pessoas. O comportamento guiado por normas é apoiado pelaameaça de sanções sociais que torna racional obedecer a normas,Suponhamos que eu me defronte com a escolhaentrevínger-mepor um insulto à minha irmã e não fazer nada. O custo da vin-,'

é gança é que eu poderia por isso tomar-me alvo decontra-víngan-.'ça. O custo de não fazer nada é que minha família e meus ami-,

gos certamente me abandonarão, deixando-me por minhaprópria conta, exposto aos predadores. Uma análise de cll~to--be"j...n~fiCio poderia bem dizer-me que a vingança é a escoliía,'rndq:;_~ ,._.nal. A contra-vingança é incerta, uma vez que poderiaserdirigi~j';;f.;

142

tsvlnteração

~ulaifp'a:tai os últimos dois lugares e percebemosestar eml6ordo~por.,razõesum tanto turvas. Eu gosto da mulher dot~ê;minha-mulher não-gosta que eu .goste dela. Mas não que­

remos>ldeclarar essas razões. Em vez disso, apelamos para nor­:mas~sociais. Eu invoco a norma da reciprocidade, dizendo: "Co­

}mo-;eles nos convidaram para jantar em casa deles, é nossa vez~, de convidá-los agora". Minha mulher invoca outra norma: "Uma

vez que já convidamos dois homens solteiros, devemos convidarduas mulheres, para criar um equilíbrio".-~;:;Etr1 negociações salariais o puro' poder de barganha (capítuloXi-,) tem muito peso. O apelo a normas sociais aceitas também

· pode ter certa eficácia, entretanto. Para justificar os aumentos sa­làriais, os trabalhadores podem referir-se ao faturamento da em­presa, o nível dos salários em outras empresas e ocupações, opercentual de aumentos salariais em outras empresas ou ocupa­ções. Quando as mudanças estiverem sendo comparadas, elespodem escolher o ano de referência de modo a tomar seu próprio

· casotão forte quanto possível. Os empregadores usam argurnen­-~_ tossimilares para resistir a exigências de aumento de salários.

Cada argumento pode ser apoiado por uma norma de salários;justos. Há uma norma de divisão equânime do excedente entrecapital e trabalho. Os empregadores apelarão para essa normaquando a empresa estiver indo mal, os trabalhadores quando ela

, estiver bem. Há uma norma de pagamento igual por trabalhoigual. Os empregados irão apelar para essa norma quando ga­nharem menos que empregados de firmas similares, mas não

· quando ganharem mais. A norma de preservação de status, ou.diferenças entre salários, também pode ser explorada com pro-· p6sitos de negociação.~!'Alguns argumentam que é a isso que se resumem as normas:são-instrumentos de manipulação, usados para vestir o auto-inte­.rêsse com trajes mais adequados. Mas isso não pode ser verdade: -r

AlgU'masnormas, como a norma da vingança, obviamente ultra­-passamo auto-interesse. Um argumento mais geral contra a vi­s~oúcínicadas normas é que se ninguém. acreditasse em normas;'ão.:haveria-nada a manipular. A descrição de Colin Tumbull so- i

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5 Na linguagem do capítulo precedente. se o comportamento guiadopor normasé sustentado apenas porsanções externas, nãose tratade umequllíbrlo,

Normas sociais

pessoas que deixam de fazer X. -Bnquanto o custo de exprimirdesaprovação é menor que o custo de receber desaprovação.pornão exprimi-Ia;faz parte do auto-interesse racional de uma pes­soa exprimi-la. Ora, exprimir desaprovação é sempre caro, sejaqual for o comportamento alvo. Como mínimo absoluto, exigeenergia' e atenção que poderiam ser usadas para outros fins.Pode-se alienar ou provocar o indivíduo-alvo a certo custo ourisco para si mesmo. Por outro lado, quando urna pessoa semove para cima na cadeia de ações, a partir da violação original,o custo de receber desaprovação cai rapidamente para zero. Aspessoas não franzem o cenho para outras quando estas deixamde sancionar pessoas que deixam de sancionar pessoas que dei­xam de sancionar pessoas que deixam de sancionar uma viola­ção de norma. Conseqüentemente, algumas sanções devem serexecutadas por motivos diferentes que o medo de ser sancio­nado. Argumentei no parágrafo precedente que às vezes há ummovimentador não movido no próprio início da cadeia. Aqui ar­gumentei que toda cadeia deve ter um.s

Mesmo que as conseqüências não sejam parte da motivaçãopróxima do comportamento guiado por normas, elas ainda pode­riam entrar na explicação das normas. As normas poderiam exis­tir porque são úteis ou para o indivíduo ou para o grupo que assegue. Ora, algumas dentre as normas que mencionei são inques­tionavelmente úteis, tais como as normas de cooperação. A utili­dade das outras é mais duvidosa.

As regras de etiqueta, normas de como se vestir e semelhantesnão parecem ter quaisquer.conseqüências úteis. Ao contrário, orígido controle dessas normas sobre a mente parece criar um bo­cado de miséria sem sentido. Argumenta-se às vezes que elasservem à útil função de confirmar a identidade ou filiação a um,grupo social. Essa afirmação é um pouco como o argumento dadança da chuva mencionado no capítulo x. Como a noção deidentidade social é fugidia, é difícil avaliar. Uma fraqueza do ar-

144

4' Elaspoderiam ser mesmo o alvoda desaprovação pelaprimeiraparte-. isto é-.-; . 'a pessoacujasviolações elasdeixam de sancionar. O leitoré encorajado a pen-

,.sar .em exemplos! . .

. Interação .

da contra outro membro de minha família, clã ou tribo. As con-'.seqüências de permanecer passivo, por.contraste, são certas. ' r ' .: i ,:'

Em resposta a esse argumento podemos observar primeiroque normas não necessitam de sanções externas para serem efe­tivas. Quando as normas são internalizadas, são seguidas mes­mo que a violação sejainobservada e não exposta a sanções; Avergonha ou antecipação. da mesma é uma sanção interna sufi­ciente. Não cutuco em meu nariz quando. posso ser observadopor. pessoas. em um. trem que passa, mesmo se tiver certeza deque todos são perfeitos estranhos a quem não irei ver nunca maise que não têm poder de me impor sanções. Não jogo lixo no par­que, mesmo que não haja ninguém ao redor observando. Se apunição não fosse nada mais que o preço do crime, ninguém sen­tiria vergonha ao ser apanhado. No processo de internalizar nor­mas, as atitudes de outras pessoas são essenciais, mas uma vezque o processo foi completado as normas permanecem como sefosse por si. mesmas. Não funcionará argumentar que ~eguir.·á ~.

norma mesmo quando não observado é.um modo racional de I'~economizar nos custos de decisão. Às 'vezes uma pessoa sabe, !que teria muito a. ganhar e nada a perder por violar uma norma ';~.- nada, isto é, exceto o auto-respeito. Isso não quer dizer que as . • t

sanções são supérfluas uma vez que uma norma fui internali- ."zada. A natureza humana sendo o que é, as sanções externas sãoum contrapeso útil para a fraqueza de vontade.' .

Precisamos perguntar também por que as pessoas iriam san~.

cionar' outras por violarem normas. O que ganham com isso?'Uma resposta poderia ser que se elas não exprimirem sua: de­saprovação da violação, elas próprias serão o alvo da desapro­vação de terceiros.vQuando há uma norma para fazer X, há comfreqüência, corno disse, uma norma de ordem mais elevada parasancionar pessoas que deixam de fazer X. E poderia haver mes­mo uma norma para sancionar pessoas que deixam de sancionar

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Normassociais

poderia, se lhe for dado o tempo de cinco minutos, contar uma ',',', história"sobre as coisas' ruins que aconteceriam se não tívésse­

mos essa nonria. Mas .contar uma história não é apresentar um '.argumento. A norma que nos previne contra, aceitar ou 'fazer .

• ofertas para aparar os gramados de outros por dinheiro parecemais prometedora a esse respeito. Se eu estiver sem dinheiro,posso ficar tentado a aceitar ou solicitar uma oferta, pensando,corretamente, que uma transação não pode fazer diferença, Masuma conseqüência não-intencional de muitos negócios monetá­rios entre vizinhos poderia ser a perda do comportamento, de aju­da mútua espontânea que é.umdos principais benefícios de vivernuma comunidade. Impedindo os negócios, a norma preserva.acomunidade. ' '.

