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O Contencioso Geral da Procuradoria Geral do Estado 85 A mesma regra que importa na remessa necessária no caso de extinção sem análise de mérito ou de improcedência da demanda, prevista no art. 17, da Lei da Ação Popular, não foi repetida na Lei da Ação Civil Pública. Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, conforme noticiado no infor- mativo de jurisprudência 395 (período de 18 a 22 de maio de 2009), decidiu, no REsp 1.108.542-SC, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 19/5/2009, que “Na ausência de dispositivo sobre remessa oficial na Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), busca-se norma de integração dentro do mi- crossistema da tutela coletiva, aplicando-se, por analogia, o art. 19 da Lei 4.717/65. Embora essa lei refira-se à ação popular, tem sua aplica- ção nas ações civis públicas, devido a serem assemelhadas as funções a que se destinam (a proteção do patrimônio público e do microssis- tema processual da tutela coletiva), de maneira que as sentenças de improcedência devem sujeitar-se indistintamente à remessa necessá- ria. De tal sorte, a sentença de improcedência, quando proposta a ação pelo ente de Direito Público lesado, reclama incidência do art. 475 do CPC, sujeitando-se ao duplo grau obrigatório de jurisdição. Ocorre o mesmo quando a ação for proposta pelo Ministério Público ou pelas associações, incidindo, dessa feita, a regra do art. 19 da Lei da Ação Popular, uma vez que, por agirem os legitimados em defesa do patri- mônio público, é possível entender que a sentença, na hipótese, foi proferida contra a União, estado ou município, mesmo que tais entes tenham contestado o pedido inicial. Com esse entendimento, a Turma deu provimento ao recurso do Ministério Público, concluindo ser in- dispensável o reexame da sentença que concluir pela improcedência ou carência da ação civil pública de reparação de danos ao erário, in- dependentemente do valor dado à causa ou mesmo da condenação.” REsp 1.108.542-SC, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 19/5/2009. Portanto, pelo entendimento encampado pelo Superior Tribunal de Justiça, no caso de improcedência ou carência da ação civil pública de reparação de danos ao erário, estará a sentença sujeita ao reexame necessário, ainda que não sucumbente propriamente a Fazenda Pública, como forma de defesa do interesse público. 10. DO INCIDENTE DE SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA 10.1. Considerações iniciais A suspensão de execução de liminar ou de sentença tem como finalidade obstar o cumprimento do comando contido em liminar e sentença que possa produzir efeitos imediatos, ou seja, que não seja objeto de recurso dotado de efeito suspensivo. Pode ser utilizado exclusivamente pelas pessoas jurídicas de direito públi- co ou pelo Ministério Público, que podem ter o interesse de obstar a produção manual_pge_parte1.indd 85 7/11/2013 15:32:22

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O Contencioso Geral da Procuradoria Geral do Estado

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A mesma regra que importa na remessa necessária no caso de extinção sem análise de mérito ou de improcedência da demanda, prevista no art. 17, da Lei da Ação Popular, não foi repetida na Lei da Ação Civil Pública.

Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça, conforme noticiado no infor-mativo de jurisprudência 395 (período de 18 a 22 de maio de 2009), decidiu, no REsp 1.108.542-SC, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 19/5/2009, que

“Na ausência de dispositivo sobre remessa oficial na Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/1985), busca-se norma de integração dentro do mi-crossistema da tutela coletiva, aplicando-se, por analogia, o art. 19 da Lei 4.717/65. Embora essa lei refira-se à ação popular, tem sua aplica-ção nas ações civis públicas, devido a serem assemelhadas as funções a que se destinam (a proteção do patrimônio público e do microssis-tema processual da tutela coletiva), de maneira que as sentenças de improcedência devem sujeitar-se indistintamente à remessa necessá-ria. De tal sorte, a sentença de improcedência, quando proposta a ação pelo ente de Direito Público lesado, reclama incidência do art. 475 do CPC, sujeitando-se ao duplo grau obrigatório de jurisdição. Ocorre o mesmo quando a ação for proposta pelo Ministério Público ou pelas associações, incidindo, dessa feita, a regra do art. 19 da Lei da Ação Popular, uma vez que, por agirem os legitimados em defesa do patri-mônio público, é possível entender que a sentença, na hipótese, foi proferida contra a União, estado ou município, mesmo que tais entes tenham contestado o pedido inicial. Com esse entendimento, a Turma deu provimento ao recurso do Ministério Público, concluindo ser in-dispensável o reexame da sentença que concluir pela improcedência ou carência da ação civil pública de reparação de danos ao erário, in-dependentemente do valor dado à causa ou mesmo da condenação.” REsp 1.108.542-SC, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 19/5/2009.

