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PERÍCIA NA PINTURA DE JHERONIMUS BOSCH – AS TENTAÇÕES DE SANTO ANTÃO – MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO - MASP
S.D.A.C.Hitner Pesquisa concluída no IA -UNICAMP - apoio FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de são Paulo)
Introdução
A análise científica realizada com métodos laboratoriais
da pintura de Hieronymus Bosch, As Tentações de
Santo Antão, do MASP, tem como propósito verificar
se a atribuição feita ao nome do pintor se confirma.
Entre as obras de Bosch, a temática da vida de Santo
Antão foi abordada de muitas maneiras sendo que a
mais atraente e mais completa de todas está
configurada em forma de um tríptico, onde a história
da vida santo está mostrada nos três painéis. Esta obra
se encontra atualmente no Museu Nacional de Arte
Antiga na cidade de Lisboa e a representação do painel
central é muito semelhante à do MASP.
A obra de Bosch do MASP é um painel único. Chegou
a São Paulo na segunda metade dos anos 50. Alegava-
se ser a primeira versão do painel central lisboeta por
muitos especialistas. Durante os anos 70, o quadro do
MASP tornou a ser objeto de análise de uma
historiadora de arte flamenga que, pesquisando a fundo
as Tentações de Lisboa,
Fig A Obra-prima de Jheronimus Bosch – Museu
Nacional de Arte Antiga - Lisboa (painel central das
Tentações de Santo Antão)
se deparou com a do Brasil:
Fig B Jheronimus Bosch, As Tentações de Santo
Antão – Museu de Arte de São Paulo - MASP
e, diante das semelhanças, penetrou profundamente no
âmbito da questão sobre a autenticidade das Tentações
de Bosch que se assemelhassem particularmente no
intuito de estabelecer uma tese sobre as etapas de
elaboração anteriores à obra-prima lisboeta. Na tese da
historiadora estas etapas ocorriam da seguinte maneira:
primeiramente Bosch teria elaborado as Tentações do
MASP e depois de Lisboa. Todavia, a tese da
historiadora não se concretizou completamente por
carência de material técnico e historiográfico deficiente
advindo do Brasil da época.
Ao longo destes anos, no entanto, os historiadores da
arte especialistas em Bosch, ao citarem a obra de São
Paulo, ou limitavam-se a acolher as opiniões supra
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação. Vol.1, No.6, pp. 353 - 357 Copyright © 2007 AERPA Editora
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citadas, ou catalogavam a obra como uma mera cópia,
entre muitas de configuração semelhantes espalhadas
pelo mundo (quinze oficiais – p.99, 100).
Materiais Utilizados Na Pesquisa
Os principais métodos científicos adotados na análise
da obra do MASP compreenderam:
a) radiação ultravioleta
Fig.C: Fotografia Ultravioleta - MASP
b) radiação infravermelha
FigD: Detalhe fotografado em infravermelho - MASP
FigE: Fotografia em infravermelho - MASP
c) radiografia
Fig F: Detalhe da obra em preparação para res-
tauro (limpa) com inserção de fotografia Raio X
MASP
d) registros fotográficos detalhados e à luz rasante
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FigG: Detalhe fotografado à luz rasante - MASP
e) investigação minuciosa do suporte de madeira
Fig H: Detalhe do reverso da moldura (com sinal de
autenticidade) – MASP
f) exame pontual de avaliação da tinta, que implica na
retirada de amostras para análise química da tinta e dos
pigmentos
Fig I: Estratigrafia da camada (MASP)
Fig J : Detalhe da camada marrom esverdeada –
envelhecimento fotoquímico - MASP
(A competência dos pintores flamengos medievais
para fazer suas pinturas veio do assim chamado
MANUSCRITO DE STRASBOURG, um trabalho do
século XV sobre a técnica de pintura). O manuscrito
foi destruído pelo fogo em 1870 mas, felizmente, uma
cópia dele tinha sido feita alguns anos antes por um
inglês empenhado num livro de história da pintura a
óleo1. O autor do MANUSCRITO DE STRASBOURG
explicita a metodologia de como “temperar” as cores
com óleo:
“... Agora eu irei também ensinar como todas as cores
são para serem temperadas com óleo... e em primeiro
lugar como o óleo é para ser preparado para este
propósito de maneira que possa ficar límpido e claro, e
que seque rapidamente.
Como preparar óleo para as cores: Pegue o óleo de
linhaça ou de cânhamo ou óleo velho de nogueira ou
de aveleira, quanto for necessário. Coloque nisso
ossos mantidos por longo tempo, escandecidos até
tornarem-se brancos com uma quantidade igual a de
pedra-pomes; deixe-os cozinhar no óleo, removendo a
espuma. Então retire o óleo do fogo e deixe-o esfriar
bem. Se a quantidade for de aproximadamente um
quarto, adicione a isto uma onça de sulfato de zinco.
Isto irá difundir-se no óleo que se tornará bem límpido
e claro.