.A norma poderia também .ter um aspecto mais indecoroso, en­tretanto. É verdade que se eu oferecer dinheiro a meu vizinhopara aparar a minha .grama, faço uma ostentação de riqueza deum modo disruptivo para a comunidade. Masa norma contra os;';tentar riqueza pode ser apenas um caso especial de urna normade ordem mais elevada: Não tente aparecer. "Não penses queésmelhor do que nõs.e acima de tudo, não te comportes de manei­ras que nos façam pensar que pensas ser melhor do que nós."Essa norma, que prevalece em muitas comunidades pequenas,pode ter conseqüências muito ruins. Pode desencorajar os maisdotados de usarem seus-talentos, e pode levar a que sejam rotu­lados de feiticeiros se ainda assim os usarem. '

A norma contra aumentar o ritmo encontrada na maioria dosambientes de trabalho pode ser vista nessa perspectiva. A ex;'plicação usual dessa norma é que os aumentos de ritmo induzemos empregadores aelevar os padrões, de modo que no final todosos trabalhadores perdem. O problema com esse relato é que elafaz os empregadores parecerem realmente irraciomiis,'úmavez"que seria seu interesse dissipar o receio dos trabalhador~s~~~h1-~ ;;~"

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prometer-se a um padrão.pré-estabelecido. Um reI,a:to.alterp~~j.vo',::;:,

poderia ser um em termos de normas sociais, confonnismo;elirj~S',;.;,/,

veja. O impacto geral da norma de não aparecer prova\iélriiérit'--

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149

Interação

eíÍ~6:;;é~q~e,o mesmo não explica porque essas regras são~m~:frÇq·üênciaconiplicadas. Para sinalizar pu confirmar a mia­

Çã.ê~de.i'àIguéina um grupo um sinal deveria ser suficiente, comoQ:usQ,d.e um crachá ou gravata. Ao contrário, freqüentemente há

{iUiipla redundância, A'maneíra de falar de uma pessoa educadaemOxford difere do inglês falado padrão de muitos modos além

"dós <necessários para sinalizá-la como graduada por Oxford., Uma resposta é que a complexidade das regras serve a uma fun­ção adicional, a de manter fora os de fora e por baixo os inician­teso É fácil imitar uma forma de comportamento, mas difícilaprender mil regras sutilmente diferentes. Mas esse argumentose esvazia diante do fato de a vida da classe trabalhadora ser nãomenos regulada por normas que a das classes superiores. En­quanto muitas pessoas da classe média gostariam de se fazerpassar por membros da classe superior, poucas tentam passar poroperãriosf

, ,As normas da vingança também são ambíguas a esse respeito.Poder-se-ia argumentar que haverá menos rixas em sociedadesreguladas por códigos de honra, uma vez que todos saberão queelas poderão ter conseqüênciasdesastrosas. Mas não é claro queisso seria bom. Poder-se-ia provavelmente eliminar quase todo ocomportamento, criminoso se todos os crimes fossem punidos.com.a pena de morte, mas o custo de criar-se esse regime de ter­ror seria proibitivo. E de qualquer modo as sociedades domina­das pela vendetta têm uma incidência muito alta de mortes porviolência.,.; As normas que regulam o papel do dinheiro são igualmente

". , " ambíguas. Eu não acho que a norma contra comprar lugares~~,~;A:;;.., numa ma de cinema tenha conseqüências úteis, embora.natural­~1~';Z!;1~\'I mente, pudesse tê-las. Qualquer economista que honre o título

.;~f~\~~.\'<.·. ';;,~t,,".:.;· .. o::. ,~ .

;~;';\;;;:i>:;6'~!Para maior certeza-poder-se-la contar uma história sobre esse caso também.,';:i'~c:11~ãqé menosdiflcll livrar-se das normas de etiqueta do que adquiri-Ias. Talvez

-.,<seja do interesse da classe trabalhadora como um todo que seus membros não.encontrem-tacílídade para abandonar a classe. umavezque os primeiros a fazê­o.tenderiam ~ ser seusmembros maisdotados e, portanto, também seuslideresotenclaís,rr,J á~" ,-', . '

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7 Comofoi notado no capitulo VIII, a invejabem poderia ser favorecida pela se­leçãonatural. Algum comportamento guiadopor normasé intimamente relacio­

,nadoà inveja. Isso poderia dar uma história. Outra história evolucionária é queo conformismo pode ter sido uma eficiente estratégia de sobrevivencia para,

, 'nossos ancestrais. embora mais tarde se tomasse um obstáculo ao progresso., ." Talvez tenhasido assim que o leopardo adquiriu Suas manchas e o etíopea sua,;"3;c<.>r; ,e talveznão.

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EM Lake Wobegon Days Garrison Keillor descreve o.pia daBandeira em sua cidade mítica. Herman, o organizador da

parada, comprou uma quantidade de bonés azuis, vermelhos ebrancos e distribuiu-os às pessoas da cidade de modo que pudes­sem marchar através das ruas como uma Bandeira Viva,enquan­to ele se postaria sobre o teto do Edifício Central para 'tirar umafotografia. Logo-após a guerra, aspessoas ficàrainJeHiês emcomparecer,porém mais tardereéonsideraram:"YrJ;3!!'I,~: ~'::'.:: ,',

•. ',: ~J'...'

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Uma causa de ressentimento erao fato dequenenhum rtpl~s" "chegou avera Bandeira queestavam formando; a: fotogI-afia nojornal eraempreto e branco. Apenas Herman é Mr. Hansoli ,chegaram aVetaBandeira real, e alguns meninos muito baixosparaserem necessários lá embaixo. Aspessoas queriam umachance de subirparao telhado e testemunhar o espetáculo por si

, mesmas."Como vocês podem subir sedevem estaraqui embaixo?"

disse Herman. "Vocês sobem alipara vere não vão ternadaparaolhar. Não basta saberem queestão fazendo suaparte?"

NoDiada Bandeira de 1949, exatamente quando Hermandisse, uÉisso! Fiquem assim agora!" umdos vermelhos abriumoabrecha-subiu voando quatro lances de degraus atéotelhado, inclinou-se e olhou demoradamente. Mesmo como '. " ,buraco quehavia deixado atrás de si,eramoavisão magnífica.',';A Bandeira Viva enchia a rua embaixo. Uma Bandeira pe.rfeita!,,';

."Osvermelhos tãobrilhantes! Elenão conseguia desviar osolhos. "Desça para cá! Precisamos demoa fotografia!" berrou

,Herman. "Corno estáaparecendo?" gritavam-lhe aspessoas.:>- ::::"Inacreditável! Não consigo descrevê-lo", disse ele. ;."', ,;,-,,~, r.

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,rnllo' é bom, embora ocasionalmente possa ter conseqüências;; dteís, Embora preserve a comunidade,ela impede o progresso.

:i"" ff,yamos supor que descobrimos que dada norma deixa a todosem situação melhor do que estariam sem ela. Ainda falta umgrande passo até a conclusão de que a norma existe porque fazcom que todos fiquem em situação melhor. A não ser que espe­cifiquemos o mecanismo pelo qual os benefícios não-intencio­nais do comportamentoguiado por normas sustêm a norma, essavisão é uma afirmação gratuita. A seleção natural poderia expli­car as normasde cooperação, embora não nos ajude a compreen­der porque elas variam tanto, entre as sociedades e assumem tan­tas formas diferentes: altruísmo, dever, eqüidade. De outraforma, não vejo quaisquer candidatos plausíveis para o mecanis­mo pelo qual as conseqüências benéficas das normas as mantêmno lugar. infelizmente,'não posso propor qualquer outra explica­ção de normas, também. As normas, no meu entender, resultamde propensões psicológicas sobre as quais sabemos pouco. Em­bora eu pudesse contar uma hist6ria ou duas sobre como as nor­mas poderiam ter -ernergido,? nada tenho a dizer sobre comorealmenteemergiram.

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Interação

,J~dassím.todos.tinhamquedar uma olhada.v'Não!" disseeríiWí~'rnãs'eles fizeram umavotação ea coisafoi unânime.