Portanto, pelo entendimento encampado pelo Superior Tribunal de Justiça, no caso de improcedência ou carência da ação civil pública de reparação de danos ao erário, estará a sentença sujeita ao reexame necessário, ainda que não sucumbente propriamente a Fazenda Pública, como forma de defesa do interesse público.

10. Do inciDente De suspensão De execução De liminar e De sentença

10.1. considerações iniciaisA suspensão de execução de liminar ou de sentença tem como finalidade

obstar o cumprimento do comando contido em liminar e sentença que possa produzir efeitos imediatos, ou seja, que não seja objeto de recurso dotado de efeito suspensivo.

Pode ser utilizado exclusivamente pelas pessoas jurídicas de direito públi-co ou pelo Ministério Público, que podem ter o interesse de obstar a produção

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imediata de efeitos de decisões que possam causar grave lesão a determinados bens jurídicos, sintetizados nas expressões ordem, saúde, segurança e econo-mias públicas.

10.2. Da legitimidade para a sua proposituraQuando de sua criação, a suspensão poderia ser requerida exclusivamente

pela pessoa jurídica de direito público interessada (art. 13 da Lei 191/36), situ-ação essa que se manteve quando de sua previsão no Código de Processo Civil de 1939 (art. 328) e no revogado art. 4º da Lei 4.348/64.

Sob a indicação de pessoas jurídicas de direito público incluem-se, sem qualquer dificuldade, a União, os Estados membros, o Distrito Federal, os Mu-nicípios, suas respectivas autarquias e fundações públicas.

A legitimidade das pessoas jurídicas de direito público também decorre do dispositivo contido no art. 5º e seu parágrafo único da Lei 9.469/97, que autoriza a intervenção das pessoas jurídicas de direito público quando a deci-são puder gerar reflexos econômicos, podendo, inclusive, recorrer das decisões independentemente de comprovação de interesse jurídico, assumindo, nesse caso, a qualidade de parte.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou, em pedido formulado pela União, que aludido artigo autoriza não só a interposição de recurso, mas tam-bém requerer a suspensão da eficácia da decisão.119

Conforme lembra a Ministra Ellen Gracie Northfleet, os órgãos públicos também detêm legitimidade para requerer a suspensão, na medida que pos-suem capacidade processual ou personalidade judiciária.120

Nesse sentido, valiosa é a lição, ainda contemporânea, de Hely Lopes Mei-relles, ao comentar o instituto da suspensão sob a ótica do mandado de segu-rança (suspensão de segurança), para quem a lei deve ser interpretada de forma racional e observando os fins a que se destina, de modo que pode requerer a suspensão também o órgão interessado,121 estendendo-se às pessoas e órgãos de direito privado que possam suportar os efeitos da liminar.122

O art. 4º da Lei 8.437/92 e o art. 15 da Lei 12.016/09 conferem legitimidade ao Ministério Público para o requerimento de suspensão de execução, o que é perfeitamente justificável, uma vez que os bens jurídicos protegidos corres-pondem ao interesse público (art. 129 da CF).

119 STJ - AgR Pet 1.621/PE, Corte Especial, rel. Min. Nilson Naves, j. 24.06.2002, DJ, de 14.04.2003, p. 165.

120 NORTHFLEET, Ellen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, Nova Série, São Paulo, Revista dos Tribunais, v. 1, 2, p. 170, jul./dez. 1998.