Mais tarde esprema o óleo num pedaço de pano de
linho limpo dentro de uma bacia limpa, e o ponha no
sol por quatro dias. Deste modo ele adquirirá uma
consistência densa, e também se tornará tão
transparente como um cristal fino. E este óleo seca
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muito rapidamente e faz todas as cores clarearem e
sobretudo tornarem-se transparentes. Os pintores não
estão familiarizados com isto. Esta excelência foi
chamada de oleum preciosum; e com este óleo as cores
deverão ser firmadas e temperadas. Todas as cores
deveriam ter base firme e depois serem temperadas em
um estado meio-líquido, nem muito denso nem muito
delgado...”2 .
Os pintores flamengos tinham recursos limitados,
entretanto, altos padrões. Era comum que usassem as
cores da terra circulando através dos amarelos
atingindo vermelhos surdos, até chegarem nos marrons.
As nuanças coloridas podiam ser mudadas
artificialmente através de aquecimento.
Os pigmentos azuis eram difíceis de ser adquiridos e
difíceis de ser usados. Um dos mais preciosos era o
ultramarino natural (Na,Ca)8[(SO4,S,Cl)2|(AlSiO4)6],
feito de lápis lazuli moído. O lápis lazuli, vindo das
minas de Badakhshan (N.Afeganistão) e do Egito, era
um item muito importante no comércio da Europa
Medieval. Era carregado por caravana ao porto de Acre
e daí transportado para Veneza. (Os venezianos o re-
exportavam para as cidades da França, Alemanha e dos
Países Baixos).
Resultados
-Origem da obra não é conhecida;
-Estado geral de desgaste. O leitor poderá observar o
desgaste do painel por meio das fotografias elaboradas
durante a limpeza e restauro da obra no Brasil.
Fig K: Fotografia da obra “limpa”pronta para
restauro - MASP
- Pentimenti vistos a olho nu: em dez áreas (p. 78).
- O exame do desenho subjacente apresenta mudanças
de composição em diversos grupos (p. 75-77). Todas as
zonas pintadas mostraram um bom resultado para o
estudo dos traços subjacentes pouco se assemelhando,
no entanto, com os estudados no painel de Tentações
Lisboa.
-Mudança na composição: O exame de Raio X
demonstrou certos elementos não existem na camada
pictórica efetiva. São eles: (área central) No lugar do
monstro verde de mantilha que está saindo do nicho em
frente à mesa carregando a bandeja com coruja
aparecem dois rostos diferentes, para citar somente um
exemplo.
- Apresentação de detalhes diferentes e detalhes
inéditos entre os dois painéis (p. 94).
Conclusão
Há detalhes inéditos na composição do óleo do MASP,
que fazem dele uma autêntica versão de pesquisa por
parte do artista. Estes detalhes foram minuciosamente
catalogados, pois pode tratar-se de uma obra em etapa
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de evolução até atingir a perfeição demonstrada no
painel de Lisboa (laudo completo da autora - p. 101) .
Isto de acordo com as conclusões de Friedländer3 ,
Eigenberger4 e Lievens de Waegh.5
Referências
P.S.: As páginas de referência desta palestra podem ser
encontradas no site:
www.bosch-masp.com.br/congresso Olinda 2006.
1- Materials for a History of Oil Painting, por Charles
Lock Eastlake, 1847.
2- Apud Baron Van der Elst, J.- The Last Flowering of
the Middle Ages, Doubleday, Doran & Company, New
York, 1944, p.38.
N.A.: Apesar dos progressos ultimamente efetuados
nos métodos instrumentais de análise e dos esforços de
muitos investigadores, parece que os pintores
flamengos misturavam ao óleo secativo um aditivo
especial [x] que, segundo alguns, seria uma resina, e
segundo outros, água. Entretanto, continua sem
esclarecimento o tipo de composição deste famoso
aglutinante oleoso. Na ocasião do exame e tratamento
da obra de Van Eyck L’AGNEAU MYSTIQUE, sob a
direção de Paul Coremans- Les Primitifs Flamands, III
Contributions a l’étude des Primitifs Flamands 2, De
Sikkel, Anvers, 1953, p.76, o autor diz: “Nous ne
pouvons préciser, avec une certitude suffisante, la
nature exacte de la substance “x” ajoutée à l’huile
siccative. Nous sommes portés à croire que cette
matière a des propriétés proches de celles de certaines
résines naturelles, soit donc d’une substance
complètement soluble dans l’huile siccative et formant
avec elle un film de structure homogène. Nous pensons
que ces caractéristiques ne se retrouvent pas dans une
émulsion”.
3- Friedländer, M.J. Die Altniederländische Malerei,
Leiden, 1937, Vol. XIV, p. 99,100.
4- Director der Gemalde Sammlung Akademie der
Bildende Kunst, Viena, Áustria (doc. no corpus, p. 110,
conforme carta ao MASP).
5- Lievens Waegh, M.L, Les Tentations de Saint
Antoine de Jérôme Bosch au Musée de Lisbonne –
Étapes de l’Élaboration d’un Chef-d’-Oeuvre, Bulletin
de l’Institute royal du Patrimoine artistique, t. XIV,
Bruxelles, 1973/4.
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