~~iJ~~p~~r uni,Os Íne~bros ~ BandeiraYiva ~ubiram parao teto e'.,',.;, "~:adminiraril-na. Era maravilhosal.Trazla lãgrimas aosolhos, ,

:>~r~~:1~ fazi(â ~ente ref1et~ sobreestegrande p~s e no lugarde Lake'j7,:':íf~"Wobegon em tudoISSO. As pessoas quenam ficarali paradas.. Ct;: durante toda a tardee simplesmente absorvera visão. Assim,

l',' 'quando a primeira hora se passoue apenàs quarenta dos;'l, quinhentos haviam estadono alto,os outrosficaram maise mais

. inquietos. "Depressa! Parede embromar! Voc2 já viu!Desçaparacãe dê umachance paraalguém mais!"Hennanmandavaas pessoas subirem em grupos de quatro; e depois dez, mas após

r.j). duashorasa Bandeira Vivatomou-se a Bandeira Sentadae:~, ." depois começou a erodir, àmedida que os membros que haviam« dadouma olhada pensavam em dirigir-se paracasaparao jantar,.;f:ú.o,que enfureceu os que aindanãohaviamsubido. "Dezminutos

··'j,.;;:;.ma!s.I'l' gritou Herman, masdez minutos Se transfonnacam em·;;fi;:.V,4t!~ e, trinta, e as pessoas escapuliam e. a Bandeira que ficou~~"~ .para o último a ir vê-laerawna Bandeiraperfurada por fogode'; canhão. . ' . . .

y, '. Em 1950os Sonsof Knute assumiram o Diada Bandeira..,; Herman deu-lhes as caixasde bonés.Desdeentãoos Knutes

conseguiram várias Bandeiras boas,emborana maiorpartedosanoso comparecimento tenhasidopobre. Vocêprecisade aomenosquatrocentos parafazeruma boa.Emalguns anos,os

. ,Knutes estabeleciam umaregrade "não olhar",em outrosanosorganizavam um sorteio. Umanoexperimentaram com umgrandeespelho segurado por doishomens paraforada beirado

. telhado, masquando as pessoas inclinaram as cabeças para trás eolharamparacima,a Bandeira desapareceu, naturalmente.

. ~ Os:,Yt'~begoniM.os enfrentam um problema de ação coletiva,mesmo que. incomum. Cada um é tentado a subir para o teto ou,

',.: " :<na~x~riência,posterior, olhar para o espelho. 'Mas se todos fize­);'('J~Í'eni issô;a Bandeira se desfaz e não há nada para seolhar.' Para·'·L", 4t(re~oIXêt·(rproblemã,· eles recorrem a técnicas clássicas de. coor-

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Ação coletiva ,

denação: impor uma .regra de ."não .olhar", .i~~~~::túfisorteios. A.' primeira não é muito sa~isfatória: urrí~'(~~z~g~,pouco sentido em formar uma Bandeira que ninguém Pôdê\ver;As outras asseguram que algumas pessoas observem, niaS~\não,

t.antas que não fique nada para observar. Exigem, entretantó';~t-~;?"coordenação centralizada, apoiada por sanções ou ao menos pela"autoridade. Neste capítulo discuto as soluções descentralizadaspara o problema da ação coletiva, reservando as soluções centra­lizadas para o capítulo xv.

Vamos definir uma ação coletiva um pouco mais cuidadosa­mente. Suponhamos que cada membro de um grupo tenha a es­colha entre empenhar-se numa certa atividade e não empenhar­se na mesma. O grupo tem um problema de ação coletiva se for.melhor para todos se alguns o fizerem do que se ninguém o fi­zer, mas melhor para cada um não fazê-Io.! Pode ser ou não me­lhor para todos se todos o fizerem do que se ninguém o fizer. Eque todos o façam pode ser ou não o melhor. Cooperar é agircontra o próprio auto-interesse de um modo que beneficie a to­dos se alguns, ou possivelmente todos, agirem daquela forma.

No mais conhecido problema de ação coletiva é melhor paratodos se todos cooperarem. Esta é uma extensão do Dilema doPrisioneiro, generalizado a partir de duas pessoas para grupos dequalquer tamanho. Na vida social.há inumeráveis exemplos des­sa perversa tendência de a racionalidade individual gerar o de­sastre coletivo. Aqui estão alguns exemplos, para suplementaraqueles citados no capítulo x.4 É melhor para todos os traba­lhadores se todos fizerem greve por salários mais altos doque seninguém o fizer, mas cada trabalhador se sairá melhor peJma-

2 Deus podia vê-la, é claro. Nascatedrais medievais muitoscapltéls mara~ilho.sos estão tão altoque ninguém pode veros detalhes sem binóculos, que não ha­viam sido inventados quando elas foram construídas. Mas uma vez que Deuspodia vê-los, isso não importava. Os wobegonianos não parecem ter tido omesmofervorreligioso.

3 Aqui "melhor" significa melhorpela visão puramente auto-interessada. "Me­lhorpara todos"é umafraseambígua, comoficaráclaromaisadiante.

4 A contrafinalidade está estreitamente ligadaaoproblema da açãocoletiva.

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Interação

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5 Hã duas maneiras pelas quais os cooperadores adicionais beneficiam os outros.'Podem aumentar seja a quantidade do bem posto em disponibilidade, seja aprobabilidade de que o mesmo seja tomadodisponfveI. Quando mais e maispessoas usam o ônibus para ir ao trabalho em vez de irem em seusprõpríos car­ros, o congestionamento diminui consideravelmente e todos ganham tempo.Quando mais e mais pessoas se juntam auma campanha para manter aberta aescola local. as chances de que isso seja conseguido ficám muito melhores.Ambos os casos são cobertos se pensarmos nos beneficios cornobeneflcíos es-perados. - ..' '. '''';' .. :'--,': .,....-.'

153

Ação coletiva

são chamadas não-cooperadores. As duas linhas maisgróssasmostram como seus benefícios esperados variam com o númerode cooperadores.! O fato de que a não-cooperação é individual­mente racional, em termos de-beneficios egoístícos.jirnostradopelo fato de qua a linha mostrando a recompensa aos não-coope­radores está consistentemente acima da outra. Que é melhor paratodos se todos cooperarem do que ninguém é mostrado pelo fatode que B está acima de O. Como no Dilema do Prisioneiro deduas pessoas, o não-cooperador unilateral ou participante inde­pendente obtém o maior benefício C, enquanto que o pior resul­tado A é reservado para o cooperador unilateral. Se há ao menosD cooperadores, eles farão melhor por si mesmos do que se nin­guém cooperar. A linha fina mostra como o benefício médiopara todos os membros do grupo, cooperadores e não-coopera­'dores, varia com o número de cooperadores. Por definição, eladeve começar em O e terminar em B.

A distância entre as duas curvas representa o custo (por coo­perador) da cooperação. Na figura o custo não varia com o nú­mero de cooperadores, mas este é um caso um tanto atípico. Ocusto da cooperação pode aumentar à medida que mais pessoascooperarem. À medida que mais pessoas se juntam a campa­nhas de rádio que' pedem ligações telefônicas, as linhas ficamcongestionadas e leva mais tempo para conseguir completá-Ias.O custo também pode decrescer: à medida que mais pessoasaderem a um movimento revolucionário, asforças do governodevem distribuir-se mais esparsamente. .

Esses dois casos são mostrados na Fig. XIII.2, nos diagramasAeB; respectivamente, No caso A, o custo da cooperação aurnen-.

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necendo no emprego. Se os outros fizerem greve, ele colherá obenefício do esforço deles sem pagar o preço, e seeles não o fi­zerem, ele não poderá fazer nada por si mesmo. E melhor paratodas as empresas de um ramo; ou todos os membros da OPEP,se todos se fixarem numa cota de produção ou num preço de car­tel do que se todos se comportarem competitivamente, mas cadaum tiver um incentivo pare sair fora. É melhor para todos os quevão diariamente à cidade se todos forem de ônibus do que se to­dos forem de carro, mas para cada um é sempre melhor ir de car­ro. E melhor para todos se ninguém jogar lixo no parque, mas osIndivíduos não têm incentivo para abster-se de jogar.lixo,É me­lhor para todas as empresas se todas investirem em pesquisa edesenvolvimento, mas na ausência de um sistema de patentespode ser melhor para cada empresa emprestar das oputras, Vo­tar, declarar sua renda corretamente, formar lobby para manteraberta a escola local, manter estações de rádio públicas e juntar­se aum movimento revolucionário conformam-se a um mesmopadrão.