121 Por exemplo, o Tribunal de Contas e a Câmara dos Vereadores.

122 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 27ª ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 88.

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10.3. competência para o julgamento do incidenteVia de regra, o pedido de suspensão de segurança é dirigido ao presidente

do Tribunal a que couber o conhecimento do recurso possível da decisão limi-nar ou da sentença. Trata-se de competência absoluta, portanto imodificável.

Desse modo, a suspensão de execução de liminar ou de sentença prove-niente de juízo de primeira instância será de competência do presidente do Tribunal de Justiça ou do Tribunal Regional Federal que possa conhecer do respectivo recurso.

O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça também têm competência para o pedido de suspensão. O primeiro, quando o fundamento da suspensão for ofensa a matéria constitucional, em especial aos princípios da Administração Pública; o segundo, quando o fundamento for matéria infra-constitucional (art. 25 da Lei 8.038/90).

A competência de um desses Tribunais ocorrerá quando:

a) negado pedido de reforma de decisão denegatória de concessão de suspensão proveniente de presidente de Tribunal de Justiça ou de Tribunal Regional Federal;

b) acolhido agravo regimental interposto pelo interessado contra de-cisão concessiva de suspensão deferida pelo presidente de Tribu-nal de Justiça ou de Tribunal Regional Federal;

c) concedida liminar por relator em sede de agravo de instrumento, não havendo necessidade de prévia interposição de agravo regi-mental pelo Poder Público.123

10.4. Dos bens jurídicos tuteladosA suspensão da eficácia da decisão poderá ser requerida quando houver

grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

Não é qualquer lesão aos bens jurídicos protegidos pela norma de regên-cia que justifica a suspensão da eficácia da decisão, mas tão somente a grave lesão, conforme bem especificado no art. 4º da Lei 8.437/92 e no art. 15 da Lei 12.016/09.

Aliás, como decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, não é o bastante também que a decisão judicial cause algum prejuízo à pessoa jurídica de direi-to público, até porque toda decisão revela certo grau de lesividade. A lei não possui palavras inúteis, não podendo ser descartado o qualitativo empregado.

123 “O presidente do Supremo Tribunal Federal pode suspender liminares deferidas por relatores no âmbito dos Tribunais de Justiça, independentemente da interposição de agravo regimental pelo Poder Público.” (STF - SS 2.491/PE, rel. Min. Nelson Jobim, DJ, de 15.12.2004). No mesmo sentido: STF - AgR SL 112/TO, Pleno, rel. Min. Ellen Gracie, v.u., DJ, de 24.11.2006).

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Tal entendimento se revela correto, uma vez que o legislador não quis que o incidente de suspensão fosse empregado sem critérios, ou, na feliz expres-são do Ministro Humberto Gomes de Barros, em decisão de indeferimento de suspensão, fosse “amesquinhado”, “devendo ser encarada e manejada [a sus-pensão] de forma correta: como exceção, jamais como regra nas demandas que envolvem o Poder Público”.124

Os bens jurídicos protegidos encerram, cada qual, conceitos jurídicos in-determinados, a serem completados no caso concreto. Raramente a doutrina aponta critérios para identificação de cada um deles.

O entendimento dominante na doutrina é o de que a cognição em sede de suspensão está restrita à análise da ocorrência de lesão grave aos bens jurídicos indicados na lei de regência.125 No mesmo sentido, já foi decidido que não se admitem debates acerca do mérito da questão envolvida.126

Porém, ressaltou a Ministra Ellen Gracie, em já indicado julgado, enten-dimento de que, sem prejuízo da análise da grave lesão prevista no art. 4º da Lei 8.437/92, “permite-se o proferimento de um juízo mínimo de delibação a respeito da questão jurídica deduzida na ação principal”.127

10.5. Duração da medidaO art. 4º, § 9º, da Lei 8.437/92, determina que a suspensão da execução

vigorará até o trânsito em julgado da decisão de mérito da demanda principal. No mesmo sentido, o art. 25 da Lei 8.038/90.