A Figura XIII.l mostra o caso mais simples do Dilema do Pri­sioneiro para muitas pessoas. Aqui as pessoas que fazem o que émelhor se todos o fizerem são chamadas cooperadores; as outras

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Figura XIII.3

Ação coletiva

zemmuita coisa, mas quando quase todo mundo aderiu, faz pou­ca diferença se os poucos que não estãocomprometidos tambémo fizeram. Às vezes a unanimidade é importante: uma' única fir­ma que venda mais barato que um cartel pode monopolizar' omercado se. tiver capacidade produtiva suficiente. Geralmente,entretanto, alguns poucos aventureiros independentes não elimi-narão os benefícios. . . . . .

A" Figura XIIl.3 mostra esse caso, supondo que os custos deoperação sejam constantes. Ambos os fenômenos ilustrados nosdiagramas A e B da Fig. XIII.2 são observados. Com respeito aobenefício médio, os cooperadores à esquerda de m causam maismal do que bem, assim como os à direita de n. Ora, essa frase éum tanto enganadora. Quando os cooperadores fazem mais maldo que bem, é por que o mal que fazem a si mesmos, através docusto de cooperar, excede o bem que fazem a todos os outros (ea si mesmos); Eles não prejudicam outras pessoas efetivamente.A Figura XIII.4 ilustra casos nos quais atos de cooperação são po­sitivamente prejudiciais., No caso A, atos unilaterais de cooperação causam danos a to­

dos. Como foi mencionado no capítulo VI, o desarmamento' uni-

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Interação

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6 As expressões "primeiro", "meio"e "último"podem referir-se aos tempos emquecooperadores sucessivos se juntam(comona organização de um movlmen­

.to revolucionário). Mas também podem referir-se a atos simultâneos de coope­ração (como em votações). No último caso, expressam uma comparação deduassituações. Dizerque os últimos votantes acrescentam muitopoucoé dizerque o beneficio criadonumasituação em que todos votam é quaseque inteira-

--:. mente igualao beneficio criadoquando quase todosvotam,

154

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ta tão rapidamente que, à medida que mais e mais se juntam, ocusto excede não apenas o beneficio.ao cooperador,mas a somatotal dos beneficios de todos. Isso é mostrado pelo fato de que a

.curva de benefício médio alcança seu ponto mais alto quandocercade metade dos indivíduos coopera. No caso R, o custo dacooperação é muito alto quando há poucos cooperadores. Os pri­meiros cooperadores, na verdade, tomam a situação pior.

As Figs. XIII.! e XIII.2 sãó atípicas pelo fato de que os benefí­cios da cooperação são mostrados Comoconstantes. Cada coope­rador adicional acrescenta a mesma quantidade ao bem-estar detodos. Na realidade, a situação típica é.que o primeiro e o ültímocontribuintes acrescentam pouco, enquanto que os que chegamno meio são mais éficezes.s Uns poucos revolucionários não fa-

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7 Como no diagramaA da Fig. XIII.2. na Fig. XlII.3 e em todos os três diagramasda Fig. XI1I.4. . > •• " ... :L. "

Ação coletiva

Quando a cooperação universal for indesejável,? uma soluçãodeve definir quem deve cooperar e quem não. As soluções po­dem ser centralizadas ou descentralizadas, dependendo de reque­rerem indução e força externamente impostas. Soluções descen- 'tralizadas são mais básicas que as centralizadas, uma vez queassegurar a concordância com uma instituição central é em simesmo um problema de ação coletiva (capítulo xv). Quando,entretanto, a cooperação universal é indesejável, é difícil deter­minar por meio de uma solução descentralizada quem vai coo­perar e quem não vai. Nesses casos, os mecanismos descentra­lizados podem render cooperação demasiada ou insuficiente.Como em Lake Wobegon, uma solução centralizada pode sernecessária. Isso sugere um processo em dois passos: a ação co­letiva descentralizada com participação universal estabelece umainstituição central com capacidade para forçar a participação se­letiva. A relação entre greves e sindicatos é um bom exemplo.Antes que os trabalhadores estivessem organizados não era pos­sível dirigir só alguns para a greve: era todos ou nenhum.

As soluções descentralizadas podem ocorrer por uma varieda­de de motivações individuais: auto-interesse, altruísmo, norniassociais ou alguma combinação dos mesmos. Há dois equívocos aserem evitados ao tentar explicar o comportamento cooperativo.O mais cru é acreditar que exista uma motivação privilegiada-'auto-interesse, por exemplo - que explique todas as instânciasda cooperação. Um erro mais sutil é acreditar que cada instânciada cooperação pode ser explicada por uma motivação. Na reali­dade, a cooperação ocorre quando e porque diferentes motiva-ções se reforçam entre si. '

O auto-interesse poderia parecer uma motivação improvável,uma vez que o problema de ação coletiva é definido em parte,pela cláusula de que não é egoisticamente racional cooperar. E,num problema isolado isso é efetivamente verdadeiro. Quandoas mesmas pessoas enfrentam problemas de.ação coletiva vezes

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Interação

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lateral ilustra essa possibilidade. Atos individuais derebelíão po­dem criar'um pretexto para que as autoridades caiam não apenassobre os rebeldes, mas também sobre os circunstantes. No casoB, os últimos cooperadores desfazem parcialmente. o trabalhodos anteriores. No capítulo IV dei o exemplo da limpeza apósuma festa, Ou suponhamos que em tempo de guerra todos insis­tam em entrar para o exército, de modo que não fique ninguémtrabalhando nas indústrias que são vitais para o esforço de guer­ra. No caso C, é pior se todos cooperarem do que se ninguém ofizer. Podemos imaginar que após uma festa haja uma grandequantidade de lixo no gramado, e que todos se precipitem pararecolhê-lo, pisoteando o gramado no processo. Embora não sejaum Dilema do Prisioneiro para muitas pessoas, é um problemade.ação coletiva tal como a defini.

Os problemas de ação coletiva surgem porque é difícil conse­guir queas pessoas cooperem para seu benefício mútuo. "Resol­ver'voproblema é atingir a cooperação mutuamente benéfica.

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AÇã,l} coletiva

guntadas por que cooperam, provavelmente responderiam. quefazem assim porque outros cooperaram no passado, mas isso émais reflexo de uma norma de eqüidade do que um mecanismode reação num equilíbrio auto-interessado.

. Acredito, por isso, que a maior parte da cooperação é devida a"motivações não-egoísticas de uma espécie ou de outra. Tipica­mente, várias motivações coexistem e reforçam umas às outras. .Para ilustrar essa proposição, voltemos ao que acredito ser ocaso típico de ação coletiva, ilustrado pela Fig. XIII.3, e suponha­mos que os indivíduos tenham as várias motivações não-egoísti­cas discutidas no capítulo VI. Alguns são kantianos: querem fa­zer aquilo que seria melhor se todos o fizessem. Alguns sãoutilitaristas: querem promover o bem: comum. Alguns sãomotivados pela norma daeqüidade: elesnão querem andar decarona na cooperação dos outros, mas também não querem coo­perar quando poucos outros o fazem. Nunca há muitoskantia­nos, mas suponhamos que seu número sejam. Enquanto o núme­ro de outros cooperadores esteja entre m e n, um utilitaristatambém desejaria cooperar, uma vez que nesse intervalo cadaato adicional de cooperação aumentaria o benefício médio. Os­kantianos poderiam agir como gatilho ou catalisador para o com­portamento utilitarista, e os utilitaristas como multiplicador paraos kantianos.

Os utilitaristas poderiam agir eles próprios como catalisadorpara pessoas que são motivadas pela norma da eqüidade. Paracada um dos últimos, há certo número de 'outros cooperadoresque serão induzidos à cooperação. Alguns são facilmente induzi­dos à cooperação pela vergonha, enquanto outros se aproximamapenas quando quase todos já aderiram. Para alguns, a soma to­ta! de kantianos e utilitaristas pode ser suficiente. Para outros, asoma total dos kantianos, utilitaristas e aqueles que foram indu­zidos pela soma total de kantianos e utilitaristas pode ser sufi­ciente. E assim por diante. Dependendo da constelação de moti­vações;a:reação em. cadeia pode continuar em frente até 'acooperação universal ou parar antes dela. Como a norma daeqüidade é insensível a resultados não há nada para impedi-la de

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8. >Essascolocaçõessão aproximadas.mas podem ser tornadas precisas.9 . Em alguns, grupos pequenos, bastante unidos. isso pode ser realizado.A comu­

nidade dos banqueiros ocidentais aparentemente consegue manter uma frentekiUnida diante dospaíses devedores do Terceiro Mundo pela crença de que uma

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Interação

evezes repetidas-pode estar em seu auto-interesse cooperar, por. esperança de reciprocidade, medo de retaliação ou ambos. Em, interações repetidas, cada pessoa precisa escolher um mecanis­

;,U) de reação que lhe diga o que fazer em qualquer interaçãodada, em função do que ela e os outros fizeram em interaçõesprévias. Uma função de reação particularmente simples, "pagarna mesma moeda", diz às pessoas para começarem cooperandona primeira rodada e então. cooperar em qualquer rodada pos­terior se e apenas se todos os outros cooperaram na rodada pre­cedente. Se todos adotarem esse princípio, todos cooperarão emcada interação. Sob certas condições, a adoção universal de "pa­gar na mesma moeda" é um equilíbrio. Se outros o adotarem,ninguém pode fazer melhor que adotá-lo ele próprio. A adoçãouniversal do princípio "nunca cooperar" também é um equilí­brio, embora inferior.

As condições nas quais as pessoas cooperarão porauto-inte­resse são realmente rigorosas. Os indivíduos devem não ser mui­Tu míopes. Para serem movidos por retaliação e retribuição futu­ras, precisam importar-se com o futuro. Quando o fazem, oauto-interesse de longo prazo pode substituir a moralidade ou as

.normas sociais, supondo-se que algumas condições adicionaissejam satisfeitas. Os ganhos da cooperação universal devem sersubstanciais; o ganho da não-cooperação unilateral não dema­siadamente grande; e a perdada cooperação unilateral, peque­na.8 Finalmente, cada indivíduo deve estar realmente confiantede que os outros indivíduos são.racionais e plenamente informa­dos sobre a situação. Uma vez que não há estratégia dominante,ele não adotará "pagar na mesma moeda" a não ser que estejacerto de que outros farão isso também. Em grupos grandes, commuitas .pessoas que não conhecem umas àsoutras, esta últimacondição é de realização irnprovâvel.? Muitas pessoas, se per-

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continuar até o fim mesmo que fosse melhor para todos que nãoo fizesse. , .

Na vida real, ninguém age como utilitarista, mesmo se apenasporque é difícil imaginar a forma da curva dos benefícios mé­dios. Mas há evidência de que algumas pessoas têm o instintocaracteristicamente utilitário de cooperar mais quando outras fa­zem menos, e vice-versa.10 A norma de eqüidade, naturalmente,aponta numa direção exatamente oposta. O kantianismo por de­finição não é sensível ao que os outros fazem. Quase nada é co­nhecido sobre a distribuição dessas motivações na população e omodo pelo qual elas interagem para produzir cooperação descen-tralizada. '

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~~. Isso se aplica mesmoquando as decisões s110 tomadas simultaneamente. se es,:'• colhas simultâneas tiveremque ser feitas em muitasocasiões sucessivas; A de­,..1 cisão de votar ou nãoem dada eleição podedependerda afluênciaà últimaelei-'::hj)Ç~O. Assimpoderiamser gerados ciclospollticosdo tipo teiade aranha.. ' : c" ,':;..

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XIV

NEGOCIAÇÃO

EXISTEM dois tipos de cooperação. Em uni deles, faz sentidofalar sobre atos individuais de cooperação. No outro,a uni­

dade básica é um padrão cooperativo de comportamento - umconjunto de atos de cooperação, Remover o lixo do parque oupagar os próprios impostos são exemplos do primeiro. São atosque beneficiam outros, mesmo se ninguém mais cooperar.' ABandeira Viva ilustra o segundo. Se um único indivíduo saíssepara a rua com, digamos, um boné vermelho na cabeça, não be­

.neficiaria a ninguém. É preciso um número substancial de pes-soas para formar qualquer coisa que se pareça a um padrão debandeira. Isso é cooperação no sentido literal, cotidiano, que sig­nifica cooperar com outras pessoas - dando-lhes as mãos e ca­minhando lado a lado com elas. Ou consideremos a cooperaçãode trabalhàdorcs e capitalistas na produção. O trabalho sozinhoou o capital sozinho não produzirão qualquer valor. Para fazê-lo,devem interagir na produção. Os benefícios da divisão do traba­lho são mais um exemplo. Uma firma que se especialize na im­pressão de livros será improdutiva a não ser que haja outra firmaque se especialize em composição tipográfica. Neste' capítuloconsidero a cooperação nesse segundo sentido, interativo.'

A cooperação bem-sucedida nesse~e~Ud~~yquer,a solução de .dois problemas. Em geral, deve haver um mecanismo.para divi­dir os benefícios da cooperação. Em' casos onde a cooperaçãouniversal é sem sentido, c1êveh~v~rtampérri ur,h mecanismo paradecidir a quem deve ser peririitidô.:Yjajardê:~á.r.ona.Cada.proble­ma pode ser resolvido de modo descentralizado ou centralizado.

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xv

INSTITUIÇÕES SOCIAIS

175

Instituições sociais

tituições públicas incluem .o Congresso, a Comissão de Seguri­dade e Intercâmbio, a Suprema Corte e o Conselho de Educação.Suas sanções, apoiadas pelo .sistema de aplicação das leis, in­cluem subsídios, taxas, multas e prisão. As regras que vigoramincluem leis, decisões judiciais, decretos administrativos e or-

• dens executivas.As instituições nos afetam de muitas maneiras: forçando-nos

ou induzindo-nos a agir de certas maneiras; forçando-nos a fi­nanciar atividades pelas quais não pagaríamos de outro modo;capacitando-nos a fazer coisas que não poderíamos fazer de ou­tro modo; por tomar mais difícil para nós fazer coisas do que se­ria de outro modo; e mudando o contexto das negociações entrepartes privadas. Considerarei esses mecanismos nessa ordem.': .

Modificar o comportamento pelo uso da força é o aspectomais' notável das instituições. Aqui "força" signiflcaqualquer .ação designada a tomar uma prática indesejável mais caraparaaqueles que poderiam sentir-se tentados a empenhar-se nela'. Asinstituições públicas, particularmente, apóiam-se fortementenes­se modo de impor suas regras. Suponhamos que oestadoapliqueum imposto sobre bebidas para evitar que as pessoas bebam.Isso envolve dois tipos de força. O estado usa a força contra os'compradores de bebidas tomando o hábito de beber mais caro,mas também usa a força contra os vendedores, tornando maiscaro ou arriscado vender bebidas contrabandeadas. Se opropôsí­to do imposto é simplesmente gerar renda, apenas' o segundotipo de força está envolvido. A renda do estado,tipican1énte;'~

usada para financiar bens públicos que de' outro p100~ 'rião sé­riam produzidos,' tais como conheciméntocienttficô.;hásiéô6u,defesa nacional.' '. , . " <'; .•.: ,.', ',:, .;':

As instituições privadas também us~·foIÇ~.;,~:,nã?~~piu;ameaçando de expulsão. Uma associação de empregadorespode

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multar empresas-membros que violem suasinstruções sobre atéque ponto podem ir em concessões salariais, Uma firma. podepunir um empregado negligente negandO;'ltier:cátgos'~9'{:promo­ções, Uma igreja pode punir o divórcio récüsandô~se.'a:toinarparte em novos casamentos. A ameaça últimâ é.a'expulsão.de-

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174

A s instituições evitam que a sociedade se desmantele, desde.que haja algo para evitar que as. instituições se desmante­

lem. Por um lado, as instituições nos protegem contra as conse­qüências destrutivas da paixão e do auto-interesse, mas por outrolado, as próprias instituições correm o risco de ser minadas peloauto-interesse, a "ferrugem das sociedades", como o chamouTocqueville. Uma instituição apresenta como se fora duasfaces.Parece agir, escolher e decidir como se fora um grande indiví­duo, mas também é criada e formada por indivíduos. Cada facemerece atenção. Embora a última seja mais fundamental, come-ço com a primeira face, mais familiar. .