Nesse ponto, a legislação fez opção em conceder ultratividade ao provimen-to jurisdicional do presidente do Tribunal,128 de modo que a medida produzirá efeitos enquanto não transitada em julgado a decisão. Esse posicionamento é seguido por Ellen Gracie.129

Uma vez indeferido o pedido de suspensão de execução pelo presidente do Tribunal respectivo, poderá o Poder Público (ou o requerente, quando não se tratar de Poder Público), valer-se de um expediente muito criticado pela dou-trina, mas que reiteradamente é utilizado: trata-se da renovação do pedido de suspensão aos Tribunais superiores.

124 STJ - SLS 837/RJ, DJ, de 22.04.2008.

125 “Reafirme-se, pois, que não é dado ao juiz presidente do Tribunal sequer uma mínima delibação de mérito quando da apreciação de pedido de suspensão, sob pena de violação de competência jurisdicional da instância ordinária, uma vez que é perante ela que se dá o cabimento do recurso próprio para o controle da legalidade ou justiçabilidade da decisão.” (VENTURI. Elton, Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao poder público. Op. Cit., p. 197).

126 STJ - SLS 845/PE, DJ, de 28.03.2008, rel. Min. Barros Monteiro.

127 STF - AgR STA 118/RJ, DJe, de 28.02.2008.

128 CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A fazenda pública em juízo. Op. Cit., p. 455.

129 NORTHFLEET, Ellen Gracie. Suspensão de sentença e de liminar. Op. Cit., p. 173.

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Apesar do inconformismo anunciado por muitos, o fato é que a renovação do pedido aos Tribunais superiores é prática muito comum e acolhida. Por meio desse mecanismo, formula-se o requerimento de suspensão diretamente ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, quer se ale-gue matéria constitucional ou infraconstitucional respectivamente. Se acaso for alegada matéria constitucional e infraconstitucional, já foi decidido que a competência será do presidente do Supremo Tribunal Federal, que absorve a competência do Superior Tribunal de Justiça.

A renovação é requerimento de legitimidade idêntica à do pedido de sus-pensão originário, cuja possibilidade foi reforçada pela Lei 12.016/09 (art. 15, §1º).

10.6. Do agravo internoDas decisões do presidente do Tribunal proferidas em sede de suspensão

de execução caberá o recurso de agravo interno (agravo regimental, agravinho etc.), cujo julgamento estará a cargo ou do Pleno do Tribunal (para os casos em que o Tribunal conte com menos de vinte e cinco membros), ou para a Corte Especial.

Para a interposição desse agravo regimental, não se aplica o disposto no art. 188, do CPC. A propósito, vide o informativo de jurisprudência 523, do Supe-rior Tribunal de Justiça, que noticiou:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INAPLICABILIDADE DO ART. 188 DO CPC AO INCIDENTE DE SUSPENSÃO DE LIMINAR. Não incide o art. 188 do CPC — que confere prazo em dobro para recorrer à Fa-zenda Pública ou ao Ministério Público — na hipótese de o recurso interposto ser o incidente de suspensão de liminar previsto no art. 4º, § 3º, da Lei 8.437/1992. Precedente citado do STF: STA-AgR 172-BA, Tribunal Pleno, DJe 2/12/2010. REsp 1.331.730-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 7/5/2013.

10.7. estrutura da suspensão de execução de liminar a partir de um caso prático

Sem dúvida alguma, um dos desafios atuais da advocacia de Estado é har-monizar a observância dos direitos fundamentais e a defesa do interesse pú-blico. Não se trata de tarefa fácil no dia-a-dia, principalmente pela imagem negativa que o Estado muitas vezes deixa, ou em razão do preconceito de mui-tos profissionais do Direito, que sempre partem do princípio de que a atuação estatal é equivocada, desmedida, desproporcional ou irrazoável.