Para esse propósito, uma instituição pode ser definida comoum mecanismo de imposição de regras. As regras governam ocomportamento de um grupo bem definido de pessoas, por meiode sanções externas, formais. O contraste aqui implicado é comas normas sociais, que impõem regras por meio de sanções ex-:temas, infonnais,e com regras internalizadas. Um policial podemultar-me se eu jogar lixo no parque. Senão houver policial nas .imediações, outras pessoas podem olhar-me ferozmente. Se nãohouver outras-pessoas nas imediações, minha própria consciên­cia pode ser impedimento suficiente.

As instituições podem ser privadas ou públicas, dependendo .da natureza das sanções. As instituições privadas incluem em­presas, sindicatos, organizações religiosas e universidades. Aprincipal sanção à suadisposição é a expulsão do grupo. Para fa-

-zer as pessoas aderirem,. elas oferecem benefícios que variam.desde salários ou diplomas até a absolvição de pecados. As ins-

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Instituições sociais

obrigatório processar-me por danos se eu não o fizesse. É clara;mente uma boa coisa não haver instituições dessa espécie. Emais enigmático por que não existem meios instituicionais paraaperfeiçoar o autocontrole. Se desejo deixar de fumar, poderiadar boas vindas à oportunidade de assumir. um compromisso"Obrigatório de pagar mil dólares para uma obra beneficente nocaso de voltar a fumar.

As leis do casamento são capacitadoras: sem elas não seriapossível estabelecer com outra pessoa um compromisso verossí­mil por toda a vida. As leis do divórcio, que são o outro lado damoeda, são restritivas: elas tomam difícil desfazer o compromis­so. Elas não forçam as pessoas a permanecer casadas, mas criamum contrapeso a desejos impulsivos de romper. As mais impor­tantes instituições desse tipo são as constituições. As partes deuma constituição que tornam mais difícil mudar a constituiçãodo que promulgar legislação ordinária são análogas às leis do di-.võrcio, Não são destinadas a criar uma estrutura perene.I mas aforçar as pessoas a pensar duas vezes antes de mudá-la. Por serrestritiva, uma constituição também é capacitadora, Sem garan­tias constitucionais contra o confisco de propriedades, por e­xemplo, o planejamento econômico de longo prazo por indi­víduos seria impossível,

Finalmente, as instituições podem afetar o comportamento al­terando o contexto das negociações para os individuccrNo capí­tulo precedente eu disse que uma vez que o resultado da nego­ciação é determinado em grande parte pelo conjunto de acordosexeqüíveis e pelo resultado da discordância, as partes têm um in­centivo para agir estrategicamente sobre esses elementos da situ­ação. Partes externas, tais como o 'estado, também podem querermodificar a situação, em favor da eficiência ou por propósitos de,distribuição (como é discutido mais adiante). O resultado da ne­gociação coletiva é afetado por limites legalmente impostos lijornada de trabalho" e por leis que exijam ou permitam arbi-

3 Como dizem os especialistas em leis. a constltulçãonão é um pactode suicídio.4 Se o poder de barganha é afetado pelo melhor resultado que as partes podem

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missão ou excomunhão, mas usualmente a instituição tem umespectro mais amplo de sanções. " ';.:

. Enquanto a força pretende tomar. o comportamento indese­jável mais dispendioso, a indução funciona tomando um com­portamento desejável menos dispendioso. O estado oferece isen­ções de impostos para investimentos ou doações beneficentes.!Subsidia firmas em regiões periféricas ou universidades queaceitam alunos de grupos minoritários. Em alguns países ajudaos fazendeiros a cultivarem a terra, em outros a não a cultiva­rem. Com freqüência há uma escolha entre a força e a indução.Nas sociedades modernas, votar c$ geralmente voluntário, às ve­zes compulsório, mas nunca '(ao que eu saiba) induzido por re­compensas. Na Atenas clássica, por contraste, os cidadãos erampagos para comparecer à assembléia. Os trabalhadores podemser forçados a aderir ao sindicato se este tiver um controle sobreo emprego, ou induzidos por esquemas de pensão ou seguro fa-voráveis. .

Algumas instituições são estabelecidas mais para capacitar aspessoas a fazer certas coisas do que para detê-las ou induzi-las.As leis contratuais servem o propósito de capacitar as pessoas afazer acordos com compromissos que de outra forma não mere­ceriam crédito.ê Sem contratos garantidos" a interação eo pla­nejamento de longo prazo se apoiariam nas frágeis bases da ho­nestidade e de ameaças verossímeis. E interessante que não hajainstituições que ajudem as pessoas a assumir compromissos ve­rossímeis de causar dano a si próprias ou a outras pessoas. Aameaça de matar-me a não ser que as coisas sejam feitas a meumodo poderia ser tomada verossímil se houvesse uma instituiçãoà qual fosse legalmente permitido e obrigatório matar-me se eunão o fizesse. A ameaça de retirar o meu negócio da firma a nãoser que eu obtenha um desconto poderia ser tomada merecedorade crédito se houvesse uma instituição à qual fosse permitido e

Indiretamente. as induções pressupõem força, uma vez que a instituição podeser punidase deixarde entregara recompensa.

2 Essa função capacitadora também se apóia na força, uma vez qu.e os contratos. são garantidoslegalmente.

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-Interação

renda denâo-fazendelros

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tragern obrigatória .no caso de as partes não alcançarem acordo.A abolição da prisão para devedores teve enorme impacto sobreos contratos privados, assim como o enfraquecimento do prin-cípio de caução ao comprador.. ' '

Quando as instituições afetam o bem ..estar das pessoas, po-, dem deixar todos em melhor situação, deixar alguns em melhor

situação à custa de outros ou deixar todos em situação pior. Con­sideremos um imposto sobre atividades não-agrícolas para subsi­diar fazendeiros. Inicialmente, a distribuição da renda está em Ana Fig. XV.L

Um imposto percentual sobre a renda das atividades não-agrí­colas geralmente levará a uma perda na renda total, uma vez queaqueles que são taxados tenderão a trabalhar menos.s Como to-

obter, conforme'discutido no capítulo precedente, isso se mantém verdadeiro.mesmo se uma negociação sem restrições tivesse condúzidoa uma jornada detrabalhomaiacurta que o limite legalmenteimposto.

S , Isso-pode parecer óbvio, mas não é, e na realidade pode ser falso. Quando a··...i.renda é taxada,'as pessoas podem trabalharmaispara mantero padrãode vida anlrJquese acostumaram: Mas usualmenteesse efeito é dominadopela tendência a

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dos os pontos da.linha EF representamdistribuições .de rendaque somamo rnesmototal.r-a.dlstríbuíção após transferênciadeve estar em algum ponto Cabaixo dessa linha..Em Cós fazen­'deiros ganham pouco relativamente-a A;'enquanto que os não-fa­zendeiros perdem bastante.Poderiamesmo acontecer que a que-

• bra de renda dos não-fazendeiros -diminuara demanda, porprodutos agrícolas ao ponto .d~ mesmo' os fazendeiros termina­rem por perder, sendo então D á distribuição finaI.Cada.um.dosresultados, especialmente o último, poderia facilmente .levar ,apressão política para abolir o imposto e reverter à situaçãoA.Su,ponhamos, entretanto, que alguém invente uma fonn{i:imeligen!~de recolhimento de impostos.quepossa chegar 1\re~lizllJ;'iJraI\~fe7rências sem perda.de produção.s Tal desenvolvimento pgd.eri~

levar a um movimento de C para B! Se 9 dispcsitivoJi;yess,é' ~i<J<>pensado no início, o movimento poderia ter .sido ~ire~aI1l:e.n_tc::,4~

A para B. ',,' , , ", '. " .', "''i'' """""'<,.h."'·":,,, ,,'"Como nesse exemplo, as instituições podem:pro<i~zk<?~~~9;#~

pos de efeitos. Algumas ações institucionais são pupíméÍlte~çfi~

cientes: fazem com que todos fiquem melhor, .como rio' 'fiiovi;·mentode C para B, ou de D para A.? Alguns são puramenteredistributivos: transferem renda sem qualquer desperdício,como no movimento de A para B. Outras ações alcançam 'a re­distribuição ao custo de certo desperdício, como no movimentode A para C. Outros ainda 'alcançam a efíciênciaê com prejuízo

preferiro lazerao trabalhoquandoo trabalhose toma menosremuneratívo, "6 Em teoria. isso pode ser alcançadoatravés de "taxação sobreo rendimento bru­

to", na qual é atribuído às pessoas um impostoque é independente de quantotrabalham e ganham. Sob esse esquema, elas não têm motivos para trabalharmenos, uma vez que retêma renda totalde cada hora adicionalde trabalho..

7 Há duas noções deeficlênela que são facilmente confundidas. Mudanças quedeixam todos em melhorsuituaçãosão chamadas melhoramentos Pareto, lem­brando o economista italiano Paréto, Um estado em queninguém pode ficarmelhor sem que alguémfique pior é chamadoParetoótimo. Um melhoramentoPareto pode ser um movimento para um estado Pareto ótimo, mas não precisa

, sê-lo se houverespaçopara ulteriormelhoramento Pareto. Um movimento para.o estado Pareto ótimo pode ser um melhoramento Pareto,'mas. não precisasê-lose alguémsair pior, como no movimento de C paraA. ,". c': ' , . ',' .

8 Istoé, a otimizaçãoPareto, .: '

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Instituições sociais

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benetrclo por não-cooperadorcom pequena multa

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10 Adicionalmente, há um grande número de equilíbrios.nos quaisexatamente k .pessoas cooperam. Eles sãoaltamente instáveis, entretanto. Se umapessoaadi­cionalcooperar, todas as outras o farão, umavez que cooperadores agora fun­cionammelhor que não-cooperadores. Se umapessoa deixade cooperar, todosos outrosdeixarão de fazê-lo, umavezqueagoraos cooperadores se saempior.

colheita. Para superar' a propensão dos cidadãos a pegar carona,o estado pode forçâ-los a pagar impostos e usar a renda para pro­duzir bens públicos. Alternativamente, pode forçá-los ouinduzi­los a agir cooperativamente, como quando empresas são multa­das por poluir ou inventores recebem pensão do estado.

O problema de ação coletiva na Fig. XV.2, caracterizado porbenefícios constantes e custos decrescentes de cooperação, mos­tra como variados graus de força poderiam fazer as pessoas COO~ .

perarem. Se uma grande multa é imposta por comportamentonão-cooperativo, .os cooperadores sempre se sairão 'melhor queos não-cooperadores. A cooperação é unia estrãtégia. dominante.Com uma pequena multa, tanto a cooperação universal como anão-cooperação universal são equilíbrios. lO A cooperação seráalcançada apenas se as pessoas estiverem bem informadas, de'

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9 . Naturalmente, esse movimento alcança a redistribuição a favordosnão-fazen­deiros, umefeitoque bem poderiaser a motivação real por trás da abolição deimpostos mesmo queo motivooficial sejao ganhode eficiência.

, Interação

do objetivo redistributivo, como no movimento de C para A.9 E.alguns, finalmente, são puramente destrutivos, deixando todosem situação pior, como no movimento de A para D.

Esses efeitos podem ser intencionais ou não-intencionais.Com freqüência -o efeito esperado é alcançar a redistribuição,com o desperdício como efeito colateral não-intencional. Ou oobjetivo é alcançar eflciêncía, e então apresenta efeitos redis­tributivos indesejáveis. As vezes o objetivo é frustrado porque ainstituição não antecipa os efeitos de segunda e terceira ordemde suas ações, como é ilustrado pela falha em antecipar a quedade demanda provocada por um novo imposto. Quando a legis­lação sobre custódia dos filhos mudou de uma regra de pressu­posição a favor da mãe para a regra de que a custódia deveria se­guir os melhores interesses da criança, os legisladores nãoanteciparam que a nova lei iria privar as mulheres de um trunfoque poderiam usar na negociação de um acordo financeiro. Ou ainstituição podia não antecipar que os indivíduos se adaptam es­trategicamente às suasações, como ria falha em antecipar a que­bra na produção causada por um novo imposto. Outro exemploda crença ingênua de que indivíduos regulados por uma lei irãocontinuar a comportar-se como se não fossem regulados foimencionado no capítulo I. Se o estado toma obrigatório para em­pregadores dar estabilidade a pessoas que estiveram empregadaspor dois anos, muitas pessoas serão demitidas após dezoito me­ses. O resultado 'final poderia ser menos segurança no trabalhoem vez de mais.

As instituições podem deixar todos em situação melhor resol­vendo problemas de ação coletiva. Um sindicato pode induzir ostrabalhadores a aderir eseguir ordens de greve oferecendo bene­fícios especiais a seus membros. Um partido revolucionário po­de forçar o campesinato a aderir ameaçando-o de violência, ouinduzi-lo oferecendo programas educacionais ou ajuda com a

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negociantes trabalhadores profissionais,

campo de golfeorquestrapiscina coberta

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:.1Suponhamos que a votação, majoritária seja tomada como I!

uma expressão da vontade popular ou do interesse da comunida-'de. Então a vontade, popular é que é melhor ter um campo degolfe do que subsidiar a orquestra, uma vez que os negociantes ~

os trabalhadores juntos formam uma maioria com essa preferên-da. Similarmente, a vontade popular é que subsidiar a orquestraé melhor que construir uma piscina, pois os negociantes e osprofissionais juntos formam uma maioria com essa preferência.Mas a vontade popular também apóia a piscina acima do campode golfe, desde que os traba-lhadores e profissionais juntos têmtal preferência. E isso pode significar apenas que a noção devontade popular é incoerente, ou que a própria vontade popular éincoerente, como se preferir. Se um.indivíduo disser que prefere,sorvete de baunilha ao de chocolate, de chocolate ao de morangoe de morango ao de baunilha, iríamos pensar que ele não com-preende o que significa preferir alguma coisa ou que ele sim- •plesmente está embananado e confuso. Certamente não tomarí-amos sua declaração como expressão do que ele realmente quereE nem devemos tomar as preferência cíclicas da maioria-comouma expressão do que a comunidade realmente quer. '",

,No caso individual, entretanto, geralmente há alguma coisaque uma pessoa realmente quer, embora possa ter alguma. difi;:' .». ,culdade em escolher, Poderíamos afirmar o mesmo da comu-, "nidade? Umalinhade argumentação é que a disi::ussãoracio~~:>.,;:

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Instituições sociais

ximadamente igual, .representando a comunidade .dos.negõcíos,os trabalhadores industriais e os profissionais dos:ser:yiços:éle. 'saúde e social. Vamos supor também que, conformeo estereõtí-.po desses grupos, eles classificam as oções como segue:,L,',' , , 'o

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II Na realidade. é claro que nenhuma representação é perfeita. porque os rnem­: bros do eleitorado-têm 'interesses dlvergelltes.A escolha de uma pessoa pararepresentar os interesses de umaparte'CIO' eleitorado cria, exatamente osmesmos-problemas queos discutidos maisadiante no texto. ,""

{~h1.jiiiK~ , "~Ji.~J~~qii~~s~~m"cõnW·-êiilrS'~Cooperação umas'das outras.

lf;,rt{h~Ê;';:-.Um.ajj;~i;~lciiliçada,seriaes~ contra desertores, mas poderia.'f~<i:ir,;/,,: 'ser díãcildealcànçar, Simil~1uma grande indução toma­':~:'<_ ;/' ,ria'a cooperação uma -estraté~ dominante, enquanto que uma

indução pequena criaria um c:qttílibrio cooperativo e um não-cooperativo.' ,

Estive' dizendo que as instiiWções "fazem" ou "pretendem", isso ou aquilo, mas falando e1Uitamente, isso é bobagem. Ape­nas indivíduos podem agir e praender. Se pensarmos em insti­tuições como indivíduos em gl"wxie escala e esquecermos que asinstituições são compostas de :n.divíduos com interesses diver­gentes, podemos ficar irremediavelmente perdidos. As noções,particularmente, de "vontade JX'PUlar", o "interesse nacional" eo "planejamento social" devem JUa existência a essa confusão.