Porém, sendo o Procurador do Estado um profissional que, como já foi dito anteriormente, pavimenta o caminho para a efetivação das políticas públicas, sem se descuidar de direitos fundamentais, poderá valer-se do incidente de suspensão para a fiel observância do interesse público.

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Na sequência, apresenta-se a estrutura e o exemplo de uma suspensão.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ________

(Endereçamento = detalhe: Presidente do Tribunal e não ao relator de eventual recurso que poderá ser interposto)

(Requerente do incidente + Fundamento legal do pedido)

O ESTADO DE ________, pessoa jurídica de direito interno, pelo Procurador do Estado que esta subscreve, com fundamento no art. 12, § 1º, da Lei 7.347/85 e no art. 4º, caput, da Lei 8.437/92, vem, mui respeitosamente, perante Vossa Excelência requerer a SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE LIMINAR concedida no bojo dos autos da Ação Civil Pública n. ..., ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, em trâmite pela Vara .........., consoante os fatos e fundamentos a seguir expostos.

I – DA DECISÃO PROFERIDA

(Indicação e explanação sobre a decisão proferida que produz efeitos jurídicos imediatos, muito embora seja impugnável por recurso).

O Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou a referida ação civil públi-ca, visando a compelir o Estado ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente no aumento do efetivo policial civil e militar nos municípios de ....... e ........., sob a alegação de que estaria a ocorrer violação a interesse difuso da sociedade, em razão da inadequada prestação do serviço de segurança pública afeto à Polícia Judiciária e à Polícia Militar naquelas localidades.

O r. Juízo da Vara ....... concedeu, de plano, a liminar requerida determinando o aumento do efetivo policial atualmente existente naquela comarca, conforme deci-são cuja parte final tem o seguinte teor: (...).

Registre-se, por oportuno, que tal liminar foi concedida sem a prévia e obrigató-ria oitiva do representante legal da pessoa jurídica interessada, afrontando, portanto, o disposto no art. 2º, da Lei 8.437/92, e o princípio do contraditório, o que, por si só, implica na sua nulidade, consoante reiterado entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça.

II- DO CABIMENTO è (explanação sobre a demonstração do cabimento da sus-pensão – FRISAR A EXISTÊNCIA DE GRAVE LESÃO A UM DOS BENS JURÍDICOS LESADOS)

O art. 4º, da Lei 8.437/92, estabelece a competência dessa Egrégia Presidência do Tribunal de Justiça para suspender a execução de medidas liminares quando houver

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requerimento da pessoa jurídica interessada e risco de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

A situação em exame, de flagrante gravidade, encontra amparo em permissivo legal, justificando o cabimento do presente pedido.

A decisão guerreada implica interferência nas atribuições e competências da Secretaria de Estado da Segurança Pública e rechaça por completo o princípio cons-titucional da independência entre os Poderes, pois, além de interferir diretamente na administração dos recursos humanos colocados à disposição do Estado, também não leva em consideração todo trabalho estratégico existente para o direcionamento da política de segurança pública.

Nesse passo, a decisão judicial possui potencial para propiciar grave lesão à eco-nomia e à segurança públicas, bens jurídicos tutelados pelo incidente de suspensão.

Tem-se a grave lesão à economia pública, pois não é possível propiciar o cumpri-mento imediato da decisão no tempo exigido pela decisão judicial, o que propiciaria a imposição de elevada multa ao Estado, além do que, haveria necessidade de reajus-tamento do quadro de pessoal a ser suportado pela Administração Pública.

Além disso, há grave lesão à ordem pública, pois está sendo desconsiderado todo o planejamento estratégico para disposição do quadro de pessoal e políticas públicas de segurança, sem que fosse demonstrado, em contrapartida, que as mudanças de-terminadas importarão em diminuição da criminalidade para toda a região.

A propósito, na Suspensão de Medida Liminar 118.231.0/0-00, que tramitou pe-rante a Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em situação simi-lar foi reconhecida a grave lesão, nos seguintes termos:

“(...) E, com efeito, a deliberação combatida, malgrado bem intencionada, afeta muito de perto a ordem administrativa na exata medida em que impõe alocação de policiais, sem a exata dimensão do eventual comprometimento, acaso maior, do mesmo serviço essencial em outras localidades. Ou se se cogitar de novos profissionais, da mesma forma é preciso concurso, que se realiza no limite das restrições com despesas de pessoal, nesse ponto em risco, também, a economia pública.”

Como se vê, é atribuição do Estado, exclusivamente, a fixação e organização da política de segurança pública.

Deve ser registrado, ainda, o potencial efeito multiplicador da decisão concessi-va da liminar, pois muitas outras decisões poderão vir, interferindo-se sobremaneira na efetivação das políticas públicas.

(Note-se que não se ingressou propriamente no mérito da causa, o que não afasta a necessidade de aparente legitimidade da medida).

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V – DO PEDIDOPresentes os pressupostos legais, requer a suspensão da decisão proferida pelo

MM. Juízo de Direito da Comarca de ..., até o trânsito em julgado da decisão. Nestes termos ,p. deferimento.

Local e data.

Procurador do Estado

11. Da intervenção anômala

O art. 5º da Lei 9.469/97 trata da denominada intervenção anômala (ou anódina), pela qual a União e as demais pessoas jurídicas de direito público, com fundamento na demonstração de interesse econômico (e não de interesse jurídico), podem pugnar a juntada de documentos e de memoriais que enten-derem pertinentes.

Art. 5º A União poderá intervir nas causas em que figurarem, como au-toras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais.

Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de com-petência, serão consideradas partes.

INTERESSE JURÍDICO INTERESSE ECONÔMICO

Autoriza a assistência Autoriza a intervenção anômala

Importa no deslocamento da competência. Não importará no deslocamento da

competência.

Ao assim proceder, a pessoa jurídica de direito público não adquire a con-dição de parte e, portanto, não está sujeita à coisa julgada formada.

A intervenção anômala da União, em demanda que tramita perante a Justi-ça Estadual, importará na modificação da competência?

Resposta: NÃO. Não há o deslocamento, uma vez que não há interesse ju-rídico da União.

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ATENÇÃO!

7. No caso concreto, a Corte a quo, ao julgar recurso contra senten-ça que reconheceu prazo trienal em ação indenizatória ajuizada por particular em face do Município, corretamente reformou a sentença para aplicar a prescrição quinquenal prevista no Decreto 20.910/32, em manifesta sintonia com o entendimento desta Corte Superior sobre o tema.8. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.(REsp 1251993/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2012, DJe 19/12/2012).

De se registrar que este último julgado ainda não havia transitado em julga-do quando da confecção do presente Manual, sendo objeto de recursos extra-ordinários que aguardam a sua admissibilidade.

12.3. Da prescrição parcelar (súmula 85 stJ) e da prescrição do fundo de direito

Contrapõem-se a prescrição parcelar e a prescrição do fundo de direito, e para a sua diferenciação há de ser respondido um questionamento: foi formu-lado pedido na via administrativa, tendo o indivíduo ciência da resposta ao pleito?

Dois exemplos são elucidativos.

Imagine-se que determinado indivíduo formule pedido judicial para que lhe seja deferida uma gratificação. Não houve qualquer pedido na via admi-nistrativa. Nesse caso, sendo concedido o pedido, o magistrado determinará a observância da prescrição parcelar, ou seja, estarão prescritas as parcelas ven-cidas há mais de cinco anos do ajuizamento da ação.

Aplicável, na espécie, a súmula 85 do STJ, segundo a qual “nas relações jurí-dicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quan-do não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação”.

Portanto, na prescrição parcelar, NÃO HOUVE FORMULAÇÃO DE REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA e, por isso, prescre-vem apenas as parcelas devidas e vencidas anteriormente ao quinquênio anterior ao ajuizamento da ação.

Passa-se ao exemplo da prescrição do fundo de direito.