, Uma instituição pode ser dídgida em linhas ditatoriais ou de­mocráticaso No primeiro caso, a instituição tem uma "vontade" eum "interesse", embora, como veremos, possa não ser fácil exe­cutá-los. No outro caso, mais, ínteressante, não é claro como avontade ou o interesse da instítuíção devem ser definidos, Consi­deremos uma assembléia em que cada membro é um repre­sentante perfeito dos interesses de seu eleitorado,'! e suponha­mos que tenham que decidir entre três propostas. Pensemos,especificamente, numa câmara municipal que deve escolher en­treconstruir uma piscina coberta, subsidiar a orquestra sinfônicalocal ou criar um campo de golfe. Ora, se há uma alternativa quetodos acreditem a melhor, a escvlha dessa opção pode plausível­I:?ente ser cham~uma expressão da vontade popular. Em polí-tica, entretanto, a unanimidade 6 a exceção.' ,,". Poderia parecer que quando há um conflito de interesses, o

y?to majoritário expressará ou efetivamente constituirá a vonta­de popular. Mas essa proposição não tem consistência. Supo­nhamos que há três blocos nn assembléia, de tamanho apro-

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ntre\ri1~mbros da câmara pode .superar o conflito de interesses,ie~Dlod():que-todos terminem por ver que uma reivindicação estát ~ }.,' " . ,

rtais bemfundamentada que as outras. Ora, algo como isso pode:r;;::;iér,.verdade às vezes, mas não sempre. O tempo com freqüência

"/';''':(curto e as decisões devem ser tomadas antes que o acordo seja. alcançado; e às vezes o acordo não seria alcançado mesmo que a

discussão continuasse pará sempre. Se as pessoas têm idéias di­ferentes sobre o que gostariam de fazer em seu tempo de lazer,nenhuma quantidade de discussão irá persuadi-las de que a mú­sica é inerentemente mais valiosa que os esportes.

Outra linha de argumentação poderia parecer mais promisso­ra, ou seja, que o voto majoritário é falho porque negligencia aintensidade das preferências. Se os amantes da música têm pre­ferências muito fortes, enquanto os outros não se importam mui­to com uma coisa ou outra, parece que subsidiar a orquestra é aescolha acertada. Se pudéssemos medir e comparar os níveis de-bem-estar de diferentes pessoas, poderíamos decidir que a vonta­de 'popular reside na alternativa que melhora o bem-estar total dacomunidade em maior escala. Essa proposta logo se depara comprofundas complicações filosóficas, que não precisam preocu­par-nos aqui, pois isso de qualquer modo é totalmente imprati­cável. Não existe nenhum procedimento confiável para medir aintensidade das preferências, mesmo se apenas porque as pes­soas poderiam achar ser de seu interesse representá-las falsa­mente.'', Um indivíduo geralmente sabe o que quer; argumentei que

. uma sociedade não sabe. Um indivíduo geralmente pode fazer oque decidiu fazer; argumentarei que a sociedade não pode. Parao indivíduo não há brecha entre a decisão e a execução, exceto afraqueza de vontade e a incapacidade física. O mecanismo detransmissão entre o cérebro e a mão não tem vontade ou inte­resse próprios para opor-se à ordem do cérebro. Uma instituição,por contraste, deve depender de indivíduos com interesses pró­

.prios.As .decisões institucionais são facilmente defletidas e dis-\ ..:to~ldas'por comportamento em benefício próprio dos agentes

quedevemexecutá-las. A forma mais visível e viciosa de opor--"~~'" .

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- Instituições sociais

tunismo é a corrupção. Os de fora podem subornar funcionáriospara moldarem as regras ou violarem as regras em seu favor. Seos agentes buscam o poder antes que a riqueza, podem procurarinflar a máquina burocrática e aumentar sua equipe além do queé necessário para a tarefa. Às vezes eles agem por sua concepção

•privada do interesse da instituição, desprezando ordens de cima.Para fazer frente a essas -tendências, pode-se colocar a con­

fiança no desenho institucional. Os administradores com fre­qüência são recompensados com bônus em ações para assegurarque seus interesses privados coincidam com os da firma. Os ob­jetivos institucionais podem ser formulados para reduzir o esco­po da fraude e da corrupção, como quando são cobrados impos­tos sobre a terra e não sobre a produção. Às vezes jurados, juízese funcionários públicos são escolhidos ao acasovdernodo qUeseja mais difícil suborná-los. Alguns funcionários públíccs ..sãoeleitos e não nomeados, de modo que sejam maislesp~)J'~sáqili.zá~veis por suas ações. Os impérios chineses adotavama prãtica ~arotação de funcionários para evitar que se familiari.zaSseirúIema-:­siadamente com a nobreza local. Pode haver recompensas p'à(aindivíduos que denunciem práticas corruptas.. Uma instituiçãopode vigiar outra, c mesmo apanhá-Ia por tentativa de corrupção.

Essas soluções tendem a criar seus próprios problemas. A ro­tação, eleição e escolha aleatória de funcionários trabalham con­tra a estabilidade e a eficiência. Se o objetivo das instituições épromover a eficiência, não faz sentido atar as mãos de funcioná­rios para evitar que aceitem subornos. Os métodos de recolhi­mento de impsotos que são menos vulneráveis à corrupção po­dem não trazer muita renda. Se uma instituição deve vigiar aoutra, devemos perguntar: -quem vai guardar os guardiães? Umsistema de vigilância mútua é vulnerável ao conluio. Um indiví-,duo que detecta uma prática corrupta poderia lucrar mais chanta­geando as partes corruptas do que denunciando-as. Em geral;qualquer mecanismo que seja designado a detectar e agir contraa formação de ferrugem na máquina institucional é por si mesmosujeito à ferrugem.

Embora seja difícil provar, acredito que a variação em corrup-

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POR volta de 1630 encontramos Descartes discutindo com um, amigo que acredita que uma bala de canhão alcança sua mais

alta velocidade algum tempo após deixar a boca do mesmo. Acrençado amigo é bastante natural. Quando uma pessoa começaà correr, leva algum tempo, até que ela alcance sua velocidademáxima, após o que, por fim, a pessoa acaba perdendo a força.Leva algum tempo, também, para que a bala alcance o pontomais alto de sua trajetória. A idéia de um crescimento gradual edepois gradual enfraquecimento de forças é compulsiva. Foine­cessário o gênio de Galileu e de Descartes para ver que o.movi.mento não é um processo, mas um estado que irá persistir indefi­nidamente, a não ser se perturbado por forças externas. A balaalcança sua velocidade máxima no momento de deixar a boca <laarma e continuaria à mesma velocidade na ausência da resistên­cia do ar e da gravidade.

,O metabolismo orgânico apresenta outra ambigüidade.' Olha­da de perto, a destruição e criação de células parece ser um pro­cesso de mudança incessante, quase caos. Se dermos um passoatrás, entretanto, vemos quehá um padrão na mudança. Novascélulas de, um determinado tipo estão sendo criadas à mesmataxa à qual as células antigas estão sendo destruídas,1 sendo o re­SUIUldo líquido que a estrutura celular como um todo é mantidainalterada. "Plus ça change, plus c'est la même chose."Na No:ruega .hâ igrejas de. aduelas de madeira, construídas no século ,

- . _.; ,: ~\fi0e.~ rr:.<... ··.,:·!r"-··~~~.~"'·~'~:'

Infelizmente. isso nãoé verdade paraas célulascerebrais (ou é meno~~étdad~'i'do queno caso de outrascélulas). ' '.>:()1I.iJ .

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çã~I~~tre,palses é explicada em grande parte pelo grau de es­,,:p{ritQ, público de seus funcionários, não pela inteligência do de­

.;:'i',}':: senho institucional.· A moralidade e as normas sociais parecem:~~~t,', , Ç<)Qtàr, mais' que.o auto-interesse esclarecido. Os desejos impor­H' i: ,',' , tammais que as oportunidades. Essa formulação do problema~"" poderia ser enganadora, porém. Se há múltiplos equilíbrios, aci-

dente e história poderiam proporcionar a explicação. Dois paísespoderiam ter o mesmo desenho institucional e a mesma misturade motivações individuais, e ainda assim, um poderia estar infes­tado de corrupção e o outro livre da mesma. O que parece sermotivações de espirito público pode ser apenas comportamentocalcado no espírito público, motivado por auto-interesse numequilíbrio no qual vale a pena ser honesto. A Fig. XV.2 ilustra oponto; Não acredito que isso possa valer para toda a variação en­tre os países, mas eu poderia-estar errado.

"Emqualquer caso, ê óbvio que as instituições não são entida­des monolítlcas com as quais se possa contar para transmitir eentão executar decisões do alto. Falar sobre instituições é apenasfalar sobre indivíduos que interagem uns com os outros e compessoas de fora das instituições. Seja qual for o resultado da inte­

'ração, ela deve ser explicada em termos dos motivos e oportuni-dades desses indivíduos.

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