O mesmo servidor formula requerimento na via administrativa, pugnando pela concessão de uma gratificação. O pedido é indeferido e o servidor tem plena ciência do resultado da decisão. Dessa maneira, aplicando-se o disposto no art. 1º, do Decreto 20.910/32, o servidor terá o prazo de cinco anos para o ajuizamento da ação e, passado esse período, caducará o próprio direito e não apenas as parcelas.

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ATENÇÃO!

ATENÇÃO!

Verifica-se, então, que na prescrição do fundo de direito, não prescrevem apenas as parcelas, mas o próprio direito não poderá mais ser exigido.

PRESCRIÇÃO PARCELAR PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO

Não houve requerimento administrativo

ou, se houve, o interessado não foi

cientificado da decisão. Também não

houve lei de efeitos concretos.

Houve o indeferimento do requerimento

na via administrativa ou lei de efeitos

concretos.

12.4. Da interrupção do prazoInterrompido o prazo prescricional, sendo ele reiniciado por qualquer mo-

tivo, voltará a correr pela metade, consoante determina o art. 9º, do Decreto 20.910/32: “A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do pra-zo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo”.

Dessa maneira, já transcorridos quatro anos de prescrição, voltando tal pra-zo a correr, ter-se-á mais dois anos e meio.

Porém, se a interrupção ocorrer durante a primeira metade, aplicável a sú-mula 383 do STF, segundo a qual “a prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo”.

Portanto, a soma dos prazos já transcorrido e do faltante NUN-CA poderá ser inferior a CINCO ANOS.

QUADRO DE EXEMPLOS PARA MELHOR COMPREENSÃO

Exemplo 01: houve interrupção da prescrição quando decorridos quatro anos. Se a

prescrição voltar a correr, correrão mais dois anos e meio.

Exemplo 02: houve a interrupção da prescrição quando decorrido um ano. Se a prescrição

voltar a correr, correrão MAIS QUATRO ANOS (e não só a metade).

13. Da execução em face Da fazenDa pública

13.1. considerações iniciaisO processo de execução passou por complexa reformulação com o advento

da Lei 11.232/05, responsável pela introdução do “cumprimento de sentença”

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Com a petição inicial devem ser anexadas cópias das peças processuais tidas como relevantes (art. 736, caput, CPC), dentre as quais a procuração ou-torgada pelo exequente a seu advogado (na medida em que a lei processual não exige a comunicação processual da oposição dos embargos por citação pessoal daquele, mas sim pela intimação do próprio patrono) e o próprio título executivo, facultada a juntada de qualquer outro documento tido como útil à defesa do Estado, à força da irrecusável incidência da regra constitucional do contraditório e da ampla defesa também na execução.

Por fim, vale frisar que a decisão judicial que resolve os embargos em pri-meiro grau de jurisdição ostenta a natureza jurídica de sentença, desafiando, assim, a interposição de recurso de apelação (art. 513, CPC), afastada por com-pleto qualquer cogitação de que o recurso cabível poderia ser o de agravo de instrumento, aplicável no âmbito da impugnação ofertada pelo devedor no cumprimento de sentença e ainda assim especificamente nas hipóteses em que não há extinção da execução (art. 475-M, § 3º, CPC).

13.4. passo-a-passo da execução contra a fazenda pública

1.

Título executivo judicial ou

extrajudicial

2.

Citação para oposição de

embargos em 30 dias

3.

Opostos embargos

4.

Manifestação a parte contrária

5.

Sentença/recursos/trânsito em

julgado

6.

Expedição do precatório ou da

RPV nos autos da execução.

14. Dos JuizaDos especiais Da fazenDa pública

14.1. Da competênciaA competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública é obrigatória,

devendo a parte, necessariamente, litigar perante este órgão jurisdicional nos casos em que se admite a competência do rito sumaríssimo.

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O Contencioso Geral da Procuradoria Geral do Estado

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Dessa maneira, ajuizada demanda que incide na regra de competência dos Juizados, deverá a mesma ser para este direcionado.

Regras de competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública

COMPETÊNCIA

OBRIGATÓRIA

Causas de interesse dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, de até sessenta salários mínimos

EXCLUSÃO DA

COMPETÊNCIA

- ações de mandado de segurança, de desapropriação, de divisão e

demarcação, populares, por improbidade administrativa, execuções

fiscais e as demandas sobre direitos ou interesses difusos e coletivos;

- causas sobre bens imóveis;

- causas que tenham como objeto a impugnação da pena de demissão

imposta a servidores públicos civis e sanções disciplinares aplicadas

a militares;

- causas que não sejam de menor complexidade.

a) Competência para o julgamento das causas cíveis de interesse dos Es-tados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como de suas autarquias, fundações públicas e empresas públicas, até sessenta salários mínimos:

O legislador adotou o critério do valor da causa, valendo-se do salário mí-nimo nacional. Nesse sentido, a demanda não poderá ultrapassar aos sessenta salários mínimos.

No caso de litisconsórcio ativo, esse valor deverá ser considerado para cada um dos autores. A propósito, já decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: “Competência – Ação Ordinária – Valor dado à causa de R$ 35.000,00 – Litis-consórcio facultativo ativo – Inconformismo ante a decisão que determinou a remessa dos autos ao Juizado Especial da Fazenda Pública da Capital – Com-petência de natureza absoluta, devendo-se levar em consideração o valor da prestação individual de cada litisconsorte – Precedentes do Egrégio TJSP e do STJ”. (Agravo de Instrumento 0277818-64.2011.8.26.0000, Relator Oscild de Lima Júnior).

Havendo parcelas vincendas, o valor da causa será calculado a partir da soma de doze parcelas e de eventuais parcelas vencidas, operação essa que não pode ser superior a sessenta salários mínimos.

b) Causas excluídas da competência dos Juizados:

Há determinadas demandas que, muito embora possam ser de pequeno va-lor, estarão excluídas da competência do Juizado Especial da Fazenda Pública. São elas:

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Américo Andrade Pinho, Luciano Alves Rossato e Nelson Finotti Silva

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4. Passo-a-Passo da execução fiscal

1.

Inscrição em dívida ativa

2.

Expedição CDA

3.

Ajuizamento execução fiscal

4.

Citação do executado

5.

5 dias para pagamento ou ga-rantia do juízo

6.

Garantido o juízo

7.

30 dias para embargos

8.

Embargos sem efeito suspensi-vo automático

9.

Expropriação de bens

5. Questões de concursos

1. (FCC – Procurador do Estado - MT/2011) Na execução fiscala) É necessária a intervenção do Ministério Público.b) O devedor deverá ser intimado, pessoalmente, do dia e hora da realização do leilão.c) É incabível a citação por edital, mesmo se frustradas as demais modalidades.d) A substituição do bem penhorado por precatório independe da anuência do exequente.e) A prescrição ocorrida antes da propositura da ação não pode ser decretada de ofício.

2. (Cespe – Procurador do Estado - PB/2008) Assinale a opção correta quanto à execução fiscal.a) Na execução fiscal, caso os bens oferecidos à penhora pelo executado sejam de difícil

alienação, o credor pode recusar a nomeação, com a consequente indicação à penhora de dinheiro existente em conta corrente do devedor.

b) A taxa sistema especial de liquidação e custódia (SELIC) pode ser incluída na liquidação de sentença condenatória com trânsito em julgado que tenha fixado correção monetária e juros de mora, pois essa taxa fixa tão-somente os índices dos juros convencionais cobrados pelo mercado. Por isso, ela pode ser cumulada com correção monetária e juros de mora.

c) Na execução fiscal, a intervenção do Ministério Público, na qualidade de fiscal da lei, é obrigatória, em razão do interesse público, no caso, consubstanciado no crédito da Fazenda Pública.

d) Os embargos do devedor, na execução fiscal, só serão admitidos com a garantia do juízo. Por isso, a insuficiência da penhora para garantir a satisfação integral do credor acarreta a extinção liminar dos embargos do devedor e o prosseguimento da execução.

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